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Arte Moderna

- Teorias da arte
- Precursores da arte
moderna
- vanguardas artísticas
europeias

Profª Jacyara Mardgan


Ifes/2019
Filosofia da Arte - Teorias

Existem atualmente variadíssimas formas de manifestação artística que, por sua vez,
encerram em si correntes e formas de expressão muito diversas. Vários objetos com
formas, suportes e origens muito diferentes podem ser considerados obras de arte. As
teorias da arte têm por objetivo explicar a natureza da obra de arte em geral, mediante as
suas várias formas de composição.

Alguns críticos consideram essa tarefa inevitavelmente fadada ao fracasso. Segundo


eles, a arte é um fenômeno demasiado diversificado e não podemos encontrar condições
necessárias e suficientes para a sua identificação, ou seja, condições que uma vez
presentes nos garantam que estamos diante de obras de arte. O conceito de arte não
pode ser definido, por semelhanças de família, tal como os conceitos de jogo, número e
religião. Tais conceitos parecem possuir uma essência comum a todas as suas
aplicações, mas na realidade apresentam apenas semelhanças parciais. Se interpretada
como exigindo apenas que os objetos de aplicação do conceito possuam semelhanças
quaisquer entre si, qualquer coisa é, em algum aspecto, semelhante a qualquer outra
coisa.

Por exemplo: O Edifício do Empire State e um alfinete são semelhantes no tocante ao


fato de serem feitos de material inorgânico e de serem pontudos, o que não nos qualifica
a dizer que são iguais.

Se as semelhanças não forem por algum critério limitadas, conceitos com semelhanças
de família tornam-se ilimitadamente aplicáveis, perdendo a sua função classificatória e
deixando de fazer qualquer sentido. Assim é preciso estabelecer paradigmas, para a
aplicação do conceito a partir do compartilhamento de elementos semelhantes.

Nessa perspectiva as teorias da arte voltam a fazer sentido, se não como teorias que
visam estabelecer condições necessárias e suficientes ou essências comuns, ao menos
como teorias que devem estabelecer o paradigma daquilo que chamamos de arte, além
das margens de similaridade entre os objetos. O importante passa a ser que essas teorias
sejam capazes de iluminar dimensões importantes da obra de arte. Um conceito com
aplicações muito diversificadas pode ser muitas vezes analisado como um conceito
formado por subconceitos variadamente assemelhados entre si.

Sendo assim, mesmo que um certo conceito geral não possua uma essência comum a
suas aplicações, isso não significa que os subconceitos que o constituem, se
considerados individualmente, não possuam essências comuns a suas aplicações ainda
mais específicas.

Existem infinitas teorias da Arte, que surgem a partir da necessidade da produção na


qual a arte esta inserida, bem como dos desdobramentos científicos e filosóficos de seu
tempo. Aqui estudaremos 4 teorias que foram construídas ao longo da história crítica da
arte, analisando conceitos da Grécia até os dias atuais. Teoria da Arte como Imitação;
2
Teoria da Arte como Expressão, Teoria da Arte Formalista e Teoria da Arte como
Conceito Aberto,.

1- TEORIA DA ARTE COMO IMITAÇÃO OU REPRESENTAÇÃO

Centrada no objeto real

É uma das mais antigas concepção sobre a natureza da arte, sugerindo que a sua função
é a de representar alguma coisa. Platão e Aristóteles concebiam a arte como imitação
ou mímese, ou seja, uma representação naturalista da realidade. Assim, a pintura imita a
natureza, o drama imita a ação humana. Segundo esta teoria uma obra de arte só é arte
se for uma imitação de algo que é produzido pelo homem.

Esta teoria é baseada em imitações do real, como paisagens, pessoas, objetos, etc. e nos
oferece um critério de classificação bastante rigoroso que permite distinguir o que é do
que não é arte. Se imita é arte. Esta também oferece um critério de valoração do que
é um bom objeto de arte: aquele que mais se aproxima do objeto imitado.

Vários foram os momentos na história da arte em que o artista se utilizou da imitação da


realidade, quer seja na paisagem, natureza morta, retratos ou como movimentos
estabelecidos da arte.

Realismo - O realismo foi um movimento artístico e literário surgido nas últimas


décadas do século XIX na Europa, em reação ao Romantismo. Até 1880 o movimento
predominou na França estendendo-se
pela Europa e outros continentes. Os
integrantes desse movimento repudiaram
a artificialidade do Neoclassicismo e do
Romantismo, pois sentiam a necessidade
de retratar a vida, os problemas e
costumes da classe média. Manifestou-se
principalmente na pintura, onde as obras
retratavam cenas do cotidiano das
camadas mais pobres da sociedade.

Madame Bovary - Gustave Courbet

Realismo Soviético ou Neo-Realismo:


Movimento de regresso da imagem realista
no séc. XX, onde a arte volta-se a um
realismo socialmente comprometido. Esteve
diretamente relacionado ao contexto político
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e social da época, principalmente na Rússia, após a Revolução de 1917 e se tornou a
arte oficial do pais em 1925 sendo nomeado Realismo Socialista ou Realismo Soviético
A arte deveria refletir a sociedade, assumindo um papel interventivo e de compromisso
com uma visão político-ideológica. Para alcançar esse objetivo recorreu a uma
linguagem plástica figurativa, gráfica e de propaganda..
Boris Vladimirski - Rosas para Staline,1949

Fotorrealismo – Hiperrealismo: Séc. XX e XXI -


Também conhecido como fotorrealismo é um estilo de
pintura e escultura, que busca mostrar os detalhes, de
forma hiper-real, tornando a obra idêntica a uma
fotografia ou a uma cena da realidade. As obras hiper-
reais, por apresentarem uma exatidão de detalhes
bastante minuciosa e impessoal, geram um efeito de
irrealidade, formando o paradoxo: "É tão perfeito que
não pode ser real". Escultura de Ron Mueck

Realismo Perverso ou Arte com cadáveres: Estilo criado pelo artista contemporâneo
Von Hagens. Suas "obras de arte" são feitas com cadáveres de verdade, que têm a pele
retirada para que se revelem em detalhes os órgãos, nervos, ossos, veias e artérias.   Von
Hagens alcança tais efeitos graças a uma técnica de
conservação de cadáveres que inventou no fim dos
anos 70: a Plastinação. Ela consiste em substituir
todos os líquidos do organismo, como o sangue e a
gordura, por um tipo especial de silicone. Um
corpo "plastinizado" não só pode ser conservado
indefinidamente como também fica livre de odores
e tem as cores de seus tecidos realçadas.

Avaliação crítica da teoria da arte como imitação.

Como saber, entre várias obras de arte, qual a que melhor imita o tema representado?
Mesmo que uma obra seja muito representativa, como saber que aquilo que é
representado se assemelha à realidade?
Como se enquadrar obras de artes musicais? O que é que elas imitam?

Objeções da teoria da arte como imitação: Ficam de fora desta teoria, todas as formas
de arte ou objetos artísticos não figurativos.

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NAS DÚVIDAS E INDAGAÇÕES DA TEORIA, SURGEM A NECESSIDADE
DE NOVAS FUNDAMENTAÇÕES.

2- TEORIA DA ARTE COMO EXPRESSÃO - CENTRADA NO ARTISTA

Tese: Uma obra é arte se, e só se, exprime sentimentos e emoções do artista.

Esta teoria tem a vantagem de explicitar porque as


obras de arte despertam em nós emoções e
sentimentos. O argumento será, então, o de que as
obras de arte despertam em nós sentimentos
porque os artistas os expressaram no ato
criador.

Por outro lado, esta teoria também apresenta um


critério claro para delimitar o que é arte, com a
vantagem de poder incluir formas de manifestação
artística que não seja figurativa.

Também apresenta um critério valorativo: uma


obra de arte é tanto melhor quanto melhor
conseguir expressar os sentimentos do artista.

Munch, O Grito, (1893)

Avaliação crítica da teoria da arte como expressão:

A principal objeção é a de que existem obras de arte que não expressam nenhuma
emoção. Alguns artistas recusam inclusivamente a ideia de que as suas obras expressam
qualquer emoção. Assim, este critério deixaria de fora muitos objetos que consideramos
obras de arte, mas que não suscitam qualquer sentimento.

Por outro lado, o fato de uma obra suscitar em nós um sentimento tal, não significa que
as emoções tenham existido no criador.

Além disso, dificilmente podemos saber qual foi o sentimento que o artista procurou
expressar.

Por fim, nas obras musicais, quais os sentimentos a ter em conta, o do artista ou do
intérprete?

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3 - “TEORIA DA ARTE FORMALISTA ou FORMA SIGNIFICANTE”

Centrada no expectador.

Tese: Uma obra é arte se, e só se, provoca uma emoção estética.

Enquanto que a teoria da expressão está centrada


no artista criador, a teoria da forma significante
está centrada no sujeito que aprecia obras de
arte. Assim, será uma obra de arte o objeto que
consegue provocar no seu espetador uma emoção
estética.

