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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Os articulados
1. Os articulados
1.1. Noção. Função
A fase dos articulados encontra-se regulada nos arts. 552º a 590º.

É nesta fase e através das respetivas peças, que as partes introduzem o pleito em juízo,
expondo as suas razões, argumentos ou motivos, enunciando os fundamentos de facto e de
direito que suportam as suas teses jurídico-substantivas e jurídico-processuais, concluindo pela
formulação das respetivas pretensões, assim moldando o objeto da ação.

Articulados – são as peças escritas em que as partes expõem o fundamento da ação e da


defesa e formulam os pedidos correspetivos (art. 147º, nº 1). O conteúdo desses atos devem
ser anunciados por artigos.

1.2. Nomenclatura. Classificação


Há que fazer uma classificação tripartida:

 Articulados normais ou necessários – petição e contestação;

 Articulado eventual – réplica, aqui o autor responde à matéria da reconvenção ou,


tratando-se de ações de simples apreciação negativa impugna os factos que o réu haja
alegado e alega os factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu na
contestação;

 Articulados extraordinários.

A petição inicial
2. Petição inicial
2.1. Definição. Objeto. Iniciativa
A petição inicial é o articulado a utilizar pelo autor para dedução em juízo de uma dada
pretensão de uma tutela jurisdicional, nele alegando os respetivos fundamentos de facto e de
direito. É a primeira peça processual, é um articulado pela forma como está estruturada sendo
estrutura por artigos.

Através da petição inicial concretiza-se a chamada disponibilidade do inicio do processo.


Nenhuma querela judicial se inicia sem o prévio impulso de uma das partes, dai que seja o
articulado-base, uma vez que sem a petição não chega a existir um processo.

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A apresentação (material) ou a entrada (virtual) da petição inicial em juízo marcam, pois, o


inicio do processo, ou seja, a constituição da instância ou relação jurídica processual entre o
autor e o tribunal, considerando-se a partir dies a quo, como pendente, isto é, proposta,
instaurada ou intentada a ação; isto sem prejuízo do disposto no art. 144º (art. 259º, nº 1).

Este momento constitui o facto gerador da instância, o que releva, desde logo,
para impedir o decurso do prazo de caducidade, bem como para a chamada
pendência da causa.

Em relação ao réu:

 Os efeitos decorrentes da pendência da causa só se produzem, em regra, após a sua


citação (art. 259º, nº 2).

Exceção a esta regra é a do art. 366º, nº 2 e


6.

É ao autor que cabe a iniciativa da solicitação da tutela jurisdicional em juízo (impulso


processual inicial), a qual não pode ser oficiosamente desencadeada (art. 3º, nº 1).

2.2. Apresentação a juízo. Requisitos. Taxa de justiça. Forma externa


2.2.1. Formas de apresentação a juízo. Suporte digital
Petição inicial: ato processual a ser praticado pelo autor sob forma escrita devendo ser
introduzida em juízo por transmissão eletrónica de dados.

Meio de carácter obrigatório se a causa importar a constituição de mandatário


e/ou a parte estiver patrocinada; em tal situação valerá como data da prática do
ato processual e da respetiva expedição (art. 144º, nº 1).

Não sendo obrigatória a constituição de mandatário nos termos do art. 40º e a parte não se
encontrar patrocinada, pode também ser apresentada por uma das formas do art. 144º, nº 7.

Formas estas também utilizáveis quando ocorra uma situação de justo


impedimento (art. 144º, nº 8)

Se for apresentada por transmissão eletrónica de dados, deve o autor apresentar, pela mesma
via, os documentos que devam acompanhar, ficando, contudo, o mesmo dispensado de
remeter os respetivos originais.

Esta forma de apresentação documental não terá lugar quando de formatos


superiores a A4 ou a dimensão dos ficheiros a enviar não permitir (nº 3 do art.
144º)

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2.2.2. Requisitos. Indicações obrigatórias


Art. 552º, nº 1.

Na parte final da petição, deve o autor apresentar o rol de testemunhas e requerer outros
meios de prova.

Requerimento probatório (inicial) esse que, se o réu houver contestado, pode o


autor vir a alterar, ou na réplica ou no prazo de 10 dias a contar da notificação da
contestação (art. 552º, nº 2).

O autor deve juntar à petição inicial e identificar especificamente os documentos destinados a


fazer a prova nela alegados (art. 423º, nº 1 CPC).

A omissão deste dever, pela apresentação posterior dos documentos, faz incorrer
o autor em multa nos termos do art. 423º, nº 2.

Não se torna necessário requerer-se nela a citação do réu.

É imperativo conter o requerimento para a citação antecipada do réu se


verificado o condicionalismo do nº 1 do art. 561º e também para a produção da
antecipada de prova (art. 419º) ou para o chamamento à intervenção principal de
um terceiro para ocupar, como seu associado, a posição de autor (arts. 261º, 262º
e 311º e ss).

À menção do domicilio profissional do mandatário judicial constituído deve seguir-se a


aposição da respetiva assinatura (art. 552º, nº 1, al. b)), com junção, desde logo, da
competente procuração forense e com indicação do domicilio por ele escolhido para receber a
notificações, as quais devem ser feitas por via eletrónica.

2.2.3. Taxa de justiça


A apresentação de uma petição inicial cuja prática a lei exige o pagamento de taxa de justiça,
pelo que deve o autor juntar, nesse momento, o documento comprovativo do seu prévio
pagamento ou da concessão do beneficio do apoio judiciário, na modalidade dispensa do
mesmo, salvo se, neste último caso, aquele documento já se encontrar junto aos autos; tudo
sob pena da sua recusa pela secretaria, nos termos da al. f) do art. 558º (arts. 145º e 552º, nº 3
e 4).

Se tiver sido requerida citação urgente nos termos do art. 561º, nº 1 “faltando, à data da
apresentação da petição em juízo menos de 5 dias para o termo do prazo de caducidade, deve
o autor juntar documento comprovativo do pedido de apoio judiciário requerido, mas ainda
não concedido” (art. 552º, nº 9).

Nesta situação, o pagamento da taxa de justiça deve ser realizado mediante o art.
552º, nº 10.

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Recai sobre as partes o ónus de auto liquidarem a taxa de justiça devida, de harmonia com o
disposto no RCP e as suas tabelas anexas e com as regras técnicas legalmente estabelecidas
(arts. 5º a 15º desse diploma).

2.2.4. Forma externa


Do nº 1 do art. 552º resulta a estruturação deste peça processual em quatro partes essenciais:

1. Endereço – deve constar a designação do tribunal e respetivo juízo onde a ação é


proposta (corresponde à 1ª parte da al. a)), a qual logicamente supõe a prévia
determinação do tribunal competente para conhecer do pleito.

2. Cabeçalho / intróito – o autor deve identificar as partes, com indicação dos seus
nomes domicílios ou sedes e, sempre que possível, indicar os números de identificação
civil e fiscal, profissões e locais de trabalho (corresponde à 2ª parte da al. a)). O autor
deve também mencionar a forma de processo aplicável (se a ação é especial ou
comum) – corresponde à al. c).

3. Narração – reporta-se à al. d), o autor através dela expõe os fundamentos da ação, da
mesma devendo constar, desde logo, a alegação do circunstancialismo fático que
integra ou substancia a causa de pedir – factos essenciais/principais – o ónus da
alegação, afirmação ou dedução fáctica cominado no nº 1 do art. 5º. E também a
alegação das razões de direito que servem de fundamento à ação e,
consequentemente, à fundamentação da futura sentença.

4. Conclusão - o autor ou o réu-reconvinte o pedido, o qual contém a solicitação da


tutela jurisdicional concretamente pretendida (al. e)). É através do pedido que se
definem e aferem os elementos ou limites da sentença em caso da procedência da
ação, para efeitos de caso julgado (arts. 580º, 581º e 619º a 621º), devendo o mesmo
constituir a resultante lógica das premissas fácticas deduzidas na narração. De resto, o
pedido deve ser expressa formulado na conclusão “não bastando que apareça
acidentalmente referido na narração da petição”.

2.3. A causa de pedir


2.3.1. Noção. Modalidades
Causa de pedir (causa petendi ou origo petitionis) – consiste no ato ou facto jurídico ou no
especifico vicio invalidante, que constituem a fonte de que dimana “o direito que o autor ou o
réu-reconvinte pretende fazer valer” em juízo.

A causa de pedir é o facto juridicamente relevante do qual dimana a pretensão (o pedido).

Pode a causa de pedir, para além da conduta ou omissão ilícitas e culposas subjacentes à
responsabilidade contratual e extracontratual, assumir uma qualquer das modalidades do art.
581º, nº 4:

 Nas ações reais o facto de que deriva o direito real;


 Nas ações constitutivas e na anulação, o concreto ou a nulidade especifica que se
invoca para obter o direito pretendido (art. 581º, nº 4).

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Intimamente ligado ao princípio do dispositivo a causa de pedir exerce uma função


individualizadora do pedido e de conformação do objeto do processo; ao apreciar o pedido, o
tribunal não pode basear a sua decisão de mérito em causa de pedir não invocada pelo autor
(arts. 608º e 609º), sob pena de nulidade da sentença por excesso de pronúncia (art. 615º, al.
d)).

Tudo sem prejuízo de poder invocar-se uma causa de pedir, a titulo subsidiário ou causa de
pedir subsidiária, a ser considerada apenas na hipótese de não ser acolhida a causa de pedir
deduzida a titulo principal.

Nesta circunstância, e à semelhança do que sucede com dedução dos pedidos


subsidiários (art. 554º), a procedência da causa de pedir deduzida a titulo principal
prejudica o conhecimento da causa de pedir deduzida a título meramente eventual
ou subsidiário; o eventual conhecimento desta, tendo procedido a principal, é por
isso, gerador do vicio de excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida
contemplados na al. d) do nº 1 do art. 615º, ex-vi do art. 608º, nº 2.

2.3.2. Ónus da alegação. Integração da causa de pedir


O autor tem o ónus de alegar, de forma substanciada, os factos que integram a causa de pedir.

Ónus de susbtanciação este que não se estende aos factos que o autor não tem o
dever de conhecer e que o réu não pode desconhecer. A falta de substanciação
destes últimos é suprida, quer pelo dever de esclarecimento que impede sobre o
réu ao abrigo do princípio da cooperação (art. 7º, nº 2), quer por um eventual
depoimento da parte (art. 454º, nº 1).

Doutrina atual: exigência legal de enunciação da causa de pedir se confinar apenas à


enunciação dos factos necessários (essenciais) à individualização do pedido em harmonia com
o ónus da alegação vertido no nº 1 do art. 5º, assim acolhendo uma conceção mitigada, que
poderá rotular-se de individualização aperfeiçoada.

Não há que confundir, nesta sede, factos necessários à determinação da causa de pedir, cuja
falta implica a rejeição da petição inicial por ineptidão (art. 186º , nº 2, al. a)) ou de absolvição
do réu da instância (arts. 577º , al. b) e 278º, nº 1, al. b)) e factos necessários para a
concludência da causa de pedir invocada, cuja falta será, a se, geradora da improcedência da
ação. No fundo, a clássica distinção entre pressupostos processuais e condições da ação, já que
a «causa de pedir pode não esgotar todos os factos indispensáveis à procedência da ação».

O ónus da alegação, afirmação ou dedução dos factos essenciais constitutivos da causa de


pedir (por banda do autor) e que integram a chamada narração da petição inicial, compreende
desde logo, os factos (a matéria de facto) relevantes (pertinentes) para o reconhecimento do
direito arrogado juízo - os chamados factos principais ou essenciais (art. 5º, nº 1). Dever este
intimamente ligado ao chamado princípio dispositivo, em cuja observância releva o encargo
(para as partes) de deduzirem ou afirmarem os factos (principais) constitutivos ou integradores
do direito ou da exceção concretamente invocados ou alegados (arts 3º, nº 1 e 5º, nº 1).

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Impende, pois, sobre as partes o ónus (também monopólio) da alegação, não só dos factos
principais da causa, isto é, dos que integram a causa de pedir como também aqueles em que
se baseiam as exceções (art. 5º, nº 1).

Alegação essa a ser feita nos articulados (art. 147º, nº 1); e que pode/deve também
estender-se aos factos complementares ou concretizadores e aos próprios factos
instrumentais, em ordem a facilitar uma profícua atividade
indagatória/instrutória/cognitiva por banda do juiz do processo na devida
oportunidade, mas sempre em observância do princípio da autocontenção quanto
às respetivas clareza, simplicidade e estrita pertinência funcional para uma boa e
justa decisão da causa.

A responsabilidade imposta por lei às partes da alegação dos factos essenciais – ónus da
alegação dos factos cujo efeito lhes é favorável – é produtor de efeitos cominatórios:

 Absolvição do réu ou do autor-reconvindo do pedido na ausência ou deficiência da


alegação dos factos constitutivos do direito arrogado em juízo;

 Condenação do réu ou do autor-reconvindo no pedido por omissão de alegação dos


factos impeditivos, modificativos ou extintivos em que se funda a exceção ou contra
exceção deduzidas, gerando a improcedência destas.

A alegação deve abranger, não só factos reais consubstanciadores de uma ação ou omissão
ilícitas ou de um qualquer evento danoso, como também os factos conjeturais ou hipotéticos.

Os mandatários das partes não podem olvidar que a articulação dos factos desempenha um
papel fundamental na habilitação do juiz (na fase da gestão inicial do processo e da audiência
prévia) bem identificar o objeto do processo e enunciar os temas da prova (art. 596º) e a bem
delimitar e identificar as questões a resolver e a destrinçar quais de entre os factos principais
alegados julga (total ou parcialmente) provados e não provados (arts. 607º e 608º).

