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O que é, afinal, a arte?

Que características devem apresentar os objetos e as múltiplas


expressões humanas para serem considerados artísticos? Podemos apresentar uma
definição consensual deste conceito? Ou será que o conceito de arte nem sequer pode ser
definido?
Devido à diversidade das obras artísticas, assim como à discussão não consensual tanto da
opinião pública, como dos filósofos sobre a definição de arte e a distinção entre boa e má
arte, este continua a ser um problema filosófico relevante nos dias de hoje.
Foquemo-nos nestes dois exemplos:
O quadro da Monaliza, pintado por Leonardo da Vinci, é visto como uma obra de arte e até
mesmo como uma obra prima. Mas o que faz desta pintura um objeto artístico? Será
porque é um retrato bem pintado e fiel à realidade? Ou será porque os museus a
consideram uma obra de arte? De qualquer forma parece consensual tratar-se de uma obra
de arte.
Reparemos agora nesse exemplo: a fonte de Marcel Duchamp. Podemos considerar que
este objeto é uma obra de arte? Porque é que alguns consideram este objeto arte e outros
não?
Diversos filósofos tentaram responder a estas perguntas, procurando encontrar critérios ou
parâmetros que permitissem distinguir o que é arte daquilo que não o é, tendo surgido
diversas teorias.
Assim, essas teorias resumem-se em essencialistas ou não essencialistas.
As primeiras, motivo deste artigo, são teorias da arte que afirmam a existência de
propriedades essenciais ou intrínsecas comuns a todas as obras de arte.
Esta teoria subdivide-se, assim, em três teorias: a teoria da arte como representação da
natureza, a teoria da arte como expressão de sentimentos e a teoria da arte como forma
significativa.

A primeira teoria, a teoria da arte como representação, é uma das mais antigas teorias da
arte, sendo o objetivo do artista, consoante esta teoria, copiar o objeto o mais fielmente
possível como se fosse um espelho da realidade, ou seja, para esta teoria, uma obra é arte,
se e só se, imitar algo.
Deste modo, esta teoria apresenta um poder explicativo bastante grande, um critério de
classificação das obras de arte bastante rigoroso, permitindo-nos distinguir, com certa
facilidade, o que é ou não obra de arte, e apresenta também um critério valorativo das
obras de arte, o que nos possibilita diferenciar as boas das más obras de arte. Seguindo este
pensamento, no caso de uma pintura, quanto mais semelhante à realidade, mais valiosa é
ou seja, quanto maior for a ilusão da realidade provocada pela obra a quem a observa,
melhor será para o artista que a concebeu.
Mas será esta uma boa teoria?
Na minha ótica não.
Até é bastante fácil provar que não se trata de uma boa teoria. Não precisamos de procurar
muito para percebermos que, apesar de muitas obras de arte imitarem algo, são inúmeras
aquelas que não o fazem. Exemplos dessas obras estão no ramo da música ou da literatura,
onde é bastante improvável que haja alguma obra musical ou literária que imite seja o que
for, outro exemplo é a arte abstrata (quadro de Kandinsky).
Outra objeção a esta teoria é que se fosse adotada, muito do que hoje consideramos arte,
deixaria de o ser visto que não preenchem tal requisito, sendo esta teoria demasiado vaga e
subjetiva para distinguir o que é ou não arte.
Um novo motivo para não ser considerada uma boa teoria é o simples facto de o critério
valorativo falhar. Existem obras que imitam algo mas que se torna impossível saber se se
tratam de boas ou más obras, é exemplo A Escola de Atenas, de Rafael. Como podemos
saber se A Escola de Atenas, reproduz com perfeição as figuras de Platão e Aristóteles?
Pois bem, assim sendo não acredito que esta seja uma boa teoria como definição de arte.

Mais tarde, insatisfeitos com a teoria da arte como imitação, surgiu outra tentativa de
definir arte, esta afirmava que arte era a expressão de emoções. Esta concessão foi
desenvolvida pelo romantismo e valoriza especialmente a criatividade do artista.
Defendia que através da arte era possível exprimir de uma forma clara e libertadora as
emoções que dominam o nosso pensamento.
Vejamos como exemplo o pensamento de Tolstoi. Este escritor sugeria que numa obra de
arte o artista cria algo que exprime genuinamente o que está a sentir, por exemplo, medo,
alegria, angústia, esperança, etc. O objetivo do artista ao criar uma obra a partir das suas
emoções, para além de se expressar, é fazer com que as pessoas se identifiquem e acima de
tudo que desperte nelas algumas das emoções que a obra tenta passar.
O artista não se limita a criar algo que descreva os sentimentos, mas sim algo que faça os
outros seres humanos refletirem e partilhar da mesma emoção que o levou a criar algo.
Assim sendo, esta teoria, tal como a outra, apresenta um critério que permite, com algum
rigor, classificar se certos objetos são ou não arte, apresentando também um critério
valorativo.
Mas volto a fazer a mesma questão. Será esta uma boa teoria para definir arte?
De certa forma e em comparação com a teoria representacionista, esta é, a meu ver, uma
melhor definição de obra de arte no entanto ainda bastante insatisfatória.
Em primeiro lugar, tal como na outra teoria, é facilmente encontrada uma obra de arte que
não tenha necessariamente os sentimentos do artista expressos nela e que, mesmo assim,
seja considerada uma obra de arte.
Seguidamente, e também de acordo com a outra teoria, o critério de classificação e de
valorização encontra-se deficitário. Como podemos nós saber se uma determinada obra
exprime correctamente as emoções do artista que a criou, quando o artista já morreu há
séculos? E as obras de autores anónimos ou desconhecidos não são boas nem más?
Deste modo, considero que a teoria expressivista não é uma boa definição de arte.

A teoria como forma significativa defendida, entre outros, pelo filósofo Clive Bell, foi mais
uma das tentativas de definir arte, considerando que não se deve começar por procurar
aquilo que define uma obra de arte na própria obra, mas sim no sujeito que a aprecia.
Assim sendo, para esta teoria, uma obra é arte se e só se provocar emoção estética no
expectador.
De acordo com a definição dada, percebemos que a condição de provocar condição estética
torna-se, assim, condição necessária para que um objeto seja considerado obra de arte.
Deste ponto surge a questão: se essa emoção estética é provocada apenas pelas obras de
arte, não terá de haver alguma propriedade, peculiar a todas as obras de arte, capaz de
provocar tal emoção estética nas pessoas? Clive Bell responde que sim e diz que é a forma
significante.
Mas o que é essa forma significante?
É a combinação de linhas e cores, do ritmo com os movimentos ou dos traços e contornos.
E como é que identificamos a forma significante dos objetos artísticos?
É necessário recorrer a aspetos como o equilíbrio, a harmonia, a coerência, entre outros.
Coloco novamente a mesma questão. Será esta uma boa teoria como definição de arte?
Tal como as outras teorias, esta também apresenta dificuldades.
Anteriormente, concluímos que a emoção estética é produzida pela forma significante, no
entanto a forma significante é aquilo que produz a emoção estética, tratando-se de uma
falácia.
Assim, depois desta reflexão, podemos questionar-nos novamente: O que é, afinal, a arte?
É, agora, evidente que não existe uma definição concreta e universal de arte, tendo todas as
teorias essencialistas falhado em certos pontos.

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