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BIOÉTICA

GRUPO A Faculdade Multivix está presente de norte a sul do


Estado do Espírito Santo, com unidades presenciais

MULTIVIX em Cachoeiro de Itapemirim, Cariacica, Castelo,


Nova Venécia, São Mateus, Serra, Vila Velha e Vitória,
e com a Educação a Distância presente
em todo estado do Espírito Santo, e com
polos distribuídos por todo o país.

Desde 1999 atua no mercado capixaba,


destacando-se pela oferta de cursos de
graduação, técnico, pós-graduação e
extensão, com qualidade nas quatro
áreas do conhecimento: Agrárias, Exatas,
Humanas e Saúde, sempre primando
pela qualidade de seu ensino e pela
formação de profissionais com consciência
cidadã para o mercado de trabalho.

Atualmente, a Multivix está entre o seleto grupo de


Instituições de Ensino Superior que
possuem conceito de excelência junto ao
Ministério da Educação (MEC). Das 2109
R EE II T O R
R
instituições avaliadas no Brasil, apenas
15% conquistaram notas 4 e 5, que são
consideradas conceitos de excelência em
ensino. Estes resultados acadêmicos
colocam todas as unidades da Multivix
entre as melhores do Estado do Espírito
Santo e entre as 50 melhores do país.

MISSÃO

Formar profissionais com consciência cidadã para o


mercado de trabalho, com elevado padrão de quali-
dade, sempre mantendo a credibilidade, segurança
e modernidade, visando à satisfação dos clientes e
colaboradores.

VISÃO

Ser uma Instituição de Ensino Superior reconhecida


nacionalmente como referência em qualidade
educacional.

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2 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
BIBLIOTECA MULTIVIX (Dados de publicação na fonte)

Marcela Santos Procópio

Bioética / PROCÓPIO, M. S. - Multivix, 2020

Catalogação: Biblioteca Central Multivix


2020 • Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei.

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LISTA DE FIGURAS

UNIDADE 1

  > Relação entre ética, moral e deontologia 12


  > Obra dos principais idealizadores da teoria “principialista”
da Bioética: Tom Beanchamp e James Childress 13
  > Van Rensselaer Potter 16
  > Código de ética do embriologista  17
  > Direito à saúde 18
  > Crescimento da população brasileira até o ano de 2010 20
  > Esquema da bioética principialista 25

UNIDADE 2

  > Assento dos réus durante o julgamento de Nuremberg 29


  > Pesquisa científica 33
  > Busto de Aristóteles 39
  > British Cruelty Animal Act 40
  > Peter Singer 41

UNIDADE 3

  > Colheita de trigo 52
  > Protocolo de Cartagena em biossegurança 53
  > Fecundação de óvulo por espermatozoide 57
  > Representação da tecnologia de fertilização in vitro 59
  > Injeção intracitoplasmática de espermatozoides 60
  > Embrião humano de 10mm na quinta semana de gestação 61

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UNIDADE 4

  > Ovelha Dolly empalhada no Royal Museum of Scotland, em


Edimburgo, Escócia. 67
  > Diagrama demonstrando o procedimento de clonagem
reprodutiva e terapêutica 70
  > Células-tronco embrionárias de camundongo 76
  > Esquema básico das primeiras etapas da maturação do ovócito
humano, a fertilização e a nidação 77
  > Embrião de 8 células 79
  > Embrião humano masculino, de sete semanas de idade ou nove
semanas de idade gestacional 80
  > Terapia de células-tronco para esclerose múltipla 82

UNIDADE 5

  > Identificação humana 87


  > Reação em cadeia da polimerase (PCR) 89
  > Resultado da PCR após ser realizada uma eletroforese em gel
de agarose 90
  > Enchente 91
  > Tubos de PCR 92
  > Identificação de pessoas 94
  > Escala de comparação de tamanho de nanomateriais 98
  > Nanotubos de carbono 102
  > Lipossomo obtido por nanotecnologia para revestimento de
medicamentos 104

UNIDADE 6

  > Aborto realizado por aspiração a vácuo com equipamento elétrico 111
  > Feto humano de três meses 113
  > Protestos contra a permissão do aborto em caso de fetos anencéfalos 115
  > Reconstituição do primeiro transplante de coração humano,
realizado em 1967 123

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SUMÁRIO

UNIDADE 1 1 BIOÉTICA: CONCEITOS, PERSPECTIVAS HISTÓRICAS, DESAFIOS E


RESPONSABILIDADES 10
1.1 O QUE É BIOÉTICA?10
1.2 DESAFIOS E RESPONSABILIDADES17

UNIDADE 2 2 BIOÉTICA E PESQUISA28


2.1 BIOÉTICA E PESQUISA COM SERES HUMANOS28
2.2 ASPECTOS CONCEITUAIS SOBRE OS TIPOS DE PESQUISA EM
SERES HUMANOS32
2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS E INTERNACIONAIS EM
RELAÇÃO ÀS PESQUISAS COM SERES HUMANOS36
2.4 BIOÉTICA E PESQUISA COM ANIMAIS39

UNIDADE 3 3 BIOÉTICA: ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS E A


REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA47
INTRODUÇÃO47
3.1 ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGMS)48
3.2 REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA56

UNIDADE 4 4 BIOÉTICA: CLONAGEM, CÉLULA-TRONCO66


4.1 INTRODUÇÃO66
4.2 CLONAGEM GERMINATIVA E TERAPÊUTICA66
4.3 CÉLULAS-TRONCO75

UNIDADE 5 5 BIOÉTICA: GENÉTICA E NANOTECNOLOGIA86


5.1 INTRODUÇÃO86
5.2 A GENÉTICA NA IDENTIFICAÇÃO HUMANA86
5.3 NANOTECNOLOGIA97

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6 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
UNIDADE 6 6 BIOÉTICA NA MEDICINA: ABORTO E TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS108
6.1 INTRODUÇÃO108
6.2 ABORTO108
6.3 TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS118

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ICONOGRAFIA

ATENÇÃO ATIVIDADES DE
APRENDIZAGEM
PARA SABER

SAIBA MAIS
ONDE PESQUISAR
CURIOSIDADES
LEITURA COMPLEMENTAR
DICAS

GLOSSÁRIO QUESTÕES

MÍDIAS
ÁUDIOS
INTEGRADAS

ANOTAÇÕES CITAÇÕES

EXEMPLOS DOWNLOADS

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Bioética

UNIDADE 1

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
você possa:

> de ampliar seus


conhecimentos
sobre os contextos
históricos em
destaque; e
> de localizar os
movimentos sociais
abordados como
fruto de cada
contexto histórico.

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Bioética

1 BIOÉTICA: CONCEITOS,
PERSPECTIVAS HISTÓRICAS,
DESAFIOS E RESPONSABILIDADES
A disciplina de bioética tem como principal objetivo introduzir o pensamento
ético aplicável as diversas profissões da área da saúde.
Por se tratar de um tema multidisciplinar, envolvendo a biologia, saúde, di-
reito e filosofia, primeiro temos que entender conceitos básicos sobre ética e
moral. Depois de entendido esses conceitos um breve contexto histórico para
explicar como o pensamento ético se desenvolveu na sociedade mundial.
Também daremos início aos estudos dos princípios da bioética. Será aborda-
do, principalmente a teoria principialista de Beuachamp e Childress publi-
cada em 1979. Nesta unidade será abordado os desafios e responsabilidades
que é trabalhar com ciência e vida, uma vez que a bioética também se aplica
a estudos clínicos, ambientais e animais.
Por fim será abordado como essa teoria foi aceita pela sociedade brasileira e
como ela se aplica ao Sistema Único de Saúde (SUS).

1.1 O QUE É BIOÉTICA?


A origem da palavra ética vem do grego “éthos”, que significa o modo de ser,
o caráter. Já os romanos traduziram o “éthos” para o latim como “mos” (ou no
plural mores) que quer dizer costume dando origem a palavra moral.
No cotidiano não há distinção entre ética e moral, as palavras são usadas
como sinônimos. Porém os cientistas e filósofos fazem a distinção entre elas.
Ética é tido como o estudo do comportamento moral, ou seja, tenta explicar
justificar e até criticar a moral de uma sociedade. O conceito de moral é de-
finido como um conjunto de normas, conceitos, costumes e valores de uma
determinada sociedade. Agora que entendemos um pouco dos conceitos po-
demos trabalhar com a bioética propriamente dita.

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Bioética

Para quem tem interesse em entender melhor


os conceitos filosóficos e suas aplicações no
cotidiano, de uma forma lúdica e de fácil leitura, o
livro “O mundo de Sofia”, é um romance que exala
conteúdo de uma forma simples e suave. Publicado
pela primeira vez em 1991 pelo escritor, professor
e filósofo Jostein Gaarder. Traduzido em diversas
línguas, atualmente, no Brasil é publicado pela
editora Companhia das letas.

1.1.1 CONCEITO DE BIOÉTICA


A bioética  é uma área de estudo que envolve a ciência humana usando o
princípio da ética e as ciências biológicas. Fundamentando os princípios éti-
cos que regem a vida quando essa pode ser colocada em risco pela medici-
na ou pelas ciências. A palavra bioética é uma junção dos radicais “bio”, de
origem grega “bios” que significa vida e “éthos”, que diz respeito à conduta
moral como já mencionado anteriormente.
O estabelecimento de uma profissão em seu significado pleno está extrema-
mente associado à existência de um código de ética profissional: os códigos
deontológicos. Cada profissão tem sua conduta regida pelos conselhos fede-
rais (CFM - Conselho federal de Medicina; CFR – Conselho federal de farmácia)
e regionais (CREF- Conselho regional de Educação física; CREFITO - Conselho
Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional), como pode ser observado no
esquema abaixo.

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Bioética

RELAÇÃO ENTRE ÉTICA, MORAL E DEONTOLOGIA

Ética
Princípios gerais

Moral
Aplicação ao comportamento
humano e social

Deontologia
Aplicação às profissões

Fonte: Mattar (2010, p. 241). 

#PraCegoVer
Esquema que mostra a hierarquia e sobreposições dos conceitos de deontologia,
legislação que se aplica nas diferentes profissões seguido da moral que está vinculado ao
comportamento social e a ética um termo mais abrangente e teórico.

1.1.2 FUNDAMENTAÇÃO DA ÉTICA E BIOÉTICA


A Bioética nasce em um ambiente científico, como uma necessidade sentida
pelos próprios profissionais da saúde, em seu sentido mais amplo, de prote-
ger a vida humana e seu ambiente.
Uma segunda característica é o seu caráter interdisciplinar, pois abrange pro-
fissionais da área médica, teólogos, sociólogos, juristas, psicólogos, filósofos,
dentre outros.
Por fim, mas sem esgotar suas características, é um ramo do conhecimento
humano que se apoia mais na razão e no bom juízo moral de seus investi-
gadores do que em alguma corrente filosófica ou autoridade religiosa. Daí
serem seus princípios de caráter autônomo e universal.

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Bioética

Um dos modelos de análise bioética mais divulgados é certamente o “princi-


palista” (que será abordado mais profundamente ao longo do texto), apresen-
tado por Tom Beanchamp e James Childress, em Principles of Biomedical
Ethics (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002). Os autores propõem a existência de
quatro princípios como norteadores da ação que se quer boa. São eles: o da
beneficência, o da não-maleficência, o
da justiça e o da autonomia. Estes princí-
pios encontram as suas raízes na história
da filosofia ou na tradição da ética médi-
ca, a partir do que ganham a sua justifi-
cação como princípios. Eles não obede-
cem a qualquer disposição hierárquica e
são válidos prima facie. Em caso de con-
Prima Facie
flito entre si, a situação em causa e as
suas circunstâncias definirão o que indi- Que se pode constatar de
imediato, sem ser necessário
carão o que deve ganhar precedência. O
examinar melhor; claro,
princípio da autonomia parece, então, evidente, óbvio.
receber a preferência dos autores.

OBRA DOS PRINCIPAIS IDEALIZADORES DA TEORIA “PRINCIPIALISTA” DA BIOÉTICA: TOM


BEANCHAMP E JAMES CHILDRESS

Fonte: Journal of Medical Ethics (2013).

#PraCegoVer
Fotografia da sétima edição do livro Princípios da Ética Biomédica.

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Bioética

Outros modelos de reflexão e análise atualmente aplicados em Bioética são: o


modelo casuístico, o modelo do cuidado, o modelo contemporâneo do direito
natural e o modelo contratualista.

O modelo casuístico

Apresentado por Albert Jonsen e Stephen Toulmin em The abuse


of casuistry, preconiza uma análise de caso a caso. Cada caso deve
ser examinado nas suas características individuais, estabelecendo-se
comparações e analogias com outros casos.

O modelo do cuidado

Apresentado por Carol Gilligan em In a different voice, partindo do


estudo da psicologia evolutiva, é mais de natureza psicológica do que
filosófica. O cuidado é mais personalizado e atende aos valores dos
indivíduos envolvidos.

O modelo contemporâneo do direito natural

Apresentado por John Finnis em Natural law and natural


rights, estabelece a existência de alguns bens fundamentais. O
conhecimento, a vida estética, a vida lúdica, a racionalidade, a
religiosidade e a amizade não supõem qualquer organização
hierárquica entre si. Moral será toda a ação que contribui para o
desenvolvimento destes valores.

O modelo contratualista

Apresentado por Robert Veatch em A theory of medical ethics, parte


da denúncia das várias insuficiências de fundo que a ética hipocrática
condena. É baseado em um triplo contrato: entre médico e pacientes,
entre médicos e a sociedade e um contrato mais amplo acerca dos
princípios orientadores da relação médico-paciente. Para regular
estas relações deve-se obedecer a algumas regras fundamentais: o
da beneficência, o da proibição de matar, o de dizer a verdade e o de
manter as promessas.

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Bioética

1.1.3 EVOLUÇÃO DO CONCEITO E CONTEXTO


HISTÓRICO
Em meados do século XX diante de um colapso ecológico global, quando fo-
ram identificadas as primeiras consequências das mudanças climáticas, do
aumento exponencial da população após a Segunda Guerra Mundial, da ex-
ploração demasiada de recursos naturais não renováveis e da evolução de
novas tecnologias, principalmente atômicas, químicas e biológicas, que con-
feriram ao ser humano o poder inédito de destruir o próprio planeta. Foi neste
contexto que o termo bioética foi mencionado pela primeira vez (HECK, 2005).
A história da Bioética teve início em 1971,
quando Van Rensselaer Potter, bioquí-
mico e professor de oncologia da Escola
Médica da Universidade de Wisconsin,
publicou o livro Bioethics: Bridge to The
Future, que apenas mais tarde seria re-
Mídias Integradas conhecido como a principal obra da bio-
Tem interesse em aprender ética, um campo de atuação científica,
mais sobre o relatório normativa e institucional estabelecido
Belmont e a ética em nos Estados Unidos da América do Nor-
pesquisa com seres
humanos? Para maiores te (EUA). A consolidação deste campo
informações, leia a matéria da ética aplicada ocorreu, sobretudo,
“O Relatório Belmont e a após a publicação do Belmont Report
ética em pesquisa com seres (1978), documento que sintetizou orien-
humanos”, clicando aqui.
tações éticas para a realização de pes-
quisas biomédicas e comportamentais
envolvendo seres humanos naquele país. A repercussão pública sobre abusos
em investigações científicas envolvendo grupos de minorias é considerada
fator importante para o estabelecimento da bioética como um campo de dis-
cussão pública sobre conflitos éticos envolvendo as ciências biomédicas e as
práticas clínicas A publicação da Encyclopedia of Bioethics, em 1978, e do livro
Principles of Biomedical Ethics, em 1979, consolidaram no âmbito acadêmi-
co a identidade biomédica que até hoje caracteriza a bioética naquele país
(DALL’AGNOL, 2005; HECK, 2005).

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Bioética

VAN RENSSELAER POTTER

Fonte: Wikimedia Commons (2020).

#PraCegoVer
Foto em preto e branco do criador do termo bioética, Van Rensselaer Potter.

O início das discussões bioéticas no Brasil deu-se, tardiamente, no fim da


década de 1980 e início dos anos 1990 no cenário de redemocratização, que
criava a expectativa de que o novo campo fosse ferramenta útil para atingir
objetivos políticos, coletivos, sensíveis às necessidades de grandes mudanças.
O caráter crítico é apontado no surgimento da bioética no Brasil pelo reco-
nhecimento de seu forte vínculo com movimentos sociais em defesa da de-
mocracia, dos direitos sociais e civis, e da grande parcela da população social-
mente desfavorecida. As marcas dessa
origem operam tanto como pontos de
ruptura quanto de consolidação de dis-
cursos e prática.
Além do contexto político e de seu as-
pecto multidisciplinar, outra caracterís-
tica que marca o início da bioética no
Brasil é a capacidade de produzir novos Mídias Integradas
pensamentos e agregar múltiplos sujei- Para manter-se atualizado
tos (Corrêa A.P.R; Garrafa V, 2005). sobre o código de ética
brasileiro acesse o site da
Em 1995 foi criada a Sociedade Brasileira Sociedade Brasileira de
de Bioética, bem como cursos de pós- Bioética, clicando aqui.
-graduação. Essa criação e essa implan-

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Bioética

tação foram os fatores determinantes para agregar a esse campo de estudos


profissionais, diferentes áreas do conhecimento.

1.2 DESAFIOS E RESPONSABILIDADES


A disciplina de bioética trata de temas específicos como nascer/não nascer
(aborto), morrer/não morrer (eutanásia), saúde/doença (ética biomédica),
bem-estar/mal-estar (ética biopsicológicas) e se ocupa de novos campos de
atuação do conhecimento, como clonagem (ética genética), irresponsabilida-
de perante os pósteros (ética de gerações), depredação da natureza extra-
-humana circundante e agressões ao equilíbrio sistêmico das espécies (ecoé-
tica). Dentre as diversas práticas da bioética destacam-se atividades
terapêuticas em todo e qualquer exercício das relações profissionais de médi-
cos, enfermeiros, dentistas, psicólogos, nutricionistas, biólogos, fisioterapeu-
tas farmacêuticos, biomédicos terapeutas ocupacionais e demais técnicos
especializados em saúde e doença, bem como os usuários das novas técnicas
biomédicas e farmacológicas tornam-se subordinados ao discurso. Podemos
citar como exemplo, o recente código de ética dos profissionais embriologis-
tas, com a primeira edição publicada em 2018.

CÓDIGO DE ÉTICA DO EMBRIOLOGISTA

Fonte: Pronúcleo (2020).

#PraCegoVer
Imagem ilustrativa da capa do Código de Ética e Conduta da Associação Brasileira de
Embriologistas.

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Bioética

O Brasil dispõe de um sistema público


de saúde, o Sistema Único de Saúde
(SUS), que foi implementado com a lei n.
8.080, de 19 de setembro de 1990 homo-
logada pelo então presidente Fernando
Collor de Melo. Um dos grandes desa-
fios para a saúde, desde então, é aplicar Mídias Integradas
a bioética na sua forma de contemplar Para melhor contextualização
toda a população brasileira. Para enten- da história e desenvolvimento
do SUS no Brasil assista o
der melhor como a bioética, seu contex-
vídeo no link a seguir.
to, aplicabilidade, desafios e responsa-
O SUS do Brasil - um projeto para a
bilidades também temos que entender saúde
como as diretrizes do SUS funciona. Este
será abordado mais profundamente no
decorrer do texto.

DIREITO À SAÚDE

Fonte: Pikist (2020).

#PraCegoVer:
Imagem ilustrativa do martelo do juiz, também chamado de malhete, representando o
direito à saúde.

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Bioética

1.2.1 DESAFIOS DA BIOÉTICA


Desde a Grécia Antiga, segunda metade do século XX até o presente, a bioé-
tica interage com múltiplos fatores circunstanciais na medicina. Por um lado,
os desafios à vida no micro e macrouniverso em escala planetária e, por outro,
o desenvolvimento tecnológico desenfreado levantam uma série de pergun-
tas acerca da capacidade humana de sentir, julgar e agir adequadamente em
relação a um patrimônio que vem dos primórdios da vida sobre o planeta. A
abordagem da bioética vai além de uma ética médica e herda boa parte das
tarefas da filosofia ocidental no afã de monitorar a conduta humana.
A medida, porém, que o espectro temático se distende para fora da medicina,
a bioética corre o risco de perder contorno, mascarar realidades e desenten-
der seus agentes, razão pela qual importa explicitar seu caráter interdiscipli-
nar, sua demanda científica e seu desafio filosófico mais instigante.
Dentre os muitos desafios que, de fato, o mundo contemporâneo nos apre-
senta, será considerado especialmente três: um primeiro, provocado pela
mesma estrutura da ciência moderna e que exige uma ética da ciência; um
segundo, consequência do anterior, provocado pelo impacto da ciência e da
técnica na ação dos homens e que exige uma ética da solidariedade univer-
sal; e um terceiro, provocado pelo fenômeno da globalização e que exige uma
resposta ético-política capaz de responsabilizar-se pelas consequências de
nossas ações a nível planetário (HECK, 2005).
O Brasil é uma país de dimensões continentais e a estrutura socioeconômi-
ca é bem variante. De acordo com dados do IBGE 2020 (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística), atualmente
a população brasileira conta com mais
de 212 milhões de habitantes.
O boom populacional brasileiro teve
seu marco nas décadas de 1950 e 1960.
Com a crescente demanda populacio-
nal frente a serviços de saúde e higiene Mídias Integradas
sanitária, vem o grande desafio. Ofertar Para mais informações
saúde, educação e dignidade a todos. sociodemográficas, acesse o
link do site do IBGE.

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CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA ATÉ O ANO DE 2010

Fonte: IBGE (2010).

#PraCegoVer
Gráfico referente a quantidade de habitantes x ano, demonstrando o crescimento
populacional do Brasil até o ano de 2010.