Assim, na narração deve fazer-se uma descrição segundo uma ordem sequencial cronológica.

Para efeitos de condenação no pagamento de taxa de justiça, consideram-se de especial


complexidade as ações e procedimentos cautelares que contenham articulados ou alegações
prolixas (art. 530º, nº 7).

Sobre o autor recai o dever de enunciar e substanciar devidamente a causa de pedir e o pedido
(art. 552º, nº 1, al. d) e e)).

Isto é, o ónus de observar o princípio da susbtanciação (fáctica), traduzido na


exposição precisa, discriminada e suficientemente inteligível dos factos essenciais
tendentes à demonstração do ato (ou facto) concreto juridicamente relevante, de
que dimana o pedido.

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2.4. O pedido
2.4.1. Noção
O autor formula ou deduz na petição inicial, um pedido de tutela jurisdicional, solicitando ao
tribunal a emissão do dictat autoritário adequado à tutela do seu interesse (art. 552º, nº 1, al.
e)).

O pedido traduz-se, assim, na pretensão do autor, para a qual, sob invocação de


um direito ou situação jurídica carecidos de acolhimento e proteção a concessão
de uma concreta providência judiciária.

A dedução/formulação do pedido é essencial para que o tribunal possa resolver o conflito de


interesses que a ação pressupõe (art. 3º, nº 1).

O pedido deduzido pelo autor ou pelo réu-reconvinte pode traduzir-se ou na


afirmação ou negação de uma situação jurídica subjetiva de direito material ou
numa manifestação da vontade de constituir uma situação jurídica nova com
base num direito potestativo.

O pedido, não só conforma ou molda o objeto do processo, como condiciona o conteúdo da


decisão de mérito a emitir pelo tribunal competente, isto porque o juiz na sentença, deve
resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, não podendo
ocupar-se de outras» (art. 608º, nº 2) e «não pode condenar em quantidade superior ou em
objeto diverso do que se pedir» (art. 609º, nº 1), sob pena de nulidade da decisão por omissão
de pronúncia, excesso de pronúncia ou condenação ultra-petitum, respetivamente (art. 615º,
nº 1, alíneas d) e e)).

2.4.2. Modalidades
2.4.2.1. Pedidos alternativos
O pedido alternativo baseia-se numa obrigação alternativa, ficando o direito arrogado pelo
autor satisfeito se efetuada pelo réu uma só de duas ou mais das prestações em equação.

Na obrigação alternativa ou disjuntiva, o vinculo desdobra-se em duas ou mais


prestações, mas o devedor fica liberado desde que satisfaça apenas uma delas,
isto é, da que vier a ser determinada por escolha.

Reporta-se o nº 1 do art. 553º a duas espécies de direitos alternativos:

a) Os originariamente ou por natureza alternativos – nascem ou constituem-se de modo


alternativo.

 É o caso das obrigações alternativas a que se reportam os arts. 543º e ss do


CC, as quais compreendem duas ou mais prestações, ficando o devedor
exonerado se efetuar aquela que, por escolha, vier a ser designada. Ao titular
do direito de escolha assiste a faculdade de optar pela prestação mais

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adequada a um seu interesse futuro ou a um seu interesse presente ainda


para si nebuloso e indefinível.

b) Os que, embora não sendo inicialmente alternativos, se podem resolver em alternativa


– são aqueles em que o titular/ credor pode decidir-se por uma de entre as várias
soluções que a lei lhe apresenta em alternativa. Nessa eventualidade, pode o credor
optar entre insistir pelo cumprimento ou pela resolução do contrato.

2.4.2.2. Pedidos subsidiários


Pode o autor deduzir mais de um pedido contra o mesmo réu em relação de subsidiariedade
(art. 554º, nº 1).

Pedido subsidiário é aquele que se apresenta ao tribunal para ser tomado em consideração
apenas no caso de não proceder um pedido anterior.

Tal formulação, in eventu, ocorre nas situações em que, aquando da propositura da ação, o
autor tenha dúvidas acerca da admissibilidade ou do êxito do pedido principal.

Nesse caso, e prevenindo o risco da improcedência da pretensão principal, com a


correlativa necessidade de ter de instaurar uma nova ação em que deduza outra
pretensão secundária, o autor pode deduzir logo na mesma petição inicial ambos os
pedidos:

 A titulo principal, o pedido preferencial, em ordem a que o tribunal o


analise e decida com carácter prioritário;

 A título secundário, o pedido eventual ou subsidiário, em ordem a que o


tribunal só tenha que decidir do mérito do segundo se concluir uma
improcedência do primeiro.

Quer os pedidos subsidiários, quer os alternativos, subjaz uma pluralidade de pretensões, com
vista a ser atendida apenas uma delas.

Enquanto que, no caso da alternatividade, as pretensões se perfilam como


juridicamente equivalentes, na hipótese da subsidiariedade há como que uma
graduação ou hierarquização entre os diversos pedidos.

Na subsidiariedade, a pretensão realmente querida pelo autor é a por ele


formulada em primeiro em primeiro lugar (pedido primário). Para a
hipótese de esse pedido não vir a proceder, deduz então um outro
pedido a titulo secundário para que, ao menos este, possa vir a ser
julgado procedente.

Quanto aos requisitos para a formulação de pedidos subsidiários, o nº 2 do art. 554º remete
para os arts. 36º a 39º.

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2.4.2.3. Pedidos cumulativos


O pedido pode ser único ou múltiplo.

Pode o autor deduzir mais de um pedido contra o mesmo réu em cumulação (art. 555º, nº 1),
ou, em certas condições, discriminadamente contra diversos réus, também em cumulação (art.
36º) ou em relação de subsidiariedade (art. 39º).

A cumulação de pedidos pode ser:

 Simples (art. 555º) – um autor deduz contra o mesmo réu vários pedidos. Através da
cumulação simples o autor almeja obter simultaneamente vários efeitos jurídicos
através da procedência de todos eles. O que distingue a cumulação da alternatividade
e da subsidiariedade, na medida em que, nestas duas últimas situações, o autor visa
apenas a procedência de apenas um dos diversos pedidos apresentados. Se a
cumulação respeitar a relações jurídicas díspares, os pedidos cumulados assumem,
entre si, inteira autonomia; se respeitar a uma mesma relação jurídica, os pedidos
(cumulados) são principais e acessórios 

 Plural (art. 36º) – vários autores, entre si coligados, deduzem contra um ou vários réus
diversos pedidos.

Para que a cumulação seja admissível, exige a lei compatibilidade entre os pedidos, identidade
de forma do processo correspondente a todos eles e identidade do juízo absolutamente
(conjugação dos arts. 36º, 37º e 555º).

Requisitos:

 O primeiro é de natureza substancial (compatibilidade substancial entre pedidos) e


justifica-se porque seria algo ilógico e incongruente que o autor pudesse, no mesmo
processo, formular pedidos cujos efeitos jurídicos se neutralizem reciprocamente.

 Os dois outros requisitos são de natureza processual. Por um lado, exige-se que a
todos os pedidos corresponda uma forma de processo de idêntico grau de
especialidade e solenidade (exceto se, dentro do processo comum, a diferença provier
unicamente do valor), assim se evitando que a um dos pedidos corresponda processo
comum e a outro processo especial ou, a um deles, determinado processo especial e,
ao outro, processo especial diferente; já se a todos os pedidos corresponder processo
comum, nenhum óbice existe à cumulação. Por outro, exige-se que o tribunal da
propositura da ação (o tribunal da causa) tenha competência absoluta para conhecer
de todos os pedidos (internacional, material e hierárquica), ainda que a não possua em
razão do valor ou do território.

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2.4.2.4. Pedidos genéricos ou ilíquidos


Em regra, o pedido deve ser enunciado sob a forma especifica, isto é, com determinação dos
seus conteúdos e quantitativos.

Contudo, pode suceder que, no momento da propositura da ação, não se torne


possível ao autor determinar, desde logo, o quid e o quantum da respetiva
pretensão. Em tal eventualidade, poderá deduzir um pedido genérico, ou seja,
formular um pedido do objeto global sem ter que discriminar cada um dos
elementos em que o mesmo se possa decompor.

A formulação de pedidos genéricos só é admitida nas três hipóteses excecionais contempladas


no art. 556º, todas respeitantes a bens jurídicos ainda não devidamente determinados ou
individualizados:

 Universalidade (art. 556º, nº 1, al. a) CPC – o autor não tem de individualizar os


elementos que integram a universalidade. O autor limita-se a indicar a própria
universalidade a que os mesmos pertencem. A determinação do objeto a que o pedido
respeita faz-se mediante o incidente de liquidação a deduzir na ação declarativa ate ao
momento do início da audiência final;

 Indemnização decorrente de facto ilícito (art. 556º, nº 1, al. b) - A determinação do


objeto a que o pedido respeita faz-se mediante o incidente de liquidação a deduzir na
ação declarativa ate ao momento do início da audiência final;

 Quantitativo dependente de prestação de contas ou de outro ato a praticar pelo réu


(art. 556º, nº 1, al. c). A determinação do objeto a que o pedido respeita faz-se pela
prática deste ato ou de outro que o supra com subsequente pronúncia do tribunal (art.
941º e ss).

Quanto à oportunidade própria ou efetivação da liquidação, rege o nº 1 do art. 358º: deve o


autor, antes de se iniciar a audiência final, deduzir o incidente de liquidação para tornar liquido
o pedido genérico, quando se refira a uma universalidade ou às consequências de um facto
ilícito.

Esse incidente pode também ser deduzido depois de proferida a sentença de


condenação genérica, nos termos do nº 2 do art. 609º, e caso seja admitido, a
instância declarativa já extinta, considera-se renovada.

No requerimento respetivo, o autor relaciona os objetos compreendidos na universalidade


(identificando-os devidamente) ou especifica os danos derivados do facto ilícito concluindo por
um pedido de quantia certa.

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Se o incidente for deduzido antes do inicio da audiência final, a matéria da liquidação é


considerada nos temas da prova enunciados ou a enunciar nos termos do art. 596º, nº 1 (art.
360º, nº 2). Já a liquidação a que se reporta o nº 2 do art. 358º - deduzido depois de proferida
a sentença genérica – pode ser operada por árbitros nos casos determinados por lei ou por
convenção das partes.

A sentença pode ser proferida em termos genéricos se não houver elementos para
fixar o objeto ou quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem
prejuízo de condenação imediata na parte que seja liquida (art. 609º, nº 2).

Em sede executiva, sempre que for ilíquida a quantia em divida, o exequente deve especificar
os valores que considera compreendidos na prestação devida e concluir o requerimento
executivo com um pedido liquido (art. 716º, nº 1).

2.4.2.5. Pedidos de prestações vincendas


Art. 557º, nº 1 e 2.

De excluir da previsão do art. 557º, face ao seu caracter excecional, quaisquer outras situações
congéneres ou similares (art. 11º do CC). Já a previsão do art. 610º parece permitir, de modo
irrestrito, o pedido do cumprimento de obrigações inexigíveis à data da propositura da
respetiva ação.

2.5. Vícios da petição inicial


2.5.1. Vícios formais. Controlo externo
Cumpre à secretaria geral o controlo formal externo da petição inicial, isto é, a apreciação
preliminar dos vícios resultantes da falta de observância de determinados requisitos (vícios
meramente formais) – art. 558º.

Tal controlo é aferido aquando da distribuição eletrónica diária dos processos e


demais requerimentos entrados em juízo (arts. 204º e 207º).

Art. 590º, nº 2, al. a) e nº 3.

2.5.2. Modalidades
2.5.2.1. Pedidos alternativos
Art. 558º, nº 1, als. a) a I).

O ato de recusa pela secretaria encontra-se, de harmonia com a regra geral do art. 157º, nº 5,
sujeito a reclamação hierárquica para o juiz da causa com fundamento em injustificação da
recusa (art. 559º, nº 1).

Art. 559º, nº 2.

Art. 560º.

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2.5.2.2. Recusa informática


O controlo formal externo da petição inicial é eletronicamente aferido para efeito de
distribuição (art. 207º, nº 2).

Esta modalidade de recusa informática da distribuição é de equiparar à recusa do recebimento


pela secretaria e suscetível de reclamação hierárquica para o juiz, o qual, em última análise,
decidirá.

Isto se a petição não houver já sido (ex-ante) recusada e só seguidamente


recebida por decisão judicial proferida em resultado de reclamação ou recurso,
coberta a mesma pela força de caso julgado formal (art. 620º).

O despacho pelo qual o juiz recusa a distribuição eletrónica é, em termos em tudo idênticos
aos do proferido em sede de reclamação do ato de recusa do recebimento pela secretaria,
suscetível de recurso e em grau (até à Relação) por aplicação analógica do nº 2 do art. 559º.

Também nesta situação goza o autor do beneficio da apresentação de nova petição, com
subsistência dos efeitos da apresentação da primitiva, ex-vi do disposto do art. 560º.

2.5.3. Ineptidão
Pode a petição inicial encontrar-se ferida de vícios de natureza substantiva, que prendem com
a aptidão desse articulado para uma correta configuração das pretensões deduzidas em juízo
face ao direito material abstratamente aplicável.

O art. 186º, nº 1 fornece-nos o conceito de ineptidão da petição inicial, indicando as situações


típicas em que ocorre tal vicio, definindo simultaneamente o respetivo efeito. Trata-se de uma
de uma nulidade principal do conhecimento oficioso, podendo porém ser objeto de
arguição/reclamação dos interessados (art. 198º, nº 1) e que, se detetada, integra exceção
dilatória como tal de anulação de todo o processo e, por isso, geradora absolvição do réu da
instância (arts. 278º, nº 1, al. b) e 557º, al. b)).

