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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto.

A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência


fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
- ISSN 2236-5044

A (IN) CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO INSTITUTO DA


REINCIDÊNCIA FUNDAMENTADA NO
DIREITO PENAL DO AUTOR

Halison Tharlley Nolli1


Airto Chaves Junior2

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo verificar a (in) constitucionalidade material


da reincidência e sua respectiva adequação aos objetivos da Constituição da
República Federativa do Brasil. A pesquisa leva em conta a dualidade direito
penal do autor e direito penal do fato e busca, a partir deste plano diferencial
de perspectivas, averiguar distintas formas de tratamento do instituto da
reincidência para agravar e vedar benefícios penais em razão da prática de
idênticas infrações penais, porém, com conduta de vida dessemelhante. Ao
final, a pesquisa demonstra que a previsão da reincidência, tal como prevista
no Código Penal Brasileiro não se encontra em harmonia com os objetivos da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que visam promover
a igualdade, o fim da marginalização e das desigualdades sociais. O estudo
leva em conta acórdãos exarado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, que deixam de aplicar a reincidência como agravante da pena por
considerá-la inconstitucional, tendo em vista que, conforme esses julgados, a
reincidência encontra fundamento no direito penal do autor, teoria esta
declaradamente repudiada por nosso ordenamento jurídico, mas que de forma
enrustida é enaltecida dia após dia no âmbito jurídico penal por meio de
institutos que a asseguram, tais como a reincidência. Quanto à metodologia
empregada, registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método

1
Acadêmico do 9º Período do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – Univali, campi Itajaí.
2
Mestre em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí na linha de pesquisa: Produção e Aplicação do Direito
- Sociedade; Área de Concentração: Fundamentos do Direito Positivo; Professor do Curso de Graduação em
Direito da Univali nas disciplinas de Direito Penal e Direito Processual Penal, Professor de Direito Penal da Escola
do Ministério Público do Estado de Santa Catarina (EMPSC); Professor de Direito Penal, Direito Processual Penal
e Prática Penal do Morgado Concursos; Professor de Criminologia do ICPG (Instituto Catarinense de Pós-
Graduação); Parecerista da Revista Direito e Política (ISSN 1980-7791), do Programa de Pós-Graduação Strito
Sensu da UNIVALI; Parecerista da Revista Eletrônica de Iniciação Científica do Cejurps - UNIVALI (ISSN 2236-
5044). Advogado.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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Indutivo. Já, a fase de construção das considerações finais do artigo é


composta na base lógica Indutiva.

INTRODUÇÃO

A reincidência está prevista no Código Penal e possui diversos efeitos


negativos para o acusado ou apenado. Os tribunais e parte da doutrina
nacional justificam a reincidência sob o argumento da necessidade de maior
reprovabilidade do autor de um crime que já foi condenado com sentença
transitada em julgado, pois este, em tese, não deveria voltar a delinquir, tendo
em vista que já conhece o sistema penal e, em tese, já foi ressocializado.

Presume-se, desta forma, que, se alguém já foi condenado voltar a delinquir, a


responsabilidade pela reincidência será exclusiva sua; e, isto se dará em
decorrência de sua maior periculosidade, pois, se deduz que o fato de um
autor de crime, já conhecedor do sistema penal e, em tese, ressocializado,
cometer novo crime, é devido a seu caráter ser voltado à prática delitiva.

Ocorre que, tal presunção não pode prosperar, pois além de acabar punindo o
autor por quem ele supostamente é – direito penal do autor - e não pelo crime
que cometeu – direito penal do fato -, atuando, assim, com base na
periculosidade presumida, acaba gerando uma dupla punição pelo mesmo
fato, o que caracteriza bis in idem.

Desta forma, a presunção de periculosidade, não se coaduna com o que


dispõe a Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, pois o texto
constitucional adotou expressamente, dentre seus objetivos: a inclusão
social3, o fim da marginalização e das desigualdades sociais. A reincidência

3
BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Brasília. 2009. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=116383>. Acesso em: 20 de janeiro de 2012.
[...]Direitos humanos: ressocialização de presos e combate à reincidência. Existem hoje no Brasil cerca de 446 mil
presos, segundo dados apurados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Uma relação de 229 detentos para
cada grupo de mil habitantes, quase o dobro do registrado na Argentina e mais que o triplo da taxa existente na
Dinamarca. Do total de presidiários brasileiros, 57% já foram condenados, enquanto outros 43% ainda são
provisórios e aguardam julgamento. O Brasil é signatário de tratados que versam sobre direitos humanos como o
Pacto de San José, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e a Declaração Universal dos
Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Todos eles proíbem o tratamento degradante do
preso [...] O déficit carcerário é de 156 mil vagas no Brasil. Se fosse retirado das celas todo o excesso de
presidiários, daria para encher quase dois estádios do Maracanã. [...]. “As penitenciárias não podem ser depósitos
de pessoas indesejáveis, mas um mecanismo de ressocialização” defendeu o ministro Gilmar Mendes ao visitar o
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contraria tais objetivos, uma vez que causa a exclusão social, marginaliza e
promove a desigualdade.

Diante disso, a (in) constitucionalidade da reincidência pode ser contestada a


partir de dois pressupostos: a) material: ou seja, sua incompatibilidade
substancial com os objetivos e princípios constitucionais, por estar à
reincidência pautada no direito penal do autor, levando em consideração o
sujeito e não o crime praticado; e, b) formal: por confrontar diretamente com
os tratados de direitos humanos que o Brasil ratificou e que vedam à dupla
punição pelo mesmo fato.

