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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE ANGOLA

FACULDADE DE LETRAS E CIÊNCIAS SOCIAIS

MANUAL DE CIÊNCIA POLÍTICA


E DIREITO CONSTITUCIONAL

Luanda, Fevereiro de 2020


CONSTANTINO CAMPOS FERREIRA MUIMBO

AURIO CRISTÓVÃO MIGUEL

FAUSTINO MARTINHO

ALEXANDRE KAIONGOLO SACALENDE MUATA

Com a Coordenação de:


ASSUNÇÃO BERNARDO
(Professor de Ciência Política e Direito Constitucional do Curso de Direito da
Universidade Técnica de Angola)

MANUAL DE CIÊNCIA POLÍTICA


E DIREITO CONSTITUCIONAL

Luanda, 2020
Reprodução interdita
Qualquer reprodução deste manual, total ou parcial, que não tenha sido previamente
autorizado, pode constituir crime ou infração, puníveis nos termos das legislações aplicáveis.

Os infractores ficarão sujeitos a um processo criminal e a penalidades civis.


No dizer de Augusto Cury, existe dois tipos de sabedoria:
a sabedoria inferior e a sabedoria superior. A sabedoria
inferior é dada pelo quanto uma pessoa sabe e a superior
é dada pelo quanto ela tem consciência de que não sabe.
Por isso dedicamos este manual a todas as pessoas que
reconhecem que nada sabem e por causa disso são
eternos aprendizes na escola da vida.
ESTRUTURA DO MANUAL

Nota Prévia

Preliminares

1. Conceitos
2. Critérios de Distinção entre o Direito Público e o Direito Privado
3. O Método da Ciência Política e do Direito Constitucional
4. Tendências Actuais do Direito Constitucional
5. O Ensino do Direito Constitucional em Angola

Parte I

Capítulo I – Direito Constitucional


1. O Direito Constitucional como Direito Público
2. Teoria e Doutrina do Direito Constitucional
3. O Direito Constitucional como Direito Político
4. Características do Direito Constitucional
Capítulo II – Direito Constitucional e a Constitucional
1. Constitucionalismo
2. A Constituição
Capítulo III – Regimes Políticos e Sistemas Políticos de Governos
1. Nota Preliminar
2. Regimes Políticos
3. Sistema de Governo
Capítulo IV – Teoria Geral do Estado
1. Os Elementos do Estado
2. Formas de Estado
3. Classificação Jurídico-Internacional de Estados
4. Fins e Funções do Estado

Parte II
Capítulo V – Poder Constituinte
1. O Que é o Poder Constituinte?
2. A Origem da Teoria do Poder Constituinte
3. Titularidade do Poder Constituinte
4. Quem é o Titular do Poder Constituinte
5. Formas e Exercício do Poder Constituinte
6. Poder Constituinte Originário e Derivado
7. Limites do Poder Constituinte
Capítulo VI – Revisão Constitucional
1. Modalidades de revisão Constitucional
2. Limites de revisão Constitucional
3. Limites de revisão na Constituição de Angola
4. A História Constitucional de Angola e as Revisões Constitucionais
5. A Constituição da República de Angola de 2010
6. A Constituição da República de Angola de 2010: IIª ou IIIª República?
Capítulo VII – Controlo e Garantia da Constituição
1. Inconstitucionalidade das Leis
2. Fiscalização da Constituição e da Legalidade
3. Recurso de Inconstitucionalidade

Parte III
Capítulo VIII – Direito Humanos e Liberdades Fundamentais
1. Alguns exemplos de Direito Fundamentais
2. Dimensões dos Direitos Humanos
3. Evolução e Constitucionalidade dos Direitos Fundamentais
4. As várias Gerações dos Direitos Fundamentais
5. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH)
6. Direitos e Liberdades fundamentais na Constituição Angolana
7. Meios de Proteção dos Direitos Fundamentais
Capítulo IX – Democracia e Direito Eleitoral
1. O Sufrágio, da democracia directa à democracia representativa
2. Os Sistemas Eleitorais
3. Sistema Eleitoral
4. Partidos Políticos
NOTA PRÉVIA

É, sem dúvida, com um prazer renomado que elaboramos este manual,


isto é, com a coordenação do ilustríssimo professor Assunção Bernardo (actual
regente da cadeira de Ciência Política e Direito Constitucional na Faculdade de
Direito da UTANGA). É também com bastante humildade que dispomos à
comunidade académica e aos amigos do saber e da ciência, este material, que
resulta de um árduo trabalho realizado nos últimos meses. Assim estes
apontamentos têm um objectivo meramente didáctico. Na verdade, a motivação
para elaboração do presente material, surgiu na necessidade de actualizar as
matérias que fazem parte do anterior material utilizado na cadeira de CPDC.
O presente material, por si só, procura expor de forma clara e simples os
conceitos fundamentais sumariados com a devida fundamentação teórico-
doutrinária, expondo o pensamento de grandes autores e doutrinadores
constitucionalistas e politólogos, que actuam, quer no grupo de ciências
jurídicas quer no das ciências Políticas.
Este manual é composto por vários capítulos e tem como principal
propósito, facilitar a compreensão dos alunos durante os estudos exaustivos
desta cadeira extraordinária.
Sem esquecer, queremos exprimir um profundo reconhecimento e
gratidão a todas as pessoas, singulares e colectivas, que, directa e
indirectamente, tomaram possível a feitura desta obra.
Primeiramente, agradecemos a Deus, pois sem ele não teríamos o
folego da vida. Agradecemos também aos nossos pais, pelo apoio que nos têm
dado todos os dias e principalmente o contributo prestado para nossa
formação. A nossa gratidão vai também a Universidade Técnica de Angola
(UTANGA).
Um agradecimento especial dirigimos ao nosso Prof. Doutor Assunção
Bernardo, pelo conhecimento que nos transmitiu sobre está estupenda cadeira
e também pela sua disposição e colaboração para a formação deste manual.
Aos nossos colegas e amigo pela disposição e ajuda prestada que nos
foram muito úteis.
A Todos Muito Obrigado.
Como nunca há trabalhos perfeitos e acabados (e este é um deles), o
aperfeiçoamento de alguns conteúdos deste manual será um trabalho contínuo.

Luanda, Fevereiro de 2020

Constantino Campos Ferreira Muimbo


Aurio Cristóvão Miguel
Faustino Martinho
Alexandre Kaiongolo Sacalende Muata
PRELIMINARES

Antes de debruçarmos, propriamente, sobre as matérias que vislumbram


a Ciência Política e o Direito Constitucional, achamos melhor, dar alguns
subsídios no que toca a alguns conceitos e métodos de estudo dos mesmos,
no sentido de os leitores compreenderem melhor esta estupenda cadeira.

1. Conceitos

 Ciência: o termo ciência vem do Latim scientia que significa


conhecimento. Pode ser definida como “a sistematização de
conhecimentos, ou seja, um conjunto de proposições lógicas
correlacionadas sobre um comportamento de certos fenômenos
que se deseja estudar”1.
 Política: o termo política vem do grego polis, que significa
Cidade-Estado. Entende-se por Política, como “toda actividade
humana do tipo competitivo, que tem como objecto a conquista e
o exercício do poder”2.

Tendo dito isto, podemos definir Ciência politica como o estudo


cientifico da politica, ou seja, enquanto que a politica é uma actividade de
competição, a ciência politica é o estudo desta actividade competitiva.

1
LAKATOS, Eva Maria & MARCONI, Marina de Andrade, Fundamentos de metodologia científica, 2003,
pág. 80
2
AMARAL, Diogo Freitas do, História das Ideias Políticas, 2010, pág. 21

7
K PRELIMINARES

 Direito: Segundo Diogo Freitas do Amaral3:

Direito é o sistema de regra de conduta social, obrigatórias para todo


os membros de uma certa comunidade, a fim de garantir no seu seio,
a justiça, a segurança e os Direitos Humanos, sob a ameaça das
sanções estabelecidas para quem violar tais regras.

Cabe ainda ressalvar, que existem dois ramos do Direito, que são: o
Direito Público e o Direito Privado.

 O Direito Público: é o conjunto de normas jurídicas que


estabelecem a organização e estrutura do Estado e as relações
entre o Estado e o cidadão, e que por sua vez, o Estado intervém
nessas relações com o seu poder de autoridade (ius imperii).
 Direito Privado: é o conjunto de normas jurídicas que regula as
relações jurídicas dos cidadãos entre si, ou entre os cidadãos e o
Estado, e que por sua vez, o Estado actua sem o seu poder de
autoridade (ius imperii), ou seja, actua em pé de igualdade com os
cidadãos.

2. Critérios de Distinção entre o Direito Publico e o Direito


Privado

Existem vários critérios para distinguir o Direito Público do Direito


Privado, dentro os quais, os mais predominantes são:

a) Critério da natureza dos interesses: segundo este critério


integram ao direito público as normas que asseguram a realização
dos interesses próprios da sociedade, ou seja, interesses
colectivos ou públicos. Ao direito privado pertencem as normas
dirigidas à satisfação de interesses que tão-só dizem respeito aos
indivíduos, ou seja, aos interesses privados.

Este critério é susceptível de critica, pois as normas jurídica, quer


públicas ou privadas prosseguem simultaneamente aos interesses público e
privados4.
3
AMARAL, Diogo Freitas do, Manual de Introdução ao Direito, 2004, pág. 148
4
JUSTO, António dos Santos, Introdução ao Direito, 2012, pág. 235 e 236.

8
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Por exemplo: as normas do Direito penal, fazem parte do Direito Público,


pois protegem o interesse da coletividade (interesse público), mas, ao mesmo
tempo, protegem o interesse pessoal (interesse privado) que cada um de nós
tem na conservação da sua vida ou do seu bem. Quando os agentes da
segurança pública, predem um meliante, eles protegem simultaneamente a
vida de cada cidadão (interesse privado) e previnem que a paz e a ordem
pública não sejam perturbadas (interesse público).

b) Critério da qualidade dos sujeitos: neste critério, o direito


público disciplina as relações jurídicas entre o Estado e os demais
entes públicos, já o direito privado regula as relações entre os
particulares, ou seja, um cidadão comum com outro cidadão
comum5.

Este critério também é susceptível de critica, pois, o Estado e as demais


entidades públicas também participam em relações jurídicas de âmbito privado.

Por exemplo: suponhamos que o Estado construiu uma escola, e


necessita de materiais escolares, como: carteiras, quadros, marcadores, etc.,
neste caso, o Estado terá que comprar estes materiais a uma empresa privada,
e nestes termos o Estado, por sua vez, deverá contrair um contrato de compra
e venda, actuando em pé de igualdade com os particulares, deixando de parte
o seu poder de autoridade, e quando isto acontecer, estaremos perante ao
Direito privado. Logo, podemos concluir que as normas do direito privado não
regulam só as relações entre os privados, pois, o Estado ou qualquer ente
público pode muito bem relacionar-se com qualquer ente privado.

c) Critério da posição dos sujeitos: para este critério, pertencem


ao direito público as normas jurídicas que disciplinam as relações
de subordinação, isto é, aquelas que se ocupam da constituição e
da organização do Estado e dos demais entes públicos e regulam
as relações em que Estado intervêm numa posição de
superioridade (como aplicações de multa, coima, cobranças de
imposto, etc.), ou seja, ao Direito público, compreende as normas

5
Ibidem, pág. 237.

9
K PRELIMINARES

que regulam a actividade ou as relações em que participam


sujeitos dotados de prerrogativas de autoridade 6. Ao direito
privado cumpre disciplinar as relações jurídicas em que os
sujeitos (que também pode ser o Estado ou os demais entes
público) se encontram numa posição de igualdade 7, ou seja, é o
conjunto de normas jurídicas que regulam as relações entre os
cidadãos ou entre os cidadãos e o Estado, onde o Estado esteja
despido do seu poder de autoridade (ius imperii).

Dentre todos, este critério é o mais aceitável, pois oferece um


enquadramento mais concreto sobre os dois ramos.

No nosso entender, todos estes critérios, apesar de alguns serem


susptíveis de criticas, servem para compreender a distinção entre o direito
público e o direito privado e para evidenciar o carácter relativo e meramente
tendencial dos mesmos.
 Constituição: é entendida como um documento escrito ou não,
que contém as normas jurídicas que disciplinam todo um Estado.

Juridicamente ainda podemos defini-la, como a lei fundamental e


suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do
Estado, à formação dos poderes públicos, a forma de governo e aquisição do
poder, distribuições de competências, direitos, garantias e deveres dos
cidadãos.

Além disso, é a própria Constituição que individualiza os órgãos


competentes para edição de normas jurídicas, legislativas ou ate mesmo
administrativas.

 Direito Constitucional: é o ramo do Direito Público que se traduz


na ordem jurídica que disciplina a Constituição de um determinado
Estado, isto é, o conjunto de normas jurídica que regulam a

6
MACHADO, Jónatas E.M; COSTA, Paulo Nogueira & HILÁRIO, Esteves Carlos, Direito Constitucional
Angolano. 2.ª ed. 2013, pág. 12.
7
JUSTO, António dos Santos, op. cit., 2012, pág, pág. 238 e 239.

10
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

estrutura do Estado, designando e definindo suas funções,


atribuições e limites de actuação dos órgãos do poder público 8.

3. O Método da Ciência Política e do Direito Constitucional

A Ciência Politica, por estudar meros factos políticos utiliza um método


próprio, pois a Ciência Politica estuda o Estado nas vertentes de poder,
governação e da luta pelo poder, das instituições dos Estados, pelos diferentes
actores político, fá-lo numa perspectiva metódica descritiva e analítica 9, ou
seja, a Ciência Politica analisa e depois descreve os factos políticos que se
emergem mediante uma determinada realidade.

No campo estritamente jurídico, o Direito Constitucional vai noutra


vertente, utilizando o método da ciência jurídica que é o método dogmático
(interpretação e construção, análise e síntese, ou seja, o método dogmático
consiste em induzir para depois deduzir mais tarde, andar do particular para o
geral)10.

Dito de outro modo, o Direito Constitucional orienta-se a partir de uma


perspectiva normativa, ele anda da norma ou do preceito para unidade do
sistema, conferindo um sentido normativo aos fenómenos sociais, determinado
como estes devem ser.

Para o prof. Fernando Macedo:

O método da Ciência do Direito Constitucional tem como escopo


retirar o sentido dos princípios ou normas constitucionais, tendo em
vista a sua aplicação a actos e/ou factos para se saber se os mesmos
estão em harmonia com aquilo que o Direito Constitucional prescreve.
Isto é, saber se o acto e/ou facto praticado ou não praticado é
Constitucional (está de acordo com a Constituição) ou inconstitucional
(está em desacordo com a Constituição/viola a Constituição). 11

Ainda é importante realçar que, o Direito Constitucional tem como


objecto de estudo as Leis Constitucionais, o ordenamento Jurídico
8
CAETANO, Marcelo, Ciência Politica e Direito Constitucional, 1983, pág. 41
9
CAPOCO, Zeferino, Manual de Ciência Politica e Direito Constitucional, 2015, pág. 23
10
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional, Tomo I, 1.ª ed. 2003, pág. 42
11
MACEDO, Fernando, Guia da Aula Teórica/Direito Constitucional, 2013, pág. 20

11
K PRELIMINARES

Constitucional e a própria Constituição, e tem como objectivo, dar resposta


aos problemas de natureza constitucional dentro de uma determinada
sociedade.

Já a Ciência Politica tem como objecto de estudo o próprio politico e


como objectivo, estudar as actividades, os factos e os problemas políticos.

4. Tendências Actuais do Direito Constitucional

Entendemos por tendências actuais do Direito Constitucional, como toda


disposição de uso corrente que auxilia e orienta o modo e a realização
das normas Constitucionais. Dito de outro modo, as tendências actuais são
vários artifícios que o próprio Direito Constitucional utiliza para
salvaguardar os princípios e as normas constitucionais.

As tendências actuais do Direito Constitucional são: A Jurisprudência


Constitucional, o Direito Constitucional Comparado, Acompanhar as novas
leituras dos problemas político-constitucionais e seguir a evolução das
novas técnicas de informação e os riscos que as mesmas envolvem para
os cidadãos.

4.1. Jurisprudência Constitucional

Como Aristóteles afirmava, a lei não prevê tudo, portanto, haverá


sempre casos ou situações que não estarão previstos em qualquer legislação.
Quando isto acontece, estaremos perante as famosas Lacunas da Lei
(situações que lei não se pronuncio).

Segundo o Código Civil vigente, isto é, nos termos do art.º 10, n.1 à n.º
3, quando o julgador estiver perante aos casos que a lei não preveja ou regula,
ele deverá resolve-lo, segundo a norma aplicável aos casos análogos (casos
semelhantes). Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a
norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do
espírito do sistema, ou seja, na falta de uma lei e de um caso análogo (caso
semelhante), o juiz tem a legitimidade de criar uma norma jurídica, para dar
solução a um determinado conflito. Nestes termos é que surge a jurisprudência.

12
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A Jurisprudência corresponde “à orientação que se retira das


decisões judiciais, emanadas dos tribunais da mais alta hierarquia para
resolução de casos semelhantes, submetidos a outros tribunais de igual
ou menor hierarquia”12, ou seja, a jurisprudência consiste no conjunto das
orientações que resulta das decisões uniformes tomadas pelos tribunais na
aplicação das normas jurídicas, isto é, aos casos semelhantes.

Por exemplo: se os tribunais superiores entenderem que situações


idênticas que não estão previstas na lei, devem ser decididas da mesma
maneira, tendo em vista que um grande número de situações semelhantes já
foi solucionado da mesma forma, o tribunal superior atestará solenemente á
todos tribunais de hierarquia igual ou inferior, que resolvam as demais
situações ou casos, de forma uniforme.

Na linha doutrinária de Paulo Nader13, a jurisprudência pode ser:

a) Secundum legis (segundo a Lei): aquela que se limita a interpretar


determinadas regras definidas na ordem jurídica, ou seja, são
aquelas decisões que refletem o verdadeiro sentido das normas
vigentes.
b) Praeter legis (além da lei): é a que se desenvolve na falta de regras
específicas, ou seja, quando a lei for omissa, os juízes deverão
tomam as decisões com base na analogia ou princípios gerais do
Direito.
c) Contra legis (contra lei): são aquelas decisões, tomadas pelos juízes
que contraria o Direito e o espírito da lei. Normalmente estes tipos de
jurisprudências são considerados decisões injustas.

No caso em concreto, a jurisprudência Constitucional, refere-se ao


modo como os tribunais têm resolvido os casos que dizem respeito as
matérias constitucionais. Neste âmbito ganham relevo os Tribunais
Constitucionais, aos quais está associada esta tendência.

12
QUIXITO, Tereza, Apontamento de Sociologia do Direito, 2015, pág. 34
13
NADER, Paulo, Introdução ao Estudo do Direito, 36.ª, 2014, pág. 173

13
K PRELIMINARES

A Jurisprudência Constitucional é considerada uma tendência actual do


Direito Constitucional, porque como salienta o prof. Gomes Canotilho “as
decisões dos Tribunais Constitucionais passaram a considerar-se como um
novo modo de praticar o Direito Constitucional”14 e para que se conheça a
Constituição é necessário conhecer as decisões emanadas nos mesmos.

4.2. Direito Constitucional Comparado

O Direito Constitucional Comparado, consiste em relacionar os direitos


constitucionais nacionais com um direito constitucional internacional.

Embora que o Direito Constitucional varia no tempo e no espaço, este,


mesmo assim, apresenta validades universais, cujo conhecimento pode
contribuir para o avanço da legislação de outras sociedades.

Esta tendência tem como objectivo, comparar normas e princípios


Constitucionais de diferentes Estados, no propósito de revelar as novas
conquistas alcançadas nos mesmos Estados. Contudo, o Direito Constitucional
Comparado, aproveita o estudo e a experiencia jurídica de um Estado para ser
implementado em um outro Estado.

4.3. Acompanhar as Novas Leituras dos Problemas


Político-Constitucionais

No novo contexto mundial tem se visto vários problemas quer do ponto


de vista político, económicos e social. No nosso país, por exemplo, temos
constatados diversos problemas de caracter económico (como a corrupção,
desvios ilícitos do erário público, etc.) e também político (como conflitos dentro
dos partidos políticos e alegações de fraude nas eleições presidenciais).

Nestes casos, o Direito Constitucional deve acompanhar estes


problemas, no sentido de garantir que a paz e a ordem pública não sejam
perturbadas e assegurando que tais problemas não voltem a acontecer.

14
CANOTILHO, J.J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª ed, 2000, pág. 26

14
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

4.4. O Direito Constitucional e as Novas Técnicas de


Informação

Como é sabido, o mundo não é estático, mas sim dinâmico, ou seja, o


mundo evoluir a cada dia que passa e com isso, também vão surgindo novas
técnicas de informação, como por exemplo, a cibernética, a ciência robótica e
as redes socias. Nestes termos, o Direito Constitucional deve acompanhar
estas novas técnicas de informação e saber se as mesmas constituem um risco
para os cidadãos.

O prof. Adérito Correia15, dá exemplos como a inseminação artificial e a


clonagem, novas técnicas de informação que se tem emergidos nos últimos
tempos e que constituir um risco, no que tange, ao bem vida de cada cidadão.
Portanto, o Direito Constitucional deve acompanhar estás técnica, no sentido
de dar resposta do ponto de vista legal, salvaguardando o bem vida e o
interesse de cada cidadão.

Outro exemplo, refere-se a febre da juventude “as redes sociais”. Muitas


vezes nas redes sociais temos constatado, várias ilicitudes como, difamação e
violação das comunicações privadas (invasão da conta de alguém sem o seu
consentimento). Nestes termos, o Direto Constitucional deve dar resposta,
criando normas que regulam estás situações, para prevenir que não se viole o
bom-nome e a privacidade de cada cidadão. Contudo, esta tendência consiste
em acompanhar a dinâmica e a evolução das técnicas de informação, para que
se possa dar resposta no âmbito das normas e princípios constitucionais.

Ver o esquema para melhor compreensão sobre as tendências actuais.

15
CORREIA, Adérito, Lições de Direito Constitucional, 2011, pág. 15

15
K PRELIMINARES

Esquematização das Tendências Actuais do Direito Constitucionais

Refere-se as decisões dos


Jurisprudência Tribunais Constitucionais,
Constitucional que ajudam a conhecer e a
interpretar as Constituições.

Consiste em relacionar o
Direito Direito Constitucional
Constitucional Nacional com o Direito
Comparado Constitucional Internacional,
(de um Estado para outro
Estado).
Tendências actuais do
Direito Constitucional

Consiste no acompanhamento
Acompanhar as novas dos diversos problemas de
leituras dos problemas âmbito político, social e
Políticos-Constitucionais económico, de forma a evitar
conflitos socias.

Consiste em acompanhar as
O Direito novas técnicas de
Constitucional e as informação para assegurar o
Novas Técnicas de bem-estar e a tranquilidade
informação da população.

16
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

5. O Ensino do Direito Constitucional em Angola

O Direito Constitucional em Angola começou a ser ensinado em 1980,


sob influência do modelo alemão, da Alemanha do Leste e do modelo soviético,
apesar de certas influências do modelo francês e português.

Assim, foi ensinado durante uma década na única Faculdade de Direito


existente em Angola (a faculdade de Direito Agostinho Neto), criada apenas em
1979, onde a disciplina era designada por Direito Estatal, o professor Adérito
Correia foi o único regente desta disciplina desde 1980 ao ano de 2000.

A transição de Angola para o regime pluripartidário e para o Estado de


Direito democrático trouxe alterações no estudo e no ensino do Direito
Constitucional. O Ensino do Direito Constitucional foi feito conjuntamente com a
Teoria da Constituição16. Ainda é importante realçar, que actualmente os
programas das disciplinas não são uniformes, por exemplo, na UCAN o Direito
Constitucional não é ensinado conjuntamente com a Ciência Politica enquanto
que na UAN e na UTANGA é.

6. Estudo do Direito Constitucional nalguns países


europeus e nos E.U.A

6.1. Alemanha

Na Alemanha, o Direito Constitucional (verfassungrecht) é designado


como Direito do Estado ou Direito Estatal (Staatsrecht). A utilização da
designação Direito Estatal está ligada à afinidade entre o Direito Constitucional
e o Direito Administrativo, ou seja, na Alemanha estuda-se em conjunto o
Direito Constitucional e o Direito Administrativo, não só na Alemanha mais
também noutros países do mundo jurídico de língua alemã, tais como a Suíça e
a Áustria17.

É importante também realçar que o Staatsrecht se divide em dois: o


Staatsrecht Tradicional ou Clássico e o Staatsrecht actual.

16
Ibidem, pág. 23
17
Ibidem, pág. 16

17
K PRELIMINARES

O Staatsrecht Clássico tinha um âmbito mais vasto que o Direito


Constitucional e que o próprio Staatsrecht actual, pois além das matérias
pertencentes a estas disciplinas, abrangia também assuntos tratados por
outros ramos de Direito, nomeadamente o Direito Administrativo e o Direito
Eclesiástico, tratando igualmente da organização judiciária 18.

A jurisprudência do Tribunal Constitucional tem uma grande importância


no ensino do Direito Constitucional na Alemanha, daí que o “Direito
Constitucional seja um Direito com fortes acentuações judicialistas”, tal como
se passa nos E.U.A19.

6.2. França

Actualmente em França, os Constitucionalistas elaboram o estudo


conjunto do Direito Constitucional com o estudo das Instituições Políticas. Em
França o Direito Constitucional não se mantém nos paramentos normativos, ela
estuda historicidade e os aspectos sociopolíticos do Direito Constitucional.

Os Juristas franceses afirmam que o Direito Constitucional não deveria


manter-se somente nos paramentos normativos, pois, se assim o for, será
incapaz de fornecer um conhecimento crítico-prático da realidade social.

6.3. Portugal

Em Portugal, o ensino do Direito Constitucional, começou a ter


referência a partir da década 70 do século XX, graças a obra de Marcello
Caetano intitulada “Ciência Política e Direito Constitucional”, cuja estrutura se
aproxima dos manuais franceses, nela o autor abarca as matérias relacionadas
a Teoria do Estado, da Ciência Política (instituições política), da teoria da
Constituição, além do estudo normativo da Constituição Portuguesa 20.

As obras de Direito Constitucional com mais influência em Portugal são,


a de J.J. Gomes Canotilho “Direito Constitucional e Teoria da Constitucional”,
nela o autor faz uma perspectiva normativa e teórica do estudo da Constituição
18
Ibidem, pág. 16
19
Ibidem, pág. 17
20
Ibidem, pág. 22

18
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Portuguesa, a obra de Jorge de Miranda, “Direito Constitucional”, em seis


volumes, também o mesmo, publicou uma nova obra subordinada ao tema
“Teoria do Estado e da Constituição”, também é importante realçar a obra de
Marcello Rebelo de Sousa e do prof. Jorge Bacelar Gouveia “Manual de Direito
Constitucional”21.

Em todas estas obras estuda-se a experiência constitucional portuguesa,


a organização do poder, os direitos fundamentais, as fontes do Direito, além da
justiça constitucional.

6.4. Grã-Bretanha

O Direito Constitucional inglês é um direito constitucional pioneiro, que,


apesar disso ou por isso mesmo, nunca pôs de parte a sua tendência
historicista, ou seja, estudar Direito Constitucional na Ingraterra é estudar a
história do Reino Unido. A sua própria Constituição é a sua história 22.

Autores como S. A. De Smith (professor na Universidade de Cambridge),


fazem o estudo conjunto do Direito Constitucional e do Direito Administrativo,
isto resulta, de uma interpretação e sistematização das normas jurídicas
fundamentais da ordem jurídica estatal, está interpretação baseia-se num
pensar dogmático. Assim, Smith, na sua obra “Constitutional and Administrative
Law” apresenta um estudo das normas acerca do governo, do parlamento e
das câmaras, da administração, da justiça, a polícia e finalmente, os direitos e
deveres fundamentais dos cidadãos. Numa segunda parte, ele aborda o Direito
Administrativo e numa terceira parte a Commonwealth 23.

6.5. E.U.A

Nos E.U.A, nas faculdades de Direito é ensinado o “Constitutional Law”


numa perspectiva semelhante à que acabamos de frisar em relação à Grã-
Bretanha. O Direito Constitucional nos E.U.A é, sobretudo, o estudo das

21
Ibidem, pág. 22
22
Ibidem, pág. 21
23
SMITH, S. A, Constitutional and Administrative Law, 3.ª ed. Peguim Books, 1913, apud CORREIRA,
Adérito, op. cit., 2011, pág. 20

19
K PRELIMINARES

decisões do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, na interpretação da


Constituição Federal Americana24.

O Direito Constitucional nos E.U.A é mais um direito constitucional


jurisprudencial que dedica grande importância à interpretação e a aplicação da
lei pelos tribunais e à função de fiscalização da constitucionalidade das leis por
eles exercida25.

Depois deste estupendo prelúdio, já nos sentimos capaz de debruçar,


contundentemente, sobre os conteúdos que compõem a Ciência Politica e o
Direito Constitucional.

24
E. Allem Farnsworth, Introdução ao sistema Jurídico dos Estados Unidos, pág. 182, apud CORREIRA,
Adérito, op. cit., 2011, pág. 21
25
CORREIRA, Adérito, op.cit., 2011, pág. 21

20
CAPÍTULO I

DIREITO CONSTITUCIONAL
Como anteriormente já se referiu, Direito Constitucional “consiste no
conjunto de princípios e de normas que regulam a organização, o
funcionamento e os limites do poder do Estado, assim como estabelecem os
direitos das pessoas à respectiva comunidade política” 26

1. O Direito Constitucional como Direito Público

Tradicionalmente diz-se que o Direito Constitucional pertence,


juntamente, com os outros ramos de Direito Público nomeadamente: Direito
Internacional, Direito Administrativo, Direito Penal ou Criminal, Direito Fiscal,
Direito Processual, Direito de mera Ordenação Social, etc.

Para além do Direito Constitucional ser um ramo do Direito público é


também um Direito Interno por oposição ao Direito Internacional, quer isso
dizer que o Direito constitucional estabelece e dá unidade à ordem jurídica
interna, no caso presente a ordem jurídica angolana.

Como o Direito Público, o Direito Constitucional é:

26
GOVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Constitucional, 2005, pág.29.
21
DIREITO CONSTITUCIONAL

a) Direito coactivo, isto é, o Direito Constitucional é obrigatório,


actua contra a vontade do cidadão, este Direito não admoesta,
ele impõe e proíbe.
b) Determina a competência dos poderes públicos, isto é, ele dita
quais são os poderes e os deveres dos órgãos do poder politico;
c) Estabelece os princípios constitucionais que limitam as
actividades dos poderes públicos;
d) Estabelece os mecanismos de controlo jurisdicional, ou seja, ele
ditar quais serão os órgãos que vão fiscalizar a Constituição,
como por exemplo: o Tribunal Constitucional.

Apesar do Direito Constitucional ser um ramo do Direito Público, é


necessário também ter em conta, que a Constituição, contém na verdade, uma
“força geradora de direito privado” 27, ou seja, as normas constitucionais se
aplicam à actividade privada e por sua vez, são criadoras de Direito Privado,
como por exemplo: o Direito do Trabalhado (art.º 76.º da CRA), Direitos
Autorais (art.º 42.º, n.º 2 da CRA) e o Direito da Família (art.º 35.º da CRA).

OBS: enquanto que o Direito Público é coactivo o Direito Privado é flexível,


porque, no Direito Privado predomina a vontade dos particulares e no Direito
Público predomina a vontade do Estado.

2. Teoria e Doutrina do Direito Constitucional

Na visão do prof. Adérito Correia, Teoria do Direito Constitucional


refere-se aos conceitos de Direito Constitucional, que são coletados a partir de
determinadas teorias, sem referência a uma ordem constitucional concreta 28.

Dito do outro modo, a teoria do direito constitucional consiste no estudo


de diversos conceitos constitucionais a partir de ideias ou estudos já
realizados, sem se comprovar se os mesmos condizem com a realidade
constitucional.

Quanto a Doutrina do Direito Constitucional, é o estudo de uma


realidade constitucional concreta (por exemplo a realidade angolana) 29, ou seja,
27
PINTO, Carlos Motta, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª ed. 1999, pág.72
28
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 32
29
Ibidem, pág. 32

22
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

são aqueles estudos que resultam e condizem com uma determinada realidade
constitucional

Por exemplo: se um individuo criar conceitos sobre o Direito Constitucional


a partir de manuais ou teorias de Direito Constitucional, estaremos perante a
uma Teoria do Direito Constitucional, pois, não podemos comprovar se estes
conceitos criados pelo individuo condizem com a realidade.

E se por ventura, o individuo criar conceitos de Direito Constitucional a


partir de estudos, que não se basearam em manuais ou teorias de alguns
autores, mas sim que resultaram da vivência e realidade Constitucional de um
determinado país, estaremos perante a uma Doutrina do Direito
Constitucional, pois os seus conceitos resultaram da realidade Constitucional.