2.5.3.1. Causas
São quatro as causas que geram a ineptidão da petição inicial, ou seja, da sua falta de aptidão
para o eventual acolhimento ou reconhecimento do direito nela arrogado (art. 186º, nº 1 e 2,
al. a), b) e c)):

1. Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido:


ocorre este vício quando nenhum pedido chegou a ser deduzido ou o pedido
(apresentado) se acha formulado de forma obscura ou equívoca que o torna de todo
incompreensível;

2. Quando falte ou seja ininteligível a indicação da causa de pedir:


verifica-se esta causa de nulidade quando, por falta, omissão, ambiguidade ou
obscuridade (ininteligibilidade) na indicação da causa de pedir, não possa saber-se
qual o ato ou facto jurídico (negócio jurídico, conduta ilícita, vício invalidante, direito
sobre uma coisa, etc.) em que o autor se baseia para enunciar o seu pedido;

12
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Exemplo: numa ação de revindicação de um prédio (art° 1311º do CC), o autor


alega a sua propriedade sobre o prédio, mas não indica qual a forma originária ou
derivada da alegada aquisição; ou alega a aquisição por usucapião sem integrar o
conceito com os respetivos requisitos factuais.

3. Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir:


padece a petição deste vício quando, tendo o pedido e a causa de pedir sido
claramente enunciados, ocorra «contradição intrínseca ou substancial e insanável»
entre um e outra»

Exemplos ilustrativos: - o autor afirma encontrar-se na plena posse dum prédio,


mas vem pedir a sua restituição; - o autor argui a nulidade do contrato
alegadamente inquinado por vício da vontade, mas solicita a condenação do réu
numa das prestações emergentes do negócio anulando como se o
mesmo fosse válido;

4. quando se cumulem causas de pedir ou pedidos entre si substancialmente


incompatíveis:
a ineptidão resulta, nessa hipótese, não da contradição (lógica) entre o pedido e a
causa de pedir, mas da oposição entre as causas de pedir invocadas ou entre os
próprios pedidos concretamente deduzidos (o que não contende com a possibilidade
de dedução de pedidos genéricos, alternativos ou subsidiários).

Exemplos:

- de ineptidão por incompatibilidade de pedidos: - o autor pede, ao mesmo tempo,


a condenação do réu na realização da prestação e na omissão de a realizar; - o
credor pede, simultaneamente, a confirmação da resolução de um contrato e a
condenação do réu devedor no seu integral cumprimento%6,

- de ineptidão por incompatibilidade de causas de pedir: - o autor pede ao tribunal


o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre a coisa reivindicada, que
alega (cumulativamente) ter adquirido por compra e venda, por transmissão
sucessória e por usucapião67;

- de ineptidão por cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis: o autor


instaura ação em que pede a condenação do réu a reconhecer o seu direito de
propriedade sobre determinado prédio e que dele faz parte integrante uma
determinada parcela de terreno que alega estar a ser possuída pelo réu e pede a
condenação do último a reconhecer esse seu direito de propriedade sobre todo
esse seu prédio, nele se incluindo aquela parcela de terreno e, bem assim a
restituir-lhe essa parcela (pedidos típicos da reivindicação) e em cumulação real,
pede que se ordene a demarcação entre esse seu prédio e o prédio do Réu,
contíguo ao primeiro (pedido típico de demarcação)

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

2.5.3.2. Controlo. Oportunidade. Indeferimento liminar


O vicio de ineptidão é próprio e especifico da petição inicial, não podendo, pois, dele enfermar
qualquer outro articulado.

Art. 198º, nº 1 CPC.

O controlo da ineptidão, como vicio de substância ou de conteúdo que é, cabe


sempre e, de modo exclusivo, ao juiz da causa.

Nulidade, contudo, sanável se verifica a hipótese prevista no nº 3 do art.


186º, ou seja, se o réu contestar a ação e se se verificar, após a audição do
autor, que ele (réu) interpretou convenientemente a petição inicial. Assim,
o reclamam os princípios da cooperação, da boa-fé e da economia
Nas hipóteses processual, tendo sempre presente a necessidade de assegurar a
em que a exercitação eficaz do princípio do contraditório.
citação
depende do despacho inicial (art. 226º, nº 4, als. A) a F)), o juiz, em vez de ordenar a citação,
pode nele indeferir liminarmente a petição com esse fundamento (art. 590º, nº 1); se vier a
conhecer do vicio em fase posterior, declarará nulo todo o processo.

Fora destes casos a ineptidão da petição inicial constitui nulidade insanável, cuja ocorrência
cabe ao juiz verificar oficiosamente até ao despacho saneador (art. 200º, º 2), absolvendo o
réu da instância (arts. 186º, 196º, 278º, nº 1, al. b) e 595º, nº 1, al. a)).

Isto porque qualquer dos defeitos essenciais enunciados nas als. A), b) e c) do nº
2 do art. 186º acarreta a falta de aptidão com a consequente inutilização dessa
peça básica da aça, provocando, naturalmente, a invalidação de todo o processo
(art. 186º, nº 1), sendo por isso, considerada como uma exceção dilatória
nominada (arts. 278º, nº 1, al. b), 576º, nº 2 e 577º, nº 1, al. b)).

Algo idêntico é o efeito da não adesão do autor ao convite ao completamento ou correção da


petição carecida dos requisitos legais ou desacompanhada dos documentos necessários até ao
termo do prazo estabelecido (nulidade total ou parcial do articulado irregular a decretar no
despacho saneador).

Nestes casos excecionais das alíneas a) a e) do citado nº 4 do art. 226º (salvo, pois, no relativo
à citação urgente) - havendo necessidade de despacho liminar prévio -, em vez de ordenar a
citação do réu, pode o juiz indeferir liminarmente a petição inicial, ou o requerimento inicial. O
que poderá suceder quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de
forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente
(cfr., genericamente, o disposto no nº 1 do art. 590º - despacho de gestão inicial do processo).

Havendo lugar a despacho liminar prévio, para além da alternativa de deferir ou de indeferir,
deve o juiz convidar o autor ao aperfeiçoamento da petição, na mesma medida em que deverá
«oficiosamente providenciar pelo suprimento da falta de pressupostos processuais suscetíveis
de sanação, bem como pela realização dos atos necessários à regularização da instância ou

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a
praticá-lo» - dever de gestão processual (art. 6º, n. 2).

Do despacho que haja indeferido liminarmente a petição de ação ou o requerimento de


procedimento cautelar - despacho liminar negativo - cabe recurso em um grau (para a Relação)
independentemente do valor da causa – art. 629º, nº 3, al. c).

Mas não cabe recurso do despacho que mande citar os réus ou requeridos - despacho liminar
positivo -, já que «não serão consideradas precludidos as questões que Podiam ter sido motivo
de indeferimento liminar» (art. 226º, nº 5). Não olvidar, com efeito, que - independentemente
do valor da causa ou da sucumbência - há sempre recurso de apelação (em um grau) para a
Relação - das decisões de indeferimento liminar da petição da petição de ação ou do
requerimento inicial de procedimento cautelar (cfr. a citada al. c)). De resto, «no despacho em
que o juiz de 1ª instância admita o recurso com tal fundamento, deve o mesmo ordenar a
citação do réu ou do requerido, tanto para os termos da recurso como para os da causa, salvo
nos casos em que o requerido não deva ou não possa ser previamente ouvido antes do
decretamento da providência cautelar que no caso couber (cfr. o nº 7 do artº 641º).

O que o autor não pode é, previamente à apresentação do recurso, seguir a via da "reclamação"
(a que se reporta o nº 1 do art. 559º para o caso de recusa pela secretaria), já que, no caso de
ineptidão, o despacho proferido em 1º grau possui, ele próprio, natureza jurisdicional.

2.5.3.3. Beneficio concedido ao autor. Apresentação de nova petição


Reconhecido judicialmente o vicio da ineptidão, com o consequente indeferimento liminar da
petição inicial, assiste ao autor (art. 590º, nº 1), idêntico beneficio ao que lhe é facultado pelo
art. 560º para o caso de recusa de recebimento ou de distribuição.

Isto é: o autor pode apresentar outra petição nos 10 dias subsequentes a qualquer
das duas supra-citadas recusas ou à notificação do despacho judicial que haja
confirmado a decisão de ineptidão; nesta última situação, pois, se o autor tiver
optado pelo recurso de apelação previsto na al. c) do nº 3 do art. 629º,
considerando-se a ação proposta na data em que a primeira petição foi
apresentada em juízo, subsistindo, assim, todos os efeitos civis inerentes à
propositura dos concretos ação ou procedimento – art. 560º.

A citação
3. A citação
3.1. Noção. Função
Citação – ato ou peça processual através do qual se convoca o réu a exercitar o seu direito ao
contraditório e, eventualmente, deduzir pedidos contra o autor, sendo, pois, o ato pelo qual se
dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada ação e se chama ao
processo para se defender. Utiliza-se, ainda, para chamar, pela primeira vez, ao processo
alguma pessoa interessada na causa. A notificação emprega-se em quaisquer outros casos,
chamar alguém a juízo ou dar conhecimento de um facto (art. 219º, nº 2).

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

A citação trata-se de um ato essencial de comunicação entre o tribunal e o réu com tripla
função:

1. Transmissão do conhecimento da instauração da ação;


2. Convite para apresentar a sua defesa;
3. Constituição como parte.

Através da citação constitui-se, concretiza-se e desencadeia-se uma relação jurídica processual


de carácter triangular:

Juiz
Com esta relação triangular dá-se o cumprimento ao
princípio do contraditório, permitindo-se à pessoa
contra quem foi proposta à ação vir a juízo pronunciar-
se sobre a pretensão, apresentando, para o efeito, a sua
defesa (art. 563º).
Autor Réu

Só a partir do momento da citação o ato de proposição da ação produz efeitos em relação ao


réu (art. 259º, nº 2).

Para tal, no ato da citação, devem ser obrigatoriamente disponibilizados ao réu o duplicado da
petição inicial e as cópias dos documentos que a hajam acompanhado.

Além disso, deve o demandado ser informado dos elementos identificativos da ação para a
qual é citado, do prazo de que dispõe para apresentar a sua defesa e da necessidade de
constituir advogado.

Finalmente, deve ser advertido das cominações em que incorre se não contestar,
designadamente no caso de revelia (art. 227º, nº 1 e 2).

 Às citações reportam-se os artigos: 219º a 224º; 225º a 246º;

 Às notificações reportam-se os artigos: 219º, nº 2; 220º a 224º; 247º a 258º.

3.2. Oportunidade e lugar


A citação pode ser realizada mesmo que os tribunais estejam fechados ou no decurso das
férias judiciais, quer através de transmissão eletrónica de dados, quer por qualquer das
modalidades previstas no art. 225º.

Art. 224º, nº 1 e 2

Art. 219º, nº 3.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

3.3. Regra da oficiosidade. Exceções. Despacho liminar prévio


O primeiro despacho judicial tem o seu momento normal no fim dos articulados – o chamado
despacho de gestão inicial do processo, vulgo despacho pré-saneador (art. 590º, nº 1).

Isto sem embargo dos poderes dos poderes de gestão processual e de gestão inicial
do processo expressamente consagrados nos arts. 6º e 590º, nº 1 respetivamente,
cuja exercitação pode mesmo ter lugar no próprio despacho inicial.

Art. 226º, nº 1 a 3 com remissão para o art. 562º.

Art. 226º, nº 1 – regra da oficiosidade das diligencias destinadas à citação.

Exceções à regra da oficiosidade:

 Art. 226º, nº 4;
 Art. 931º, nº 1;
 Art. 239º, nº 3
 Art. 240º a 245º
 Art. 366º

3.4. Modalidades de citação


3.4.1. Citação de pessoas singulares
Art. 225º, nº 1 – citação edital ou pessoal

a) Citação pessoal
Pode ser efetuada por três vias distintas (art. 225º, nº 2):

I. Transmissão eletrónica de dados:

 Em certos casos, a lei equipara a citação pessoal a efetuada em pessoa diversa


do citando, se essa pessoa houver sido encarregada de lhe transmitir o
conteúdo do ato, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citado dela
teve oportuno conhecimento (art. 225º, nº 4).

 Art. 225º, nº 3 e 5.

II. Entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, seu depósito nos termos
do art. 229º, nº 5 ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do nº 3 do
mesmo preceito legal:

 Art. 227º nº 1 e art. 228º, nº 1

 Art. 230º, nº 1

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

III. Contacto pessoal do agente de execução ou do funcionário judicial com o citando:

 Tem caracter residual, uma vez que, art. 231º, nº 1.


 Art. 232º, nº 6

Art. 234º nº 1 a 4.

À ausência do citando em parte certa, em parte incerta, ou estrangeiro é aplicável,


respetivamente, o regime do art. 235º, 236º e 239º.

b) Citação edital
Art. 225º, nº 6

Art. 240º, nº 1 e 2

Art. 243º

Art. 244º

3.4.2. Citação de pessoas coletivas


Art. 246º, nº 1, 2, 3, 4 e 5.

3.5. Efeitos
Art. 259º, nº 2

Excecionalmente, pode a instância iniciar-se em relação ao réu mesmo antes da citação.

Os efeitos a que alude o art. 259º, nº 2 são aqueles a que se reporta o art. 564º CPC e ainda os
previstos nos arts. 323º, nº 1 e 805º do CC.

Não pode, assim, o réu, sob o argumento de que a propositura da ação só produz efeitos
contra si depois da citação, invocar a seu favor uma pretensa caducidade do direito de ação se
a petição houver sido recebido a tempo.