Este artigo abordará a (in) constitucionalidade da reincidência e sua (in)


subsistência no ordenamento jurídico brasileiro sob o enfoque material, ou
seja, levará em conta a (in) compatibilidade da previsão do instituto com os
objetivos e princípios constitucionais4por estar pautado na teoria do direito
penal do autor.

O objetivo será constatar se a teoria que se coaduna com a reincidência é a


do direito penal do autor, tendo em vista que são levadas em conta
circunstanciam pessoais e não fáticas para se aplicar a reincidência, conduta
essa não condizente com a Constituição da República Federativa do Brasil,
por promover a desigualdade; marginalização e uma forma de discriminação
do autor de um crime já familiar ao sistema penal frente a um autor de um
crime estranho a este sistema, ferindo assim os princípios da individualização
da pena e culpabilidade.

1 A REINCIDÊNCIA
1.1. Aspectos históricos

Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), [...]. De acordo com ele, “nenhum país logrou reduzir o índice de
criminalidade e, portanto, melhorar os índices de segurança, sem atacar o problema sério da reincidência”. E os
números fundamentam essa preocupação. Segundo dados obtidos a partir dos mutirões, os índices de
reincidência variam entre 60% e 70%. Ou seja, sem perspectiva, o preso volta a praticar crimes quando retorna ao
convívio social.
4
A eventual incompatibilidade da reincidência sob o prisma formal, portanto, não é tema da presente pesquisa.

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Há muito tempo se tem notícia da causa de agravação da pena por questão de


reincidência. Estudos indicam que foi no Direito Romano, também no
Germânico, onde ela aparece pela primeira vez5.

No entanto, foi no Direito Francês que a reincidência penal ganhou contornos


determinantes. O Código Penal francês de 1810 deu inicio a essa nova fase.
Sofreu várias alterações, principalmente em 1885. Contudo, a maior mudança
ocorreu em 1907. Na Germânia, os tedescos a previam apenas para alguns
delitos, como o furto, o roubo, a receptação e o estelionato6.

Portugal, em 1891, aplicava pena de deportação para os autores de crimes


quando reincidentes era, segundo Falconi7: “uma forma velhaca de corrigir os
problemas internos, passando-os para outras plagas”.

A Inglaterra, em 1908, tendo em vista que o problema da reincidência


começava a ter repercussão maior, criou a “Prevention of crime act”. Tal
providencia teve reflexos imediatos em algumas localidades dos Estados
Unidos, que a adotou com as alterações regionais necessárias. O mesmo
ocorria na União Soviética em suas quinze Repúblicas8.

No Brasil o Código Criminal do Império de 1830 consagrava a reincidência em


seu artigo 16, §3º, como circunstância agravante, no entanto, a reincidência
deveria ser específica9 (prática de novo delito da mesma natureza do
precedente).

Da mesma forma, o Código Penal de 1890, artigo 40, considerava


circunstancia agravante a reincidência especifica10. A redação antiga do

5
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. Cone. São Paulo. 2002. p.285.
6
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 285.
7
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 285.
8
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 285/286.
9
Segundo Zaffaroni e Pierangeli: se denomina de reincidência especifica a que exige a pratica de um novo delito
igual, ou da mesma categoria, daquele pelo qual sofreu anterior condenação. ZAFFARONI, Eugenio Raúl.
PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. 6. ed. revista e atualizada. p. 716.
10
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 286.
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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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Código Penal de 1940 estabelecia, além da reincidência específica, a


reincidência genérica11, com caráter de perpetuidade, nos artigos 46 e 47.

A Lei 6.416 de 1977 extinguiu a reincidência específica e limitou o tempo dos


efeitos da condenação anterior, adotando o sistema da temporariedade ou
transitoriedade, de forma que deixaram de prevalecer os efeitos da
reincidência se decorridos cinco anos12.

Atualmente, a reincidência está prevista no artigo 63 do Código Penal,


redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984: “Art. 63 - Verifica-se a
reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em
julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por
crime anterior”.

Assim, pela redação do artigo 63 do Código Penal, pode-se constatar que


nosso ordenamento jurídico adotou a reincidência genérica.

1.2. Conceito

A reincidência, conforme artigo 63 do Código Penal é o cometimento de um


crime após já ter sido o autor condenado por outro crime.

Esta condenação pode ser proferida no Brasil ou no estrangeiro, no entanto,


quando a sentença condenatória for proferida em outro país, o crime tem que
ser punido também aqui no Brasil13.

Embora não seja necessário nenhum requisito especial para a sentença


estrangeira ou sua homologação, para que está possa gerar os efeitos da
reincidência, alguns pressupostos deverão ser atendidos: a) a conduta
também deve ser considerada crime no Brasil; b) deve haver a previsão da

11
Conforme ensinamento de Zaffaroni e Pierangeli: fala-se em reincidência genérica, que se conceitua como o
cometimento de um delito depois de ser sido o agente condenado e submetido à pena por outro delito. Zaffaroni,
Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p. 716.
12
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal brasileiro, volume 1: parte geral, art. 1° a 120. 10. ed. rev. atual. e
ampl. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2012. p. 496.

13
ZAFFAONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p. 721.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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reincidência no país que foi cometido o crime, por exemplo, não seria possível
condenar como reincidente no Brasil uma pessoa condenada na Colômbia,
porque esta legislação não prevê a reincidência14.