3. O Direito Constitucional como Direito Político

O Direito Político é o conjunto de normas que se reportam directa e


imediatamente ao Estado, constituindo o estatuto jurídico do Estado exprimindo
um particular enlace da instância política e da instância jurídica das relações
entre os homens30, ou seja, o Direito Político, é constituído por normas, que
regulam á organização do Estado e a limitação jurídica do poder político.

A relação entre o Direito Constitucional e o Direito Político deriva do


facto de que o Estado enquanto poder político é objecto do Direito
Constitucional, ou seja, o Estado é composto por órgãos políticos, estes é que
governam e o administram em nome do povo, logo será objecto do Direito
Constitucional, porque o Direito Constitucional é que vai traçar a estrutura e os
limites destes mesmos órgãos.

O Poder Politico enquanto objecto do Direito Constitucional, traça 31:

1. Os princípios fundamentais e estruturante do Estado, como por


exemplo, o princípio democrático (art.º 2.º da CRA), princípio
republicano (art.º 1.º da CRA), princípio da separação dos poderes

30
MIRANDA, Jorge, op. cit., 2003, pág. 12
31
Ibidem, pág. 33

23
DIREITO CONSTITUCIONAL

(art.º 105.º nº 4 da CRA), princípio da laicidade (art.º 11.º da CRA),


etc.;
2. A forma e a estrutura do Estado, como por exemplo, Estado unitário
(art.º 8.º da CRA) e a forma e estrutura do governo (regime político
parlamentar, semiparlamentar e presidencial), etc.;
3. A competência e as atribuições constitucionais dos órgãos de
direcção política (Presidente da República, art.º 119.º e 120.º, da
Assembleia Nacional, art.º 160.º e ss, CRA, etc.)

Cabe ainda dizer, que a Constituição é o estatuto jurídico do Estado e do


politico, porque dita as diretrizes do Estado e o comportamento que o politico
deve adoptar em determinadas circunstâncias.

4. Características do Direito Constitucional

De acordo com o prof. Bornito de Sousa o Direito Constitucional tem


como características32:

1- Posição hierárquico normativa superior: o Direito Constitucional


goza de uma posição hierárquico normativa superior, pelo simples
facto de estar acima de todas as Leis de um determinado Estado
“Lex Superior”. Esta posição caracteriza-se em três perspectivas:

a) Autoprimazia normativa: enquanto que os demais ramos de direito


buscam fundamento de validade na Constituição, as normas do
Direito Constitucional encontram fundamento de validade em si
próprias.

Por exemplo: para criação das normas do Direito Penal, deve-se olhar
para o que a Constituição diz, ou seja, a Constituição nos termos do art.º 59º
diz claramente que é proibido a pena de morte, e consequentemente as
normas do Direito Penal não podem legalizar a pena de morte, sob pena
destas normas serem inválida, porque toda e qualquer norma abaixo da
Constituição só é válida se estiver de acordo com a Constituição.

32
SOUSA, Bornito de, Apontamentos de Ciência Política e Direito Constitucional, 2008, pág. 11.

24
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Já Constituição, não precisa estar de acordo com nenhuma outra lei


abaixo dela, porque só pelo facto de ser a lei suprema, ela encontra validade
em si mesma.

b) Fonte Primária de todo o direito positivo e normas de normas


(normae normarum): as normas do Direito Constitucional são as
fontes de produção jurídica das outras normas a baixo da
Constituição (normas Infraconstitucionais), pelo facto dela dar origem
a todas normas infraconstitucionais. O Direito Constitucional também
é normas de normas, porque dela surgem outras normas. Por
exemplo: as normas do Direito Penal, do Direito do Trabalho, do
Direito da Família, etc.

c) - Princípio da Conformidade: todas as normas infraconstitucionais


e actos do poder político devem estar em conformidade com a
Constituição (art.º 226.º da CRA, sob pena de serem considerados
inexistentes, nulas, anulas, ineficaz ou até mesmo inconstitucionais.

2- Supra ordenamento: O Direito Constitucional é um supra


ordenamento que confere unidade a todo o ordenamento jurídico
(todas as leis de um determinado Estado) e estabelece a hierarquia
entre as demais normas;
3- Procedimento específico de criação das normas de Direito
Constitucional: o Direito Constitucional distingue-se também dos
demais ramos do Direito pela forma e procedimento de criação das
suas normas. As normas constitucionais emanam de um Poder
Constituinte originário ou derivado, de acordo com um processo
específico de criação. Só se pode falar em Direito Constitucional
Formal se as normas tiverem sido criadas por um Poder Constituinte
originário ou derivado;
4- Controlo Jurisdicional: as normas do Direito Constitucional estão
sujeitas a controlo jurisdicional, isto é, são controladas por todos os

25
DIREITO CONSTITUCIONAL

tribunais, quer nos Tribunais Comuns, no Tribunal Constitucional, nos


Tribunais ou Secções Administrativas, no Tribunal de Conta, etc.

Cabe ainda salientar que o Direito Constitucional, no novo contexto


mundial, tem apresentado novas características, a saber 33:

1.ª Supremacia: caracteriza o Direito Constitucional pela posição


suprema que ocupa na ordem jurídica. Esta posição afigura-se de topo,
colocando-se num lugar hierarquicamente superior aos demais ramos de
direitos;

2.ª Transversalidade: o Direito Constitucional considera-se transversal


numa perspectiva material, mediante o carácter transversal das matérias que o
atravessam. É do âmbito do Direito Constitucional definir as grandes linhas do
Estado enquanto comunidade, abrangendo assim diversos temas relevantes da
vida colectiva;

3.ª Politicidade: é característica do Direito Constitucional por este ser


um Direito Político, tendo como objecto de estudo e a ordem o poder politico,
ou seja, Direito Constitucional estuda o poder político, nomeadamente o politico
em si.

4.ª Estadualidade: o Direito Constitucional é um Direito Estatual por


excelência. Ele dita todos os modos procedimentais do Estado-poder na sua
relação com o Estado-comunidade dos cidadãos, estabelecendo limites na
actuação daquele e garantido defesa dos direitos desta última face àquele
poder;

5.ª Legalismo: caracteriza o Direito Constitucional por o assentar “numa


visão de cunho legalista”34, pelo seu caracter de constituir quer como fonte de
normas, quer como disciplinador do poder politico, ou seja, o Direito
Constitucional tem como finalidade, regular o poder politico, os direitos,
liberdades e garantias do cidadão por via da lei.

6.ª Fragmentarismo: o Direito Constitucional é fragmentário, ou seja,


não regula todas as matérias jurídicas e se o fizer não o fará por completo.

33
Gouveia, Jorge Bacelar, Manual, op. cit., 2005, pág. 39 a 45.
34
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 40.

26
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

7.ª Juventude: o Direito Constitucional actual é um ramo do Direito


novo, nascido graças a Revolução Americana e Francesa do século XVIII.

8.ª Abertura: o Direito Constitucional “é aberto aos influxos de outros


ramos normativos, estado muito longe de ser um sistema normativo fechado” 35.

5. As Ciências afins e auxiliares do Direito Constitucional

A titulo de introito cabe salientar que o Direito não caminha só, com isto
queremos dizer, que o Direito não é independente, necessita de outras ciências
para que elas o possam dar suporte e auxilio.

Ciências afins, são todas aquelas que tratam ou estudam o mesmo


objecto que o Direito Constitucional, e as Ciências auxiliares, são as que
tendo um objecto de estudo diverso, fornecem, no entanto, subsídios
indispensáveis à tarefa de uma terceira, no caso ao Direito Constitucional. 36

Entre as ciências afins, destacam-se:

Ciência Política: é aquela que estuda o fenómeno político como um


mero facto, estudo os comportamentos das instituições e os respectivos
titulares, o sistema dos partidos, o sistema eleitoral, o sistema de governo e o
regime político;

Teoria Geral do Estado: estuda os elementos e as características do


Estado enquanto realidade conceptual;

Sociologia Política: estuda as relações de poder entre o Estado e a


sociedade;

História das Ideias Políticas: estuda o pensamento de vários


pensadores sobre o poder político;

Histórias Política: estuda as causas e consequências de


acontecimentos político;

35
MACEDO, Fernando, op. cit., 2013, pág. 40
36
GOUVEIA, Jorge Bacelar, op. cit., 2005, pág. 64-71

27
DIREITO CONSTITUCIONAL

Filosofia Político: estuda os limites dos direitos das pessoas e os


limites do Poder Público.

Entre as ciências auxiliares, destacam-se:

Estatística e a Matemática: estas ciências contribuem no campo dos


sistemas eleitorais.

Sociologia: ela oferece elementos auxiliares preciosos quanto à


adequação social e os motivos pelas quais surgem certos comportamentos
indecorosos.

Economia: esta disciplina dá as bases para as opções económicas que


os textos constitucionais deveram seguir para a organização do sistema
económico do Estado.

História: esta disciplina ajuda a justificar os acontecimentos


constitucionais, baseados na explicação do percurso dos povos, nas suas
múltiplas formas de organização, os acontecimentos económicos, sociais,
religiosos e também elementos directamente políticos.

Geografia e a Astrofísica: relativamente estas ciências contribuem


para o direito constitucional, delimitando os espaços estaduais, bem como o
aproveitamento que tais espaços proporcionam.

Sem o contributo destas ciências dificilmente seria possível conhecer


certos conceitos jurídico-constitucionais, que só fazem sentido recorrendo à
sua ajuda.

Como vislumbra Adérito Correia, o Jurista não pode ser indiferente ou


neutral ao conhecimento37, ou seja, o jurista deve ser aberto e não se limitar
apenas a Ciência do Direito, deve conhecer e intender, ainda que não for de
forma absoluta, outras áreas do conhecimento. O Jurista não é obrigado a
saber tudo, mas é obrigado a saber o necessário.

37
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 37.

28
CAPÍTULO II

DIREITO CONSTITUCIONAL E A
CONSTITUIÇÂO

1. Constitucionalismo
1.1. Conceito

Para Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:

Constitucionalismo, é o movimento político, jurídico e ideológico


que concebeu ou aperfeiçoou a ideia de estruturação racional do
Estado e de limitação do exercício de seu poder, concretizada
pela elaboração de um documento escrito destinado a
representar sua lei fundamental e suprema . 38

Dito de outro modo, chama-se Constitucionalismo a várias


manifestações políticas, sociais e culturais que tinham como fundamento
partilhar e limitar o poder, bem como estatuir as garantias e os direitos de cada
cidadão.

Do ponto de vista histórico, o Constitucionalismo esta dividido em duais


partes, que são: constitucionalismo antigo e constitucionalismo moderno.
38
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, Direito Constitucional Descomplicado, 14ª. ed, 2015, pág. 1
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

1.2. Constitucionalismo Antigo

Desde a Antiguidade a Constituição teve como objecto o ordenamento


geral das relações sociais e políticas. Neste âmbito as doutrinas constitucionais
mais importantes são as hebraicas e as gregas.

Analisando a Antiguidade clássica, Karl Loewenstein 39 identificou, entre


os hebreus, timidamente, o surgimento do Constitucionalismo, estabelecendo-
se no Estado teocrático limitações ao poder político, isto é, ao assegurar aos
profetas a legitimidade para fiscalizar os actos governamentais que
extrapolassem os limites bíblicos.

Outras ideias que encontraram expressão institucional no Estado


moderno remontam à Grécia e a Roma, tratando-se mesmo de axiomas da
moderna ideia ocidental de Estado. Um desses axiomas é a das diversas
classes sociais, institucionais (órgão) de que emana o poder político, de modo
a poderem participar globalmente no exercício do mesmo.

É neste axioma que se insere, ou é dele que deriva, a teoria da


Constituição mista, que tem por base a ideia de equilíbrio de forças diversas,
ou seja, é aquela Constituição que salvaguarda tanto os interesses dos ricos
quanto os interesses dos pobres. O conceito de Constituição mista remonta o
Platão, tendo sido desenvolvido pelo seu discípulo Aristóteles, a propósito das
formas de governo, enquanto “modos do poder supremo do Estado”.

Para Aristóteles a Constituição mista é a melhor constituição porque só


ela tem em conta, ao mesmo tempo, os ricos e os pobres. Para ele, os ricos e
os pobres deveriam ter acesso partidário ao exercício do poder político 40.

Deferente de Aristóteles, o filosofo grego Políbio, afirma que a questão


fundamental não é a de dar poderes a todas as classes, mas sim o equilíbrio
do poder, devendo existir uma contraposição de poderes 41.

Dito de outro modo, para Políbio, o importante não é distribuir o poder


em todas as classes, mas sim equilibrar o poder, existindo separação de

39
LOEWENSTEIN, Karl, Teoria de la Constitución, 2. ed, 1970, pág. 154
40
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 50
41
Ibidem, pág. 51

30
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

poderes, evitando a concentração de poderes e mais importante seria a


transposição do poder, ou seja, a alternação do poder de uma mão para outra.

Pouco tempo depois Aristóteles desenvolve outra teoria, enquadrando o


conceito de Constituição média, advogando que o meio termo é bom em tudo,
e, assim a melhor sociedade é a que for composta pelo maior número possível
de membros semelhantes ou iguais. Assim, a Constituição média ou governo
médio, tal como o conceito de Constituição mista abarcam a mesma realidade:
a de equilíbrio entre as classes sociais42.

Só nos resta concluir afirmando que a Constituição mista atende mais às


desigualdades, a Constituição média atende sobretudo ao equilíbrio entre
classes como um processo de integração numa grande classe média.

A Constituição média, encara o equilíbrio como um processo de


atenuação das diferenças sociais entre as classes, com vista ao equilíbrio
global do sistema.

Cabe também sublinhar, que os antigos, contudo, não tinham ideia da


Constituição como norma chamada a separar os poderes e a garantir os
direitos. A Constituição era um ideal ético e político a perseguir. Na era antiga,
a Constituição foi mais um projecto de reconciliação social e política, sobretudo
em épocas de crise.

1.3. Constitucionalismo Moderno

O constitucionalismo moderno desenvolveu-se com a superação do


modelo político e institucional da Cristandade medieval, assente nos valores de
autoridade, hierarquia e estratificação social, e do Estado Absoluto, edificado
em torno da personalidade centralizadora do Monarca e sobre o direito divino.
A Magna Carta de 1215 representa o grande marco do constitucionalismo
medieval, estabelecendo, mesmo que formalmente, a proteção a importantes
direitos individuais43.

42
Cfr. Ibidem, 51
43
A Magna carta de 1215 e a Petition of Rigts de 1628 são pactos firmados durante a história
constitucional inglesa, ou seja, são convenções entre o monarca e os súditos concernentes ao modo de
governo e às garantias dos direitos individuais.

31
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

O Constitucionalismo moderno é um fenómeno complexo, com refrações


políticas, filosóficas, culturais e ético-religiosas, cuja compreensão escapa a
qualquer reducionismo. Ele subentende uma luta ideológica de afirmação de
concepção liberal de poder político que procura novas bases de legitimação 44.

Cabe também sublinhar que o Estado constitucional é concebido pelo


liberalismo político como instrumento de separação das concepções medievais
e absolutistas do poder, mediante a afirmação da soberania popular, da
igualdade originária de todos os indivíduos, dos direitos naturais e inalienáveis
e da limitação e separação dos poderes estaduais 45.

O constitucionalismo moderno tem como elemento caracterizador a luta


pela limitação do poder político, graças a diversos acordos celebrados na Idade
Moderna, como: o Petition of Rights, de 1628; o Habeas Corpus Act, de 1679; o
Bill of Rights, de 1689; e o Act of Settlement, de 1701.

Todavia, a luta pela limitação do poder político teve que ser travada com
persistência teorética e político-institucional. Isto, porque as ideias que
apontavam para a centralização e o reforço do poder político tinham uma longa
tradição. Além disso, a experiência das guerras civis religiosas constituía, para
muitos, um forte argumento no sentido do fortalecimento da autoridade do
Monarca.

O reforço do poder do Monarca foi conseguido, nos sécs. XVI a XVIII,


com bases em argumentos desenvolvidos a partir das ideias de soberania
absoluta, direito divino, razão de Estado, Estado patrimonial e concepção
personalista do Estado.

O conceito de “soberania absoluta” foi desenvolvido por Jean Bodin, nos


seus Seis livros da República, 1576, e por Thomas Hobbes, na sua obra
Leviathan, 1651. Ambos sofriam daquilo que George Haverkate designa por
“síndrome da guerra civil”, na medida em que, tendo vivido no meio de guerras

44
Udo Di Fabio, da Recht offener Staaten, Tubingen, 1998, 27 ss. apud, MACHADO Jónatas; COSTA, Paulo
e HILÁRIO, Esteves, op. cit., 2013, pág 17.
45
Di Fabio, Das Recht offener Staaten…, cit. 16 ss. E 38 ss apud MACHADO Jónatas; COSTA, Paulo e
HILÁRIO, Esteves, op. cit., 2013, pág. 18

32
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

civis religiosas, um e outro surgem em boa medida como defensores do reforço


da autoridade do Estado46.

É neste contexto que que surge a noção de soberania absoluta,


proposta por Jean Bodin, definida como “summa in cives ac subtidos
legibusque soluta potestas”47. Todavia para Bodin, o reforço da autoridade do
Monarca passava pela consideração das forças sociais intermédias, essencial
para o reforço do poder48.

Para Thomas Hobbes, o poder político era legitimado através do


contrato social e já não do direito divino. O Estado surgia como um antídoto a
uma inicial de estado de natureza, caracterizada pela guerra de todos contra
todos (bellum omninum contra omnes). A força estadual, quer se esteja diante
de um monarca ou de um parlamento, reside no facto de que o mesmo é o
único depositário dos direitos que os indivíduos para ele transferem através do
contrato social.

Note-se, todavia, que para Thomas Hobbes, o reforço do poder político


não passava necessariamente pelo Monarca, na medida em que, em seu
entender, os direitos individuais poderiam ser transferidos para uma
assembleia.

Uma outra linha de reforço do poder absoluto dos monarcas encontra-se


na ideia de “Razão de Estado”, de que ainda hoje se encontram ressonâncias.
Quer se tenha em vista a conquista e a manutenção do poder, a proteção dos
interesses superiores da segurança e da independência do Estado, a
promoção de uma concepção divina do poder político, ou mesmo, como se
sustentou mais recentemente, a nocção de que o Estado é uma manifestação
objectiva do Espirito absoluto, a verdade é que a ideia de razão de Estado
pode facilmente conduzir à ideia de que os fins justificam os meios.

1.3.1. Limitação do Poder Político

46
Haverkate 1993, pp 48 apud MACHADO Jónatas; COSTA, Paulo e HILÁRIO, Esteves, op. cit., 2013, pág. 19
47
Bodin 1609, pág. 123 apud MACHADO Jónatas; COSTA, Paulo e HILÁRIO, Esteves, op. cit., 2013, pág. 19
48
Holmes, Passions and Constraint…, cit., 100 ss., 109 ss. e 120 ss., apud, M ACHADO Jónatas; COSTA,
Paulo e HILÁRIO, Esteves, op. cit., 2013, pág. 19

33
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

A limitação do poder político advém do movimento constitucional e


concomitantemente está na génese da Constituição, localizado no tempo e em
espaços geográficos e culturais diferenciados. Em verdade não há um
constitucionalismo, mas vários constitucionalismos. Quando falamos em
constitucionalismo: a ideia de que os governos devem ser limitados, o poder
deve ser limitado, com vista ás garantias dos direitos dos cidadãos.

Para o constitucionalismo, o Estado só é um Estado constitucional,


desde que o poder esteja distribuído por vários órgãos e os direitos
fundamentais. É o que expressamente traduz o art.º 16.º da declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão: “Qualquer sociedade em que não esteja
assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes
não têm Constituição”.

Trata-se de uma teoria, ou mesmo, de uma ideologia, que se funda no


princípio do governo limitado. O constitucionalismo implica, assim, um juízo de
valor, uma valoração das actividades dos governos. O constitucionalismo vai,
assim, fazer uma teoria normativa do poder, e uma teoria normativa da
democracia49.

Este é o constitucionalismo moderno, distinto do constitucionalismo


antigo, que foi prática até ao século XVIII, antes do surgimento das
constituições escritas.

O constitucionalismo moderno deu origem à Constituição moderna.


Várias doutrinas asserção que as constituições escritas como instrumentos
para conter qualquer arbítrio decorrente do poder advieram de dois marcos
históricos e formais do constitucionalismo moderno: a Constituição norte-
americana de 1787 e a francesa de 1791 (que teve como preâmbulo a
Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789),
movimento este deflagrado durante o Iluminismo e concretizado como uma
contraposição ao absolutismo reinante, por meio do qual se elegeu o povo
como o titular legítimo do poder.

A Constituição visa a salvaguarda da liberdade e dos direitos dos


cidadãos. Mas a Constituição é igualmente o exercício mais elevado da
49
CANOTILHO, J.J. Gomes, op. cit., 2000, Pág. 51

34
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

soberania, seja ela do povo ou da Nação, o acto pelo qual os cidadãos


escolhem o tipo de organização que os vai governar e que se vinculam, mas
que igualmente vincula os governantes50.

2. A Constituição

Podemos definir Estado, de forma genérica e simplificada, como


organização de um povo sobre um território determinado, dotada de soberania
e que se rege no paramento de uma Constituição.

Todo Estado, conforme acima conceituado, tem uma Constituição, em


sentido amplo. Nessa acepção ampla, ou sociológica, a Constituição é
simplesmente a forma de organização do Estado. Trata-se de um conceito
fático, que depende da existência de um texto escrito, ou mesmo normas,
escritas ou não, referentes a essa organização; usualmente é emprega para
descrevê-lo, a expressão "Constituição material do Estado".

A Constituição, objeto de estudo do Direito Constitucional, deve ser


entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que rege a sua
organização político-jurídica51.

As normas de uma Constituição devem dispor acerca da forma do


Estado, dos órgãos que integram a sua estrutura, ·das competências desses
órgãos, da aquisição do poder e de seu exercício. Além disso, devem
estabelecer as limitações ao poder do Estado, especialmente mediante a
separação dos poderes (sistema de freios e contrapesos) e a enumeração de
direitos e garantias fundamentais52.

O constitucionalista J. J. Gomes Canotilho, cunhou a expressão


"Constituição ideal", reiteradamente citada pelos autores pátrios. Os elementos
caracterizadores desse conceito de ''Constituição ideal", de inspiração liberal,
são os seguintes53:

a) a Constituição deve ser escrita;


50
CANOTILHO, J.J. Gomes., ob. cit., 5ª ed., pag. 52
51
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 4
52
Ibidem, pág. 5
53
Cfr. Ibidem, pág. 5

35
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

b) deve conter uma enumeração de direitos fundamentais individuais


(direitos de liberdade);

c) deve adotar um sistema democrático formal (participação do "povo"


na elaboração dos atos legislativos, pelos parlamentos);

d) deve assegurar a limitação do poder do Estado mediante o princípio


da divisão de poderes.

Conforme antes referido, as normas de uma Constituição, no Estado


liberal, devem restringir-se a determinar a estrutura do Estado, o modo de
exercício e transmissão do poder e a reconhecer direitos fundamentais de
liberdade aos indivíduos.

2.1. Sentido do Termo Constituição

Existem várias tipologias para definir o termo “Constituição”, a saber:


Constituição em sentido sociológico, Constituição em sentido político e
Constituição em sentido jurídico.

2.1.1. Constituição em Sentido Sociológico

Na visão sociológica, a Constituição é concebida como fato social, e


não propriamente como norma. O texto positivo da Constituição seria resultado
da realidade social do País, das forças sociais que imperam na sociedade, em
determinada conjuntura histórica. Caberia à Constituição escrita, tão somente,
reunir e sistematizar esses valores sociais num documento formal, documento
este que só teria eficácia se correspondesse aos valores presentes na
sociedade54.

Ferdinand Lassalle, em seu livro Qué es una Constitucíon? defendeu


que uma Constituição só seria legitima se representasse o efetivo poder social,
refletindo as forças sociais que constituem o poder, ou seja, as Constituições
devem estar de acordo com a realidade social. Caso isso não acorresse, ela
seria ilegítima, caracterizando-se como uma simples folha de papel. 55

2.1.2. Constituição em Sentido Político


54
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 6
55
LENZA, Pedro, Direito Constitucional Esquematizado, 23ª ed, 2019, pág. 142

36
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A concepção política de Constituição foi desenvolvida por Carl Schmitt,


para o qual a Constituição é uma decisão política fundamental, ou seja, a
decisão política do titular do poder constituinte 56.

A Constituição surge, portanto, a partir de um ato constituinte, fruto de


uma vontade política fundamental de produzir uma decisão eficaz sobre modo
e forma de existência política de um Estado.

Nessa concepção política, Schmitt estabeleceu uma distinção entre


Constituição e leis constitucionais: a Constituição disporia somente sobre as
matérias de grande relevância jurídica, sobre as decisões políticas
fundamentais (organização do Estado, princípio democrático e direitos
fundamentais, entre outras); as demais normas integrantes do texto da
Constituição seriam, tão somente, leis constitucionais 57.

2.1.3. Constituição em Sentido Jurídico

Em sentido jurídico, a Constituição é compreendida de uma perspectiva


estritamente formal, apresentando-se como pura norma jurídica, como norma
fundamental do Estado e da vida jurídica de um país, paradigma de validade de
todo o ordenamento jurídico e instituidora da estrutura primacial desse Estado.
Ou seja, a Constituição consiste, pois, num sistema de normas jurídicas 58.

O pensador mais associado à visão jurídica de Constituição é o


austríaco Hans Kelsen, que desenvolveu a denominada Teoria Pura do Direito.
Para Kelsen, a Constituição é considerada como norma, e norma pura, como
puro dever-ser, sem qualquer consideração de cunho sociológico, político ou
filosófico59.

Embora reconheça a relevância dos fatores sociais numa dada


sociedade, Kelsen sempre defendeu que seu estudo não compete ao jurista
como tal, mas ao sociólogo e ao filósofo. Segundo a visão de Hans Kelsen, a
validade de uma norma jurídica positivada é completamente independente de
sua aceitação pelo sistema de valores sociais vigentes em uma comunidade,
56
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 6
57
Ibidem, pág. 7
58
Ibidem, pág. 7
59
LENZA, Pedro, op. cit., pág. 144

37
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

tampouco guarda relação com a ordem moral, pelo que não existiria a
obrigatoriedade de o Direito coadunar-se aos ditames desta (moral) 60.

A ciência do Direito não tem a função de promover a legitimação do


ordenamento jurídico com base nos valores sociais existentes, devendo
unicamente conhecê-lo e descrevê-lo de forma genérica, hipotética e abstrata.
Esta era a essência de sua teoria pura do direito: desvincular a ciência jurídica
de valores morais, políticos, sociais ou filosóficos. Kelsen desenvolveu dois
sentidos para a palavra Constituição61:

a) sentido lógico-jurídico, situa-se em nível do suposto ou do


hipotético;
b) sentido jurídico-positivo, trata-se de uma norma posta ou criada.

Em sentido lógico-jurídico, Constituição significa a norma fundamental


hipotética, cuja função é servir de fundamento lógico transcendental da
validade da Constituição em sentido jurídico-positivo 62.

Essa norma fundamental hipotética, fundamento da Constituição


positiva, não possui um enunciado explícito; o seu conteúdo pode traduzir-se,
em linhas gerais, no seguinte comando, a todos dirigidos: "conduzam-se
conforme determinado pelo autor da Constituição positiva"; ou, de forma mais
simples, "obedeçam à Constituição positiva". Para Kelsen, a norma jurídica não
deriva da realidade social, política ou filosófica, mas sim de uma norma
suposta.

O fundamento de validade das normas não está na realidade social do


Estado, mas sim na relação de hierarquia existente entre elas. Uma norma
inferior tem fundamento na norma superior, e esta tem fundamento na
Constituição positiva. Esta, por sua vez, se apoia na norma fundamental
hipotética, que não é uma norma positiva (posta), mas uma norma imaginada,
pressuposta, pensada.

Em sentido jurídico-positivo, Constituição corresponde à norma


positiva suprema, conjunto de normas que regulam a criação de outras normas,

60
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 7
61
Ibidem, pág. 7
62
Cfr. Ibidem, pág. 7

38
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

lei nacional no seu mais alto grau. Ou, ainda, corresponde a certo documento
solene que contém um conjunto de normas jurídicas que somente podem ser
alteradas observando-se certas prescrições especiais.63

Destas duas concepções de Constituição criadas por Kelsen, a


relevância para o Direito moderno é a jurídico-positiva, a partir da qual a
Constituição é vista como norma fundamental, criadora da estrutura básica do
Estado e parâmetro de validade de todas as demais normas.

2.1.4. Constituição em Sentido Material, Formal e Instrumental

2.1.4.1. Constituição em Sentido Material

Constituição em sentido material (ou substancial) é o conjunto de


normas, escritas ou não escritas, cujo conteúdo seja considerado propriamente
constitucional, isto é, essencial à estruturação do Estado, à regulação do
exercício do poder e ao reconhecimento de direitos fundamentais aos
indivíduos64.

Segundo este sentido, as normas constitucionais são aquelas que tratam


das regras estruturais da sociedade, de seus alicerces fundamentais como:
formas de Estado, governo, seus órgãos, etc.

Do ponto de vista material, o que vai importar para definirmos se uma


norma tem caráter constitucional ou não será o seu conteúdo, pouco
importando a forma pela qual foi essa norma introduzida no ordenamento
jurídico65.

Segundo esse conceito, há matérias que são constitucionais em razão


de seu conteúdo, e as normas que delas tratam - é indiferente se são escritas
ou consuetudinárias, se integram um único documento redigido de forma
unitária ou textos esparsos surgidos em momentos diversos.

63
Ibidem, pág. 8
64
Ibidem, pág. 9
65
LENZA, Pedro, op. cit., 2019, pág. 143

39
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

2.1.4.2. Constituição em Sentido Formal

O conceito formal de Constituição diz respeito à existência, em um


determinado Estado, de um documento único, escrito por um órgão soberano
instituído com essa específica finalidade, que contém, entre outras, as normas
de organização política da comunidade e, sobretudo, que só pode ser alterado
mediante um procedimento legislativo mais árduo, e com muito maiores
restrições, do que o necessário à aprovação das normas não constitucionais
pelos órgãos legislativos constituídos66.

Na acepção formal, portanto, as normas constitucionais serão aquelas


introduzidas pelo poder soberano, por meio de um processo legislativo mais
dificultoso, diferenciado e mais solene que o processo legislativo de formação
das demais normas do ordenamento67.

Este sentido, centra-se na forma como foi introduzida a norma no


ordenamento jurídico e não o seu conteúdo.

2.1.4.3. Constituição em Sentido Instrumental

A Constituição em sentido instrumental refere-se ao instrumento pelo


qual contém as normas Constitucionais, ou seja, é o documento ou o material
pelo qual estão inseridas as normas Constitucionais.

Finalizando este tema, resta-nos elaborar um conceito básico de


Constituição, reunindo todos os elementos acima destacados.

Deste modo, podemos definir Constituição, como o conjunto de normas,


reunidas ou não em um documento escrito, que tem como principal função,
estabelecer a estrutura básica do poder político, regulando o exercício e a
transmissão desse poder, enumera também os direitos fundamentais, os fins
do Estado e a forma de criação e extinção das suas normas.

Para melhor compreensão, ver o esquema a seguir:

66
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 9
67
LENZA, Pedro, op. cit., 2019, pág. 143

40
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

41
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

Esquematização dos Sentidos do Termo Constituição

A Constituição é o conjunto dos


factores reais do poder que regem
uma nação, ou seja, a Constituição
SENTIDO SOCIOLOGICO deve ser construída em conformidade
com os factores reais da sociedade,
caso contrário será simplesmente
uma folha de papel.

A Constituição é uma decisão política


fundamental que tem como objecto
SENTIDO POLÍTICO principal a forma de governo, a forma
de Estado e a matriz ideológica da
nação.

A Constituição é compreendida como


o conjunto de normas fundamentais
de um Estado; a Constituição é
SENTIDO JURÍDICO considerada como norma pura, como
puro dever-ser sem qualquer
consideração de cunho sociológico ou
político.

A Constituição é o conjunto das


SENTIDOS DO normas escritas ou não, cujo o
TERMO conteúdo só será considerado
CONSTITUIÇÃO Constitucional, se versar sobre à
estruturação do Estado, à
SENTIDO MATERIAL regulamentação do exercício do poder
e ao reconhecimento de direitos
fundamentais aos indivíduos, neste
sentido o que importa é o conteúdo
não a forma pela qual tenha sida
inserida este conteúdo na
Constituição.

Neste sentido a Constituição é um


documento único e escrito por um
órgão soberano, com a finalidade de
SENTIDO FORMAL regular a organização política da
comunidade, aqui o que importa é a
forma pela qual as normas foram
introduzidas na Constituição e não o
seu conteúdo.