Porém para que isso aconteça, todas as obras de


arte têm que partilhar uma propriedade em comum.
Para os defensores desta teoria, essa propriedade é
aquilo a que chamam de forma significante.

Piet Mondrian, Composition A:


Composition with Black, Red,
Gray, Yellow, and Blue, 1920

Avaliação crítica da teoria da arte como forma significante:

 Se a definição de obra de arte depende da emoção do espetador, então uma obra


deixa de ter o caráter de arte se alguém perante ela não sente nenhuma emoção
estética?
 Por outro lado, o que é que provoca exatamente essa emoção estética? A forma,
a cor, a textura, o som, o movimento?

4 - CONCEITO ABERTO

Tese: o conceito de obra de arte é um conceito aberto cujo significado vai sendo
alargado de forma a integrar novas características que incluam novas formas de
expressão artística que vão surgindo.

Na arte contemporânea existe uma enorme


variedade de correntes estéticas e de estilos
que não se submetem aos cânones
estabelecidos. Uma das características
valorizadas é a criatividade e a capacidade
para imaginar novas formas para expressar
emoções, comunicar ideias ou fazer pensar.

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Dario Escobar, Singular-Plural -  Gallery
1600, Atlanta 2012

ARTE MODERNA

Observa-se uma tendência em localizar na França do século XIX o início da arte


moderna. A experiência urbana - ligada à multidão, ao anonimato, ao contingente e ao
transitório - é enfatizada pelo poeta e crítico francês Charles Baudelaire (1821 - 1867)
identificado como o primeiro crítico de arte moderna. “O moderno não se define pelo
tempo presente - nem toda a arte do período moderno é moderna -, mas por uma
nova atitude e consciência da modernidade”, declara Baudelaire. A modernização de
Paris - traduzida nas reformas urbanas, relaciona-se diretamente à sociedade burguesa
que se define ao longo das revoluções de 1830 e 1848. A ascensão da burguesia traz
consigo a indústria moderna, o mercado mundial e o livre comércio, impulsionados pela
Revolução Industrial. A industrialização em curso e as novas tecnologias colocam em
crise o artesanato, fazendo do artista um intelectual apartado da produção. "Com a
industrialização, esse sistema entra em crise", afirma o historiador italiano Giulio Carlo
Argan, "e a arte moderna é a própria história dessa crise."

O trajeto da arte moderna no século XIX acompanha a curva, iniciada pelo primeiro
questionamento aos padrões acadêmicos, surgido no romantismo. Estes assumem uma
atitude crítica em relação às convenções artísticas e aos temas oficiais impostos
pelas academias de arte, produzindo pinturas históricas sobre temas da vida moderna
carregados de emoções - A Liberdade Guiando o Povo (1831), de Eugène Delacroix
(1798 - 1863), trata da história contemporânea em termos modernos. As figuras do
povo, na imagem embebidas de emoção, já apresentam uma leve recusa às normas
da arte acadêmica.

O centro das discussões sobre arte estava localizado na capital francesa Paris, onde sua
característica cosmopolita permitia aos artistas se alimentar das discussões da nova
sociedade que se mostrava em formação, e essa atmosfera inspira uma espécie de
empatia nos pensadores e poetas do período, que vão expressar um sentimento de
redescoberta da realidade de forma mais sensível, se tornando uma tônica a partir da
década de 1840. Em uma visão utópica acreditava-se que através da compreensão da
arte, era possível instrumentalizar o povo para a grande revolução. O movimento
Realista, vai se projetar na representação da realidade, em que ondas de protesto contra
a industrialização e sua técnica mecânica que afastava o trabalho artesanal, sua busca
exclusiva do lucro e a exploração do homem pelo homem, se transformou numa postura
socialista. Nas artes, Gustave Courbet (1819 - 1877), considerado o primeiro realista,
afirma que “arte não tem mais razão de ser se não for realista. Este não significa a
diligente imitação da natureza; pelo contrário, o próprio conceito de natureza deve
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desaparecer, enquanto resultante de escolhas idealistas no ilimitado mundo do real.” 1 A
propriedade maior do realismo estava na experiência da realidade concreta, encarando-a
de frente e despindo-se de qualquer preconceito religioso, moral ou estético.

As três telas d Courbet expostas no Salão de 1850, Enterro em Ornans, Os Camponeses


em Flagey e Os Quebradores de Pedras, marcam o compromisso do artista com o
programa realista, pensado como forma de superação das tradições clássica e romântica,
assim como dos temas históricos, mitológicos e religiosos. O rompimento com os temas
clássicos vem acompanhado na arte moderna pela superação das tentativas de
representar ilusionísticamente um espaço tridimensional sobre um suporte plano. A
consciência da tela plana, de seus limites e rendimentos, inauguram o espaço moderno
na pintura, verificado inicialmente com a obra de Éduard Manet (1832 - 1883). As
pinturas de Manet, na década de 1860, lidam com vários temas relacionados à visão
baudelairiana de modernidade e aos tipos da Paris moderna: boêmios, ciganos,
burgueses empobrecidos etc. Além disso, obras como Dejeuner sur L
´Herbe [Piquenique sobre a relva] (1863) desconcertam não apenas pelo tema (uma
mulher nua, num bosque, conversa com dois homens vestidos), mas também pela
composição formal: as cores planas sem claro-escuro nem relevos; a luz que não
tem a função de destacar ou modelar as figuras; a indistinção entre os corpos e o
espaço num só contexto.

São as pesquisas de Manet que dão origem ao primeiro movimento puramente moderno
da arte, identificado como impressionismo.

1. IMPRESSIONISMO -

Impressionismo é o termo usado para designar uma corrente pictórica que tem origem
na França, entre as décadas de 1860 e 1880. A origem do nome remonta a um texto
jornalístico que, inspirado na tela Impressão, Sol Nascente, 1872, de Claude Monet
(1840 - 1926), rotula de Exposição dos Impressionistas a primeira apresentação pública
dos novos artistas no estúdio do fotógrafo Nadar (1820 - 1910), em 1874. A essa
exposição seguem-se outras sete, de 1876 a 1886 que conhecem reações hostis por parte
do público e da crítica.

Embora não se possa falar em uma escola homogênea ou em programa definido, é


possível localizar certos princípios comuns na pintura desses artistas: preferência pelo
registro da experiência contemporânea; observação da natureza com base em
impressões pessoais e sensações visuais imediatas; suspensão dos contornos e dos
claro-escuros em prol de pinceladas fragmentadas e justapostas; aproveitamento
máximo da luminosidade e uso de cores complementares, favorecidos pela pintura
ao ar livre, ausência da cor preta. Em relação ao trabalho com as cores pela técnica da
mistura ótica - cores que se formam na retina do observador e não pela mistura de
1
Argan, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo Companhia das Letras, 2004. p.33
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pigmentos -, cabe observar o diálogo que estabelecem com as teorias físicas da época,
como as de Chevreul (circulo das cores e , Helmholtz (teoria tricomática) e Rood
(receptores sensoriais).

A renovação estilística empreendida pelo impressionismo encontra algumas de suas


matrizes nos trabalhos precursores como William Turner (1775 - 1851) nas paisagens,
em Courbet (1819 - 1877), partidário de novas formas de registro da natureza e no
impacto causado pelas estampas japonesas - suas soluções formais e colorido
particulares, como nas obras de Manet.

Se as paisagens e naturezas-mortas estão entre os temas preferidos dos pintores,


observa-se certa variação em seu repertório. Basta lembrar as figuras femininas de
Renoir, as dançarinas e as corridas de cavalos de Degas, os retratos e os interiores de
Cézanne. De qualquer modo, as eleições temáticas, ainda que variáveis, recusam os
motivos históricos, mitológicos e religiosos consagrados pela tradição acadêmica. Entre
os paisagistas mais fiéis ao movimento privilegia-se desde temáticas de movimento das
águas e seus reflexos, explorados em regatas, barcos e portos, até os motivos
camponeses com suas terras cultivadas, as aldeias e estradas.

O impressionismo e a renovação estilística por ele empreendida redirecionam a história


da pintura ocidental, a partir de fins do século XIX. Boa parte da produção pictórica
desde então pode ser lida como uma série de desdobramentos e reações ao movimento,
seja nas manifestações mais imediatamente ligadas a ele - por exemplo o neo-
impressionismo de Georges Seurat e Paul Signac que utilizam-se de pontos para
produção de suas obras, neo-impressionismo de Cézanne, Vincent van Gogh (1853 -
1890) e Paul Gauguin (1848 - 1903), que acentuam os traços em espessas camadas de
tinta, por vezes deformando as imagens, vindo a formar novos movimentos nas
chamadas vanguardas posteriores.

Principais artistas: Claude Monet (1840 - 1926), Pierre Auguste Renoir (1841 - 1919),
Edgar Degas (1834 - 1917), Camille Pissarro (1831 - 1903), Paul Cézanne (1839 -
1906), entre muitos outros.