De nada adianta a observância destas formalidades ou requisitos para


aplicação sem se levar em conta que a sentença penal estrangeira deve ser
produzida com a observância do devidos processo legal. Assim preceituam
Zaffaroni e Pierangelli15 que “[...] deve tratar-se de uma sentença condenatória
pronunciada como conclusão de um processo em que se tenha respeitado os
direitos humanos fundamentais, em tema de garantias processuais do due
process of Law [...]”.

Para efeitos da reincidência, não se considera a infração penal militar anterior


praticada o crime político ou a contravenção penal. A lei não faz distinção do
crime anterior, ou o crime seguinte foram praticados dolosa ou
16
culposamente .

Assim, para que o autor de um delito possa ser considerado reincidente, deve
ter havido uma sentença condenatória, transitada em julgado, anterior; e
ainda, devem-se observar o pressuposto do artigo 64 do Código Penal:

Art. 64 - Para efeito de reincidência:


I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do
cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver
decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o
período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se
não ocorrer revogação; (...).

Ou seja, o autor de um crime será considerado reincidente se cometer um


novo delito após já ter sido condenado, esta condenação já deve ter
transitado em julgado, e desde que não tenha decorrido mais de cinco anos
do transito em julgado e o cometimento do novo crime.

14
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 10. ed. rev., atual e ampl., 2010.
15
ZAFFAONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p. 724.
16
Nas palavras de Zaffaroni e Pierangeli: [...] Existem códigos estrangeiros em que os efeitos da reincidência limitam-
se às penas privativas de liberdade, mas isso não ocorre com a lei brasileira, porque nesta sequer existe
fundamento para excluir os delitos apenados com multa [...]. ZAFFAONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José
Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p. 723.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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1.2 Consequências

A reincidência17 é instituto de direito penal que visa repreender de forma mais


gravosa o autor de crime que já tenha cometido outro crime, e tenha por este
sido condenado com sentença transita em julgado, num intervalo de tempo
não superior a cinco anos 18.

A reincidência pode ser dividida em reincidência real ou ficta. A reincidência


real ocorre quando o agente comete novo delito depois de já ter efetivamente
cumprido pena por crime anterior; já a reincidência ficta ocorre quando o
autor de um crime comete um novo crime depois de ter sido condenado, mas
ainda sem cumprir pena 19.

O Código Penal Brasileiro adotou a reincidência ficta, que possui vários


efeitos, tais como: (a) agrava a pena privativa de liberdade (art. 61, I CP); (b)
determina regime de cumprimento de pena mais severo (art. 33, CP); (c)
impede substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos,
se especifica em crime doloso (art. 44, II, CP); (d) impede substituição da pena
privativa de liberdade por multa (art. 60, §°, CP); (e) prepondera no concurso
de circunstâncias agravantes e atenuantes (art. 67, CP); (f) obstrui o sursi,
quando da prática de crime doloso (art. 77, I, CP); (g) aumenta o lapso
temporal de cumprimento da pena para obtenção do livramento condicional
(art. 83, II, CP); (h) aumenta o prazo (art. 100, CP) e interrompe a prescrição
(art. 117, VI, CP); (i) revoga o sursi (art. 81, CP) e a reabilitação (art. 95, CP); (j)
impede alguns casos de diminuição da pena (art. 155, § 2º; 170 e 171, § 1º, do
CP); (l) impede a prestação de fiança (art. 323, III, CPP); (m) impossibilita a
suspensão condicional do processo (art. 89, Lei nº. 9.099/95), entre outros20.

2 DIREITO PENAL DO AUTOR

17
Segundo Romeu Falconi: A palavra reincidência é de origem latina e significa incorrer, podendo também
representar acontecer, ocorrer, etc. como já dito, do latim “incidire”. O prefixo “re” resolve a problemática
vernacular que concerne à reinteração: incorrer outra vez. FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3.
ed., rev., ampl. e atual. Cone. São Paulo. 2002. p. 285.
18
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 10. ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revistas dos
Tribunais, 2010.
19
NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 10. ed. rev., atual e ampl. p. 435.
20
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. 6. ed.
revista e atualizada. Revista dos Tribunais. São Paulo. 2006

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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Antes de adentrar no conceito de direito penal do autor, faz-se necessário


entender o que significa direito penal do fato.

Direito penal do fato é a regulação legal que visa punir alguém por ter
cometido um fato, tipificado como infração penal; e, este fato típico se
relacione apenas com a conduta do agente e não com elementos ligados à
personalidade ou modo vida do autor do fato típico21.

Claus Roxin22 define direito penal de fato por uma “(...) regulação legal, em
virtude da qual a punibilidade se vincula a uma ação concreta descrita
tipicamente (...) e a sanção representa só a resposta do fato individual, e não a
toda condução da vida do autor e os perigos que no futuro se esperam do
mesmo” 23.

O direito penal do fato tem origem nos princípios liberais, sendo uma garantia
da aplicação da lei penal de uma forma igualitária, ou seja, influi na segurança
jurídica dos direitos individuais, pois evita que arbitrariedades sejam usadas
como fundamentos para condenação de alguém24.

Desta forma, o ordenamento jurídico que se baseie em princípios de Estado


Democrático de Direito, se inclinará, sempre, a regular o direito sancionador
tendo por base o fato praticado e não os elementos ligados ao modo de vida
do agente que praticou o fato25.

Anotino García-Pablo de Moloina26 formula as seguintes considerações


quanto ao direito penal do fato: “O ser humano responde perante a lei penal
pelo que fez – ação ou omissão -, não pelo o que ele é. Todo delito pressupõe,
portanto, uma ação ou uma omissão, um comportamento (...)” 27.