1.2.2 RESPONSABILIDADES DA BIOÉTICA


Responsabilidade é um conceito moderno. Responsabilizar-se por algo sig-
nifica, originariamente, responder em juízo por seus atos, defendendo e/ou
justificando comportamentos oficialmente questionados. Cada um é respon-
sável por suas ações a serem legitimadas perante instância superior, a quem
cabe pronunciar-se favorável ou desfavoravelmente. O conceito de responsa-
bilidade, usual na tradição, está familiarizado com ilicitude, culpa e reparação.
Quem é chamado à responsabilidade transgrediu uma ordem estabelecida
por leis, normas ou valores, é forçado a encontrar explicações para sua con-
duta e submete-se a decisões superiores (MARTINS-COSTA; LUDWIG, 2009).
As responsabilidades bioéticas no Brasil estão intrinsicamente associadas aos
princípios e diretrizes que regem o SUS. Podemos dizer isso, pois ambas fo-
ram estruturadas e implementadas no país da década de 1990.
O Sistema Único de Saúde (SUS), também chamada de “Lei Orgânica da Saú-
de”, é a tradução prática do princípio constitucional da saúde como direito de
todos e dever do Estado e estabelece, no seu artigo 7o, que “as ações e servi-
ços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que

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Bioética

integram o Sistema Único de Saúde (SUS) são desenvolvidos de acordo com


as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, (Brasil. Lei n. 8080),
obedecendo ainda aos seguintes princípios:

Princípio 1

Universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de


assistência;

Princípio 2

Integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e


contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e
coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade
do sistema;

Princípio 3

Preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade


física e moral;

Princípio 4

Igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de


qualquer espécie;

Princípio 5

Direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde;

Princípio 6

Divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde


e a sua utilização pelo usuário;

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Bioética

Princípio 7

Utilização da epidemiologia para o estabelecimento de prioridades, a


alocação de recursos e a orientação programática;

Princípio 8

Participação da comunidade;

Princípio 9

Descentralização político-administrativa, com direção única em cada


esfera de governo: a) ênfase na descentralização dos serviços para os
municípios; b) regionalização e hierarquização da rede de serviços de
saúde;

Princípio 10

Integração em nível executivo das ações de saúde, meio ambiente e


saneamento básico;

Princípio 11

Conjugação dos recursos financeiros, tecnológicos, materiais e


humanos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
na prestação de serviços de assistência à saúde da população;

Princípio 12

Capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de


assistência; e

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Bioética

Princípio 13

Organização dos serviços públicos de modo a evitar duplicidade de


meios para fins idênticos.

1.2.3 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA BIOÉTICA


O modelo de análise bioética comumente utilizado e de grande aplicação na
prática clínica na maioria dos países é o “principialista”, introduzido por
Beauchamp e Childress, em 1989.

Os princípios, as regras e os direitos precisam ser, além de especificados,


ponderados. Os princípios (e coisas do gênero) nos orientam para certas
formas de comportamento; porém, por si mesmos, eles não resolvem conflitos
de princípios. Enquanto a especificação promove um desenvolvimento
substantivo da significação e do escopo de normas, a ponderação consiste
na deliberação e na formulação de juízos acerca dos pesos relativos das
normas. (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002, p. 299).

O princípio da autonomia

Requer que os indivíduos capacitados de deliberarem sobre suas


escolhas pessoais, devam ser tratados com respeito pela sua
capacidade de decisão. Esses têm o direito de decidir sobre as
questões relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Quaisquer atos
médicos devem ser autorizados pelo paciente;

O princípio da beneficência

Diz respeito à obrigação ética de maximizar o benefício e minimizar


o prejuízo. O profissional deve ter a maior convicção e informação
técnicas possíveis que assegurem ser o ato benéfico ao paciente (ação
que faz o bem);

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23 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

O princípio da não-maleficência

Esse, estabelece que a ação do médico sempre deve causar o menor


prejuízo ou agravos à saúde do paciente (ação que não faz o mal).
A finalidade é reduzir os efeitos adversos ou indesejáveis das ações
diagnósticas e terapêuticas no ser humano;

O princípio da justiça

Estabelece como condição fundamental a equidade, ou seja,


obrigação ética de tratar cada indivíduo conforme o que é
moralmente correto e adequado, de dar a cada um o que lhe é devido.
Os profissionais da saúde devem atuar com imparcialidade, evitando
ao máximo que aspectos sociais, culturais, religiosos, financeiros ou
outros interfiram na relação profissional-paciente. Os recursos devem
ser equilibradamente distribuídos, com o objetivo de alcançar, com
melhor eficácia, o maior número de pessoas assistidas.

Em relação à criança ou indivíduos men-


talmente incapazes, o princípio da auto-
nomia deve ser exercido pela família ou
responsável legal. Entretanto, estes não
têm o direito de forçá-las a receber tra-
tamentos e/ou intervenções nocivos ou
desproporcionalmente penosos, às ve-
zes, por motivos religiosos. Consequen- Exemplo
temente, os profissionais devem intervir Em um paciente com
ou negar-se a adotar condutas especí- risco iminente de vida,
ficas quando as decisões dos pais ou justifica-se a aplicação de
medidas salvadoras (diálise,
responsáveis legais forem contrárias aos amputação, histerectomia,
melhores interesses da criança. ventilação assistida,
transplantes etc.) mesmo que
Os princípios bioéticos estabelecem pa-
tragam consigo algum grau
drões que orientam, guiam e avaliam de sofrimento, prevalecendo
condutas, enquanto não são sobrepos- assim o princípio da
tos pela alegação de fatos ou argumen- beneficência sobre o da não-
maleficência. O primeiro
tos dos quais, novamente, resulta prima
objetivo neste momento é a
facie um bem maior, mais útil, mais jus- preservação da vida.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 24
Bioética

to, e assim por diante. Assegurada a universalidade de seu objeto, a bioética


não pode furtar-se ao confronto com a diversidade cultural que mundo afora
determina condutas, sustenta razões, plasma indivíduos e agrega multidões
(CORRÊA; GARRAFA, 2005).

ESQUEMA DA BIOÉTICA PRINCIPIALISTA

Autonomia

Beneficência Principialismo Não-maleficência

Justiça

Fonte: Elaborada pelo autor (2020).

#PraCegoVer:
Esquema circular demonstrando que a ética principialista funciona em ciclo e não em
uma hierarquia.

CONCLUSÃO

Uma vez consolidada como ciência, com objeto e métodos não mais restritos
ao universo da medicina, a bioética fica em condição de hospedar múltiplas
disciplinas com conteúdo acadêmicos diversos para interagir, na teoria e na
prática, com as diferentes áreas do conhecimento sem abdicar da identidade,
refazer objetivos e/ou descartar métodos. Dada sua destinação interdisciplinar,
a ciência da bioética tem a tarefa de aplicar a pluralidade de seus princípios e
suas regras às várias frentes de geração, elaboração e administração do saber.
O progresso intelectual avança com mais rapidez do que o processo moral (éti-
co). Porém, hoje em dia a bioética ampliou a sua abrangência, gerando inte-

MULTIVIX EAD
25 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

resses instituições privadas e públicas. Em razão disto, ganha uma aceitação


em escala global, em parte como uma tentativa de apresentar sinais de como
lidar com os novos problemas éticos que o mundo técnico-científico levanta
ao interferir vida de todos. É possível perceber, com criações de Comissões Na-
cionais de Bioética, centros de estudos, publicações na área e os congressos
realizados ou projetados são uma evidência desta amplitude. Observa-se que a
bioética tem como principais objetivos o respeito e a conservação da dignidade
da pessoa humana. Ela compreende o estudo das dimensões morais das ciên-
cias da vida, utilizando diversas metodologias éticas em contexto mais amplo.
No Brasil, apesar de ser mais recente do que nos Estados Unidos, por exem-
plo, já possuímos inúmeras iniciativas e estudos sobre este tema. Prova dis-
so, são os próprios estudos que vão de encontro aos problemas do mundo
contemporâneo, ou seja, da ciência e da vida, do pedagógico ao jurídico, do
biológico ao social. Com isso, surge sob vários paradigmas, que tratam das
questões primordiais ligadas ao início da vida, do desenvolvimento da pessoa,
como por exemplo, aborto, eutanásia, doação de órgãos, bem como temas
relacionados com a engenharia genética, ecologia, saúde etc.

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Bioética

UNIDADE 2

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
seja capaz:

> Compreender os
aspectos éticos e
jurídicos relativos
à realização
de pesquisas
envolvendo seres
humanos.
> Compreender
os aspectos
éticos e jurídicos
que envolvem
a realização
de pesquisas
envolvendo a
experimentação
animal.

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27 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

2 BIOÉTICA E PESQUISA
Olá, pessoal! Bem-vindos a mais uma importante unidade de estudos da dis-
ciplina de Bioética!
A partir de agora nossos olhares serão voltados para a bioética e para a pes-
quisa, buscando compreender os embasamentos éticos e jurídicos que en-
volvem este importante e amplo campo de estudos.
Vamos aprofundar nossos conhecimentos acerca das realizações de pesqui-
sas que ocorrem tanto em seres humanos, quanto em animais, compreender
quais são os limites para esses experimentos e de que forma eles ocorrem.
Fiquem atentos para descobrir ainda mais sobre esses importantes assuntos
que podem ser tema de grandes debates para a atualidade!
Bons estudos!

2.1 BIOÉTICA E PESQUISA COM SERES HUMANOS

2.1.1 CONTEXTO HISTÓRICO E ABORDAGEM


DOS DOCUMENTOS BÁSICOS DE ÉTICA
EM PESQUISA: CÓDIGO DE NUREMBERG,
DECLARAÇÃO DE HELSINQUE E RELATÓRIO
BELMONT
A bioética, como temática de estudo e ciência qualitativa na área da filosofia,
direito e saúde, tem o seu início no Brasil durante a década de 1990. Isso se
decorreu no contexto da redemocratização do país, em que se observou o
aumento do debate sobre direitos individuais, sociais, e também as questões
de ética em saúde pública.
Ao falar de ética na medicina ou em pesquisa com seres humanos temos
que recuperar alguns fatos que marcaram a história e deram início à regula-
mentação da experimentação com humanos. Dentre os documentos básicos
sobre a ética podemos citar o Código de Nuremberg, a Declaração de Helsin-
que e o Relatório Belmont, que iremos explorar adiante.

MULTIVIX EAD
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Bioética

O Tribunal de Nuremberg, em 9 de dezembro de 1946, julgou vinte e três pes-


soas, vinte das quais, médicos que foram considerados criminosos de guerra,
pelos experimentos realizados em seres humanos, durante a Segunda Guer-
ra Mundial. Em 19 de agosto de 1947, as sentenças foram divulgadas, e sete
pessoas foram acusadas e condenados à morte. Com a sentença, também foi
publicado um documento que ficou conhecido como Código de Nuremberg.
Esse documento tornou-se um marco na história da humanidade que, pela
primeira vez, estabeleceu-se um conjunto de recomendações internacionais
sobre os aspectos éticos envolvidos na pesquisa em seres humanos.

ASSENTO DOS RÉUS DURANTE O JULGAMENTO DE NUREMBERG

Fonte: Wikicommons (2020).

#PraCegoVer:
Fotografia colorida de uma vista superior do banco de réus do tribunal de Nuremberg.

O documento estabelece que um indivíduo dotado de plena capacidade de


tomada de decisões precisa ter os seus desejos respeitados. O pesquisador,
por sua vez, deve proteger os interesses do seu paciente.
Além disso, o Código de Nuremberg (SHUSTER, 1997), aborda outros princí-
pios, que podem ser observados abaixo:

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Bioética

1. O consentimento voluntário do ser humano é absolutamente


essencial.
2. O experimento deve ser tal que produza resultados vantajosos para
a sociedade, que não possam ser buscados por outros métodos
de estudo, mas não podem ser feitos de maneira casuística ou
desnecessariamente.
3. O experimento deve ser baseado em resultados de experimentação
com animais e no conhecimento da evolução da doença ou outros
problemas em estudo; dessa maneira, os resultados já conhecidos
justificam a condição do experimento.
4. O experimento deve ser conduzido de maneira a evitar todo
sofrimento e danos desnecessários, quer físicos, quer mentais.
5. Não deve ser conduzido nenhum experimento quando existirem
razões para acreditar que possa ocorrer morte ou invalidez
permanente; exceto, talvez, quando o próprio médico pesquisador
se submeter ao experimento.
6. O grau de risco aceitável deve ser limitado pela importância do
problema que o pesquisador se propõe resolver.
7. Devem ser tomados cuidados especiais para proteger o
participante do experimento de qualquer possibilidade de dano,
invalidez ou morte, mesmo que remota.
8. O experimento deve ser conduzido apenas por pessoas
cientificamente qualificadas.
9. O participante do experimento deve ter a liberdade de retirar-se no
decorrer do experimento.
10. O pesquisador deve estar preparado para suspender os
procedimentos experimentais em qualquer estágio, se ele tiver
motivos razoáveis para acreditar que a continuação do experimento
provavelmente causará danos, invalidez ou morte para os
participantes.

Infelizmente o Código de Nuremberg não obteve tanto sucesso quanto espe-


rado. A mídia não deu a devida atenção ao assunto e os médicos e cientistas
acharam que este código somente se aplicava aos condenados pelos crimes
que ocorreram durante a Segunda Guerra Mundial. Então até a década de
1970, os aspectos éticos em torno da pesquisa clínica com seres humanos ain-
da eram muito negligenciados (DINIZ; CORRÊA, 2001).

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Bioética

[...] o julgamento dos médicos nazistas em Nuremberg recebeu pouca


cobertura da imprensa e, antes da década de 70, o próprio código raramente
era citado ou discutido nas revistas médicas. Pesquisadores e clínicos
americanos aparentemente consideravam Nuremberg irrelevante para seu
próprio trabalho [...] (ROTHMAN, 1991, p. 62).

Em 1964, a Associação Médica Mundial (AMM), um órgão regulador das as-


sociações médicas internacionais, publicou a Declaração de Helsinque, um
documento que não possui poderes legais ou normativos, mas que, pelo con-
senso conquistado, é uma referência ética importante para a regulamenta-
ção de pesquisas médicas envolvendo seres humanos (DINIZ, 2005).
A declaração de Helsinque traz em seu conteúdo alguns princípios a serem
considerados ao conduzir uma pesquisa com seres humanos. Tendo 12 princí-
pios, em resumo, o documento preza em primeiro lugar que a pesquisa bio-
médica deve seguir uma hierarquia de ensaios, in vitro, in vivo e depois trans-
lacionar para humanos. Somente profissionais cientificamente treinados
devem conduzir pesquisas com humanos. Em qualquer pesquisa com seres
humanos, cada participante em potencial deve ser adequadamente informa-
do sobre os objetivos, métodos, benefícios previstos e potenciais perigos e
incômodos que o experimento possa acarretar. Deve ser informado de que é
livre para retirar seu consentimento em participar, a qualquer momento
(AMM,1964).
Como abordado anteriormente, o Rela-
tório Belmont foi essencial para o desen-
volvimento da bioética mundial (LEONE;
PRIVITERA; CUNHA, 2001). Publicado por
Van Potter em 1978, esse relatório tinha
como objetivo analisar princípios ético
básicos que possam nortear pesquisas
Saiba Mais
com seres humanos e desenvolver pro-
Para acessar a Declaração de
tocolos técnicos, garantindo que a pes-
Helsinque na íntegra e ver as
suas modificações, desde a quisa seja administrada e aplicada diante
primeira publicação, acesse o tais princípios. Dentre os princípios cita-
link aqui. dos no relatório devemos citar os quatro
mais importantes: Respeito à autonomia,
beneficência, justiça e não maleficência
(BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2002).

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31 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

O princípio da autonomia

O indivíduo, desde que com plena capacidade e consciência, possui o


direito de decidir sobre as questões relacionadas ao seu corpo e à sua
vida. Quaisquer atos médicos devem ser autorizados pelo paciente, ou
em alguns casos pelo responsável legal.

O princípio da beneficência

Diz respeito à obrigação ética de prevalecer o benefício em detrimento


ao prejuízo. Dessa forma, o pesquisador ou médico necessita sempre
prezar pela preservação da saúde do paciente.

O princípio da não-maleficência

Tem por objetivo reduzir ao máximo os danos causados à saúde e a


moral dos indivíduos.

O princípio da justiça

Tem por finalidade garantir a equidade. A obrigação ética de tratar


cada indivíduo com o que é moralmente adequado, oferecer o que é
necessário dentro da individualidade do paciente. O profissional da
saúde deve atuar de forma imparcial.

2.2 ASPECTOS CONCEITUAIS SOBRE OS TIPOS DE


PESQUISA EM SERES HUMANOS
A pesquisa científica pode ser definida como uma classe de atividades cujo
objetivo é desenvolver ou contribuir para o conhecimento generalizável. O
conhecimento generalizável consiste em teorias, relações ou princípios ou no
acúmulo de informações sobre as quais estão baseados, que possam ser cor-
roborados por métodos científicos aceitos de observação e inferência (Reso-
lução 196/96 item II).

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Bioética

PESQUISA CIENTÍFICA

Fonte: Plataforma Deduca (2021).

#PraCegoVer: Imagem de um homem com jaleco branco, representando um cientista,


manuseando equipamentos de laboratório, caracterizando a pesquisa científica.

Podemos citar três que são muito frequentes na área da saúde: pesquisas
epidemiológicas, pesquisas de comportamento, atitudes e crenças e os testes
de novos remédios e procedimentos.

Pesquisas Epidemiológicas

São estudos que têm como objetivo a produção do conhecimento


sobre as características dos agravos de saúde na população.
Geralmente utilizam dados secundários, tais como documentos,
declarações de óbito, fichas produzidas pelos próprios serviços de
saúde, prontuários médicos, ou até mesmo artigos publicados em
revistas científicas.

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33 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

Pesquisa sobre comportamento, atitudes e crenças

Buscam entender a maneira como as pessoas vivem, como agem


e o que pensam sobre determinada temática, que seria o objeto do
estudo. O contato entre a equipe de pesquisa e os participantes ocorre
por meio de entrevistas, grupos de discussão ou questionários.

Testes de novos remédios e procedimentos

Esses estudos são pagos frequentemente pelos laboratórios


farmacêuticos, que possuem como objetivo a testagem de novos
medicamentos. Nessas pesquisas, a equipe de profissionais
possui contato com os participantes que, geralmente, passam por
procedimentos médicos e laboratoriais, antes e após a utilização do
novo medicamento, para avaliar o efeito da substância.

A epidemiologia contribui com o desenvolvimento de diferentes metodolo-


gias de pesquisa, com a finalidade de responder a perguntas clínicas. O co-
nhecimento adequado desses delineamentos de pesquisa é fundamental
no planejamento de uma pesquisa, e também na leitura e na interpretação
dos estudos, para as quais recomendamos revisões recentes sobre o assunto
(BUEHLER; et al., 2009)
De acordo com Nedel e Silveira, 2009, podemos classificar os estudos epide-
miológicos das seguintes formas:

Ensaio clínico randomizado (ECR)

Estudo intervencionista e prospectivo. Os participantes devem ter a


mesma oportunidade de receber, ou não, a intervenção proposta e
esses grupos devem ser os mais parecidos possíveis, de forma que a
única diferença entre eles seja a intervenção em si, podendo-se, assim,
avaliar o impacto na ocorrência do desfecho em um grupo sobre o
outro. É o padrão de excelência em estudos que pretendem avaliar o
efeito de uma intervenção no curso de uma situação clínica.

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Bioética

Ensaio clínico não randomizado (quase experimental)

Neste tipo de estudo há um grupo intervenção e um grupo controle,


mas a designação dos participantes para cada grupo não se dá de
forma aleatória, como no ECR, mas conveniência do pesquisador.

Estudos de prevalência (transversais)

As mensurações dos fatores de risco e dos desfechos analisados


ocorrem em um mesmo momento, concomitantemente, não
podendo inferir no que veio primeiro (exposição ou desfecho).

Caso-controle

Observacional, longitudinal e retrospectivo. Seleciona-se uma


população com determinado desfecho de interesse (casos) e
outra, semelhante ao primeiro grupo, sem o desfecho de interesse
(controles). Comparando-se os dois grupos, avaliam-se os fatores que
poderiam estar relacionados à ocorrência do desfecho pesquisado.

Estudos de coorte

Observacional longitudinal, prospectivo ou retrospectivo. Selecionam-


se populações exposta e não exposta a determinado fator, fazendo seu
acompanhamento por um determinado período de tempo, ao final do
qual deve ser analisado o efeito do fator de exposição no aparecimento
do desfecho.

Revisão sistemática com metanálise

O objeto de análise deixa de ser os pacientes e passa a ser as pesquisas


já realizadas anteriormente sobre determinado objeto de pesquisa.
Os trabalhos originais publicados na literatura são revisados e
selecionados de maneira sistemática, e os resultados deles podem
ser sumarizados sob um único parâmetro de magnitude de efeito (a
metanálise).

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35 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS E


INTERNACIONAIS EM RELAÇÃO ÀS PESQUISAS
COM SERES HUMANOS
Um dos vários modelos utilizados em Bioética é o modelo principialista. Este
serve de fundamentação à vários documentos internacionais e, no Brasil, à
Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que regulamenta a
pesquisa em seres humanos no país.
Essa é a resolução que dá as diretrizes e normas reguladoras para pesquisa
com seres humanos no Brasil. Ela foi elaborada por um grupo de pessoas
com diferentes profissões, inclusive com representantes de usuários. É neste
documento que está descrito o funcio-
namento da Comissão Nacional de Ética
em Pesquisa (CONEP), dos Comitês de
Ética em Pesquisa (CEP) e os princípios
que devem ser respeitados em todas as
pesquisas que envolvem seres humanos
(BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho
Saiba Mais Nacional de Saúde. Resolução n. 196, de
10 out. 1996).
Quer ter acesso integral à
resolução nº. 196/96? Acesse Além da Resolução 196/96, o Conselho
aqui o link. Nacional de Saúde aprovou as seguintes
resoluções complementares:

Resolução CNS n. 240, de 5 de junho de 1997

Considerando a necessidade de definição do termo “usuários”


para efeito de participação nos comitês de ética em pesquisa das
instituições.

Resolução CNS n. 251, de 7 de agosto de 1997

Aprova normas de pesquisa envolvendo seres humanos para a área


temática de pesquisa com novos fármacos, medicamentos, vacinas e
testes diagnóstico.

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Bioética

Resolução CNS n. 292, de 8 de julho de 1999

Pesquisas coordenadas do exterior ou com participação estrangeira


e pesquisas que envolvam remessa de material biológico para o
exterior.

Resolução n. 301, de 16 de março de 2000

Contempla o posicionamento do CNS e CONEP contrário a


modificações da Declaração de Helsinque.

Resolução CNS n. 303, de 6 de junho de 2000

Reprodução humana.

Resolução CNS n. 304, de 9 de agosto de 2000

Populações indígenas. Resolução CNS n. 340, de 8 de julho de 2004


– Diretrizes para a Análise Ética e Tramitação do Projetos de Pesquisa
da Área Temática Especial de Genética humana.

Resolução CNS n. 346, de 13 de janeiro de 2005

tramitação de projetos de pesquisa multicêntricos no sistema


Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) e (CONEP).

Resolução CNS n. 347, de 13 de janeiro de 2005

Aprova as diretrizes para análise ética de projetos de pesquisa


que envolva armazenamento de materiais ou uso de materiais
armazenados em pesquisas anteriores.

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Bioética

Resolução CNS n. 370, de 8 de março de 2007

O registro e credenciamento ou renovação de registro e


credenciamento do CEP.

Resolução CNS n.404, de 1 de agosto de 2008

Declaração de Helsinque.

Resolução CNS n.421, de 18 de junho de 2009

Reestrutura a composição da Comissão Nacional de Ética em


Pesquisa – CONEP.