No Brasil, ecos do impressionismo podem ser encontrados nas obras de Arthur


Timótheo da Costa (1882 - 1922), Belmiro de Almeida (1858 - 1935), Almeida Júnior
(1850 - 1899), Eliseu Visconti (1866 - 1944) entre outros. O clareamento da paleta, a
atenção aos efeitos produzidos pelas diferentes atmosferas luminosas, a incorporação de
temas simples e afastados da eloqüência acadêmica, o uso de pinceladas fragmentadas e
descontínuas são incorporados aos poucos pelos artistas brasileiros. No entanto, o
acanhamento do ambiente artístico, a resistência do público e das instituições às novas
tendências estéticas e as limitações impostas pela Academia Imperial de Belas Artes -
Aiba - no ensino por ela ministrado e nas orientações que imprime ao estudo de
brasileiros no exterior - dificultam um diálogo mais fecundo entre as investigações
introduzidas pelos impressionistas e a arte realizada pelos pintores nacionais, que muitas

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vezes não vão além de uma incorporação superficial das técnicas impressionistas,
adaptando-as a um olhar ainda comprometido com os padrões acadêmicos.

VANGUARDA ARTÍSTICA EUROPÉIA.

Conjunto de tendências artísticas vindas de diferentes países europeus cujo principal


objetivo era levar para a arte o sentimento de liberdade criadora, a subjetividade e
até mesmo certo irracionalismo, sobretudo em um contexto em que as correntes
filosóficas de cunho positivista influenciavam toda produção artística da época. Os
movimentos de vanguarda emergiram nas duas primeiras décadas do século XX e
provocaram uma ruptura com a tradição cultural do século XIX, influenciando não
apenas as artes plásticas, mas também outras manifestações artísticas, entre elas a
literatura.

A palavra Vanguarda, derivada do francês avant-garde, significa “o que marcha na


frente”. As correntes de vanguarda, embora apresentassem propostas específicas,
pregavam um mesmo ideal: era preciso derrubar a tradição por meio de práticas
inovadoras, capazes de subverter o senso comum e captar as tendências do futuro.
Essas propostas, incompreendidas à época em virtude, principalmente, do contexto
conservador no qual estavam inseridas, adquiriram importância histórica e
influenciaram o trabalho de vários artistas no mundo. No Brasil, as vanguardas
estiveram intrinsecamente relacionadas com a primeira geração do Modernismo, uma
vez que seus representantes (presentes na literatura, na arquitetura, nas artes plásticas ou
na música), contagiados pelo sentimento de renovação, observaram a necessidade de
alinhar o pensamento artístico brasileiro às vanguardas que surgiram na França no início
do século XX.

As principais correntes de Vanguarda Européia.

2. FAUVISMO:

Ao contrário de outras vanguardas que povoam a cena européia entre fins do século
XIX e a 1ª Guerra Mundial, o fauvismo não é uma escola com teorias, manifestos ou
programa definido. Para boa parte dos artistas que adere ao novo estilo expressivo - com
forte presença na França entre 1905 e 1907 -, o fauvismo representa sobretudo uma fase
em suas obras. Falar em vida curta e em organização informal de pintores em torno de
questões semelhantes, não significa minimizar as inovações trazidas à luz
pelos fauves('feras'). O grupo, sob a liderança de Henri Matisse (1869-1954), tem como
eixo comum a exploração das amplas possibilidades colocadas pela utilização da cor. A
liberdade com que usam tons puros, nunca mesclados, manipulando-os arbitrariamente,
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longe de preocupações com verossimilhança, dá origem a superfícies planas, sem
claros-escuros ilusionistas. As pincelas nítidas constroem espaços que são, antes de
mais nada, zonas lisas, iluminadas pelos vermelhos, azuis e alaranjados. Como afirma
Matisse a respeito de A Dança (1910): "para o céu um belo azul, o mais azul dos azuis,
e o mesmo vale para o verde da terra, para o vermelhão vibrante dos corpos".

Os fauvistas fazem sua primeira aparição pública no Salão de Outono, em Paris, 1905.


No ano seguinte, no Salão dos Independentes, o crítico Louis Vauxcelles batiza-os
de fauves (feras, em francês) em função da utilização de cores fortes e intensas. O grupo
reúne diversos pintores: Albert Marquet (1875-1947), reconhecido como desenhista;
André Derain (1880-1954), autor com Matisse de paisagens de Collioure, em 1905;
Maurice de Vlaminck (1876-1958), responsável por vibrantes paisagens, construídas, de
modo geral, com aplicação de tinta diretamente do tubo sobre a tela; Raoul Dufy (1877-
1953), que do impressionismo se converte ao fauvismo por influência de Matisse;
Georges Rouault (1871-1958), adepto do novo estilo, embora não faça uso das cores
brilhantes em suas prostitutas e palhaços. Gravitam ainda em torno das
propostas fauvistas: Georges Braque (1882-1963), Othon Friesz (1879-1949), Henri
Charles Manguin (1874-1949), Charles Camoin (1879-1965), Jean Puy (1876-1960),
Louis Valtat (1869-1952), Kees van Dongen (1877-1968) etc. Antecipações da nova
forma expressiva podem ser encontradas na retrospectiva de Vincent van Gogh (1853-
1890), de 1901; nas duas mostras de Paul Gauguin (1848-1903), em 1904 e 1906; nas
exposições de arte islâmica e do primitivismo francês (1903 e 1904), e também nas
viagens realizadas por Matisse, em 1904 e 1905, quando explora o potencial da cor nas
paisagens meridionais, fora do registro descritivo tradicional. O entusiasmo pela arte
primitiva, a retomada do neo-impressionismo de Van Gogh e Gauguin e a defesa da arte
como expressão de estados psíquicos, de impulsos e paixões individuais - contra o
registro impressionista da natureza por meio de sensações visuais imediatas -, aproxima
o fauvismo do expressionismo alemão, organizado no mesmo ano de 1905 no Die
Brücke ('A ponte').  Se isso é verdade (e o fauvismo francês teve, como sabido, grande
impacto no movimento alemão), é possível observar derivas diversas nas duas
produções de talhe expressionista. Distantes do acento dramático e das figuras
distorcidas, caros aos alemães, os pintores franceses elegem a cor, a luz, os cenários
decorativos e a expressão da alegria, ao invés da dor e da angústia. Alegria de Viver, de
Matisse, 1906, evidencia traços essenciais da atitude estética fauvista. A cena, quase
idílica, tematiza a comunhão dos homens com a natureza e o amor, que a liberdade dos
corpos nus, o movimento sinuoso das linhas e as cores límpidas expressam. O lirismo
da tela e seu feitio decorativo serão explorados pelo pintor, não apenas nas paisagens,
mas também nas cenas interiores que realizou. A arte de Matisse é feita para decorar,
indica o crítico italiano G.C. Argan, mas "não os templos, o palácio real e a casa dos
senhores, e sim a vida dos homens".

O advento do cubismo em 1907, com o célebre quadro de Pablo Picasso (1881-


1973), Les Demoiselles d'Avignon, marca a crise do fauvismo. Se o cubismo partilha
com o fauvismo a idéia de que o quadro é uma estrutura autônoma - ele não representa a
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realidade, mas é uma realidade própria -, as pesquisas cubistas caminham em direção
diversa, rumo à construção de espaços por meio de volumes, da decomposição de
planos e das colagens. O interesse pela arte primitiva poderia ser considerado outro
ponto de contato entre fauvistas e cubistas, mas ele representa, na verdade, mais um
afastamento entre os movimentos. Enquanto os fauves, assim como os expressionistas
em geral, vêem na arte primitiva a expressão de uma certa condição natural do homem,
Picasso recupera as máscaras africanas como formas libertas de qualquer contexto. O
cubismo está na raiz da arte abstrata e dos construtivismos de modo geral. Os fauvistas,
por sua vez, estão na origem dos movimentos expressionistas europeus, que irão
repercutir na arte do anos de 1950 e 1960, a partir do expressionismo abstrato.

No Brasil, parece difícil localizar influências especificamente fauvistas embora alguns


desses artistas puderam ser vistos na exposição de arte francesa realizada em São Paulo
em 1913, no Liceu de Artes e Ofícios. Mais fácil, talvez, pensar em impacto de
tendências expressionistas entre nós, por exemplo na produção dos anos 1915-16
de Anita Malfatti (1889-1964) - em trabalhos como O Japonês, A Estudante Russa e A
Boba -, na dicção expressionista de parte da obra Lasar Segall (1891-1957), ou ainda
em Oswaldo Goeldi (1895-1961). Flávio de Carvalho (1899-1973) e Iberê Camargo
(1914-1994) exemplificam novas possibilidades abertas pela sintaxe expressionista
entre nós.