Consiste no instrumento pelo que


SENTIDO contém as normas Constitucionais, ou
INSTRUMENTAL seja, o material pelo qual estarão
inseridas as normas jurídicas

42
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

2.2. Classificação da Constituições

Para classificar qualquer Constituição depende de diversos critérios,


criados para realçar como ela se apresenta, isto é, do ponto de vista da sua
origem, forma, modo de elaboração, conteúdo, estabilidade, extensão
finalidade, etc.

2.2.1. Quanto à Origem

Quanto à origem, as Constituições podem ser outorgadas,


democrática (populares votadas ou promulgadas), cesaristas (ou
bonapartistas) e pactuadas (ou dualistas).

As Constituições outorgadas são aquelas que são impostas, de


maneira unilateral, pelo agente revolucionário (grupo ou governante). Que não
recebeu do povo legitimidade para em nome dele actuar 68, ou seja, são aquelas
Constituições que são elaboradas e impostas sem a participação do povo.

As Constituições outorgadas são designadas por alguns doutrinadores


como "Cartas Constitucionais".

As Constituições democráticas (populares ou promulgadas): são


aquelas Constituições que resultam do trabalho de uma Assembleia Nacional
Constituinte, eleita diretamente pelo povo, para, em nome deles, a Assembleia
elabore a Constituição69.

As Constituições cesaristas (bonapartistas) são aquelas que


inicialmente são elaboradas unilateralmente pelo detentor do poder, mas
dependem de ratificação ou aprovação do povo por meio de um referendo 70.

Essa participação popular não é democrática, pois cabe ao povo


somente referendar a vontade do agente revolucionário, detentor do poder. Por
isso, não são, propriamente, nem outorgadas, nem democráticas, pois, não se

68
LENZA, Pedro, op. cit., 2019, pág. 167
69
Ibidem, pág. 168
70
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 11

43
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

concede a liberdade para uma efectiva discussão ou uma eventual rejeição das
propostas.

2.2.2. Quanto à Forma

Quanto à forma, as Constituições podem ser escritas ou não escritas.

Constituição escrita é aquela formada por um conjunto de regras


sistematizadas e formalizadas por um órgão constituinte, em documentos
escritos solenes, estabelecendo as normas fundamentais de um dado Estado 71.

Nas Constituições não escritas (costumeiras ou consuetudinárias):


são aquelas constituídas por um conjunto de normas constitucionais esparsas
em vários textos, baseado em costumes na jurisprudência e em convenções 72,
normalmente estas normas constitucionais não são solenemente elaboradas
por um órgão especialmente encarregado dessa tarefa, tampouco estão
codificadas em documentos formais, solenemente elaborados.

Tais normas se sedimentam a partir dos usos e costumes, das leis


esparsas comuns, das convenções e da jurisprudência. Um exemplo claro é a
Constituição inglesa. Neste país parte das normas sobre organização do
Estado são consuetudinária73.

No entender de Jorge Miranda, “a Constituição inglesa é uma


Constituição não escrita, só no sentido de que grande parte das regras sobe
organização do poder político é consuetudinária; e, sobretudo, no sentido de
que a unidade fundamental da Constituição não repousa em nenhum texto ou
documento, mas em princípios não escritos assentes na organização social e
política dos Britânicos”74

A distinção essencial é que, nos países de Constituição escrita, as


normas constitucionais são elaboradas por um órgão especificamente
encarregado desse mister, que as formalizam em texto constitucional solene.
Diversamente, nos Estados de Constituição não escrita, as normas
constitucionais, quando escritas, estão cristalizadas em leis e outras espécies
71
Ibidem, pág. 11
72
MORAIS, Alexandre de, Direito Constitucional, 13 ed., 2003, pág. 30
73
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 12
74
MIRANDA, Jorge, op. cit., t. 1, 2003, pág. 126

44
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

normativas esparsas, que surgiram ao longo do tempo e, dada a sua dignidade,


adquiriram status constitucional.

2.2.3. Quanto ao Modo de Elaboração

Quanto ao modo de elaboração, as Constituições podem ser


dogmáticas ou históricas.

As Constituições dogmáticas, sempre escritas, se apresenta como


produto escrito e sistematizado por um órgão constituinte, a partir de princípio e
ideias fundamentais da teoria política e do direito dominante 75.

Poderão ser ortodoxas ou simples (fundadas em uma só ideologia) ou


ecléticas ou compromissórias (formadas pela síntese de diferentes
ideologias, que se conciliam no texto constitucional).

As Constituições históricas (ou costumeiras), resultam da lenta


formação histórica, do lento evoluir das tradições, dos fatos sociopolíticos,
representando uma síntese histórica dos valores consolidados pela própria
sociedade, como é o caso da Constituição inglesa 76.

As Constituições dogmáticas são necessariamente escritas,


elaboradas por um órgão constituinte, ao passo que as históricas são do tipo
não escritas, aquelas que a prática ou o costume sancionaram ou impuseram.

As Constituições dogmáticas tendem a ser menos estáveis, porque


espelham as ideias da sociedade em momento específico e o com o passar do
tempo e a consequente evolução do pensamento da sociedade, surge a
necessidade de constantes atualizações, por meio da alteração do seu texto.
As Constituições históricas tendem a apresentar maior estabilidade, pois
resultam do lento amadurecimento e da consolidação de valores da própria
sociedade.

75
MORAIS, Alexandre de, Direito Constitucional, 13 ed., 2003, pág. 30
76
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 13

45
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

2.2.4. Quanto ao Conteúdo

Quanto ao conteúdo, temos Constituição material (ou substancial) e


Constituição formal.

Na concepção material de Constituição, consideram-se


constitucionais somente as normas que cuidam de assuntos essenciais à
organização e ao funcionamento do Estado e estabelecem os direitos
fundamentais (matérias substancialmente constitucionais) 77.

Neste caso, para a identificação de uma norma constitucional, o


importante é o seu conteúdo e não importa o processo de elaboração ou a
natureza do documento que a contém; ela pode, ou não, estar em uma
Constituição escrita.

Na concepção formal de Constituição, são constitucionais todas as


normas que integram uma Constituição escrita, elaborada por um processo
especial (rígida), independentemente do seu conteúdo 78.

Aqui, leva-se em conta, o processo de elaboração da norma: todas as


normas integrantes de uma Constituição escrita, solenemente elaborada, serão
constitucionais. Não importa, o conteúdo da norma.

2.2.5. Quanto à Estabilidade

A classificação das Constituições quanto ao grau de estabilidade


(alterabilidade, mutabilidade ou consistência), as constituições dividem-se
em imutáveis, rígidas, flexíveis ou semirrígidas ou semiflexíveis.

A Constituição imutável é aquela que não admite modificação do seu


texto.

Essa espécie de Constituição está em pleno desuso, em razão da


impossibilidade de sua atualização diante da evolução política e social do
Estado.

77
Ibidem, pág. 13
78
Ibidem, pág. 14

46
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A Constituição é rígida quando exige um processo legislativo especial


para modificação do seu texto, mais difícil do que o processo legislativo de
elaboração das demais leis do ordenamento jurídico.

A Constituição flexível é aquela que permite sua modificação pelo


mesmo processo legislativo de elaboração e alteração das demais leis do
ordenamento jurídico, como ocorre na Inglaterra, em que as partes escritas de
sua Constituição podem ser juridicamente alteradas pelo Parlamento com a
mesma facilidade com que se altera a lei ordinária 79.

A Constituição semirrígida ou semiflexível é aquela que contém uma


parte rígida e outra parte flexível, ou seja, é aquela que exige um processo
legislativo mais difícil para alteração de certa normas constitucionais (rígida) e
ao mesmo tempo, permite a mudança de outras normas constitucionais por um
procedimento simples, semelhante àquele de elaboração das demais leis
infraconstitucionais (flexível).

2.2.6. Quanto à Correspondência com a Realidade


(Critério Ontológico – essência)

O constitucionalista alemão Karl Loewenstein desenvolveu uma


classificação para as Constituições que leva em conta a correspondência
existente entre o texto constitucional e a realidade política do respectivo
Estado.

Segundo Loewenstein, as Constituições de alguns Estados conseguem,


verdadeiramente, regular o processo político no Estado. Outras Constituições,
apesar de elaboradas com esse mesmo intuito, não conseguem, de facto,
normalizar a realidade política do Estado. Existem, ainda, Constituições que
nem têm esse intuito, pois visam, somente, à manutenção da estrutura de
poder vigente. Desta feita, podem as Constituições ser classificadas em três
grupos: Constituições normativas, Constituições nominativas e
Constituições semânticas.

79
Ibidem, pág. 17

47
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

As Constituições normativas são as que efetivamente conseguem, por


estarem em plena consonância com a realidade social, regular a vida política
do Estado80.

Constituição normativa, conseguem, de facto, fazer com que os agentes


do poder e as relações políticas obedecem ao conteúdo, às diretrizes e às
limitações impostas pelo texto constitucional.

As Constituições nominativas (nominalistas ou nominais) são


aquelas que, embora tenham sido elaboradas com o intuito de regular a vida
política do Estado, ainda não conseguem efetivamente cumprir esse papel, por
estarem em descompasso com o processo real de poder e com insuficiente
concretização constitucional81.

“São prospectivas, isto é, voltadas para um dia serem realizadas na


prática, como uma roupa guardada no armário que será vestida futuramente,
quando o corpo nacional tiver crescido”, afirmam, os professores Paulo Vicente
e Marcelo Alexandrino82.

As Constituições semânticas, são aquelas que desde a sua


elaboração, não têm o fim de regular a vida política do Estado, de orientar e
limitar o exercício do poder, mas sim, de beneficiar os detentores do poder.

Em suma, as constituições normativas limitam efetivamente o poder e


asseguram de facto os direitos dos cidadãos, e as nominativas, embora não o
façam hoje, ainda têm esse propósito, para concretização futura.

Já as constituições ditas semânticas são submetidas ao poder político


prevalecente, servindo apenas para estabilizar e eternizar dos detentores do
poder vigente.

2.2.7. Quanto à Extensão

No tocante à sua extensão, as Constituições podem ser analíticas e


sintéticas.

80
Ibidem, pág. 20
81
Ibidem, pág. 20
82
Ibidem, pág. 20

48
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Constituição analítica (longa, larga, prolixa, extensa, ampla ou


desenvolvida) é aquela de conteúdo extenso, que versa sobre matérias tanto
constitucionais ou não, ou seja, este tipo de Constituição, regula também
assuntos alheios ao Direito Constitucional, isto é, cuida também de regras ou
preceitos pertencentes ao campo da legislação ordinária e não somente do
Direito Constitucional.

Constituição sintética (básica, concisa, tópica, breve, sumária ou


sucinta) é aquela que possui texto curto, tratando apenas de regras básicas de
organização do sistema político jurídico do Estado, deixando para a legislação
infraconstitucional as demais matérias. É o caso, por exemplo, da Constituição
dos Estados Unidos da América, composta de apenas sete artigos e vinte e
sete emendas.

2.2.8. Quanto à Finalidade

Quanto à finalidade as Constituições podem ser: Constituição-garantia,


Constituição-balanço e Constituição-dirigente.

Constituição-garantia é aquela que garante a liberdade, direitos


pessoais e delimita o Poder Politico.

Este tipo de Constituição tem como maior preocupação a limitação dos


poderes estatais, isto é, a imposição de limites à ingerência do Estado na
esfera individual. Daí a denominação "garantia", indicando que o texto
constitucional se preocupa em garantir a liberdade, limitando o poder.

Constituição-balanço é aquela que se limita a demonstrar a ordem


existente, ou seja, nesse tipo de Constituição, o texto é elaborado com vistas a
espelhar certa realidade social, caso a realidade se altere uma nova
Constituição deve ser promulgada83. É a Constituição “do ser”

Constituição dirigente, ou (analítica), é aquela que define fins,


programas, planos e diretrizes para a atuação futura dos órgãos estatais. É a
Constituição que estabelece um programa para dirigir a evolução política do
Estado. O termo "dirigente" significa que o legislador constituinte "dirige" a

83
Ibidem, pág. 22

49
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

atuação futura dos órgãos governamentais, por meio de programas e metas a


serem realizadas por estes84.

“O elemento que caracteriza uma Constituição como dirigente é a


existência, no seu texto, das denominadas normas programáticas". Como o
próprio termo indica, tais normas estabelecem um programa, um rumo
inicialmente traçado pela Constituição, que deve ser perseguido pelos órgãos
estatais. São normas que têm como destinatários não os indivíduos, mas os
órgãos estatais, requerendo destes a atuação numa determinada direção,
apontada pelo legislador constituinte85.

84
Ibidem, pág. 22
85
Ibidem, pág. 22

50
Esquematização sobre as Classificações das Constituições

São aquelas
Escritas sistematizadas em um só
São elaboradas sem a
Outorgadas texto
participação do povo 2- Forma São aquelas que não estão
1-Origem Democráticas
São elaboras com a
Não Escritas
codificadas em um texto
participação do povo solene
Nestas Constituições o que importa
São elaboradas sem a
é o conteúdo da norma e não o
participação do povo, mas Material processo para sua elaboração
Cesaristas dependem da aprovação 4- Conteúdo
do povo, para estar em Nestas Constituições o que
vigor importa é o processo de
Forma elaboração da norma e não o seu
conteúdo
É aquela que não
Imutáveis admite modificação
do seu texto

5- Estabilidade Rígida Exigem um processo


legislativo complexo para
São aquelas que resultam dos modificação do seu texto
dogmas ou ideias fundamentais
Dogmáticas da teoria política e do Direito Quadro Geral das
Exigem um processo
Flexível legislativo mais fácil para
3- Modo de Classificações das modificação do seu texto

Elaboração Constituições
Semiflexível É aquela que contém
São aquelas que resultam da
Históricas uma parte rígida e outra
lenta formação histórica
flexível

É aquela que
possui um texto É aquela quem tem como
Analítica extenso preocupação, limitar os
Conseguem regular e limitar poderes do Estado e
Normativas o poder do Estado 7- Extensão Garantia garantir os direitos
É aquela que
São criadas com objectivo de
Sintética possui um texto
fundamentais
É aquela que se limita em
6- Correspondência regular e limitar o poder, mas curto demonstrar a realidade
Nominativas Balanço
Com a Realidade não conseguem faze-lo social existente
Não regulam e nem limitam o 8- Finalidade
É aquela que define fins,
poder do Estado, mas sim,
programas, planos e diretrizes
Semântica beneficiam os detentores do
para a atuação futura dos
poder. Dirigente órgãos estatais

Pág. 51
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

2.3. A Constituição Económica

Como frisava Adérito Correia, “a Constituição Económica é o conjunto de


normas e princípios constitucionais relativos à economia”. 86 Dito de outro modo,
a Constituição Económica é o conjunto de normais constitucionais que frisam
sobre a actividade económica do Estado, isto é, do art.º 89.º à 104.º da
Constituição de Angola.

Do ponto de vista formal, vislumbra Carlos Teixeira, que “a Constituição


económica é a parte económica da Constituição do Estado, em que estão
contidos os dispositivos essenciais ao ordenamento da actividade económica
desenvolvida pelos actores económicos (indivíduos e pessoas colectivas,
incluindo o Estado)”.87

É neste conjunto de dispositivos que se encontram estatuídos os


direitos, deveres, liberdades e responsabilidades destes mesmos actores no
exercício da actividade económica88.

No entender de Bacelar Gouveia, o sistema económico Angolano está


organizado e dividido da seguinte maneira 89:

- O regime económico: é a parte que define os princípios e as regras que


ordenam a actividade económica, em resultado da aplicação dos pontos axiais
da caracterização dos sistemas económicos;

- O regime financeiro: é a parte que define os princípios e as regras que


estabelecem a actividade pública de arrecadação de receitas e de decretação
de despeças, tendo como foco central o orçamento do Estado como
instrumento fundamental da actividade financeira pública;

- O regime fiscal: é a parte que estabelece os princípios e as regras que


regulam, especialmente dentro das receitas públicas a arrecadação das
receitas fiscais e a fiscalização das despesas do erário público, tal como

86
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 56
87
TEIXEIRA, Carlos, A Nova Constituição Económica de Angola e as Oportunidades de Negocio e
Investimentos, 2011, pág. 4
88
Ibidem, pág. 4
89
Gouveia, Jorge Bacelar, op. cit., 2005, pág.

52
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

explicar por via da sua fulcral relação com os cidadãos, de onde provêm essas
receitas e como são aplicadas.

2.3.1. Formação e Transformação da constituição económica


A Lei Constitucional de 1975 (LC 75) não incluía nenhuma divisão
especialmente dedicada à economia. A constituição económica constava do
Título I (Princípios Fundamentais), do art.º 8º ao art.º 12º, portanto,
basicamente, cinco artigos. Aí se consagrava uma economia nacional
planificada. Consagrava-se o sector público da produção, as formas
cooperativas e a propriedade privada quer dos nacionais quer dos
estrageiros. Os recursos naturais eram considerados propriedade do Estado.
O sistema fiscal era norteado pelo princípio da tributação progressiva.

Com a revisão da LC 75, lavada a cabo em 1978, exprime-se,


claramente, a orientação socialista da economia, já que, como afirmava o art.º
9º do texto constitucional, a base do desenvolvimento económico e social
passava a ser a propriedade socialista consubstanciada na propriedade estatal
e na propriedade cooperativa, bem como consagrava o mesmo artigo como
objecto estratégico as constantes alargamento e consolidação das relações de
produção socialista”.

A grande mudança na Constituição económica verifica-se em 1991, com


a aprovação da nova Lei Constitucional, através da Lei nº 12/91. A constituição
económica continua inserida no Titulo I (Princípio Fundamentais). Porém, a
constituição económica já não é aquela do socialismo, mas uma constituição
económica de uma economia não planificada (o Estado oriente o
desenvolvimento da economia nacional art.º 9º).

“O sistema económico assenta na coexistência de diversos tipos de


propriedade, pública, privada, mista, cooperativa e familiar, gozando todas de
igual proteção, art.º 10º”. Institui-se uma reserva do Estado art.º 12º. Como
novidade o art.º 13º consagra irreversibilidade dos confiscos e nacionalizações
praticados ao abrigo da lei, “sem prejuízo do disposto em lei específica sobre
privatizações”

53
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

A revisão constitucional de 1992 (Lei nº 23/92) não alterou a constituição


económica consagrada em 1991.

2.3.2. Na Constituição de 2010

A Constituição de 2010 não introduziu alterações de realce à


Constituição Económica. A grande novidade traduz-se no facto da Constituição
Económica ter ganho autonomia sistemática no sistema constitucional. Com
efeito consagra no Titulo III Organização Económica, Financeira e Fiscal que
se subdivide no Capítulo I- Princípios Gerais e o Capítulo II- Sistema Financeiro
e Fiscal.

2.3.3. Economia planificada e economia de mercado

2.3.3.1. Economia Planificada

A economia planificada, também chamada de economia centralizada ou


economia centralmente planificada é um sistema económico cujo o Estado é
que controla o planeamento e as metas da economia do país.

Este modelo nasceu do Socialismo, que teve como o seu maior


percursor Karl Marx, que entendia que o socialismo é o melhor sistema tanto
político e económico porque ela tem como principal essência o princípio da
igualdade. O socialismo defende o sistema de economia planificada, porque
entende que o poder económico deve ser centralizado na mão do Estado,
assim a população trabalharia normalmente, porém em empresas estatais,
regulamentadas e fiscalizadas pelo Estado.

Desta forma, o salário de todas as pessoas seria praticamente o mesmo,


todos receberiam a mesma quantidade que seus vizinhos, parentes, amigos e
outros. Outro ponto a destacar, é que não haveria diferenças socias entre as
comunidades. Os serviços de educação, saúde e transporte também seriam
públicos. Actualmente, os países considerados socialistas e que
concomitantemente têm uma economia planificada são: Cuba, China, Correia
do Norte, Vietnã e Laos.

54
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

O sistema de economia planificada ficou conhecido através das


Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), que o adoptou em 1928. A URSS,
devido a influência que detinha naquela altura conseguiu influenciar outros
países a implementar o mesmo sistema de economia, dentre destes países,
estiveram envolvidos muitos países africanos, incluindo Angola.

Em Angola este sistema económico esteve vigente com Lei


Constitucional de 1975, que como salienta Carlos Teixeira, este Lei consagrava
uma Constituição económica directiva, assentados nos princípios de
acentuados dirigismo e intervenção directa ou indirecta do Estado na
economia.90

Dito de outro modo, a economia angolana comportava princípios do


socialismo e do centralismo, onde a economia estava toda centralizada na mão
do Estado, que por sua vez, produzia e distribuía tudo.

Naquele período, o Estado angolano encabeçado pelo partido do MPLA,


era quem dirigia todo o país, isto é, não só em termos económicos, maís
também em termo jurídicos e políticos. Esta época ficou conhecida como o
período do “Partido Único”.

Este período teve o seu colapso, com a transição Constitucional de


199191, onde a Lei Constitucional consagrou, do ponto de vista politico, o surgir
de novos partidos políticos, deixando o Estado angolano o um unipartidário
passando a ser pluripartidarista e do ponto de vista económico a Lei
Constitucional consagra um sistema económico de mercado ou uma economia
não planificada92.

2.3.3.2. Economia de mercado

A economia de mercado é um sistema económico, pelo qual os agentes


económicos privados é quem controlam a economia e neste caso há pouca
intervenção do Estado.
90
TEIXEIRA, Carlos, op. cit., 2011, pág. 7 e 8
91
Vide a pág. 159.
92
Videm, ibidem, pág. 8

55
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

A economia de mercado nasceu do capitalismo, que teve como seu


maior percursor Adam Smith, que entendia que o Estado não deveria intervir na
economia porque qualquer interferência do Estado na economia, teria efeitos
maléficos, produzindo desequilíbrios e desperdícios. A função do Estado
deveria limitar-se à defesa das agressões externas e ao exercício da actividade
de policiamento e de aplicação da justiça.93

Neste tipo de economia não se prevê nem se deseja a intervenção do


Estado na actividade económica, pois tal levaria à alteração das regras de
mercados. Ao Estado na economia, caberia apenas a função de observador e
árbitro, limitando-se a intervir apenas para garantir a satisfação das
necessidades colectivas.94

Como já foi frisado, o Sistema económico de mercado em Angola foi


implementado com transição Constitucional de 1991. Posteriormente houve
também a revisão Constitucional de 1992, onde na verdade não houve
mudanças, só houve digamos que, uma organização sistemática das matérias
que já faziam parte da Lei Constitucional de 1991.

Na Lei Constitucional de 1991 e concomitantemente a revisão


constitucional de 1992, trouxeram grandes mudanças do ponto de vista,
daquilo que é o sistema económico de Angola.

A Lei Constitucional, consagrou no seu artigo 10º, a coexistência de


diversos tipos e propriedade pública, privada, mista, cooperativa e familiar,
gozando todos de igual proteção. Consagrou também a livre acesso a reserva
pública bem como a liberdade económica (livre iniciativa) e entre outros
princípios plasmados na Constituição Económica.

Alguns especialistas entendem que estas mudanças só foram possíveis


graças ao primeiro programa tentativo de recuperação económica e financeira,
conhecida em Angola como SEF (Saneamento Económico Financeiro) criada
no ano de 1988.95

93
HERIQUES, Lucinda Sobral & LEANDRO, Manuela, Introdução à Economia, 2014, pág. 12
94
Ibidem, pág. 13.
95
Ibidem, pág. 8

56
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Este programa tinha como objectivo a restruturação do sector


empresarial público, a reforma económica do mercado, reavaliação do
processo de privatização, reforma do sistema monetário, bancário, cambial e
fiscal, passos estes tendentes a abertura ao comércio esterno e ao
investimento privado estrangeiro.

Este programa económico proporcionou a abertura para criação de


empresas privadas, mistas e familiares, prevalecendo o princípio das zonas
económicas públicas (absolutas e relativas).
2.3.4. A Constituição Económica e a Economia Social de
Mercado

Como foi salientado anteriormente, o sistema de economia de mercado


defende a não intervenção do Estado na Economia, afirmando que, se o
Estado intervir na economia pode este, causar um desequilíbrio no mercado
financeiro.

Mas, contudo, é impossível que um Estado não intervenha no mínimo


possível, na economia do seu país, porque a intervenção deste, cria diversas
actividades comerciais, industriais e sociais transformadas em serviços
públicos e consequentemente gera mais emprego para a população.

A economia de Angola não foge disto, ou seja, sistema económico de


Angola não é uma economia pura de mercado, pois há inúmeras intervenções
do Estado na economia angolana, portanto Bacelar Gouveia dá-lhe o epiteto de
economia social de mercado ou economia mista 96, pois, há inúmeras
intervenção do Estado na economia.

2.3.5. O Sistema Económico Constitucional

2.3.5.1. Um Sistema Económico Pluriforme

O Sistema económico angolano é pluriforme pelo simples facto de que


nela, coexistirem várias formas, com estrutura e lógica diversas de sector
económicos (art.º 92º, nº 1 da CRA). Com efeito, a Constituição consagra

96
GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Constitucional,

57
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

vários sectores económicos, de acordo com a propriedade de meios de


produção:

a) Sector Público, constituído pelas empresas do Estado e de outras


entidades públicas. Os recursos naturais como terra (art.º 15.º e
16.º), enquadra-se igualmente no sector público considerado
propriedade originaria do Estado.
b) Sector Privado, constituída pelas empresas privadas e os demais
entes privados e todos os bens que não estejam inseridas no
domínio público (art.º 96º, da CRA).
c) Sector cooperativo: compreende os bens de produção titulados e
geridos pelas cooperativas97, este sector é composto pelos ramos
Agrário (agrícola, pecuário, florestais), Artesanato, Comercialização,
Consumo, Construção, Crédito, Cultura, Ensino e Educação,
Habitação, Mineração artesanal e semi-industrial, Pescas e
derivados, Saúde, Solidariedade social, Transportes, Ambientes e
outros previstos na Lei.

Este sector abrange o domínio privado e é regulada pela Lei 23/15 de 31


de agosto, Lei das Cooperativas.

2.3.6. Os Sectores de Propriedades e a Iniciativa


Económica

O sistema económico Constitucional assenta na garantia dos três


sectores de propriedade. Assim a primeira consequência é que nenhum deles
pode ser abolido ou essencialmente lesado.

Trata-se de uma garantia institucional do pluralismo de sectores de


propriedades. Conjugando com a garantia constitucional de propriedade
privada (art.º 14º, CRA) e a iniciativa privada (art.º 14.º da CRA), a Constituição

97
A Lei 23/15 de 31 de agosto (Lei das Cooperativas), no seu artigo 3.º alínea a) define como
Cooperativas, as pessoas colectiva autónomas de livres constituição, de capital e composição variáveis e
de controlo democrático, em que os seus membros se obrigam a contribuir com os recursos financeiros,
bens e serviços, para o exercício de uma actividade empresarial, de proveito comum e com riscos
partilhados, que visa a promoção dos interesses sociais e económicos dos seus membros, com um retorno
patrimonial predominantemente realizado na proporção das suas operações com a cooperativa.

58
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

económica assegura a existência de um sector económico privado


(propriedade privada e empresa privada).

2.3.6.1. Direito de Propriedade, a livre iniciativa e os tipos


de propriedade como princípios fundamentais do Estado

Antes de mais, o Direito de propriedade e livre iniciativa são princípios


fundamentais do Estado e assim devem ser entendidos, tirando-se da
afirmação deste princípio fundamental todas as consequências.

No artigo 37.º, nº 1, da CRA afirma que é garantido a todos o direito a


propriedade privada e à sua transmissão, nos termos da Constituição e da Lei.

Já no art.º 38.º, nº 2, da CRA, diz que a todos é reconhecida a livre


iniciativa empresarial e cooperativa, e exercer nos termos da lei.

Quantos aos tipos de propriedades, temos a propriedade pública e a


propriedade privada. Em relação à terra, considerada propriedade originária do
Estado (art.º 15.º, nº 1, da CRA), desde que não seja objecto de direitos
legítimos e legalmente constituídos, e em relação aos recursos naturais,
enquanto propriedade do Estado (art.º 16.º da CRA).

2.3.6.1. A Iniciativa Económica

Como já foi esmiuçado, a Constituição económica consagra a garantia


institucional das três formas de iniciativa económica que são a iniciativa
pública, privada e a iniciativa cooperativa, correspondentes aos três sectores
de propriedade.

Quanto a iniciativa pública, cabe enfatizar a existência de actividades


económicas reservadas aos Estado, designadas por “reservas públicas. Aí se
distingui a reserva absoluta do Estado – Banco Central Emissor, portos e
aeroportos, industrias bélica da reserva relativa do Estado.

Quanto a iniciativa privada, esta tem como limite específico a proibição


de empresas privadas nas reservas pública, atras referidas e quanto a reserva
relativa do Estado, ainda por definir. Fora disso, a empresa privada tem acesso
a todas as áreas económicas, mesmo em relação a exploração de recurso

59
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

naturais, apesar de serem considerados propriedades do Estado, através do


regime de conceição.

Em relação a iniciativa cooperativa, não tem nenhum limite específico,


não estando vedado a acesso das cooperativas a certas áreas económicas a
não ser as reservadas ao Estado.

2.3.6.1.1. Mercado e o planeamento público

O Planeamento deve traduzir-se na definição de “objectivo e medidas de


curto e médio prazos e dos programas sectórias e regionais”, por tanto na
elaboração de planos desenvolvimento económico e social como instituição
Constitucionalmente necessário à coordenação e orientação da actividade
económica (art.º 91.º da CRA).

Com tudo, o planeamento é apenas obrigatório para o sistema


empresarial do Estado e autárquico. Para o sector privado o planeamento tem
uma natureza indicativa.

Queremos com isto dizer, que os planos não substituem o mercando. Os


planos não são mais do que a coordenação e racionalização das medidas de
político-económica pública, ficando a sua eficácia dependente de instrumento
não compulsórios (incentivos, politica monetária, politica de crédito, politica
fiscal, politica orçamental, etc.). Assim o mercado desempenha um papel
essencial na coordenação económica.

A Constituição admite e, em certos casos impõem, a intervenção do


Estado na regulamentação económica, deste a racionalização dos circuitos de
distribuição, a proteção e defesa do consumidor, até as actividades
especulativas e outras práticas comercias antieconómica.

No que diz respeito ao mercado de trabalho, a Constituição impõe o


estabelecimento do salário mínimo nacional. O Estado pode intervir por
diversas formas, regulando, fomentando, fiscalizando e orientando o
desenvolvimento económico.

É claro que apesar de se reconhecer o papel do mercado, os planos de


desenvolvimento constituem um papel importante na orientação económica

60
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

nacional. Isto só é possível na medida em que o Estado possa influenciar a


actividade económica em geral, não apenas pelo efeito que o sector público
possa influenciar a actividade económica em geral, mas também pela
coordenação de todos os instrumentos de intervenção pública, directa ou
indirecta, no mercado (sistema fiscal, fixação de preços, subvenções, etc.).

2.3.7. Expropriação, Nacionalização e Privatização

O art.º 37.º da Constituição vigente consagra a expropriação por


utilidade pública, mediante justa e pronta indemnização [...]. Já a
nacionalização vem inserida no art.º 97.º da CRA. Quanto à privatização, a
Constituição dedica-lhe o art.º 96.º, que estabelece que os bens que não
estejam expressamente previstos na Constituição e na Lei como fazendo parte
do domínio público do Estado e demais pessoas colectivas de direito público
integram o domínio privado do Estado [...].

Desta feita, é necessário explicitar os conceitos com que estamos a


lidar. Entende-se por expropriação, “a transferência forçada, por acto de
autoridade, de um bem da esfera privada para a esfera pública do Estado, por
motivo de interesse ou utilidade pública, com pronta e justa indeminização”.

A Nacionalização é “a transferência de uma empresa ou bem particular,


serviço ou actividade sob gestão privada para propriedade ou controlo do
Estado”.
Não obstante do que já foi frisado, as nacionalizações podem também
traduzir-se na transferência de um bem da esfera estrangeira para esfera
nacional.
Um exemplo claro, verifica-se no período da descolonização em Angola.
Neste período, ou seja, depois do colono português abandonar o território
angolano, havia várias propriedades que faziam parte da esfera económica do
mesmo, portanto, o Estado Angolano teve que nacionalizar, ou seja, passar os
bens que fazia parte da esfera do colono (estrangeira) para a esfera nacional
Angola, para que este posteriormente não o reivindicasse.

61
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

Cabe ainda salientar que, as Nacionalizações são irreversíveis, ou seja,


quando o Estado nacionalizar o bem, este já não pode voltar para a esfera do
seu titular, isto é, a luz do art.º 97.º da CRA.

Por exemplo, se por ventura o Estado nacionalizar por engano, algum


bem que fazia parte da esfera privada de qualquer cidadão, este já não pode
revindicar, pois a lei já não permite, mas o Estado, ficará obrigado a indemnizar
o cidadão, que viu seu bem a ser nacionalizado.