Por mais de uma década a resolução196/96 do Conselho Nacional de Saúde


(CSN) foi o Norte para a bioética na saúde e condução de ensaios clínicos no
Brasil. Porém em 12 de setembro de 2011, por meio de coletas de sugestões via
eletrônica e correios a resolução sofreu modificações. As sugestões em ques-
tão foram submetidas a uma análise técnica no Encontro Nacional dos Comitês
de Ética em pesquisa (ENCEP), que posteriormente enviaram suas considera-
ções ao CSN. O Conselho Nacional de Saúde, em reunião em plenário, decidiu
pela revogação das resoluções 196/96, 303/2000 e 404/2008. Isso ocorreu no
dia 12 de setembro de 2012. Todas as resoluções revogadas foram substituídas
pela nova resolução n.466, que entrou em vigor a partir de 13 de junho de 2013.
O recente documento tem um caráter mais ético pois leva em consideração
os princípios básicos da bioética como o respeito a autonomia, justiça, benefi-
cência e não maleficência. Com isso deu-se a entender e a garantir os deveres
que a comunidade científica tem para com a sociedade e com os participan-
tes de pesquisa.

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Bioética

2.4 BIOÉTICA E PESQUISA COM ANIMAIS

2.4.1 CONTEXTO HISTÓRICO


Investigações na área da saúde tem embasamento teórico nos pensamen-
tos de Hipócrates (450 a.C.), Aristóteles (384-322 a.C.) e Galeno (201-131 a.C.)
precursores da análise entre órgão de humanos e animais. Talvez a primeira
pesquisa científica foi desenvolvida por William Harvey publicada em 1638
que diz respeito a circulação sanguínea em mais de 80 espécies (RAYMUN-
DO; GOLDIM, 2006).

BUSTO DE ARISTÓTELES

Fonte: Wikicommons (2020).

#PraCegoVer: Cópia romana do busto de Aristóteles esculpido por Líspio, artista grego do
século IV a.C.

A utilização de modelos animais na ciência possibilitou muitos avanços na


área biomédica. Por muitos anos pouco se questionou sobre a ética em ex-
perimentação animal, que até então eram usados de forma indiscriminada.
No século XIX surgiram os primeiros movimentos organizados em favor dos
direitos dos animais. A Inglaterra foi pioneira em regulamentar o uso de ani-
mais em pesquisas científicas (RAYMUNDO; GOLDIM, 2006). O conhecido
British Cruelty Animal Act, que ocorreu em 1876, resultou em uma emenda
complementar na Lei relacionada a crueldade aos animais, incluindo o capí-
tulo 77, que regulamentava os aspectos éticos a serem considerado na utili-

MULTIVIX EAD
39 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

zação de animais para a experimentação médica, fisiológica ou científica. O


trecho da lei britânica pode ser observado na figura a seguir:

BRITISH CRUELTY ANIMAL ACT

Fonte: UK Public General Acts (1876).

#PraCegoVer: Imagem do capítulo 77 da lei sobre crueldade aos animais que


regulamentava os aspectos éticos a serem considerado na utilização de animais para a
experimentação médica, fisiológica ou científica.

O princípio dos 3Rs (do inglês: Replacement, Reduction and Refinement),


criado por Russell and Burch em 1959 tem como premissa uma pesquisa hu-
manitária para os animais. Com o passar dos anos, estes princípios foram in-
corporados em algumas leis que regulamentam a utilização de animais para
pesquisa científica. Os princípios dos 3Rs são a substituição, redução e refina-
mento, e as suas definições podem ser observadas a seguir.

1 Replacement

Pode ser traduzido como substituição. Propor uma alternativa a


experimentação animal, ou seja, se houver possibilidade substituir o
uso de animais por outra ferramenta.

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Bioética

2 Reduction

sendo traduzido como redução. O pesquisador deve utilizar um


método que reduza o número de animais usados em experimentos ou
pesquisas, permitindo, porém, que permita os pesquisadores obter um
nível comparável de informações de um número menor de animais.

3 Refinement

com tradução literal para refinamento. Métodos para minimizar a


dor, tortura, sofrimento ou danos duradouros que um animal pode
sofrer. O refinamento se aplica a todos os aspectos do uso de animais,
incluindo alojamento e criação para procedimentos científicos.
Exemplos perfeitos incluem o uso de anestésicos e analgésicos
adequados para evitar o estresse.

A discussão sobre o uso de animais em experimentação volta em 1975 quando


Peter Singer publica o livro Animal Libertation. O autor cita que a justificativa
dos que utilizam animais em pesquisa e dos que aceitam essa prática consis-
te que os resultados provenientes de um estudo podem auxiliar no avanço e
entendimento das questões humanas.

PETER SINGER

Fonte: Wikicommons (2020).

#PraCegoVer: Fotografia do filósofo e autor da obra Animal Libertation.

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41 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

2.4.2 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


No Brasil não havia legislação específica que tratasse da experimentação com
animal. A primeira norma brasileira sobre animais foi o Decreto n. 16.590, de
1924, baseado nas normas de países europeus.
A primeira lei brasileira a tratar de experimentação animal, Lei n. 6.638 foi pu-
blicada em 1979 e estabeleceu normas para a prática de ensino e científica da
dissecação de animal vivo. Biotérios e centros de experiências deveriam ser re-
gistrados. No entanto, apesar de previsão de regulamentação em 90 dias pelo
Poder Executivo, que não ocorreu, o que resultou na não efetividade da norma.
A Constituição Federal da República Federativa do B rasil 1988 tem seu
fundamento na dignidade da pessoa humana, trazendo como direito difuso
o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Especificamente o artigo 225,
§1º, V I I dispõe que todos t êm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. E para assegurar a efetivi-
dade desse direito incumbe ao Poder Público, proteger a fauna e a flora, ve-
dadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológi-
ca, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.

Para entender melhor como os cientistas aplicam


a ética na experimentação animal, assista ao vídeo,
clicando aqui.

Somente após 10 anos da promulgação da constituição de 88 foi publicada


a Lei de Crime Ambiental (Lei n. 9.605/98) que trouxe como causa de agrava-
mento de pena se o crime for praticado com emprego de métodos cruéis para
abate ou captura de animais. Criminalizando por meio dos artigos 31 e 32 as
condutas: introduzir espécimes no País sem parecer técnico e licença; praticar
abuso, maus tratos, experiência dolorosa ou cruel em animais vivos, ainda que
para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.

MULTIVIX EAD
Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 42
Bioética

O marco regulatório da experimentação


animal no Brasil aconteceu com a pu-
blicação da lei Arouca (n. 11.794/2008),
que regulamentou o inciso VII do §1º do
Art. 225 da Constituição Federal. Essa
lei estabeleceu os procedimentos para
Saiba Mais uso científico de animais em atividade
de ensino e pesquisa. Além disso, criou
Quer saber mais sobre a lei n.
9.605/98? Basta acessar o link o Conselho Nacional de Controle de Ex-
disponível aqui. perimentação Animal (CONCEA) e as
Comissões de Ética no Uso de Animais
(CEUAs). Os direitos e deveres das Co-
missões de Ética em animais está deter-
minado no artigo 5º da lei Arouca, con-
forme descrito a seguir.

Formular e zelar pelo cumprimento das normas relativas à utilização


humanitária de animais com finalidade de ensino e pesquisa
científica;

II

Credenciar instituições para criação ou utilização de animais em


ensino e pesquisa científica;

III

Monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que


substituam a utilização de animais em ensino e pesquisa;

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43 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

IV

Estabelecer e rever, periodicamente, as normas para uso e cuidados


com animais para ensino e pesquisa, em consonância com as
convenções internacionais das quais o Brasil seja signatário;

Estabelecer e rever, periodicamente, normas técnicas para instalação


e funcionamento de centros de criação, de biotérios e de laboratórios
de experimentação animal, bem como sobre as condições de trabalho
em tais instalações;

VI

Estabelecer e rever, periodicamente, normas para credenciamento de


instituições que criem ou utilizem animais para ensino e pesquisa;

VII

Manter cadastro atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa


realizados ou em andamento no País, assim como dos pesquisadores,
a partir de informações remetidas pelas Comissões de Ética no Uso de
Animais (CEUAs), de que trata o art. 8o desta Lei;

VIII

Apreciar e decidir recursos interpostos contra decisões das CEUAs;

IX

Elaborar e submeter ao Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia,


para aprovação, o seu regimento interno;

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 44
Bioética

Assessorar o Poder Executivo a respeito das atividades de ensino e


pesquisa tratadas nesta Lei.

CONCLUSÃO

A partir da leitura proposta e levando em consideração todo o conteúdo dis-


cutido, pode-se concluir que o respeito à vida e o respeito às pessoas devem
prevalecer em todas as esferas, e as pesquisas científicas envolvendo seres
humanos devem basear-se na justiça. Isso também é benéfico porque é in-
justo permitir que certas categorias de pessoas (minorias étnicas, prisioneiros,
pacientes, etc.) aceitem pesquisas simplesmente por causa de sua vulnerabi-
lidade, fácil acesso ou porque são mais fáceis de manipular. O uso racional de
seres humanos para pesquisas científicas baseia-se na avaliação cuidadosa
da relação risco / benefício, que está intimamente relacionada a cada princí-
pio estudado.
Os benefícios do uso de animais em pesquisas são inegáveis. Porém, para
solucionar os problemas relacionados à condução dessas pesquisas, é eficaz
adotar e seguir os princípios éticos e, por fim, refletir sobre a validade dos re-
sultados. Combinar os três princípios “R” no estágio de planejamento da pes-
quisa animal pode disseminar melhor os padrões comportamentais dos ex-
perimentos com animais na comunidade científica e para toda a sociedade.
Cada país é responsável por regulamentar as leis que orientam o uso de ani-
mais em pesquisas, contanto que estejam em consonância com os padrões
científicos internacionais. No Brasil, a regulamentação final nessa área ainda
em fase de elaboração, o que dificulta a padronização de procedimentos e,
principalmente, retarda o cumprimento das normas (e legislações) éticas na
pesquisa animal.

MULTIVIX EAD
45 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

UNIDADE 3

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
seja capaz:

> Elucidar os aspectos


éticos e jurídicos que
envolvem as pesquisas
e a comercialização
de organismos
geneticamente
modificados.
> Compreender os
aspectos éticos e
jurídicos que envolvem a
realização de pesquisas
envolvendo a utilização
de embriões humanos
e os procedimentos de
reprodução assistida.

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46 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

3 BIOÉTICA: ORGANISMOS
GENETICAMENTE MODIFICADOS
E A REPRODUÇÃO HUMANA
ASSISTIDA

INTRODUÇÃO
Esta unidade traz uma abordagem integrada da bioética, destacando os te-
mas de organismos geneticamente modificados (OGMs) e a reprodução hu-
mana assistida. Serão apresentados os conceitos de OGMs, sua aplicação na
indústria e sociedade, bem como os dilemas éticos envolvendo os riscos de
manipulação e consumo de organismos geneticamente modificados. Para
melhor caracterizar os aspectos bioéticos envolvendo OGMs, veremos ainda a
principal legislação internacional e nacional que regula sua produção, comér-
cio e consumo.
Essa parte da disciplina também versa sobre a reprodução humana assistida
e serão apresentadas as principais técnicas amplamente utilizadas na área,
bem como os dilemas éticos que envolvem a manipulação de gametas e em-
briões, além das possibilidades que se abrem com as tecnologias inovadoras:
doação de gametas, cessão temporária de útero e seleção de embriões. Dian-
te disso, a legislação sobre o tema é fundamental para normatizar e garan-
tir procedimentos éticos e seguros. No entanto, veremos que ainda existem
poucas normas internacionais e nacionais sobre o assunto, sendo que vários
países atuam sem qualquer tipo de regulação.
Desse modo, esta unidade tem a intenção de proporcionar reflexões sobre os
aspectos bioéticos envolvendo OGMs e reprodução humana assistida. Espe-
ramos que seja possível compreender que os avanços tecnológicos trazem
conflitos éticos que devem ser amplamente discutidos e regulados, a fim de
garantir a segurança da sociedade e do meio-ambiente.

MULTIVIX EAD
Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 47
Bioética

3.1 ORGANISMOS GENETICAMENTE


MODIFICADOS (OGMS)
O advento de avanços tecnológicos em biomedicina nos séculos XX e XXI pro-
piciaram a manipulação genética e o surgimento de organismos genetica-
mente modificados, que constituem um importante campo de discussão em
bioética. Como será apresentado ao longo desta unidade, o uso da engenha-
ria genética permite a alteração do material genético em laboratório para que
organismos apresentem características de interesse, seja agronômico ou in-
dustrial. Tal manipulação genética traz riscos inerentes e, consequentemente,
dilemas bioéticos envolvendo as vantagens e desvantagens da produção e
consumo deste tipo de organismo. Por isso, diversas normas internacionais e
nacionais têm sido aprovadas, a fim de regulamentar a produção, o comércio
e o consumo de OGMs no mundo.

3.1.1 O QUE SÃO ORGANISMOS


GENETICAMENTE MODIFICADOS
Organismos geneticamente modificados (OGMs) são seres vivos, cujo mate-
rial genético (DNA ou RNA) tenha sido modificado por qualquer técnica de
engenharia genética. Os OGMs podem ser obtidos por meio da transgênese
ou transgenia, que é a manipulação genética em que uma sequência de DNA
(total ou parcial) de um organismo exógeno transferida para outro organismo
de espécie distinta do primeiro. São, portanto, variedades que tiveram seu
genoma alterado, permitindo que o organismo transgênico expresse uma ca-
racterística relevante desejada, uma vez que determinará a produção de uma
proteína nova de interesse.

Exógeno significa aquilo que é externo ao


organismo, ou seja, que se originou externamente
ao organismo. É oposto a endógeno, que significa o
que é interno ao organismo, produzido por ele.

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48 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

Organismos geneticamente modificados não são


sinônimos de transgênicos. A transgenia é uma das
técnicas de produção de OGMs, mas existem outras
técnicas, como a cisgenia, em que a transferência de
DNA ocorre entre organismos da mesma espécie.

Essa nova proteína pode conferir vantagens ao ser vivo manipulado geneti-
camente, como a expressão de características de relevante valor agronômico
ou industrial. É o caso da soja Roundup Ready, um tipo de semente de soja
que foi desenvolvida pela Monsanto na década de 1980, resistente a herbici-
das e à base de glifosato. No Brasil, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agrope-
cuária, Embrapa, destaca-se como importante local de pesquisa e produção
de OGMs na agricultura. Um exemplo é o feijão Embrapa 5.1, geneticamente
modificado para resistência ao mosaico dourado, doença que causa amarele-
cimento das folhas, nanismo e severa deformação das vagens e grãos (FARIA,
ARAGÃO, 2013; LIMA, SILVA FILHO, OLIVEIRA, 2018).
Outra aplicação relevante da transgenia é a geração de micro-organismos
geneticamente modificados para a produção de proteínas humanas de inte-
resse na indústria farmacêutica. É o caso da insulina humana recombinante,
que hoje é produzida por OGMs. Previamente ao surgimento desta tecnolo-
gia, a indústria farmacêutica utilizava pâncreas de suínos para obter a insu-
lina que era utilizada em humanos, o que levava a menor especificidade da
enzima utilizada, além de ser necessária uma quantidade enorme de órgãos
do animal para a extração da proteína. Atualmente, com o advento da en-
genharia genética, a indústria farmacêutica utiliza a bactéria Escherichia coli
geneticamente modificada com a inserção do gene da insulina humana, o
que permite a produção, em escala industrial, de insulina específica humana.
Assim, tem-se um produto mais barato e de maior eficácia.
Portanto, os OGMs são amplamente difundidos na sociedade atual, sendo
importantes mecanismos biotecnológicos para melhorar a produtividade
agrícola e industrial. Os OGMs têm permitido o desenvolvimento de plantas
resistentes a doenças e pragas, com o potencial de tornar a agricultura menos
dependente de agrotóxicos, além de permitirem a produção de proteínas de
interesse humano em escala industrial.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 49
Bioética

Soja

Roundup Ready, da Monsanto = tolerante a herbicida.

Feijão

Embrapa 5.1, da Embrapa = resistente ao vírus do mosaico dourado do


feijoeiro.

Algodão

Twinlink, da Bayer = resistente a insetos e tolerante a herbicida.

Milho

MON89034xMON88017, da Monsanto = resistente a insetos e tolerante


a herbicida.

3.1.2 DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM OS


OGMS
Desde o começo de sua comercialização, em 1996, a área global de planta-
ções transgênicas aumentou mais de cinquenta vezes, passando de 1,7 mi-
lhão de hectares cultivados em seis países para 90 milhões de hectares em
21 países em 2005 (JAMES, 2005). Além disso, são utilizados OGMs em vários
outros setores da economia, como na indústria farmacêutica e na produção
de animais geneticamente modificados em pesquisa científica. Por isso, são
levantadas diversas questões a respeito da segurança e dos possíveis riscos da
manipulação, ingestão e liberação de OGMs na natureza.
A manipulação do genoma de organismos permite o melhoramento na pro-
dução agroindustrial, a partir da inserção de proteínas de interesse humano.
Entretanto, além das novas características, os OGMs adquirem um conjunto
de novas qualidades, advindas tanto da regulação gênica, quanto dos possí-

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50 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

veis efeitos secundários da inserção de um gene exógeno no genoma de ou-


tra espécie. Dessa forma, segundo Costa e Marin (2011), os riscos do consumo
e produção de OGMs podem ser classificados em três: alimentar, ecológico e
agrotecnológico.
O risco alimentar compreende os pos-
síveis efeitos adversos da ingestão de
OGMs no organismo humano. Podem
ser efeitos imediatos, como o de pro-
teínas tóxicas produzidas pelo OGM
ou efeitos pleiotrópicos das proteínas
transgênicas no metabolismo da planta
Pleiotropia
ou, ainda, riscos mediados pela acumu-
lação de herbicidas e seus metabólitos Pleiotropia é o conjunto
de múltiplos efeitos de um
nas variedades e espécies resistentes a
gene, quando um único
herbicida (COSTA, MARIN, 2011). gene controla diversas
Em relação aos riscos ecológicos, são características do fenótipo.
aqueles que podem alterar as relações
ambientais e evolutivas naturais. Dentre
eles, tem-se a redução da diversidade das culturas de plantas, já que os OGMs
derivam de um grupo limitado de variedades parentais. Outro risco possível
é a transferência não controlada de vantagens evolutivas (como resistência
a pragas e doenças) para espécies selvagens. Isto pode ocorrer em razão de
polinização cruzada com plantas selvagens, o que pode ocasionar o declínio
da biodiversidade natural. Há ainda o risco de efeitos adversos na biodiversi-
dade em função da produção de possíveis toxinas pelo OGM, que pode afetar
espécies de insetos e a microbiota do solo, alterando a cadeia trófica. Outro
risco ecológico importante é o desenvolvimento de resistência por insetos e
bactérias às toxinas produzidas pelo OGM, em razão da pressão seletiva, o que
pode alterar o processo evolutivo natural (COSTA, MARIN, 2011).
Os riscos agrotecnológicos estão relacionados a alterações e possíveis adversi-
dades no processo produtivo utilizando OGMs. Um destes riscos é a mudança
imprevisível em propriedades e características não alvo em OGMs, devido aos
efeitos pleiotrópicos de um gene. Outro risco é a perda ou diminuição da efi-
ciência do transgênico resistente a pragas em razão do cultivo extensivo das
variedades OGMs por muitos anos (COSTA, MARIN, 2011).

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 51
Bioética

COLHEITA DE TRIGO

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer:
Imagem de uma colheitadeira acompanhada por um trator e um reboque colhendo trigo.

Portanto, a utilização de OGMs e seu consumo trazem diversos dilemas éti-


cos, devido aos riscos da manipulação genética e da seleção artificial de varie-
dades mais vantajosas aos interesses humanos.
O cultivo de OGMs suscita discussões científicas, éticas, econômicas e políti-
cas. Por um lado, ativistas e alguns cientistas afirmam que os conhecimentos
científicos sobre os impactos do uso de plantas transgênicas em larga esca-
la para o cultivo comercial são ainda insuficientes (COSTA, MARIN, 2011). Por
outro lado, grandes empresas do ramo agropecuário têm produzido diver-
sas variedades de plantas geneticamente modificadas, cada vez mais utiliza-
das no consumo humano e animal. Estas empresas afirmam que os OGMs
trazem vantagens ao produtor e/ ou consumidor, tais como menor custo de
produção, menor preço, maior valor nutricional e durabilidade do produto.
Além disso, para serem disponibilizados à sociedade, estes OGMs são rigoro-
samente avaliados quanto a sua biossegurança e potenciais riscos (OMETTO,
TOLEDO, 2004).

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52 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

3.1.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS E


INTERNACIONAIS EM RELAÇÃO AOS OGMS
As crescentes produções de organismos geneticamente modificados em todo
o mundo, bem como seu comércio internacional, têm gerado importantes dis-
cussões acerca da regulamentação mundial de sua produção e consumo. Den-
tre as diretrizes internacionais, cabe destacar o Protocolo de Cartagena sobre
biossegurança, de 2003, o qual apresenta dispositivos restritivos sobre o co-
mércio internacional de transgênicos. Dentre eles, a obrigação de procedimen-
tos específicos para a identificação, embalagem e transporte de transgênicos
e a exigência de que os países que exportarem organismos vivos modificados,
para introduzi-los no meio ambiente, deverão informar à parte compradora,
para que a primeira entrega inclua informações suficientes para que o com-
prador possa tomar as decisões adequadas. O protocolo ainda faz referência
ao princípio da precaução, considerando-o norteador para a transferência de
OGMs em situações de risco, sendo necessário aplicá-lo quando houver incer-
teza científica quanto aos danos ao meio ambiente (COSTA, MARIN, 2011).

PROTOCOLO DE CARTAGENA EM BIOSSEGURANÇA

Fonte: Convention on Biological Diversity (2000).

#PraCegoVer:
Imagem da capa de um livro, com o título à direita, em inglês: Protocolo de Cartagena em
Biossegurança da Convenção em Diversidade Biológica – textos e anexos.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 53
Bioética

No Brasil, o marco inicial da regulamentação dos organismos geneticamente


modificados foi estabelecido pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo
225 (SILVA, 2010).
Segundo o artigo 225, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988),

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de


uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
[...]
II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País
e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético;
[...]
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida
e o meio ambiente.

O tema é, ainda, regulado pela Lei de Biossegurança nº. 11.105/ 2005, que dis-
põe sobre o tratamento acerca de organismos geneticamente modificados
e derivados, estimula o avanço científico na área de biossegurança, biotec-
nologia, proteção à vida e à saúde humana, ambiental e vegetal. Além disso,
esta lei cria dois importantes órgãos: o Conselho Nacional de Biossegurança,
órgão de assessoramento superior do Presidente da República para formu-
lação e implementação da Política Nacional de Biossegurança, e a Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança, que é uma instância colegiada multidis-
ciplinar que presta apoio técnico ao governo federal (BRASIL, 2005).