3. EXPRESSIONISMO

Tendência artística que valorizava a subjetividade, o expressionismo surgiu no começo


do século XX 1905 -1914 , na Alemanha. Opondo-se à estética impressionista, os
expressionistas preconizavam a arte como elemento legítimo para a expressão dos
sentimentos do artista. Para os expressionistas, arte liga-se à ação, muitas vezes
violenta, através da qual a imagem é criada, com o auxílio de cores fortes -  que rejeitam
a verossimilhança - e de formas distorcidas. A base filosófica do expressionismo
encontra-se em Nietzsche, e segundo o filósofo Alemão, a base da criação é entender
que a consciência serve como base para lutar contra a rigidez dos esquemas lógicos.
Assim, os expressionistas entenderam e superaram a ideia real do impressionismo, que
era uma pesquisa acerca do valor da experiência visual como momento primeiro da
relação entre sujeito e objeto.. A afirmação do expressionismo se dá com o grupo Die
Brücke [A Ponte], criado em 1905 em Dresden, contemporâneo ao fauvismo francês, no
qual se inspira.

O caráter de crítica social da arte; as figuras deformadas, cores contrastantes e


pinceladas vigorosas que rejeitam todo tipo de comedimento; a retomada das artes
gráficas, especialmente da xilogravura; o interesse pela arte primitiva. Essa
poética encontra sua tradução em motivos retirados do cotidiano, nos quais se
observam o acento dramático e algumas obsessões temáticas, por exemplo, o sexo e
a morte.

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A arte expressionista encontra sua fonte na problemática do isolamento do homem
frente à natureza, assim como na defesa de uma poética sensível à expressão do
irracional, dos impulsos e paixões individuais. Combina-se a essa matriz, o pós-
impressionismo de Vincent van Gogh (1853-1890) e Paul Gauguin (1848-1903).

O pintor norueguês Edvard Munch (1863-1944) é talvez a maior referência do


expressionismo alemão. Munch, em sua ênfase no sentido trágico da vida, retrata a
famosa tela O Grito, 1893 - reproduzida dois anos depois em litografia -, fornece uma
chave privilegiada de acesso ao seu universo. A pessoa de aspecto fantasmático, em
primeiro plano, define um foco que arrasta todo o cenário. As linhas deformadas da
figura expandem-se pelo entorno, que participa da angústia do grito, emitido por ela
própria, segundo algumas leituras, ou pela natureza, de acordo com Munch em texto
escrito para o quadro, publicado na Revue Blanche, em 1895: "Tornei-me consciente do
infinito e vasto grito da natureza". A distorção da figura que grita - ou que abafa com as
mãos o grito da natureza -, sobre a qual paira a imagem da morte, afasta qualquer ideia
de beleza.

O expressionismo conhece desdobramentos em outros grupos na Alemanha, como


o Der Blaue Reiter [O Cavaleiro Azul], de Franz Marc (1880-1916) e Wassily
Kandinsky (1866-1944), criado em 1911, e considerado um dos pontos altos do
movimento. Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a voga expressionista
reverbera na produção dos artistas reunidos em torno da nova objetividade, Otto Dix
(1891-1969) e George Grosz (1893-1959), por exemplo. Perseguido pelos nazistas em
1933 como "arte degenerada", o expressionismo é retomado após a Segunda Guerra
Mundial (1939-1945), num contexto de crítica ao fascismo e de tematização dos
horrores da guerra, cujo exemplo maior é Guernica, de Pablo Picasso (1881-1973).
Após os anos 1950, o expressionismo abstrato aparece como principal herdeiro do
movimento nos Estados Unidos.

No Brasil, a produção dos anos 1915 e 1916 de Anita Malfatti (1889-1964), em


trabalhos como O Japonês, A Estudante Russa e A Boba, são reveladores de seu
aprendizado expressionista. Ainda no contexto modernista, é possível lembrar a forte
dicção expressionista de parte da obra Lasar Segall (1891-1957) e o expressionismo sui
generis de Oswaldo Goeldi (1895-1961). Mais para frente, com as obras de Flávio de
Carvalho (1899-1973), e com as pinturas de Iberê Camargo (1914-1994), percebem-se
as possibilidades abertas pela sintaxe expressionista do país.

4. CUBISMO: 

Tendência artística que influenciou escritores e artistas plásticos no início do século


XX. Este deixou suas marcas ao imprimir novas técnicas narrativas que fragmentavam
a realidade e permitiam uma desconstrução da visão clássica sobre o tempo e o espaço.
Sua origem remonta à Paris e a 1907, ano do célebre quadro de Pablo Picasso, Les
13
Demoiselles d'Avignon. Considerado um divisor de águas na história da arte ocidental, o
cubismo recusa a ideia de arte como imitação da natureza, afastando noções como:
perspectiva e modelagem, assim como qualquer tipo de efeito ilusório. "Não se imita
aquilo que se quer criar", diz Georges Braque, outro expoente do movimento. A
realidade plástica anunciada nas composições de Braque leva o crítico Louis Vauxcelles
a falar em realidade construída com "cubos", no jornal Gil Blas, 1908, o que batiza a
nova corrente. Cubos, volumes e planos geométricos entrecortados reconstroem
formas que se apresentam, simultaneamente, em vários ângulos nas telas. O espaço
do quadro - plano sobre o qual a realidade é recriada - rejeita distinções entre
forma e fundo ou qualquer noção de profundidade. Nele, corpos, paisagens e,
sobretudo, objetos como garrafas, instrumentos musicais e frutas têm sua estrutura
cuidadosamente investigada nos trabalhos de Braque e Picasso, tão afinados em termos
de projeto plástico que não é fácil distinguir as telas de um e de outro. Mesmo assim,
nota-se uma ênfase de Braque nos elementos cromáticos e, de Picasso, em aspectos
plásticos.

O cubismo se divide em duas grandes fases. Até 1912, no chamado cubismo analítico,


observa-se uma preocupação predominante com as pesquisas estruturais, por meio da
decomposição dos objetos e do estilhaçamento dos planos, e forte tendência ao
monocromatismo. Entre 1912 e 1913, as cores se acentuam e a ênfase dos experimentos
é colocada sobre a recomposição dos objetos. No momento do cubismo sintético,
elementos heterogêneos - recortes de jornais, pedaços madeira, cartas de baralho,
caracteres tipográficos, entre outros - são agregados à superfície das telas, dando origem
às famosas colagens, amplamente utilizadas a partir de então.

O ano de 1914 remete ao fim da colaboração entre Picasso e Braque e à uma atenuação
das inovações cubistas, embora os procedimentos introduzidos pelo movimento estejam
na base de experimentos posteriores como os do futurismo, construtivismo, purismo e
vorticismo.

O cubismo pode ser considerado uma das principais fontes da arte abstrata e suas
pesquisas encontram adeptos no mundo todo. No Brasil, influências do cubismo podem
ser observadas em parte dos artistas reunidos no modernismo de 1922, em alguns
trabalhos de Vicente do Rego Monteiro, Antonio Gomide e sobretudo na obra de Tarsila
do Amaral, Léger e  Candido Portinari.

5. FUTURISMO:

Entre as outras tendências vanguardistas, o Futurismo, difundido principalmente por


meio de manifestos foi o movimento mais radical e subversivo. O Manifesto Futurista,
de autoria do poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti (1876 - 1944), é publicado em
Paris em 1909. Nesse primeiro de uma série de manifestos veiculados até 1924,
Marinetti declara a raiz italiana da nova estética: "...queremos libertar esse país (a Itália)
14
de sua fétida gangrena de professores, arqueólogos, cicerones e antiquários".
Apresentava como proposta a subversão completa da arte, propondo a quebra das
imagens e a queima dos museus, com o objetivo de enterrar o passado e propor novas
produções ligadas a ideia do novo pelo novo.

Falando da Itália para o mundo, o futurismo coloca-se contra o "passadismo" burguês e


o tradicionalismo cultural. À opressão do passado, o movimento opõe a glorificação do
mundo moderno e da cidade industrial. A exaltação da máquina e da "beleza da
velocidade", associada ao elogio da técnica e da ciência, torna-se emblemática da nova
atitude estética e política. Uma outra sensibilidade, condicionada pela velocidade dos
meios de comunicação, está na base das novas formas artísticas futuristas. O futurismo
desenvolveu-se em todas as artes, influenciando vários artistas que posteriormente
instituíram outros movimentos modernistas. Sua pintura recebeu influência do cubismo
e do abstracionismo, mas utilizava-se de cores vivas e contrastes e da sobreposição das
imagens com a pretensão de dar a ideia de dinamismo, movimento. Este repercutiu
principalmente na França e na Itália, onde vários artistas, entre eles Marinetti, se
identificaram com o fascismo. O novo é uma característica tão forte do movimento, que
este defendia a guerra como forma de higienizar o mundo.

O futurismo enfraqueceu após a Primeira Guerra Mundial, mas seu espírito rumoroso e
inquieto refletiu no dadaísmo, no concretismo, na tipografia moderna e no design
gráfico pós-moderno. No Brasil Fernand Leger é um de seus representantes.