A nacionalização distingue-se da expropriação propriamente dita tanto


pelo objectivo, quanto pelo seu fim. A expropriação consiste na desapropriação
de qualquer bem imóvel privado (terreno ou edifício) em benefício da
população, por vários motivos de utilidade pública (construção de estradas,
urbanização, etc.).

Já a nacionalização tem sempre por objectivo unidades económicas


(exploração ou empresas agrícolas, comerciais, industriais, etc.),

Por fim, entende-se por privatização, “a transferência total ou parcial de


uma empresa da esfera pública, para esfera privada”. A privatização, na
verdade é, uma técnica pelo qual o Estado reduz ou modifica a sua intervenção
na economia em favor do sector privado.

Angola, entrou recentemente em processo de privatizar cerca de 115


empresas públicas.

Este processo ajuda o Estado Angolano a diminuir alguma subcarga do


ponto de vista económico, pois, muitas destas empresas na mão do Estado
não geravam lucros, pelo contrário, só geravam mais despesas para o OGE.

É importante ainda esquadrinhar, que a privatização defere da


nacionalização, pois, a privatização centra-se na transferência de um bem da
esfera pública para esfera privada, enquanto que a nacionalização se centra
em transferir um bem da esfera privada para esfera pública.

62
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

2.3.8. A Constituição Financeira

2.3.8.1. As Finanças Públicas e a Constituição Económica

Entendemos por Constituição Financeira, o conjunto de normas e


princípios constitucionais que regulam os sistemas monetário, financeiro,
fiscal e orçamental, bem como as respectivas políticas. A Constituição
financeira integra e está subordinada organicamente e funcionalmente à
Constituição económica. Do ponto de vista sistemático, a Constituição
financeira, integra o Título III no Capítulo II.

A Constituição consagra dois objectivos da constituição financeira, a


saber: em primeiro lugar, a Constituição Financeira é organizada de forma a
garantir a formação, a captação, a capitalização e a segurança das poupanças,
assim como mobiliação a aplicação dos recursos financeiros necessários ao
desenvolvimento económico e social [...], isto é, de acordo com o art.º 99.º da
CRA.

Em segundo Lugar, é o da obrigação, para o Estado, de promover "uma


justa repartição dos rendimentos e da riqueza" (art.º 101.º da CRA), com vista
alcançar a "justiça social" (art.º 90.º da CRA), seguindo a ideia de que a
igualdade económica e social é a base necessária de efectiva igualdade dos
cidadãos (é o princípio da igualdade, art.º 23.º da CRA e concomitantemente o
art.º 90).

2.3.8.2. A Constituição Monetária

No que concerne a Constituição monetária, faz parte da Constituição


financeira. A Constituição Financeira, estabelece os princípios de reserva de lei
para a estruturação do sistema financeiro, bem como os objectivos da captação
de poupanças e de aplicação dos meio financeiros disponíveis.

É de realçar que este papel é atribuído ao Banco Emissor (Banco


Nacional de Angola), como banco central, que assegura a preservação do valor
da moeda nacional e das políticas monetárias, financeira e cambial (art.º 100.º
da CRA).

63
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

2.3.8.3. A Constituição Fiscal

A Constituição Fiscal é o conjunto de normas que regem o sistema fiscal


de um determinado Estado, é um elemento essencial da Constituição
financeira. Abrange os art.º 101.º, 102.º e 103.º da Constituição da República
de Angola.

O mais importante na Constituição fiscal são, porém, as garantias dos


contribuintes, consubstanciadas tanto no princípio geral da legalidade do
imposto (art.º 102.º, nº 1 da CRA) como direito de não pagar impostos que não
tenham sido criados nos termos da Constituição vigente.

2.3.8.4. Constituição Orçamental

A Constituição Orçamental, está integrado de igual modo, na


Constituição Financeira. A Constituição Orçamental diz respeito ao Orçamento
Geral do Estado (OGE), que com base ao art.º 104.º, nº 1 da CRA, constitui o
plano financeiro anual ou plurianual consolidado do Estado e deve refletir os
objectivos, as metas e as acções contidos nos instrumentos de planeamento
nacional.

O OGE, tem como objectivo estabelecer as receitas e as despesas que


serão efectuadas em cada ano fiscal, fixando os limites de despesas
autorizadas, isto é para todos os serviços, institutos públicos, fundos
autónomos e segurança social, bem como para as autarquias locais [...] art.º
104 nº 2, da CRA.

2.4. Funções da Constituição

As primeiras constituições escritas inseriram-se num quadro de limitação


e fragmentação do poder absoluto das monarquias europeias é na Revolução
americana pela conquista da independência da Ingraterra.

As Constituições a prelúdio, têm como função limitar o poder político e


defender os direitos fundamentais dos cidadãos, mas com base a algumas
doutrinas achamos melhor dividir as funções das constituições em:

64
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

a) Função das garantias e de direitos das liberdades fundamentais


(art.º 30.º à 75.º da CRA): está função consiste em determinar os
direitos fundamentais e proporcionar meios com que garantam com
que estes direitos sejam cumpridos;

b) Função propriamente constitutiva: a Constituição deve ser


constitutiva e não constituída, ou seja, a Constituição deve
acompanhar as mudanças sociais de um determinado Estado, para
que esteja sempre em conformidade com qualquer realidade social;

c) Função da estabilização e racionalização de um determinado


sistema de poder: a Constituição é uma base coerente e racional
para os titulares do poder político, que visam, mediante ela, dar
estabilidade e continuidade à sua concepção de sociedade. A
Constituição é, assim uma ordem garantidora de estabilidade, numa
relação de continuidade e mudança. A Constituição é assim uma
ordem aberta e um quadro capaz de abarcar os pluralismos
existentes na sociedade, sejam eles políticos, económicos, socias ou
culturais;
d) Função constitutiva legitimadora: a Constituição deve limitar a
legitimidade do poder, ou seja, esta função consiste na alternância de
governantes, porém a própria constituição também deve limitar o
período do exercício do poder, isto é através de mandatos (art.º 113.º
da CRA);

e) Função de base normativa de consenso fundamental em


determinada sociedade (designada por outros autores como
Função de integração ou de unidade): diz que cabe à Constituição
“[a] revelação normativa do consenso fundamental de uma
comunidade relativamente a princípios, valores, ideias e directrizes
que servem de padrões de conduta política e jurídica numa
comunidade”98. Dito de outro modo, a Constituição deve resultar do
consenso entre o povo e a Assembleia constituinte;

98
ALEXANDRINO, José Melo, Novo Constitucionalismo Angolano, 2013, pág. 55

65
DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUIÇÃO

f) Função de estabelecimento dos princípios estruturais da


organização do poder político: para além da Constituição criar os
órgãos do poder político, estabelece ainda as suas competências e
atribuições, valendo aqui o princípio da tipicidade de competências
dos órgãos de soberania, quer isso dizer, que os órgãos de
soberania são apenas aqueles que forem identificadas pela própria
Constituição (artigos 105.º da CRA);

g) Função de controlo e limitação do poder: não basta que a


Constituição legitime os órgãos do poder político, cabe também a ela,
criar normas que permitam o controlo e o limite desses órgãos
(artigos 105.º à 197.º da CRA).

66
CAPITULO III

REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS


POLÍTICOS DE GOVERNOS

1. Nota Preliminar

Regime Político são “concepções fundamentais das relações entre o


indivíduo e a sociedade política cuja ideologia do poder político tem por missão
verter na ordem jurídica”99. Com tudo os regimes políticos refere-se a
monarquia, a república, a democracia e a diversas formas de ditadura 100.

Um sistema político de governo, diferencia-se do regime político, pois,


sistema de governo é a forma como o poder político de um país é dividido
e exercido, nomeadamente o Poder executivo e o Legislativo, mas não
obstantes disso, devemos ter em conta o sistema que é estabelecido na
lei fundamental ou Constituição de um Estado, isto é, o conjunto de
órgãos que estruturam o Estado em termos de exercício do poder.

99
CARVALHO, Manual Proença de, Manual de Ciência Política e Sistemas Políticos e Constitucionais,
2008, pág. 71.
100
Ibidem.
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Geralmente os sistemas de governos variam de acordo com a relação e


a distribuição de funções entre os poderes Executivo e Legislativo.

Os sistemas de governos mais predominantes são: o Parlamentarismo,


onde existe uma dependência entre o poder Legislativo e o poder Executivo, o
Presidencialismo, onde existe uma separação e independência entre o poder
Legislativo e o poder Executivo e o Semipresidencialismo ou
Semiparlamentarismo ou também muitas vezes chamados de Sistema
hibrido, é aquele onde existe uma interdependência entre o poder legislativo e
o Governo, mas por sua vez, também existe uma separação e independência
entre o poder Legislativo e o Presidente da República.

Ainda temos os sistemas Sui Generis, que são considerados sistemas


próprios, ou seja, aquele sistema que determinado país cria com o objectivo de
assegura os seus próprios interesses.

Também é importante sublinhar que no novo contexto mundial tem se


emergido um novo Sistema de governo, que é o Sistema de Governo
Directorial, pelo qual o órgão do poder executivo é um órgão colegial restrito, o
Directório. O Directório é formado por dois ou mais elementos, eleitos pelas
duas câmaras do Parlamento, por um período determinado por Lei 101.

Este sistema está vigente na Suíça e San Marino, também esteve


vigente em França, entre 1795 a 1799.

2. Regimes Políticos

De maneira simples, podemos conceituar o Regime de Governo, como a


forma pelo qual o Estado se organiza para dar origem ao exercício do poder.
Dito de outro modo, as relações entre governantes e governados, o modo pelo
qual os primeiros exercem sua autoridade sobre os segundos, tudo isto
constitui o conjunto de regras que preside ao exercício do poder, e esse
conjunto de regras é o regime político.

101
Ibidem, pág. 86.

68
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Aristóteles que analisou mais de centena de constituições do seu tempo


procurou classificar com base no número dos que exerciam o poder: todos,
alguns, ou só um102.

Chamou monarquia ao regime em que só um exerce o poder


independentemente da vontade do povo.

Chamou aristocracia ao regime que o poder é exercido por alguns;

Chamou democracia ao regime em que o poder é compartilhado por


todos cidadãos, que alternadamente governam e são governados, ou seja, é o
regime pelo qual os governantes governam em favor da maioria.

Abraham Lincoln (foi o 16º presidente do Estados Unidos, o primeiro


presidente do Partido Republicano e o primeiro Presidente americano a ser
assassinado) no seu discurso de Gettysburg, entende que a democracia é
“government of the people, for the people and for the people”, tradução, a
democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo. Quer isto dizer,
que no regime democrático, o governo deve administrar o Estado sempre no
interesse do povo, ou seja, tudo que o governo fizer deve sempre ser com o
objectivo de beneficiar ou favorecer o povo.

Quanto aos tipos de democracia, destacam-se as seguintes:

- Democracia Directa: é o regime político pelo qual todo cidadão tem o


direito de expor sua opinião e exercer seu papel nas principais decisões de um
país.

A Grécia foi o berço da democracia directa, nomeadamente Atenas sob


governação de Péricles. Em Atenas todos tinham direito de prestar as suas
opiniões sobre o governo, quando estivessem reunidos na ágora (praça
pública).

Actualmente o Butão e alguns cantões suíços mais pequenos, ainda


exercem a democracia directa.

102
FERNANDES, António José, Introdução à Ciência Política, teorias métodos e temáticas, 2010, pág 144.

69
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

- Democracia Indirecta ou Representativa: é o regime político pelo


qual, o povo detentor do poder soberano, devido a densidade territorial e
populacional do Estado, elege representantes, que terão como objectivo
principal administrar, criar e emanar normas jurídicas proporcionando ainda
meios para que estas sejam acatadas, mas tudo isso em nome do povo.

A democracia Indirecta estabelece que a população utilize do voto para


a escolha dos representantes políticos mais adequados aos seus interesses.
Desse modo, os cidadãos teriam os seus direitos assegurados, pelos seus
governadores que se comprometeriam a atender os anseios de seus eleitores.

Os E.U.A, a Ingraterra, Rússia, Argentina, Itália, Cabo verde, Nigéria,


Moçambique, etc., são países que utilizam a Democracia Representativa.

No caso de Angola, está também utiliza o regime democrático


representativo, porém, o art.º 2.º, n.º 1 da CRA, consagra uma democracia
representativa e participativa, antes de explicar o porque, vejamos o que é uma
democracia participativa.

- Democracia Participativa: também chamada de democracia


deliberativa ou ativista, é um modelo de exercício de poder onde a
população participa activamente na tomada das principais decisões
políticas, através de associações, sindicatos, partidos políticos, movimentos
sociais e organizações não governamentais.

De igual modo, as participações políticas incluem a participação em


manifestações, marchas, protestos, a difusão de informações, além da própria
discussão e debates sobre os acontecimentos políticos. Esta forma de
Democracia veio enfatizar a participação do povo nas decisões políticas, pois,
nos últimos tempos, os nossos representantes, têm-se desviados daquilo que é
o enfoque da Democracia representativa (satisfação dos interesses do povo).

No caso de Angola, isto é, com base ao artigo 2.º, n.º 1 da CRA, a


Democracia angolana e do tipo representativa e participativa. Representativa,
porque, devido a nossa densidade populacional e territorial, elegemos
representantes, no sentido deles governarem e administrarem o Estado,
segundo os nossos interesses.

70
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

É participativa, porque, os Cidadãos podem intervir de forma directa na


tomada de decisões políticas, através de reuniões e manifestações (art.º 47.º
da CRA), associações (art.º 48.º da CRA), associações sindicais (art.º 49.º da
CRA) e participação na vida pública (art.º 52.º da CRA).

- Democracia semidirecta: é aquela que além da existência de


representantes eleitos que tomam a maior parte de decisões em nome dos
cidadãos, estes também têm a oportunidade de influencia-las, através de
iniciativas populares¸ plebiscitos103 e referendos104 (ratificação de decisões
de representantes). Este tipo de democracia até ao momento, é mais visível na
Suíça.

Segundo Aristóteles, estes regimes puros só existiriam se os detentores


e executores do poder se manifestem fiéis ao interesse geral. Caso contrário,
degeneram em regimes corrompidos.

Assim, a monarquia degenera em tirania ou ditadura, sempre que o


homem que governa só o faz em interesse próprio; a aristocracia degenera
em oligarquia, quando se verifica o mesmo fenómeno; a democracia
degenera em demagogia, quando todos procuram satisfazer os seus próprios
interesses, descurando o interesse geral.

3. Sistema de Governo

Como acima já se conceituou, sistema de governo, está ligado ao modo


como se relacionam os Poder Legislativo e Executivo no exercício das suas
funções governamentais105, mas não obstante disso, devemos ter em conta o
sistema de governo que a Constituição e as demais leis consagram.

103
Entende-se por plesbicito, como uma manifestação popular expressa através de voto, que ocorre
quando o Estado toma uma decisão contra os interesses do cidadão.
104
Referendo, é um instrumento, pelo qual os cidadãos são chamados a pronunciar-se através de sufrágio
directo e secreto, sobre um determinado assunto que tem relevância para toda nação.
105
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág.295.

71
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

3.1. Surgimento do Parlamentarismo

Sistema parlamentares são regimes de governo que assentam num


maior predomínio parlamentar, isto é das Assembleias legislativas ou
parlamentos106.

O Parlamentarismo resultou de um procedimento histórico, não tendo


sido previsto por qualquer teórico, nem se tendo constituído através de um
movimento político.

O berço do Parlamentarismo é a Ingraterra, sendo lá em que as


características do parlamentarismo foram se definindo paulatinamente.

O parlamentarismo trouxe definitivamente na história das instituições


políticas como expressão da luta de dois poderes ou forças antagônicas: a
Coroa dos reis e o Parlamento do povo. Ambos se defrontam numa disputa de
prerrogativas, donde resultará o domínio sobre a organização política e sua
máquina de governo.

Com o parlamento surge, por consequência, visível dualidade de


poderes: a autoridade do monarca, que declina, quando a monarquia absoluta
se faz limitada e representativa; e o poder parlamentar e o poder democrático,
oriundo da representação nacional, que emana das fontes populares do
consentimento e se acha em plena ascensão, tanto no alargamento das suas
origens democráticas como no peso da influência que exercerá, caminhando
resolutamente para o predomínio e subsequente apogeu.

Como exemplos de sistemas de governos parlamentares, podemos citar:


o Reino Unido, a Alemanha, a Itália, a Espanha, a Grécia, a Holanda Japão,
Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Suécia, Dinamarca, Noruega, Botsuana,
Suriname, Africa do Sul, etc.

O sistema parlamentar pode apresentar-se em Estados Monárquicos


Constitucionais e em Repúblicas Constitucionais.

Nos Estados monárquicos Constitucionais, o chefe de Estados é o


monarca, geralmente este cargo é hereditário.
106
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 242

72
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Enquanto que em Repúblicas Constitucionais, o chefe de Estados é o


Presidente da República, que pode ser eleito directa ou indirectamente.

As características do Parlamentarismo são:

a) Distinção entre Chefe de Estado e Chefe de Governo

O Poder do Estado se apresenta internamente em três: Poder Executivo,


exercido pelo 1º Ministro, auxiliado pelo gabinete; Poder Legislativo,
representado pela Câmara dos Comuns e pela Câmara dos Lordes; e o
Poder Judiciário, representado pelos Lordes Chanceleres - apesar da
separação, é visível uma interdependência entre o Poder Executivo e o
Legislativo.

O Chefe de Estado é representado pelo Monarca ou Presidente da


República e o Chefe do Governo é representado pelo 1º Ministro.

Neste sistema o Monarca ou Presidente de República tem um papel


passivo na governação e o 1.º Ministro tem um papel activo na governação.

Quando se trata de sistemas de governo em Estados repúblicanos, o


chefe de Estado (Presidente da República) é sempre eleito por sufrágio
indirecto107.

b) Possibilidade de dissolução do Parlamento.

O Monarca ou Presidente da República, que tem função de presidir a


nação, indicar o 1º Ministro que deverá ser líder do partido que ocupar o maior
número de cadeiras do parlamento (Câmara dos Comuns), e poderá avaliando
o momento acatar e dissolver o parlamento convocando imediata eleição a
pedido do 1º Ministro; e o outro Chefe de Governo, encarnado na figura do 1º
Ministro que exercerá o Poder Executivo conjuntamente com o gabinete sendo
todos Chefe de Governo e os ministros, que compuserem o gabinete,
responsáveis solidariamente por seus atos, portanto se cair um ministro cai
todo o gabinete e o 1º Ministro.

107
CARVALHO, Manuel Proença, Manual de Ciência Política e Sistemas Políticos e Constitucionais, 2008,
pág. 92

73
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

c) Chefia de Governo com responsabilidade política

Ao contrário do presidente da República, o 1º Ministro exerce sua função


com responsabilidade política tendo que prestar contas de suas ações diante
do Parlamento, podendo se causar desconfiança ou vier a ser acusado por
algum crime poderá perder o cargo.

Dito de outro modo, o Primeiro Ministro, detém uma responsabilidade


política para com o Parlamento, visto que, o Governo pode cair no Parlamento,
com resultado da não aprovação de uma moção de confiança apresentada pelo
partido ou coligação que sustentam o Governo, ou pela aprovação de moção
de censura apresentada pela oposição. 108

3.1.1. Igualdade entre o Poder Executivo e o Poder


Legislativo

Quanto à igualdade entre o executivo e o legislativo, faz-se ressaltar a


necessidade para o executivo de uma chefia distinta. Desfrutará essa chefia
maior ou menor prestígio também, consoante o modo de designação do chefe
do Estado, que participa na direção executiva e que no sistema parlamentar
republicano pode ser um Presidente da República, elevado a esse posto por
eleição direta ou indireta.

Quando esse chefe, com alguma parcela de responsabilidade executiva


no sistema parlamentar, com o direito “ser parte activa e real do governo” como
pessoa moralmente livre e responsável, embora constitucionalmente
irresponsável se elege mediante sufrágio directo, seu prestígio aumenta, sua
autoridade se reforça e os termos do equilíbrio e igualdade entre os dois
poderes ficam melhor resguardados.

Chefe de Estado, o rei ou Presidente da República é politicamente


irresponsável. Chefe de governo, sua responsabilidade se exerce através do
gabinete, que se torna politicamente responsável perante o Parlamento e
cobre assim a responsabilidade do Chefe de Estado, fazendo-o, por
consequência, politicamente irresponsável.

108
Ibidem, pág. 94

74
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Na monarquia limitada ou representativa, a decisão era do Chefe de


Estado com a referenda dos ministros; na monarquia parlamentar, decide o
ministério, com a assinatura do Chefe de Estado. De modo que, o Chefe de
Estado, no parlamentarismo clássico, aparece, de forma permanente.

Pertence ainda à natureza do sistema parlamentar, para a conservação


da igualdade do executivo e do legislativo, a dualidade do poder executivo.
Manifesta-se essa dualidade pela presença de um Chefe de Estado, que
representa todo o País, bem como a independência do executivo, e pelo
gabinete, que actua em conexão com o legislativo, trazendo ao observador a
reminiscência do fundamento democrático do governo.

3.1.2. Tipos de Parlamentos

No actual contexto mundial existe dois tipos de parlamentos, que


passamos a destacar109:

a) Parlamentos unicamerais: são aquelas que estão compostos


apenas por uma única câmara, constituindo esta a única
assembleia representativa;
b) Parlamentos bicamerais: são aquelas que se encontram
constituídos por duais assembleias que participam na elaboração
das leis.

Como já foi possível constatar mais acima, o bicameralismo tem origem


britânica, sendo adoptado nos E.U.A já desde o séc. XVIII, ao passo que em
França o modelo não vincou inicialmente. No parlamento britânico, o modelo
consolidou-se com a câmara baixa, câmara dos comuns (The Commons) e a
câmara alta câmara dos Lordes (The House of Lords)110.

Luís Sá, apresenta algumas razões que têm justificado o


bicameralismo111:

109
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 244
110
Cf. Ibidem, pág. 245
111
SÁ, Luís, O Lugar da Assembleia da República no Sistema Político, 1994, pág. 334

75
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

a) A segunda câmara é uma garantia contra a precipitação ou


irreflexão na feitura das leis pela primeira, permitindo
remediar e ponderar o que esta tiver decidido;
b) A existência de duais câmaras divide a autoridade das
assembleias, impedindo que uma só assuma a plenitude do
poder e resvale no despotismo e na tirania;
c) Uma segunda câmara constituída por modo diverso da
primeira pode formar um centro de resistência ao predomínio
momentâneo de um partido ou da demagogia.

Ainda é importante realçar, que o Sistema do Governo Parlamentar,


pode assumir as modalidades de sistemas de governo de Gabinete ou de
Assembleias.

O sistema de governo parlamentar de gabinete, verifica-se quando,


quando o partido do Governo consegue a maioria absoluta no parlamento

Em contrapartida, o sistema de governo parlamentar de Assembleias,


verifica-se quando o partido do Governo, não detém a maioria no parlamento,
assim, o Governo não encontra apoio no parlamento e tem sempre que
negociar com a oposição, para que o programa do governo siga em frente.

3.2. Surgimento do Sistema Presidencial

O presidencialismo surgiu da criação da Constituição dos E.U.A em


1787, tendo resultado da aplicação das ideias democráticas, concentradas na
liberdade e na igualdade dos indivíduos e na soberania popular, conjugadas
com o espírito pragmático dos criadores do Estado norte-americano.

Esta criação deu-se através da experiência constitucional britânica.


Quando os juristas da Convenção de Filadélfia tratavam de assentar as bases
de uma existência nacional independente, as lições do quadro político da
Ingraterra, cujas instituições medravam á sombra da liberdade, estiveram
presentes no espírito dos Pais da Constituição, indo estes buscar naqueles
ensinamentos inspiração com que levar a cabo sua obra legislativa
fundamental.
76
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Este Sistema assenta no princípio da separação dos poderes entre o


poder legislativo, executivo e judicial, onde cada um não só desempenha a sua
função, mas também não interferem em actos de outros órgãos. É o que se
chama, o mecanismo de checks and balances (Freios e contrapesos).112

Cabe ressaltar que o presidencialismo e a República andam de mão


dadas, na República, não há monarca, pois é um regime que não se pauta na
ideia de que o poder emana de um direito divino destinado a uma pessoa ou
família específica113.

O poder emana da vontade popular, segundo o princípio republicano. As


República geralmente possuem democracias que tem a clássica separação de
poderes, isto não quer dizer que em toda república terá como principal líder um
Presidente, porque, não obstante disso, existem Repúblicas que adotam o
Parlamentarismo como por exemplo a Alemanha.

O Presidencialismo possui as seguintes características:

Em Sistemas Presidencialistas, a distinção entre chefe de Estado e


chefe de governo não existe claramente. Tanto as funções de chefe de
Estado, quanto de chefe de Governo ficam acumuladas para uma pessoa (o
Presidente) e que por sua vez, o Presidente da República tem um papel activo
na governação do País.114

Essa pessoa, como se pode imaginar, é a peça central do


Presidencialismo. Ele é responsável por coordenar a execução das políticas
públicas, a escolha dos ministros que trabalharão com ele, o Presidente tem
ainda o Poder de veto, vindos do Legislativo, entre outras mais. Ele não tem
um papel decorativo, como acontece em muitas Repúblicas Parlamentaristas.

Como o poder emana do povo, faz sentido que no presidencialismo o


principal líder do sistema seja escolhido pelo voto popular. E é isso que

112
MACHADO, Jónatas E. M; COSTA, Paulo Nogueira & HILÁRIO, Esteves Carlos, op. cit., 2013, pág. 229
113
POLITIZE, Sistemas e Formas de Governos: O Que São? 2017, pág. 20, Acesso em: 28.jan.2020
Disponível em: https://www.politize.com.br/trilhas/sistemas-de-governo/
114
Ibidem, pág. 20

77
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

acontece na maior parte das Repúblicas Presidencialistas. Essa é outra grande


diferença do Presidencialismo em relação ao Parlamentarismo 115.

No parlamentarismo, o chefe de governo (nomeadamente chamado de


Primeiro-Ministro), é escolhido pelo parlamento, na maior parte dos casos. No
caso do Presidencialismo, o Presidente não precisa ter qualquer relação com o
Poder Legislativo para ser eleito.

Ele pode ser eleito para o cargo máximo do Poder Executivo sem nunca
ter exercido o cargo de deputado. Portanto, podemos considerar que o
Presidencialismo cria uma distinção mais clara entre os poderes Executivo e
Legislativo.

3.3. Surgimento do Semipresidencialismo

O semipresidencialismo é um termo criado pelo cientista político francês


Maurice Duverger, pode ser entendido como uma mistura dos dois outros
Sistemas que já debruçamos: presidencialismo e o parlamentarismo. Alguns
altores como Manuel Proença de Carvalho asserção que, antes da França ter
adoptado o Semipresidencialismo, este sistema de governo já tinha vigorado
em 1919 na Finlândia e na Alemanha de Weimar 116.

Primeiramente o semipresidencialismo, surge em Repúblicas, assim


como Presidencialismo. O Presidente também é eleito pelo povo, exatamente
como acontece no presidencialismo. Por outro lado, o semipresidencialismo
diferencia as figuras de chefe de Estado e Chefe de Governo, o que é uma
característica do Parlamentarismo117.

O grande diferencial do semipresidencialismo é que o chefe de Estado


(Presidente), não tem papel passivo, meramente decorativa ou simbólica,
como ocorre em muitos Sistemas Parlamentaristas e em especial os
monárquicos. O Presidente no Sistema Semipresidencial possui poderes que
vão muito além de formalidades.

115
Ibidem, pág. 21
116
CARVALHO, Manuel Proença, op. cit., 2008, pág. 87
117
POLITIZE, op. cit., 2017, pág. 26

78
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Existe, nesse Sistema, uma coexistência entre o Presidente e o


Primeiro-Ministro. Ambos possuem funções muito importantes e
complementares. O Presidente cuida de várias funções práticas, como cuidar
da política externa do país, chefiar as forças armadas, nomear funcionários,
vetar leis, entre outros. Ele também nomeia o Primeiro-Ministro e em alguns
casos pode demiti-lo118.

Além de tudo isso, existe uma diferença crucial entre o


Semipresidencialismo e o Parlamentarismo: no Parlamentarismo o parlamento
pode derrubar o Primeiro-Ministro, já no Semipresidencialismo isto também
pode acontecer, mas em contrapartida, o Presidente tem o poder de dissolver o
parlamento, poder inexistente em sistemas Presidencialistas ou
Parlamentaristas.

3.4. Sistema de Governo de Alguns Países da Europa e das


Américas

3.4.1. Sistema de Governo Britânico


O Reino Unido é constituído pela maior ilha continental da Europa, a
Grã-Bretanha (formada pela Escócia, Inglaterra e País de Gales) e pela Irlanda
do Norte, cujo o sistema de governo é o Parlamentarismo.

A Constituição britânica é uma Constituição não escrita, já que os seus


preceitos não se encontram reunidos num texto único, não assumindo no
conjunto a forma de uma lei escrita119.

A Constituição britânica é uma Constituição consuetudinária. Com efeito,


grande parte das regras sobre organização do poder político tem origem no
costume, o que constitui na actualidade um caso único.

A Constituição britânica é também uma Constituição flexível podendo a


qualquer altura ser alterada pelo Parlamento nos mesmos termos de uma lei
ordinária.

118
Ibidem, pág. 26
119
CARVALHO, Manuel Proença de, op.cit., 2008, pág. 147.

79
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Quanto à forma do Estado, o Reino Único é um Estado Unitário, já que


há uma unidade de poderes políticos.

3.4.1.1. Os órgãos constitucionais britânicos

Como órgãos constitucionais no sistema britânico encontram-se


previstos os seguintes120: o Monarca, o Parlamento, o Gabinete, os Tribunais
e o Conselho Privado.

3.4.1.1.1. O Monarca

O Monarca é o Rei ou Rainha do Reino Unido que exerce o cargo a titulo


vitalício, cuja sucessão é por hereditariedade, de acordo com o direito de
sucessão do tronco. O Monarca é o titular da coroa, instituição monárquica que
na termologia jurídica inglesa é uma expressão de interesse colectivo, que tem
sentido de Estado121.

Sendo um titulo honorífico, o Monarca não exerce qualquer poder


político real, ficando com um papel passivo ou meramente simbólico na
governação, mas a sua posição constitucional é aparentemente forte,
considerando que tudo é feito em seu nome, quer no parlamento, quer no
Gabinete, funcionando a sua invocação como sendo o próprio Estado Britânico
em acção, sob a designação o Reino de Sua Majestade 122.

O Monarca não possui qualquer responsabilidade nem politica, nem


jurídica, isto é, de acordo com o princípio da referenda ministerial the King do
no wrong123. Dito de outro modo, o rei “reina, mas não governa” ou o “monarca
não pode oficialmente decidir sozinho”, assim como “o soberano não pode agir
mal”124.

Desta feita, na ordem jurídica britânica, o Rei tem dois direitos que são:
ser informado sobre todos os factos importantes da vida política do Reino e o
direito de aconselhar o Governo.

120
GOUVEIA, Jorge Bacelar, op. cit., 2005 pág. 268 e ss
121
CAETANO, Marcelo, Manual de Ciência Política, I, p. 52 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 83
122
GOUVEIA, Jorge Bacelar, op. cit., pág. 269
123
CAETANO, Marcelo, op. cit., p. 53 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 84.
124
CARVALHO, Manuel Proença, op. cit. 2008, pág. 154.

80
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

No âmbito da prerrogativa real, o monarca é norteado pelos seguintes


poderes125:

a) O comando das Forças Armadas, assim como a nomeação dos mais


altos postos das Forças Armadas;
b) Proclamar a guerra e fazer a paz;
c) Nomear o Primeiro-Ministro;
d) Dissolver o Parlamento;
e) A rejeição e promulgação das leis;
f) O direito de concluir tratados;
g) O direito de nomear embaixadores e juízes;
h) O direito de reconhecer os governos;
i) O direito de Indulto;
j) A criação de Pares;
k) A distribuição de títulos e condecorações;
l) A possibilidade de autorizar a apelação para a Comissão Judiciária do
Conselho Privado;
m) A faculdade de participar nas reuniões do Conselho Privado, aquando
da tramitação da legislação mais importantes deste órgão.

3.4.1.1.2. O Parlamento Britânico

O Parlamento Britânico é um órgão político de maior importância no


Ordenamento Jurídico Britânico, exercendo todos os actos políticos e jurídicos
da Função governativa.

O Parlamento Britânico é bicamaral, existindo duas câmaras: a Câmara


Lordes (House of Lords), câmara alta, representando a Rainha ou Rei, e uma
câmara baixa – Câmara dos Comuns (House of Commons), representando o
Reino Unido.