O Conselho Nacional de Biossegurança reúne-se


sempre que convocado pelo Ministro de Estado
Chefe da Casa Civil da Presidência da República ou
mediante provocação da maioria de seus membros,
sendo composto pelos seguintes membros:

I.  Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presi-


dência da República, que o presidirá;
II.  Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia;
III.  Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário;

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54 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

IV.  Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e


Abastecimento;
V.  Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento;
VI.  Ministro de Estado da Justiça;
VII.  Ministro de Estado da Saúde;
VIII.  Ministro de Estado do Meio Ambiente;
IX.  Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indús-
tria e Comércio Exterior;
X.  Ministro de Estado das Relações Exteriores;
XI.  Ministro de Estado da Defesa;
XII.  Secretário Especial de Aquicultura e Pesca da
Presidência da República.

Segundo o artigo 1° da Lei de Biossegurança (BRASIL, 2005),

Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização


sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a
transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a
comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de
organismos geneticamente modificados – OGMs e seus derivados, tendo
como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança
e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a
observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.

Ainda conforme a Lei de Biossegurança, em seu artigo 2, parágrafo 3º, todos


os interessados em realizar atividade envolvendo OGMs deverão requerer au-
torização à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, que se
manifestará no prazo fixado em regulamento. A CTNBio, integrante do Minis-
tério da Ciência e Tecnologia, é instância colegiada multidisciplinar de caráter
consultivo e deliberativo para prestar apoio técnico e de assessoramento ao
Governo Federal na formulação, atualização e implementação da Política Na-
cional de Biossegurança de OGMs e seus derivados, bem como no estabeleci-
mento de normas técnicas sobre o tema. Ela é composta de membros titula-
res e suplentes, designados pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia,
sendo constituída por 27 cidadãos brasileiros de reconhecida competência
técnica, de notória atuação e saber científico (BRASIL, 2005).
Esta lei também exige que toda instituição que utilizar técnicas e métodos de
engenharia genética ou realizar pesquisas com OGM e seus derivados deverá
criar uma comissão interna de biossegurança (CIBio), além de indicar um técni-

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Bioética

co principal responsável para cada projeto específico. A lei ainda tipifica crimes
e penas envolvendo infrações e delitos em biossegurança (BRASIL, 2005).

Acesse a Lei de Biossegurança (Lei federal nº.11.105/


2005) para conhecer as normas de segurança e
mecanismos de fiscalização de atividades que
envolvam organismos geneticamente modificados
– OGM e seus derivados (BRASIL, 2005).

3.2 REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA


O avanço dos estudos em reprodução e o advento de biotecnologias aplicadas
a esta área propiciou o surgimento de diferentes técnicas de reprodução hu-
mana assistida, permitindo maiores sucessos no tratamento da infertilidade.
Por outro lado, as tecnologias inovadoras também trazem diversos dilemas
éticos que envolvem tanto a doação de gametas, as possíveis manipulações
genéticas e a seleção de embriões quanto às relações jurídicas entre o doador
e o(a) filho(a). Por isso, mecanismos regulatórios são fundamentais para nor-
matizar a utilização das técnicas de reprodução humana assistida.

3.2.1 ENTENDA O QUE É REPRODUÇÃO


HUMANA ASSISTIDA
A infertilidade é caracterizada como ausência de gravidez clínica após um
período de um ano ou mais de relações sexuais regulares e desprotegidas,
sendo que tanto fatores femininos como masculinos podem estar relaciona-
dos a ela. Para as mulheres, alguns fatores são a idade acima de 35 anos, diag-
nóstico prévio ou alta probabilidade de disfunção ovulatória (irregularidade
menstrual/ amenorreia), doença uterina, tubária, peritoneal e/ ou endome-
triose. Já para os homens, os principais fatores são relacionados a alterações
seminais (YAMAKAMI et al., 2017). Estima-se que cerca de 5 a 10% dos casais
apresentam o quadro de infertilidade e metade das células formadas pela
união do espermatozoide com o oócito perde-se e 15% evolui para aborto até
a 22a semana de gestação (COHEN; OLIVEIRA, 2020).

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56 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

FECUNDAÇÃO DE ÓVULO POR ESPERMATOZOIDE

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer:
Imagem de um óvulo sendo fecundado por um espermatozoide. O fundo é preto e os
gametas têm coloração branca.

Com o avanço da medicina, diversas técnicas surgiram para permitir a repro-


dução humana em caso de dificuldade de conceber um filho de forma na-
tural. Reprodução assistida é toda aquela em que ocorre alguma interferên-
cia médica no processo reprodutivo com o objetivo de que ocorra a gravidez
(COHEN; OLIVEIRA, 2020). Essas técnicas podem ser classificadas de baixa ou
alta complexidade. Os tratamentos de infertilidade de baixa complexidade
são aqueles nos quais a fecundação ocorre no aparelho reprodutivo feminino,
sem a necessidade de manipulação em laboratório do embrião e englobam, a
relação sexual programada e a inseminação intrauterina (IIU). A relação sexual
programada consiste na determinação, por ecografias, do melhor período do
ciclo menstrual para o casal ter relações sexuais. Este método pode ser feito
tanto no ciclo menstrual natural, quanto auxiliado por medicamentos. Neste
segundo caso, a indução da ovulação ocorre por meio de medicamentos (via
oral ou injetável), seguido de acompanhamento ultrassonográfico e orienta-
ção do período em que o casal tem maior probabilidade de gestação. Já a IIU
é o tratamento inicial para casais com subfertilidade, após um ano de tenta-
tiva sem gravidez. Seu objetivo é fazer com que os espermatozoides móveis
possam ser concentrados em um pequeno volume e depositados diretamen-
te no útero no momento da ovulação. O tratamento inicia-se com a indução
da ovulação por medicamentos, seguido do preparo do sêmen para melhorar
sua motilidade e capacidade de fertilização. Em seguida, o médico realiza a
inseminação e é feito o suporte da fase lútea pelo uso de progesterona (YA-
MAKAMI et al., 2017).

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 57
Bioética

Nos casos de maior dificuldade de con-


cepção, são utilizadas as técnicas de re-
produção assistida de alta complexida-
de. Uma destas técnicas é a Fertilização
in vitro (FIV), que consiste na estimula-
ção ovariana por medicamentos para
aumentar o número de oócitos maduros
Curiosidade recrutados em um ciclo, seguida da cap-
tação destes oócitos e obtenção dos es-
A reprodução humana
assistida teve início na permatozoides. Cerca de 3 a 4 horas após
Inglaterra, em 1978, com o a captação, os oócitos são fertilizados pe-
nascimento de Louise Brown. los espermatozoides no laboratório pelo
No Brasil, o primeiro bebê
método convencional (FIV clássica) ou
assim gerado nasceu em
1984. pela injeção intracitoplasmática de es-
permatozoides (ICSI). Na ICSI, o esperma-
tozoide é diretamente injetado dentro do
oócito, enquanto na FIV clássica o oócito e espermatozoides são colocados em
uma placa de Petri para fertilizarem sozinhos. Após a fertilização, os embriões
são congelados ou transferidos para o útero da mãe (YAMAKAMI et al., 2017).

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58 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

REPRESENTAÇÃO DA TECNOLOGIA DE FERTILIZAÇÃO IN VITRO

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: Imagem de desenho do corpo de uma mulher à esquerda, evidenciando seu


sistema reprodutivo. Há um conjunto de setas em ciclo. A primeira sai do corpo da mulher
para a direita, indicando a retirada do oócito para uma placa de Petri. Outra seta sai da
placa de Petri, indicando o procedimento de fertilização in vitro por ICSI. Em seguida, uma
seta indica a transferência do embrião de volta ao útero da mulher, à esquerda, finalizando
o ciclo.

3.2.2 OS DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM A


REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA
Com o avanço da medicina, diversas técnicas surgiram para buscar o trata-
mento para a infertilidade: fertilização in vitro, doação de gametas, útero de
aluguel, entre outras. Além das questões envolvendo possíveis manipulações
genéticas ou seleção de embriões, estes tratamentos abrem novas possibili-
dades, como a de casais homoafetivos terem filhos e a utilização de embriões
congelados e descartados em pesquisa científica. Por isso, alguns conflitos
começaram a surgir e a questionar a licitude moral e ética dos procedimen-
tos realizados.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 59
Bioética

INJEÇÃO INTRACITOPLASMÁTICA DE ESPERMATOZOIDES

Fonte: Wikipedia (2020).

#PraCegoVer: Imagem de uma agulha com espermatozoides sendo injetados diretamente


no óvulo.

Segundo Cohen e Oliveira (2020, p. 264),

Diante desse contexto, vários questionamentos surgem: o que fazer com os


embriões excedentes? É possível manipular geneticamente um embrião
para torná-lo “melhor”? Se os embriões são apenas um aglomerado de
células, é possível utilizá-los em pesquisas? Se não são, então eu os trato
como “seres humanos em potencial”? Se eu perdi um ente querido, posso
tentar trazê-lo de volta, por meio de clonagem? Se eu “emprestar” meu
útero, posso reivindicar a maternidade do bebê? Qual a idade limite para
se gerar um bebê? Posso usar o sêmen do meu companheiro falecido para
fertilização? A quem pertence os embriões congelados? Se se constata
em biópsia de embrião algum problema genético, mas compatível com a
vida, como a síndrome de Down, esse embrião pode ser descartado? Posso
selecionar o sexo do embrião?

Portanto, são diversos os questionamentos surgidos com a reprodução huma-


na assistida. Estes dilemas envolvem diversos setores da sociedade, dentre eles
a medicina, o direito e a religião. O status moral do embrião é uma das questões
primordiais relacionada à reprodução humana assistida. O momento exato em
que a vida se inicia é controverso, por isso, ainda não há consenso se o embrião
é uma vida humana e deve ser tratada como tal ou não. Este dilema esbar-
ra em questões religiosas e culturais, que são variáveis conforme a sociedade.
Para católicos e hinduístas, por exemplo, vida é a união do gameta masculino
com o feminino; enquanto o judaísmo percebe a vida quando o embrião co-
meça a adquirir formato humano; e o islamismo vê o início da vida quando “Alá”
sopra no embrião. Já para a ciência, há cerca de cinco correntes que definem a
vida e o seu início: genética, embriológica, neurológica, ecológica e metabólica.
Questões como o descarte de embriões com problemas genéticos ou a utiliza-
ção de embriões em pesquisa científica estão relacionadas ao entendimento
sobre o início da vida (COHEN; OLIVEIRA, 2020; SCHLINK, 2014).

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Bioética

EMBRIÃO HUMANO DE 10MM NA QUINTA SEMANA DE GESTAÇÃO

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: No centro da imagem há um embrião humano de 10mm. É possível observar


a coluna vertebral do embrião e sua cabeça. O fundo da imagem é avermelhado e o
embrião tem uma coloração esbranquiçada.

Outra área bastante complexa em bioética é a doação de gametas, tanto


para heterossexuais quanto em uniões homoafetivas. Casais homossexuais
femininos podem gerar filhos pela doação de sêmen, enquanto os mascu-
linos podem fazê-lo pela doação de oócitos e útero de aluguel. Este tipo de
procedimento suscita diversos questionamentos bioéticos e morais. Em re-
lação às doações de gametas, questiona-se a possibilidade de compensação
financeira, o anonimato do doador e,
ainda, o processo de seleção do doador
genético: se é desconhecido (bancos
de gametas) ou algum membro da fa-
mília ou amigo. Questionamentos re-
levantes também envolvem a escolha
da doadora de útero e se deve ocorrer
compensação financeira pela cessão
temporária do útero. Nos casos de doa-
Curiosidade
ção de gametas, questiona-se também
os possíveis vínculos advindos da rela- Existem diversos casos
de mães e parentes que
ção entre o doador e o filho (COHEN;
cedem seu útero para casais
OLIVEIRA, 2020). homoafetivos. Veja aqui um
exemplo.

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Bioética

3.2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


E INTERNACIONAIS QUE REGULAM A
REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA
Diante da falta de um consenso em relação aos problemas bioéticos que sur-
giram com a prática da reprodução assistida, foram criadas normas para guiar
os procedimentos envolvendo reprodução humana assistida por meio de leis
ou guias de referência. Tal regulamentação é importante para determinar os
tratamentos aprovados, assegurar a segurança dos pacientes e demais pesso-
as envolvidas com o tratamento, impondo limites quanto ao avanço científico.
Nesse contexto, a Austrália foi o primeiro país a propor uma legislação para
regular os procedimentos de reprodução humana assistida, em 1984. A par-
tir de 1990, inúmeras sociedades médicas e países estabeleceram diretrizes
éticas e normas, para as tecnologias reprodutivas. Em 2019, a International
Federation of Fertility Societies fez uma pesquisa sobre presença ou ausên-
cia de legislação específica para reprodução assistida envolvendo 89 países.
Dentre eles, 77 (87%) responderam que a prática de reprodução assistida era
regulada por legislação e/ ou guias de referência, 57 (64%) responderam haver
legislação em seu país que regule tecnologias de reprodução assistida e 29
(33%) responderam não existir legislação sobre o tema em seu país.

A International Federation of Fertility Societies


(IFFS) é uma federação de nações-membro que têm
interesse nos aspectos clínicos e de pesquisa em
reprodução e fertilidade. O IFFS é uma organização
não governamental (ONG), com relações oficiais
com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

No Brasil, apesar da amplitude do uso de técnicas de reprodução assistida,


não há legislação própria a respeito da matéria, apenas algumas menções
em legislações esparsas. As práticas relacionadas às novas tecnologias repro-
dutivas no país têm se pautado pelas resoluções normativas produzidas pelo
Conselho Federal de Medicina (CFM) e dirigidas prioritariamente aos médicos
(VASCONCELOS, 2014).

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Bioética

A Lei de Biossegurança nº. 11.105/2005 regulamenta um importante aspecto


acerca da possibilidade de utilização de células tronco embrionárias em pes-
quisa científica e terapia. Segundo o artigo 5° da lei nº 11.105/2005,

É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco


embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in
vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes
condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação
desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de
completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou
terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus
projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em
pesquisa. (BRASIL, 2005)

Com a pretensão de sanar as lacunas


jurídicas, o Conselho Federal de Medi-
cina (CFM) criou a regulamentação nº
2.168/2017, que define as normas éticas
para a utilização das técnicas de repro-
dução assistida, como dispositivo deon-
tológico a ser seguido pelos médicos,
Saiba Mais sempre em defesa do aperfeiçoamento
das práticas e da observância aos prin-
Para entender melhor a
importância científica das cípios éticos e bioéticos que ajudam a
pesquisas com células tronco trazer maior segurança e eficácia a tra-
embrionárias, acesse o link, tamentos e procedimentos médicos. O
clicando aqui. CFM, por meio desta resolução, conside-
ra que o avanço do conhecimento cien-
tífico permitiu o encontro de soluções para os problemas relativos à reprodu-
ção humana (VASCONCELOS, 2014).
Nesta resolução, tornou-se obrigatório o consentimento informado, em for-
mulário especial, com a concordância por escrito de todos os pacientes sub-
metidos às técnicas de reprodução assistida. Todos os aspectos médicos de-
vem ser detalhadamente expostos, bem como informações sobre dados de
caráter biológico, jurídico, ético e econômico. A resolução também proíbe a
seleção de características biológicas do filho (como o sexo), exceto quando

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Bioética

se trate de doenças. Outra importante regulamentação desta norma é o nú-


mero máximo de embriões a serem transferidos para a receptora. Mulheres
com até 35 anos podem receber até dois embriões; entre 36 e 39 anos, até três
embriões; mais de 40 anos, até quatro embriões.
A referida norma ainda reafirma o papel auxiliar e facilitador das técnicas de
reprodução humana assistida, cuja utilização é considerada legítima, já que se
apresenta como ferramenta de efetiva probabilidade de êxito (VASCONCELOS,
2014). Neste sentido, a resolução permite a utilização da reprodução assistida
para a generalidade das pessoas em sociedade: heterossexuais, homoafetivos
e transgêneros. É vedada a finalidade lucrativa ou comercial da doação de ga-
metas e embriões, que deve ser feita de forma anônima. Para a cessão tempo-
rária de útero (útero de aluguel), a norma ainda prevê que as cedentes devem
pertencer à família de um dos parceiros, sendo vedado o caráter lucrativo ou
comercial. Outra importante regulamentação desta norma é a possibilidade de
reprodução assistida post-mortem (após a morte), desde que haja prévia auto-
rização do(a) falecido(a) para uso do material biológico criopreservado.

CONCLUSÃO

Esta unidade apresentou uma reflexão sobre os aspectos bioéticos envolven-


do a manipulação genética para a criação de organismos geneticamente
modificados (OGMs) e a reprodução humana assistida. Observamos que os
avanços tecnológicos na área biomédica permitiram o surgimento de tec-
nologias inovadoras que podem trazer tanto benefícios quanto riscos para a
saúde e segurança.
É importante frisar que negar os avanços científicos e tecnológicos não os tor-
na inexistentes. O desafio é saber utilizá-los em benefício da saúde e desen-
volvimento humanos e dos demais seres vivos. A discussão do tema à luz da
bioética nos remete a muitos dilemas que ainda devem ser enfrentados pela
sociedade. Tendo em vista os aspectos aqui abordados, constata-se que a dis-
cussão acerca dos aspectos éticos e legais envolvendo engenharia genética,
OGMs e reprodução humana assistida está em processo de desenvolvimento.

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Bioética

UNIDADE 4

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
possa:

> Elucidar os
aspectos éticos
e jurídicos que
envolvem as
pesquisas e
a aplicação
terapêutica da
clonagem.
> Compreender
os aspectos
éticos e jurídicos
da realização
de pesquisas
envolvendo a
utilização dos
diferentes tipos de
células-tronco.

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Bioética

4 BIOÉTICA: CLONAGEM, CÉLULA-


TRONCO

4.1 INTRODUÇÃO
Esta unidade traz uma abordagem elucidativa sobre clonagem germinati-
va e terapêutica e células-tronco, destacando aspectos relevantes no âmbito
desses dois temas.
A primeira parte desta unidade versa sobre os conceitos e técnicas empregadas
para a realização da clonagem, tanto com objetivo reprodutivo quanto terapêu-
tico. Também abordaremos os aspectos bioéticos inerentes ao processo de clo-
nagem em animais e em humanos, salientando os riscos e benefícios potenciais
das técnicas para a saúde, bem como as questões morais e éticas que devem
ser avaliadas. Para complementar, veremos as principais normas jurídicas nacio-
nais e internacionais que regulamentam os diferentes tipos de clonagem.
Na segunda parte desta unidade, veremos os principais tipos de células-tron-
co – embrionárias e adultas, assim como suas potenciais aplicações em te-
rapias e medicina. Abordaremos os diversos dilemas bioéticos e polêmicas
envolvendo as pesquisas com células-tronco embrionárias, como o conceito
de vida e o status jurídico do embrião. Diante dos conflitos éticos, ainda vere-
mos as principais legislações mundiais e nacionais acerca das permissões e
regulação do uso de embriões em pesquisa.

4.2 CLONAGEM GERMINATIVA E TERAPÊUTICA


Os avanços tecnológicos em biotecnologia propiciaram o surgimento de téc-
nicas inovadoras como a clonagem, que é um mecanismo para produzir indi-
víduos geneticamente idênticos ao progenitor.
Esta técnica pode ser utilizada com a finalidade reprodutiva, para gerar uma
prole idêntica ao doador, como é o caso da ovelha Dolly, primeiro mamífero
clonado do mundo ou, ainda, a técnica pode ter finalidade terapêutica, em
que as células-tronco do “embrião” gerado por clonagem podem ser utiliza-
das para a geração de tecidos e órgãos em laboratório.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 66
Bioética

Em todos os casos, surgem dilemas éticos inerentes ao processo de clona-


gem, como: o que fazer com os clones que apresentarem defeitos? Quem
são os pais do indivíduo clonado? Como selecionar quem será clonado? Estas
e outras questões pertinentes levantam debates. Por isso, diversas normas
foram criadas, tanto em âmbito internacional quanto nacionalmente, para re-
gulamentar o tema.

OVELHA DOLLY EMPALHADA NO ROYAL MUSEUM OF SCOTLAND, EM EDIMBURGO,


ESCÓCIA.

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma ovelha branca empalhada em uma redoma de vidro.

4.2.1 O QUE É CLONAGEM?


Clonagem é um mecanismo por meio do qual são produzidos seres genetica-
mente idênticos a seus progenitores, sendo um processo comum de propaga-
ção de espécie em plantas e bactérias (reprodução assexuada). Portanto, um
clone é um indivíduo que se origina de um organismo, idêntico a ele. Em huma-
nos, o único caso de clones naturais são os gêmeos idênticos (univitelinos), que
se originam do mesmo zigoto e, por isso, têm o mesmo genótipo (ZATZ, 2004).

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Bioética

No século XX, com o advento de tecnologias inovadoras em biomedicina, tor-


nou-se possível, em laboratório, clonar um mamífero, a ovelha Dolly, a partir
de células somáticas diferenciadas, o que abriu um caminho para a possibili-
dade de clonagem em humanos, já que a técnica permitiu a reprogramação
de uma célula já diferenciada.
A clonagem em laboratório pode ser feita, basicamente, de duas formas: se-
parando-se as células de um embrião em seu estágio inicial de multiplicação
celular ou pela substituição do núcleo de um óvulo por outro proveniente de
uma célula de um indivíduo já existente. O primeiro processo é semelhante
àquele que ocorre naturalmente em gêmeos univitelinos, que têm origem
em um mesmo zigoto (SCHLINK, 2014).
A segunda forma de clonagem é deno-
minada clonagem reprodutiva e, nesta
técnica, é feita a transferência do núcleo
de uma célula somática de um indivíduo
para um óvulo enucleado (seu núcleo é
previamente retirado). Em seguida, esta
célula começa a se comportar como um Para saber
óvulo recém-fecundado por um esper- Com exceção das
matozoide, sendo transferido para um células sexuais (oócito
e espermatozoide), que
útero para se desenvolver. Temos, então,
apresentam 23 cromossomos,
um indivíduo com o mesmo genótipo a espécie humana
e as mesmas características físicas do compreende 23 pares de
doador da célula somática. É como um cromossomos (46 no total)
em cada uma de suas
gêmeo idêntico nascido posteriormen-
células. Estas células, com 46
te. Esta é a técnica que foi utilizada para cromossomos, são chamadas
clonar a ovelha Dolly, em 1996 (SCHLINK, células somáticas.
2014; ZATZ, 2004).
No entanto, esta técnica é extremamente complexa e apresenta baixas ta-
xas de sucesso. A Dolly só nasceu depois de 276 tentativas que fracassaram.
Posteriormente, outras tentativas de clonagem usando diferentes mamíferos,
como camundongos, porcos e bezerros também demonstraram baixas taxas
de sucesso. Além disso, observou-se que os poucos animais clonados apre-
sentavam diversos tipos de anormalidades e defeitos de saúde, como proble-
mas cardíacos e imunológicos (ZATZ, 2004).

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Bioética

O primeiro clone brasileiro gerado a partir de células


de um animal adulto foi a Penta, uma bezerra
produzida por pesquisadores da Unesp, em 2002.
Penta morreu com pouco mais de um mês de idade.