Artistas como Umberto Boccioni (1882 - 1916), Carlo Carrà (1881 - 1966), Luigi
Russolo (1885 - 1947), Giacomo Balla (1871 - 1958) e Gino Severini (1883 - 1966)
estão entre os principais nomes do primeiro futurismo, que conhece um refluxo em
1916, com a morte de Boccioni e com a crise social e política instaurada pela Primeira
Guerra Mundial (1914 - 1918).

Os modernistas reunidos na Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, recebem


imediatamente a alcunha de "futuristas" (configuram o chamado futurismo paulista), em
virtude das propostas estéticas renovadoras e das intervenções estéticas de vanguarda. A
consideração cuidadosa das obras de modernismo, entretanto, permite aferir a distância
entre a vanguarda modernista brasileira e a italiana.

6. DADAÍSMO: 

Criado na Suíça durante a Primeira Guerra Mundial, o Dadaísmo surgiu como resposta
ao clima de instabilidade provocado pelo conflito bélico. Sua principal característica é a
linguagem peculiar, permeada pelo deboche e pelos ilogismos dos textos, além da
aversão a qualquer conceito racionalizado sobre a arte. Ao contrário de outras correntes
artísticas, o dadaísmo apresenta-se como um movimento de crítica cultural mais ampla,
que interpela não somente as artes, mas modelos culturais passados e presentes. Trata-

15
se de um movimento radical de contestação de valores que utiliza variados canais
de expressão: revista, manifesto, exposição e outros.

As manifestações dos grupos dada são intencionalmente desordenadas e pautadas pelo


desejo do choque e do escândalo, procedimentos típicos das vanguardas de modo geral.
A criação do Cabaré Voltaire, 1916, em Zurique, inaugura oficialmente o dadaísmo.
Fundado pelos escritores alemães H. Ball e pelo pintor e escultor alsaciano Hans Arp, o
clube literário - ao mesmo tempo galeria de exposições e sala de teatro - promove
encontros dedicados a música, dança, poesia, artes russa e francesa. O termo dada é
encontrado por acaso numa consulta a um dicionário francês. "Cavalo de brinquedo",
sentido original da palavra, não guarda relação direta, nem necessária, com bandeiras ou
programas, daí o seu valor: sinaliza uma escolha aleatória (princípio central da criação
para os dadaístas), contrariando qualquer sentido de eleição racional. "O termo nada
significa", afirma o poeta romeno Tristan Tzara, integrante do núcleo primeiro.

A geografia do movimento aponta para a formação de diferentes grupos, em diversas


cidades, unidos pelo espírito de questionamento crítico e pelo sentido anárquico das
intervenções públicas. O clima mais amplo que abriga as várias manifestações dada
pode ser encontrado na desilusão e ceticismo instaurados pela Primeira Guerra Mundial,
1914-1918, que alimenta reações extremadas por parte dos artistas e intelectuais em
relação à sociedade e ao suposto progresso social. A obra dada repercute em todo e
artistas como Francis Picabia estabelecem um elo entre Europa e Estados Unidos
atuando principalmente em Nova York, onde o protagonista do movimento passa a ser
Marcel Duchamp e Man Ray.

Se o dadaísmo não professa um estilo específico nem defende novos modelos, aliás
coloca-se expressamente contra projetos predefinidos e recusa todas as experiências
formais anteriores, é possível localizar formas exemplares da expressão dada. Nas artes
visuais, os ready-made de Duchamp constituem manifestação cabal de um espírito que
caracteriza o dadaísmo. Ao transformar qualquer objeto escolhido ao acaso em obra
de arte, Duchamp realiza uma crítica radical ao sistema da arte. Assim, objetos
utilitários sem nenhum valor estético em si são retirados de seu contexto original e
elevados à condição de obra de arte ao ganhar uma assinatura e um espaço de
exposição, museu ou galeria. Por exemplo, a roda de bicicleta que encaixada num
banco vira Roda de Bicicleta, 1913, ou um mictório, que invertido se apresenta
como Fonte, 1917, ou ainda os bigodes colocados sobre a Mona Lisa, 1503/1506 de
Leonardo da Vinci, que fazem dela um ready-made retificado, o L.H.O.O.Q., 1919. Os
princípios de subversão mobilizados pelos ready-made podem ser também observados
nas máquinas antifuncionais de Picabia e nas imagens fotográficas de Man Ray.

Ainda que 1922 apareça como o ano do fim do dadaísmo, fortes ressonâncias do
movimento podem ser notadas em perspectivas artísticas posteriores. Na França, muitos
de seus protagonistas integram o surrealismo subsequente. Nos Estados Unidos, na
década de 1950, artistas como Robert Rauschenberg, Jasper Johns retomam certas
orientações do movimento no chamado neodada.
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Difícil localizar influências diretas do dadaísmo na produção brasileira, mas talvez seja
possível pensar que ecos do movimento dada cheguem pela leitura que dele fazem os
surrealistas, herdeiros legítimos do dadaísmo em solo francês. Por exemplo, em obras
variadas como as de Ismael Nery e Cicero Dias; nas fotomontagens de Jorge de Lima,
que podem ser aproximadas de trabalhos correlatos de Max Ernst; na produção
de Flávio de Carvalho.

7. SURREALISMO: 

O termo, cunhado por André Breton com base na idéia de "estado de fantasia
supernaturalista" de Guillaume Apollinaire, traz um sentido de afastamento da realidade
comum que o movimento surrealista celebra desde o primeiro manifesto, de 1924. Nos
termos de Breton, autor do manifesto, trata-se de "resolver a contradição até agora
vigente entre sonho e realidade pela criação de uma realidade absoluta, uma
supra-realidade". A importância do mundo onírico, do irracional e do inconsciente,
anunciada no texto, se relaciona diretamente ao uso livre que os artistas fazem da obra
de Sigmund Freud e da psicanálise, permitindo-lhes explorar nas artes o imaginário e os
impulsos ocultos da mente. O caráter anti-racionalista do surrealismo coloca-o em
posição diametralmente oposta das tendências construtivas e formalistas na arte que
florescem na Europa após a Primeira Guerra Mundial, 1914-1918, e das tendências
ligadas ao chamado retorno à ordem. Como vertente crítica de origem francesa, o
surrealismo aparece como alternativa ao cubismo, alimentado pela retomada das
matrizes românticas francesa e alemã, do simbolismo, da pintura metafísica italiana -
Giorgio de Chirico, principalmente - e do caráter irreverente e dessacralizador
do dadaísmo, do qual vem parte dos surrealistas.

Como o movimento dada, o surrealismo apresenta-se como crítica cultural mais ampla,
que interpela não somente as artes mas modelos culturais, passados e presentes. Na
contestação radical de valores que empreende, faz uso de variados canais de expressão -
revistas, manifestos, exposições e outros -, mobiliza diferentes modalidades artísticas
como escultura, literatura, pintura, fotografia, artes gráficas e cinema.

A crítica à racionalidade burguesa em favor do maravilhoso, do fantástico e dos sonhos


reúne artistas de feições muito variadas. Na literatura, Breton e Max Jacob; Nas artes
plásticas, René Magritte, Joán Miró, Max Ernst, Salvador Dalí, e outros. Na fotografia,
Man Ray, Dora Maar, Brasaï. No cinema, Luis Buñuel. Certos temas e imagens são
obsessivamente tratados por eles, com soluções distintas, como, por exemplo, o sexo e o
erotismo; o corpo, suas mutilações e metamorfoses; o manequim e a boneca; a
violência, a dor e a loucura; as civilizações primitivas; e o mundo da máquina. Esse
amplo repertório de temas e imagens encontra-se traduzido nas obras por procedimentos
e métodos pensados como capazes de driblar os controles conscientes do artista,
portanto, responsáveis pela liberação de imagens e impulsos primitivos.

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As colagens e assemblages constituem mais uma expressão caraterística da lógica de
produção surrealista, ancorada na idéia de acaso e de escolha aleatória, princípio central
de criação para os dadaístas. A célebre frase de Lautréamont é tomada como inspiração
forte: '"Belo como o encontro casual entre uma máquina de costura e um guarda-chuva
numa mesa de dissecção". A sugestão do escritor se faz notar na justaposição de objetos
desconexos e nas associações à primeira vista impossíveis, que particularizam as
colagens e objetos surrealistas. Que dizer de um ferro de passar cheio de pregos, de uma
xícara de chá coberta de peles ou de uma bola suspensa por corda de violino? Dalí
radicaliza a idéia de libertação dos instintos e impulsos contra qualquer controle
racional pela defesa do método da "paranóia crítica", forma de tornar o delírio um
mecanismo produtivo, criador. A crítica cultural empreendida pelos surrealistas,
baseada nas articulações arte/inconsciente e arte/política, deixa entrever sua ambição
revolucionária e subversiva, amparada na psicanálise - contra a repressão dos instintos -
e na idéia de revolução oriunda do marxismo (contra a dominação burguesa). As
relações controversas do grupo com a política aparecem na adesão de alguns ao
trotskismo (Breton, por exemplo) e nas posições reacionárias de outros, como Dalí.

