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Débora Rana
O primeiro ponto a explorar será uma breve reflexão sobre os limites do conceito
de arte, constatando-se a ausência de um critério absolutamente rigoroso a partir do qual
nos seja possível distinguir objetos artísticos de não artísticos. Esta questão «O que é a
arte?» tem sido importante não só no campo da estética como também na prática artística.
De facto, muitos são os exemplos que ficam por responder quando pretendemos de uma
forma segura determinar o que é ou não é arte. A velha ideia de que todas as obras de arte
têm de resultar das mãos do artista, ou que têm de ser esteticamente belas e aprazíveis ou
emocionalmente intensas, passou a ser difícil de ser sustentada assim que obras como a
Fonte (1917) de Marcel Duchamp (1887-1968) passaram a estar no mundo das artes.
Atualmente, e sobretudo a partir do século XX, vemo-nos numa grande encruzilhada
parecendo que tudo e mais alguma coisa pode ser arte.
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Para Platão a arte é mimesis, este termo pode e deve ser traduzido por imitação. Importa, contudo,
salientar que enquanto para Platão a mimesis tem um sentido negativo, entendendo-a como um
simulacro da verdadeira realidade, Aristóteles atribui-lhe um sentido positivo e entende-a como
representação da realidade. (Filosofia 10, 2017)
constantemente bombardeados com uma tamanha diversidade de objetos que parecem pôr
em causa a nossa noção do que é arte. Hoje mais do que nunca vemo-nos forçados a
perguntar «Mas afinal o que é a arte?», parecendo que a cada minuto surge um novo
objeto que adivinha novas estruturas, novas perceções, novas perspetivas, novos materiais
e novas formas de expressão. Por esse motivo, vale certamente a pena procurar perceber
se existem ou não determinadas características que um objeto deve possuir de maneira a
elevar-se ao estatuto de um objeto artístico. Dito de outra maneira: dada a importância
deste problema, é justo da nossa parte procurar perceber que condições necessárias e
suficientes deve um determinado artefacto humano possuir para que possa ser
considerado como uma obra de arte. Ora, isto é precisamente aquilo a que pretendemos
responder a partir de duas posições diferentes – a teoria formalista e a teoria expressivista
da arte.
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Ideia defendida por Morris Weitz (1916-1981).
começaremos por explorar a teoria defendida pelo crítico e filósofo de arte britânica Clive
Bell. Conhecida a sua tese e as objeções que lhe são apontadas, passaremos, de imediato,
à análise da teoria defendida por R. G. Collingwood. Exploradas ambas as posições
propor-se-á um estudo relativo às diferenças teóricas entre os autores, permitindo aos
alunos assimilar as disparidades teóricas da noção formalista com a noção expressivista
da arte.
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Tal como fazem os expressivistas
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Warburton, 2007.
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Almeida, 2000
Clive Bell ao abandonar a ideia de que existe uma característica que possa ser
diretamente encontrada em todas as obras de arte, diz-nos de forma bastante clara que
devemos começar por procurar essa característica não na obra mas no sujeito que a
contempla. Isto não quer dizer que para ele não exista uma característica comum a todas
as obras de arte, simplesmente sublinha que se essa característica existe ela só é possível
de ser identificada tendo em consideração uma determinada emoção que é provocada em
quem a aprecia. De maneira a clarificar a posição do autor, é importante esclarecer que
por forma significante devemos entender algo que resulta das relações e combinações de
linhas, cores e formas, sendo este o núcleo duro da obra de arte6. Segundo Bell a forma é
determinante para se poder falar em arte, não o tema abordado ou o conteúdo escolhido.
Insiste para o facto de que a representação da realidade numa dada pintura ser sempre
secundária, pois, a seu ver, não é ela que confere valor estético à obra. Mas sim a
combinação de linhas e cores produzidas pelo artista que têm o poder de despertar no
espectador a emoção estética, uma emoção que se distingue das emoções da vida
quotidiana estando, portanto, totalmente destituída de interesses práticos. Note-se que o
autor não diz que as obras de arte exprimem emoções, mas que provocam determinadas
emoções em quem as aprecia. O filósofo britânico sugere ainda que a forma significante
permite-nos entrever a estrutura do mundo tal como de facto ele é: um entrever para lá do
véu das aparências. O entrever da realidade última que a forma significante pode dar não
é alcançado diretamente, ele resulta da expressão de uma emoção que o artista sentiu
sobre um determinado aspeto, real ou imaginário, do mundo. Parece, pois, que há aqui
um ponto de convergência entre os dois autores: o processo criativo resulta das emoções
experienciadas pelo artista, que concebe uma dada obra e lhe dá um lugar no mundo.
Contudo, Bell adverte que é a forma significante que o observador deve procurar e não a
expressão da emoção por parte do artista. Note-se, ainda, que o autor não afirma que as
obras de arte exprimem emoções (ideia defendida pelo expressivismo), mas que
provocam determinadas emoções nos seus espectadores. Vemos, portanto, que a
verdadeira preocupação de Bell está na forma, sendo absolutamente irrelevante a época
em que a obra foi produzida ou quem a criou. Por esse motivo, podemos afirmar que com
Bell a arte é colocada para lá das contingências do tempo e do lugar.
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Clive Bell reflete apenas em torno da 3ª arte- pintura, deixando de lado todas as outras artes como é o
caso do cinema, música, literatura, etc.
