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Introdução
O ser humano é essencialmente um ser relacional. Para ocorrência do processo de
socialização ao qual passa todos os seres humanos, é exigida a presença do outro. Esse
processo é gradual e se inicia, desde os primeiros anos de vida. Transferência e
contratransferência são conceitos centrais na compreensão da relação terapêutica nas
diversas vertentes da psicanálise. Esses constructos sofreram grandes modificações
conceituais no decorrer da extensa obra freudiana.
A transferência surge do contato emocional dos pacientes com a situação analítica e
por se tratar de uma relação dinâmica, é algo vivo. Por outro lado, sabemos que a
transferência leva o analista a apresentar uma resposta emocional frente ao seu
paciente. É preciso destacar que esse encontro envolve duas pessoas, duas vivências.
Desse relacionamento surgirão afetos, sentimentos, vivências inconscientes que vão
engendrar mutualidade, tratamento relacional que está inserido no âmbito da
intersubjetividade. Assim sendo – paciente e analista –, estão irremediavelmente vivos.
Dessa forma, consideramos o efeito da presença na vida psíquica de cada participante
do encontro. Estamos, portanto, não só no domínio do intrapsíquico. (PALHARES, 2008)
A oposição transferência x contratransferência constitui, por conseguinte, o eixo
essencial do processo analítico. Assim sendo, a teoria da transferência se articula
necessariamente com a da contratransferência.
“Freud sempre deixou claro que o domínio desse assunto era conseqüência da
experiência clínica e, acima de tudo, da própria análise do analista, tida por ele como uma
“necessidade fundamental” de todo psicanalista militante.” (LÖSCH, s.d.)
Objetivo
O objetivo desse artigo é de examinar os conceitos de Transferência e
Contratransferência como constructos presentes no discurso psicanalítico Freudiano e
Pós-Freudiano, bem como sua importância na clínica psicanalítica.
1. A Transferência
1.1. Histórico
O termo "transferência" foi utilizado pela primeira vez por Freud em 1895, como uma
forma de resistência, ou seja, um obstáculo ao processo analítico, como meio de
evitação aos conteúdos da sexualidade infantil que ainda permanece ligada às "zonas
erógenas", as quais, na evolução normal, já deveriam estar desligadas. (ISOLAN, 2005)
Foi em 1912 que Freud publicou a primeira obra exclusivamente dedicada à
transferência, denominada “A dinâmica da transferência”, na qual explica como a
transferência é necessariamente relacionada ao tratamento psicanalítico. FREUD
enfatiza que a transferência não se deve ao tratamento psicanalítico, mas é devido à
neurose. O autor explica que se a necessidade de amar de algum indivíduo não é
totalmente satisfeita pela realidade, ele irá se aproximar de cada pessoa que conhecer
inclusive o médico. Por isso, para ele, a transferência é um dos elementos fundamentais
para caracterizar o método de tratamento psicanalítico. (BARTOLOMEI, 2008)
Freud, no inicio de seu trabalho, tentava explicar às pacientes o que ele percebia; ele falava para
elas como se instalavam os conflitos e como elas estavam vivendo esta briga interna. Mas muito
cedo, e isto aconteceu ainda quando trabalhava com Breuer, percebeu que as pacientes viviam
desejos intensos para com o médico. O próprio Breuer, tomado de surpresa por Ana O., quase teve
seu casamento desmoronado. Havia então um fenômeno típico, perigoso com o qual era preciso
se acautelar. (ANDRADE, s.d.)
No caso Dora, ficou bem claro para Freud que o rompimento do trabalho depois de
apenas três mêses de análise, ocorreu por causa dos desejos intensos da paciente e
que ele não percebeu em tempo e não mostrou a ela. Havia os sintomas histéricos de
Dora, mas, diz Freud, surgiu um novo sintoma: a transferência.
1.2. Conceito
De acordo Isolan (2005), Freud conceitualiza a transferência ao afirmar que:
Transferências são reedições, reduções das reações e fantasias que, durante o avanço da análise,
costumam despertar-se e tornar-se conscientes, mas com a característica de substituir uma
pessoa anterior pela pessoa do médico. Dito de outra maneira: toda uma série de experiências
psíquicas prévias é revivida, não como algo do passado, mas como um vínculo atual com a pessoa
do médico. Algumas são simples reimpressões, reedições inalteradas. Outras se fazem com mais
arte: passam por uma moderação do seu conteúdo, uma sublimação. São, por tanto, edições
revistas, e não mais reimpressões. (FREUD, 1969. v. 7, p. 109-19)
Bion (2000) diz que a importância da transferência está em seu uso na prática da
psicanálise e que ela deve ser observada tanto por analisandos como por analistas, essa
é a sua força e sua fraqueza. A sua força é devido a estar disponível às duas pessoas e,
portanto, passível de ser discutido por elas; sua fraqueza, porque o fato é inefável e não
pode ser discutido por mais ninguém”.