A citação produz efeitos processuais ou adjetivos e efeitos materiais ou substantivos

a) Efeitos processuais ou adjetivos


1. Torna estáveis os elementos essenciais da causa – art. 564º, al. b):

 Assim, art. 260º

 Ainda que a citação venha a ser anulada (art. 198º), os efeitos produzidos pela
citação mantêm-se desde que o réu venha ser nova e regularmente citado nos
30 dias subsequentes ao trânsito em julgado do despacho anulatório (art.
565º), sem prejuízo do regime próprio de interrupção da prescrição (art. 323º,
nº 2 do CC).

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

2. Inibe o réu de propor contra o autor ação destinada a apreciar a mesma questão
jurídica:

 A inibição cominada pela c) do art. 564º destina-se a evitar a repetição da


causa, ocorrendo, nessa eventualidade – se verificada a chamada tripla
identidadef - a exceção dilatória de litispendência (arts. 577º, al. i) e 580º).

 Tripla identidade essa que se encontra na base (servindo igualmente) para


aferir da exceção de caso julgado (cfr. a citada al. i) do art. 577º).

 A exceção de litispendência deve ser deduzida na ação proposta em 2º lugar,


sendo como tal considerada a ação para a qual o réu foi citado
posteriormente; se, porem, em ambas as ações, a citação houver sido
efetuada na mesma data, «a ordem das ações e determinada pela ordem de
entrada das respetivas petições iniciais em juízo» (art. 582º, nº 1, 2 e 3).

b) Efeitos materiais ou substantivos


A citação produz os seguintes efeitos:

1. Faz cessar a boa-fé do possuidor:

 Faz cessar a boa-fé daquele contra quem tenha sido proposta a ação de
reivindicação da coisa possuída (art. 564º, al. a) do CPC e 1260º, nº 1, do CC);
se contudo, o possuidor estiver de boa fé, isto é, ignorar que, ao adquirir a
posse, lesava o direito de outrem (art. 1260º, nº 1, do CC) - o que, havendo
justo título, se presume (art° 1260º, nº 2, do CC) -, a sua citação para a ação de
reivindicação (art. 1311º do CC) ou de simples apreciação da existência do
direito de propriedade, converte-o em possuidor de má fé, o que tem
consequências quanto a benfeitorias, frutos e responsabilidade pela perda ou
deterioração da coisa.

2. Interrompe a prescrição:

 Opera, nos termos do nº 1 do art. 323º do CC, a interrupção da prescrição ou


da usucapião (art. 1292º, nº 1 do CC).

 A prescrição tem-se por interrompida pela «citação ou notificação judicial de


qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o
direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal
seja incompetente» (art. 1292º do CC).

3. Nas obrigações puras, a citação vale como interpelação:

 Obrigações com prazo certo – prazo de cumprimento contratualmente pré-


fixado.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

 Obrigações sem prazo certo / obrigações puras – torna-se necessária uma


interpelação admonitória endereçada pelo credor ao devedor com a
cominação de um prazo a partir do qual o devedor passa a encontrar-se
incurso em mora.

 A citação do devedor operada em processo judicial, tornando a obrigação


vencida, vale como interpelação extrajudicial, constituindo o devedor em
mora a partir desse momento (com a consequente obrigação de pagamento
de juros moratórios a contar desse dies a quo), ainda que o credor devesse
pedir o pagamento no domicílio do devedor (arts. 805º, nº 1, do CC e 610º, nº
2, al. b), do CPC) - cfr. o art. 813º do CC.

c) Situações especiais de efeitos não decorrentes da citação


Em contados casos, admite a lei a resolução ou a denúncia extrajudicial do contrato
(caducidade e oposição à renovação) como, por exemplo, no de arrendamento rural (art. 189º,
nº 1, al. a) e 19º da LAR).

Contestação
4. Contestação
4.1. Noção. Modalidades.
Contestação – peça processual em que, por via de regra, é feita a defesa do réu relativamente
ao pedido do autor, assim exercitando o seu direito ao contraditório (art. 3º, nº 1 e 2).

Em certas circunstâncias, poderá ainda ser aproveitada pelo réu para deduzir
pedidos contra o autor (art. 266º).

Por isto, costuma distinguir-se na contestação, entre defesa propriamente


dita (contestação defesa) – e reconvenção (contestação-reconvenção).

 Contestação defesa – o réu toma posição perante a pretensão


contra si formulada, confinando-se a "contraria direta ou
indiretamente a pretensão do autor" (art. 571º), em exercitação,
pois quer do ónus da contestação propriamente dita (art. 567º, nº
1), quer do ónus da impugnação (art. 574º, nº 2).

 Reconvenção – o demandado passa ao contra-ataque,


formulando pedidos contra o autor.

Contestação em sentido material – peça escrita através da qual o réu responde à petição
inicial, deduzindo os meios de defesa que tenha contra a pretensão do autor.

Contestação em sentido formal – é um articulado de estrutura similar à da petição inicial,


incluindo o endereço, o cabeçalho, a narração e a conclusão (art. 572º).

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

4.2. Prazo. Apresentação a juízo


Art. 569º, nº 1, 2 e 3

Art. 569º, nº 3 – solução que se justifica já que, para além de não prejudicar o autor (dado o
art. 575º, nº 2), concede a vários réus a possibilidade de uma defesa conjunta ou comum,
beneficio que subsiste mesmo no caso de contestação separada dos diversos réus.

Face ao seu carácter perentório, o decurso do prazo da contestação faz precludir o direito a
contestar (art. 139º, nº 3), salvo o caso de justo impedimento (art. 140º) e ressalva também a
possibilidade da prática do ato nos 3 dias úteis imediatos ao termo do prazo, mediante o
pagamento de multa (art. 139º, nº 5, 6, 7 e 8).

A esses prazos haverá ainda que acrescentar o prazo dilatório previsto no art. 245º,
face à regra da continuidade dos prazos contemplada no art. 138º.
Pode, no entanto, o juiz, a titulo excecional (e sem audição do autor), prorrogar o prazo da
contestação por período não superior a 30 dias, quando motivo poderoso impeça ou dificulte
anormalmente a organização da defesa (art. 141º, nº 1 e 2 e art. 569º, nº 5 e 6).

A razão de ser da possibilidade de prorrogação dos prazos processuais reside,


quanto ao autor, na necessidade de colheita de elementos e documentos
essenciais, por vezes de obtenção demorada. Quanto ao réu a de lhe
proporcionar uma preparação da sua defesa mais eficaz, se existir motivo
manifestamente dificultador ou impossibilitador da respetiva organização.

Art. 569º, nº 4

No caso de pluralidade de réus, se a prorrogação do prazo da defesa for concedida apenas a


um deles, tal beneficio deve considerar-se extensivo aos restantes demandados (principio da
igualdade das partes); isto para assegurar a possibilidade de uma defesa conjunta, em nada
prejudicando a celeridade processual, já que os autos sempre teriam que aguardar o decurso
do último prazo deferido (art. 569º, nº 2).

Quanto à apresentação em juízo e respetiva forma, aplica-se o art. 144º, nº 1 a 8.

4.3. Notificação ao autor


Art. 575º, nº 1 – será enviado um duplicado com o propósito de o autor tomar conhecimento
da atitude assumida pelo réu perante a ação e atuar processualmente em conformidade.

Art. 575º, nº 2.

4.4. Forma externa. Ordenação das matérias. Requisitos


Este articulado possui uma estrutura externa similar à da petição inicial:

a) Cabeçalho/introito – o réu individualiza a ação, identificando o processo e indicando os


nomes das partes – art. 572º, nº 2;

21
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

b) Endereço – dirige a contestação ao juiz a quem foi distribuído o processo, com menção
da comarca, juízo ou secção pelos quais a causa corra os seus trâmites;

c) Narração – expõe as razões de facto e de direito pelas quais se opõe à pretensão do


autor, isto é, a sua versão sobre os factos alegados pelo autor, tomando posição
acerca desses factos e trazendo ao processo novos factos, bem como os seus
argumentos ou razões de direito, procurando demonstrar que os factos narrados pelo
autor não integram a previsão normativa de direito material abstratamente invocada
(art. Art. 572º, al. b)); art. 572º, al. c).

d) Conclusão – extrai o réu as consequências lógica das alegações por si feitas na


narração, tendo presente a variabilidade das consequências consoante se trate de
procedência de uma exceção dilatória ou de uma exceção perentória ou da
impugnação pedindo: ou a absolvição da instância, com base na procedência de
alguma exceção dilatória (art. 576º, nº 2) ou a absolvição do pedido, por improceder a
ação por impugnação ou proceder alguma exceção perentória (art. 576º, nº 3).

Art. 572º, al. d). O réu deve, pois, quanto ao requerimento de proposição / requerimento /
oferecimento da prova, cumprir, no seu articulado de defesa, idêntico dever ao que impede
sobre o autor.

No mesmo articulado, poderá o réu deduzir reconvenção, suscitar a verificação do valor da


causa ou impugnar o valor indicado pelo autor (art. 305º, nº 1) e, bem assim, outros
incidentes, como os de intervenção provocada de terceiros na hipótese de preterição de
litisconsórcio necessário ou da conveniência em litisconsórcio facultativo (art. 316º, nº 1 e 3) e,
finalmente, arguir nulidades principais, a nulidade de todo o processo por ineptidão da petição
inicial (art. 198º, nº 1) e, sendo caso disso, a nulidade por erro na forma de processo (art. 193º,
nº 1 e art. 198º, nº 1) bem como ainda, querendo contestar para prevenir a hipótese de
improcedência da respetiva arguição, a nulidade da citação (art. 191º, nº 1 a 3).

No que especificamente concerne à junção da prova documental, deve a mesma ser, desde
logo, apresentada com esse articulado, dessa junção se fazendo menção expressa e
devidamente reportada aos factos a provar (art. 423º, nº 1), devendo, quanto à possibilidade e
aos efeitos da respetiva apresentação em momento ulterior, observar-se o preceituado no art.
424º e 425º.

Deve ainda ser assinada por quem a redigiu.

O reu não tem que indicar qualquer valor na contestação, a menos que não concorde com o
valor atribuído pelo autor da ação, porquanto, nessa hipótese, pode impugná-lo, desde que
ofereça outro valor em substituição daquele e também se tiver deduzido pedido
reconvencional (art. 305º, nº 1).

Recai sobre o réu o dever de organizar as matérias da sua exposição – art. 583º, nº 1.

Deve começar pela invocação da matéria integradora de eventuais exceções dilatórias, já que a
verificação/procedência das mesmas preencherá normalmente uma circunstância obstativa do
conhecimento do mérito da causa, com consequente absolvição do réu da instância ou
remessa do processo para o tribunal ou juízo competente – arts. 278º; 576º, nº 2; 577º e 578º.

22
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

No que respeita à defesa que diretamente se prende com o mérito da causa, deve o réu iniciar
a sua alegação pelos factos impugnatórios das teses sustentadas pelo autor, à qual se seguirá a
sua invocação/ alegação dos factos essenciais que se baseiam as exceções perentórias de pôr
em crise a pretensão do demandante (arts. 5º, nº 1; 576º, nº 3 e 578º).

Também, por razões de ordem lógica, no domínio das exceções perentórias,


devem ser alegadas, em primeiro lugar as impeditivas, depois as modificativas e,
por fim, as extintivas.

4.5. Taxa de justiça


Art. 570º, nº 1 – principio da igualdade das partes

Deve o réu juntar com o articulado da contestação documento comprovativo do prévio


pagamento da taxa de justiça, ou, se se encontrar a aguardar decisão sobre a concessão do
beneficio de apoio judiciário, documento comprovativo da apresentação do respetivo
requerimento junto do órgão administrativo decisor competente.

Essa última comprovação deve ser feita no prazo de 10 dias a contar da


notificação da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário – art. 570º,
nº 2.
4.6. Controlo formal externo
A perentoriedade, associada ao ato da sua apresentação em juízo, faz com que a recusa da
contestação pela secretaria só seja admissível quando o articulado não esteja em condições
absolutas de ser recebido.

Deve, assim, e em geral, aplicar-se às hipóteses de recusa de recebimento da contestação pela


secretaria, a titulo subsidiário, ainda que com adaptações, o disposto no art. 558º para a
petição inicial – principio da igualdade das partes.

Em todos os demais casos, o controlo deve ser feito pelo juiz ao abrigo do
princípio da gestão processual, contemplado nos arts. 6º e 590º, nº 1 a proferir
nos termos do art. 590º.

4.7. Ónus da contestação. Revelia. Consequências processuais


Se o réu, investido pela citação, no ónus de contestar, inobservar tal ónus e não deduzir
qualquer defesa dentro do prazo legal, incorrerá em situação de revelia:

 Revelia relativa – se dentro desse prazo, intervier por algum outro modo no processo.
O reu não apresenta defesa;

 Revelia absoluta - quando não intervier de modo algum no processo, assim se


quedando em completo silêncio – art. 566º e 567º, nº 1. No caso desta revelia,
aquando da conclusão inicial do processo após o decurso do prazo da contestação, o
juiz verificará cautelarmente da regularidade da citação, mandando-a repetir se não

23
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

houver sido feita com observância das formalidades legais (art. 566º). Não há espaço
para alegações, passa-se diretamente para a sentença.

O estado de revelia produz efeito probatório (cominatório/perentório/confessório), para além


de outros efeitos relativos à situação processual do réu à tramitação subsequente da ação.

Regime regra: revelia operante

Regime excecional: revelia inoperante

4.7.1. Revelia operante


Há revelia operante quando o réu havendo sido citado regularmente na sua própria pessoa, ou
tendo juntado procuração a mandatário judicial no prazo da contestação, não deduzir
qualquer oposição.