21
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. Civitas. Madrid,
2006.
22
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 176.
23
Tradução livre dos autores.
24
DE MOLINA, Anotino García-Pablo. Derecho penal, introducción. Servicio publicaciones facultad derecho,
Universidad Complutense Madrid. Madrid. 2002. p. 359.
25
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. 2006.
26
DE MOLINA, Anotino García-Pablo. Derecho penal, introducción. p. 359.
27
Tradução livre.

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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O direito penal de fato dá azo para duas consequências: a) ninguém pode ser
punido pelos seus pensamentos; b) a forma de ser do sujeito, sua
personalidade, não pode servir de fundamento para a responsabilidade
criminal ou agravação de sua pena28.

No entanto, como salienta Roxin29, as intenções preventivo-especiais, tendem


a criar tipos penais pautados na personalidade do sujeito ao fato em si:

Por outra parte, as fortes tendências preventivo-especiais, existentes desde


os tempos de Liszt no direito penal alemão, vão na direção da personalidade
do delinquente, para se evitar futuros delitos, dependendo estes mais da
personalidade que o concreto fato individual.

Assim, em sentido inverso, se entende o direito pena do autor como o tipo


penal que se importe mais com modo de vida ou personalidade do agente
(passado), que o fato (presente) praticado por este30.

Nas palavras de Molina31:

O chamado direito penal do autor constitui a antítese do direito


penal do fato. Trata-se de um modelo de direito penal totalitário,
defendido pela doutrina alemã próxima do regime nazista, ao teor
da qual o homem tem que ser processado não pelo que fez, mas
sim pelo que é 32.

Claus Roxin33 salienta que: “O que se faz culpável aqui para o autor não é o
fato que cometeu, e sim o que o autor é, este se converte em objeto da
censura legal”. Partindo deste pressuposto, resta evidenciado a afronta ao
princípio da isonomia, uma vez que se pune quem se é ao em vez do que se
fez.

Desta forma, aonde os pressupostos para a aplicação penal se incluem algo


diferente da ação individual, como por exemplo, o modo de vida ou

28
DE MOLINA, Anotino García-Pablo. Derecho penal, introducción.
29
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 176.
30
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. 2006.
31
DE MOLINA, Anotino García-Pablo. Derecho penal, introducción. p. 360.
32
Tradução livre do espanhol.
33
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 177.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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personalidade do autor, nas palavras de Claus Roxin34: “estaremos diante de


um sistema em que a pena se dirige ao autor como tal”, ou seja, um direito
penal do autor.

Para Liszt e seus seguidores, os pressupostos da punibilidade devem ser


determinados pelos critérios de direito penal de fato, em consequência, os
efeitos jurídicos devem ser fixados mais por critérios de direito penal do
autor35.

Claus Roxin36, discorrendo sobre a tese defendida por Teser e Kollmann,


seguidores de Lizst, afirma que:

Ambos sustentam (desde muito diversos pontos de partida


metodológicos em particular) as teses de que não se devem
processar fatos por sua repercussão no mundo exterior, mas sim
por que nos revela sobre interior do autor. Por tanto, o fato é só um
sintoma da personalidade do autor37.

O direito penal, pautado nas características do autor, fundamenta-se, segundo


Liszt e seus seguidores (Radbruch; Eb. Schmidt, Kohlrausch, Grünhut), no
pressuposto de que o fato típico praticado pelo sujeito é a reflexão do caráter,
como expressão da personalidade deste, nas palavras de Roxin38:

(...) a culpabilidade do autor reside (desde uma perspectiva


determinista) na responsabilidade do homem pelo seu caráter, por
que a periculosidade do delinquente condicionada por sua
personalidade se apresenta diretamente como elemento de
culpabilidade.

O direito penal baseado no fato tem a função de promover uma sanção


pautada no princípio da isonomia, proporcionalidade; de outro modo, o direito
penal do autor, por partir de premissas subjetivas/arbitrarias, não é capaz de
garantir a igualdade e proporcionalidade da aplicação da pena ou até mesmo
seleção dos fatos típicos39.

34
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 177.
35
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. 2006.
36
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. 2006.
37
Tradução livre
38
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 177.
39
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. 2006.

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
- ISSN 2236-5044

3 REINCIDÊNCIA E O DIREITO PENAL DO AUTOR

A legitimidade da reincidência como agravante de pena é contestada por


alguns autores40, sob o argumento de que esta quebra a proporcionalidade,
que necessariamente deve existir entre o crime praticado e a pena, já que esta
última vê-se influenciada por uma circunstancia totalmente estranha ao fato
que se encontra sobre análise.

Nas palavras de Fernando Galvão41: “a reincidência não é verdadeiramente


uma circunstancia já que não se relacionada com o delito praticado, e sim
com o seu autor”.

Manzini42 reconhece que a reincidência não aumenta a gravidade objetiva do


delito; contudo, defende ele que o instituto serve para qualificar como mais
criminosa a personalidade de seu autor. Seguindo este raciocínio, Fernando
Galvão43 conclui:

(...) a reincidência estaria relacionada com o elemento subjetivo do


autor e produzira reflexos no exame da imputabilidade (...). A
adoção desse posicionamento revela que a censurabilidade da
culpabilidade valoriza com maior prioridade a pessoa do
delinquente do que o fato que este cometeu.