Segundo Laplanche e Pontalis (2001), a transferência é entendida como: O processo
pelo qual desejos inconscientes se atualizam sobre determinados objetos no quadro de
um certo tipo de relação estabelecida com eles e, eminentemente, no quadro da
situação analítica. Trata-se aqui de uma repetição de modelo infantil vivido com um
sentimento de atualidade acentuada.
“Freud postula que o paciente não recorda coisa alguma do que esqueceu e reprimiu, mas
expressa-o pela atuação, ou seja, ele reproduz o reprimido não como uma lembrança, mas
como uma ação repetitiva e inconsciente.” (ISOLAN, 2005)
“Foi apenas em 1909 que Freud parou de considerar a transferência como algo contra-
produtivo para o processo analítico. Pois, até então, a transferência era considerada um
obstáculo para a análise, uma resistência do paciente.” (LÖSCH, s.d.)
2. Contratransferência
2.1. Histórico e Conceito
É sabido que FREUD não deixou nenhum estudo sistematizado sobre a
contratransferência, embora tenha reconhecido a sua existência e a necessidade de
mantê-la sob rigoroso controle, a fim de evitar os seus perigos.
Castro (2005) diz que em 1910, surgiu o conceito de contratransferência, como sendo
uma reação do analista provocada pela transferência do paciente, e, como tal, algo a ser
superado ou ultrapassado para que o analista volte a trabalhar em condições
adequadas. No trabalho de 1912, Freud conclui que o médico tenta compelir o paciente
a ajustar seus impulsos emocionais ao nexo do tratamento e da história de sua vida,
submetendo-os à consideração intelectual e a compreendê-los à luz de seus valores
psíquicos. E que “esta luta, entre o médico e o paciente, entre o intelecto e a vida
instintual, entre a compreensão e a procura da ação, é travada, quase exclusivamente nos
fenômenos das transferências”.
Segundo Isolan (2005), a contratransferência inicialmente passou pelas mesmas
vicissitudes da transferência, sendo vista como uma manifestação indesejável no
tratamento. O conceito de contratransferência foi introduzindo por Freud que o definiu
como sendo aquilo que "surge no médico como resultado da influência que exerce o
paciente sobre os seus sentimentos inconscientes". (FREUD, 1969, p.125-36)
Segundo Laplanche e Pontalis (2001) o fenômeno da contratransferência se ampliou
depois de Freud, principalmente a medida em que o tratamento foi sendo compreendido
enquanto uma relação e também com a expansão da psicanálise a novos campos, a
análise de pacientes psicóticos e de crianças, onde as reações inconscientes do analista
podiam ser mais solicitadas.
Após Freud, o conceito tomou novas conotações, ampliando consideravelmente a sua
compreensão. Pode-se dizer que quase cada autor que escreveu sobre o fenômeno da
contratransferência nestas últimas décadas, apresentou sua própria versão. Há desde os que
consideram como contratransferência a totalidade das reações do analista como relação ao
paciente, aos que limitam o conceito às respostas eliciadas pela contratransferência do paciente,
sem falar na concepção atualmente mais divulgada, segundo a qual a contrantransferência
compreende as reações oriundas do inconsciente do analista, vinculadas experiências da infância
do analista, projetadas na relação analítica. (ANDRADE, 1983)
De acordo com Isolan (2005), como na transferência, a primeira reação de Freud foi
sentir a contratransferência como algo inadequado, um obstáculo a ser evitado. Diz ele
que "nos sentimos quase inclinados a insistir em que ele deve reconhecer esta
contratransferência existente em si mesmo e superá-la". (FREUD, 1969, p.125-36)
O desenvolvimento do conceito de contratransferência começou a surgir quando foi
considerado em seus aspectos positivos, principalmente como meio importantes de
compreensão do inconsciente do analisando. A reação ou atitude contratransferencial
deixou de ser considerada como um simples obstáculo, e a sua natureza terapêutica
passou a ser reconhecida e valorizada. (ANDRADE, 1983)
Conclusão
Transferência e contratransferência são conceitos centrais na compreensão da relação
terapêutica nas diversas vertentes da psicanálise. Desde o início de sua prática clínica,
Freud depara-se com a dinâmica da transferência. Podemos entender e concluir que a
Transferência foi considerada por Freud um instrumento central de todo tratamento
analítico e foi reconhecendo, gradativamente que os pacientes repetiam na sua relação
com o médico (psicanalista) aquilo que tinha vivido na infância com outras pessoas.
A contratransferência, um dos conceitos fundamentais do campo analítico, é uma das
mais complexas e controversas entre as diferentes correntes psicanalíticas e,
permanece ainda hoje problemática. A partir dos textos descritos por alguns teóricos a
contratransferência é uma reação inevitável causada no analista. Quanto mais analisado
ele for, menos ele sucumbirá aos efeitos contratransferenciais.
Fonte: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/transferencia-e-contratransferencia