Produz a mesma, como efeito cominatório essencial, a confissão dos factos


articulados pelo autor (art. 567º, nº 1), gerando uma presunção irrefutável de
confissão.

Este comportamento omissivo do réu provoca a chamada confissão tácita, ficta ou presumida.

Não se confunde com a confissão judicial expressa, consubstanciada numa


declaração de reconhecimento de um facto cuja prova pertencia, em principio, à
parte contrária (arts. 352º e 355º e ss do CC). Dispensando qualquer manifestação
expressa de vontade, basta-se a lei, para que a revelia surta efeito confessório
com que o réu não conteste a ação.

Efeito que, por norma, conduzirá a um julgamento de mérito favorável


ao autor. Por isso se designa esta modalidade de confissão por confissão
semi-plena.

A confissão presumida fica definitivamente adquirida no processo, não podendo o réu vir
posteriormente negar os factos relativamente aos quais se manteve em total silêncio o inércia.

4.7.2. Tramitação subsequente à revelia operante


Se operar o efeito cominatório da revelia (revelia operante) seguir-se-á o procedimento
abreviado previsto nos nº 2 e 3 do art. 567º, por reporte ao art. 566º.

Tidos por confessados os factos por ausência de contestação, cessa a fase dos articulados,
deixando de haver lugar as fases da gestão inicial do processo e da audiência prévia, da
instrução e da audiência final.

Haverá lugar, de imediato, a uma fase de alegações escritas – a serem


exclusivamente apresentadas pelo autor em caso de revelia absoluta do réu ou
sucessivamente pelo autor e pelo réu na hipótese de este haver constituído
mandatário – após o que é proferida sentença julgando a causa conforme for de
direito – art. 567º, nº 2.

24
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Nesta situação não há lugar a qualquer averiguação ou decisão fácticas de carácter autónomo,
mas, tão-somente, à interpretação e aplicação da lei à hipótese vertente; seguir-se-á
normalmente a sentença de mérito de procedência ou improcedência do pedido.

Improcedência que poderá resultar da inconcludência da petição inicial. E se a


apreciação/decisão da causa se revelar de manifesta simplicidade, a sentença pode
circunscrever-se à parte conclusiva/decisória, precedida da necessária identificação
das partes e da fundamentação sumária do julgamento – art. 567º, nº 3.

O art. 566º é omisso quanto à possibilidade de sanação das exceções dilatórias e das
irregularidades da petição inicial. Mas quanto às exceções dilatórias, impondo o art. 608º, nº 1
que a sentença de mérito seja precedida da verificação dos pressupostos processuais, não
seria crucial que o juiz não pudesse promover a sanação da sua eventual falta, de preferência
antes das alegações das partes e, o objetivo essencial de alcançar uma decisão de mérito
sempre recomendará a correção dos eventuais vícios de forma.

Deve o juiz a uma espécie de pré-saneamento, verificando se a petição enferma


ou não quaisquer irregularidades formais e fixando o prazo para suprimento ou
correção dos vícios detetados (art. 590º, nº 2 e 3); e também da eventual
ocorrência de exceções dilatórias, providenciando pelo suprimento daquelas que
forem suscetíveis de sanação (arts. 6º, nº 1 e 3; 590º, nº 2, al. a)).

Se for detetada qualquer exceção dilatória insuscetível de sanação, o juiz poderá (salvo as
exceções dos nº 2 e 3 do art. 278º) deixar de absolver o réu da instância (arts. 278º, nº 1; 576º,
nº 2 e 577º).

Só se preenchidos todos os pressupostos processuais, deverá o processo ser


facultado para exame pelo prazo de 10 dias, primeiro ao advogado do autor e
depois ao advogado do réu (se o réu o houver constituído) para alegarem por
escrito, proferindo o juiz a sentença de mérito em que aplicará o direito aos factos
assentes por confissão.

4.7.3. Revelia inoperante. Situações legais. Consequências processuais


a) Situações legais
Nem sempre o efeito cominatório ou perentório de prova por confissão resultante de revelia
se produz, já que o art. 568º lhe introduz, nas suas alíneas a) a d), algumas limitações, que
constituem outras tantas exceções àquela regra. Assim:

a) Art. 568º, al. a) – esta exceção funciona em qualquer situação de pluralidade de réus, e
limita a sua eficácia aos factos de interesse para o réu revel, não sendo prejudicada ela
superveniente desistência do autor relativamente ao réu contestante. O beneficio da
contestação por um dos co-réus é, assim, circunscrito à matéria concretamente
impugnada pelo réu-contestante; daí que os factos não efetivamente impugnados

25
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

tenham que ser dados como assentes relativamente a todos os réus ( nº 2 do art. 574º,
com referência à al. a) do art. 568º). Só não podem ser considerados como
confessados os factos impugnados pelo réu contestante (art. 574º, nº 1), pois que
seria absurdo que os réus revéis ficassem em situação mais favorável que a dos
efetivamente contestantes;

b) Art. 568º, al. b), 1ª parte – Se o réu for um incapaz e o objeto do litígio se situar no
âmbito da sua incapacidade, não se produz o efeito perentório ou cominatório, não só
perante o incapaz, como também perante outro eventual réu revel, na parte
respeitante a factos de interesse comum, ainda que se trate de litisconsórcio
voluntário ou coligação. Pretende-se, a um tempo proteger o incapaz que nela
permaneça e evitar a dissonância na apreciação da matéria de facto.
Já se o objeto do litígio se situar numa zona de capacidade do incapaz, a exceção se
não justifica, pois que a necessidade da proteção do incapaz se tornará então
despicienda, havendo que fazer funcionar plenamente o efeito (a operância) da
revelia.
No entanto, se o réu incapaz não contestar (através do seu representante) não entra,
desde logo, em revelia: deverá então ser citado o Ministério Público, correndo novo
prazo para a defesa (art. 21º, nº 1) e só na falta de contestação do Ministério Público é
que o réu incapaz fica em situação de revelia (ainda que inoperante).

c) Art. 568º, al. b), 2ª parte - Na base desta exceção legal encontra-se a consabida falta
de fiabilidade da citação edita associada à incerteza de que o réu tenha tido real e
efetivo conhecimento da ação contra si instaurada. Isto sendo certo não assistir ao réu
o direito de ilidir a presunção de que, através da publicação dos editais e anúncios,
tomou efetivo conhecimento dessa instauração (art. 240º, nº 1 e 2 e 242º; 244º). Só
opera a exceção relativamente ao réu citado editalmente que haja caído em revelia
absoluta, pois que, se não contestar, mas constituir mandatário no processo ou juntar
algum documento no prazo da contestação, a sua revelia é apenas relativa e, por isso,
operante (nº 1 do artº 567º e a al. b), in fine, do art. 568º).
Também, nesta sede, o efeito cominatório se não produz perante outro co-réu que
seja revel juntamente com o ausente.

d) Art. 568º, al. c) – subjazendo ao efeito probatório da confissão ou da admissão uma


certa ideia de adesão à verosimilhança da afirmação ou alegação do autor, traduzida
no desinteresse da respetiva contradição, os efeitos da inércia do demandado não
podem deixar de circunscrever-se à esfera dos direitos disponíveis. Já se a pretensão
do autor tiver por objeto ou respeitar a situações jurídicas ou interesses indisponíveis,
a omissão de contestar não produz qualquer eficácia probatória (confessória); pois, de
contrário, seria conferir ao seu silêncio um resultado probatório não alcançável por via
de uma qualquer declaração de vontade negocial.
Assim se evita que as partes logrem obter, pela via ínvia (indireta) da ausência de
contestação, um efeito jurídico que não poderiam obter pela via extrajudicial. De
realçar que, quer a disponibilidade, quer a indisponibilidade da relação jurídica de que
se trate, serão sempre de aferir pelas regras do direito substantivo, sendo que, na
ausência de disposição legal expressa, deverá seguir-se o princípio da autonomia da
vontade, segundo o qual as partes podem dispor extrajudicialmente dos seus direitos,

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

devendo, na dúvida, vigorar, à semelhança do direito privado, o princípio in dubio pro


libertate (presunção geral de liberdade dos sujeitos de direitos).

e) Art. 568º, al. d) - Do efeito revelia adveniente da falta de contestação do réu geradora
da confissão ficta (nº 1 do art. 567º) há ainda que excecionar os factos cuja prova só
possa fazer-se através de documento escrito (art. 568º, al. d)). Adjetiva a lei, através
desta exceção, a estatuição do art. 364º do CC. A inoperância da revelia circunscreve-
se, pois, aos factos carecentes de prova documental, que não a todos os demais factos,
sendo, qua tale, «mais restrita que a das previsões das anteriores alíneas» do art.
568º
Deste modo, se a lei exigir (art. 364º do CC) ou as partes convencionarem (art. 223º do
CC) a necessidade de documento escrito como forma ou para a prova de um negócio
jurídico (ou de outro facto jurídico), esse documento não é dispensável, sendo
pois irrelevantes para a prova da declaração negocial, quer o mero silêncio da parte,
quer a declaração expressa de confissão.

Sem embargo da possibilidade de renúncia à forma convencionada, a omissão de contestar


não equivale a renúncia e se não for ilidida (através de factos alegados pelo autor e não
impugnados pelo réu) a presunção do nº 1 do arte 223º daí se seguirá que tal vinculação só se
tornará possível pela forma acordada242. Preceito esse (do nº 1 do art. 223º) que, por isso,
não dispensa a alegação, pelo autor, da estipulação (negocial/convencional) da forma especial
para a declaração.

Também nesta sede, e ex-vi do nº 2 do art. 574º (de aplicar por analogia) serão de excluir da
confissão ficta os factos física ou legalmente impossíveis e os notoriamente inexistentes (art.
354º, al. c), do CC).

b) Repercussões processuais da revelia inoperante


No que concerne às repercussões no iter processual resultantes da circunstância de a falta de
contestação não importar a confissão dos factos articulados pelo autor, a situação prevista na
al. a difere da das restantes alíneas do art. 568º. Assim:

a) no caso da alínea a) , porque ao réu revel aproveita a contestação apresentada pelo


seu co-réu (tudo se passando como se houvesse também contestado), a tramitação
processual seguirá o seu curso normal. Pode, assim, haver réplica - se admissível tal
peça na concreta situação processual (art. 584º) -, podendo também ter lugar todas as
demais fases processuais, ou seja, a audiência prévia, a instrução, a audiência final e a
sentença;

b) já nas hipóteses das alíneas b), c) e d) do art° 568° , a ausência de contestação faz com
que cesse a fase dos articulados. Na subsequente fase da gestão inicial do processo e
da audiência prévia, não há lugar à prolação do despacho a que se reporta o art. 596º
de identificação do objeto do litigio e enunciação dos temas da prova; não
funcionando a cominação, torna-se necessário submeter os factos articulados
relevantes à produção de prova, a fim de que o juiz possa, em função dela, bem decidir
o pleito, pelo que haverá lugar às fases da instrução, da audiência final e da sentença.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

A situação jurídico-processual do réu revel manter-se-á incólume «ainda que esse co-réu
venha, entretanto, a confessar o pedido, a transigir ou a ser absolvido da instância». Tal
situação só é afetada na parte que diretamente se prende com a falta de contestação,
subsistindo, quanto ao restante, todos os seus poderes processuais.

Deste modo, se a revelia for operante, o réu tem a faculdade de produzir alegações escritas,
desde que haja constituído advogado (nº 2 do art. 567º). Se a revelia for inoperante, há que
distinguir entre revelia absoluta e revelia relativa:

 Se incurso em revelia absoluta, o réu revel não é notificado para nenhum ato ou
diligência processual, apenas lhe sendo notificada a decisão final (art. 249º, nº 2 a 5).

 Se relativa, é notificado para os atos processuais subsequentes.

Em qualquer das situações, e no que respeita à produção/realização de atos instrutórios, não é


admitido ao réu revel requerer o depoimento pessoal do autor ou a prova por declarações e
arrolar testemunhas (a contrario, os art. 453º, e 572º, al. d), respetivamente), prova pericial
(artº 467º e ss.) e prova por inspeção judicial (art. 490º e ss.), bem como intervir nas diversas
diligências probatórias relativas às provas constituendas, na inquirição das testemunhas
arroladas pelo autor (art. 516º, nº 1 a 4).

Pode, porém, deduzir incidentes de impugnação e acareação, esta entre as testemunhas


arroladas pelo autor (art. 515º, 521º e 523º), bem como juntar documentos (se reunidos os
pressupostos dos nº 2 e 3 do art. 423º), isto é, se demonstrar que tais documentos se
mostravam indisponíveis (sem culpa sua) no decurso do prazo para a apresentação da
contestação.

E pode ainda, na audiência final, produzir alegações orais, quer de facto, quer de direito (art.
604º, nº 3, al. e) e 4 a 8). Intervenções e atuações essas a serem feitas através de mandatário
judicial (art. 40º).

Sendo a revelia inoperante por verificação de uma qualquer das situações das al. b), c) e d) do
art. 568º, o processo segue a sua tramitação normal (art. 599º) não sendo o réu revel
notificado enquanto não intervier no processo, com exceção da notificação da sentença, desde
que a sua residência ou sede sejam conhecidas no processo (art. 249º, nº 5).

5. A defesa do réu
5.1. Defesa por impugnação e/ou por exceção
Através da contestação-defesa o réu opõe-se, por contradição, ao pedido contra si formulado
pelo autor ou através da invocação de exceções dilatórias ou perentórias.