Ocorre que, o Direito penal não pode ser pautado por presunções, ou seja,
nada garante que alguém que cometeu um crime culposo e volta a delinquir é
mais perigoso que alguém que comete apenas um homicídio doloso. Zaffaroni
e Pierangeli44 tecem o seguinte argumento a respeito da periculosidade
presumida:

Não faltaram doutrinadores que acabaram por inventar a ideia da


“periculosidade presumida”. Todavia, a periculosidade, no caso de
se poder valorá-la, constitui um juízo fático, e, por conseguinte,
jamais poderia ser presumido juris et jure, porque se assim fosse,
40
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. 6. ed.
revista e atualizada. 2006.
41
GALVÃO, Fernando. Direito penal parte geral. Del Rey. Belo Horizonte, 2007. p. 667.
42
MANZINI, Vicenzo. Tratado de derecho penal, t.3. Ediar. Buenos Aires. 1948.
43
GALVÃO, Fernando. Direito penal parte geral. p. 668.
44
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p.
718.

1426
NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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estabeleceria a presença de um fato quando o fato não existe, e


isso, na ciência jurídica, não se denomina “presunção” e sim
“ficção”.

Os defensores da reincidência sob o prisma da maior periculosidade do autor


de um crime quanto já condenado por outro crime encontram certa
dificuldade de justificação desta tese, uma vez que, conforme Zaffaroni e
Pierangeli45: “nada faz presumir ser mais provável que venha praticar um
delito de emissão de cheque sem provisão de fundos, quem antes causou um
homicídio culposo com o seu veículo”.

A teoria psicológica da culpabilidade afirma que a reincidência demonstra


uma decisão mais forte na vontade do sujeito, dotada de maior permanência
para a prática delitiva. Zaffaroni e Pierangeli46 contestam esta teoria por
entenderem que:

Pode acontecer de ter a própria condenação anterior reforçado


essa decisão (voltar a delinquir), e, por outro lado, quando os
delitos são completamente diferentes, não se pode falar de um
reforço de uma vontade que não existe.

Outra corrente entende que se a condenação anterior não foi suficiente para
efetivar o efeito repressivo especial, é necessário aumentar a condenação
pelo segundo delito. Da mesma forma que as teorias anteriores, Zaffaroni e
Pierangeli47, contestam, afirmando que:

A mera notificação de uma condenação, sem qualquer


cumprimento de pena, não pode contramotivar a ninguém (...). No
efetivo cumprimento da pena, pode-se afirmar esta consequência,
posto que, mui frequentemente, não é contramotivadora, mas
precisamente motivadora, ou seja, condicionante da assunção do
rol ou papel desviado do sujeito.

Desta forma, a reincidência só seria concebível caso o Direito penal de hoje


adotasse como justificativa da pena o autor em si mesmo e não o fato por ele
praticado, em outras palavras, a reincidência não tem lugar no ordenamento

45
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p.
719.
46
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p.
719.
47
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral. p. 720.

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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jurídico que adotar a teoria do direito penal de fato no lugar da teoria do


direito penal de autor. Conforme Alexandre Morais da Rosa48:

A reincidência serve para, de mãos dadas com a análise da


personalidade do agente, fixar a pena necessária para sua
recuperação, com franca influência da ‘Escola Positiva’, e
fundamentada na periculosidade, violando escancaradamente o
princípio do ‘non bis in idem’ e da ‘intangibilidade da coisa julgada.

Ou seja, o melhor modelo que para explicar a reincidência é a do direito penal


do autor, por pautar-se na premissa da periculosidade presumida. Na verdade,
a reincidência serve para identificar as pessoas em disciplinadas e
indisciplinadas49.

Nas palavras de Moraes da Rosa50: “a ‘periculosidade’ foi defenestrada dos


Estados Democráticos, impossível seu manejo a partir da incidência de uma
‘oxigenação constitucional’ (Cap. 3º) do Código Penal”.

Alguns autores51entendem que a reincidência releva uma tendência mais


favorável do sujeito a cometer novos crimes, portanto sua menor liberdade de
escolha do comportamento correto. A reincidência deste modo deveria
produzir efeitos atenuantes, pelo reconhecimento de uma menor
imputabilidade do autor.

Assim, a reincidência possui um fim alegórico: manter a disciplina e a ordem,


sob a ameaça de se aumentar a pena daquilo que se fez e se quitou, punindo-
se novamente a situação anterior52.

Paulo Queiroz53, afirma que:

A pessoa é assim considerada pelo direito penal como uma variável


independente e não como uma variável dependente das situações.
Vale dizer, a lei penal trabalha com imagens falsas, pois se baseia
em ações, em vez de interação, funda-se em sistemas de

48
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes. Rio de Janeiro. Lumen Jures. 2006. p.
354/355.
49
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes. p. 355.
50
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes. p. 355.
51
GALVÃO, Fernando. Direito penal parte geral. p. 668.
52
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes. p. 356.
53
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2008. p. 102.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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responsabilidade biológica e não em sistemas de responsabilidade


social.

Ou seja, toda sistemática penal se funda na ideia de culpabilidade individual,


não levando em consideração o meio-ambiente que vive o autor do crime, ou
seja, desprezando o sistema social em que este se insere54.

4 (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA REINCIDÊNCIA

A Constituição da República Federativa do Brasil tem como objetivo55, dentre


outros, promover a igualdade e erradicar qualquer forma de marginalização,
desigualdade social ou qualquer forma de discriminação:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa


do Brasil:
(...)
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

José Afonso da Silva56 conceitua marginalização como: “a pessoa que fica à


margem da vida social”, ou seja, a pessoa que não faz parte da vida comum
social por algum motivo, econômico, penal ou moral (preconceito com quem
cumpre ou cumpriu uma pena).