Por outro lado, uma importante aplicação da clonagem em medicina é a cha-


mada clonagem terapêutica. Nesta técnica, o óvulo enucleado recebe o nú-
cleo de uma célula somática de um indivíduo e é estimulado em laboratório
para formar um “embrião”. Neste caso, o embrião não é implantado em um
útero com objetivo reprodutivo, mas cultivado em laboratório para dar ori-
gem a células-tronco embrionárias que poderão ser usadas em terapias.
Estas células indiferenciadas podem fabricar diferentes tecidos e órgãos, que po-
dem ser usados em transplantes e terapias, com a vantagem de evitar rejeição,
já que o doador do núcleo da célula é a própria pessoa. Um exemplo seria substi-
tuir o tecido cardíaco de uma pessoa que sofreu infarto, com o tecido produzido
em laboratório a partir de células somáticas da própria pessoa (ZATZ, 2004).

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Bioética

DIAGRAMA DEMONSTRANDO O PROCEDIMENTO DE CLONAGEM REPRODUTIVA E


TERAPÊUTICA

Fonte: Wikimedia Commons (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há um diagrama com setas mostrando o processo de clonagem.


À esquerda, são observadas duas células: a doadora e o óvulo. Setas para a direita indicam
a remoção do núcleo das duas células. A seta seguinte indica uma célula, demonstrando
que o núcleo da célula doadora foi introduzido no óvulo. Outra seta para a direita aponta
para um aglomerado de células, com a inscrição clone. Abaixo deste diagrama, observa-se
a indicação dos dois tipos de clonagem: a reprodutiva, com uma seta para a direita saindo
do aglomerado de células e indicando o termo barriga de aluguel; e terapêutica, com
uma seta para a direita saindo do aglomerado de células e indicando um conjunto destas
células separadas umas das outras. A seta seguinte indica o termo cultura celular.

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Bioética

4.2.2 DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM OS


DIFERENTES TIPOS DE CLONAGEM
A clonagem é uma técnica inovadora em biotecnologia que, inerentemente,
traz diversos dilemas éticos e morais que devem ser analisados. Conforme
apresentado anteriormente, a clonagem pode ter diferentes objetivos: repro-
dutivo ou terapêutico e cada um deles deve ser discutido separadamente à
luz da bioética (SILVA, 2010).
Quanto à clonagem reprodutiva, é possível observar que, além de ser pouco
eficiente, com baixas taxas de sucesso, também traz inúmeras anomalias e
defeitos aos animais clonados. Por outro lado, experiências com clonagem
têm ensinado muito acerca do funcionamento celular, sendo de grande be-
nefício para a geração de conhecimento científico (ZATZ, 2004).
Já a clonagem terapêutica, mostra-se
com importante potencial para o trata-
mento de doenças e transplantes de ór-
gãos ou tecidos defeituosos. Esta clona-
gem pode ser equiparada a uma cultura
de células, sem fins reprodutivos. Neste
Saiba mais
caso, o embrião não é implantado no úte-
ro e não há geração de um novo indivíduo, Diversos animais foram
clonados no mundo e a maior
apenas de células. Além disso, o potencial
parte deles desenvolveu
de utilização dos tecidos para tratar inú- anomalias e defeitos de
meras doenças e melhorar a qualidade saúde. A ovelha Dolly sofria
de vida das pessoas torna a discussão éti- de uma doença pulmonar
progressiva e foi abatida
ca mais favorável à técnica (ZATZ, 2004).
em fevereiro de 2003, aos
Entretanto, mesmo a utilização da clona- 6 anos e meio. Além disso,
gem terapêutica traz questionamentos foram observados defeitos
cardíacos em porcos
éticos. Discute-se a validade da geração clonados, placentas anormais
de um novo ser para salvar outros, dian- em ovelhas e gado, além de
te da utilização da clonagem para gerar problemas imunológicos em
um embrião que doará o tecido para o carneiros.
tratamento de pessoas já nascidas. Se-
ria válido sacrificar uma vida para salvar outra? Neste caso, parece haver um
reconhecimento de que existe uma dignidade crescente com o desenvolvi-
mento da pessoa, sendo que um ser humano adulto tem sua dignidade ple-

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71 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

na em relação a um embrião clonado em laboratório que nem mesmo será


implantado para nascer (SCHLINK, 2014).
Ademais, a simples possibilidade de clonar humanos suscita discussões éti-
cas envolvendo aspectos morais, religiosos e sociais. Questiona-se diversos fa-
tores advindos da técnica, como: quem será o pai ou a mãe do clone? Quem
deve ser clonado? Quais os critérios? O que fazer com os clones que nascerem
defeituosos? (ZATZ, 2004)

Em 2018, na China, foram clonados os primeiros


primatas do mundo pela técnica de substituição do
núcleo de um óvulo por outro proveniente de uma
célula de um indivíduo já existente. Os macacos
clonados, Zhong Zhong e Hua Hua, tornam a
possibilidade da clonagem de humanos mais
próxima da realidade. Saiba mais, clicando aqui.

Segundo Cohen e Oliveira (2020, p. 342 - 343),

Percebemos que a Bioética surgiu da necessidade de compreender e


repensar os “sintomas” da sociedade moderna. A reflexão bioética surgiu por
meio da percepção das mudanças das relações psicossociais ocasionadas
pelos grandes avanços científicos e tecnológicos, fazendo renascer o conflito
entre ciências biológicas e as ciências humanas. Isso pode ser observado,
atualmente, quando se relaciona a Bioética à reflexão sobre temas como
eutanásia, aborto, reprodução assistida, clonagem e terapias gênicas.
Tais temas provocam conflitos em valores preestabelecidos socialmente,
com mudanças bruscas, como nas definições de vida, saúde e morte. Tais
valores, por serem novos, necessitam da criação de parâmetros para serem
incorporados à vida social e em uma elaboração individual.

Portanto, a clonagem é uma técnica que traz diversos riscos e polêmicas, es-
pecialmente conflituosos, além de importantes definições sociais, como os
conceitos de vida e morte. Por isso, é necessária uma ampla avaliação com
diferentes setores da sociedade e comunidade científica para a definição dos
parâmetros ética e moralmente aceitáveis em clonagem, tanto reprodutiva
quanto terapêutica.

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Bioética

1 Ovelha

Dolly (1996), Escócia.

2 Camundongo

Cumulina (1997), Estados Unidos.

3 Gado

Noto e Kaga (1998), Japão.

4 Cabra

Mira (1998), Estados Unidos.

5 Gato

Copy cat (2001), Estados Unidos.

6 Cavalo

Prometea (2003), Itália.

4.2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


E INTERNACIONAIS EM RELAÇÃO AOS
DIFERENTES TIPOS DE CLONAGEM
Ainda de acordo com Cohen e Oliveira (2020, p. 83),

O Direito, como a ciência que deve regulamentar a vida em sociedade


por meio de normas, é chamado a buscar soluções para novos desafios
apresentados pelo avanço da tecnologia aplicada à vida humana e a todos
os seres da natureza. Tornaram-se bastante conhecidos temas como células-

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Bioética

tronco embrionárias, técnicas de reprodução assistida, clonagem reprodutiva


ou terapêutica, aconselhamento genético, bancos de material biológico
humano, de DNA e cordão umbilical, genoma humano, terminalidade da
vida e melhoramento da pessoa, para citar os mais comuns. Entretanto, o
Direito não conseguirá apresentar respostas satisfatórias se não recorrer à
interdisciplinaridade, em que a Bioética tem um papel fundamental. Somente
um diálogo entre os vários profissionais facilitará a busca por parâmetros.

Em face dos dilemas éticos envolvendo a clonagem, as regras e normas jurídi-


cas são importantes para regulamentar as técnicas permitidas e o controle de
riscos. Para tanto, a bioética é fundamental como ciência de reflexão, a fim de
analisar todos os aspectos técnicos, morais e sociais advindos da clonagem.
Com o surgimento de biotecnologias inovadoras e a clonagem bem-sucedida
da ovelha Dolly, a comunidade científica internacional voltou-se para a análi-
se dos riscos e polêmicas envolvendo a possibilidade da clonagem humana à
luz da bioética.
Neste momento, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ci-
ência e a Cultura (Unesco) adotou a Declaração Universal sobre o Genoma
Humano e os Direitos Humanos, em 1997. É um texto abrangente, que trata
de questões polêmicas, tanto de Bioética quanto para uma abordagem de
Direitos Humanos, tais como: manipulação do genoma humano, clonagem
humana e transgênicos, assim como aponta princípios e valores intangíveis.
Outro importante regramento é a Declaração Internacional sobre os Dados
Genéticos Humanos, da Unesco, de 2004. Esta norma visa garantir o respei-
to da dignidade humana e a proteção dos Direitos Humanos e das liberda-
des fundamentais em matéria de recolha, tratamento, utilização e conserva-
ção de dados genéticos humanos, em conformidade com os imperativos de
igualdade, justiça e solidariedade (COHEN, OLIVEIRA, 2020).

Genoma é toda a informação genética hereditária


de um ser vivo, codificada em DNA ou RNA. Em
seres humanos, corresponde aos 22 pares de
cromossomos autossomos e aos 02 cromossomos
sexuais (X e Y), presentes no núcleo de todas nossas
células somáticas.

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Bioética

No Brasil, a Lei de Biossegurança, lei nº 11.105/2005, normatiza alguns aspec-


tos envolvidos no procedimento de clonagem e, em seu artigo 6°, proíbe a
clonagem e manipulação genética em célula germinativa, zigoto ou embrião
humano. Esta lei ainda tipifica o crime de realizar clonagem humana, com a
pena de reclusão de dois a cinco anos e multa (SCHLINK, 2014).
Há ainda a instrução normativa nº 08/97 do CTNBio (Comissão Técnica Nacio-
nal de Biossegurança, do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Co-
municações), que dispõe sobre a manipulação genética e clonagem em seres
humanos. A norma também veda taxativamente a manipulação genética de
células germinativas ou células totipotentes, bem como experimentos envol-
vendo qualquer técnica de clonagem em humanos (BRASIL, 1997).

4.3 CÉLULAS-TRONCO
Células-tronco são células indiferenciadas que têm o potencial de especializar-
-se em diversas células de diferentes tecidos. Podem ser embrionárias, aque-
las presentes no embrião ao longo do desenvolvimento, ou adultas, aquelas
que existem nos tecidos para garantir sua renovação celular. Em razão de sua
indiferenciação, estas células apresentam um enorme potencial em medici-
na para ser utilizadas em terapias de regeneração tecidual de órgãos danifi-
cados ou transplantes. Entretanto, diversos dilemas éticos são enfrentados
na utilização de células-tronco em pesquisa, especialmente as embrionárias.
Estes dilemas envolvem questões éticas, filosóficas, científicas e religiosas de
alta complexidade, como o momento de surgimento da vida e a dignidade e
proteção do embrião. Para regular estes aspectos éticos e morais, diversos paí-
ses criaram normas acerca do tema. No Brasil, a Lei de Biossegurança permite
a pesquisa com células-tronco embrionárias, desde que sejam obtidas de em-
briões inviáveis ou descartados, sempre com o consentimento dos genitores.

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75 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

CÉLULAS-TRONCO EMBRIONÁRIAS DE CAMUNDONGO

Fonte: Wikimedia Commons (2021).

#PraCegoVer: A imagem é uma micrografia de células-tronco embrionárias de camundongo.


As células-tronco são arredondadas e estão marcadas em verde, com fundo cinza.

4.3.1 ENTENDA O QUE SÃO AS CÉLULAS-


TRONCO E AS SUAS APLICAÇÕES
As células-tronco são células indiferenciadas que ainda não possuem uma
especialização e têm o potencial de diferenciar-se em diversas outras célu-
las do organismo. Existem três tipos principais de células-tronco: totipotentes,
pluripotentes e multipotentes.

•  As totipotentes são as células presentes no embrião logo após a fecundação


até a fase de oito células. Nesta fase, cada uma dessas células é capaz de se
desenvolver em um ser humano completo;

•  As células pluripotentes também são embrionárias, mas em uma etapa


posterior do desenvolvimento, consistindo das células que compõem a massa
celular interna do blastocisto. Por serem diferenciadas das totipotentes,
as pluripotentes são menos versáteis, apresentando menor potencial de
diferenciação;

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Bioética

•  Já as células multipotentes, são aquelas presentes no indivíduo adulto,


sendo responsáveis pela renovação celular dos tecidos e encontradas em
todos os tecidos, principalmente naqueles com maior renovação, como a
medula óssea. Estas células podem se dividir para autorrenovar e manter as
nossas células ao longo da vida, como podem se diferenciar e formar células
específicas daquele tecido. As células multipotentes apresentam menor
capacidade de diferenciação que as demais.

ESQUEMA BÁSICO DAS PRIMEIRAS ETAPAS DA MATURAÇÃO DO OVÓCITO HUMANO, A


FERTILIZAÇÃO E A NIDAÇÃO.

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há um desenho de parte do sistema reprodutor feminino:


um ovário, tuba uterina e útero. O esquema mostra as etapas iniciais da fertilização e
implantação do embrião. Saindo do ovário, há um ovócito e, abaixo dele está escrito
ovulação. Na tuba uterina, há desenhos de espermatozóides e um deles se encontra
dentro do ovócito. Mais à direita, fora da tuba uterina está escrito 1° dia e na tuba uterina
está escrito primeira clivagem. Em seguida, à direita, está escrito 2°, 3° e 4° dias e indicados
os estágios de 2, 4 e 8 células, com o desenho do respectivo embrião. Já no útero, está
escrito 4° dia, com o desenho do zigoto com inúmeros células dentro, onde está escrito
mórula. Mais abaixo, no útero, há o escrito 5° dia e o desenho do embrião em blastocisto.
Abaixo, há as indicações de 6° a 9° dias e a implantação do zigoto na parede do útero. O
zigoto é uma esfera que faz contato com o útero.

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Bioética

Devido a sua capacidade diferenciativa, os diferentes tipos de células-tronco


apresentam enorme potencial para uso em terapias e tratamento de doen-
ças. O advento de tecnologias em ciências biomédicas permitiu o entendi-
mento do processo de diferenciação celular e a possibilidade de manipulação
de células-tronco em laboratório para estimular a sua diferenciação em célu-
las específicas de interesse. As pesquisas com células-tronco visam encontrar
maneiras de tratar ou reverter algumas doenças e desenvolver terapias que
retardem processos degenerativos.
As células-tronco de indivíduos adultos podem ser utilizadas em técnicas de
autotransplante, em que as células indiferenciadas retiradas do próprio indi-
víduo podem ser utilizadas para reconstituir seus órgãos danificados e assim
evitar rejeições.
Pesquisas recentes mostraram que células-tronco retiradas da medula de in-
divíduos com problemas cardíacos foram capazes de reconstituir o músculo
do seu coração, o que abre perspectivas de tratamento para pessoas com
problemas cardíacos. Há ainda a possibilidade do uso de células-tronco do
cordão umbilical e da placenta, que são ricos neste tipo celular. Pesquisas re-
centes demonstraram que o sangue do cordão umbilical é o melhor material
para substituir a medula em casos de leucemia (ZATZ, 2004).
Já as células-tronco embrionárias, por apresentarem maior indiferenciação,
têm inúmeros potenciais terapêuticos. As células totipotentes e multipoten-
tes podem ser estimuladas em laboratório a diferenciarem-se em tecidos e
órgãos para transplante. Além disso, estas células têm um importante poten-
cial de utilização na regeneração de tecidos e órgãos danificados.
Por outro lado, alguns riscos na terapêutica com células-tronco ainda devem
ser estudados e avaliados. Um deles, é a possibilidade de geração de tumores,
já que estas células têm um grande potencial de autorrenovação, sendo alvos
susceptíveis de carcinogênese. Outro risco advindo do uso de células-tronco
são as alterações cromossômicas, tanto em células-tronco adultas quanto nas
embrionárias (BARBOSA et al., 2003).

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Bioética

EMBRIÃO DE 8 CÉLULAS

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma micrografia de um embrião com oito células. O embrião


é uma esfera com várias esferas menores dentro. O embrião aparece em imagem negativa,
sem coloração e o fundo da imagem é cinza.

4.3.2 OS DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM A


UTILIZAÇÃO DAS CÉLULAS-TRONCO
Apesar das inúmeras aplicações potenciais e benefícios advindos da utilização
de células-tronco, tanto adultas quanto embrionárias, diversos dilemas éticos en-
volvem a técnica. Neste sentido, não apenas aspectos técnicos e científicos são
questionados, mas também valores e crenças, o que potencializa o grau de di-
vergências, não apenas no âmbito acadêmico, mas na sociedade como um todo.
Quando se questiona o uso de células-tronco embrionárias, o principal dile-
ma ético envolve o conceito de vida humana.
Para a bioética, o respeito à vida humana é fundamental. Mas o que é vida
humana? Em que momento ela se inicia? Este conceito é variável conforme
aspectos científicos, religiosos, sociais e culturais. É possível considerar que a
vida se inicia no momento da fecundação, sendo o primeiro estágio do de-
senvolvimento humano. Neste caso, o embrião, mesmo o de oito células, já
seria considerado vida humana, com todos os seus direitos e garantias de
dignidade e proteção. Por outro lado, diferentes religiões consideram que a
vida só se inicia posteriormente no desenvolvimento embrionário, quando,
por exemplo, o embrião adquire formato humano. Neste segundo caso, a uti-
lização de embriões ainda no estágio inicial do desenvolvimento embrionário
seria menos condenável do ponto de vista moral.

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Bioética

EMBRIÃO HUMANO MASCULINO, DE SETE SEMANAS DE IDADE OU NOVE SEMANAS DE


IDADE GESTACIONAL.

Fonte: Wikipedia (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há um embrião humano de sete semanas de idade. Ele tem


coloração amarelada e está de lado, com o cordão umbilical à mostra e apresenta os
quatro membros: dois braços, duas pernas e, na cabeça, é possível ver um olho, uma
orelha, o nariz e a boca. Ao lado da imagem há uma régua, indicando que o
embrião tem cerca de 1,5cm.

Um argumento relevante na avaliação bioética da aceitação das pesquisas


com células-tronco embrionárias diz respeito ao valor dado a uma vida em
potencial, em detrimento de utilizá-la para salvar diversas vidas já existentes.
Neste aspecto, segundo Zatz (2004, p. 9):

Sabemos que 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e que são
inseridos em um útero, nas melhores condições, não geram vida. Além disso,
um trabalho recente (Mitalipova et al., 2003) mostrou que células obtidas de
embriões de má qualidade, que não teriam potencial para gerar uma vida,
mantêm a capacidade de gerar linhagens de células-tronco embrionárias e,
portanto, de gerar tecidos. Em resumo, é justo deixar morrer uma criança ou
um jovem afetado por uma doença neuromuscular letal para preservar um
embrião cujo destino é o lixo? Um embrião que, mesmo que fosse implantado
em um útero, teria um potencial baixíssimo de gerar um indivíduo? Ao
usar células-tronco embrionárias para regenerar tecidos em uma pessoa
condenada por uma doença letal, não estamos, na realidade, criando vida?
Isso não é comparável ao que se faz hoje em transplante quando se retiram
os órgãos de uma pessoa com morte cerebral (mas que poderia permanecer
em vida vegetativa).

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Bioética

Portanto, há que se ponderar os enormes potenciais terapêuticos advindos


do uso de células-tronco embrionárias frente aos aspectos éticos envolvidos
no descarte de embriões humanos. Para isso, faz-se necessária uma reavalia-
ção ética na sociedade, a fim de garantir que pessoas com problemas de saú-
de não sejam privadas de potenciais tratamentos, ao mesmo tempo em que
as técnicas de manipulação de embriões sejam altamente reguladas, levando
em consideração aspectos éticos e morais.

No Brasil, existe a Rede Nacional de Terapia


Celular (RNTC), formada por oito Centros de
Tecnologia Celular, em 52 laboratórios. A RNTC
tem como objetivo aumentar a integração entre
os pesquisadores do Brasil que trabalham com
células-tronco, propiciando a troca de informações
e tecnologias. Saiba mais, clicando aqui.

Quando se trata de usar células-tronco de indivíduo adulto, os aspectos éticos


e morais parecem menos questionáveis, já que constituem células de um or-
ganismo e não um embrião com potencial de gerar uma nova vida. Por outro
lado, a técnica envolve riscos inerentes para o organismo, como o desenvolvi-
mento de tumores, que também devem ser analisados quando da aceitação
e da definição de limites para seu uso em humanos (FRANÇA et al., 2017).

4.3.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


E INTERNACIONAIS QUE REGULAM AS
ATIVIDADES COM CÉLULAS-TRONCO
Apesar das inúmeras aplicações potenciais das células-tronco em terapias
e dos dilemas éticos envolvendo sua utilização, ainda não existem normas
internacionais que regulem, a nível mundial, a realização de pesquisas com
células-tronco. Por isso, muitos países têm criado normas próprias para regu-
lamentar o tema (BARBOSA et al., 2013).
O Reino Unido foi o primeiro país a autorizar, em lei, a pesquisa com célu-
las-tronco embrionárias, em 2001, após extenso debate bioético envolvendo

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Bioética

toda a sociedade. Outros países, além de permitir a pesquisa com os embri-


ões excedentes de clínicas de reprodução assistida, também autorizam a pró-
pria produção de embriões em laboratório para fins exclusivos de investiga-
ção científica, como é o caso de Austrália, Japão, África do Sul, Cingapura,
China e Suécia. Nos Estados Unidos, a situação normativa é mais complexa.
Lá, a pesquisa com células-tronco embrionárias é autorizada nacionalmente,
desde que não seja subvencionada com recursos federais. Por isso, alguns Es-
tados como Califórnia, Illinois e Maryland editaram leis locais que autorizam
o financiamento estadual para estas pesquisas. Outro país com regulamen-
tação singular é a Alemanha, que possui uma lei, de 2002, que proíbe o uso
de embriões alemães em pesquisas, permitindo apenas o uso de linhagens
de células-tronco embrionárias já importadas, produzidas em outros países.
Logo, a Alemanha proíbe o uso de embriões de origem alemã, mas permite o
uso de linhagens celulares já importadas de outros países. O contexto do na-
zismo e as possibilidades de pesquisas envolvendo seres humanos dificultam
o debate democrático no país, por isso a proibição do uso de material biológi-
co alemão em laboratório (DINIZ; AVELINO, 2009).

TERAPIA DE CÉLULAS-TRONCO PARA ESCLEROSE MÚLTIPLA

Fonte: Plataforma Deduca (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há um profissional da saúde aplicando uma injeção no braço de


um paciente.