Tal oposição será:

 Frontal ou direta – se consistir, quer na contradição dos factos articulados na petição,


quer na afirmação de que esses factos não podem surtir o efeito jurídico almejado
pelo autor – art. 571º, nº 2, 1º segmento.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

 Lateral ou indireta – se se traduzir na alegação de factos obstativos do conhecimento


do mérito da causa, que impliquem a remessa do processo para outro tribunal (art.
571º, nº 2 e art. 574º, nº 1 a 4) ou que sejam suscetíveis de impedir, modificar ou
extinguir o direito invocado pelo autor (art. 571º, nº n e art. 574º, nº 1 e 4).

A contestação-defesa do réu pode, assim, assumir as modalidades de defesa por impugnação


ou de defesa por exceção (art. 571º, nº 1).

Mas, se o réu aproveitar o articulado da contestação para deduzir uma contra-ação ou um


contra-pedido contra o autor, diz-se que apresentação uma contestação-reconvenção.

5.1.1. Defesa por impugnação


O réu defende-se por impugnação quando contradiz os factos articulados na petição ou
quando afirma que esses factos não podem produzir o efeito jurídico pretendido pelo
demandante.

A impugnação é um meio de defesa direta, uma oposição ou um ataque frontal ao


pedido.

A impugnação/oposição pode ser de:

 Facto -o réu opõe-se à versão da realidade apresentada pelo autor, negando os factos
alegados como causa de pedir, na petição inicial;

 Direito – o réu questiona a qualificação ou significação jurídica que o autor atribui aos
factos por si narrados. Aceitando, embora a verdade dos factos, o réu sustenta que
deles não emergem os efeitos jurídicos que o autor pretende (inconcludência da
pretensão). O réu contradiz o efeito jurídico que o autor pretende extrair dos factos
alegados, pondo em crise a determinação, interpretação ou aplicação da norma
jurídica pelo autor invocada na petição inicial.

Ambos os tipos de oposição assumem um carácter direito ou frontal de defesa, sendo de


salientar que se o réu mantém dentro do terreno ou do campo em que o autor se colocou, isto
é, esgrimindo com as mesmas armas que o autor, tendo sempre em sua mira a sua absolvição
total ou parcial do pedido, por força da improcedência, total ou parcial da ação.

Impugnação de facto:

A impugnação dos factos constitutivos, pelo réu, por sua vez, pode ser:

 Direta – quando o réu nega frontalmente esses factos, afirmando não terem na
realidade ocorrido;

 Indireta – quando o réu, confessando ou admitindo parcialmente os factos


integradores da causa de pedir, invocada pelo autor, afirma, por seu turno, factos cuja
existência é incompatível com a realidade de outros, também alegados pelo autor, no
âmbito da mesma causa de pedir, quando alega factos instrumentais (art. 5º, nº 2)
probatórios incompatíveis com os factos alegados como causa de pedir pelo autor e
quando com estes é incompatível o conjunto dos factos alegados pelo réu, de um dos
factos alegados pelo autor, do qual os restantes dependem (art. 574º, nº 1 a 4).

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Assim, a impugnação de facto pode assumir uma das 4 modalidades:

1. Negação direta dos factos alegados pelo autor, rotulando-os, puramente e


simplesmente, de falsos (inexatidão absoluta);

2. Negação indireta ou motivada, fornecendo dos factos alegados uma outra perspetiva,
panorâmica ou significado, isto é, apresentando uma contra-versão ou contra-
exposição desse mesmos factos (negatio per positionem);

3. Inexatidão relativa fornecendo uma contra-versão parcialmente diferente dos factos


alegados pelo autor;

4. Invocação em relação a eles, da figura do simples desconhecimento (art. 574º, nº 3).

A oposição mediante a invocação do simples desconhecimento não constitui impugnação em


sentido técnico, mas antes uma modalidade de defesa que lhe pode equivaler, já que consiste
na declaração, pelo réu, de que ignora se determinado facto corresponde ou não à realidade.

Caso se trate de um facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento, a invocação desse
conhecimento equivalerá a confissão (art. 574º, nº 3).

5.1.2. Defesa por exceção


O réu defende-se por exceção quando alega factos que obstam à apreciação de mérito da ação
ou que, servindo de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor,
determinam a improcedência total ou parcial do pedido (art. 576º, nº 3).

Toda a defesa por exceção é uma defesa indireta, porquanto não traduzida num
Defesa ataque frontal e direta, mas antes num ataque lateral oblíquo ou de flanco à
por pretensão do autor. Em suma: é exceção toda a defesa indireta, toda a defesa
que não seja por oposição.

exceção – traduz-se na alegação de nova factualidade que o réu entende como suscetível de
obstar a que o tribunal possa extrair o efeito pretendido pelo autor; seja porque tais factos
impedem o tribunal da causa de apreciar o pedido deduzido pelo autor (exceção dilatória – art.
576º, nº 2), seja porque conduzem o tribunal apreciador ao julgamento da respetiva
improcedência (exceção perentória – art. 576º, nº 3).

Ao invocar esta última, o réu aceita a narração fáctica apresentada pelo autor;
porém, traz para o processo novos factos suscetíveis de gerar a sua absolvição da
instância ou de impedir, modificar ou extinguir o direito que o autor pretende fazer
valer com a sua propositura da ação – art. 576º, nº 3.

Daí falar-se num ataque indireto, lateral ou de flanco, pois o réu sai do campo em que o autor
se colocou, lançando mão de armas de facto distintas das usadas pelo autor na petição inicial.

Em função dos efeitos produzidos por este meio defensional há que distinguir entre exceções:

 Dilatórias;
 Perentórias.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

5.1.2.1. Exceções dilatórias


Exceções dilatórias / processuais – são as que, obstando a que o tribunal conheça do mérito
da causa, dão lugar à absolvição do réu da instância ou à remessa dos autos para outro
tribunal (art. 576º, nº 2), constituindo, assim, na arguição de quaisquer irregularidades ou
vícios de carácter (formal) processual.

O que sucede quando invocada a falta a falta de um pressuposto processual, isto


é, de um dos requisitos técnico-formais exigidos para que o tribunal se possa
debruçar sobre o mérito da causa, condenando ou absolvendo o réu do pedido
deduzido pelo autor.

A falta (não sanada) de algum desses pressupostos gera o surgimento das exceções que inibem
o juiz da emissão do seu juízo decisório final.

Daí serem também designadas por exceções processuais, já que somente afetam a
relação jurídica processual, sem contenderem com a relação jurídica material,
apenas protelando o momento em que esta será apreciada.

Pode dizer-se, por isso, que, tendencialmente, as exceções dilatórias e os


pressupostos processuais são o verso e reverso da mesma realidade.

Art. 577º - enumera as exceções dilatórias. Na expressão “entre outras” cabem as exceções
dilatórias inominadas, nomeadamente:

 Falta de interesse processual ou de interesse em agir;


 Não sujeição das partes à jurisdição portuguesa;
 Ocorrência de factos demonstrativos da existência e fraude;
 Simulação processual (uso anormal do processo).

São nominadas as expressamente contempladas na al. a) a i) do art. 577º:

a. A incompetência, quer absoluta, quer relativa, do tribunal;

 a primeira dá lugar à absolvição da instância (art. 99º, nº 1) e a segunda à


remessa do processo para o tribunal competente – art. 105º, nº 3.

b. A nulidade de todo o processo;

c. A falta de personalidade ou de capacidade judiciária de alguma das partes;

 estes vícios só assumem a natureza de exceção dilatória se não forem,


entretanto, sanados, nas hipóteses em que a lei preveja a suscetibilidade de
tal sanação (arts. 11º; 14º; 15º e 16º).

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

d. A falta de autorização ou deliberação que o autor devesse obter;

e. A ilegitimidade de alguma das partes;

 Pretendendo-se assegurar que estejam em juízo os verdadeiros titulares da


relação material litigada, em ordem a que a decisão a proferir possa resolver
efetivamente o conflito de interesses, a não intervenção de alguns desses
titulares na lide faz com que a decisão que vier a ser proferida os não possa
vincular, e daí que a apreciação da questão de fundo possa resultar em pura
inocuidade.

f. A coligação de autores ou réus, quando entre os pedidos não exista a conexão exigida no
artigo 36.º;

g. A pluralidade subjetiva subsidiária, fora dos casos previstos no artigo 39.º;

h. A falta de constituição de advogado por parte do autor, nos processos a que se refere o
n.º 1 do artigo 40.º, e a falta, insuficiência ou irregularidade de mandato judicial por
parte do mandatário que propôs a ação;

 Reporta-se aos casos em que é obrigatório o patrocínio judiciário e à falta,


insuficiência ou irregularidade do mandato.

i. A litispendência ou o caso julgado.

 Verifica-se esta exceção quando preenchidos os requisitos da chamada


tríplice identidade a que se reportam os arts. 580º e 581º.

 Todas as exceções dilatórias são de conhecimento oficioso, salvo as de


incompetência absoluta decorrente da violação do pacto privativo de
jurisdição ou da preterição de tribunal voluntário e a de incompetência
relativa nos casos não abrangidos pelo disposto no art. 104º, as quais têm
de ser invocadas pelo réu para que o tribunal as possa apreciar (art. 578º).

5.1.2.2. Exceções perentórias


A defesa por exceção perentória consiste no estipulado no art. 576º, nº 3 CPC.

Neste tipo de defesa o réu não repudia nem contradiz os factos articulados pelo autor,
arguindo-os de falsos ou inexatos.

Mas aduz ou traz para o processo razoes, motivos ou argumentos concludentes no


sentido do não acolhimento da tese jurídico-substantiva enunciada na petição.

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Comum aos 3 enunciados de exceções perentórias é a alegação de um circunstancialismo


fáctico de carácter inovatório, com o objetivo de neutralizar, paralisar ou inutilizar a eficácia do
direito arrogado em juízo pelo autor.

Factualidade nova essa suscetível de impedir a válida e eficaz geração do direito


invocado pelo autor, ou que, admitindo tal constituição implicam a alteração ou
modificação de um direito que, todavia, subsistirá com alteração do seu conteúdo
ou, finalmente, factos determinantes da extinção do direito, com a consequente
impossibilidade de o autor dele retirar qualquer efeito útil prático-jurídico ou
prático-económico.

5.2. Princípio da concentração da defesa. Exceções


Art. 573º, nº 1 CPC.

Daqui resulta que o réu deve incluir nessa peça processual, quer a defesa direta
(impugnação), quer a defesa indireta (exceção dilatória ou perentória), não podendo
reservar para momento ulterior do processo certos meios defensionais de carácter
eventual ou subsidiário.

Este principio é tributário do principio da celeridade e da economia processual e a sua


cominação estende-se aos incidentes eventualmente suscitados pelo réu.

O réu pode defender-se, a titulo simultâneo, por exceção dilatória e por impugnação.

Isto porque a eventual procedência de uma qualquer exceção dilatória prejudica o


conhecimento do mérito da causa, tornando despicienda apreciação da deduzida
defesa direta do réu por impugnação e por exceção perentória.

Se julgadas improcedentes as exceções dilatórias eventualmente deduzidas e, na hipótese de


defesa por etapas, teria que ser concedido ao réu novo prazo defensional para vir discutir o
fundo da questão.

O que seria violador do direito da defesa do réu como dos princípios da economia,
celeridade, boa-fé e lealdade processuais.

Com a defesa concentrada ou unitária, impede-se que o réu utilize a sua


defesa como expediente dilatório do processo.

A arguição de nulidades pode, contudo, ser feita mesmo antes da dedução da contestação.

Art. 588º, nº 1 e 3 CPC – sob pena de preclusão do direito processual.

5.2.1. Princípios da preclusão e da eventualidade

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Do principio da preclusão resulta que, recaindo sobre o réu o ónus de, na contestação,
impugnar os factos alegados pelo autor, alegando os factos que sirvam de base a qualquer
exceção dilatória ou perentória, todos os meios de defesa não invocados nesse momento
ficam prejudicados, não podendo voltar mais tarde a ser alegados.

O princípio da eventualidade significa que, face ao risco de preclusão, o réu há-de esgrimir, de
modo simultâneo, todos os fundamentos e argumentos da sua defesa, em ordem a que cada
um deles possa ser considerado na hipótese de qualquer dos precedentes vir a improceder.

5.2.2. Exceções ao princípio da concentração. Defesa separada e defesa


diferida
Art. 573º define algumas exceções da concentração da defesa e que se reconduzem a duas
espécies:

a) Defesa separada (nº 1)

b) Defesa posterior ou diferida (nº 2) – aqui há que distinguir:

 Meios de defesa supervenientes – a serem deduzidos em articulado


superveniente (arts. 588º e 589º);

 Meios de defesa que a lei expressamente admita posteriormente à


contestação, dela fazendo parte aqueles meios defensionais cuja dedução
após a contestação a lei faculta (arts. 97º e 98º; 102º e 104º; 115º a 117º;
187º, al. b) e 188º);

 Meios de defesa de que o tribunal pode conhecer oficiosamente, abrangendo,


arts. 577º a 579º e 608º.

5.3. Ónus da impugnação. Efeito cominatório/probatório. Exceções.


5.3.1. Conteúdo
Art. 574º, nº 2 CPC.

Art. 574º, nº 1 CPC.

O réu ou demandado não pode remeter-se a uma atitude passiva sobre os factos
articulados pelo autor.

Art. 574º, nº 3 CPC.

5.3.2. Efeito cominatório/probatório. Exceções.


A citação constitui o réu, não só no ónus de contestar, mas também no ónus de impugnar. Este
último representando uma erupção característica dos sistemas de ficta confessio, em contraste
com os de ficta litis contestio, não podendo o réu posteriormente vir pôr em crise a prova que
a lei faz decorrer do seu silencio, isto é, de que a verdade processual reproduza a verdade
material subjacente.