A Câmara do Lordes é encabeçada pelo monarca, ela é formada por


pessoas escolhidas dentro da nobreza. Essa Câmara não interfere na política e
tem como função cuidar das coisas referentes a Dinastia Inglesa como por

125
DUVERGER, Maurice, Os Grandes Sistemas Políticos, 1988, pág. 231.

81
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

exemplos os casamentos reais ou a concessão de honrarias e revisar os


projectos da Câmara dos Comuns.

Detinha no passado os mesmos poderes que a Câmara dos Comuns,


mas a partir nomeadamente das conhecidas “Leis sobre o Parlamento de 1991,
1949 e 1999”, que consagram uma limitação expressa aos seus poderes, as
suas atribuições encontram-se hoje muito reduzidas, pelo que na actualidade
os “lordes” pouca influência têm na vida política Britânica 126.

Em matérias legislativas, possui unicamente um voto meramente


suspensivo face à Câmara dos Comuns, cuja eficácia se resume a um mero
efeito retardador.

Hoje em dia a Câmara dos Lordes funciona fundamentalmente como um


fórum de debates de elevada qualidade, continuando a ser válida a afirmação
de George Burdeau127 de que, como alguns dos seus elementos são escolhidos
de entre as personalidade mais importantes do país, aos debates é
proporcionado o aperfeiçoamento do seu conteúdo.

Quanto a Câmara dos Comuns, está é eleita por sufrágio universal,


directo e secreto nas eleições legislativas. Tem 659 deputados, exercendo um
mandato de 5 anos. O acto eleitoral obedece a regra do sistema de círculos
eleitorais uninominais e o vencedor decide-se pela maioria, numa só votação,
mesmo que essa maioria seja relativa.

Os parlamentares da Câmara dos Comuns são responsáveis por eleger


o Primeiro-Ministro, por meio do bloco político que obtiver a maioria dos
assentos da Casa.

Quanto às suas atribuições, compete à Câmara dos Comuns o exercício


das funções política e legislativa, sendo as respectivas deliberações decisivas
tanto para sustentar politicamente o Governo, como provar as Leis. A Câmara
é presidida por um Speaker (o presidente do Parlamento), escolhido entre os
Deputados da maioria.

126
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit. 2008, 157.
127
BURDEAU, George, Manuel Droit Constitutionnel, 1998, pp. 225 apud CARVALHO, op. cit., 2008, pág.
158

82
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

3.4.1.1.3. O Gabinete

O Gabinete (representa o Governo) é encabeçado pelo Primeiro ministro


e constituída pelos demais ministros que o Primeiro Ministro designar 128. O
Primeiro-Ministro é eleito de forma indirecta, pelo Parlamento, sendo apontado
pelo partido que obteve a maioria dos assentos na casa dos comuns, a
principal casa legislativa do parlamento britânico.

Desta forma, a governabilidade é um ponto-chave no parlamento


britânico. A obtenção de maioria congressual é crucial para eleger o primeiro-
ministro. Quando não há governabilidade, o Primeiro ministro pode entregar o
cargo e convocar as eleições.

O Primeiro-Ministro também pode entregar o cargo quando haver voto


desconfiança, também chamado de moção de censura, é um instrumento
político à disposição do Parlamento.

Dito de outro modo, quando as forças de oposição entendem que o


Primeiro-Ministro está em uma posição de fragilidade e não tem condições de
governar, coloca-se a pauta de votação uma moção (voto de desconfiança),
para expressar a desconfiança do Parlamento no Chefe de Governo.

Apesar de o voto de desconfiança não implicar a perda do cargo de


Chefe de Governo, pode ser uma forma de constranger o Primeiro-Ministro a
renunciar, e entregar o cargo.

O gabinete é um órgão que tecnicamente responde pela politica geral do


Governo perante o Parlamento, perante a Coroa e perante a Nação 129.

O Governo apresenta duas categorias de ministros: Ministros seniores


(os senior ministers) e os Ministros juniores (os junior ministers). Os senior
Ministers são os mais importantes e politicamente experientes, ocupando as
pastas ministeriais mais relevantes da governação. Os junior Ministers incluem
os Secretários Parlamentares que actuam em praticamente todos
ministérios130.
128
CARVALHO, Manuel de Proença, op.cit. 2008, pág. 158
129
CAETANO, Marcelo, op.cit., I, pág. 60 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 85-86.
130
CAPOCO, Zeferino, op. cit. 2015, pág. 85.

83
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Cabe ao Gabinete as seguintes características, isto é, vislumbradas por


Marques Guedes131:

a) É o Gabinete que prepara o discurso da Coroa, lido na abertura


solene de cada sessão do Parlamento (na Câmara dos Lordes), no
qual se anunciam as linhas gerais do programa legislativo e de
governo;
b) É o Gabinete que propõe à Câmara dos Comuns as principais
medidas legislativas;
c) É o Gabinete que elabora as Orders in Council, formalmente
aprovadas e publicadas pelo Conselho Privado, e exerce outras
atribuições de natureza regulamentária;
d) É o Gabinete que colectivamente assume, perante o Parlamento, a
responsabilidade pela política governamental;
e) É ainda o Gabinete que em caso desacordo sobre matéria grave,
segundando o Primeiro Ministro, aconselha ao Soberano a
dissolução da Câmara dos Comuns e a realização de novas
eleições, se não preferir apresentar a sua própria demissão.

3.4.1.1.4. Os Tribunais Britânicos

A tipologia dos tribunais é outra grande especifidade do poder judicial


britânico. A estrutura obedece uma cúpula que tem no topo a House of Lords; o
suprime court cuja composição é formada por um Court of Appeal, Court of
Justice e Crown Court132.

No plano inferior da cúpula encontram-se os County Courts e Magistrate


Courts, que administram a justiça em questões civis e criminais gerais 133.

3.4.1.1.5. O Conselho Privado

O Privy Council (o Conselho Privado) conta com mais de trezentos


membros que exercem altos cargos políticos e judiciais segundos seus méritos
e serviços.
131
QUEDES, Marques, Ideologias e Sistemas Políticos, 1978, p. 93.
132
CAPOCO, Zeferino, op. cit. 2015, pág. 87.
133
Ibidem.

84
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

É presidido por um membro do Gabinete e só raras vezes reúnem, como


por exemplos, em que um novo Rei cinge a Coroa ou quando o monarca
anuncia o seu casamento134. Funciona como um Conselho de Estado, sendo
um órgão de consulta do Chefe de Estado 135.

3.4.1.2. O Sistema de Partidos no Reino Unido: O


Bipartidarismo Perfeito

Os Whigs que deram origem ao Partido Liberal e os Tories ao Partido


Conservador, alternaram entre si no poder desde o final do século XVII até ao
início do século XX.

Na actualidade, o sistema de partidos no Reino Unido, por força


sobretudo do sistema eleitoral, gira em torno de dois grandes partidos: o
Partido Trabalhista pertencendo à família social-democrata, portanto, de
esquerda democrática, desde os meados dos anos noventa quase centrista
com o chamado New Labour, e o Partido Conservador integrando-se na
direita democrática136.

Estes dois partidos polarizam a vida pública do país, alternando entre si


no poder.

Como características dos partidos britânicos, salientem-se a sua forte


organização, a disciplina partidária, consubstanciada numa disciplina e voto
rigoroso segundo as ordens do líder, e a autoridade do líder sobre o partido. No
respeitante à eleição do líder do Partido Conservador, o processo obedece na
actualidade às seguintes regras: há uma série de votações cujos eleitores são
os deputados conservadores na Câmara dos Comuns, sendo em cada
escrutínio o candidato menos votado eliminado 137.

Quando só restarem dois candidatos, haverá então uma votação a nível


nacional aberta às “bases”, em que participam todos os membros do Partido
Conservador.

134
CAETANO, Marcello, op. cit., I, 1978 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit. 2015 pág. 87.
135
GOVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Constitucional I e II, 2005, pág. 273.
136
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit. 2008, pág. 166.
137
Ibidem, pág. 167

85
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Uma vez eleito, o líder reina no seu partido. Por seu turno, no
concernente à liderança do Partido Trabalhista, os sindicatos representam 1/3
do colégio eleitoral, os deputados 1/3 e os militantes do partido, igualmente 1/3.

Apesar do líder deter uma grande autoridade sobre o seu partido, esta
não é, no entanto, tão forte como no Partido Conservador, já que terá que
contar com os sindicatos que têm grande influência no seio do partido, e com
as várias tendências internas, nomeadamente da sua ala esquerda.

Quer o Partido Conservador, quer o Partido Trabalhista realizam os seus


Congressos anuais, onde se debate, mas não de decide. Refira-se, aliás, que
os seus líderes partidários não assistem aos Congressos, para não
comprometer o seu prestígio, vindo apenas a pronunciar o discurso final, que
define a orientação do Partido138.

As duas grandes forças políticas alcançam, assim, no total entre 75% e


80% dos votos expressos e entre 90% a 95% da representação da Câmara dos
Comuns, obtendo cada uma de per si a almejada maioria parlamentar.

Por sua vez, em termos eleitorais, a terceira força partidária, o Partido


Liberal Democrata (situado politicamente entre o Partido Conservador e o
Partido Trabalhista), herdeiro do Partido Liberal que, entre 1935 e 1983, se
afirmava como o terceiro partido mais votado, e resultado da função do Partido
Liberal com o Partido Social-Democrata criado nos 80, tem também
representação na Câmara dos Comuns.

Todavia, este terceiro partido não tem qualquer influência na formação


das maiorias governamentais, porquanto e como já foi observado
anteriormente, há uma grande disfunção entre o voto popular obtido pela “3.ª
força” e o respectivo número de deputados. Face ao antecedente, podemos
classificar o sistema de partidos do Reino Unido de bipartidarismo perfeito139.

138
Ibidem, pág. 167
139
Ibidem, pág 167.

86
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

3.4.2. Sistema de Governo dos E.U.A

Observa-se, antes de mais, que “os Estados Unidos da América entram


a História Constitucional Universal por terem sido os primeiros a efectiva uma
revolução liberal, para além de possuírem a mais antiga e também primeira
Constituição escrita feita até hoje”140.

Além Constituição dos Estados Unidos da América há que ter em conta


as Constituições dos Estados Federados, aplicáveis com grande importância
no domínio da política interna de cada Estados Federados. Mas é a
Constituição Federal que funda os Estados Unidos. Assim se afirma que “o
Direito Constitucional dos Estados Unidos brota do sistema jurídico inglês e do
pensamento político do séc. XVIII, posto perante as condições peculiares de
América do Norte”141.

Os E.U.A tem como sistema de governo o famoso presidencialismo


puro, devido a separação rígida dos Poderes, que é quase absoluta, deste
modo, há pouca iniciativa legislativa para o Executivo, dito de outro modo, eles
defendem a separação absoluta dos Poderes, isto é, eles são contra a
concentração de poderes. Logo é importante dividir estes poderes, onde cada
poder tem a capacidade de controle.

3.4.2.1. A Constituição dos Estados Unidos

A Constituição dos Estados Unidos da América foi criada na data de 17


de setembro de 1787 e entrou em vigor em 1790. Contém 7 extensos artigos e
27 emendas.

Ana Guerra Martins sustenta que 142, na necessidade de conciliar os


vários Estados dominou os debates, tendo acabado mesmo por dar lugar a
duas alianças que salvaram a Convenção, a saber: os estados pequenos
contra os grandes, num segundo momento, o Norte contra Sul, sendo, nessa
medida, a Constituição Norte-americana o resultado de vários compromissos.

140
GOUVEIA, Jorge Bacelar, op. cit., I, 2005, pp. 276
141
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional, I, 1996, pág. 143.
142
MARTINS, Ana Guerra, Origem da Constituição Norte-Americana, 1994, pág. 116 e 117

87
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Na realidade, e de um lado, os Estados cuja economia assentava


fundamentalmente no comércio; do outro, os estados cuja base económica era
agrícola.

De uma banda, os Estados que possuíam escravos; de outra banda, os


Estados não esclavagistas. Finalmente, sabendo-se que era necessário um
poder forte, como resultava do fracasso da Confederação, também os estados
não estavam dispostos abdicar totalmente da sua autonomia. Assim nasceu o
Federalismo143.

O Federalismo visava articular o poder soberano de uma entidade


central, a União, com o dos Estados sem esvaziar os poderes destes últimos.
Neste contexto a Constituição elencou logo no primeiro artigo quais os poderes
que competiam à Federação, deixando os restantes para a esfera da
competência dos Estados.

De outra sorte, instituiu um sistema de freios e contrapesos de forma a


limitar os poderes dos governantes no âmbito da Federação. Pelo artigo VII, da
Constituição, a ratificação de nove estados era suficiente para que a Lei
fundamental entrasse em vigor. Mas entre dezembro de 1787 e junho de 1788,
os restantes Estados-membros ratificaram o texto constitucional.

A importância da Constituição Norte-Americana é indesmentível, seja em


termos históricos, seja contributos para a Ciência Política e o Direito
Constitucional.

Segundo Freitas do Amaral a relevância da Constituição Norte-


Americana resulta dos seguintes aspectos144:

a) É a Primeira grande Constituição escrita em sentido moderno;

b) É a Primeira Constituição republicana da era moderna;

c) É a Primeira Constituição a consagrar um Estado Federal;

d) É a Primeira Constituição a estabelecer um Sistema de Governo


Presidencialista, por influência do sistema de separação de poderes;

143
CARVALHO, Manuel Proença, op. cit., 2008, pág. 184.
144
AMARAL, Diogo Freitas, História das Ideias Políticas, Volume II, 1997, pág. 76.

88
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

e) É a Primeira Constituição que institui um sistema de garantia judiciária


da constitucionalidade das leis;

f) É a primeira Constituição que comporta uma Declaração de Direito;

g) É a Primeira Constituição a decretar a separação das confissões


religiosas;

3.4.2.2. O Federalismo Norte-Americano

Na actualidade, os Estados Unidos formam uma Federação constituída


por 50 estados federados: aos 13 estados iniciais, foram-se adicionando com o
tempo outros, uns por compra, outros por conquista e outros ainda pela
expansão colonizadora, sendo os Estados mais recentes o Alasca (1958) e o
Hawai (1959).

Tratando-se um Estado Federal, coexiste assim a Constituição do


Estado Federal com as Constituições dos 50 estados federados. 145

A estrutura política de cada estado federal apresenta algumas


características análogas ao desenho constitucional do Estado Federal. Com
efeito, cada estado federal existe um governador (eleito por dois ou quatro
anos), que à imagem do Presidente norte-americano, detém o poder executivo.

Na maioria dos estados, o governador é assistido por vice-governador,


que corresponde ao Vice-presidente da União.

3.4.2.3. Os órgãos constitucionais norte-americanos


145
Os 50 estados dos E.U.A, são: Alabama (capital Montgomery); Alasca (capital Juneau); Arizona
(capital Phoenix); Arkansas (capital Little Rock); Califórnia (capital Sacramento); Carolina do Norte
(capital Raleigh); Carolina do Sul (capital Columbia); Colorado (capital Denver); Connecticut (capital
Harftord); Dakota do Norte (capital Bismark); Dakota do sul ( capital Pierre); Delaware (capital Dover);
Florida (capital Tallahassee); Geórgia (capital Atlanta); Havai (capital Honolulu); Idaho (capital Boise);
Illinois (capital Springfield); Indiana (capital Indianápolis); Iowa (capital Des Moines); Kansas (capital
Topeka); Kentucki ( capital Frankfurt); Louisiana ( capital Baton Rouge); Maine (capital Augusta);
Maryland (capital Annapolis); Massachussets (capital Boston); Michigan (capital Lansing); Minnesota
(capital Saint Paul); Mississipi (capial Jackson); Missouri (capital Jefferson City); Montana (capital
Helena); Nebraska (capital Lincoln); Nevada (capital Carson City); New Hampshire (capital Concord);
New Jersey (capital Trenton); Nova Iorke (capital Albany); Novo México (capital Santa Fé); Ohio
(capital Columbus); Oklahoma (capital Oklahoma City); Oregon (capital Salem); Persilvânia (capital
Harrisburg); Rhode Island (capital Providence); Tennesse (capital Nashville); Texas (capital Austin);
Utah (capital Salt Lake City); Vermont (capital Montpelier); Virgínia (capital Richmond); Washington
(capital Olympia); West Virgínia (capital Charleston); Wisconsin (capital Madison); Wyoming (capital
Cheyenne) e um distrito federal, o District of Columbia, onde se sinta a capital federal Washington D.C. e
um estado Associado, Porto Rico com capital em San Juan.

89
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Os órgãos de soberania na Constituição dos Estados Unidos da América


são: o Congresso da Federação, o Presidente Federal (dos Estados Unidos)
e os Tribunais (Federal). Tais órgãos encontram-se constitucionalmente
definidos consoante os poderes que por eles são exercidos. Assim, o
Congresso exerce o poder legislativo; o Presidente, o poder executivo; e os
Tribunais, o poder judicial.

3.4.2.3.1. O Congresso Federal

O Congresso Federal com sede em Washington, é o Parlamento dos


E.U.A, contendo duas Câmaras (bicamaral): a Câmara alta, o Senado (Senate)
e a Câmara baixa, Câmara dos Representantes (House of Representatives). O
Senado representa os Estados, enquanto que a Câmara dos Representantes
representa todo o povo norte-americano.

3.4.2.3.1.1. Câmara dos Representantes

O número de representantes na Câmara dos Representantes dos


Estados Unidos da América (U. S. House of Representatives) é fixado por lei
e não pode exceder quatrocentos e trinta e cinco (435) membros,
proporcionalmente representando a população de cinquenta Estados da
Federação norte americana, por distritos. Os deputados da Câmara são
eleitos por sufrágio universal e directo em um sistema eleitoral de
representação maioritária e exercem um mandato de 2 anos. 146

Como consequência do sistema adotado nos Estados Unidos da


América, há Estados que elegem apenas um Deputado. Na elaboração de leis,
o membro da Câmara apresenta projeto de lei que é encaminhado a uma
comissão com competência para estudá-lo.

Se aprovado em Comissão, o projeto é levado a plenário, sendo


aprovado por 218 dos 435 votos (maioria simples) e, então, encaminhado ao
Senado, e, se é aprovado por comissão, vai ao plenário, podendo ser
aprovado por 51 dos 100 Senadores (maioria simples).

146
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit., 2008, pág. 225

90
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Por fim, uma comissão formada por membros de ambas as Casas


(Comitê de Conferência) faz a versão final do projeto, que é votada pelas duas
Casas, separadamente. Aprovado o projeto no Congresso, o Presidente tem
dez dias para aprová-lo ou vetá-lo. A Câmara é presidida por um Speaker,
que uma vez eleito por maioria, torna-se também o chefe dessa maioria.

3.4.2.3.1.2. O Senado

O Senado, como já dissemos, é o órgão representativo de todos os


Estados da União, composto por dois senadores de cada Estado o que da um
total de 100 Senadores, independentemente da densidade populacional,
extensão geográfica ou outras condições de natureza económica e financeira.

O mandato de senador tem a duração de seis anos, mas “cada vez que
é eleita uma Câmara de Representantes renova-se um terço do Senado”, pelo
que, “cada senador tem a sua data de início e do fim do mandato, mas existe
uma continuidade garantida para o conjunto, que nunca é totalmente
renovado”.

O Senado é presidido pelo vice-Presidente dos E.U.A e nas suas


ausências, pode ser pode ser substituído pelo presidente pro tempore, eleito
pelas própria Câmara no início da legislatura.

3.4.2.3.1.3. Presidente Federal

O Presidente Federal (PF) o titular do poder Executivo que exerce com


um colégio formado por um Vice-Presidente, secretário de Estado e por um
conjunto de ministro que formam o Executivo Office 147. O Presidente exerce
ainda as funções de chefe de Estado e de governo Federal, O PF é eleito por
um colégio eleitoral (eleito pelo povo), segundo a Constituição, o candidato à
Presidência deve ter pelo menos 35 anos, ser cidadão nato e ter vivido nos
E.U.A por pelo menos 14 anos, o mandato é de 3 anos, podendo o Presidente
exercer apenas 2 mandatos.

147
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 91

91
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

O Vice-Presidente dos Estados Unidos substitui o presidente nas suas


ausências, pode assumir a presidência e a chefia de Federação vacatura
exercendo o mandato até o fim da legislatura, com todos os poderes inerentes
ao cargo.

3.4.2.3.1.3.1. Os Poderes do Presidente

O Presidente da União possuindo imensos poderes é simultaneamente,


Chefe de Estados e de Governo e comandante supremo das forças armadas,
ou seja, o Presidente da União perfila-se como o centro da cena política norte-
americana e o símbolo da unidade nacional.

Na verdade, o Presidente dirige o Gabinete e o Executive Office,


identificando-se com o Poder Executivo, pois não há Governo em sentido
próprio nos Estados Unidos, mais sim uma Administração submetida ao
Presidente148.

Nestes termos, é ao Presidente que compete definir as linhas gerais do


programa governamental, exercer o poder regulamentar, chefiar a
Administração Federal, nomeando e demitindo os funcionários federais,
carecendo, contudo, a nomeação dos altos funcionários federais do acordo
maioritário do Senado, entre os quais se contam o director da C.I.A. e o
Presidente da Reserva Federal (conhecida por FED), que funciona como
Banco Central do país.

O Presidente dispõe ainda da faculdade de nomear livremente os


chamados “cargos de execução pública”, os seus agentes pessoais, que
actuam com seus enviados especiais e a sua staff da Casa Branca.

O Presidente tem ainda a competência de nomear os Juízes do


Supremo Tribunal Federal, o que também carece da confirmação maioritária do
Senado. O Presidente tem o direito de veto face à legislação do Congresso,
isto é, se o Presidente não concordar com um determinado projecto devolvê-lo-
á ao Congresso no prazo de dez dias, excluídos os domingos.

148
MIRANDA, Jorge. op. cit., Tomo I, 1997, p. 154

92
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

O veto só pode ser ultrapassado por uma maioria de dois terços dos
membros presentes em cada Câmara, prerrogativa esta iniciada a partir dos
finais do século XIX, que faz com que o Presidente atrase a produção
legislativa do Congresso, convertendo-se muitas vezes esta sua actuação em
veto absoluto.

O Presidente dispõe igualmente o direito de indulto. Compete também


ao Presidente preservar e defender a Constituição, sendo assim o garante da
unidade da Federação.

Em matérias de política externa, e com o acordo maioritário do Senado


nomeia os cônsules e embaixadores, reconhece os estados e negoceia e
conclui os tratados, sendo depois estes ratificados por maioria de dois terços
dos senadores presentes.

3.4.2.3.1.4. Os Tribunais

Como órgãos jurisdicionais os tribunais Norte Americanos estruturam-se de


acordo com os seguintes critério: Tribunais Federais e Tribunais de Estados 149.

Os Tribunais Federais exercem a justiça Federal e os Tribunais Estaduais,


que exercem o poder judicial nesse Estado, dispondo de um tribunal supremo e
tribunais de segunda e primeira instancia, julgando estas questões civis e
criminais dos seus cidadãos.

Os tribunais Federais classificam-se entre os tribunais Federais de distrito,


que formam a primeira instancia, tribunais de apelação de circuito, de segunda
instancia e o Supremo Tribunal. Assim, cabe ao supremo tribunal dos Estados
garantir o equilíbrio político entre a Federação e os Estados, entre o poder
federal e os órgãos dos Estados Federados, sendo este também o guardião da
Constituição Federal.

3.4.2.4. A Eleição do Presidente dos Estados Unidos

Como já foi salientado o Presidente dos Estados Unidos é eleito por


sufrágio universal e indirecto. O sufrágio é indirecto porque o povo vota para

149
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 91

93
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

um colégio eleitoral e o colégio esse constituído por eleitores (designados por


eleitores presidenciais), que, por sua vez, irão escolher o Presidente dos
Estados Unidos.

O processo de candidatura à Presidência começa muito antes do acto


eleitoral propriamente dito, sendo de facto a nomeação dos candidatos dentro
de cada partido o primeiro passo.

Assim, a nomeação dos candidatos pelos dois grandes partidos (Partido


Republicano e o Partido Democrata) é feita, na sua maioria, após disputa
interna de entre os vários “candidatos à candidatura”, através das chamadas
eleições primárias que se desenrolam durante vários meses, métodos este
que também é adoptado nas nomeações para senadores, representantes,
governadores, mayores (presidentes de câmara) e para membros das
assembleias estaduais dos Estados federados. Este processo surgiu em 1901
na Flórida150.

Nestas eleições, o povo é chamado a pronunciar-se sobre a eleição dos


delegados que na Convenção do partido irão escolher o candidato, número de
delegados que difere de partido para partido em cada estado. Os delegados à
Convenção do Partido são designados de forma diferente nos diversos Estados
federados.

Nestes termos, as eleições primárias podem ser abertas, fechadas e não


partidárias151.

Nas eleições primárias abertas, não é conhecida qualquer filiação


pública dos eleitores. Deste modo, cada eleitor pode votar para os delegados,
assemelhando-se, pois a eleições normais, ou seja, cada eleitor recebe dois
boletins, um democrata, outro republicano, utilizando apenas um deles.

Já nas eleições primárias fechadas, só podem votar os membros do


partido que vai escolher os seus delegados, isto é, os eleitores devem declarar
oficialmente se são democratas ou repúblicanos, sendo a sua filiação no
partido registada pública.

150
CARVALHO, Manuel de Proença, op. cit. 2008, pág. 199.
151
DUVERGER, Maurice, op. cit., 1985, pág. 306

94
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Finalmente, nas eleições primárias não partidárias, um só boletim


contém os nomes de todos os candidatos à nomeação, sem indicar a filiação
partidária.

Quanto ao acto eleitoral propriamente dito, verifica-se em duais fases, a


primeira fase os cidadãos votam normalmente no presidente que pretendem
escolher, mas estes votos não têm nenhuma relevância para a escolha do
Presidente, visto que na história dos E.U.A, por quatro vezes ocorreu que o
candidato eleito presidente não foi o mais votado pela população.

A na segunda fase, cada cidadão, votará nos membros que constituirão


o Colégio Eleitoral. Cada Estado dispõe de um número de eleitores que
corresponde ao número total dos membros do Colégio Eleitoral (também
designados por eleitores presidenciais).

O colégio eleitoral, é constituída por 538 membros (designados de


eleitores presidenciais) que têm como função eleger o Presidente dos E.U.A.

Cada Estado membros disponibiliza um número de membros para


formar o colégio eleitoral, mas também é importante salientar que este numero
vária segundo a densidade populacional de cada Estado membro.

Por exemplo, a Califórnia, o Estado mais populoso dos Estados Unidos,


indica 55 eleitores presidenciais, visto que é este numero corresponde a 2
senadores e 53 deputados da câmara dos representantes; o Texas, que é o
segundo Estado mais populoso, indica 31 (2 senadores mais 29 deputados da
câmara dos representantes).152

Por outro lado, os Estados menos populosos como Alasca, Delaware,


Vermont, Dakota do Norte, Dakota do Sul Montana e Wyoming indicam 3
eleitores presidenciais (1 senador e 2 deputados da câmara dos
representantes). Os restantes estados oscilam entre os 4 e os 17 eleitos. 153

Depois deste todo processo, teremos um total de 435 deputados da


câmara dos representantes e 100 senadores, mais 3 eleitores presidenciais

152
CARVALHO, Manuel de Proença, op. cit. 2008, pág. 203
153
Ibidem, pág. 245

95
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

eleitos distrito de Columbia, somando-as dará um total de 538 (numero total


dos membros do colégio eleitoral).

Os eleitores presidenciais, escolhidos como acabámos de descrever,


reúnem-se na Segunda-feira a seguir à segunda Quarta-feira de dezembro nas
capitais dos seus estados para elegerem separadamente o Presidente e o
Vice-presidente. Vence o candidato que obtiver os votos dos 270 eleitores
presidenciais (metade mais um dos 538 eleitores) e desta feita é eleito
Presidente dos Estados Unidos.

O.B.S: as eleições nos E.U.A, são tão complicadas que nem os próprios
americanos percebem como eles votam.

3.4.2.5. Os Partidos Políticos Norte-Americano – o


bipartidarismo

Nos Estado Unidos existem dois grandes partidos com possibilidade de


assumirem os poderes executivos e legislativos: o Partido Republicano e o
Partido Democrático.

Desta feita, os Presidentes Norte-Americano são oriundos do Partido


Democrático ou Republicano, o mesmo acontece com os Vice-presidentes. De
igual modo, o Congresso está dividido entre o Partido Republicano e o Partido
Democrático, sendo raro aparecer um ou outro independente com
representação parlamentar, ou seja, sem filhação partidária 154.

O mesmo sucede com os governadores e vice-governadores do Estados


federados, ainda que também já tenha havido governadores independentes, e
com o poder legislativo nas câmaras dos Estados federados

A origem histórica do sistema bipartidário remonta às origens Estados


Unidos.

154
Ibidem, pág. 245

96
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

3.4.3. Sistema de Governo Francês

A França adopta o sistema semipresidencialista de governo, sistema de


governo que tem como origem em dois factos históricos: a Revolução
Francesa (iniciada em 1789) estabeleceu uma forte tradição parlamentar no
país, com um papel central atribuído à Assembleia Nacional; o outro, a
importante figura do general Charles De Gaulle (figura importante na
resistência francesa na Segunda Guerra Mundial), isso, levou os franceses a
refletirem sobre o papel que lhe caberia dentro de seu sistema político no pós-
Guerra (anos de 1950).155

Estava claro que De Gaulle tinha que desempenhar um papel importante


no sistema político francês. Visto que a França tinha em vigor o sistema
parlamentarista, ele não poderia ser um chefe de governo (um primeiro-
ministro) porque estaria assim exposto à disputa política cotidiana o que
provavelmente causaria muito desgaste à sua figura. Ele deveria ser, então, um
chefe de Estado, mas seria mero símbolo, sem poder de controlar os rumos
políticos do país.156

Desta forma, em 1958 foi promulgada uma nova Constituição,


consagrando também a V República Francesa, cria assim um sistema político
destinado a dar destaque para De Gaulle. As atribuições do general, como
chefe de Estado, extrapolavam a dimensão simbólica.

Ele coordenava directamente a política externa do país, comandava as


forças armadas francesas e ainda tinha à sua disposição meios para intervir em
caso de crises políticas. Um desses meios de intervenção é o poder de
dissolver a Assembleia Nacional, poder que não existe em nenhum sistema
presidencialista ou parlamentarista. 157

Todos esses poderes tornaram o sistema de governo francês um híbrido


entre parlamentarismo e presidencialismo. Nestes termos, nasceu o
Semipresidencialismo na França.

155
POLITIZE, op. cit., 2017, pág. 29
156
Ibidem, pág. 27
157
Ibidem, pág. 27

97
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

De toda história constitucional francesa, está conta até hoje com 14


constituições. Constituições de 1791; 1793; 1795; 1799; 1802; 1804; 1804;
1814; 1830; 1848; 1852; 1870; 1875; 1946 e 1958.

3.4.3.1. Os órgãos constitucionais da 5ª República


Francesa

A Constituição estabelece os seguintes órgãos do Estado da 5ª


República Francesa: o Presidente da República, o Governo, o Parlamento
(bicameral), formado pela Assembleia e o Senado, o Conselho Constitucional
e o Alto Tribunal de Justiça ou Alta Corte de Justiça.

3.4.3.1.1. O Presidente da República

O Presidente da República é chefe de Estado e Comandante em chefe


das Forças Armadas Francesas. Exerce também determinadas funções
executivas atribuídas por força da Constituição. É eleito por 5 anos renováveis
sem limite, isto é, através de sufrágio universal e directo, pelos cidadãos
franceses.