A difusão do surrealismo pela Europa e Estados Unidos faz-se rapidamente. Nos


Estados Unidos, o surrealismo é fonte de inspiração para o expressionismo abstrato e
a arte pop. No Brasil especificamente o surrealismo reverbera em obras variadas como
as de Ismael Nery e Cicero Dias, assim como nas fotomontagens de Jorge de Lima.
Nos dias atuais artistas continuam a tirar proveito das lições surrealistas.

8. ABSTRACIONISMO

Em sentido amplo, abstracionismo refere-se às formas de arte não regidas pela figuração


e  pela imitação do mundo. Em acepção específica, o termo liga-se às vanguardas
européias das décadas de 1910 e 1920, que recusam a representação ilusionista da
natureza. A decomposição da figura, a simplificação da forma, os novos usos da cor, o
descarte da perspectiva e das técnicas de modelagem e a rejeição dos jogos
convencionais de sombra e luz, aparecem como traços recorrentes das diferentes
orientações abrigadas sob esse rótulo. Inúmeros movimentos e artistas aderem à
abstração, que se torna, a partir da década de 1930, um dos eixos centrais da produção
artística no século XX.

É possível notar duas vertentes a organizar a ampla gama de direções assumidas pela
arte abstrata. A primeira, inclinada ao percurso da emoção, ao ritmo da cor e à
expressão de impulsos individuais, encontra suas matrizes no expressionismo e
no fauvismo, descrita como abstracionismo informal. A segunda, mais afinada com
os fundamentos racionalistas das composições cubistas, o rigor matemático e a
depuração da forma, aparece descrita como abstracionismo geométrico.
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As vanguardas russas exemplificam as duas vertentes: Wassili Kandinsky (1866-1944),
representante da primeira, é considerado pioneiro na realização de pinturas não-
figurativas com Primeira Aquarela Abstrata (1910) e a
série Improvisações (1909/1914). Seu movimento em direção à abstração inspira-se na
música e na defesa de uma orientação espiritual da arte, apoiada na teosofia. Em torno
de Kandinsky e Franz Mac (1880-1916) organiza-se, na Alemanha, o Der Blaue
Reiter [O Cavaleiro Azul], 1911, grupo do qual participam August Macke (1887-1914)
e Paul Klee (1879-1940).

Kasimir Malevich (1878-1935) é um dos maiores expoentes da arte abstrata geométrica.


No bojo do suprematismo, 1915, defende uma arte comprometida com a pesquisa
metódica da estrutura da imagem.

- A geometria suprematista se apresenta nos célebres Quadrado Preto


Suprematista (1914/1915) e Quadrado Branco sobre Fundo Branco (1918). Arte como
simplificação da forma.

Suprematismo foi um Movimento russo de arte abstrata, o suprematismo surge por volta
de 1913, mas sua sistematização teórica data de 1925, do manifesto Do Cubismo ao
Futurismo ao Suprematismo: o Novo Realismo na Pintura, escrito por Kazimir
Malevich (1878-1935) em colaboração com o poeta Vladimir Maiakóvski (1894-1930).
O suprematismo está diretamente ligado ao seu criador, Malevich, e às pesquisas
formais levadas a cabo pelas vanguardas russas do começo do século XX,
o raionismo de Mikhail Larionov e Natalia Goncharova e o construtivismo de Vladimir
Evgrafovic Tatlin. Nesse contexto, o suprematismo defende uma arte livre de
finalidades práticas e comprometida com a pura visualidade plástica. Trata-se de romper
com a idéia de imitação da natureza, com as formas ilusionistas, com a luz e cor
naturalistas - experimentadas pelo impressionismo - e com qualquer referência ao
mundo objetivo que o cubismo de certa forma ainda alimenta. Malevich ainda fala em
"realismo", e o faz com base nas sugestões do místico e matemático russo P.D.
Ouspensky, que defende haver por trás do mundo visível um outro mundo, espécie de
quarta dimensão, além das três a que os sentidos humanos têm acesso. O suprematismo
representaria essa realidade, esse "mundo não objetivo", referido a uma ordem superior
de relação entre os fenômenos - espécie de "energia espiritual abstrata" -, que é
invisível, mas nem por isso menos real.

Se a arte de Malevich tem pretensão espiritual, ela não se confunde com a defesa do
espiritual na arte que faz Wassily Kandinsky (1866-1944), que o define como
"expressão da vida interior do artista". Malevich, ao contrário, se detém na pesquisa
metódica da estrutura da imagem, que coincide com a busca da "forma absoluta", da
molécula pictórica. Como ele mesmo afirma no manifesto de 1915: "Eu me transformei
no zero da forma e me puxei para fora do lodaçal sem valor da arte acadêmica. Eu
destruí o círculo do horizonte e fugi do círculo dos objetos, do anel do horizonte que
aprisionou o artista e as formas da natureza. O quadrado não é uma forma

19
subconsciente. É a criação da razão intuitiva. O rosto da nova arte. O quadrado é o
infante real, vivo. É o primeiro passo da criação pura em arte".

As obras suprematistas, vistas pela primeira vez na exposição coletiva A Última


Exposição de Quadros Futuristas 0.10 (Zero. Dez), realizada em dezembro de 1915, em
São Petesburgo, na Rússia, evidenciam a nova proposta pictórica: formas geométricas
básicas - quadrado, retângulo, círculo, cruz e triângulo - associadas a uma pequena
gama de cores. A austeridade das formas puras e a simplicidade quase hierática da
geometria suprematista se apresentam integralmente em obras, hoje célebres,
como Quadrado Preto Suprematista, 1914/1915, Suprematismo: Realismo Pictórico de
um Jogador de Futebol, 1915, Quadrado Vermelho: Realismo Pictórico de uma
Camponesa em Duas Dimensões, 1915, Quadrado Branco Sobre Fundo Branco, 1918.
Desde 1910, a produção de Malevich encontra-se afinada com as vanguardas européias
- com o cubismo das obras iniciais de Pablo Picasso (1881-1973), com as pinturas de
Paul Cézanne (1839-1906), Fernand Léger (1881-1955), André Derain e também com
o futurismo -, combinadas em sua obra com fontes folclóricas e populares russas, e com
a experimentação artística russa que tem em Maiakóvski sua liderança maior. Da fase
inicial pós-impressionista, sua pintura se dirige às formas tubulares de Léger, à
fragmentação cubista e ao trato futurista da imagem, como O Amolador de Facas, 1912.
Com o movimento suprematista, Malevich adere à abstração e ao compromisso com a
pesquisa metódica da forma pura, evidenciada em séries como Branco sobre Branco.
Após 1918, quando anuncia o fim do suprematismo por considerar o esgotamento do
projeto, volta-se preferencialmente ao ensino, à escrita e à construção de modelos
tridimensionais que têm grande influência sobre o construtivismo.

Mesmo que o rótulo suprematismo se confunda com o nome de seu mentor, sua
influência sobre outros artistas russos é notável - por exemplo, a pintora Olga
Vladimirovna Rozanova -, assim como sua penetração na Europa, marcando as artes
visuais de modo geral a pintura, a arquitetura, o mobiliário, o design, a tipografia etc.
No Brasil, parte da obra de Malevich está presente na 22ª Bienal Internacional de São
Paulo, de 1994.

- A obra de Malevitch tem impacto sobre o construtivismo de Alexander Rodchenko


(1891-1956) “Negro sobre Negro”(1918) arte como construção humana de sentidos.

O construtivismo, foi um movimento Russo que pensou a pintura e a escultura como


construções - e não como representações -, guardando proximidade com a arquitetura
em termos de materiais, procedimentos e objetivos. O termo construtivismo liga-se
diretamente ao movimento de vanguarda russa e a um artigo do crítico N. Punin, de
1913, sobre os relevos tridimensionais de Vladimir Evgrafovic Tatlin (1885 - 1953). A
consideração das especificidades do construtivismo russo não deve apagar os elos com
outros movimentos de caráter construtivo na arte, que ocorrem no primeiro decênio do
século XX, por exemplo, o grupo de artistas expressionistas reunidos em torno de
Wasilli Kandinsky (1866 - 1914) no Der Blaue Reiter [O Cavaleiro Azul], em 1911, na
Alemanha; o De Stijl [O Estilo], criado em 1917, que agrupa Piet Mondrian (1872 -
20
1944), Theo van Doesburg (1883 - 1931) e outros artistas holandeses ao redor das
pesquisas abstratas; e o suprematismo, fundado em 1915 por Kazimir Malevich (1878 -
1935), também na Rússia. Isso sem esquecer os pressupostos construtivos que se fazem
presentes, de diferentes modos, no cubismo, no dadaísmo e no futurismo italiano.