Desta forma, com o fim da marginalização, o objetivo constitucional do fim da


desigualdade social estará alcançado em partes, pois um está relacionado
com o outro.

A promoção do bem de todos só é possível com o fim da marginalização; das


desigualdades sociais e sem discriminação de qualquer natureza, sendo
objetivo primordial de todo Estado, quer a constituição formal o diga ou não57.

No entanto, a reincidência, ao invés de promover a ressocialização, promove a


estigmatização da pessoa, prejudicando a sua reincorporação social. O

54
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed.
55
José Afonso da Silva conceitua objetivo como: um signo que aponta para a frente, indicando um ponto adiante a
ser alcançado pela prática de alguma ação: aqui ação governamental. SILVA, José Afonso. Comentário
contextual à constituição. 6. ed. ataul., Malheiros. São Paulo. 2008. p. 46.
56
DA SILVA, José Afonso. Comentário contextual à constituição. 6. ed., atual. p. 48.
57
SILVA, José Afonso. Comentário contextual à constituição. 6. ed., atual.

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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registro da condenação uma vez cumprida e a sua relevância potencial futura


colocam o condenado que cumpriu sua condenação em desigualdade frente
ao resto da população, tanto na questão jurídica como na questão
fática/social. 58

A reincidência está prevista na maioria dos Códigos do continente americano.


No entanto tal presunção absoluta de uma maior periculosidade do sujeito é,
sem dúvida, incompatível com os princípios garantistas penais que se pauta o
Estado Democrático de Direito59.

O autor de um crime, quando ainda ostenta a qualidade de primariedade, não


obstante ter praticado diversos delitos, não tem seu grau de periculosidade
atenuado em relação a um autor de um crime quando reincidente em crimes
de menor potencial ofensivo. Neste sentido, afirma Paulo Queiroz 60:

Cumpre notar, inicialmente, que, com a relativização determinada


pelo princípio da presunção legal de inocência, o instituto perdeu
grandemente o seu sentido, uma vez que nem sempre o réu
reincidente é mais perigoso do que o não reincidente. É de
reconhecer, portanto, que a reincidência já não constitui um
sintoma seguro de maior perigosidade, não se justificando, também
por essa razão, sua existência.

A reincidência não deixa de ser uma pena tarifada, uma vez que aumenta a
pena por fundamento diverso do justificante da medida geradora da
culpabilidade e responsabilidade próprias. Dessa forma, é possível verificar
que a reincidência não se pauta no direito penal do fato, e sim, tem forte apelo
ao direito penal do autor, de modo que o agravamento decorrente da
reincidência equivale à pena sem culpabilidade, sem fundamento no fato em
61
si, importando dupla valoração da mesma causa.

Paulo Queiroz62 conclui que:

Por isso é que Cobo del Rosal e Vives Antón propõem a abolição
pura e simples do instituto, porque, além de incompatível com um
58
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes. p. 356.
59
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. 2008. 102/103.
60
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. p. 340.
61
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. 340.
62
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. p. 340

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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direito penal da culpabilidade pelo fato, esta evidenciada sua total


ineficácia.
63
Existem autores, como Juarez Cirino dos Santos , que propõem uma
reanálise das consequências da reincidência, em vez desta ensejar o
agravamento da pena, deve, ao contrario, justificar sua atenuação.

Ana Cláudia de Bastos e Marcus Alan de Melo Gomes64 expõe o seguinte


argumento:

É perfeitamente possível que o juiz se depare com uma pessoa


conduzida à pratica da conduta cuja pena se trata de fixar-lhe, por
força das limitações socialmente impostas à sua liberdade de
escolha e a reincidência pode estar evidenciando a incapacidade
do sistema de controle em promover a reinserção social deste
sujeito. (...), a reincidência pode militar em favor de usar redução no
índice de reprovabilidade da conduta e, consequentemente, do
valor da pena base.

Assim, se o novo crime é cometido após o sujeito ter cumprido sua pena, o
processo de deformação e embrutecimento da pessoa, que decorre do
sistema penitenciário, deveria induzir o legislador a incluir a reincidência real
entre as circunstancias atenuantes, como consequência da atuação deficiente
e estigmatizante do Estado sobre sujeitos criminalizados65.

Agora, se o novo crime é cometido pelo sujeito após a simples formalidade do


transito em julgado de condenação anterior, ou seja, reincidência ficta, não é
possível indicar qualquer presunção de periculosidade, sendo assim, incapaz
de se fundamentar circunstância agravante. Desta forma, Paulo Queiroz66
conclui que:

(...) no caso de reincidência real (o condenado cumpriu de fato a


pena, passando pela experiência carcerária), dele ela ensejar a
atenuação da pena; na hipótese de reincidência ficta (o condenado
não chegou a cumprir pena alguma, por qualquer motivo, como
fuga, por exemplo), tal circunstancia é irrelevante, devendo ser
ignorado.

63
DOS SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal: a nova parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1985
64
BASTOS, Ana Cláudia de. GOMES, Marcus Alan de Melo. Ciências criminais, Lumen Juris. Rio de Janeiro.
2009.p.223.
65
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed.
66
QUEIROZ, Paulo. Direito Penal parte geral, 4. ed. p. 340

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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A ideia de que o Estado pode prender o cidadão para aplicar a


pena/recuperação; e, diante da ausência de condições para tanto - no qual o
cárcere deforma/prejudica -, na verdade, a reincidência deve ser considerada
67
como causa atenuante da pena e não agravante, como hoje é. Falconi
compartilha o mesmo ponto de vista:

Ora, com todo respeito, se a primeira pena se mostrou ineficaz, não


há de ser a exacerbação da segunda que a transformará em eficaz.
Redundante é o equívoco de pensar que o agravamento da pena
poderá, de alguma forma, intimidar o delinquente.