34
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Art. 572º nº 2 CPC

Há exceções a considerar à regra do efeito cominatório, não tendo por admitidos por acordo:

a) Os factos que se encontrem em manifesta oposição com a defesa considerada no seu


conjunto – não se pode considerar o efeito da admissão, só porque não se especifica o
facto concretamente impugnado, quando da analise da contestação se possa extrair,
com segurança, que o réu não aceita e não adere à exatidão desse considerado facto;

b) Os factos sobre os quais não seja admissível confissão – explica-se pela razão de que,
se a lei proíbe a confissão expressa de determinado facto ou negócio jurídico, evidente
se torna que a confissão tácita, ou a admissão por acordo também não pode revelar,
sob pena de vir a obter-se por via indireta ou obliqua um resultado que diretamente
não pode ser alcançado;

c) Os factos que só possam ser provados por documento escrito (art. 574º, nº 2) – à
previsão do nº 2 do art. 574º subjaz um fundamento em tudo equivalente à da al. a)
do art. 568º para o efeito cominatório da revelia: em matéria de declaração negocial,
rege o principio da consensualidade ou da liberdade de forma (art. 219º do CC);
porém, em diversas situações, a lei exige, sob pena de nulidade, o mero documento
particular escrito outra forma mais solene para a celebração de certos negócios
jurídicos;

d) Os factos não impugnados por incapazes, ausentes e incertos, quando representados


pelo MP ou por advogado oficioso (art. 574º, nº 4) – também não são imputados a
estes o ónus da impugnação a que se reportam os nº 1 e 2, nem as ficções ligadas à
alegação do desconhecimento do facto a que se refere o nº 3, ambos do art. 574º. Mas
já deve ser observado o efeito cominatório quando representados pelo representante
geral ou litigando autorizados pelo curador (art. 17º a 20º);

e) Factos instrumentais – justifica-se pela oficiosidade que caracteriza os factos


instrumentais que resultem da instrução da causa, potencialmente alicerçados de
possíveis presunções judicias, os quais são livremente investigáveis no decurso da
própria audiência, mesmo que não oportunamente alegados pela parte interessada
(arts. 5º, nº 2; 411º; 412º e 698º, nº 3).

Não deve surtir eficácia probatória/cominatória de admissão o silêncio do réu ou a


inconsciência da referência por si produzidas relativamente aos factos a que se reportam as
als. a), b) e c) do nº 3 do art. 417º e o nº 2 do art. 454º.

No caso de pluralidade de réus, subsiste o ónus de impugnar, pelo que, ao contrário do que
ocorre no caso de revelia a que se reporta a al. a) do art. 568º, ao não impugnante não
aproveita a impugnação que haja sido feita por outro ou por outros réus.

6. A reconvenção
6.1. Defesa por exceção e reconvenção

35
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

No articulado de defesa, pode o réu limitar-se a exercer uma defesa indireta ou obliqua
através da invocação de qualquer exceção perentória.

Assim acontecerá sempre nos termos do art. 576º, nº

Se o réu aproveitar esse articulado para operar uma modificação objetiva da instancia,
deduzindo um pedido que se perfile em substância como autónomo relativamente ao pedido
principal, visando através dele obter a condenação do autor nesse novo pedido, ultrapassará
uma postura ou atitude simplesmente defensional, pois que acrescentará algo inovatório,
dizendo que tal eventualidade que contra-atacou através da reconvenção.

Deste modo, quando o pedido formulado pelo réu constituir uma decorrência
lógica e necessária da sua oposição, não pode ele ser considerado como
reconvenção, mas sim como mera defesa.

Se esse pedido consubstanciar-se numa verdadeira pretensão autónoma deduzida


pelo réu contra o autor, estamos perante um pedido reconvencional.

Relativamente ao pedido e às designações das partes:

 Réu – reconvinte (lado ativo);


 Autor – reconvindo (lado passivo).

O efeito jurídico pretendido pelo réu pode ser materialmente incompatível ou compatível com
o pedido formulado pelo autor ou ser dependente deste. O uso da exceção ou da reconvenção
dependerá do efeito jurídico pretendido obter, de harmonia com o principio do pedido.

6.2. Facultatividade e autonomia da reconvenção


Correspondendo a esse contra-pedido uma ação própria, poderá o réu optar entre fazê-lo
valer por via de reconvenção ou em ação proposta em separado já que a reconvenção não é
obrigatória, mas meramente facultativa.

A contestação/reconvenção não constitui um ónus do réu, mas uma mera faculdade cujo
exercício não preclude o direito de acionar o autor em ação autónoma – princípio da liberdade
de reconvir.

Art. 266º CPC.

Art. 266º, nº 6 CPC.

Se o autor-reconvindo não contestar os factos articulados em sede de


reconvenção e, uma vez que esta consubstancia uma ação cruzada, devem ter-se
por confessados os factos alegados pelo réu na reconvenção, com as exceções
previstas nas alíneas a), b), c) e d) do art. 568º (revelia inoperante).

Pode o réu-reconvinte requerer, antes mesmo da apreciação/decisão da contestação-


reconvenção, a adoção de uma qualquer medida cautelar, assim prevenindo os riscos das

36
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

previsíveis delongas no reconhecimento do direito que se propõe alegar e deduzir no âmbito


reconvencional.

6.3. Requisitos
6.3.1. Requisitos processuais
Art. 583º, nº 1 e 2.

Apresenta uma estrutura formal idêntica à da petição inicial.

Para a determinação do valor da causa deve atender-se ao momento em que a ação é


proposta, sem prejuízo da dedução do incidente do valor.

Porém, havendo reconvenção, o valor do pedido reconvencional soma-se ao valor


do pedido da ação quando os pedidos sejam distintos nos termos do nº 2 do art.
299º (art. 530º, nº 2), sendo esta soma que deve atender-se para efeitos do valor
da causa e, eventualmente, para efeitos de repartição da competência entre
instancia central e a instancia local, ainda que o processo venha a ser anulado por
ineptidão da petição inicial ou os pedidos venham a ser reduzidos ou a ser objeto
de desistência, transação ou de decisão de improcedência.

Art. 583º, nº 2 do CPC.

Art. 583º, nº 3 CPC.

A reconvenção pode ser deduzida não apenas pelo réu contra o autor mas também por ou
contra outros sujeitos que, de harmonia com os critérios gerais aplicáveis à pluralidade de
partes, possam associar-se ao reconvinte ou reconvindo através da suscitação do incidente de
intervenção principal provocada (arts. 311º a 315º e 316º, nº 1, 2 e 3), como sucederá quando
o pedido formulado pelo réu implicar um litisconsórcio necessário passivo entre o reconvindo
e uma terceira pessoa (art. 266º, nº 4).

Mesmo que se trate de litisconsórcio voluntário ou coligação, faculta também a lei


ao réu devedor solidário a dedução, em reconvenção, do pedido de condenação
dos seus condevedores, não demandados como réus, em satisfação do direito de
regresso (art. 316º, nº 2).

O juiz pode, contudo, recusar a reconvenção se entender que há inconveniente grave na


instrução, discussão e julgamento conjuntos. Nesta eventualidade aplica-se o art. 266º, nº 5
CPC.

O autor e o réu supostos pelo art. 266º são aqueles a quem se reconheça
legitimidade para, nessa qualidade, intervirem no pleito. Se o réu for julgado parte
ilegítima para a ação principal no despacho saneador, esse julgamento prejudica
também o conhecimento do pedido reconvencional. 37
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

A reconvenção pode ser inepta como a petição inicial.

Essa ineptidão não gera, todavia, nulidade de todo o processo, mas, tão-somente,
a nulidade da própria reconvenção, com a consequente absolvição do autor-
reconvindo da instância reconvencional.

Para além dos elementos de conexão com o pedido do autor indicador no nº 2 do art. 266º,
cumpre ao réu observar, na dedução do seu pedidos, todos os requisitos legalmente exigidos
para a obtenção de uma decisão de mérito, isto é, os pressupostos processuais, uns relativos à
competência absoluta do tribunal, outros ligados à forma do processo (este ultimo ponto: art.
266º, nº 3).

Assim, desde logo, quanto à competência absoluta do tribunal para o conhecimento do pedido
principal e do pedido reconvencional (art. 93º, nº 2).

É preciso, ainda, ter em conta o poder-dever, por parte do juiz, de ordenar a junção/apensação
de ações pendentes no próprio ou em tribunal distinto, suscetíveis de ser reunidas num só
processo, se nelas se verificarem os pressupostos da admissibilidade da reconvenção, salvo a
inconveniência dessa junção, quer pelo estado do processo, quer por outra qualquer razão
atendível (art. 267º, nº 1 a 4).

6.3.2. Requisitos materiais


O exercício do direito de reconvir depende ainda da verificação de certes limites ou requisitos
de ordem substancial, material ou objetiva, em satisfação da exigência legal de uma certa
conexão entre o pedido do autor e o pedido reconvencional (arts. 266º, nº 2, al. a) a d)).

As als. a) a d) do art. 266º são as hipóteses de reconvenção taxativamente contempladas.

Isto para a chamada reconvenção pura, uma vez que, nas situações da alínea b) e
c), a reconvenção pode ser deduzida a titulo eventual para o caso de o pedido
originário vir a ser julgado procedente.

Art. 266º, nº 2, al. c)

Sendo a compensação um meio de extinguir as obrigações (art. 847º, nº 1 do CC),


se dois sujeitos de direito forem simultaneamente credores e devedores um do
outro poderá qualquer um deles subtrair-se ao cumprimento compensando a sua
divida com o seu crédito, desde que observados os requisitos das diversas alíneas
desse nº 1. Nesta primeira vertente, o réu dirige ao autor, através de contestação,
a declaração de compensação prevista no art. 848º, nº 1 do CC, com vista à
extinção reciproca de ambos os créditos, não impedindo a compensação a
iliquidez da divida (art. 847º, nº 3 do CC).

38
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

6.3.3. A reconvenção nas ações de simples apreciação negativa, no processo


executivo e em outros processos e procedimentos especiais alternativos e
abreviados
Sendo a causa de pedir, nas ações de simples apreciação negativa, constituída, não só pela
inexistência do direito de que o réu se arroga, mas também pelos factos a este imputados,
indiciadores de um estado de incerteza objetiva que o autor pretende fazer cessar, tendo o réu
o ónus da prova da existência desse direito, passa a ocupar materialmente a posição de autor
e daí ao ser possível admitir reconvenção neste tipo de ações.

Se o processo não admitir a contestação do réu ou réplica do autor, não poderá usar-se a
reconvenção.

Em princípio, a reconvenção só é possível em processo declarativo. Em processo


executivo apenas se torna possível a oposição à execução baseada em sentença
para pagamento de quantia certa com fundamento em contracrédito sobre
exequente (art. 729º, al. h)) e, outrossim, a oposição contra execução para entrega
de coisa certa com fundamento em benfeitorias a que tenha direito (art. 860º, nº 1
e 3).

Há processos especiais em principio incompatíveis com a admissão de reconvenção, mas em


que a lei manda seguir, no caso de contestação, os termos do antigo processo ordinário ou
sumário conforme o valor, em tais casos não haverá obstáculo processual a que se admita a
reconvenção, desde que se verifique o requisito substancial da conexão dos pedidos que a lei
contempla.

Assim, requerida a providência de injunção se estiverem em causa valores superiores


à alçada do tribunal da Relação (€30.000), porque a dedução de oposição no
processo de injunção determina a remessa dos autos para o tribunal competente,
aplicando-se a forma do processo comum (art. 7º, nº 2, daquele Dec.-Lei), daí se
segue ser admissível a dedução de reconvenção, reunidos que sejam os
pressupostos do art. 266º.

Nos processos que correm pelos julgados de paz «não se admite reconvenção, exceto quando
o demandado se propõe obter a compensação ou tornar efetivo o direito a benfeitorias ou
despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida». Só é, pois, admissível reconvenção nas
hipóteses das alíneas b) e c) do nº 2 do art. 266° (cfr. o nº 1 do art. 48º da Lei nº 78/2001, de
13 de julho).

Nos processos da arbitragem voluntária « demandado pode deduzir reconvenção, desde que o
seu objeto seja abrangido pela convenção de arbitragem» (art. 339º, nº 4 da LAV).

39
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Articulados eventuais e extraordinários


7. A réplica
7.1. Função. Conteúdo
Art. 575º, nº 1 CPC.

Ao autor cabe verificar se, perante a contestação apresentada, pode ou não haver
réplica, pelo que a notificação se destina a assegurar ao autor o eventual direito de
resposta.

Art. 584º, nº 1 CPC.

Se tal não acontecer cessa a fase dos


articulados.
Este articulado serve para o autor deduzir toda a defesa quanto à matéria de um
eventual pedido reconvencional deduzido pelo réu. Mas a réplica também servirá
para, em ação de simples apreciação negativa, o autor, não só impugnar os factos
constitutivos eventualmente alegados pelo réu, como ainda para deduzir exceções
perentórias.

A função da réplica face à reconvenção é equivalente à da contestação-defesa do réu perante


a petição inicial, assumindo, assim, a natureza de uma contestação da reconvenção.

Art. 587º, nº 1 CPC.

Na parte final do art. 584º, nº 1 está a proibição da reconvenção à reconvenção.

Tem em vista obstar às excessivas delongas dos litígios e em ordem a contribuir


para uma boa e célere administração da justiça.

Face à taxatividade legal das hipóteses de admissibilidade da réplica, diz-se que se trata de um
articulado de carácter eventual.

7.2. Oportunidade. Prazo. Efeitos da falta de apresentação


Prazo: art. 585º CPC.