A eleição para o cargo de Presidente da República não tem limitação de


mandatos. Em concretos, o Presidente da República desempenha amplos
poderes constitucionais que fazem dele uma figura preponderante na política
francesa.158

Quantos a estes poderes atente-se, nomeadamente, os seguintes 159:

a) Garantir a independência nacional;


b) Vigia o cumprimento da Constituição, pelo que tem igualmente o
poder de a interpretar;
c) Assegurar o funcionamento dos poderes públicos e do Estado;
d) Nomeia o Primeiro-Ministro, não sendo para o feito obrigado a
consultar os partidos com assento parlamentar;
e) Põe termo às funções do Primeiro-Ministro, depois deste lhe
apresentar voluntariamente a sua demissão, não podendo, no

158
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 95
159
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit., 2008, pág. 277

98
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

entanto, teoricamente demitir livremente o Primeiro-Ministro,


apesar desta regra se encontrar subvertida como veremos de
seguida;
f) Preside ao Conselho de Ministro;
g) Assina os decretos-leis e os decretos aprovados em Conselho de
Ministros, pelo que a sua recusa em os assinar se configura
como um verdadeiro direito de veto, faculdade esta que a
Constituição não prevê expressamente;
h) Tem poder real de dissolver a Assembleia Nacional, precedendo
consulta do Primeiro-Ministro e dos Presidentes da Assembleia
Nacional e do Senado, ainda que não possa recorrer ao direito
de dissolução duas vezes no mesmo ano, nem dissolver a
Assembleia durante a vigência do exercício de poderes
excepcionais, consagrados no artigo 16.º da Constituição.
i) É o comandante das Forças Armadas, presidindo nessa
qualidade aos conselhos e comissões de defesa nacional;
j) Sob proposta do Governo ou sob proposta conjunto das duas
câmaras, pode submeter a referendo a qualquer projecto-lei
relativo à organização dos poderes públicos ou destinado a
autorizar a ratificação de um tratado que, sem ser contrário à
Constituição, tenha incidência no funcionamento das instituições;
k) Se o refendo tiver como resultado a aprovação de um projecto, o
Chefe de Estado promulgá-lo-á no prazo de 15 dias;
l) É chefe da diplomacia, tendo o poder de negociação e de
ratificação dos Tratados, sendo o garante do respeito deste, bem
como o direito de ser informado no respeitante às negociações
destinadas à celebração de qualquer acordo internacional não
sujeito a ratificação;
m) Dispõe do direito de mensagem fase às duas Câmaras do
Parlamento, mensagens essas que não podem ser objecto de
debate;
n) Nomeia funcionários civis e militares do Estado, nomeadamente,
Conselheiros do Estado; O Grande Chanceler da Legião de

99
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Honra; Embaixadores e Enviados Extraordinários; Conselheiros


do Tribunal de Contas; Prefeitos; Oficiais-Generais; Reitores da
Academia; Directores das Administrações Central, etc.;
o) Nomeia três membros do Conselho Constitucional, entre os quais
o seu presidente;
p) Dispõe de iniciativa de revisão constitucional, em concorrência
com o Parlamento, sob proposta do Primeiro-Ministro;
q) Preside ao Conselho Superior da Magistratura, órgão que assiste
no exercício das suas funções de garante da independência do
poder judicial;
r) Pode indultar e comutar penas, entre outros.

3.4.3.1.2. O Governo

O Governo tem responsabilidade politica perante o Parlamento pela


determinação e execução das políticas e pelos serviços administrativos.

O Primeiro-Ministro é o Chefe do Governo, sendo responsável pela


condução e determinação da política da nação 160. O Governo é formado
também pelos Ministros e pelos Secretários de Estados.

No tocante a responsabilidade política, o Governo é responsável


politicamente perante a Assembleia Nacional, ou seja, o Governo pode ser
derrubado mediante a aprovação de uma moção de censura na Assembleia
Nacional ou a rejeição de uma moção de confiança nesta última Câmara.

No que toca ao papel do Primeiro-Ministro, Jean Gicquel 161, sistematiza-


as em dois: como empreendedor político e como empreendedor jurídico.

Como “empreendedor político”, incluir-se-iam as suas funções de


animador do governo, chefe da administração, chefe da maioria parlamentar
(em nome do Presidente ou da sua própria, consoante o Presidente seja afim
ou não da maioria governativa) e colaborador do Presidente. 162

160
Veja: o artigo 10.º da Constituição Portuguesa
161
GICQUEL, Jean, Droit Constituionel et Institutions Politiques, 1999, pág. 596 apud CARVALHO, Manuel
Proença de, op. cit., 2008, pág. 283 e 284.
162
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit., 2008, pág. 284

100
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Na qualidade de “empreendedor jurídicos”, enquadram-se o poder de


iniciativa de lei, o poder de iniciativa de lei, o poder de iniciativa regulamentar e
o poder de nomeação dos funcionários civis e militares, salvos a excepção dos
mencionados no artigo 13.º da Constituição Francesa. 163

No âmbito das competências do Governo, vislumbram-se ainda 164:

a) Propor ao Presidente da República – numa iniciativa concorrente


com o Parlamento – a submissão a referendo de qualquer projecto
de lei relativo à organização dos poderes públicos ou destinado a
autorizar a ratificação de um tratado que, sem ser contrário à
Constituição, tenha incidência no funcionamento das instituições;

b) Na circunstância das duas câmaras não chegarem a acordo


relativamente a um projecto ou proposta de lei e ao cabo de duais
deliberações em cada uma delas ou quando ou quando governo
declarara sua urgência, o Primeiro-Ministro terá a faculdade de
formar uma comissão paritária, composta por membros
designados pelas duas Assembleia;

c) Compete também ao Primeiro-Ministro e aos ministros


relativamente a determinados actos, referendar certos actos do
Presidente;

d) O Governo detém ainda os seguintes poderes excepcionais:


decretar o estado de sítio e o estado de emergência, sendo o
respectivo decreto assinado pelo Chefe de Estado, assim como
recorrer ao artigo 38.º da Constituição. Neste último caso, o
Governo pode solicitar ao Parlamento autorização para, mediante
decretos-leis, e durante um prazo limitado, tomar medidas que
pertencem ao domínio da lei (delegação do poder legislativo),
sendo estes decretos-leis aprovados em Conselho de Ministros,
precedendo parecer do Conselho de Estado, mecanismo
constitucional que já foi utilizado algumas dezenas de vezes;

163
Ibidem, pág. 284 e 285
164
Ibidem, pág. 285

101
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

No caso particular, os Ministros gozam dos seguintes poderes 165:

- Dirigem a Administração subordinada à sua autoridade;

- Fixam as regras de organização e de funcionamento dos seus serviços:

- Precedendo delegação do Primeiro-Ministro, nomeiam os funcionários


dos seus serviços com a excepção das nomeações que pertencem à área
conjunta do Presidente da República e do Primeiro-Ministro;

- Como já referimos, exercem a referenda ministerial relativamente às


decisões do Presidente da República e do Primeiro-Ministro respeitantes às
suas competências;

- Fixam as despesas de pessoal de cada Ministério.

3.4.3.1.3. O Parlamento Francês

O Parlamento, detentor do poder legislativo, é bicameral composto pela


Assembleia Nacional e o Senado.

A Assembleia Nacional é a câmara baixa, o órgão com maiores poderes,


é composta por 577 Deputados eleitos por um mandato de 5 anos, eleitos por
sufrágio directo e universal em sistema de representação maioritária de duas
voltas, estado fixada nos 23 anos a idade mínima para se pode ser eleito
deputado.166

A Assembleia Nacional representa os cidadãos franceses e dispõe de


competências legislativa, de controlo e de fiscalização 167.

Já o Senado, órgão representativo das colectividade territoriais, que


integra 346 senadores, designados por colégio eleitoral de deputados,
conselheiros regionais e os delegados dos conselheiros municipais, por 6
anos168.

165
Ibidem, pág. 286
166
Ibidem, pág 287
167
MACHADO, Jónatas E. M; COSTA, Paulo Nogueira & HILÁRIO, Esteves Carlos, op. cit., 2013, pág 232
168
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 96

102
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

O Senado tem legitimidade democrática indirecta, funcionando como um


órgão localista e de controlo169.

3.4.3.1.4. Conselho Constitucional

O Conselho Constitucional te como atribuições, entre outras, julgar a


constitucionalidade dos diplomas e dos tratados 170.

Segundo o artigo 56.º da Constituição Francesa, o Conselho


Constitucional compreende nove membros, cujo mandato dura 9 anos e não é
renovável. O conselho Constitucional se renova por terços a cada três anos,
três dos membros são nomeados pelo Presidente da República, três pelo
Presidente da Assembleia Nacional e três pelo Presidente do Senado.

Além dos nove membros previstos acima, fazem legalmente parte do


Conselho Constitucional os ex-presidentes da República em caráter vitalício. O
Presidente do Conselho Constitucional é nomeado pelo Presidente da
República.

O Conselho Constitucional funciona ainda como Tribunal Eleitoral,


vigiando a regularidade das eleições do Presidente da República, deputados e
senadores em caso de controvérsia. Aprecia também as reclamações e
proclama os resultados dos escrutínios e a regularidade dos referendos.

Por outro lado, pronuncia-se sobre os impedimentos temporário ou


definitivos do Chefe de Estado, sendo neste caso as funções do Presidente da
república, com algumas excepções (convocação de referendo e dissolução da
Assembleia das República Nacional), exercidas provisoriamente pelo
Presidente do Senado, assim como sobre as incompatibilidades dos
parlamentares171.

3.4.3.1.5. O Alto Tribunal

Salienta Manuel Proença de Carvalho que, até à revisão constitucional


de 2007, este órgão era composto por vinte e quatro juízes titulares e doze
169
MACHADO, Jónatas E. M; COSTA, Paulo Nogueira & HILÁRIO, Esteves Carlos, op. cit., 2013, pág 232
170
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit., 2008, pág. 307
171
Ibidem, pág. 307

103
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

suplentes, após 2007, devido a destituição do Presidente do Alto Tribunal por


violação dos seus deveres, o Alto Tribunal, é presidido pelo Presidente da
Assembleia Nacional.

O Alto Tribunal de Justiça tem como função julgar o Presidente da


República e os ministros por acusação de violação da Constituição ou alta
traição.

3.4.4. Sistema de Governo Português

A história política e constitucional portuguesa experimentou, desde o


início do séc. XIX, e ao longo dos templos, dois regimes de governo a começar
pelo absolutismo monárquico, com variações até 1910, e a instauração do
Republicanismo nesse ano, tendo registado a vigência de 6 Constituições
(1822, 1826, 1838, 1911, 1933 e 1976)172.

3.4.4.1. A Constituição de 1976

Foi graças ao golpe militar desencadeado pelo Revolução dos Cravos


em 25 de Abril de 1974, que Portugal conduziu a vigência da Constituição de
1976, aprovada a 2 de Abril desse ano, pondo fim ao império do Regime do
Estado Novo173.

A Revolução de Abril propôs-se implementar três objectivos que


passavam por: democratização do país, através da realização de eleições
livres com a participação de partidos políticos e com exercício de todos os
direitos políticos, num clima de pluralismo político e social; descolonizar os
territórios africanos de Portugal, pondo termino à soberania portuguesa que
neles se exercia; e desenvolver a economia, possibilitando a sua recuperação
do atraso que a caracterizava e aproximando-a do contexto europeu de
sofisticado Estado social.174

Com a democratização da política portuguesa decorrente da revolução


dos Cravos, a Constituição de 1976 é a Constituição vigente actualmente.
172
Para melhor compreensão leia o manual de Ciência Política e Sistema de Políticos e Constitucionais do
professor Manuel Proença de Carvalho da pág. 309 a 325.
173
GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual…, I, pág 482 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 99
174
Ibidem, pág. 100

104
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Desde a sua aprovação e entrada em vigor, o texto constitucional foi sujeito a


várias revisões (até ao momento registam-se 7 revisões da Constituição )175.

3.4.4.2. Órgãos de Soberania Portuguesa

A Constituição Portuguesa estabelece quatro Órgãos de Soberania, a


saber: o Presidente da República, a Assembleia Nacional, o Governo e os
Tribunais, definindo-se um sistema de governo misto parlamentar-presidencial
ou semipresidencialista com pendor parlamentar, tendo características que o
distingue do sistema parlamentar, presidencial e semipresidencial puro.

Dito de outro modo, não podemos considerar o sistema de governo de


Portugal parlamentarista, porque o Chefe de Estado português afasta-se de
qualquer papel passivo ou meramente simbólico na governação de Portugal.

Não é presidencialista, pelo simples facto, do Poder Executivo português


ser dualista, ou seja, ser partilhado entre o Presidente da República e o
Primeiro-Ministro, situação esta que não acontece em nenhum país com um
sistema de governo presidencialista.

Também não é semipresidencial puro, porque o Presidente da República


português não tem poderes executivos como no semipresidencialismo francês.

Sendo assim determinados autores epilogaram o sistema de governo


português como, um sistema de governo misto parlamentar-presidencial ou
semipresidencialista com pendor parlamentar.

3.4.4.2.1. Presidente da República

Segundo a Constituição República Portuguesa (CRP), o Presidente da


República é o chefe de Estado e Comandante Supremo das Forças Armadas
Portuguesas, garantido a independência nacional, a unidade do Estado e o
regular funcionamento das instituições de democráticas (art.º 120.º). É eleito

175
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág 100

105
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

por sufrágio universal directo para um mandato de 5 anos, podendo ser reeleito
uma vez.

O Presidente da República ainda tem amplos poderes constitucionais,


podendo demitir o Governo, exonerar o Primeiro-Ministro e dissolver o
Parlamento, convocando eleições antecipadas nos termos das als. e) e g) do
art.º 133.º da CRP.

3.4.4.2.1.1. O Presidente da República e o seu Papel na


Governação de Portugal

Os poderes do Presidente da República portuguesa estão


inequivocamente mais próximos aos poderes de um Presidente no sistema
parlamentar, pois, o Presidente Português não governa, mas representa um
equilíbrio político das instituições, isto é, a luz do artigo 120.º da CRP 176.

O Presidente da República também não tem poderes executivos ou


programa partidário a que irá submeter ao Governo, não podendo também dar
ordens ou instruções a este órgão de soberania, seja o Primeiro-Ministro, seja
aos ministros individualmente considerados ainda que não esteja impedido de
dar sugestões. Nessa medida, não preside ao Conselho de Ministros [apenas
preside ao Conselho de Ministros, quando o Primeiro-Ministro lho solicitar e o
PR aceder ao convite, nos termos da alínea i) do art.º 133.º da CRP, o que na
prática nunca acontece]. Daí, uma grande diferença face ao Presidente
Francês177.

Entretanto, não podemos atribuir-lhe também um papel passivo, pois o


Chefe de Estado português afasta-se de qualquer papel meramente simbólico
ou forma atribuído aos chefes de Estado dos Sistemas de Governo
parlamentares, ou mesmo de alguns dos Presidentes dos sistemas de
governos semipresidencialistas com poderes pouco relevantes.

Na verdade, o Presidente português desempenha funções políticas de


grande relevância, sendo os seus poderes reais, revestidos a forma de
decretos dos muitos actos políticos do PR, ainda que a CRP só lhes faça
176
Constituição da República Portuguesa
177
CARVALHO, Manuel Proença de, op. cit., 2008, pág. 353

106
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

referência na alínea d) do n.º 1 do artigo 119.º e no n.º 2 do artigo 172.º da


CRP.

O Presidente português goza ainda de dois poderes muito importantes, a


saber, o poder de dissolução da Assembleia da República e o poder de
demissão do Governo.

O poder de dissolução da Assembleia da República, é um poder


autónomo e não condicionado (a opinião dos partidos políticos representados
na AR e do Conselho de Estado sobre o acto de dissolução não é vinculativa),
não estando dependente de proposta ou de concordância do Governo, nem
sujeito a referenda ministerial, apenas estando condicionado a limites de ordem
temporal ou de limitação decorrente de uma situação de emergência
constitucional, isto é a Assembleia da República não pode ser dissolvida nos
seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do
Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou de
emergência [alínea e) do artigo 133.º e n.º 1 do artigo 172.º da CRP]178.

Em consequência, o Presidente da República é livre de dissolver uma


Assembleia e convocar eleições para uma nova Assembleia da República
(logo, é tão importante para ele o poder de dissolver como de não dissolver),
seja para resolver uma crise política, seja para procurar no seu entender uma
melhor solução, ou não maioria absoluta de um partido ou bloco partidário 179.

Relativamente ao poder de demissão do Governo, o Governo é


responsável perante o Presidente da República [al. g) do art.º 133.º; 190.º; n.º 1
do art.º 191.º e n.º 2 do art.º 195.º da CRP], anotando-se aqui que não se trata
de uma responsabilidade política stricto sensu, visto que o Chefe de Estado
não pode invocar razões políticas para demitir o Governo, mas apenas o pode
fazer quando tal se torne necessário para assegurar o regulamento e o
funcionamento das instituições democráticas, ouvindo o Conselho de Estado
(parecer não vinculativo)180.

178
Ibidem, pág. 353
179
Ibidem, pág. 354
180
Ibidem, pág. 354

107
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Face a tudo que foi exposto, chegamos a ilação, que o Presidente


português não tem um papel activo e muito menos passivo na governação de
Portugal, isto é, por razões que já expusemos acima.

Desta forma, podemos atribui-lhe um papel meramente equilibrado, no


que toca a governação de Portugal.

3.4.4.2.2. Assembleia da República

A Assembleia da República é o órgão representativo de todos os


cidadãos portugueses, isto é, à luz do artigo 147.º da CRP. Exerce o poder
legislativo e serve de suporte ao Governo a quem pode votar uma moção de
confiança, ou derrubá-lo por uma moção de censura, nos termos da al. e) do
art.º 163.º da CRP.

A Assembleia da república é composto por 230 Deputados de acordo


com o art.º 148.º, só podendo candidatar aqueles, inscritos ou não em partidos,
integrem listas partidárias (n.º 1 do artigo 151.º da CRP).

Os Deputados são eleitos através do sistema de representação


proporcional e o método da média mais alta mais alta de Hondt (n.º 1 do art.º
149.º da CRP), a legislatura tem duração de quatro anos (n.º 1 do art.º 174.º da
CRP).

O Presidente da A.R. é eleito por maioria absoluta dos Deputados em


efectividade de funções [alínea b) do art.º 175.º da CRP], competindo-lhe,
nomeadamente, assegurar a substituição interina do Presidente da
República durante os impedimentos temporário deste, bem como durante
a vacatura do cargo até tomar posse o novo Presidente eleito (artigo
132.º da CRP) e exercer (a par de outras entidades) a iniciativa de
fiscalização sucessiva de constitucionalidade e de legalidade de normas
jurídicas [alínea b) do n.º 2 do artigo 281.º da CRP].

Para além de o Parlamento representar todos os cidadãos, os


Deputados representam todo o país e não os círculos por que são eleitos (n.º 2
do artigo 152.º da CRP), o que configura a existência de um mandato

108
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

representativo ou livre, em que os Deputados podem tomar livremente


decisões em nome da Nação, não podendo receber instruções dos seus
eleitores (como acontece com o mandato imperativo em que o Deputado é um
simples mandatário181

Assembleias da República tem também poder constituinte derivado


[alínea a) do artigo 161.º e artigos 284.º a 289.º], na medida em que aprova
alterações à Constituição, competências políticas [alíneas j), m) e n) do artigo
161.º e alíneas a), b), c), f) e i) do artigo 163.º da CRP], competências
legislativas [alíneas b), c), d), g) e o) do artigo 161.º e artigos 164.º e artigo
165.º, da CRP, respetivamente, competência absoluta quando as não pode
delegar e relativas, quando as pode delegar no Governo], entre outras
competências182.

3.4.4.2.3. O Governo

O Governo é o órgão competente do exercício do poder executivo.


Define-se como o órgão superior do Estado soberano que tem por missão
definir e executar as políticas públicas nacionais, sendo também o órgão
superior da Administração (art.º 182.º da CRP).

O Governo é composto pelo Primeiro-Ministro, pelos Ministros e pelos


Secretários e Subsecretários de Estado (n.º 1 do artigo 183.º da CRP). O
Primeiro-Ministro sendo chefe de governo é o elemento máximo dentro do
Governo, a ele compete escolher os Ministros e dirigir a política geral do
Governo [n.º 2 do artigo 187.º e alínea a) do n.º 1 do artigo 201.º da CRP] 183.
Politicamente o Governo é responsável perante o Presidente da República e a
Assembleia da República (art.º 190.º da CRP).

3.4.4.2.4. Os Tribunais

Os tribunais exercem o poder judicial, é a eles competem administrar a


justiça em nome do povo (n.º 1 do artigo 202.º da CRP).

181
Ibidem, pág 363.
182
Vide os artigos 162.º, 163.º e 161.º da CRP
183
Ibidem, pág. 366

109
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Cabe também, assegurar a defesa dos direitos, reprimir a violação da


legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados
(n.º 2 do artigo 202.º da CRP). Os tribunais são independentes (art.º 203.º da
CRP), estando somente subordinados à lei (artigo 203.º da CRP). Os juízes
são irresponsáveis pelas suas decisões jurídicas e a inamovibilidade (n. os 2 e 1
do artigo 216.º da CRP).

No topo da pirâmide está o Tribunal Constitucional, que fiscaliza a


Constitucionalidade das leis – podendo declarar qualquer lei ou parte dela
inconstitucional.

Outros categorias de tribunais dispõem-se do seguinte modo 184:

- O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais de primeira e de segunda


instância;

- O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais


administrativos e fiscais;

- O Tribunal de Contas.

3.4.5. Sistema Constitucional Brasileiro

Esmiuçaremos de uma forma sucinta sobre Sistema Constitucional


Brasileiro.

A actual Constituição do Brasil a de 1988, consagra três órgãos dos


poderes do Estado, a saber: o Congresso Nacional, órgão bicamaral com
uma Câmara dos Deputados e o Senado Federal, exercendo o poder
legislativo; o Presidente, o Vice-Presidente e o Governo Federal, exercendo
o poder executivo; e o Supremo Tribunais, que obedecem uma estrutura
hierárquica.

No que concerne ao exercício do poder legislativo, como vimos é


exercida pelo Congresso Nacional, composta pela Câmara dos Deputados
eleita para uma legislatura com a duração de 4 anos (art.º 44.º), com um
número de deputados não superior a 513 Deputados. De modo Semelhante o

184
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág 103

110
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Senado Federal, com 81 senadores cumpre um mandato de 8 anos, nos


termos do artigo acima referido185.

No tocante ao Poder Executivo, o art.º 76.º da CB define: o Poder


Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelo Vice-
Presidente e pelos Ministros de Estados, quanto à eleição, o art.º 77.º da CB
refere que a eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República realizar-
se-á simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno e,
no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior
ao término do mandato presidencial vigente 186.

O sistema de governo designa-se como presidencialismo, visível nas


seguintes características: junção na mesma pessoa dos cargos de Chefe de
Estado e Chefe de Governo; eleição por sufrágio universal e directo do Chefe
de Estado; subsistência independente dos poderes legislativo e executivo, não
obstante os múltiplos pontos de contacto e de colaboração 187.

O Poder Judicial, o art.º 92.º da Constituição Brasileira define como seus


órgãos os seguintes:

- o Supremo Tribunal Federal;

- o Conselho Nacional de Justiça;

- Supremo Tribunal de Justiça;

- os Tribunais e Juízes Eleitorais;

- os Tribunais e Juízes Militares;

- os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territorial.

3.5. Sistema de Governo de Angola

O Estado Angolano é uma República unitária (art.º 1.º e 8.º da CRA)


com um sistema de governação de presidencialismo-parlamentar ou
presidencialismo atípico. Angola é uma República porque o poder Soberano é
185
Ibidem, pág. 104
186
Ibidem, pág 105
187
Gouveia, Jorge Bacelar. As Constituições dos Estados de Línguas Portuguesas, Almedina, Coimbra,
2006, pág. 14 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág 105.

111
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

exercido pelo povo (art.º 3, nº 1 da CRA), pelo qual, devido a sua densidade
demográfica e extensão territorial, delega representantes, através de um
sufrágio Universal (art.º 4.º, nº 1 da CRA).

É unitária, porque é caracterizado pela unicidade de poder, ou seja, há


apenas um centro de decisões e funções políticas que é representado pela
figura do Governo central (o Presidente da República). Dito de outro modo,
todo país está sujeito a uma autoridade única, sem limitações impostas por
outra fonte de poder (perspetiva politica).

O Estado unitário, é regido por uma única lei que provem dos órgãos de
soberania com competências para tal (Presidente da Republica e a Assembleia
Nacional), isto pressupõe a dizer, que nenhuma província tem autonomia e
muito menos tem autoridade para criar as suas próprias leis (perspetiva
territorial).

E é presidencialista-parlamentar, pelos pontos a destacar:

a) O Presidente da República tem legitimidade democrática (é eleito por


sufrágio universal directo, secreto, igual, periódico, nas listas de
Partidos e Coligações de Partidos concorrentes às eleições gerais,
nos termos do artigo 109.º da CRA;
b) A Assembleia Nacional (Parlamento) tem, igualmente, legitimidade
democrática (art.º 141.º da CRA);
c) Há um controlo recíproco e interferência recíproco entre o Presidente
da República e o Parlamento (mecanismo conhecido como cheks
and balaces, também designado de freios e contrapesos, nos termos
do art.º 105.º n.º 3 da CRA);
d) Pelo relacionamento exacerbado entre o Parlamento e o Presidente
da República, no que toca, o OGE, o dever de audição da
Assembleia Nacional, no exercício de determinados poderes pelo
Presidente da República e a obrigação de submissão à Assembleia
Nacional dos decretos legislativos presidenciais provisórias ;

Com base aos requisitos supracitados, podemos concluir que o Estado


Angolano tem um sistema de governo próprio que muitos doutrinadores

112
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

denominam de presidencialista-parlamentar ou ainda presidencialismo atípico,


pelo simples facto de haver uma colaboração dependência exacerbada entre o
Poder Legislativo e o Poder Executivo.

3.5.1. Órgãos de Soberania

Com base na CRA nos termos do art.º 105.º, nº 1, os órgãos de


soberania são: o Presidente da República, a Assembleia Nacional e os
Tribunais, mas apenas os dois primeiros integram o sistema de governo.

3.5.1.1. O Presidente da República

O Presidente da República tem o papel activo na governação, sendo


Chefe de Estado, representado institucionalmente a República de Angola e
ainda, o titular do Poder Executivo e o Comandante-em-chefe das Forças
Armadas Angolanas (art.º 108.º, n.º 1, da CRA).

O PR é o garante da unidade nacional. Da independência e da integridade


territorial do País e representa a Nação no plano interno e internacional, sendo
por inerência, Comandante Supremo das Forcas Armadas 188 (art.º 108.º, n.º 4,
da CRA).

O Presidente da República é designado por sufrágio universal e directo


(art.º 106.º e 143.º, n.º 1, da CRA), sendo eleito como tal o cabeça de lista do
partido político (ou coligação de partidos políticos) mais votado no quadro das
eleições gerais (art.º 109.º, n.º 1, da CRA) ; o número dois da lista mais votada
é eleito Vice-Presidente da República (art.º 131.º, n.º 2, da CRA); o mandato é
de cinco anos (art.º 113.º, n.º 1, da CRA) podendo cada cidadão exercer até
dois mandatos (art.º 113.º, n.º 2, da CRA).

O Presidente da República não é responsável pelos actos praticados no


exercício das suas funções (art.º 127.º da CRA), salvo no caso de traição à
pátria e outros crimes definidos na Constituição como imprescritíveis e
insusceptíveis de amnistia.

188
MACHADO, Jónatas, e outros, Direito Constitucional Angolano, 2013, pp. 245.

113
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

Em caso de crise grave, o Presidente da República pode auto-demitir-se,


o que acarreta a dissolução da Assembleia Nacional e a convocação de
eleições gerais antecipadas (art.º 128.º da CRA) em caso de vacatura do
cargo, as funções são assumidas pelo Vice-Presidente, o qual cumpre o
mandato até ao fim, com a plenitude dos poderes (art.º 132.º, n.º 1, da CRA)

3.4.1.1.1. Competências como Chefe de Estado

O Presidente da República dispõe de competências na qualidade de


chefe de Estado, que abrangem, designadamente poderes para convocar
eleições e referendos; dirigir mensagens à Assembleia Nacional; promover
processos de fiscalização abstrata da Constituição; nomear e exonerar os
titulares de certos cargos; promulgar e mandar publicar a Constituição, as Leis
de revisão constitucional e as leis da Assembleia Nacional; indultar e comutar
penas; conferir condecorações e títulos honoríficos; presidir ao Conselho da
República; declarar o estado de guerra e fazer a paz, bem como declarar o
estado de sítio e o estado de emergência, com prévia audição da Assembleia
Nacional (art.º 119.º da CRA).

O Presidente da República tem ainda o poder de veto político e de veto


jurídico.

O poder de veto político tem inerente numa dimensão de direção política


[art.º 120.º, al. a), da CRA], na medida em que permite ao Presidente da
República remeter à Assembleia Nacional o diploma que lhe tiver sido
submetido para promulgação, com base numa apreciação pessoal e política do
mérito, da conveniência e da oportunidade do diploma (art.º 124.º, n.º 2, da
CRA).

Trata-se, como tal, de um veto subjectivo de natureza facultativa, que


não tem carácter definitivo. Isto significa que a Assembleia Nacional pode
superar o veto do Presidente da República, mediante uma aprovação do
diploma por maioria de 2/3 dos Deputados (art.º 124, n.º 3, da CRA).

Deferente do veto jurídico que se consubstancia no veto por


inconstitucionalidade (art.º 229, n.º 2, da CRA), que manifesta a autoridade das
decisões do Tribunal Constitucional que se pronunciem no sentido da
114
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

inconstitucionalidade de uma norma em sede de fiscalização abstrata


preventiva da constitucionalidade. Por esse motivo é um veto objectivo,
obrigatório e definitivo (art.º 229.º, n.º 3, da CRA).

3.4.1.1.2. Competência como Titular do Poder Executivo

Nas vestes de titular do Poder Executivo, compete, em geral ao


Presidente da República definir a orientação do País e a política geral de
governação [art.º 120.º, als. a) e b), da CRA]. Nesta qualidade, cabe-lhe,
também, dirimir os serviços e actividade da Administração directa do Estado,
civil e militar, superintender a Administração e exercer a tutela sobre a
Administração autónoma [art. 120.º, al. d), da CRA).

Compete igualmente ao Presidente da República definir a orgânica e a


composição do Poder Executivo, bem como definir a orgânica dos diverso
Ministros e estabelecer a números e designação dos Ministros [art. 120.º, als.
e), f) e g), da CRA]. Cabe ao Presidente da República convocar o Conselho de
Ministros e presidir às suas reuniões, tal como fixar a respetiva agenda de
trabalhos [art.º 120.º al. j), da CRA].

É também da competência do Presidente da República dirigir e orientar


a ação do Vice-Presidente, dos Ministros de Estado e dos Governadores de
Províncias. O Presidente da República dispõe, ainda, de competências no
domínio normativo, designadamente a de submissão à Assembleia Nacional da
proposta de lei do Orçamento Geral do Estado, as de solicitação à Assembleia
Nacional de autorização legislativa e respetivo exercício e, finalmente, a de
elaboração de regulamentos indispensáveis à boa execução das leis [art.º 120.º,
als. c), h), i) e l), da CRA].

3.4.1.1.3. Órgãos Auxiliares do Presidente da República

No exercício das funções, o Presidente da República dispõe do auxílio


de três órgãos constitucionais: o Conselho de Ministros, o Conselho da
República e o Conselho de Segurança Nacional.

115
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

O Conselho de Ministros é o órgão auxiliar do Presidente da República


do domínio da formação e execução da política geral do País e da
Administração Pública (art.º 134.º, n.º 1, da CRA).

O Conselho da República, por seu lado, é o órgão colegial de natureza


consultiva do Chefe de Estado (art.º 135.º, n.º 1, da CRA).

Finalmente o Conselho de Segurança Nacional é o o órgão consultivo do


Presidente da República em matéria de condução da política e estratégia de
segurança nacional, bem como de organização, funcionamento e de disciplina
das Forças Armadas, da Polícia Nacional e demais organismos de garantia da
ordem constitucional e dos órgãos de inteligência e de segurança de Estado
em particular (art.º 136.º da CRA).

3.5.1.2. A Assembleia Nacional

A Assembleia Nacional é um órgão unicameral, representativo de todos


os angolanos, que exprime a vontade soberana do povo e exerce o poder
legislativo do Estado (art.º 141.º, n.º 2 da CRA).

Assembleia Nacional (parlamento unicameral) é composta por 220


Deputados [130 eleitos pelo círculo nacional e 90 eleitos pelos 18 círculos
eleitorais provinciais (art.º 144.º, n.º 2, da CRA)], eleitos segundo o sistema de
representação proporcional para um mandato de cinco anos (art.º 143.º, n.º 2,
da CRA).

No dizer de Jonatas Machados e outros “A Assembleia Nacional é um


órgão de soberania autónomo, colegial, permanente e unicameral, com
poderes de representação nacional”. A autonomia deste órgão traduz-se no
direito de autoreunião que lhe é reconhecido. A colegialidade significa que se
trata de um órgão onde as decisões são tomadas por maioria 189.

A Assembleia Nacional tem caráter permanente, traduzindo-se numa


continuidade institucional. Esta permanência como órgão constitucional de
soberania não fica prejudicada pelos elementos de descontinuidade material

189
MACHADO, Jónatas E. M; COSTA, Paulo Nogueira de; HILÁRIO, Esteves Carlos, op. cit., 2013, pág. 253

116
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

(descontinuidade legislativa) e de descontinuidade pessoal (concretizada na


renovação periódica dos Deputados em resultado do sufrágio) 190.

A unicameralidade implica a rejeição de câmaras de pares, de


senadores e de interesses corporativos. E por fim a representação nacional
significa que os Deputados não representam especificamente os interesses dos
círculos eleitores em que são eleitos, mas sim toda a nação angolana (art.º
147.º da CRA)191.

Os Deputados podem abandonar o partido político a que pertencem sem


perder o mandato de Deputado, embora não possam mudar de partidos
durante o exercício do mandato.