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Bioética

No Brasil, a reprodução humana assistida é regulamentada pela Resolução


nº 2.168/2017, do CFM, que estabelece que os embriões não implantados no
útero devem ser criopreservados. A norma ainda prevê que os embriões crio-
preservados, há três anos ou mais, poderão ser descartados se esta for a von-
tade expressa dos pacientes, assim como os embriões abandonados por três
anos ou mais poderão ser descartados, sendo considerado, neste caso, em-
brião abandonado aquele que os responsáveis descumpriram o contrato pré-
-estabelecido e não foram localizados pela clínica (COHEN, OLIVEIRA, 2020).
Outro importante regramento nacional é a Lei Federal nº 11.105/2005 (Lei de
Biossegurança), que permite a utilização de células-tronco embrionárias des-
cartadas para fins de pesquisa e terapia (COHEN, OLIVEIRA, 2020).
Segundo o artigo 5° da Lei de Biossegurança:

Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-


tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por
fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas
as seguintes condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação
desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de
completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
(BRASIL, 2005)

Apesar da expressa permissão em lei da utilização de células-tronco embrio-


nárias em pesquisa, a questão suscita polêmicas. Tal controvérsia levou a uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) das pesquisas com células-tron-
co no Supremo Tribunal Federal (STF). A ADIN justificava-se com base no di-
reito à vida do embrião, já que, mesmo após três anos de congelamento, o
embrião ainda poderia ser implantado e dar origem a uma vida. A votação no
STF ocorreu em 2008 e concluiu, por seis votos a cinco, sobre a constitucio-
nalidade das pesquisas com células-tronco, permitindo que os estudos con-
tinuassem. Ainda assim, as normas brasileiras sobre o tema são escassas e,
portanto, ainda são necessárias regulamentações mais específicas acerca das
técnicas e metodologias utilizadas em pesquisa e terapias com células-tronco
(BARBOSA et al., 2013).

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Bioética

O Supremo Tribunal Federal (STF) é o órgão


superior do Poder Judiciário e tem a importante
função de guarda da Constituição Federal, ao julgar
questões de constitucionalidade. A Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADIN) é proposta ao STF
para questionar a inconstitucionalidade de lei, ato
normativo federal ou estadual.

CONCLUSÃO

A bioética é um estudo interdisciplinar que envolve ciências biológicas, saúde,


filosofia e direito na investigação das condições para uma administração res-
ponsável da vida humana, animal e do meio ambiente.
Neste contexto, o surgimento de tecnologias inovadoras em biomedicina
trouxe dilemas éticos e morais concernentes aos possíveis impactos, tanto na
saúde humana quanto nos dogmas sociais e religiosos.
Esta unidade apresentou uma reflexão sobre os aspectos bioéticos que envol-
vem a clonagem e o uso de células-tronco.
Observamos que a clonagem pode ter finalidade reprodutiva ou terapêutica
e que, em todos os casos, surgem dilemas éticos envolvendo a manipulação
genética em laboratório e os riscos inerentes ao procedimento.
Também abordamos os conceitos e aplicações terapêuticas do uso de célu-
las-tronco em medicina e as questões morais e éticas relativas ao descarte e
utilização de embriões humanos em pesquisa.
Por fim, ainda analisamos as principais normas internacionais e nacionais que
regulamentam tanto a clonagem quanto as pesquisas com células-tronco e
destacamos que os dilemas bioéticos em clonagem e pesquisas com células-
-tronco ainda estão sob intenso debate social, em função das implicações éti-
cas, filosóficas, científicas e religiosas de alta complexidade.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 84
Bioética

UNIDADE 5

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
você possa:

> Analisar os
aspectos éticos
e jurídicos que
envolvem a
identificação de
pessoas utilizando
ferramentas
genéticas.
> Compreender
os aspectos
éticos e jurídicos
que envolvem
a realização de
pesquisas e a
comercialização
de produtos
nanotecnológicos.

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Bioética

5 BIOÉTICA: GENÉTICA E
NANOTECNOLOGIA

5.1 INTRODUÇÃO
Esta unidade aborda a bioética em genética e nanotecnologia, destacando
aspectos relevantes no âmbito desses dois temas.
A primeira parte desta unidade versa sobre a genética na identificação hu-
mana, trazendo para a discussão as principais técnicas biotecnológicas em
identificação de pessoas e suas aplicações em diversas áreas, especialmente
em análises forenses. Ressaltamos a importância da biologia molecular para a
análise de paternidade, a identificação de autoria de crimes e o reconhecimen-
to de vítimas de grandes desastres. Também abordaremos os dilemas éticos
enfrentados na análise de DNA para identificação de pessoas, especialmente
tratando dos bancos de dados de perfis genéticos para fins criminais. No Brasil,
a lei nº 12.654/2012 e o decreto nº 7.950/2013 preveem a coleta de material gené-
tico como forma de identificação criminal, bem como a criação de um banco
nacional de perfis genéticos para subsidiar a apuração de crimes.
Na segunda parte, estudaremos o que é nanotecnologia e suas inúmeras
aplicações em biomedicina, especialmente com a produção de nanomate-
riais para diagnósticos, tratamentos e medicamentos. Abordaremos os princi-
pais questionamentos éticos envolvendo o uso de nanotecnologia, particular-
mente seus riscos e aspectos morais, filosóficos e socioeconômicos. Também
veremos as principais normas internacionais e nacionais que regulamentam
o tema, especialmente as normas ISO 229 e o Sistema Nacional de Laborató-
rios em Nanotecnologia.

5.2 A GENÉTICA NA IDENTIFICAÇÃO HUMANA


Cada ser humano apresenta um perfil genético único, que o distingue dos
demais. Com o avanço das tecnologias em genética e biologia molecular, tor-
nou-se possível, com amostras simples, como saliva, pele e sêmen, identificar
cada indivíduo utilizando técnicas laboratoriais, como a PCR (reação em ca-

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Bioética

deia da polimerase). Por isso, essas técnicas têm sido amplamente utilizadas
para identificação de pessoas, em exames de paternidade e reconhecimento
de vítimas de desastres.

IDENTIFICAÇÃO HUMANA

Fonte: Plataforma Deduca (2021).

#PraCegoVer: Imagem de uma impressão digital, representando a identificação humana.

Outra importante aplicação é nas análises forenses, como para a identificação


de material genético encontrado em cenas de crimes ou para excluir possíveis
suspeitos. Entretanto, a utilização dessas técnicas traz dilemas éticos e legais
que envolvem a privacidade dos dados e proteção a direitos fundamentais.
Além da possibilidade de erros ou falhas durante os testes, um importante
questionamento se relaciona à possibilidade da criação de bancos de dados
de perfis genéticos para fins criminais.
No Brasil, a Lei nº 12.654/2012, prevê a coleta de perfil genético como forma de
identificação criminal e o decreto nº 7.950 institui o Banco Nacional de Perfis
Genéticos e a Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos.

5.2.1 ANÁLISES FORENSES E IDENTIFICAÇÃO


DE PESSOAS
As análises forenses compreendem um conjunto de avaliações de respaldo
técnico e científico realizadas por um especialista para posterior uso em juízo.
Como exemplo, podemos citar as análises de cena de crime, como impres-

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Bioética

sões digitais e amostras de DNA ou vestígios online de crimes cibernéticos.


Neste sentido, o avanço nas técnicas de biologia molecular e genética trouxe
inúmeros benefícios para as análises forenses.
Cada ser humano apresenta um perfil genético único, o que permite identifi-
cá-lo com alta precisão. Isso acontece porque, no genoma, há polimorfismos
de DNA, que são variações nas sequências dos nucleotídeos entre indivíduos,
que correspondem a mudanças neutras ou silenciosas.
Um desses polimorfismos é o STR (short tandem repeat), que é uma repe-
tição de uma pequena sequência de DNA, variável de pessoa para pessoa.
Blocos desse tipo de repetição são denominados microssatélites, os quais, por
apresentarem uma enorme variabilidade entre os indivíduos da espécie hu-
mana, são usados em genética forense, determinação de paternidade e iden-
tificação individual (BORGES-OSORIO; ROBINSON, 2013).

O DNA (ácido desoxirribonucleico) é o material


genético encontrado no núcleo das células
eucarióticas e é o responsável por conferir
as características únicas de cada indivíduo,
sendo transferido hereditariamente pelos pais.
Na fecundação, os gametas do pai e da mãe
apresentam metade do material genético que
irá se juntar e formar o novo indivíduo. A base
dos testes de paternidade consiste no fato de
que a criança recebe de cada um dos genitores
uma sequência da DNA específica. Portanto, a
determinação da paternidade é realizada com base
no fato de a sequência de DNA específica ser ou
não compartilhada entre a criança e o suposto pai.

O principal método utilizado para a avaliação dos microssatélites e identifica-


ção individual é a PCR (reação em cadeia da polimerase). Esta técnica consis-
te em coletar amostras de DNA, que são amplificadas exponencialmente em
uma série de ciclos de alterações de temperatura.

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Bioética

Inicialmente, as amostras de DNA de fita dupla sofrem uma separação física


em altas temperaturas. Na etapa seguinte, são inseridos primers (sequências
iniciadoras complementares à região do DNA de interesse), que se ligam às
sequências complementares de fitas simples de DNA. Em seguida, a fita de
DNA complementar é alongada enzimaticamente. O processo repete-se vá-
rias vezes, produzindo uma grande quantidade de fragmentos de DNA da
região de interesse (COHEN; OLIVEIRA, 2020).

REAÇÃO EM CADEIA DA POLIMERASE (PCR)

Fonte: WikiCommons (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma representação da reação em cadeia da polimerase


(PCR). À esquerda, está a fita dupla de DNA original a ser replicado e, ao lado dele, há
nucleotídeos e primers de DNA. Na primeira etapa, de desnaturação, a dupla fita é
separada. Na seguinte, de anelamento, o primer de DNA liga-se ao DNA original, em cada
uma das fitas separadas. Na etapa seguinte, de alongamento, os nucleotídeos ligam-se ao
primer, alongando o DNA. A imagem indica que o processo de repete várias vezes.

Após a PCR, os fragmentos de DNA obtidos são avaliados por eletroforese.


Esta técnica consiste em separar os fragmentos de DNA pelo tamanho. Para
isso, os fragmentos são inseridos em um gel de agarose, no qual é aplicada
uma corrente elétrica, que induz as moléculas a moverem-se pela matriz de
agarose. As moléculas menores se movimentam mais rápido que as maiores,
o que permite a separação por tamanho do fragmento de DNA. Em seguida,
é feita a comparação do tamanho dos fragmentos de DNA do controle com
os da amostra em análise (COHEN; OLIVEIRA, 2020).

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Bioética

RESULTADO DA PCR APÓS SER REALIZADA UMA ELETROFORESE EM GEL DE AGAROSE

Fonte: Matos e Conceição (2013).

#PraCegoVer: Na imagem, há um gel de agarose sendo analisado e no qual estão os


fragmentos de DNA que podem então ser visualizados.

Para as análises forenses, diferentes amostras podem ser utilizadas na iden-


tificação genética: sangue, cabelo, saliva, sêmen, urina, pele, polpa dentária,
dentre outras. Isso é importante, porque permite, com facilidade, a coleta
das amostras, mesmo em pequenas quantidades, para a análise em gené-
tica forense. Dentre as diversas aplicações das técnicas de biologia molecu-
lar, ressalta-se a análise de paternidade, a identificação de autoria de crimes
e a possibilidade de inocentar suspeitos, por meio da comparação dos per-
fis genéticos obtidos nas cenas do crimes com o dos suspeitos (SANTANA;
ABDALLA-FILHO, 2012).
Outra valiosa aplicação da genética forense é a identificação de pessoas víti-
mas de desastres, como enchentes e terremotos. Neste caso, devido ao alto
grau de decomposição ou destruição, o reconhecimento físico da vítima
pode ser comprometido e a identificação genética torna-se uma importante
ferramenta. Entretanto, amostras biológicas coletadas após a morte podem
apresentar limitações para a análise do DNA, uma vez que ele pode estar al-
tamente degradado, em função do tempo decorrido após a morte e às con-
dições ambientais a que o cadáver estiver exposto (COHEN; OLIVEIRA, 2020).

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Bioética

ENCHENTE

Fonte: Plataforma Deduca (2021).

#PraCegoVer: Imagem de casa submersa em água, representando a enchente.

O avanço na biologia molecular, especialmente no âmbito forense, permitiu o


surgimento de bancos de perfis genéticos criminais. Esses bancos são bases
de dados que armazenam informações genéticas indivíduo-específicas, para
fins de identificação civil e investigação criminal. Podem servir para a iden-
tificação de autoria de crimes, por meio da comparação do perfil genético
encontrado na cena do crime com o banco de dados armazenado (SANTANA;
ABDALLA-FILHO, 2012).

5.2.2 DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM A


UTILIZAÇÃO DO DNA PARA A IDENTIFICAÇÃO
DE PESSOAS
O exame de DNA para fins de identificação pessoal pode ser considerado um
dos maiores avanços do século na área forense. Entretanto, as técnicas susci-
tam questionamentos éticos e legais que envolvem privacidade dos dados e
proteção a direitos fundamentais.
Os exames de paternidade enfrentam dilemas bioéticos de variadas formas.
Por um lado, questiona-se a possível submissão ao exame compulsoriamen-
te, já que transgride a liberdade individual e a dignidade da pessoa humana.

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91 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

Por outro lado, têm-se o direito do filho de conhecer seu pai, além de toda a
assistência, guarda, criação e cuidado advindas da paternidade (LOCH, 2014).

TUBOS DE PCR

Fonte: Biomedicina Padrão (2020).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma mão com luva segurando oito tubos transparentes de
PCR, preenchidos com um líquido também transparente.

Outro relevante aspecto bioético envol-


vendo exames de DNA é a possibilida-
de de erros. Embora sejam raras, falhas
podem ocorrer nas análises, o que gera
insegurança jurídica. Erros na coleta ou
armazenamento das amostras, equipa-
mentos sem a calibração adequada ou,
ainda, falhas na preparação das solu-
ções e durante o teste, podem levar a re- Curiosidade
sultados errôneos e, consequentemen-
Apesar de raros, acontecem
te, a julgamentos incorretos. Para evitar erros em exames de DNA.
este tipo de erro, é fundamental que os Veja este exemplo, no qual
peritos e profissionais que realizam as um laboratório teve que
indenizar um homem
técnicas tenham formação acadêmica
por exame incorreto de
adequada, além de conhecimento e ex- paternidade, clicando aqui.
periência na área de atuação. Para acei-
tação do trabalho pericial, deve-se con-

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 92
Bioética

siderar a validade do teste realizado, bem como sua reprodutibilidade, sendo


possível a realização de perícias de contraprova para garantir a confiabilidade
dos testes genéticos.
A criação de um banco de dados de perfis genéticos para fins criminais envol-
ve dilemas éticos de variadas esferas. Um importante aspecto é a segurança
dos dados e seu tempo de permanência no banco. Como definir quem terá
sua amostra genética coletada? Seriam apenas criminosos e suspeitos ou
toda a população adulta? Estando o sujeito obrigado a realizar o exame, ques-
tiona-se a autonomia e dignidade individual, já que a ele não cabe a escolha
de não o realizar. Do ponto de vista de equidade, todas as pessoas devem ser
tratadas com igualdade de direitos, de dignidade e de forma justa. Por isso,
quando há obrigatoriedade de fornecer amostra genética para inclusão em
um banco de dados de DNA criminal, imposta a um único grupo de indivídu-
os, ela pode configurar, uma situação de discriminação, em que a equidade
de tratamento é desrespeitada (SANTANA; ABDALLA-FILHO, 2012).
Outro aspecto relevante relacionado ao surgimento de bancos de dados ge-
néticos refere-se à privacidade dos dados e proteção contra possíveis trans-
gressões de direitos e liberdades fundamentais. Quem teria acesso a estes
dados e como eles seriam utilizados na prática? E quanto aos riscos desse
material biológico ser utilizado para finalidade diferente da original?
Atualmente, a obtenção de dados pessoais, como documentos de identifica-
ção ou históricos de compra, é ação corriqueira, mas que pode gerar ameaças
à privacidade individual. Ameaças que são ainda mais relevantes quando se
trata de dados sensíveis, como posicionamento político, histórico clínico ou
orientação sexual. Em se tratando de um biobanco, com amostras biológi-
cas, esse risco é ainda mais elevado. Neste caso, é fundamental a garantia do
controle de acesso às informações íntimas dos indivíduos, sendo resguarda-
do o direito a não interferência nas diversas esferas da intimidade (SANTANA;
ABDALLA-FILHO, 2012).

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93 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

IDENTIFICAÇÃO DE PESSOAS

Fonte: Plataforma Deduca (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma fila de pessoas com roupas escuras em que só aparece
parte de suas silhuetas, não sendo possível identificá-las individualmente.

5.2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


Os testes genéticos e a criação de bancos de dados de perfis genéticos susci-
taram a criação de leis e normas específicas para regulamentar os aspectos
jurídicos e éticos dos procedimentos. A Declaração Universal sobre Bioética
e Direitos Humanos, da UNESCO, busca promover a integração dos valores
éticos às questões sociais. Os princípios presentes nesta norma estão intima-
mente relacionados à problemática da criação de bases de dados de perfis
genéticos para fins criminais, como autonomia individual, confidencialidade,
igualdade e justiça (SANTANA; ABDALLA-FILHO, 2012).

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 94
Bioética

A Organização das Nações Unidas para a Educação,


a Ciência e a Cultura (UNESCO) é uma agência
especializada das Nações Unidas (ONU) com o objetivo
de contribuir para a paz e segurança no mundo,
mediante a educação, ciências naturais, ciências
sociais/ humanas e comunicações/ informação.

No Brasil, há apenas uma lei que regulamenta o Banco de Perfis Genéticos


Criminal Brasileiro, a Lei nº 12.654/2012, que prevê a coleta de perfil genético
como forma de identificação criminal.
Segundo esta lei:

Art. 9°-A. Os condenados por crime praticado, dolosamente, com violência


de natureza grave contra pessoa ou por qualquer dos crimes previstos no art.
1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, serão submetidos, obrigatoriamente,
à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA - ácido
desoxirribonucleico, por técnica adequada e indolor.

Portanto, fica estabelecida a coleta compulsória de DNA para todos os conde-


nados por crimes dolosos de natureza grave. A lei ainda estabelece o armazena-
mento do perfil genético em bancos de dados, gerenciado por unidade oficial
de perícia criminal. A norma ainda prevê que os dados constantes de bancos de
perfis genéticos têm caráter sigiloso, respondendo civil, penal e administrativa-
mente quem permitir sua utilização para fins diversos do previsto em lei.
No entanto, ela não aborda temas relevantes relacionados ao banco de dados
de DNA, por exemplo: não há dispositivos que padronizem a coleta e análise
das amostras apenas em laboratórios oficiais e a necessidade de um sistema
de controle do funcionamento do banco, com transparência, como a criação
de conselho fiscalizador. Outro relevante aspecto não tratado na lei é como
serão armazenadas as amostras biológicas e a possibilidade de sua destrui-
ção após algum período (SANTANA; ABDALLA-FILHO, 2012).

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95 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

Em 2013, publicou-se o decreto nº 7.950, a fim de regulamentar a lei nº


12.654/2012. Esse decreto instituiu o Banco Nacional de Perfis Genéticos e a
Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos, sendo que o banco tem como
objetivo a coleta e armazenamento de perfis genéticos para subsidiar a apura-
ção de crimes, enquanto a rede integrada, visa o compartilhamento de perfis
genéticos constantes nos bancos da União, dos Estados e do Distrito Federal.
O decreto ainda prevê que a rede integrada deve contar com um comitê ges-
tor, com a finalidade de promover a coordenação e a integração dos dados
nos âmbitos da União, Estados e Distrito Federal, sendo de competência do
comitê promover a padronização das técnicas de coleta e a análise do mate-
rial genético; a definição das medidas e padrões que assegurem o respeito
aos direitos e às garantias individuais nos procedimentos de análise genética,
além da definição das medidas de segurança para garantir a confiabilidade e
o sigilo dos dados.

O comitê gestor da rede integrada de bancos de


perfis genéticos é composto por representantes
titulares e suplentes, indicados da seguinte forma:

•  cinco representantes do Ministério da Justiça e


Segurança Pública;

•  um representante do Ministério da Mulher, da


Família e dos Direitos Humanos;
•  cinco representantes dos Estados ou do Distrito
Federal, sendo um representante de cada região
geográfica.

As deliberações do comitê gestor são adotadas por


maioria absoluta e o mandato dos membros é de
dois anos, permitida uma única recondução.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 96
Bioética

Portanto, o governo brasileiro sinaliza uma preocupação em garantir os di-


reitos e as liberdades dos indivíduos, cujo material genético tenha sido arma-
zenado no banco. Para isso, é fundamental que os dados sejam obtidos com
confiabilidade e tenham seu sigilo resguardado. O decreto também prevê a
exclusão do perfil genético do indivíduo no banco de dados após decorrido o
prazo de prescrição do crime cometido pelo indivíduo, o que é relevante, pois,
juntamente com a prescrição do crime, encerra-se o prazo para armazena-
mento do perfil genético (SANTANA; ABDALLA-FILHO, 2012).

5.3 NANOTECNOLOGIA
O advento de tecnologias inovadoras na física, química e biologia permitiram
o surgimento da nanotecnologia, que estuda átomos e moléculas, estruturas
de tamanho nanométrico (um bilionésimo do metro). Esta ciência apresenta
inúmeras aplicações em variadas áreas, como engenharia, física, computa-
ção, biologia e medicina. Na saúde, as aplicações envolvem, principalmente,
a produção e a disponibilidade de fármacos, equipamentos de análise e diag-
nóstico, materiais e utensílios médicos.
Apesar dos inúmeros potenciais tratamentos médicos, a nanotecnologia tam-
bém envolve dilemas éticos, especialmente relacionados a aspectos filosófi-
cos e religiosos de manipulação dos corpos humanos, bem como questões
de desigualdade de acesso a tecnologias e interesses econômico-financeiros.
Para regulamentar o tema, existem normas internacionais, como as ISO 229
e nacionais, como a portaria nº 245/2012 do MCTI (BRASIL, [2019]), que cria o
Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias (SisNANO).