A ideologia revolucionária e libertária que impregna as vanguardas em geral, adquire


feições concretas na Rússia, diante da revolução de 1917. A nova sociedade projetada
no contexto revolucionário mobiliza os artistas em torno de uma arte nova, que se
coloca a serviço da revolução e de produções concretas para a vida do povo. Afinal, a
produção artística deveria ser funcional e informativa. Realizações dessa proposta
podem ser encontradas nos projetos de Aleksandr Aleksandrovic Vesnin (1883 - 1959)
para o Palácio do Trabalho e para o jornal Pravda e, sobretudo, no Monumento à
Terceira Internacional, de Tatlin, exposto em 1920, mas nunca executado - seria
erguido no centro de Moscou. De ferro e vidro, a gigantesca espiral giraria sobre si
mesma, concebida para ser também uma antena de transmissão radiofônica, é descrita
pelo artista como "união de formas puramente plásticas (pintura, escultura e arquitetura)
para um propósito utilitário".

A obra de Alexander Rodchenko (1891 - 1956) é outro exemplo de atualização do


programa construtivista e produtivista russo. Das pesquisas iniciais, em estreito diálogo
com as pinturas abstratas e geométricas de Malevich, o artista passa às construções
tridimensionais por influência de Tatlin, encontrando posteriormente na fotografia um
meio privilegiado de expressão e registro pictórico da nova Rússia. Sua perspectiva
fotográfica original influencia de perto o cinema de Sergei Eisenstein (1898 - 1948).

As discussões sobre a função social da arte provocam fraturas no interior do


construtivismo russo. Os irmãos Antoine Pevsner (1886 - 1962) e Naum Gabo (1890 -
1977), signatários do Manifesto Realista de 1920, recusam um programa social e
aplicado da arte - lembrando as críticas de Gabo ao monumento de Tatlin - em defesa de
uma morfologia geométrica em consonância com a teoria suprematista de Malevich.
Suas pesquisas inclinam-se na direção da arte abstrata, do diálogo cerrado entre arte e
ciência e do uso de materiais industriais, como o vidro e o plástico. Em 1922, quando o
regime soviético começa a manifestar seu desagrado com a pauta construtivista, Pevsner
e Gabo deixam a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas - URSS. Na década
seguinte, a defesa oficial de uma estética "realista" e "socialista" representa o golpe
último nas pesquisas de tipo formal dos construtivistas. O exílio dos artistas contribui
para a disseminação dos ideais estéticos da vanguarda russa que vão impactar
a Bauhaus na Alemanha, o De Stijl, nos Países Baixos, e o grupo Abstraction-
Création [Abstração-Criação], na França. Gabo será um dos editores do manifesto
construtivista inglês Circle, de 1937.

Não são pequenas as influências do construtivismo na América Latina, em geral, e no


Brasil, em particular, no período após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Marcas
da vanguarda russa podem ser observadas no movimento concreto de São Paulo, Grupo
Ruptura, e no Rio de Janeiro, Grupo Frente. A ruptura neoconcreta estabelecida com o
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manifesto de 1959 - que reúne Amilcar de Castro (1920-2002), Ferreira Gullar (1930-
2016), Franz Weissmann (1911-2005), Lygia Clark (1920-1988), Lygia Pape (1927-
2004), Reynaldo Jardim (1926) e Theon Spanudis (1915) - não afasta as influências do
construtivismo russo, sobretudo na vertente inaugurada por Pevsner.

- O neoplasticismo de Piet Mondrian e Theo van Doesburg indica outra tendência da


abstração geométrica. O movimento de 1917 tem o propósito de encontrar nova forma
de expressão plástica, liberta de sugestões representativas. As composições se articulam
com base em elementos mínimos: a linha reta, o retângulo e as cores primárias - azul,
vermelha e amarela -, além da preta, branca e cinza.

O termo Neoplasticismo liga-se diretamente às novas formulações plásticas de Piet


Mondrian (1872-1944) e Theo van Doesburg (1883-1931) e sua origem remete à
revista De Stijl (O Estilo) criada pelos dois artistas holandeses em 1917, em cujo
primeiro número Mondrian  publica A nova plástica na pintura. O movimento se
organiza, segundo Van Doesburg, em torno da necessidade de "clareza, certeza e
ordem" e tem como propósito central encontrar uma nova forma de expressão plástica,
liberta de sugestões representativas e composta a partir de elementos mínimos: a linha
reta, o retângulo e as cores primárias - azul, vermelho e amarelo -, além do preto, branco
e cinza. A consideração das especificidades do neoplasticismo holandês não deve
apagar os seus vínculos com outros movimentos construtivistas na arte, que têm lugar
na Europa no primeiro decênio do século XX, por exemplo, o grupo de artistas reunidos
em torno de Wassily Kandinsky (1866-1944), na Alemanha (o Blauer Reiter), 1911; o
construtivismo russo de Vladimir Evgrafovic Tatlin (1885-1953), 1913, e o
suprematismo fundado em 1915 por Kazimir Malevich (1878-1935), também na Rússia.
De qualquer modo, o novo estilo de abstração geométrica se refere a uma tradição
holandesa particular e à trajetória artística de Mondrian. Após um período de formação
marcado pelas obras de George Hendrik Breitner (1857-1923) e Toorop, Mondrian
adere às formulações cubistas de Georges Braque (1882-1963) e Pablo Picasso (1881-
1973), em 1912, durante temporada em Paris. Nas obras dos anos 1913 e 1914 já se
observa em seus trabalhos uma depuração das formas e a redução dos detalhes ao
essencial, seja nas fachadas e torres projetadas, ou nas marinhas geométricas. O contato
com Bart Antony van der Leck (1876-1958) e com a teosofia leva o artista ao uso mais
sistemático dos planos retangulares e das cores puras, assim como à defesa de um ideal
de harmonia universal a ser alcançado pela arte. Um artigo escrito em 1915 por Van
Doesburg sobre a pintura de Mondrian marca o início de uma estreita colaboração,
selada quando da edição da revista De Stijl, à qual aderem o pintor e escultor belga
Georges Vantongerloo (1886-1965), arquitetos e projetistas como Jacobus Johannes
Pieter Oud (1890-1963)  e, Gerrit Thomas Rietveld (1888-1964), além do poeta A. Kok.
Até 1924, Mondrian é o principal colaborador do órgão, no interior do qual sistematiza
os ideais estéticos da plasticidade pura. Apoiada no princípio básico da redução da
expressão plástica à traços essenciais, a nova plasticidade rejeita a idéia de arte como

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representação, abolindo o espaço pictórico tridimensional. Rejeita ainda a linha curva, a
modelagem e as texturas. A cor pura se projeta no plano, encontrando seu oposto na
não-cor, no cinza, no branco e no preto. As oposições se desdobram no quadro: linha
negra/plano branco, linha espessa/linha fina, planos abertos/planos fechados, planos
retangulares/quadrado da tela, cor/não-cor. As composições se estruturam num jogo de
relações assimétricas entre linhas horizontais e verticais dispostas sobre um plano único.
A forma obtida a partir daí, indica Schapiro em ensaio clássico sobre o artista, é
totalidade sempre incompleta, que sugere sua continuidade além dos limites da tela. O
neoplasticismo de Mondrian dispensa os detalhes e a variedade da natureza, buscando o
princípio universal sob a aparência do mundo. Menos que expressar as coisas naturais,
sua arte visa, segundo ele, a "expressão pura da relação".

As idéias estéticas defendidas em De Stijl ressoam na cena européia mais ampla por
meio do ensaio escrito por Mondrian para o público francês, O neoplasticismo (1920), e
editado em alemão pela Bauhaus, em 1925. A exposição do grupo em Paris, em 1923, é
mais um fator a contribuir para a notoriedade da nova perspectiva artística, que
reverbera nos anos 30 nos grupos Abstraction-Création e Cercle et Carré, na França, e
no Circle, na Inglaterra. Não se pode esquecer a repercussão das teorias do
neoplasticismo na arquitetura moderna. O rompimento de Mondrian com Van Doesburg
data de 1924, quando assina sua última colaboração para a revista. Este último, em
1926, seria responsável por uma dissidência, que batiza como elementarismo. De
Stijl deixa de existir oficialmente em 1928.

No Brasil, as lições de Mondrian foram incorporadas pelas composições construtivas e


econômicas de Milton Dacosta (1915-1988). Ainda que responsável por uma obra
amparada em outras referências, Lygia Pape (1927-2004) faz homenagens a Mondrian
no Livro da Arquitetura e no desenho Mondrian, 1997.

Depois da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a Europa e os Estados Unidos


assistem a desdobramentos da pesquisa abstrata como tentativa de superação da forma
pela ultrapassagem dos conteúdos realistas e dos formalismos geométricos.

9. EXPRESSIONISMO ABSTRATO

Nos Estados Unidos, a abstração ganha força com o expressionismo abstrato de


Jackson Pollock (1912-1956), Willem de Kooning (1904-1997) E Mark Rotkho (1903-
1970).