Cirino dos Santos68, seguindo este raciocínio afirma que:

Se os efeitos criminógenos da prisão são reconhecidos, então a


ineficácia da prevenção especial reduz a execução penal ao terror
retributivo. E a questão é esta: se a pena criminal não tem eficácia
preventiva – mas, ao contrário, possui eficácia invertida pela ação
criminógena exercida –, então a reincidência criminal não pode
constituir circunstancia agravante.

Desta forma, o crime cometido anteriormente, crime este gerador da


reincidência, só pode ser levado em consideração para o cômputo da pena
como antecedentes criminais, na forma do art. 59 do Código Penal, ou seja,
como circunstancias judicial. Somente ali poderá ser feita a correta análise da
repetição criminosa, seguindo o princípio de culpabilidade, pois neste
momento o juiz estará livre para fazer uma análise, em muitas vezes benéficas
ao réu, tendo em vista que será apreciado o fato de forma completa, e não
apenas pautado em presunções de maior culpabilidade69.

Neste sentido, Ana Cláudia de Bastos e Marcus Alan de Melo Gomes70,


afirmam:

Deste modo – e somente deste modo – é possível considerar que a


situação de reincidência pode referir-se não só ao sujeito, mas aos
fatos e às circunstancias que o cercam, podendo avaliar
concretamente o grau de reprovabilidade derivado desta
reincidência, que não necessariamente pode conduzir a um aspecto
negativo.

67
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 287.
68
DOS SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal: a nova parte geral. p. 245.
69
BASTOS, Ana Cláudia de. GOMES, Marcus Alan de Melo. Ciências criminais. p. 223.
70
BASTOS, Ana Cláudia de. GOMES, Marcus Alan de Melo. Ciências criminais. p. 223.

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fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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Claus Roxin71, comentando a parte geral do Código Penal alemão, faz a


seguinte observação:

A agravação da pena pela reincidência do § 48 v. a., que passe


todos os esforços para dar-lhe uma fundamentação distinta
somente se podia explicar partindo da aceitação de uma
culpabilidade pela condição de vida e, portanto era inconciliável
com o principio da culpabilidade pelo fato; pois bem, tal preceito foi
derrogado sob a precisão da crítica contra o mesmo, pela 23ª
StrÄG de 13-4-1986.

Desta forma, a reincidência deve ser revista, ao menos sua forma de


aplicação, devendo o Brasil seguir o exemplo de alguns países que, se não a
derrogaram como no caso da Colômbia72, criaram mecanismos de reabilitação
sociais eficazes como na Holanda, por exemplo, onde são aplicados
programas de reinserção social ao invés de se punir mais gravosamente o
delinquente contumaz - os índices de reincidência diminuíram 40%73.

5 POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL

Os Tribunais têm posicionamento bastante pacifico quanto à


constitucionalidade da reincidência, afirmando que está encontra amparo na
maior periculosidade do réu, motivo este que por si só a legitima. Veja-se:

APELAÇÕES CRIMINAIS. RECURSOS DA ACUSAÇÃO E


DEFESAS. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. 1. RECURSO
DAS DEFESAS: (2) SEGUNDA FASE. AGRAVANTE
DA REINCIDÊNCIA DEVIDAMENTE RECONHECIDA.
CONSTITUCIONALIDADE DO INSTITUTO. CIRCUNSTÂNCIA
AGRAVANTE QUE OBJETIVA RECONHECER MAIOR
REPROVABILIDADE NA CONDUTA DAQUELE QUE É
CONTUMAZ VIOLADOR DA LEI PENAL. TJSC.
Processo: 2011.007019-7 (Acórdão) Relator: Hilton Cunha Júnior
Origem: Capital Orgão Julgador: Primeira Câmara Criminal
Data: 16/09/2011 Juiz Prolator: Alexandre Murilo Schramm
Classe: Apelação Criminal (Réu Preso).

Com fundamentação semelhante, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas


Gerais já havia julgado constitucional, no ano anterior, o incidente de

71
ROXIN, Claus. Direcho penal parte geral, fundamentos, la estructura de la teoria del delito. p. 177.
72
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral.
73
FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal, 3. ed., rev., ampl. e atual. p. 287.

1433
NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
Sociais e Jurídicas da UNIVALI. v. 3, n.4, p. 1416-1438, 4º Trimestre de 2012. Disponível em: www.univali.br/ricc
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arguição de inconstitucionalidade que contestava a constitucionalidade do


instituto da reincidência, sob o fundamento de ferir o princípio do non bis in
idem, este Tribunal entendeu que reincidência não representa dupla
condenação pelo crime anterior, mas sim a indicação da periculosidade do
agente, pois é considerada como reflexo da personalidade do autor e sua
menor liberdade para decidir-se pelo comportamento juridicamente adequado.
O Relator do acórdão afirmou que “ela apenas agrava a pena de quem ainda
não está recuperado para o convívio social”74.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul vem analisando a


questão da reincidência a partir de outro prisma. Para este Tribunal, a
reincidência, tal como hoje concebida (agravante da pena), deve ser afastada
diante de sua flagrante inconstitucionalidade. Anota-se, nesta seara, o
acórdão oriundo da Apelação Criminal nº. 70005125489, que atesta referido
posicionamento:

[...] Quanto à reincidência, acompanho a posição adotada por esta


Câmara, segundo a qual a reincidência como agravante se
configura inconstitucional por se tratar de um bis in idem, embora
possa ser considerada na dosimetria da pena-base. Nesse sentido,
já me manifestei na apelação criminal nº 70005015169, de relatoria
do eminente Des. Amilton Bueno de Carvalho: “Tanto esta Câmara,
por sua maioria, assim como o 3º Grupo Criminal, vêm decidindo no
sentido de afastar, por inconstitucional, o aumento determinado
pela agravante da reincidência, porquanto indisfarçável bis in idem.
Neste sentido, os Embargos Infringentes nº 70002012011,
70002199859 e 70002551315, bem como as apelações-crime nº
70004500302 e 70004873279, cujo Relator foi o eminente Des.
Luís Gonzaga da Silva Moura, que assim se manifestou:“...É que a
Câmara, por sua maioria - também o 3º Grupo Criminal vem
decidindo neste sentido: Embargos Infringentes n.ºs 70002012011,
Sapiranga; 70002199859, Porto Alegre; Esteio, entre outros;
julgados em 26.06.2001 - tem entendido de afastar, por
inconstitucional - faz presente o direito penal do autor e é
indisfarçável “bis in idem”. 75

O posicionamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul se pauta na


inconstitucionalidade da reincidência por entender que ela fera o principio ne

74
Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade nº 1.0223.05.177414-7/002, Rel. Des. Caetano Levi Lopes, julgado
em 22/09/2010.
75
Grifos acrescentados.

1434
NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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bis in idem e é pautada no direito penal do autor, ferindo, assim a


Constituição da República Federativa do Brasil 1989.

A aplicação da reincidência, como agravante da pena, é inconstitucional, pois


se constitui em uma herança lombrosiana76, aonde se presume a
periculosidade do agente por características extrínsecas deste, ferindo,
assim, o princípio da isonomia. A reincidência serve à análise da
personalidade do agente, fixando a pena ‘necessária para sua recuperação’,
com influência na Escola Positivista, não compatível com os princípios de um
direito penal de garantias77.

A reincidência é de difícil explicação em termos constitucionais; e, a


estigmatização que sofre a pessoa, acaba de certa forma prejudicando a sua
reincorporação social; os direitos humanos, a isonomia, a racionalidade das
penas e a presunção da inocência, entre outros, resultam afetados, sendo,
incompatível com o Estado Democrático de Direito a previsão legal que
possui fundamento na teoria do direito penal do autor - Escola Positivista -
aonde se pune o sujeito a partir de presunções que afloram de suas
características pessoais que revelam maior periculosidade, sem ao menos se
levar em conta os reais motivos da reincidência delitiva, ou seja, sem se
questionar qual o motivo que leva alguém que já conhece o sistema penal a
cometer um novo delito. Se a análise desta questão for feita de forma ampla,
como poderia ser feita nas circunstâncias judiciais, artigo 59 do Código Penal,
poderia se chegar, em certos casos, a conclusão que a reincidência não deve
agravar a pena, e sim atenuá-la78.

Embora a justificação oficial da reincidência tente encontrar amparo em


teorias constitucionais, a sua verdadeira justificativa se encontra na teoria
criminológica derivada do positivismo, tendo em vista a adoção do critério
periculosidade. A reincidência decorre do interesse do Estado em enumerar
as pessoas em obedientes e desobedientes, no entanto a função do direito

76
ROSA, Alexandre Morais da. Decisão penal: a bricolagem de significantes.
77
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro parte geral.
78
COPETTI, André. Direito Penal e Estado Democrático de Direito. Porto Alegre. Livraria do Advogado, 2000.
p. 194.

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NOLLI, Halison Tharlley; CHAVES JUNIOR, Airto. A (in)constitucionalidade material do instituto da reincidência
fundamentada no direito penal do autor. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências
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penal constitucional não é está, mas sim originar meios capazes de promover
a igualdade e a inclusão social de todos, erradicando a marginalização e
outras formas de discriminação - como é a reincidência79.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Da pesquisa cujos resultados se passam a expor, conclui-se que a previsão


da reincidência no ordenamento jurídico nacional afronta os princípios e
objetivos constitucionais por estar pautado no direito penal do autor. Por esta
razão, há muito tempo deixou de ser legítima, seja porque fere o princípio
supralegal ne bis in idem, seja porque contraria expressamente os objetivos e
princípios da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Constatou-se que a única explicação plausível para legitimar a reincidência


como causa agravante de pena e de privação de benefícios penais é a adoção
de requisitos ligados à personalidade do autor do crime. Assim, o delinquente
é punido, não pelo crime praticado, mas sim, por que ele é ou foi, partido da
premissa que a periculosidade do reincidente é presumida e deve, por isso,
ser mais gravemente punido (direito penal do autor).

No entanto, restou constatado que essa teoria não é capaz de fundamentar,


com amparo constitucional, uma reprimenda maior ao delinquente
reincidente, tendo em vista que sua análise é feita de forma objetiva, sem se
ater as circunstâncias fáticas que envolvem o crime. A partir dessa leitura,
não se leva em conta os princípios da individualização da pena e da
culpabilidade, e não se cumpre os objetivos constitucionais, pois acaba por
marginalizar, e colocar o reincidente em situação desigual frente aos demais
membros do corpo social que, igualmente, possa delinquir - critério de
descriminação balizado por aquilo que a pessoa representa, e não por aquilo
que ela fez.

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