Um importante órgão da Assembleia Nacional é a Comissão


Permanente. Esta Comissão funciona fora do período de funcionamento
efectivo da Assembleia nacional; entre o termino de uma legislatura e o inicio
de outra; nos demais casos previstos na Constituição e na Lei (art.º 156.º da
CRA).

Nos termos do art.º 156.º, n.º 2, da CRA, a Comissão Permanente é


presidida pelo Presidente da Assembleia Nacional, integrado ainda: os Vice-
Presidentes da Assembleia Nacional; os Secretários de Mesa; os Presidentes
dos Grupos Parlamentares; os Presidentes das Comissões Permanentes de
Trabalha; o Presidente do Conselho de Administração; a Presidente do Grupo
das Mulheres Parlamentares; doze Deputados na proporção dos assentos
parlamentares.

Ainda nos termos do art.º 156.º, n.º 3, da CRA, são competências da


comissão Permanente: exercer os poderes da Assembleia Nacional
relativamente ao mandato dos Deputados; preparar a abertura das sessões
legislativas; convocar extraordinariamente a Assembleia Nacional, quando haja
a necessidade de analisar assuntos específicos de carácter urgente;
acompanhar as reuniões das Comissões de Trabalho. Especializadas,
eventuais e Parlamentares de Inquérito fora do período de funcionamento

190
Ibidem, pág, 254
191
Ibidem, pág. 254

117
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

efectivo da Assembleia Nacional (art.º 156.º, n.º 3, da CRA). A Comissão


Permanente mantém-se em funções até à abertura da reunião constitutiva da
nova Assembleia eleita (art.º 156.º, n.º 4, da CRA).

3.4.1.2.1. Competências e Funções da Assembleia


Nacional

A Assembleia Nacional, órgão democrático representativo por


excelência, apresenta-se como órgão complexo e multifuncional 192.

Em primeiro lugar, assinala-se-lhe uma Função eletiva (art.º 163.º da


CRA).

A mesma desempenha, para além disso, uma função de revisão


constitucional [art.º 161.º, al. a), da CRA], operando como poder constituinte
derivado.

Compete-lhe ainda o exercício da Função legislativa [art.º 161.º, al. b),


da CRA], havendo matérias que lhe são reservadas, em termos absolutos ou
relativos (arts.º 164.º e 165.º da CRA).

A Assembleia Nacional pode aprovar leis, leis de revisão constitucional,


leis orgânicas, leis de bases e leis de autorização legislativa. Refira-se que a
Assembleia Nacional pode ainda aprovar actos normativos sem valor de leis,
designados por resoluções (art.º 166.º, n.º 1, da CRA).

A Assembleia Nacional exerce, também, funções de controlo e


fiscalização político [art.º 162.º a), b), c) e e), da CRA].

Cabe-lhe, igualmente, o exercício de uma função autorizante [arts.º


161.º, al. c), e 162.º, al. d), da CRA].

Finalmente, a importante função de representação de todos os


cidadãos angolanos (art.º 141.º, n.º 2, da CRA).

192
Ibidem, pág. 255

118
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

3.4.1.2.2. Estatutos dos Deputados

Como já se referiu, os Deputados representam toda a nação e não os


círculos eleitorais pelo qual foram eleitos. Os mesmos exercem um mandato
livre, embora estejam sujeitos à disciplina partidária.

A Constituição estabelece um estatuto jurídico para os Deputados,


consubstanciados em diversos direitos e deveres.

3.4.1.2.3. Incompatibilidade

O estatuto dos Deputados contempla um conjunto de incompatibilidades.


Devido ao princípio da separação de poderes, a Constituição consagrou
diversas incompatibilidades parlamentares, visando assegurar a coerência do
sistema político de governo e a distinção entre controladores e controlados, tal
como evitar a confusão e o conflito de interesses 193.

Segundo a CRA os Deputados não podem, designadamente, exercer


funções noutros órgãos constitucionais, não podem ser titulares de órgãos das
autarquias locais e não podem integrar os órgãos de direção, administração e
fiscalização de empresas públicas, institutos públicos e associações públicas
(art.º 149.º, n.º 1, da CRA).

Configuram ainda situações de incompatibilidade com a condição de


Deputado, entre outras, o exercício de funções públicas remuneradas em
órgãos da administração directa ou Indirecta no Estado, exercício de funções
de administração, gerência ou de qualquer cargo social em sociedades
comerciais e demais instituições que prossigam fins lucrativos, o exercício de
funções laborais subordinadas em empresas estrangeiras ou em organizações
internacionais, bem como a verificação de situações de inelegibilidade
supervenientes à eleição (art.º 149.º, n.º 2, da CRA).

Cabe ainda realçar que a CRA tipifica, ainda, as situações de


impedimentos dos Deputados. Os impedimentos distinguem-se das
incompatibilidades, pois, os impedimentos não vedam aos Deputados o

193
Ibidem pág. 257.

119
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

exercício de certas funções ou actividades, mas sim a prática de determinados


actos194.

Nos termos do art.º 154.º os Deputados em exercício de funções estão


impedidos de:

- Advogar ou ser parte em processos judiciais ou extrajudiciais contra o


Estado, salvo para a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos;

- Servir de árbitros, conciliadores e mediadores ou peritos remunerados


em processos contra o Estado ou outras pessoas colectivas de direito público,
salvo se for autorizado pela Assembleia Nacional;

- Participar em concursos públicos de fornecimento de bens e serviços,


bem como em contratos com o Estado e outras pessoas coletivas de direito
público, salvo os direitos definidos por lei;

- Participar em actos de publicidade comercial.

3.5.1.3. Os Tribunais

Os tribunais são órgão de soberania com competência de administrar a


justiça em nome do povo (art.º 174.º, n.º 1, CRA).

Os tribunais são, pois, órgão constitucionais de soberania, embora não


integrem o sistema de Governo propriamente dito. O n.º 2 do mesmo artigo
estabelece que «no exercício da função jurisdicional, compete aos tribunais
dirimir conflitos de interesses legalmente protegidos, bem como os princípios
do acusatório e do contraditório e reprimir as violações da legalidade
democrática».

Interpretando esta norma no cotexto mais vasto dos princípios


constitucionalmente estruturantes pode dizer-se que os tribunais
desempenham uma importantíssima função democrática, de Estado de Direito
e de direito fundamentais195.

194
URBANO, Maria Benedita, Representação Política e Parlamento, 2009, pág. 421-454 apud MACHADO,
Jonatas E.M.…. Op. cit., 2013, pág. 257.
195
Ibidem, pp. 260 e ss.

120
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Em primeiro lugar, os mesmos garantem a primazia das decisões do


poder constituinte, expressão máxima da soberania popular, sobre todos os
poderes constituídos.

Em segundo lugar, os mesmos asseguram a primazia da lei democrática


sobre todos os actos dos poderes públicos e bem assim nas relações entre
particulares, resolvendo os conflitos delas emergentes com base em critérios
de legalidade.

Em terceiro lugar, os tribunais garantem princípios fundamentais no


âmbito do due process of law.

Em quarto lugar, os tribunais desempenham uma importante função de


implementação e aplicação dos direitos fundamentais de igual dignidade e
liberdade, bem como dos próprios direitos sociais. São estas, no essencial, as
principais dimensões da função jurisdicional.

3.5.1.3.1. Independência e imparcialidade dos Tribunais

Os tribunais são órgãos independentes e imparciais, que, no exercício da


função jurisdicional, devem apenas obediência à Constituição e à Lei (art.º
175.º da CRA). A garantia da justiça passa pela impermeabilização dos órgãos
que a administram a pressões de natureza política ou outra.

A garantia do Estado de Direito postula a igualdade de todos perante a


lei, pelo que se afigura crucial garantir a independência e a imparcialidade dos
órgãos que têm a missão constitucional específica de a aplicar 196.

Com base o art.º 176.º da CRA, os Tribunais superiores da República de


Angola são o Tribunais Constitucional, o Tribunais Supremo, o Tribunal de
Contas e o Supremo Tribunal Militar.

3.1.2.2.2. Imunidade

Pode se entender de imunidade, no caso em concreto parlamentar,


como as prerrogativas ou até mesmo um privilégio que os Deputados gozam

196
VENTURA, António José, Da Independência do Poder na Constituição da República de Angola –
Subsídios para a Compreensão, 2010, apud MACHADO e outros…, 2013, pág. 261.

121
REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE GOVERNO

de não responderem civilmente, disciplinarmente e muito menos criminalmente,


pelos votos ou opiniões que emitam em reuniões, comissões ou grupo de
trabalho da Assembleia Nacional, isto é, no exercício das suas funções (art.º
150.º, n.º 1, CRA).

A imunidade é uma das características definitórias das democracias


parlamentares, tendo como objectivo evitar os riscos de auto-censura
provocada pelo medo de ser acusado por injúria, difamação ou calúnia nos
debates travados no âmbito do certo de decisão democrático-representativo
por excelência, que é a Assembleia Nacional 197.

Caberá sempre aos tribunais controlar se os votos e opiniões proferidos


pelos Deputados o foram no exercício das respectivas funções, tendo em vista
garantir a adequação da imunidade ao fim pretendido, de forma a não onerar
excessivamente os direitos à honra, ao bom nome e à reputação quando os
mesmos tenham sido postos em causa por um Deputados, nomeadamente
numa querela pessoal.

197
MACHADO, Jonatas E.M…, op. cit., 2013, pág. 258.

122
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

CAPÍTULO IV

TEORIA GERAL DO ESTADO

O Estado “é uma comunidade humana fixada num território e que,


dentro das suas fronteiras, institui uma forma de organização do poder
político soberano com o fim de garantir a segurança, a justiça e o bem-
estar económico e social”198.

Neste caso, para a existência do Estado pressupõe, portanto, a


organização política de um povo que controla soberanamente um território com
o principal objectivo de assegurar o bem-estar social da colectividade. Por isso
se diz que os elementos do Estado são a povo, o território e o poder
político.

1. Os Elementos do Estado

1.1. O Povo

O povo é um conjunto de indivíduos residentes ou não em um


determinado território e que estão ligados ao Estado pelo vinculo jurídico da
nacionalidade (cidadania). O povo é fundamental para a formação do poder

198
HERIQUES, Lucinda Sobral & LEANDRO, Manuela, op. cit., 2014, pág 10.

123
TEORIA GERAL DO ESTADO

político que não deve ser constituído por indivíduos cuja origem seja estranha
ao respectivo objectivo político.

O povo distingue-se do termo população e nação.

A população distingue do termo povo, porque o termo população tem


significado económico e meramente demográfico ou estatísticos, que se traduz
no conjunto de nacionais, estrangeiros199, polipátrida200 e apátridas201 que se
encontram no território de um Estado.

Já a nação distingue do termo povo, pelo simples facto de que ela, é um


conjunto de indivíduos ligados por laços culturais, raiz histórica ou tradicionais.

Dito de outro modo, a nação é o agrupamento humano cujos membros,


fixados num território, são ligados por laços históricos, culturais, econômicos e
linguísticos; o facto de possuírem as mesmas tradições e costumes.

Embora todas as nações tendem a ser uma Estado, existe, pois, uma
grande diferença entre um Estado e uma nação, porque há nações que ainda
não são Estados.

1.1.1. A Nacionalidade

Nacionalidade “é o vínculo jurídico-político de direito público interno que


faz da pessoa um dos elementos componentes da dimensão do Estado” 202.

Apenas o Cidadão nacional, enquanto indivíduo que pertence ao Estado,


pelo vínculo da nacionalidade tem acesso ao poder político e pode exercer o
seu direito de sufrágio.

A Nacionalidade pode ser: originária e adquirida.

A nacionalidade originária é aquela que o indivíduo toma pelo


nascimento, podendo obter-se segundo critério de ius sanguinis (o indivíduo

199
Estrangeiros: são todos aqueles que não são tidos por nacionais, em relação a um determinado Estado,
isto é, as pessoas a que o Direito do Estado não atribuiu a qualidade de nacionais
200
Polipátrida: é aquele que possui mais de uma nacionalidade, em razão de o seu nascimento o
enquadrar em distintas regras de aquisição de nacionalidade.
201
Apátrida (“sem pátria” ou heimatlos): é aquele que, dada a circunstância de seu nascimento, não
adquire nacionalidade, por não se enquadrar em nenhum critério estatal que lhe atribua nacionalidade.
202
PAULO, Vicente & ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 266

124
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

recebe a nacionalidade dos seus pais independentemente do local onde


nasceu) e pelo critério ius soli, (quando o local do nascimento determina a
nacionalidade).

A nacionalidade adquirida, resulta de facto posterior ao nascimento, e


pode obter-se mediante critérios determinados por lei, ou seja, mediantes
requisitos estabelecidos para a sua aquisição.

No contexto Angolano a nacionalidade está prevista no art.º 9.º da CRA


e Define-se como originária e adquirida.

Segundo a Lei que regula a aquisição da nacionalidade, a aquisição da


nacionalidade pode atribuir-se mediante motivos de filiação, mediante adopção,
mediante casamento, mediante naturalização e mediante solicitação.

1.2. Território

Toda a colectividade que se constitui em Estado está fixada num


determinado território. O território é o espaço geográfico, delimitado por
linhas limítrofes ou fronteiriças, no interior do qual o povo habita e os
órgãos do Estado têm o poder de impor a sua autoridade 203.

O território, divide-se em:

a) domínio terrestre, compreende o solo e subsolo (o território


terrestre é delimitado pelas fronteiras terrestres naturais e
convencionais do Estado englobando também todo o subsolo que
lhe corresponde);
b) domínio aéreo, corresponde ao espaço aéreo nacional (o território
aéreo abrange todo espaço aéreo compreendido entre as verticais
traçadas a partir das fronteiras e, nos Estados ribeirinhos, inclui
ainda o espaço aéreo do mar);
c) domínio marítimo, corresponde o mar territorial (o território
marítimo abrange entre 12 a 200 milhas, contadas a partir da
costa. Nestas milhas o Estado exerce também a sua jurisdição).

203
CAPOCO, Zeferino. Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, 2015, pp. 185.

125
TEORIA GERAL DO ESTADO

Em todas estas partes, o Estado exerce jurisdição efectiva e plena. Cabe


também relembrar que existem numerosos Estados que não possuem território
marítimo (os chamados países encravados), ficando privados do direito de
acesso directo ao mar, salvo se for por convenção com o Estado costeiros.

Por outro lado, fazem igualmente parte do território de um Estado: os


navios, e veículos sob bandeira nacional, mesmo que estejam em território
estrangeiro.

Quanto ao nosso país, é historicamente definido pelos limites


geográficos de Angola tais como existentes a 11 de novembro de 1975, data da
Independência Nacional (art.º 5.º, n.º 1 da CRA); definindo-se como “indivisível,
inviolável e inalienável”, sendo energicamente combatida qualquer acção de
desmembramento ou de separação de suas parcelas, não podendo ser
alienada parte alguma do território nacional ou dos direitos de soberania que
sobre ele o Estado exerce (art.º 5.º, n.º 6 da CRA).

Vale ainda dizer, que todos os recursos naturais existentes no território


angolano são propriedade do Estado. É o que prevê o art.º 16.º da CRA.

1.3. O Poder Político

A existência de um povo e o território não bastam para dar origem à


ideia do Estado. É preciso que a estes dois elementos se acrescente um
Poder político, quer dizer, um Poder capaz de impor ao grupo as regras de
conduta social, e dotado de autoridade para fazer-se obedecer 204.

O Poder Político é o órgão ou o conjunto de órgãos que tem como


objectivo administrar o Estado, criar e executar normas jurídica,
utilizando todos os meios de coacção necessários para garantir essa
execução, tudo isso, resultando da manifestação da vontade da maioria,
isto é, através do preito eleitoral (eleição).

O Poder Político está divido em três: o Poder Executivo (poder de


administrar o Estado); Poder Legislativo (poder de criar leis) e Poder
Jurisdicional (poder de aplicar as leis).
204
FERNANDES, António José, Introdução à Ciência Política, teorias métodos e temáticas, 2010, pág. 87.

126
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Em Angola os Poderes Políticos estão organizados da seguinte forma:

a) Poder Executivo, pertencente ao Presidente da República (art.º


108.º da CRA) que tem como principal tarefa administrar,
promover e assegurar a unidade nacional, a independência e a
integridade territorial do País;
b) Poder Legislativo, pertencente a Assembleia Nacional (art.º
141.º da CRA), que tem como principal tarefa a elaboração de
leis, com o objectivo de regular a conduta do cidadão dentro de
território nacional;
c) Poder Jurisdicional, pertencente aos tribunais (art.º 174), que
tem a competência de administrar e dirimir os conflitos em nome
do povo.

2. Formas de Estado

Assim, tendo falado dos elementos do Estado, cabe agora compreender


as formas que revestem os Estados face à ordem jurídica internacional. Mas
antes disso, vejamos o conceito de forma de Estado.

O conceito de forma de Estado está relacionado com, “o modo de


exercício do poder político em função do território de um Estado” 205.

Devido a estrutura desse poder os Estados classificam-se quanto à


forma em: Estado Unitário (ou simples) e Estado Compostos (ou Complexo).

Os Estados compostos subdividem-se em: Estados Federados (ou


Estado Federal), Estados Confederados (ou Confederação de Estados), União
Real e União Pessoal.

2.1. Estado Simples ou Unitário

O Estado Unitário é um Estado onde o poder político é um só para todo


território206, ou seja, é aquele em que existe uma única Constituição e um único

205
PAULO, Vicente e ALEXANDRINO, Marcelo, op. cit., 2015, pág. 291.
206
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 196.

127
TEORIA GERAL DO ESTADO

centro de poder, que se estende a todo o território e que todos os cidadãos


estão submetidos207. O Estado unitário organiza-se, em termos de divisão
administrativa, para que as províncias ou regiões administrativas exerçam
apenas poderes delegados pelo poder central, não podendo aqueles actuar a
margens deste208.

No entanto, neste tipo de Estado o poder político pode estar concentrado


e centralizado nos órgãos centrais, ou encontra-se repartido pelos órgãos das
colectividades territoriais, aquém são atribuídos poderes e competências
relativamente autónomos209.

Desta forma, o Estado unitário pode ser: puro ou centralizado,


concentrado, desconcentrado, descentralizado administrativamente e
descentralizado administrativamente e politicamente.

2.1.1. Estados Unitário Puro ou Centralizado

No dizer o prof. Raul Araújo, Estado unitário centralizado “é aquele em


que o poder político e administrativo é exercício exclusivamente pelo poder
central e em que as diversas colectividades que o compõem não possuem
qualquer autonomia própria”210.

Dito de outro modo, em um Estado unitário centralizado, as


competências estatais são exercidas de maneira centralizada pela unidade que
concentra o poder político.

2.1.2 Estado Unitário Concentrado

Estamos perante a um Estado unitário concentrado, quando as ordens


emanadas de cima, do centro de decisão política, circulam para baixo, através
dos canais administrativos, até as colectividades inferiores, onde os agentes do
poder actuam como meros instrumentos de execução e controle, em
obediência estrita às ordens recebidas.

207
ARAÚJO, Raul, Introdução ao Direito Constitucional Angolano, 2018, pág 88.
208
Ibidem, pág. 197.
209
FERNANDES, António José, op. cit., 2008, pág 100.
210
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 88

128
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Dito de outro modo, neste tipo de Estado, os órgãos hierarquicamente


superiores, têm a competência de emanar determinadas ordens, sendo que, os
órgãos hierarquicamente inferiores têm a obrigação de cumprir estas ordens,
ou seja, os órgãos hierarquicamente inferiores funcionam como um instrumento
de execução das ordens dos órgãos hierarquicamente superiores.

Urge, todavia, realçar que nestes tipos de Estado onde o poder político é
concentrado existe muita lentidão no solucionar de diversos problemas, pós,
devido essa modalidade, existe muita burocracia hierarquicamente organizada.

2.1.3. Estado Unitário Desconcentrado

Estado unitário desconcentrado é aquele em que há um


reconhecimento de uma parcela de competência aos órgãos
hierarquicamente inferiores, ou seja, neste tipo de Estado, os órgãos
hierarquicamente inferiores gozam de certos poderes de decisão, isto é, no
desenrolar de certas situações.

Todavia este poder é parcial, pois, estes continuam ainda dependentes


aos órgãos hierarquicamente superiores.

Mas, com efeito, quando medidas de interesse local da colectividade se


impõem, as autoridades superiores, facultam as autoridades inferiores, o poder
de tomar decisões e fazendo executá-las.

2.1.4. Estado Unitário Descentralizado


Administrativamente

Na linha doutrinária do prof. Paulo Bonavides, Estado unitário


descentralizado administrativamente, “é aquele que admite órgãos locais de
decisão sujeitos a autoridades que a própria comuna, departamento,
circunscrição ou província, venham a instituir, com o propósito de resolver os
seus respectivos interesses”211.

Dito de outro modo, devido a extensão territorial e a complexidades dos


problemas do Estado, este, estabelece órgãos locais para cada circunscrição
211
BONAVIDES, Paulo, Ciência Política, 10.ª ed., São Paulo: Malheiro Editores, 2000, pág. 196

129
TEORIA GERAL DO ESTADO

(que pode ser comuna, municípios, províncias, etc.), elegidos pela própria
população, no sentido de estes resolverem os seus problemas e satisfazerem
as suas necessidades.

Normalmente estes órgãos fazem parte do poder do local do Estado.

2.1.5. Estado Unitário Descentralizado


Administrativamente e Politicamente

Nestes tipos de Estados não ocorre só a descentralização


administrativa, mas também ocorre a descentralização política, sendo esta
ultima caracterizada pela transferência de poderes legislativos e governativos
para entidades locais.

Aqui, os órgãos do poder local possuem politicamente poderes próprios,


ou seja, pode aprovar leis e tem uma ampla autonomia institucional com
entidades políticas e administrativas próprias. Em Portugal, França e África do
Sul, verifica-se este tipo de descentralização.

2.2. Estado Composto ou Complexos

O Estado composto ou complexo “é aquele onde existe a integração de


vários ordenamentos jurídico-constitucionais, vários conjuntos de autoridades e
uma multiplicidade de centros de decisão política 212.

Dito de um outro modo, neste tipo de Estado, existem várias


Constituições e uma pluralidade de poderes políticos que se estendem aos
vários territórios que o compõem.

Este tipo de Estado pode apresentar-se nas vestes de um Estado


Federal, Estado Confederado, União Real e União Pessoal.

212
NOVAIS, Jorge Reis, Tópicos de Ciência Política e Direito Constitucional. Apontamentos policopiados,
Porto, 1990, pág. 77, apud ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 91

130
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

2.2.1. Estado Federal

Estado Federal é aquele no qual existe vários poderes inferiores diante


um só poder soberano e várias Constituições que deve está em concordância
com a Constituição Federal.

Este tipo de Estado resulta da união de vários Estados não soberano,


formando assim um só Estado que normalmente é dominado como Estado
Federal, como por exemplo, o E.U.A, Brasil, India, Nigéria, Canadá, Alemanha,
Argentina, Suíça etc.

Os Circunscrição que formam o Estado Federal podem ser chamados


de: Estados federados ou Estados membros (como no Brasil e E.U.A e India),
Províncias (como em Canadá e Argentina) Landers (como na Alemanha) e
Cantões (como na Suíça).

O Estado Federal é o detentor da soberania e os Estados federados,


apesar de terem os elementos típicos de um Estado (povo, território e poder
político), não têm soberania, porque a transferiram para o poder federal.
Apesar dos Estados federados possuírem Constituição, Parlamento, Governo e
Tribunal, estão sujeitos ao poder central da Federação. Só o Governo Federal
possui representação internacional e competência exclusiva das forças
armadas213.

Como já se realçou, cada Estado federado possui a sua Constituição,


mas estas Constituições estão subordinadas a Constituição Federal e todos o
devem respeitar.

Em suma, o Estado Federal é composto por outros Estados que não


perdem a própria identidade e que possuem dois âmbitos jurídicos (o federal e
o federado). O Direito Federal prevalece sobre os direitos dos Estados
federados, sendo que, à autoridade central, é reconhecido o poder de
uniformizar as Constituições do Estados federados aos princípios da
Constituição Federal, aos supremos poderes de direcção política ao poder de

213
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 91

131
TEORIA GERAL DO ESTADO

intervir, coativamente, para obter o respeito pelas decisões tomadas pelas


autoridades federais ou centrais214.

2.2.2. União Real

União Real é uma forma de Estado composto ou complexo. Surge


quando dois ou mais Estados adoptam uma Constituição comum, prevendo a
existência de um ou mais órgãos também comuns. a par dos órgãos
particulares de cada Estado. O Chefe de Estado., normalmente é o órgão
comum por excelência215.

Os Estados apenas conservam a sua autonomia, mas não são


soberanos, estando subordinados a uma Constituição comum ou órgãos
comuns aos Estados da união216.

Como exemplo temos, a Inglaterra, Escócia e País de Gales desde o


séc. XVII; como foi o caso da Áustria e Hungria, de 1867 a 1918, Portugal e o
Brasil entre 1815 e 1822, a Dinamarca e Islândia entre 1918 e 1944.

2.2.3. União Pessoal

A União Pessoal compreende um conjunto de Estados independentes, que têm


apenas em comum titular de um órgão (o Rei), ou seja, não se regista ali a
existência de Constituição comum ou órgãos comuns aos Estados da União,
pelo que os Estados apenas se constituem assim mantendo fidelidade à
mesma coroa, mantendo cada país da união a sua soberania. Esta união é
pessoal e não orgânica.

Como exemplo de União Pessoal temos o caso da Grã-Bretanha e os


países da Commonwealth que mantêm fidelidade à Coroa, Portugal e Espanha
entre 1580 e 1640 e Holanda e Luxemburgo entre 1816 e 1890.

Em África, também tivemos uma organização de reinos constituídos em


união pessoal, até à chegada dos europeus, em finais do séc. XV. O exemplo
mais historicamente é o Reino do Congo, quando o monarca era a figura de
214
Ibidem, pág. 92
215
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 199
216
Ibidem, pág. 199

132
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

união dos vários reinos unidos de Angola, do Congo e do Zaire, organizados


como províncias, com poderes próprios, mas subordinados à Coroa do Rei com
a capital em M’banza-Congo, norte de Angola217.

2.2.4. Confederação

É uma associação de Estados que, através de um tratado ou acordo


internacional, decidem exercer, através de um conjunto de órgãos comuns,
competências políticas no domínio da defesa e relações externas. Cada um
dos Estados da Confederação exerce a sua soberania, na sua plenitude. Há
apenas uma “aliança” entre os Estados da Confederação 218.

Como exemplos temos, a Organização Tratado do Atlântico Norte


(OTAN), ou ainda o Trada que criou a Comunidade Europeia da Carvão e do
Aço (CECA), em 1951, a Comunidade Económica Europeia (Tratado de Roma
de 1957), a Confederação dos Países Baixos (1579), a Confederação Suíça
(1815-1848), a Confederação do Reino (1806-1813) e a Confederação Alemã
(1815-1866).

2.3. A Forma do Estado Angolano

Nos termos do artigo 8.º da CRA, Angola é um Estado Unitário


desconcentrado e decentralizado administrativamente.

É unitário, porque existe uma só Constituição e um único centro de


decisão politica.

É desconcentrado, porque existe uma parcela de competência


atribuída aos órgãos do hierarquicamente inferiores (como por exemplos, os
Administradores e Governadores) para que estes tomem certas decisões, que
não têm necessidade de chegar aos órgãos superiores (como por exemplo, os
Ministros e o Presidente da República).

É também descentralizado administrativamente, porque nos termos


do art.º 213.º da CRA, dispõe que as formas organizativas do poder local
217
Assim como pode interpretar Zeferino Capoco, op. cit., 2015 pág. 200, da descrição de Joseph Ki-
ZERBO, História da África Negra, Edições Europa-América, vol. I, pág 232 e ss.
218
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 92

133
TEORIA GERAL DO ESTADO

compreendem as autarquias locais, as instituições do poder tradicional e outras


modalidades específicas de participação dos cidadãos, em a serem definidos
por lei.

Ou seja, o Estado angolano, admite órgãos locais eleitos pela própria


circunscrição (que neste caso são os municípios), para assegurarem a
prossecução de interesses específicos resultantes.

3. Classificação jurídico-internacional de Estados

Do ponto de vista jurídico-internacional, os Estados são pessoas


jurídicas dotadas de personalidade jurídicas, ou seja, possuem direitos e
deveres á nível internacional.

Tendo como critério o princípio da soberania, os Estados classificam-se


em:

1- Estados soberanos: são os Estados que gozam de personalidade


jurídica internacional, tendo plena capacidade para exercer os
direitos de soberania219.

2- Estados semi-soberanos: são Estados que registam limitações no


exercício da soberania e de outros direitos inerentes àquela 220.

3- Estados não-soberanos: aqueles que não têm personalidade


jurídica internacional, isto é, não são independentes. São todos os
Estados incorporados numa federação (Estados federados),
tomemos o exemplo dos Estados Unidos; ou numa união real
(Uniões Reais) de que é exemplo o Reino da Grã-Bretanha e Irlanda
do Norte (Reino Unido)221.

4- Estados protegidos: são aqueles que, por força de uma convenção


internacional são objecto de proteção por outro Estado que lhes
concede a orientação total ou parcial das suas relações
internacionais e, em certos casos, da própria política interna, ou seja,

219
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 194
220
Ibidem, pág. 195
221
Ibidem, pág. 195

134
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

são aqueles Estados que depende de outro Estado, o Estado que


protege chama-se Estado protector e a relação entre os dois chama-
se Protectorado. Foi o caso de Marrocos ou o protetorado francês
sobre a Tunísia222.

5- Estados vassalos: são os Estados dotados da plenitude dos direitos


internacionais, mas que só podem exercer alguns precedendo a
autorização prévia de um Estado soberano, que deles recebe um
tributo da vassalagem223, ou seja, são aqueles Estados que estão
subordinado a um outro. Foi o caso do Egipto em relação à Turquia,
sec. XIX.
6- Estados exíguos: são Estados que atendendo à sua pequena
extensão territorial e reduzida população, não possuem a plenitude
da capacidade internacional (carecem de jus belli), se encontram
numa situação especial relativamente aos Estados limítrofes, além de
que não preenchem requisitos mínimos para poderem participar em
organizações internacionais como a ONU. É o caso, Principado do
Liechtenstein e o Principado de Mónaco224.

4. Fins e Funções do Estado

Pode-se definir, Fins e Funções do Estado como o exercício de tarefas


que executam a favor dos seus cidadãos protegendo-os dos perigos e
ameaças quer internas, quer externas. Do mesmo modo, o Estado procura
servir os interesses dessa coletividade garantindo certas funções públicas e
assegurando, desse modo, também o domínio privado.

Assim, os Fins são os objectivos a alcançar para sobrevivência do


Estado e de toda a sua coletividade. As Funções são conjunto de prestações
que o Estado exerce para o bem e realização da coletividade.

4.1. A distinção entre fins e funções do Estado

222
Ibidem, pág. 195
223
Ibidem, pág. 195
224
SOUSA, Marcelo Rebelo de, Direito Constitucional (Introdução à Teoria da Constituição), pág. 132
apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 195.

135
TEORIA GERAL DO ESTADO

Como premissa, cumpre-nos indicar, de acordo com a teoria, que o


Estado existe para desenvolver certos fins importantes para a sua constituição
política e desempenhar certas funções jurídicas e políticas. Porém, não se
deve confundir os “fins” do Estado e as “funções” do Estado.

A função viabiliza o alcance do fim, entendido este como objectivo a


atingir. Assim, a função está para o fim e este é sempre o resultado cujo
alcance nunca está e nem pode ser perfeitamente realizado. Assim, função
define-se como «uma actividade específica, complementar de outras
actividades também específicas cujo exercício coordenado é indispensável à
produção de certo resultado»225. É o que Marcelo Rebelo De Sousa entende
serem «as actividades desenvolvidas por esses mesmos órgãos, tendo em
vista a realização dos objectivos que lhes encontram constitucionalmente
cometidos».226

4.2. Fins do Estado

O conceito de Estado não se restringe apenas a ideias que o definem


enquanto ente político em termos substantivos. Na verdade, há mais modos de
ver explicar o Estado, no que concerne a questões que explicam a sua razão
de existir.

Trata-se de identificar o problema fundamental sobre quais os objectivos


do Estado, ou seja, o que é que o Estado se propões cumprir. O Estado tem
que ter fins e objectivos que constituem a sua razão de ser, juntos dos seus
cidadãos e num determinado território. Para compreender isto, comecemos por
avançar uma definição de fins de Estado: Para Zeferino Capoco entende que
os fins do Estado “é o objetivo ou ideal humano que constitui o horizonte das
aspirações presentes em relação ao futuro de determinada comunidade política
para com elas perseguir o seu alcance e efectivação para o bem da
coletividade”227.