Já Collingwood ao considerar a arte como expressão de sentimentos rejeita esta
sobrevalorização das formas. Para o autor a verdadeira arte é a expressão imaginativa da
emoção. Entenda-se por expressão não uma manifestação involuntária da emoção ou um
despertar deliberado da mesma, mas antes a clarificação de um sentimento inicialmente
vago que através da sua expressão se vai tornando cada vez mais claro. Parte-se de
uma ideia geral, vaga e imprecisa para algo que de forma gradual se vai tornando mais
conciso. Collingwood defende que o processo de criação nada mais é do que um
refinamento de uma determinada emoção, uma via de que o artista dispõe para aprofundar
as suas emoções e consequentemente alcançar uma espécie de autoconhecimento que
resulta da clarificação daquilo que realmente sente. A clarificação de sentimentos é algo
que só se encontra na verdadeira arte. Esta ideia de uma verdadeira arte, pressupondo a
existência de uma falsa arte, resulta da distinção que o autor estabelece entre arte e ofício.
Segundo Collingwood, a falsa arte, associada ao entretenimento e ao artesanato, não visa
a clarificação de estados emocionais individuais do artista limitando-se a seguir um plano
previamente definido. Já a verdadeira arte não tem qualquer propósito específico, é um
fim em si mesma. O verdadeiro artista fazendo uso da sua imaginação nunca sabe de
antemão no que pode resultar este processo de clarificação, o mais comum é resultar em
pinturas, esculturas, músicas entre outras coisas. Contudo, podem nunca deixar de ser
meras ideias não se materializando e persistindo somente na mente do artista. Isto
significa que para Collingwood o processo criativo não é algo essencialmente manual ou
corporal, mas é também mental.
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Nigel Waburton no livro O que é a arte? sublinha esta ideia de uma forma bastante clara, dizendo-nos
que Collingwood tanto é um expressivista (na medida em que define a arte como expressão imaginativa
das emoções) como um idealista (uma vez que em certos momentos afirma que a obra de arte não precisa
de estar incorporada num material particular, podendo estar puramente na mente do artista).
durante o ato criativo. Deste modo, envolvermo-nos neste processo significa tornarmo-
nos observadores ativos o que nos permite uma ampliação da nossa capacidade para
compreender uma dada obra e ultrapassar a mera apreciação instrumental. Falamos,
portanto, de uma tomada de consciência gradual dos sentimentos que estão a ser
expressos, o que tanto vale para o artista como para o espectador.
Dado o exposto, verifica-se que a diferença teórica entre Bell e Collingwood é por
demais evidente sobretudo no que diz respeito à qualidade que determinados objetos têm
de possuir para se poderem elevar ao estatuto de obra de arte. Enquanto Bell centra-se
exclusivamente nos aspetos visuais (desvalorizando as intenções do artista e o seu
contexto histórico), Collingwood considera que não basta observar a obra de arte sendo
necessário ter em consideração o espírito do artista. Deste modo, salienta a presença de
certos elementos pré-conscientes que envolvem todo o processo criativo cuja função do
artista é mostrar aos seus espectadores como expressar aquela emoção em particular. Para
Collingwood o valor da obra de arte, tanto para o artista como para o público, encontra-
se na sua capacidade em clarificar e individualizar emoções específicas e é essa emoção,
inscrita na obra de arte, que permite uma maior aproximação entre estes dois polos, isto
é, entre artista e público.
De facto, Bell chamou a atenção para o que parece ser um aspeto crucial da obra
de arte – o aspeto formal. Todavia, acabou por não explorar esse aspeto deixando-o vago
e indefinido. Consequentemente, a sua teoria acabou por sair fragilizada na medida em
que o conceito de forma significante consiste precisamente na trave mestre de toda a sua
teoria. Assim, é geralmente acusada de oferecer uma definição circular posto que dois
dos seus conceitos-chave são definidos um a partir do outro. Já no que diz respeito à teoria
da arte como expressão imaginativa, a principal objeção que lhe é apontada é a estranheza
provocada pelo facto de se considerar as obras de arte como ideias que residem na mente
do artista em vez de serem objetos físicos. Outra objeção diz respeito à ideia de que o
artista clarifica emoções, a qual parece ser contrariada por muitos artistas que afirmam
procurar através das suas obras transmitir sentimentos em estado bruto, deixando-se guiar
pelo primeiro impulso e sem qualquer tipo de preocupação quanto a uma possível
clarificação do estado de espírito que os move. Para não falar de muitos outros casos em
que se afirma que a arte está inteiramente desligada da emoção.
Conhecidas ambas as teorias e algumas das suas objeções, a parte final da aula
será dedicada a uma breve recapitulação dos pontos essenciais das duas teorias
permitindo, deste modo, uma visão global das teorias em análise. Procurar-se-á identificar
os aspetos que as aproximam e os aspetos que as separam. O principal objetivo pelo qual
orientaremos esta última parte da aula consiste em procurar escapar à ideia de que todas
as teorias da arte (imitação, expressão e forma significante) são todas elas uma verdadeira
perda de tempo, inutilizando os seus esforços e toda a pretensão quanto a uma possível
definição do conceito de arte. Chegado este momento, procurar-se-á sublinhar que em
cada tentativa de definição encontramos um importante debate acerca de uma
característica particular da arte que até então tinha sido desvalorizada, omitida ou
deturpada.
Bibliografia:
Almeida, Aires; Teixeira, Célia; Murcho, Desidério. (2013) 50º Lições de Filosofia.
Lisboa: Plátano Editora
Henriques, F., Vicente, J. N., & Barros, M. R. (22 de fevereiro de 2001). Programa de
1-46.
Acedido a: 27 de junho