Em caso de pluralidade de réus, com contestações separadas, a notificação ao


autor pela secretária deve ser unitária, devendo a réplica ser apresentada logo
após a última contestação ou expirado o prazo para o fazer, isto é, em caso de
notificação separada das contestações apresentadas, o prazo para a réplica só se
inicia com a última notificação, sem prejuízo de valer, quanto às contestações já
notificadas, a réplica que o autor apresente antes dessa notificação ser efetuada.
40
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Art. 586º CPC.

Na ausência de réplica, o autor-reconvindo fica sujeito ao regime de revelia quanto ao pedido


reconvencional, isto é, ao efeito cominatório-regra previsto para a revelia do réu.

O que, desde logo, implica a decisão do pedido reconvencional no despacho


saneador, na medida em que todos os factos relevantes alegados pelo reconvinte
possam ser, de imediato, dados como provados.

Também a falta de impugnação dos factos ex-novo invocados pelo réu surte o efeito
cominatório plasmado no art. 574º aplicável ex-vi do nº 1 do art. 587º.

A falta de réplica (falta de resposta) aos factos integradores da reconvenção ou constitutivos


do direito do réu arrogado na contestação, à semelhança do que sucede com a falta de algum
dos articulados previstos na lei ou com a falta de impugnação, em qualquer deles, dos novos
factos essenciais alegados pela parte contrária no articulado anterior, surte o efeito da
admissão por acordo desses factos, em termos em tudo idêntico e com as mesmas exceções
aos da falta de cumprimento do ónus da impugnação cominado no nº 2 do art. 574º (art. 587º,
nº 1).

Art. 587º, nº 2 CPC.

A réplica deve ser notificada ao réu pelo mandatário do autor nos termos do art. 221º.

Se houver destinado a servir de resposta à contestação, assiste ao réu-reconvinte a faculdade


de alterar o requerimento probatório inicial, no prazo de 10 dias (art. 572º, al. d)).

8. Articulados extraordinários
8.1. Articulados supervenientes
Art. 611º, nº 1 CPC.

Se tais factos forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou


em novo articulado até ao encerramento da discussão.

Quanto à oportunidade para o carreamento para os autos de tais factos, através de articulados
supervenientes, contemplam os arts. 588º e 589º os seguintes momentos processuais
preclusivos:

a) Art. 588º, nº 2, al. a);


b) Art. 588º, nº 2, al. b);
c) Art. 588º, nº 2, al. c).

Há lugar a despacho liminar acerca da admissão do articulado superveniente, o qual será de


rejeição quando, por culpa da parte, for extemporaneamente apresentado, ou quando for
manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou antes da ordenação da
notificação da parte contrária para responder em 10 dias, observando-se, quanto à resposta, o
disposto no art. 587º - art. 588º, nº 4.

41
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Art. 588º, nº 5 e 6.

Art. 589º, nº 1.

8.2. Articulados judicialmente induzidos


Estes articulados e os articulados supervenientes distinguem-se entre si pela circunstancia de:

 Nos articulados supervenientes o respetivo conteúdo sobrevir efetivamente ao


momento da apresentação dos articulados normais;

 Nos articulados judicialmente induzidos o seu conteúdo permanece ab initio


essencialmente o mesmo, apenas sendo superveniente o momento da respetiva
apresentação em juízo.

Art. 590º, nº 3 e 4.

Quando surge a oportunidade para tal


convite?

Logo aquando da apresentação liminar da petição ao abrigo dos arts. 6º; 226º, nº 4 e 590º, nº
1 ou, não tendo sido proferido despacho liminar, no despacho de aperfeiçoamento que tem o
se lugar próprio na fase da gestão inicial do processo e da audiência prévia, em regra, no
despacho pré-saneador (art. 590º, nº 2 a 4); ou, se ai não tiver sido emitido, na audiência
prévia propriamente dita (art. 590º, nº 4).

 No despacho pré-saneador é fixado prazo à parte para a apresentação, por escrito, do


articulado de aperfeiçoamento – art. 590º, nº 4.

 Na audiência prévia o aperfeiçoamento é feito verbalmente e ditada para a ata, sendo


que a audiência prévia é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados em ata o
inicio e o termo dos respetivos atos – art. 155º e art. 591º, nº 4.

Trata-se de articulados que não são apresentados sob impulso da parte, antes resultando de
uma atitude persuasiva expressa do juiz da causa, destinando-se corrigir (articulados
irregulares) ou a complementar (articulados deficientes) os já apresentados.

Se as partes anuírem a um tal convite, diz-se que apresentaram articulados


judicialmente induzidos ou estimulados.

Tudo sem embargo de, quando o articulado-complemento se destinar, de modo exclusivo, ao


aperfeiçoamento do último articulado admitido a resposta se fazer nos termos do art. 3º, nº 3
e 4.

Em qualquer outra hipótese, o prazo para a resposta será de 10 dias (art. 149º, nº
1), contados, se o convite for feito no despacho pré-saneador, da data da respetiva
notificação (art. 149º, nº 2) e, quando feito a audiência prévia da data dessa
apresentação.

42
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

Em qualquer circunstância, haverá que observar o ónus da impugnação, com a consequente


admissão dos factos ex-novo articulados por acordo na ausência da respetiva contradição ou
oposição (art. 572º, al. c), 587º, nº 1 e 2; 588º, nº 4).

8.3. Outros requerimentos de natureza superveniente


Requerimentos avulsos para:

a) A modificação unilateral do pedido, por redução ou ampliação, nos termos do art.


265º, nº 1 e 2;

b) Art. 573º, nº 2;

c) Alteração do pedido ou da causa de pedir por acordo, deduzida em peça conjunta ou


separada – art. 264º;

d) Requerimento para aplicação de sanção pecuniária compulsória ao abrigo do disposto


no art. 829º - A CC (art. 265º, nº 4 e 5; Requerimento de partes destinado a corrigir, de
forma espontânea, os vícios ou deficiências dos articulados a que se reportam os nº 3
a 6 do art. 590º, observados que sejam os balizamentos e limitações legais.

Se a modificação do pedido for operada na audiência final, ficará a constar da respetiva ata,
não sendo, qua tale, objeto de requerimento avulso (art. 265º, nº 3).

Da gestão inicial do processo e da audiência prévia


1. Fase da gestão inicial do processo e da audiência prévia.
Caracterização
Esta face inicia-se com o despacho pré-saneador e respetiva execução pelas partes e pela
secretaria (art. 590º, nº 2 CPC), seguindo-se depois a audiência prévia propriamente dita, a
qual se desdobra em diversos atos com a participação ativa das partes, na estrita observância
dos princípios da cooperação e do contraditório.

A gestão inicial
1.1. Despacho pré-saneador
1.1.1. Oportunidade. Finalidades.
Nas hipóteses em que, por expressa exigência legal ou por determinação do juiz, a petição haja
de ser objeto de despacho liminar, poderá haver lugar a indeferimento liminar da petição
inicial, não só quando o pedido se perfile como manifestamente improcedente, como quando
ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer ex-
officio, com aplicação do preceituado no art. 560º.

Art. 590º, nº 2 CPC.

Excluídos os casos de despacho liminar obrigatório, é este o momento em que o juiz toma pela
primeira vez contacto com o processo.

43
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

1.1.2. Suprimento de exceções dilatórias e/ou sanação da falta de pressupostos


processuais
Cumpre ao juiz providenciar ex-officio pelo suprimento da falta dos pressupostos processuais
suscetíveis de sanação, determinando a prática dos atos necessários à regularização da
instância, ou quando a sanação dependa de ato que deva ser praticado pelas partes,
convidando estas a praticá-los (art. 6º, nº 2, ex-vi da al.a) do nº 2 do art. 590º), isto em ordem
à remoção de todos os obstáculos ao proferimento de uma decisão de mérito.

Regula a lei especificamente a forma de sanação de alguns desses pressupostos:

 Art. 14º;
 Arts. 16º e 17º e 20º a 27º;
 Art. 29º;
 Art. 34º, nº 2;
 Art. 38º;
 Art. 41º;
 Art. 48;
 Arts. 261º a 263º; 278º, nº 1, al. c) e 279º, nº 3.

Sanação a titulo oficioso sucede com a citação do representante do réu (art. 16º a 24º), a
citação do pai preterido do menor do menor (art. 16º, nº 3) ou o chamamento para
intervenção da administração principal da sociedade cuja sucursal, agencia, filial, delegação ou
representação houver sido demandada (art. 14º).

Na generalidade das situações a iniciativa oficiosa terá de ser seguida por um ato de
cooperação da parte do seu representante ou curador do terceiro titular do poder de autorizar
ou consentir, atos complementares esses que podem traduzir-se:

 Ratificação ou de renovação do processado – arts. 17º, nº 2; 24º,nº 2; 27º e 28º;


 Art. 29º, nº 1 e 100º e ss;
 Relativamente à parte: art. 48º.

Casos há em que o juiz se limita a convidar a parte a suprir a determinada regularidade ou a


optar pelo pedido que pretende ver apreciado na ação (art. 38º).

Tudo, sem embargo, de em caso de inércia do juiz, poder a parte vir aos autos, se dentro do
prazo praticar o ato regularizador do pressuposto em falta. E, também sem prejuízo de só na
audiência prévia se tornar evidente a falta de pressuposto e de o juiz apenas detetar a
irregularidade no momento da prolação do despacho saneador, podendo/devendo o juiz,
antes de proferir esse despacho, providenciar pela respetiva sanação (art. 6º e 590º, nº 2 a 4).

1.1.3. Aperfeiçoamento dos articulados


O aperfeiçoamento dos articulados previsto na al. b) do nº 2 e 4 do art. 590º, desdobra-se em
conexão com os nº 2 e 3 do mesmo preceito em três modalidades distintas:

1) Suprimento das irregularidades (vícios formais), traduzidas na carência de requisitos


legais (art. 590º, nº 3);

2) Suprimento da falta de apresentação de algum documento essencial ou de que a lei


faça depender o prosseguimento da causa (art. 590º, nº 3);

44
Direito Processual Civil II – 1ª frequência

3) Suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da


matéria de facto alegada – vícios de susbtanciação (art. 590º, nº 4).

A. Suprimento da falta de requisitos legais (formais)


A petição inicial que não observe os requisitos formais impostos pelas als. a), b) e f) do nº 1 do
art. 552º, ou infrinja requisitos dos atos escritos das partes deve ser preliminarmente recusada
pela secretaria ou, em caso de inércia desta, aquando da distribuição, controlo esse a ser feito
por meios eletrónicos, como prevê o art. 132º do CPC.

Caso esse controlo externo haja sido omitido, deve o juiz da causa, no despacho
pré-saneador, convidar o autor a corrigir a irregularidade entretanto detetada.

Já o controlo formal dos restantes articulados é feito, em última análise, pelo juiz. Deste modo,
desrespeitando o réu as normas do art. 572º, quando não individualize a ação e não exponha
as razoes de facto e de direito por que se opõe à pretensão do autor, cumpre ao juiz verificar,
designadamente, se o réu distinguiu claramente a matéria da impugnação e da exceção,
especificou separadamente as exceções deduzidas (art. 572º, al. c )), identificou e deduziu, de
modo destacado, o pedido reconvencional (art. 583º, nº 2).

É também requisito comum a qualquer outro articulado em sentido técnico a dedução por
artigos (art. 147º, nº 2), formalidade que se, não observada, constitui irregularidade, como tal
podendo dar lugar ao consequente despacho de correção.

No que se refere à formulação do pedido, ainda que a petição inicial seja apta, pode o mesmo
apresentar alguns defeitos pontuais de inteligibilidade, mormente se respeitantes à dedução
de pedidos genéricos ou ilíquidos, caso em que competirá igualmente ao juiz dirigir ao autor
um convite à respetiva concretização.

B. Suprimento da falta de apresentação de algum documento essencial ou de que a


lei faça depender o prosseguimento da causa ou o julgamento imediato de fundo
ou de forma no despacho saneador
São elementos essenciais para a definição dos direitos concretamente pretendidos fazer valer
através da ação, reconvenção ou de mera defesa (art. 590º, nº 2, al. c) e nº 3, 2º segmento):

 Art. 981º;
 Art. 959º, nº 2;
 Art. 220 do CC.

Essenciais para o prosseguimento da causa, dando a sua falta temporária lugar à suspensão da
instancia e, a sua falta definitiva, ao indeferimento liminar ou à absolvição do réu:

 Art. 380º, nº 2;
 Art. 583º, nº 3;

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Direito Processual Civil II – 1ª frequência

C. Suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da


matéria de facto
Art. 590º, nº 4 do CPC.

Insuficiências, se faltarem elementos necessários à completa integração fáctica da causa de


pedir ou da exceção concretamente invocada ou alegada.

Imprecisões, se estiverem em causa afirmações produzidas relativamente a alguns desses


elementos de facto de modo conclusivo ou equivoco.

O despacho de aperfeiçoamento pode ter lugar, quer em face do autor, quer em face do réu,
considerando o conjunto dos articulados por cada um deles apresentado. Constitui um
remédio no sentido da clarificação dos factos alegados por autor ou réu.

O convite de aperfeiçoamento, devendo ser feito pelo juiz, pode ser feito:

 Regra: despacho pré-saneador (art. 590º, nº 3) – é fixado prazo à parte para


apresentação, por escrito, do articulado de aperfeiçoamento;

 Audiência prévia (art. 591º, nº 1, al. c)) – o aperfeiçoamento é feito verbalmente e


ditado para a ata, já que a audiência prévia é sempre gravada;

A este respeito a lei impõe uma condição: o despacho de aperfeiçoamento e o subsequente


articulado da parte deverão conter-se no âmbito da causa de pedir ou exceção invocadas.

(tudo na resposta dos papeis)

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