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97 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

ESCALA DE COMPARAÇÃO DE TAMANHO DE NANOMATERIAIS

Fonte: WikiCommons (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, à esquerda há uma escala de comparação de tamanho em


nanômetros (nm). De baixo para cima o tamanho reduz na escala, iniciando com uma
bola de baseball, seguida por uma formiga, depois um fio de cabelo, hemácias, bactéria,
vírus, DNA, hemoglobina, molécula de glicose, átomo de ouro e molécula de água. À
direita, no tamanho de 1 a 100nm, estão representados os nanomateriais: lipossomo,
fullereno, dendrimer, nanotubo de carbono e grapheno.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 98
Bioética

5.3.1 ENTENDA O QUE É A NANOTECNOLOGIA


E SUAS APLICAÇÕES NA SAÚDE
A nanotecnologia é a ciência que estuda as estruturas em escala atômica e
molecular, lidando com estruturas em torno de 1 a 100 nanômetros. Neste sen-
tido, o nanômetro corresponde a um bilionésimo do metro (0,000000001m).
Portanto, esta ciência lida com estruturas extremamente pequenas, abrindo
a possibilidade de manipular átomos e moléculas para, assim, construir novos
materiais de interesse.
A nanotecnologia apresenta inúmeras aplicações em diferentes áreas do co-
nhecimento: física, química, computação, engenharia, biologia e medicina.
Com isso, a utilização de nanomateriais para diagnóstico e tratamento têm
sido importantes aliados para a medicina atual.
Uma das aplicações da nanotecnologia em medicina é a utilização de técnicas
de diagnóstico baseadas em nanopartículas, apresentando alta sensibilidade,
importantes para o diagnóstico de diferentes tipos de câncer em estágio inicial,
sendo que o diagnóstico precoce reduz os tratamentos necessários e aumenta
as chances de cura total do paciente. Há, ainda, uma possível aplicação futu-
ra da nanotecnologia, que é a criação de monitores pessoais ultrassensíveis
de saúde, que são dispositivos implantáveis nos organismos e que monitoram,
continuamente, níveis sanguíneos de determinados indicadores, ajustando, de
forma automática, a liberação de drogas em quantidades apropriadas, o que
seria relevante para diabéticos, por exemplo (BERGMANN, 2008).
Nanomateriais ainda podem ser usados como revestimento para o envio de
medicamentos de forma mais eficiente e seletiva. Este é o caso de uma for-
mulação lipossomal de doxorrubicina, um fármaco nanoencapsulado que
apresentou menor cardiotoxicidade em comparação com a doxorrubicina li-
vre para o tratamento de câncer nos ovários.
Os nanomateriais também são usados para aumentar a especificidade de
medicamentos. O fármaco nanoencapsulado é estabilizado e protegido, sen-
do liberado apenas no órgão-alvo, evitando efeitos secundários em outros
órgãos. Medicamentos nanoestruturados ativados por laser também têm
sido testados para o tratamento de câncer de pele, com resultados positi-
vos. Graças a esse transporte seletivo, um medicamento com nanotecnologia,
em geral, requer doses menores e provoca menos efeitos colaterais, quando

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99 Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017
Bioética

comparado a um medicamento convencional (CANCINO; MARANGONI; SU-


COLOTTO, 2014; HERMES; BASTOS, 2014).

A nanotecnologia foi importante durante a


pandemia de COVID-19. Algumas das vacinas
produzidas utilizaram RNA mensageiro do vírus
para induzir a resposta imune. Para proteger este
material genético de ser degradado e permitir
que ele pudesse entrar nas células, o RNA foi
encapsulado em uma membrana lipídica,
utilizando-se nanotecnologia. Para ler o artigo que
descreve essa técnica, clique aqui.

Outra importante aplicação da nanotecnologia em saúde é em equipamentos


e utensílios médicos. A nanotecnologia permite a potencialização do efeito an-
timicrobiano da prata, sendo que as nanopartículas de prata podem ser incor-
poradas em produtos médicos, pomadas ou instrumentos cirúrgicos, tornan-
do-os livres de bactérias. A nanotecnologia também pode auxiliar a engenharia
de tecidos na criação de órgãos artificiais para transplantes. Neste contexto, os
nanomateriais podem ser usados como superfícies para orientar o crescimento
e ordenação de células e tecidos em laboratório. Ademais, nanocompósitos de
liga de titânio podem ser usados para aumentar a durabilidade e biocompati-
bilidade de instrumentos cirúrgicos e próteses (BERGMANN, 2008).

5.3.2 OS DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM A


UTILIZAÇÃO DA NANOTECNOLOGIA
Apesar das diversas aplicações biomédicas da nanotecnologia, ela enfrenta
variados dilemas éticos, especialmente quando analisada frente a um meio
cultural plural. Por isso, a bioética busca compreender como os avanços bio-
tecnológicos estão inseridos na sociedade, especialmente nas relações de
produção e consumo, a distribuição de riqueza e de riscos, e como influen-
ciam as concepções de saúde e doença para o ser humano (SILVA, 2010).

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 100
Bioética

Neste sentido, conforme Pyrrho e Schramm (2019, p. 589),

A percepção de que as representações de saúde, corpo e biotecnologias


são determinadas por contexto social dinâmico e complexo une a bioética
e a saúde coletiva. As anunciadas mudanças e libertações das estruturas da
sociedade capitalista industrial não eliminaram a distinção de oportunidades
e acesso dependentes de classe, gênero, etnia e outros determinantes sociais
da saúde. Por isso, a prática biomédica é colocada sob análise, envolvendo
questões como o acesso a estas novas tecnologias de saúde, o respeito às
culturas, o poder do discurso biomédico, a relação entre profissional de
saúde e usuário, os interesses econômicos envolvidos no desenvolvimento
de novos dispositivos, entre outras.

Portanto, um importante questionamento ético em nanotecnologia se dá


em relação aos aspectos econômico-sociais. Em se tratando de um contex-
to capitalista e desigual, a distinção de acesso a novas tecnologias de saúde,
bem como os interesses econômicos envolvidos na produção de novos nano-
materiais por grandes indústrias do setor biomédico devem ser avaliados à
luz da bioética.
Atualmente, indicadores epidemiológicos já retratam a desigualdade de
acesso a tratamentos e diagnósticos médicos, especialmente para as classes
mais pobres. Portanto, questiona-se quais seriam os critérios para determi-
nar o acesso às terapias, diagnósticos e dispositivos contendo nanomateriais.
Toda a população teria acesso a esses tratamentos ou apenas quem possui
poder econômico para pagar? (PYRRHO; SCHRAMM, 2019).

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Bioética

NANOTUBOS DE CARBONO

Fonte: WikiCommons (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma representação de uma esfera formada por nanotubos de


carbono.

Além das questões econômicas, um relevante dilema ético em nanotecnolo-


gia envolve aspectos mais filosóficos e religiosos: quais os impactos biológicos
e morais das transformações e mudanças geradas nos corpos humanos para
que evoluam e aumentem seu desempenho utilizando nanotecnologia?
A possibilidade de rearranjar átomos em uma escala diminuta e poder ma-
nipular as moléculas permitiria interferir na evolução humana, proporcionan-
do corpos e mentes perfeitos, o que traz questionamentos éticos relevantes
quanto à possibilidade de impor limites ao uso e produção destas tecnologias
(PYRRHO; SCHRAMM, 2019).

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 102
Bioética

Uma questão ética de importante na discussão para a nanotecnologia en-


volve os seus possíveis efeitos adversos e impactos para a saúde no médio
e longo prazos. Neste sentido, destacam-se os riscos de toxicidade, além da
imprevisibilidade e incerteza dos conhecimentos atuais acerca dos possíveis
efeitos colaterais dos nanomateriais nos sistemas biológicos e genéticos. Por
isso, é importante assegurar o princípio da precaução, que é a garantia contra
os riscos potenciais ainda não identificados advindos do uso de uma nova
tecnologia. Assim, são necessários mais estudos para definir as concentrações
seguras de nanomateriais, estabelecer normas para sua utilização e regras de
eliminação de seus resíduos de forma segura (HERMES; BASTOS, 2014).

As pesquisas com nanotecnologia só foram possíveis


com a criação de microscópios que permitiram
a visualização destas moléculas nanométricas. O
microscópio de corrente por tunelamento é um
instrumento para observação no nível atômico,
desenvolvido em 1981, por Gerd Binnig e Heinrich
Rohrer, do IBM Zurich Research Laboratory, pelo qual
eles receberam o prêmio Nobel em física, em 1986.

5.3.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS


E INTERNACIONAIS QUE REGULAM AS
ATIVIDADES DE PESQUISA E COMERCIAIS
ACERCA DOS NANOPRODUTOS
Com o crescente aumento de pesquisas em nanotecnologia, a regulação por
meio de normas e leis é uma forma de controle de riscos e definição de me-
todologias e técnicas adequadas a serem utilizadas. Essas normas são par-
ticularmente relevantes para definir regras de desenvolvimento de novos
nanomateriais, mitigando riscos. Atualmente, já existem diversos produtos
disponíveis no mercado, desde roupas a medicamentos, que apresentam na-
nomateriais em sua composição.

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Bioética

LIPOSSOMO OBTIDO POR NANOTECNOLOGIA PARA REVESTIMENTO DE MEDICAMENTOS

Fonte: WikiCommons (2021).

#PraCegoVer: Na imagem, há uma representação de um lipossomo. É uma esfera, que


contém internamente uma estrutura em formato de cristal, que é o medicamento.

No cenário mundial, em 2005, aconteceu a primeira reunião internacional


sobre Normatização das Nanotecnologias, organizada pela British Standards
Institution (BSI), órgão de normatização britânico, da qual participaram dele-
gações de 22 países.
Posteriormente, a organização internacional de padronizações, ISO (Organi-
zation for Standardization) implantou algumas certificações e guias de padro-
nização voltados à comunidade industrial em nanotecnologia. A ISO atribuiu
ao Comitê Técnico nº 229 a responsabilidade de preparar, analisar e publicar
normas relativas à nanotecnologia como sua definição.
A ISO/TS 12901:2012 foi criada para o gerenciamento de riscos aplicados à enge-
nharia de nanomateriais; a ISO/TR 11360:2010 aborda metodologias de classifi-

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Bioética

cação e categorização de nanomateriais e a ISO/TS 16195:2013 consiste em um


guia com orientações para o desenvolvimento de ensaios de nanomateriais
(CANCINO; MARANGONI; SUCOLOTTO, 2014; FERREIRA; SANT’ANNA, 2015).
Existem, ainda, normas específicas nos diversos países do mundo. Na União
Europeia, há a normativa CEN/TC 352 do European Committee for Standardi-
zation, de 2005, que estabelece padrões no campo de nanotecnologia, como
classificações, terminologias, metodologias e especificações. Nos Estados
Unidos, o principal órgão regulador é o American National Standards Institu-
te, com o ANSI-Nanotechnology Standards Panel (ANSI-NSP), um corpo coor-
denador que cria padrões na área de nanotecnologia, incluindo nomenclatu-
ra, saúde, segurança e meio ambiente.
O desenvolvimento de nanomateriais
aplicados à medicina, no Brasil, ainda se
concentra, em maior parte, nas univer-
sidades e grandes centros de pesquisa.
Por isso, em 2009, foi criado um grupo
de trabalho sobre o Marco Regulatório
no Fórum de Competitividade de Na-
Saiba mais
notecnologia, por iniciativa do Ministério
da Indústria, Comércio Exterior e Servi- Para conhecer melhor o
ços. Participaram do fórum, representan- SisNANO, clique aqui.
tes do setor privado, da academia e do
governo. Entretanto, ainda não há nenhuma lei nacional específica sobre nano-
produtos, sendo que a única regulamentação vigente até o presente momento
no país é a Portaria nº 245/2012, que foi alterada pela Portaria n° 2.376/2019,
do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Essa portaria instituiu
o Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologia (SisNANO) como um
dos elementos do Programa Nacional de Nanotecnologia. O SisNANO é forma-
do por um conjunto de laboratórios direcionados à pesquisa em nanociências
(FERREIRA; SANT’ANNA, 2015).

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Bioética

CONCLUSÃO

Esta unidade apresentou uma reflexão sobre os aspectos bioéticos relativos à


genética na identificação humana e à nanotecnologia. Além disso, observa-
mos que a análise dos aspectos éticos e morais é necessária frente aos confli-
tos impostos pelo desenvolvimento tecnológico.
Notamos que a genética e a biologia molecular fornecem importantes ferra-
mentas que podem ser usadas na identificação humana, especialmente para
fins de investigação criminal. Neste contexto, a criação de bancos de dados de
perfis genéticos criminais suscita diversos questionamentos éticos que envol-
vem aspectos jurídicos, sociais e filosóficos.
Também analisamos a lei nacional nº 12.654/2012, que prevê a coleta de perfil
genético como forma de identificação criminal e o decreto nº 7.950/2013, que
institui o Banco Nacional de Perfis Genéticos.
Por fim, abordamos a importância dos estudos em nanotecnologia e as diver-
sas aplicações destas técnicas, especialmente em biomedicina. Ainda obser-
vamos que a nanotecnologia implica riscos e enfrenta dilemas éticos relacio-
nados a aspectos de ordem econômica e social. Além disso, vimos que tanto
no Brasil quanto no mundo, as normas sobre nanotecnologia estão ainda in-
cipientes, sendo necessários esforços de normatização para assegurar maior
padronização, saúde e segurança das técnicas.

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Credenciada pela portaria MEC nº 767, de 22/06/2017, Publicada no D.O.U em 23/06/2017 106
Bioética

UNIDADE 6

OBJETIVO
Ao final desta
unidade,
esperamos que
você possa:

> Entender os
aspectos éticos
e jurídicos que
envolvem o aborto.
> Compreender
os aspectos
éticos e jurídicos
relacionados à
doação de órgãos
para transplante no
Brasil.

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Bioética

6 BIOÉTICA NA MEDICINA:
ABORTO E TRANSPLANTE DE
ÓRGÃOS

6.1 INTRODUÇÃO
Esta unidade traz uma abordagem bioética acerca do aborto e do transplante
de órgãos.
A primeira parte da disciplina versa sobre o aborto e nela veremos as principais
técnicas utilizadas para uma realização segura, conforme padrões da OMS.
Também analisaremos os dilemas bioéticos envolvidos na prática do aborto,
que envolvem questões morais, religiosas e culturais; os principais argumen-
tos para sua criminalização, relacionada a aspectos religiosos, considerando
a sacralidade da vida. Por outro lado, observaremos que o aborto clandestino
configura um problema de saúde pública, que leva, principalmente, a parcela
mais pobre das mulheres a sofrer com sequelas e possível morte. Além disso,
veremos as principais normas que regulamentam o aborto no mundo.
Na segunda parte desta unidade, veremos os aspectos bioéticos do trans-
plante de órgão, os procedimentos para transplante no Brasil, realizado de
forma gratuita pelo SUS, além das polêmicas bioéticas envolvendo a doação
de órgãos, que se relacionam principalmente a aspectos filosóficos e religio-
sos, como a definição de morte e a inviabilidade do corpo humano. Ao apre-
sentar esses temas, ainda mostraremos que os índices altos de negativa de
doação de órgãos pela família do potencial doador levam a maiores mortali-
dades na fila de espera pela doação e, por fim, apresentaremos as principais
leis nacionais que regulamentam o procedimento.

6.2 ABORTO
O aborto é a interrupção da gestação antes que o feto seja viável, isto é, que
consiga sobreviver fora do útero. Ele pode ser espontâneo, de causas naturais,
voluntário ou induzido, sendo que este último pode ser realizado tanto cirur-
gicamente quanto por meio de fármacos que induzem o fim da gestação.

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Bioética

Apesar de serem técnicas com poucas complicações, quando realizadas em


ambiente adequado e por profissionais qualificados, o aborto ainda suscita
diversos questionamentos éticos. Neste contexto, as principais polêmicas da
prática do aborto envolvem, por um lado, aspectos morais e religiosos da sa-
cralidade da vida, mesmo intrauterina; e, por outro lado, os direitos sexuais e
reprodutivos femininos e a liberdade individual. Outro relevante aspecto ético
do aborto diz respeito aos dados epide-
miológicos que demonstram que a prá-
tica clandestina consiste em um proble-
ma de saúde pública, já que leva a altos
índices de morbimortalidade materna,
especialmente quando considerada a
população mais vulnerável e pobre, que
não tem acesso a clínicas especializa-
das. Neste sentido, os países desenvol- Atenção
vidos têm legislações mais permissivas No Brasil, o aborto é crime,
quanto à prática do aborto, que levam exceto quando envolve
a menores índices de morbimortalidade risco para a vida da mãe,
decorrente de violência
materna nestes países, em comparação
sexual ou se o feto for
com os países em desenvolvimento, que anencéfalo.
apresentam legislações mais restritivas.

6.2.1 ASPECTOS BIOLÓGICOS DO ABORTO


O aborto consiste na interrupção da gravidez antes que o feto consiga sobre-
viver sozinho fora do útero. Pode ser involuntário, o chamado aborto espontâ-
neo ou induzido. O aborto natural é a adversidade gestacional mais comum,
especialmente no primeiro trimestre da gravidez, sendo definido como a
interrupção involuntária da gravidez até 20-22 semanas gestacionais. Geral-
mente, ocorre devido a problemas genéticos, alterações cromossômicas ou
hormonais, mas, na maioria das pacientes, tem causa multifatorial, o que tor-
na a sua investigação mais complexa. De todas as gestações diagnosticadas,
15 a 20% terminam em aborto espontâneo, a maioria dentro das primeiras 13
semanas de gestação (OLIVEIRA et al., 2020).

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Bioética

Embrião é o produto da concepção do momento


da fecundação até oito semanas de vida
embrionária. Feto é o bebê em formação a partir da
nona semana até o fim da gestação.

O aborto induzido pode ser realizado de forma cirúrgica ou por meio do con-
sumo de medicamentos abortivos. Na técnica cirúrgica, utiliza-se a aspiração
a vácuo, dilatação e curetagem, dilatação e evacuação. A aspiração a vácuo
pode ser feita pela técnica manual ou elétrica. Em ambos os casos, a técnica
consiste na evacuação do conteúdo uterino por meio de uma cânula plástica
ou de metal, acoplada a uma fonte de vácuo. Na versão elétrica, é utilizada
uma bomba de vácuo de fonte elétrica, enquanto na versão manual, o vácuo
é gerado utilizando um aspirador plástico sustentado e ativado com a mão.
Dependendo da idade gestacional, o abortamento por aspiração a vácuo leva
de 3 e 10 minutos e pode ser feito de maneira ambulatorial, utilizando apenas
analgésicos ou anestesia local. Esta técnica é considerada segura, sendo raras
as complicações advindas do procedimento (OMS, 2013).
Na técnica de dilatação e curetagem, o
colo uterino é dilatado com dilatadores
mecânicos ou agentes farmacológicos,
seguido do uso de curetas afiadas de
metal para raspar as paredes do útero.
Este procedimento é menos seguro e
mais dolorido que a aspiração a vácuo,
enquanto a dilatação com evacuação Glossário
é a técnica mais utilizada em gestação
Tenáculos são instrumentos
mais avançada, depois das 12 ou 14 se-
médicos em forma de
manas de gravidez. Inicia-se com a di- agulha, encurvados em uma
latação do colo uterino, seguida da eva- de suas extremidades e
cuação do útero mediante aspiração usados para puxar os vasos
que se queria ligar.
elétrica a vácuo, com uma cânula e te-
náculos longos (OMS, 2013).

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Bioética

ABORTO REALIZADO POR ASPIRAÇÃO A VÁCUO COM EQUIPAMENTO ELÉTRICO

1
2 5
3
4

Fonte: Wikipedia (2020).

#PraCegoVer: Na imagem, há um esquema representando o sistema reprodutor feminino


durante a realização de um aborto por aspiração a vácuo com equipamento elétrico em
gestação de oito semanas. É possível observar a mão do médico inserindo a cânula no
útero da mulher.

O método farmacológico de abortamento envolve o uso de medicamentos que


induzem o aborto, sendo um método seguro e eficaz quando realizado com
supervisão médica. Os medicamentos mais utilizados são antiprogestogênio,
mifepristone, que se unem aos receptores de progesterona e inibem a ação da
progesterona e, assim, interferem na continuação da gravidez (OMS, 2013).
O aborto induzido é um procedimento seguro quando realizado por pessoal
treinado e em condições médicas adequadas. Entretanto, quando realizado
de maneira clandestina, expõe a mulher a riscos e complicações que podem
levar à morte. Tais riscos variam de acordo com as circunstâncias nas quais o
aborto é realizado, sendo bem menores quando feitos em locais adequados
e com assistência médica. As principais complicações do aborto clandestino
são perfurações do útero, retenção de restos de placenta, infecções e septice-

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Bioética

mia. Além disso, a mulher pode ter sequelas ginecológicas que levam à difi-
culdade em gestações futuras ou até esterilidade (HARDY; ALVES, 1992).
Por isso, o abortamento é considerado
um grave problema de saúde pública.
Segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), 45% de todos os abortos
realizados no mundo são em condição
de insegurança, especialmente quando
se considera países em desenvolvimen-
to. Ainda, entre 4,7% e 13,2% de todas as
Curiosidade mortes maternas podem ser atribuídas
A Organização Mundial da ao aborto inseguro. No Brasil, a estimati-
Saúde criou uma orientação va é que ocorram, anualmente, mais de
técnica sobre abortamento um milhão de abortamentos induzidos
seguro para os sistemas de
saúde. Veja mais, clicando aqui. – uma das principais causas de morte
materna no país (OMS, 2013).

6.2.2 DILEMAS ÉTICOS QUE ENVOLVEM O


ABORTO DE EMBRIÕES
A técnica do aborto envolve questionamentos éticos de diferentes searas. O
aborto articula diversas posições morais, religiosas e ideológicas, além de con-
flitos legais, que se desdobram em perspectivas culturais e sociais diferencia-
das. Para entender os conflitos éticos do aborto, é necessário compreendê-lo
em sua abrangência, considerando tanto os aspectos epidemiológicos e bio-
lógicos, quanto sociais e culturais (SILVA, 2010).
Quantos aos aspectos morais e religiosos, a principal justificativa para a proi-
bição do aborto por lei baseia-se no princípio da sacralidade da vida, na qual o
início da existência humana se daria a partir da concepção. Para esta corrente,
o aborto consistiria em uma forma de tirar uma vida, sendo a ela, privados os
direitos fundamentais de vida e dignidade. Por outro lado, os dados epide-
miológicos e de saúde indicam que o aborto clandestino e inseguro, realizado
em condições precárias, é uma das maiores causas de morbimortalidade ma-
terna. Neste sentido, garantir um abortamento seguro, além de configurar
uma ação de saúde pública, promoveria a defesa dos direitos humanos e a
vida da mãe (SANTOS et al., 2013).

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Bioética

Um dos questionamentos éticos do aborto envolve os direitos das mulheres.


Historicamente, elas ocupam uma posição reservada à procriação e ao cuida-
do, sendo que as decisões no que se refere às normas sexuais e reprodutivas
estão nas mãos de homens. Por isso, as leis e políticas tendem a estabelecer
mais restrições à liberdade sexual e reprodutiva feminina, justificadas como
necessárias para o desenvolvimento saudável da população. Entretanto, do
ponto de vista dos direitos sexuais e reprodutivos femininos, o direito à esco-
lha pela interrupção da gravidez baseia-se no livre-arbítrio, na dignidade e na
liberdade (ANJOS et al., 2013).

FETO HUMANO DE TRÊS MESES

Fonte: Wikipedia (2020).

#PraCegoVer: Na imagem, há um feto humano de três meses, com a placenta. No feto é


possível observar a cabeça, os braços e as pernas. O feto é de coloração branca e o fundo é azul.