A noção de expressionismo abstrato, utilizada pela primeira vez em 1952 pelo crítico H.
Rosenberg, refere-se a um movimento artístico que tem lugar em Nova York, no
período imediatamente após a Segunda Guerra Mundial. Trata-se do primeiro estilo
pictórico norte-americano a obter reconhecimento internacional. Os Estados Unidos
surgem como nova potência mundial e centro artístico emergente, beneficiado, em larga

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medida, pela emigração de intelectuais e artistas europeus. As diversas tendências do
modernismo europeu conhecem soluções novas em solo norte-americano, sobretudo o
jazz e o cinema de Hollywood.  A combinação de todas essas fontes tem como
referência última o pós-guerra, e uma crítica a concepção triunfalista do capitalismo e
da civilização tecnológica.  A recusa dos estilos e técnicas artísticas tradicionais, assim
como a postura crítica em relação à sociedade produzem técnicas inovadoras como por
exemplo, Pollock e sua "pintura de ação" [action painting]. Ele retira a tela do cavalete,
colocando-a no solo. Sobre ela, a tinta é gotejada e/ou atirada ao ritmo do gesto do
artista, que gira sobre o quadro ou se posta sobre ele. A nova atitude, física inclusive, do
artista diante da obra subverte a imagem do pintor contemplativo e mesmo a do técnico
ou desenhista industrial que realiza o trabalho de acordo com um projeto prévio.

Os emaranhados de linhas e cores que explodem nas telas de Pollock afastam qualquer
idéia de mensagem a ser decifrada. Do mesmo modo apresenta-se o outro estilo
utilizado por alguns artistas dessa corrente, o chamado “Color FieldPainting” (Pintura
do campo de cor), que o contrário da técnica da “Action Painting”, o Color Field
privilegiava a objetividade das cores nas telas, ao utilizar padrões geométricos mais
simples. Sua maior representação esta nas obras de Rothko, com suas faixas de pouco
brilho e sutis passagens de tons, ou mesmo as soluções figurativas de De Kooning, não
querem oferecer uma chave de leitura. A ausência de modelos, a ideia de
espontaneidade relacionada ao trabalho artístico e o gesto explosivo do pintor que
desintegra a realidade não impedem a localização de problemáticas que pulsam nas
obras produzidas. A preocupação com um retorno às origens, interpretada como busca
de forças elementares e emoções primárias, é uma delas.

No Brasil, seria arriscado pensar em seguidores fiéis das pesquisas iniciadas pelo
expressionismo abstrato. Embora certos críticos aproximem as obras de Manabu Mabe
(1924 - 1997), Tomie Ohtake (1913) e Flavio-Shiró (1928) dessa vertente, elas parecem
se ligar, antes, ao tachismo ou ao abstracionismo lírico, que conheceu adesões variadas
entre nós, seja em Cicero Dias (1907 - 2003), seja em Antonio Bandeira (1922 - 1967).
Nos anos 80, observa-se uma apropriação tardia da obra de De Kooning na produção
de Jorge Guinle (1947-1987).

No Brasil, todas essas tendências foram chamadas de Modernismo, movimento que


equivale ao Futurismo, para os italianos, e ao Expressionismo, para os alemães. Graças
à Semana de Arte Moderna de 1922, o movimento de renovação tomou rumos definidos
em nosso país, apresentando propostas consistentes.

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10. POP ART

Na década de 1960, os artistas defendem uma arte popular (pop) que se comunique
diretamente com o público por meio de signos e símbolos retirados do imaginário que
cerca a cultura de massa e a vida cotidiana. A defesa do popular traduz uma atitude
artística contrária ao hermetismo da arte moderna. Nesse sentido, a arte pop se coloca na
cena artística que tem lugar em fins da década de 1950 como um dos movimentos que
recusam a separação arte/vida. E utiliza como traços característicos a incorporação das
histórias em quadrinhos, da publicidade, das imagens televisivas e do cinema.

Uma das primeiras, e mais famosas, imagens relacionadas ao que o crítico britânico
Lawrence Alloway (1926 - 1990) chamaria de arte pop é a colagem de Richard
Hamilton (1922), O que Exatamente Torna os Lares de Hoje Tão Diferentes, Tão
Atraentes?, de 1956. Concebido como pôster e ilustração para o catálogo da
exposição This Is Tomorrow [Este É o Amanhã] do Independent Group de Londres, o
quadro carrega temas e técnicas dominantes da nova expressão artística. A composição
de uma cena doméstica é feita com o auxílio de anúncios tirados de revistas de grande
circulação. Nela, um casal se exibe com (e como) os atraentes objetos da vida moderna:
televisão, aspirador de pó, enlatados, produtos em embalagens vistosas etc. Os anúncios
são descolados de seus contextos e transpostos para a obra de arte, mas guardam a
memória de seu locus original. Ao aproximar arte e design comercial, o artista borra,
propositadamente, as fronteiras entre arte erudita e arte popular, ou entre arte elevada e
cultura de massa.

Em carta de 1957, Hamilton define os princípios centrais da nova sensibilidade artística:


trata-se de uma arte "popular, transitória, consumível, de baixo custo, produzida em
massa, jovem, espirituosa, sexy, chamativa, glamourosa e um grande negócio". Ao lado
de Hamilton, os demais artistas e críticos integrantes do Independent Group lançam as
bases da nova forma de expressão artística, que se aproveita das mudanças tecnológicas
e da ampla gama de possibilidades colocada pela visualidade moderna, que está no
mundo - ruas e casas - e não apenas em museus e galerias. Eduardo Luigi Paolozzi
(1924 - 2005), Richard Smith (1931) e Peter Blake (1932) são alguns dos principais
nomes do grupo britânico.

Ao contrário do que de sucede na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos os artistas


trabalham isoladamente até 1963, quando duas exposições - Arte 1963: Novo
Vocabulário, Arts Council, na Filadélfia, e Os Novos Realistas, Sidney Janis Gallery,
em Nova York - reúnem obras que se beneficiam do material publicitário e da mídia. É
nesse momento que os nomes de Andy Warhol (1928 - 1987), Roy Lichtenstein (1923 -
1997), Claes Oldenburg (1929), James Rosenquist (1933) e Tom Wesselmann (1931 -
2004) surgem como os principais representantes da arte pop em solo norte-americano.
Sem programas ou manifestos, seus trabalhos se afinam pelas temáticas abordadas, pelo
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desenho simplificado e pelas cores saturadas. A nova atenção concedida aos objetos
comuns e à vida cotidiana encontra seus precursores na antiarte
dos dadaístas e surrealistas. Os artistas norte-americanos tomam ainda como referência
certa tradição figurativa local - as colagens tridimensionais de Robert Rauschenberg
(1925 - 2008) e as imagens planas e emblemáticas de Jasper Johns (1930) -, que abre a
arte para a utilização de imagens e objetos inscritos no cotidiano. No trato desse
repertório plástico específico não se observa a carga subjetiva e o gesto lírico-
dramático, característicos do expressionismo abstrato - que, aliás, a arte pop comenta de
forma paródica em trabalhos como Pincela, 1965, de Lichtenstein.

No grupo norte-americano, o nome de Wesselmann liga-se às naturezas-


mortas compostas de produtos comerciais, Lichtenstein, aos quadrinhos - Whaam!, 1963
-, e Oldenburg, mais diretamente às esculturas - Duplo Hambúrguer, 1962. Entre eles,
são a figura e a obra de Warhol que se tornariam referências primeiras da arte pop, por
exemplo, 32 Latas de Sopas Campbell, 1961/1962, Caixa de Sabão Brilho, 1964, e os
diversos trabalhos feitos com imagens da atriz Marilyn Monroe (1926 - 1962), como Os
Lábios de Marilyn Monroe, Marilyn Monroe Dourada e Díptico de Marilyn,
todos datados de 1962. Suas obras se particularizam pelo uso original da cor brilhante,
de materiais industriais e pelo exagero do efeito de simultaneidade (na repetição das
latas de Campbell e dos lábios de Marilyn). A multiplicação das imagens enfatiza a
idéia de anonimato e também o efeito decorativo. A imagem destacada e reproduzida
mecanicamente, com o auxílio do silkscreen, afasta qualquer vestígio do gesto do
artista. A celebração da opulência e da fama convive, a partir de 1963, com as tragédias,
com a violência racial e das guerras (da Guerra Fria, do Vietnã). Datam desse
período Levante Racial Vermelho, 1963, e Cadeira Elétrica, 1964.

No Brasil, sugestões da arte pop foram trabalhadas na década de 1960 por Antonio Dias
(1944) - Querida, Você Está Bem?, 1964, Nota Sobre a Morte Imprevista, 1965,
e Mamãe, Quebrei o Vidro, 1967 -, Rubens Gerchman (1942 - 2008) - Não Há Vagas,
1965, e O Rei do Mau Gosto, 1966 -, Claudio Tozzi (1944) - Eu Bebo Chop, Ela Pensa
em Casamento, 1968, entre outros. No entanto a incipiente proliferação no Brasil dos
meios de comunicação de massa, na década de 1960, leva, paradoxalmente, esses
artistas a aproximar técnicas da arte pop (silkscreen e alto-contraste) a temas engajados
politicamente.

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