Outro dilema ético do aborto envolve o questionamento acerca da possibili-


dade de uso de diversos métodos contraceptivos disponíveis no mercado para
evitar a gravidez, que evitariam a necessidade do abortamento. Na contem-
poraneidade, o uso de métodos de anticoncepção é amplo e existem variados
tipos, como o anticoncepcional oral, DIU, camisinha, entre outros. Entretanto,
dados epidemiológicos indicam que o aborto ainda é utilizado como forma
de planejamento familiar, especialmente para mulheres em situação de po-
breza. Esses dados também mostram que a assistência ao planejamento fa-
miliar não funciona adequadamente no Brasil, o que justifica os índices ainda
elevados de aborto no país. Neste sentido, a assistência de saúde pública para

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Bioética

o planejamento familiar de qualidade é fundamental para prevenir a gravidez


indesejada e reduzir as práticas de aborto inseguro e, por conseguinte a mor-
talidade materna (SANTOS et al., 2013).
Apesar da disponibilidade de métodos contraceptivos, observa-se que quan-
tidade de mulheres que fizeram aborto é alta no Brasil e essa proporção au-
menta com a idade. Esse índice consiste em 6% para mulheres com idades
entre 18 e 19 anos e 22% entre mulheres de 35 a 39 anos, o que evidencia como
o aborto é prática comum na vida reprodutiva das mulheres. Nesse sentido, a
estimativa é que ocorram, anualmente, mais de um milhão de abortamentos
induzidos no Brasil (SANTOS et al., 2013).

Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil, os


procedimentos inseguros de interrupção voluntária
da gravidez levam à hospitalização de mais de 250
mil mulheres por ano, cerca de 15 mil complicações
e 5 mil internações de muita gravidade. O aborto
inseguro causou a morte de 203 mulheres em 2016,
o que representa uma morte a cada dois dias. Nos
últimos 10 anos, foram duas mil mortes maternas
por esse motivo. Veja mais, clicando aqui.

Esses dados revelam ainda outro importante aspecto ético do aborto, que é a
desigualdade de acesso aos procedimentos de abortamento com maior segu-
rança. Neste sentido, o ato de abortar de forma insegura pode ser considerado
uma injustiça social. As mulheres que apresentam condição social e econômica
mais alta conseguem realizar o procedimento com profissionais mais prepara-
dos, o que leva a menores riscos e complicações. Por outro lado, na maioria das
vezes, as mulheres em situação de pobreza recorrem ao aborto clandestino,
realizando o procedimento em condições inseguras, o que gera uma elevada
taxa de complicações pós-aborto e alto índice de internações hospitalares ou
até mesmo a morte. Estes efeitos danosos da clandestinidade e da criminali-
zação do aborto atingem principalmente mulheres mais vulneráveis, pobres e
negras, com baixa escolaridade e menor acesso à informação. Por isso, o abor-
to clandestino é considerado um problema de saúde pública no Brasil, sendo
uma importante causa de mortalidade materna no país (ANJOS et al., 2013).

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Bioética

Outro dilema ético do aborto se relaciona à possibilidade de realizá-los nos


casos em que o feto apresenta anomalias incompatíveis com a vida, quan-
do há grave risco para a saúde da mãe ou em caso de violência sexual. Em
qualquer um destes casos, enfrenta-se o dilema moral e religioso de inter-
rupção de uma vida, além da tese de que este tipo de permissão pode criar
precedentes para o aborto em outras situações, como demência e má forma-
ção congênita, casos em que há compatibilidade com a vida. Por outro lado,
existe o respeito à autonomia da mulher e seu direito de tomar suas próprias
decisões (BELARMINO; GONZALEZ; PILUSK, 2017).

PROTESTOS CONTRA A PERMISSÃO DO ABORTO EM CASO DE FETOS ANENCÉFALOS

Fonte: Wikipedia (2020).

#PraCegoVer: Imagem de várias pessoas em pé protestando em frente ao STF com faixas


com os dizeres: Anencefalia e artigo 5° da Declaração dos Direitos Humanos – Ninguém
será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

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6.2.3 ASPECTOS JURÍDICOS NACIONAIS E


INTERNACIONAIS EM RELAÇÃO À PRÁTICA DO
ABORTO
As legislações do mundo são variáveis quanto à autorização da realização do
aborto e quais casos são permitidos. A OMS reconhece a importância da prá-
tica de abortamento seguro como garantia social para as mulheres e método
de saúde pública para reduzir a morbimortalidade materna.
Segundo a OMS, as restrições legais à prática de aborto não ajudam a diminuir
o número de abortamentos e, inversamente, as leis que permitem o acesso
ao abortamento seguro não aumentam a taxa ou o número de abortamen-
tos. O principal efeito observado é permitir procedimentos legais e seguros,
que levam a uma redução da morbimortalidade materna. Neste contexto,
nos lugares onde as leis e as políticas permitem amplo acesso ao aborto, a in-
cidência e as complicações de um abortamento inseguro se reduzem. Ainda,
observa-se uma discrepância de legislação e acesso ao aborto seguro quan-
do se leva em consideração a economia do país. Apenas em 16% dos países
em desenvolvimento o aborto é permitido por razões sociais ou econômicas,
em comparação com 80% dos países desenvolvidos. Por isso, a proporção de
mortalidade materna devido a um abortamento inseguro costuma ser mais
alta nos países com restrições importantes e mais baixa nos países onde as
mulheres têm livre acesso a serviços seguros de abortamento.
À exceção de Malta, na União Europeia, todos os países permitem a interrup-
ção da gravidez em diferentes circunstâncias. Alguns, principalmente de tra-
dição religiosa, como a Irlanda, permitem o aborto apenas em caso de risco
para a vida da mãe. Entretanto, na maior parte dos países europeus, o aborto
é permitido por escolha da mulher nas primeiras semanas de gravidez. Na
Alemanha, como na maioria dos países, o limite é de 12 semanas, sendo ne-
cessário passar por um aconselhamento profissional antes de abortar.

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Bioética

Recentemente, em 2020, a Argentina aprovou


legislação permitindo o aborto por interesse da
mulher e toda gestante passou a ter acesso ao
procedimento no sistema de saúde, de forma
gratuita e segura, até a 14ª semana de gestação.
Veja mais, clicando aqui.

No Brasil, o aborto voluntário é considerado crime, sendo tipificado no código penal.


Segundo os artigos 124, 125 e 126 do Código Penal brasileiro (BRASIL, 2017),

Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante:  
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é
maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento
é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

Para o Código Penal (BRASIL, 2017), ape-


nas não se pune o aborto praticado por
médico quando não há outro meio de
salvar a vida da gestante ou se a gravi-
dez resultar de estupro. Sendo, neste úl-
timo caso, necessário o consentimento
da gestante ou, quando incapaz, de seu
Saiba mais representante legal. Embora não esteja
expressa no regulamento legal, há ain-
O Código Penal brasileiro
da uma terceira situação que autoriza o
vigente atualmente, é o
decreto lei 2.848, de 1940, aborto. Este caso deriva de um enten-
criado pelo presidente Getúlio dimento do Supremo Tribunal Federal
Vargas durante o período do que permite a interrupção terapêutica
Estado Novo (BRASIL, 2017).
da gestação quando o feto for anencé-
falo, já que é uma condição incompatí-
vel com a vida. Logo, apenas nestas três situações a gestante pode realizar o
aborto legal, com amparo do governo, gratuitamente pelo SUS.

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6.3 TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS


O transplante de órgãos consiste no procedimento de retirada de um órgão
com defeito e sua troca por outro sadio doado por um paciente em morte
encefálica. O procedimento permite que pessoas com doenças graves e gran-
des chances de morte tenham sobrevida considerável e possam ter qualida-
de de vida, voltando a seus afazeres normais. Os diversos avanços em tecnolo-
gias médicas tornaram a técnica de transplante de órgãos um procedimento
comum na prática de sistemas de Saúde e, no Brasil, o transplante é feito
gratuitamente no âmbito do SUS. O processo inicia-se com a aceitação da
família do possível doador em doar os órgãos. Em seguida, o receptor com-
patível passa pelo procedimento cirúrgico em centros de saúde especializa-
dos. A doação segue uma fila única em
todo o país, que considera critérios de
gravidade e compatibilidade. Apesar de
ser um procedimento muito importan-
te na prática médica e propiciar inúme-
ros benefícios ao paciente em estado
grave, o transplante ainda envolve vá-
rios dilemas éticos. Estas polêmicas se
relacionam, principalmente, a questões Saiba mais
religiosas e filosóficas, além da falta de
Para compreender melhor a
conhecimento acerca do procedimen- importância da doação
to. As principais normas que regulam de órgãos, leia o texto,
o transplante e a doação de órgãos no clicando aqui.
Brasil são as leis 9.434/1997 e 10.211/2001
(BRASIL, 1997; 2001).

6.3.1 A DOAÇÃO DE ÓRGÃO NO BRASIL


O transplante de órgãos é um procedimento cirúrgico que consiste na remo-
ção de um órgão ou tecido danificado (coração, pulmão, rim, medula óssea) e
sua substituição por outro normal de um doador vivo ou morto. A maior parte
das doações é feita por um doador com morte encefálica, mas para alguns
órgãos é possível fazer a doação em vida, pois o doador consegue viver sem
eles. Como é o caso da doação de um rim, um pedaço do fígado, uma parte
do pulmão e da medula óssea.

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Bioética

A doação de órgãos e o transplante são importantes garantias de saúde pú-


blica, pois o procedimento viabiliza que um paciente em estado grave e risco
de morte iminente possa retornar a suas atividades normais, com reinserção
ao mercado de trabalho e considerável sobrevida pós-transplante. Portanto,
o transplante de órgãos é uma garantia de direitos sociais, como o direito à
saúde (VICTORINO; VENTURA, 2016).
No Brasil, o transplante de órgãos é realizado pelo Sistema Único de Saúde
(SUS), gratuitamente, sendo um procedimento comum nos serviços de saú-
de. Para que a doação aconteça, deve ser atestada a morte encefálica do doa-
dor. Em seguida, a família é responsável pela decisão final de doar os órgãos.
No caso de doação em vida, o doador deve ser maior de idade e capaz juri-
dicamente, sendo possível doar para familiares. No caso de doador vivo não
aparentado, é necessária autorização judicial. Após o aceite da família para
a doação, a Central de Transplantes do Estado é comunicada e, por meio do
registro em lista de espera, seleciona os receptores compatíveis. No Brasil, há
uma lista única de receptores, com vários cadastros separados por órgãos e
critérios de compatibilidade. A ordem da lista é seguida com total rigor e con-
trolada pela Secretaria de Saúde. Além disso, a doação é confidencial, não
sendo possível à família do doador nem ao receptor conhecer a identidade
um do outro. O Brasil ainda conta com o Sistema Nacional de Transplante,
que controla as centrais de transplante estaduais e organiza as atividades de
transplante no país.
A posição na lista única de receptores é definida por critérios como tempo
de espera, urgência do procedimento e gravidade do caso. A lista também
leva em consideração os critérios de compatibilidade entre doador e receptor,
que vão desde o tamanho do órgão a tipo sanguíneo e compatibilidade imu-
nológica. Para isso, são feitos diversos exames laboratoriais tanto no receptor
quanto no doador.
Um importante fator para o sucesso do transplante de órgãos é o menor tem-
po de isquemia (tempo sem circulação sanguínea) ao qual o órgão é subme-
tido. Por isso, é necessária uma organização logística adequada para facilitar
o transporte do órgão, realizado pelo Sistema Nacional de Transplantes. No
Brasil, as listas de espera são organizadas pelas Centrais Estaduais de Trans-
plante em cada uma das 27 unidades da federação. Quando um doador é
identificado, os dados são cruzados na fila única de pacientes aguardando
por órgãos, a fim de localizar o melhor candidato, levando em consideração o

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Bioética

local de origem do doador e o tempo de deslocamento do órgão, sempre res-


peitando a ordem da fila. Caso não haja um receptor no local de origem do
doador, o deslocamento deve ser realizado para outro Estado. Para tanto, o
Ministério da Saúde, em conjunto com a
Aeronáutica, a Infraero e empresas aé-
reas, firmaram um acordo de parceria
para a mobilização e transporte de ór-
gãos para transplante.
Após o transplante, os pacientes preci-
sam manter o acompanhamento médi-
co e fazer uso de medicamentos especí-
Curiosidade
ficos imunossupressores, para bloquear
o sistema imune e evitar a rejeição do O tempo de isquemia varia
entre os órgãos, sendo de 4
órgão. Tanto o atendimento médico,
horas para o coração, 4 a 6
quanto os medicamentos são também horas para o pulmão, 12 horas
fornecidos gratuitamente pelo SUS. para o fígado e 48 horas para o
rim. Veja mais, clicando aqui.
Segundo o Ministério da Saúde, um dos
principais fatores que reduz a doação de
órgãos é a baixa taxa de autorização da família dos possíveis doadores: apenas
cerca de metade das famílias aceita doar os órgãos do parente falecido. Assim,
verifica-se que o número de órgãos disponíveis para transplante não corres-
ponde ao número de pessoas aguardando na lista de espera, o que resulta em
um elevado número de mortes ainda na fila. Por isso, o ministério orienta que
as pessoas avisem suas famílias em vida sobre o desejo de serem doadoras, a
fim de aumentar a adesão na doação de órgãos (VICTORINO; VENTURA, 2016).

Segundo a Associação Brasileira de Transplante de


Órgãos, em 2019, 39.469 pessoas ingressaram na
lista de espera por algum órgão, sendo que 2.484
delas morreram aguardando a doação. Veja mais
informações, clicando aqui.

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6.3.2 OS DILEMAS BIOÉTICOS QUE ENVOLVEM


A DOAÇÃO DE ÓRGÃOS
Em função das inovações tecnológicas e avanços biomédicos, o transplante
tornou-se prática comum nos serviços de saúde. Apesar de ser um importan-
te procedimento médico, com aumento da sobrevida e melhoria da qualida-
de de vida de pacientes com doenças graves, o transplante ainda enfrenta
dilemas bioéticos, especialmente relacionados à doação e caracterização de
morte encefálica.
Por lidar com a vida e a morte humana, o processo de doação de órgãos susci-
ta questionamentos filosóficos e religiosos. Classicamente, a morte é conside-
rada pelo critério cardiorrespiratório, que consiste na cessação irreversível da
respiração e circulação. No entanto, os avanços em medicina levaram a uma
mudança na classificação de morte, que passou a considerar o critério neu-
rológico, que consiste na morte encefálica, que expressa a perda irreversível
das funções vitais do sistema nervoso central. Portanto, houve uma evolução
histórica do conceito de morte. Entretanto, apesar disso, ambos critérios coe-
xistem, sendo o critério neurológico utilizado em ambiente intra-hospitalar e
o cardiorrespiratório em outras circunstâncias (COHEN; OLIVEIRA, 2020).
O fato de o critério neurológico ainda suscitar questionamentos religiosos e
filosóficos dificulta a doação. Muitas famílias ainda têm receio de aceitar a
doação porque mesmo quando as funções cerebrais param de funcionar, se
a pessoa estiver conectada a aparelhos, o coração continua batendo, o que
pode levar a uma falsa impressão de que a pessoa está em coma. Entretanto,
o desenvolvimento das técnicas de transplantes de órgãos e tecidos signifi-
cou um avanço fundamental na prática médica no século XX, possibilitado,
principalmente, pela aceitação ética e científica do diagnóstico de morte en-
cefálica (COHEN; OLIVEIRA, 2020; VICTORINO; VENTURA, 2016).
Outro questionamento ético da doação de órgão envolve a natureza gratuita
ou onerosa do transplante. O pagamento pela doação é condenado pela
maioria das sociedades nacionais e internacionais de transplante de órgãos.
Isso porque uma sociedade desigual favorece o comércio de órgãos, especial-
mente de pessoas pobres. No Brasil, o procedimento é gratuito e o doador
não recebe nada pela doação, que segue uma fila única. Entretanto, em al-
guns países de extrema pobreza, como Bangladesh, o tráfico ilegal de órgão,
especialmente rins, ainda acontece.

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Bioética

Um aspecto relevante do transplante


de órgãos diz respeito à liberdade de
decisão quanto à doação. No Brasil, a
decisão cabe à família da pessoa em
que foi constatada a morte encefálica.
Entretanto, muito se questiona acerca
da possibilidade de tornar todos os in-
divíduos doadores de órgãos. Por um Curiosidade
lado, não seria necessário o consenti- Veja mais informações sobre
mento de cada doador e o número de o comércio ilegal de rins em
doadores seria maior, mas, por outro Bangladesh, clicando aqui.
lado, esbarra-se em direitos fundamen-
tais como a liberdade individual. Neste
contexto, nos países onde a pena de morte é permitida, há também um ques-
tionamento sobre a doação compulsória de presos que foram condenados à
morte. Este tipo de doação enfrenta aspectos éticos e morais, especialmente
relacionados à dignidade da pessoa humana e direitos humanos.
A doação de órgãos também envolve muitas dúvidas, tabus e mitos, princi-
palmente pela falta de conhecimento e esclarecimento da população acer-
ca do procedimento. Por isso, os altos índices de recusa em doar os órgãos
vistos no Brasil. As principais dúvidas e questionamentos que dificultam o
consentimento das famílias envolvem o diagnóstico de morte encefálica e a
aparência e desfiguração do corpo. Aspectos éticos também podem influen-
ciar no consentimento, como as crenças e valores, bem como o acolhimento
e disponibilidade dos profissionais de saúde no momento da entrevista. Por
isso, ressalta-se a importância da capacitação desses profissionais para abor-
dagem e esclarecimento das famílias, a fim de garantir maior aceitação na
doação de órgãos (PESSALACIA; CORTES; OTTONI, 2011).
Nesse sentido, algumas religiões e crenças limitam a possibilidade de adesão
à doação, principalmente quando avaliam a morte relacionada à parada do
coração e apresentam rituais sagrados ligados ao corpo falecido. Em algumas
tradições budistas, por exemplo, a morte é definida por critérios diferentes
daqueles da medicina ocidental. Por isso, enquanto muitas pessoas esperam
por longos períodos por um órgão para salvar suas vidas, milhares morrem
todo ano de acidentes e seus órgãos sadios poderiam ser implantados na-
queles que esperam pelo transplante. No entanto, cerca de metade das famí-
lias de potenciais doadores recusam o procedimento (FERRAZZO et al., 2011).

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Bioética

O Ministério da Saúde cria campanhas para


conscientização acerca da doação de órgãos e uma
delas é o setembro verde. Veja mais informações,
clicando aqui.

6.3.3 ASPECTOS JURÍDICOS QUE REGULAM AS


DOAÇÕES DE ÓRGÃOS NO BRASIL
O processo de doação de órgãos e transplante está sujeito a diversos ques-
tionamentos e dilemas bioéticos, que se refletem nas legislações. No Brasil,
as principais normas que regulamentam o procedimento são a Lei 9.434, de
1997, que dispõe sobre a doação de órgãos, tecidos e partes no país e a Lei
10.211/2001, que altera dispositivos da Lei 9.434 (BRASIL, 1997; 2001).

RECONSTITUIÇÃO DO PRIMEIRO TRANSPLANTE DE CORAÇÃO HUMANO, REALIZADO EM


1967

Fonte: Wikipedia (2020).

#PraCegoVer: Na imagem, é possível observar vários profissionais de saúde paramentados e


em pé em uma sala de cirurgia. Em uma das mesas há diversos instrumentos cirúrgicos e,
no primeiro plano da imagem, pode-se observar 4 toalhas cirúrgicas sujas de sangue.

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A Lei n. 9.434/97 regulamenta a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo


humano para fins de transplante e tratamento. Segundo esta norma, o trans-
plante é gratuito no país, sendo realizado somente em estabelecimentos de
saúde, público ou privado, e por equipes médico-cirúrgicas de remoção e
transplante previamente autorizadas pelo órgão de gestão nacional do SUS.
A norma ainda dispõe que a retirada dos tecidos e órgãos destinados a trans-
plante deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica constatada e
registrada por dois médicos, com a utilização de critérios clínicos e tecnológi-
cos definidos pelo Conselho Federal de Medicina (COHEN; OLIVEIRA, 2020).
A Lei n. 9.434/97 também tipifica os crimes relacionados ao transplante, como
a remoção de órgãos e tecidos de pessoa ou cadáver em desacordo com a lei,
com pena de reclusão de dois a seis anos e multa. Se o crime for cometido
mediante pagamento ou recompensa, a pena passa para reclusão de três a
oito anos, além de multa. Caso o crime seja realizado em pessoa viva, a pena é
mais gravosa, podendo chegar à reclusão de 20 anos. O crime de comprar ou
vender órgãos e tecidos gera uma pena de reclusão de três a oito anos e mul-
ta (COHEN; OLIVEIRA, 2020).
A Lei n. 10.211 alterou dispositivos da Lei
n. 9.434, revogando o art. 2º, o qual tra-
tava da manifestação relativa à retirada
após a morte de tecidos, órgãos e par-
tes, vontade constante na Carteira de
Identidade Civil e da Carteira Nacional
de Habilitação. Com a alteração, a deci-
são de doação dos órgãos deixou de ser
Saiba mais
vinculada à vontade constante no docu-
mento de identificação e passou a ser A Associação Brasileira de
Transplantes de Órgãos
necessário o consentimento da família
(ABTO) é uma sociedade
após o diagnóstico de morte encefáli- médica, civil e sem fim
ca. Neste sentido, a lei 10.211 prevê que a lucrativo, que tem por
retirada de órgãos para transplante de- finalidade estimular o
desenvolvimento de todas
pende de autorização do cônjuge ou pa-
as atividades relacionadas
rente maior de idade, obedecida a linha à doação e transplante de
sucessória até o segundo grau, firmada órgãos no Brasil. Saiba mais,
em documento subscrito por duas tes- clicando aqui.
temunhas presentes na verificação da

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Bioética

morte. A norma também dispõe que o transplante só pode ser realizado com
consentimento expresso do receptor inscrito em lista única de espera, após
aconselhamento sobre os riscos do procedimento (COHEN; OLIVEIRA, 2020).

CONCLUSÃO

Esta unidade apresentou uma análise bioética em medicina, abordando o


aborto e o transplante de órgãos. Observamos que o aborto é a interrupção
da gestação antes que o feto seja viável, que o induzido pode ser realizado por
técnicas cirúrgicas ou medicamentosas e analisamos os questionamentos
éticos acerca do tema, que envolvem aspectos morais, religiosos, ideológicos
e culturais. Nesse contexto, vimos que as mulheres vulneráveis, que apresen-
tam situação econômica de maior pobreza, tendem a realizar o procedimen-
to de forma clandestina, apresentando maior morbimortalidade. Também
abordamos que o aborto é crime no Brasil, exceto se a gravidez resultar de
estupro, se colocar em risco a vida da mãe ou se o feto for anencéfalo.
Também analisamos os principais aspectos da doação de órgãos e do proce-
dimento de transplante no Brasil, realizado gratuitamente pelo SUS e que a
seleção do receptor segue fila única em todo o país, considerando critérios de
gravidade e compatibilidade. Ainda abordamos os dilemas éticos em doação
de órgãos, que envolvem, principalmente, questões religiosas acerca da mor-
te e a falta de conhecimento da população em geral sobre o procedimento.
Vimos que as principais normas no país que regulamentam a doação de ór-
gãos são a Lei 9.434 e a Lei 10.211/2001.

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