225
CAETANO, Marcelo, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, pág. 148 apud CAPOCO,
Zeferino, op. cit., 2015, pág. 202
226
SOUSA, Marcelo de, Direito Constitucional, pág. 148 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 202.
227
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 203.

136
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Os fins constituem os objectivos fundamentais do Estado para toda a


sua colectividade. Tais fins ou objectivos são três, que passamos a descrever:
A segurança, a Justiça, e o Bem-estar material e social.

Toda a formação do Estado, entre outros objectivos, tem por finalidade


garantir estas linhas fundamentais para a sua auto-sustentação, sobrevivência
e autodeterminação. Somente o Estado que reúne e garante estabilidade
destes objectivos consolida-se, juridicamente e politicamente.

4.2.1. A Segurança

Quanto à segurança como fim do Estado, distinguem-se dois aspectos


que cumprem as mesmas prestações de defesa: a segurança individual que
se traduz na execução das normas jurídicas pelos órgãos do Estado,
garantindo os direitos e deveres reconhecidos a cada cidadão; e a segurança
colectiva, garantindo a defesa do Estado perante os inimigos internos e
externos.

Neste sentido, «a segurança é só a organização da força posta ao


serviço de interesses vitais: é também, por um lado, a garantia da estabilidade
dos bens e, por outro, a da duração das normas e da irrevogabilidade das
decisões do poder importem justos interesses a respeitar» 228, e que resultam
no bem de cada um individualmente.

4.2.2. A Justiça

Além da segurança, que constitui o fim primordial do Estado, importante


é também a Justiça na comunidade estadual. Como todos fins, a Justiça
constitui um fim público do interesse de todos os indivíduos e das sub-
colectividades que formam a unidade do Estado.

A Garantia da Justiça pelo Estado processa-se em dois fóruns: O fórum


judicial, em que através das instâncias judiciais se dirimem os conflitos entre os
particulares e entre estes e as entidades públicas, aplicando-se aí o Direito 229.

228
CAETANO, Marcelo. Op. cit., pág. 15.
229
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 204.

137
TEORIA GERAL DO ESTADO

Em segundo, o fórum executivo administrativo, em que se atende a uma


justiça em duas perspetivas: a justiça comutativa e a justiça distributiva. A
cada perspetiva corresponde o procedimento adequado das instituições do
Estado, orientando-se para defesa e a garantia do bem-estar individual e
colectivo, no seio da comunidade política230.

Quanto a justiça comutativa, resulta no dever do Estado de garantir a


equivalência dos bens permutados nas relações de reciprocidade entre
cidadãos. Cada um deve receber equivalente à sua prestação. Na justiça
distributiva, cada cidadão tem o direito (e o Estado tem o dever) de receber o
justo valor correspondente ao que produz, ou seja, cada um deve receber o
salário justo ao tipo de trabalho que se desenvolve a favor da colectividade. Ou
ainda, mediante sua condição social, o cidadão deve receber do Estado
proventos que sejam adequados a sustentabilidade da sua carência 231.

Assim por exemplo «o designo da justiça distributiva projecta-se na


políticas económicas e sociais de correção das assimetrias pessoas e
funcionais de rendimentos e de apoio a sectores sociais mesmo não
produtivos»232.

Enquanto na justiça comutativa a regra é a igualdade das partes


intervenientes na permuta, na justiça distributiva há desigualdade das partes,
porque se considera o mérito de um na atribuição da recompensa.

4.2.3. Bem-estar social e material

Como terceiro fim do Estado aparece o bem-estar assente nos valores


da dignidade da pessoa humana, nos seus direitos quer individuais, quer
sociais e noutras prerrogativas inerentes ao ser humano na sua dimensão
naturalizante.

O bem-estar traduz-se na «promoção [pelo Estado] das condições de


vida dos cidadãos em termos de garantir o acesso, em condições

230
Ibidem, pág. 204.
231
Ibidem, pág. 204.
232
SOUSA, Marcelo Rebelo de, Direito Constitucional, 1979, pág. 230 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit.,
2015, pág. 205

138
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

sucessivamente aperfeiçoadas, a bens e serviços considerados fundamentais


pela colectividade, tais como bens económicos que permitam a elevação do
nível de vida de estratos sociais cada vez mais amplos e serviços essenciais,
sobretudo os que comtemplem a educação, a saúde e a segurança social» 233
dos mesmos cidadãos.

Os bens materiais públicos que o Estado se propõe realizar e garantir


aos cidadãos representam o que de mais sublime se situa na concretização da
sua tarefa enquanto procura responder a um objectivo fundamental só
articulável com o dever dos próprios cidadãos dentro dos princípios
estabelecidos pela própria autoridade pública, para que destes cada um possa
realizar-se satisfazendo necessidades que resultem na sua contribuição para o
bem público.

4.2.4. Fins do Estado na Constituição Angolana

O art.º 1.º da CRA consagra como objectivo fundamental a construção


de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e
progresso social.

O Estado define, assim, como um dos seus fins contribuir pelo bem-
estar, numa sociedade de liberdade e justiça, propondo-se a desenvolver o
progresso social, no que respeita ao desenvolvimento e distribuição da riqueza
pelos cidadãos, o que de certa forma se depreende dos artigos 14.º, 15.º e 16.º
da Constituição da República de Angola vigente.

Como fim de segurança, enquanto um objecto fundamental a perseguir


pelo Estado, a Constituição atribui-lhe extrema relevância. Já na preservação
da integridade e segurança nacional, no art.º 5.º n.º 6 afirma-se o combate a
qualquer acção de separação do território nacional, pelo que representa para o
estado um fim maior a garantir no plano de desenvolvimento, o mesmo
objectivo encontrando-se prescrito no art.º 11.º, n. º 2 e 3, traduzindo-se numa
segurança jurídica e política.

4.3. Funções do Estado


233
SOUSA, Marcelo Rebelo de, Direito…, 1979, pág 230 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 205

139
TEORIA GERAL DO ESTADO

A ideia de função conduz à nocção do desempenho, da prestação de


certos serviços a outrem, pelo que do conceito de funções do Estado sobressai
a nocção de certa actividade que é realizada de forma permanente a um
conjunto de cidadãos234.

As funções do Estado são:

4.3.1. Função Executiva ou Governativa:

A função executiva ou governativa concretiza-se com o poder executivo.


Tem como objectivo definir a actividade de direcção superior da colectividade
política.

É a função exercida pelos dirigentes de um Estado investidos da autoridade


de determinar a orientação política geral do país, de assegurar as suas
relações diplomáticas, de elaborar os regulamentos necessários à aplicação
das leis, e de assegurar a execução dessas leis, graças à disposição de força
material de coerção e de serviços administrativos apropriados.

4.3.2. Função Legislativa:

Traduz-se a na expressão formal da posição que o Estado adopta a


respeito dos diversos problemas inerentes à sociedade política. É, pois, a
função pelo qual o Estado cria e produz normas jurídicas (regra de Direitos) de
caracter geral e abstrata, concomitantemente organizando as instituições
destinadas a assegurar a sua aplicação.

4.3.3. Função Administrativa:

A função administrativa engloba o conjunto de actividades e serviços


que o Estado desenvolve para proporcionar aos indivíduos os benefícios
concretos que determinaram a constituição da sociedade política.

Todo o Estado deve assegurar aos seus cidadãos um certo número de


serviços destinados à satisfação de necessidade colectivas de caracter
material e cultural. Tem, por isso, necessidade de se dotar de vários

234
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 208.

140
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

organismos que prestam serviços públicos e constituem a Administração


Pública do Estado.

4.3.4. Função Jurisdicional

A função jurisdicional tem como objectivo dirimir os conflitos de interesses


através de órgãos independentes (elemento orgânico), imparciais (elemento
Formal) e passivos, numa actividade intelectual (elemento material), sendo tais
actos passíveis de recurso contencioso235.

Na visão de António José Fernandes, a função jurisdicional realiza-se


através de três ordens jurídicas236:

a) a justiça civil, cujos magistrados têm por função resolver os conflitos


entre particulares;
b) a justiça penal, cujos magistrados são encarregados de julgar os
autores das diversas infrações à lei quando não beneficiam de
prescrições extintivas (a justiça militar é um ramo da justiça penal);
c) a justiça administrativa, cujos magistrados devem controlar a
legalidade dos actos administrativos e, eventualmente, estabelecer a
indemnização devida às pessoas lesadas por um acto administrativo
irregular.

Em cada uma destas ordens judiciários, a realização da justiça processa-se


por diversas jurisdições e instanciais, normalmente hierarquizadas em
diferentes graus.

235
SILVA, Maria Manuela Magalhães & ALVES, Dora Resende, Noções de Ciência Política e Direito
Constitucional, 2000, pág. 141 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág, 209 e 210.
236
FERNANDES, António José, Introdução à Ciência Política, teorias métodos e temáticas, 2010, pág. 118.

141
CAPÍTULO V

O PODER CONSTITUINTE

O poder constituinte é um tema muito vasto e um dos temas centrais do


constitucionalismo moderno que, por si só, levanta diversas questões
complexas e controvertidas.

Assim, ao falarmos do poder constituinte estaremos a responder quatro


questões primordiais, nomeadamente237:

1- O que é o poder constituinte?


2- Quem é o titular do poder constituinte?
3- Quais são as formas e exercícios do poder constituinte?
4- Existem ou não limites no exercício deste poder?

1. O Que é o Poder Constituinte?

Entendemos por poder constituinte, como a faculdade de criar ou


modificar normas constitucionais. Desta feita no âmbito legislativo existem dois
tipos de poder: poder ordinário, para elaborar as leis em geral (normas

237
CORREIA, Adérito, Lições de Direito Constitucional, 2011, pág. 86.
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

infraconstitucionais) e o poder constituinte, para elaborar as normas


constitucionais.

2. A Origem da Teoria do Poder Constituinte

A teoria do poder constituinte surgiu na França, no fim do século XVIII, e


teve por preocupação desenvolver uma nova ideia sobre a legitimidade do
poder. Sua elaboração deveu-se, sobretudo, ao pensador e abade francês
Emmanuel Joseph Sieyès (1748 – 1836), na sua obra O que é o Terceiro
Estado.

Naquele momento, reinavam na Europa as monarquias absolutistas, que


atribuíam a legitimidade (fundamentação) do exercício do seu poder absoluto a
Deus. Por ser divina a fonte de sua legitimação, os monarcas podiam exercer o
seu poder sem estar sujeitos a quaisquer limitações.

Foi nesse cenário que surgiu a teoria do poder constituinte, trazendo os


conceitos de soberania nacional e soberania popular para substituir a ideia
de poder absoluto das monarquias, legitimado por Deus. A teoria do poder
constituinte propõe, portanto, a troca da velha ideia de poder absoluto recebido
por Deus põe uma nova forma de poder, fundada na razão humana na qual
Deus é substituído pela nação como titular da soberania.238

3. Titularidade do Poder Constituinte

3.1. A Teoria da Soberania Nacional

Para os teóricos da democracia liberal, o povo é uma entidade abstracta,


distinta dos indivíduos que o compõem. O Povo é a Nação na qual reside a
soberania. O povo, isto é, os eleitores têm por função designar os seus
representantes. Assim, os eleitores não exercem um direito, mas uma função,
exprimindo a vontade nacional. É a teoria do eleitorado-função.

A teoria da soberania nacional é ainda a teoria do mandato


representativo cabendo a soberania à Nação e sendo esta uma entidade
abstrata, o poder deve ser exercido através de representantes, porém estes
238
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo & DIAS, Frederico, Aulas de Direito Constitucional para
concursos, 2013, pág. 103 e 104.

143
O PODER CONSTITUINTE

representarão a Nação e não estes que os elegeram. Assim, o mandato é


imperativo, os eleitores não têm um mandato preciso e nunca podem controlar
ou destituir aqueles que elegeram. O mandato é, portanto, irrevogável. 239

3.2. A Teoria da Soberania Popular

Contrapondo-se a teoria de soberania nacional é criada no Estado liberal


a teoria da soberania popular. O seu teorizador foi Rousseau na sua obra
Contrato Social. Para ele, a soberania reside no povo e é inalienável, não se
vende.

Todos os cidadãos são iguais – noção de igualdade cada um aliena os


seus direitos a favor da sociedade, participando igualmente na formação da
vontade geral. Mesmo os que não participam devem submeter-se a vontade
geral. A democracia tem, assim, como fundamento no “contrato social”. É a
teoria da soberania popular segundo a qual o poder cabe ao povo, cabendo a
cada cidadão uma parcela de soberania.

As consequências dessa teoria são:

1ª Democracia directa: sempre que for possível o povo deve exercer a


democracia de forma directa. Quando tal não foi possível o poder deve ser
exercido por representantes do povo através do sufrágio universal. Esses
representantes são responsáveis perante o povo que representam e podem ser
destituído do cargo que ocupam – mandato imperativo.

2ª A eleição como um direito: sendo cada eleitor titular de uma fração


de soberania, deve eleger os seus representantes. O voto é um direito, que
conduz ao sufrágio universal já que todos os cidadãos gozam do direito de
voto.

3ª Ausência de limitações ao poder político: radicando o poder


político no povo e sendo exercido por ele directamente através dos seus
representantes não há necessidade de limitações, porque ele nunca será
despótico. Assim, se as leis são criadas pelo povo, por maioria de razão, a lei
suprema, a Constituição só pode ser criada pelo povo. 240
239
CORREIA, Adérito, op. cit. 2011, pág. 88 e 89.
240
Ibidem, pág. 89.

144
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Esta teoria do poder constituinte foi fundamental para o direito


constitucional moderno, sobretudo para a despersonalização do poder, haja
vista que este deixou de estar corporificado em uma pessoa física (o monarca,
fundamentado em uma divindade, pessoa sobrenatural), sendo transferido para
uma pessoa jurídica (o Estado, legitimado pela soberania popular/nação). Essa
mesma teoria – ao fixar a distinção entre poder constituinte e poderes
constituídos – foi fundamental, também, para o advento das Constituições
rígidas.

3.3. A Teoria da Soberania do Estado

Própria do positivo normativo do séc. XIX é a teoria da soberania do


Estado, que não foi consagrada até hoje em nenhum Constituição. Para esta
teoria, o Estado é uma entidade autónoma, não dependendo da vontade dos
homens. O povo é um elemento do Estado. Sendo assim o Estado é o titular do
poder soberano e não o povo241.

Entretanto, não podemos confundir poder constituinte e a sua teoria.

A teoria do poder constituinte – a ideia, a divisão entre poder


constituinte e poderes constituídos – é contemporânea do surgimento das
Constituições escritas, remontado ao final do século XVIII.

Por outro lado, o poder constituinte, propriamente dito, sempre


existia, na medida em que toda a sociedade tende a estabelecer as bases, os
fundamentos da sua própria organização. Enfim, mesmo antes da concepção
da teoria (francesa) do poder constituinte, este já existia de facto, pois deu vida
à organização dos diferente Estados. 242

4. Quem é o Titular do Poder Constituinte

Inicialmente entendia-se que a titularidade do poder constituinte residia


na nação (teoria da soberania da nacional), pois, a vontade soberana da nação
era a única legítima para reger e governar a vontade dos povos.

241
Ibidem, pág. 89
242
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo & DIAS, Frederico, op. Cit. 2013, pág.104.

145
O PODER CONSTITUINTE

Posteriormente ou modernamente, entendeu-se que a titularidade do


poder constituinte reside no povo (teoria da soberania popular) e não mais na
nação. Sendo assim o povo é o titular do poder constituinte.

5. Formas e Exercício do Poder Constituinte

Vimos no tema anterior que o titular do poder constituinte é o povo. Já


aprendemos, também, que o poder constituinte tem por incumbência elaborar
normas constitucionais, seja na criação da Constituição, seja na modificação ou
reforma desta.

Ora bem, agora nos interessa abordar como se dá o exercício desse


poder.

São três as tradicionais formas do exercício do poder constituinte


apontadas243:

1.ª Ditatorial ou Autocrática: nesta forma de exercício, o poder


constituinte é exercido por um indivíduo ou mesmo um conjunto de indivíduo
que elabora/elaboram a Constituição de acordo com os seus interesses. Está
subdividida em: monocrática e autocrática.

- Monocrática: quando o monarca outorga uma Constituição


(monárquica) ou mesmo quando é um ditador e elabora a Constituição em
nome do povo (bonapartista).

- Autocrática: quando o poder constituinte é exercido por conjunto de


indivíduos e a Constituição é elaborada a título próprio ou em nome do povo.

2.ª Mista ou Pactuada: e finalmente nesta forma de exercício, o poder


constituinte é exercido pelo povo. A elaboração da Constituição resulta de um
acordo ou mesmo pacto entre o povo e os seus representantes. Esta pode ser
dar através de:

- Plebiscito: a Constituição é elaborada por um indivíduo e submetida a


aprovação popular.

243
CORREIA, Adérito, op. Cit. 2011, p. 90.

146
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

- Constituições pactuadas: a Constituição resulta de um acordo entre a


Assembleia representativa e o monarca. O acordo também pode ser entre o
povo e uma autoridade não monárquica.

3.ª A Democrática: nesta forma de exercício, quem exerce o poder


constituinte é o povo, intervindo de uma forma directa ou Indirecta na
elaboração da Constituição. Ela está subdividida em: representativa ou
Indirecta, directa e semidirecta ou referendária

- Representativa ou Indirecta: cabe ao povo que exerce o poder


constituinte eleger os seus representantes e estes por sua vez reunidos em
Assembleia ou em Assembleia Constituinte vão elaborar a Constituição em
nome do povo.

- Directa: nesta, a Constituição é elaborada por todos os cidadãos


eleitores, isto é, pelo povo, porém sem a mediação de quaisquer
representantes.

- Semidirecta ou referendária: aqui, o texto constitucional é elaborado


por um órgão eleito e, posteriormente, é submetido à aprovação do povo. 244

6. Poder Constituinte Originário e Derivado

6.1. Poder Constituinte Originário

Poder Constituinte Originário (também conhecido como poder


constituinte genuíno, principal, primário ou de primeiro grau) é o poder de criar
uma nova Constituição para um Estado que nunca a teve. É aquele que
elabora o texto originário da Constituição, dando forma a um novo Estado.

Esse poder manifesta-se em dois momentos: na criação de um novo


Estado (poder constituinte originário histórico) ou no curso de um Estado já
existente, quando há uma ruptura de ordenamento jurídico (poder constituinte
originário revolucionário).

244
Ibidem, pág. 90.

147
O PODER CONSTITUINTE

Enfim, aquele que elabora a primeira Constituição do Estado é chamado


de histórico; já aquele que elabora uma nova Constituição em substituição a
outra, já existente, é denominado revolucionário. 245

O poder constituinte originário apresenta as seguintes características 246:

1.ª poder inicial: porque representa a base da ordem jurídica que se


inicia, ou seja, porque antes dele não existiu nenhum poder que lhe serviu de
fundamento. Com efeito, promulgada uma nova Constituição, toda a ordem
jurídica que se inicia terá como base, como fundamento de validade, o novo
texto constitucional, elaborado pelo poder constituinte originário. Esse texto
passa a constituir o fundamento de validade de todas as demais normas que se
vão integrando no ordenamento jurídico.

2.ª Poder autónomo (ilimitado): porque não se sujeita a nenhum limite


estabelecido pela ordem jurídica anterior; porque é um poder que não depende
de nenhum outro poder independente, pois, cabe simplesmente, a ele decidir
quando e como criar a Constituição. De facto, o poder constituinte originário é
juridicamente ilimitado, não se sujeitando a nenhuma restrição imposta pelo
direito pretérito.

3ª Poder omnipotente: porque não está subordinado a nenhum poder


ou lei formal, ou seja, este poder não está e nem pode ser limitado por
qualquer outro poder ou mesmo lei formal. É um poder acima do qual não pode
ser pensado outro poder.

6.1. Poder Constituinte Derivado

Poder constituinte derivado (também conhecido como poder constituinte


secundário, de segundo grau, constituído ou instituído) é aquele poder
competente para rever, modificar ou alterar a Constituição existente para
adoptar à evolução da sociedade.

245
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo & DIAS, Frederico, op. cit. 2013. pág. 108.
246
Ibidem, pág 108.

148
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

O poder constituinte derivado serve para introduzir correções, para


acrescentar ou suprir certas normas constitucionais que não se adequam mais
com a realidade social de um determinado Estado e introduzir as que se
adequam. 247

7. Limites do Poder Constituinte

A doutrina consagra alguns limites quer do poder constituinte originário,


quer do poder constituinte derivado.

Os limites do poder constituinte originário, aduzem-se nas formas de


criação de uma Constituição formal e, neste sentido, podemos observar:

- As instituições pré-constitucionais responsáveis pela governação;

- As regras de procedimentos que regem a discussão e votação das


normas constitucionais e que definem o momento da entrada em vigor destas
últimas, e, eventualmente;

- As normas substantivas e procedimentais que vão disciplinar


juridicamente os procedimentos de eleição de uma assembleia constituinte;

- As normas que regulam o exercício de um referendo de aprovação ou


confirmação de uma Constituição.

No âmbito dos limites do poder constituinte derivado, refere-se ao


conceito de revisão constitucional, para designar todo um conjunto de
concepções, valores ou condicionantes de natureza política, jurídica, social e
económica que a própria constituição impõe para sua modificação.

247
Ibidem, pág. 108.

149
CAPÍTILO – VI

REVISÃO CONSTITUCIONAL
Revisão constitucional são modificações que de certas normas
constitucionais. A natureza da revisão constitucional é de “assegurar a
continuidade da Constituição para que esta possa cumprir a sua tarefa” 248. A
modificação de uma norma constitucional pode ser 249:

- Por via de substituição por outra norma;

- Pode traduzir-se na eliminação de uma norma constitucional, por


via da supressão dessa norma retirando-a da Constituição;

- E finalmente, a revisão pode introduzir um novo preceito


constitucional através do aditamento.

É importante sublinhar que, a revisão constitucional se diferencia da


transição constitucional e ruptura constitucional250.

A transição de constitucional: é uma reforma constitucional que se


traduz na passagem de uma Constituição para uma outra. Com tudo pode se

248
MIRANDA, JORGE., Manual de Direito Constitucional., (2002, pp. 157 apud CAPOCO, Zeferino,…..
2015, pp. 157.
249
SILVA, Maria Manuela Magalhães e ALVES, Dora Resende., Noções de Direito Constitucional e Ciência
Política., (2000, pp. 100 apud CAPOCO, Zeferino,…. 2015, pp. 158).
250
CORREIRA, Adérito, Lições de Direito Constitucional., 2011, pp. 91.
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

alterar a Constituição material, mas pode permanecer a Constituição


instrumental e formal.

A ruptura constitucional: são situações extraordinárias que resultam


na mudança súbita da Constituição de um determinado Estado. As ruptura
constitucional resultam de: golpes de Estados, Revoluções…

1. Modalidades de revisão da Constituição

A revisão constitucional adopta duas modalidades, que passamos a


descrever:

1.ª Revisão ordinária: é a forma usualmente adoptada para a garantia e


sobrevivência da Constituição, pela concretização quer da estabilidade
constitucional, quer da sua atualização e conformidade com a realidade social
no decurso dos tempos251. Por isso, a revisão ordinária é sempre estabelecida
por um período de tempo que se entende que seja suficiente para a sua
estabilidade e adequação com as dinâmicas socioculturais e políticas da ordem
social em que se insere.

É o que se denomina limites temporais que separam uma revisão


constitucional da revisão seguinte. Esse tempo é fixado por um dispositivo
normativo-constitucional. Assim, a revisão ordinária deve entender-se como um
procedimento que visa garantir a sustentabilidade da Constituição, dentro do
tempo previsto252.

2.ª Revisão extraordinária: verifica-se quando o contexto político do


país exige uma conformação dos actos e/ou certos desenvolvimentos
sociopolíticos que vinculam as instituições do poder público “a todo o tempo” 253,
ou seja, a revisão extraordinária dá-se atendendo a gravidade ou urgência da
situação sociopolítica do país. No caso de Angola, para se efeituar uma revisão
extraordinário é necessário uma maioria parlamentar agravada “de dois terços”
dos Deputados em efectividade de funções (art.º 235, n.º 2 da CRA).

251
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 159
252
Ibidem, pág. 159.
253
Ibidem, pág. 160.

151
REVISÃO CONSTITUCIONAL

2. Limites de revisão constitucional

Os limites que se opõem ao processo da revisão constitucional são


meios que se asseguram a que qualquer revisão se processe dentro dos
parâmetros estabelecidos pela Constituição e não fora destes. Quer isto dizer
que a «a revisão não poderá violar os limites definidores da identidade
substancial imposta pelo tipo de democracia constitucional que caracteriza o
ordenamento sem causa». 254

Entretanto, os limites são: Limites formais (são todas as formalidades


prevista na Constituição que ditam a quem compete a iniciativa de revisão e,
consequentemente, a aprovação e promulgação da Constituição, ou seja, ditam
o órgão específico titular do poder de revisão), limites materiais (são aqueles
que visam garantir a permanência do núcleo essencial da Constituição, isto é,
os princípios constitucionais considerados inalteráveis, que não estão sujeitos a
revisão, art.º 236.º da CRA), limites temporais (são aqueles limites que se
referem ao tempo em que é realizada uma revisão na Constituição, art.º 235.º
da CRA) e limites circunstanciais (são aqueles que prescrevem as
circunstâncias específicas em que não podem ser realizadas qualquer tipo de
revisão constitucional, isto é, em estado de guerra, de sítio ou de emergência
e não só. Nestes casos não se pode realizar nenhuma alteração na
Constituição art.º 237 da CRA).

3. Limites de revisão na Constituição de Angola

Sendo a Constituição Angolana uma Constituição rígida, está prevê de


forma expressa, o mecanismo da sua revisão cujos preceitos constitucionais
definem os limites posto ao órgão revestido de poderes de efectuação da
revisão.

Limites formais

Como antes já foi salientado, os limites formais são aqueles que ditam o
órgão ou os órgãos titulares do poder de revisão e que consequentemente,

254
CANOTILHO, J. J. Gomes, 1997 apud CAPOCO, Zeferino, Manual de Ciência Política e Direito
Constitucional. 2015, p. 160.

152
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

terão a legitimidade de aprovar e promulgar as revisões que serão inseridas na


Constituição.

Assim, nos termos do processo de revisão da Constituição angolana, o


poder de revisão é da competência da Assembleia Nacional, sendo este o
órgão titular do poder de revisão que aprova as alterações à Constituição nos
termos dos artigos 161.º, al. a) e 234.º, n.º 1).

Mas, para iniciativa de revisão, a Constituição consagra dois órgãos: o


Presidente da República e Assembleia Nacional, por maioria de 1/3 dos
Deputados, como se pode acompanhar no art.º 233.º da CRA.

3.1. Limites Temporais

Os limites temporais, é o período que a Constituição estabelece para


que se possa revisá-la. Os limites temporais disposto no n.º 1 do art.º 235.º da
Lei Fundamental, afirmando-se aí que a Assembleia Nacional pode rever a
Constituição, decorrido cinco anos da sua entrada em vigor ou da última
revisão ordinária.

A norma constitucional que impõe limites de tempo ao poder de revisão


afigura-se como uma norma programática, evitando que haja sucessivas
revisões Constitucionais que possam prejudicar a estabilidade social,
económica e politica do Estado.

3.2. Limites Materiais

Os limites materiais são aqueles que estabelecem certas balizas ou


barreiras ao legislador durante a revisão constitucional. Os limites materiais
enumeram um conjunto de conteúdos a que o legislador constituinte se vê
impedido de alterar na efectivação do poder de revisão da Lei 255.

A luz do art.º 236.º da nossa Constituição, são limites materiais:

a) A dignidade da pessoa humana;


b) A independência, integridade territorial e unidade nacional;
c) A forma republicana de Governo;

255
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 163.

153
REVISÃO CONSTITUCIONAL

d) A natureza unitária do Estado;


e) O núcleo essencial dos direitos, liberdades e garantias;
f) O Estado de direito e a democracia pluralista;
g) A laicidade do Estado e o princípio da separação entre o Estado e as
igrejas;
h) O sufrágio universal, directo, secreto e periódico para a designação
dos titulares electivos dos órgãos de soberania e das autarquias
locais;
i) A independência dos Tribunais;
j) A separação e interdependência dos órgãos de soberania;
k) A autonomia local.

3.3. Limites Circunstanciais

A CRA consagra ainda os limites circunstanciais com o objectivo de


impedir ao poder de revisão constitucional em situações de perturbação grave
da vida político-social nacional, o acto de revisão na Constituição.

Tais limites estão estatuídos no art.º 237.º, vislumbrando que “durante a


vigência do estado de guerra, do estado de sítio ou do estado de
emergência, não pode ser realizada qualquer alteração da Constituição”.
Qualquer destas situações constitui uma perturbação nacional, e não se pode
proceder a uma revisão constitucional.

O estado de guerra, entender-se como acto de agressão declarada


contra o Estado, por uma força armada de origem externa ou interna, que se
manifesta contra a autoridade ou entidade estatal legalmente instituída,
implicando assim a acção defensiva das Forças Armadas nacionais através de
uma intervenção e acção bélicas256.

O estado de emergência, verifica-se quando há uma situação que


perturba parte da população ou toda ela. O estado de emergência dá-se por:
catástrofes naturais como: terramotos, secas chuvas intensas, tsunamis,
erupções, etc.; doenças graves como: ébola, coronavírus ou covid-19, etc.; e
por vezes quando há crise políticas.
256
Ibidem, pág. 165.

154
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

O estado de sítio, muitas vezes aparece com o estado de emergência.


Mas pode entender-se o estado de sítio como uma situação de ameaça grave
contra a unidade nacional, que afecte uma parte da população ou uma porção
do território nacional insolando-a do conjunto e impondo ali a não efectivação
dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos afectados. O estado de
sítio também pode ser originado por catástrofes naturais ou acidentes ou
doenças graves à tranquilidade pública.

4. A História Constitucional de Angola e as Revisões


Constitucionais

Do ponto de vista histórico-constitucional, o nosso país, isto é, dos anos


1975 á 2009 era regulado por leis constitucionais, leis estas, que ao nosso
entender, foram elaboradas para regular de forma temporária o sistema
jurídico-constitucional do país.

Na verdade, estás leis constitucionais foram criadas de forma urgente,


no sentido de regular os conflitos e os problemas que o Estado angolano
enfrentava naquele momento (como o processo de descolonização e
posteriormente as guerras civis internas). Por outro lado, estas leis também
ajudaram a garantir a estabilidade e o progresso do país coadjuvando ainda a
regular os problemas do âmbito político, social económico e até mesmo
legislativo.

4.1. A Iª República (Lei Constitucional de 1975)

A Lei Constitucional de 1975, consagrou o inicio da Iª República 257


Angolana. A Lei Constitucional de 1975, definia-se o princípio republicano de
Estado soberano, independente e democrático para o exercício do poder
constituinte formal (art.º 3.º), sendo que já o art.º 2.º definia o povo angolano
como o titular da soberania, ou seja, o povo angolano estava revestido de
poder supremo e omnipotente para decidir sobre os seus destinos através do
MPLA, a quem cabia a orientação política (art.3.º), no âmbito da revolução.

257
Consagra-se uma nova república quando surge uma nova Constituição que introduz mudanças
profundas à anterior Constituição.

155
REVISÃO CONSTITUCIONAL

Lei Constitucional de 1975, denominada por Zeferino Capoco, como uma


Constituição pioneira de um Estado jovem, tem os seus princípios estruturantes
baseados no discurso no discurso da proclamação da independência, proferido
pelo Presidente Agostinho Neto. A Constituição mostra clara preocupação pela
defesa da defesa da soberania nacional, pela consolidação de acções de
libertação total do País das sequelas do colonialismo, da dominação e
agressão das forças invasoras do território nacional 258.

Na Lei Constitucional de 1975, não incluía preocupações, de forma


expressa, pelas questões sociais, de uma ideia do Estado social de
democrático, mas afirma-se um Estado dirigente de todos os meios de
desenvolvimento económico que procura implantar o sistema socialista de
produção259.

Posteriormente, foram alcançadas algumas conquistas no campo político


e jurídico, sendo dadas em virtude das linhas traçadas pelo Partido dirigente
que se socorre do uso pleno dos seus direitos de soberania: o reforço das
alianças externas de cooperação igualitária com os Estados socialistas,
nomeadamente, Cuba e União Soviética, no plano da defesa e de assistência
técnica a quadros angolanos, dentro das políticas da construção do Estado e
das instituições políticas nacionais260.

4.1.1. As revisões á Lei constitucional de 1975

Com a consagração do Estado Soberano cuja a direcção política cabia


ao MPLA, seu legítimo representante, tendo este o domínio de todos os órgãos
do Estado, era também revestido de poder e legitimidade para proceder à
revisão constitucional, isto é, através do Comité Central do Partido 261. A Lei
Constitucional não gozava de limites temporais, caso verificável devido a
rapidez com que as alterações eram feitas, obedecendo às circunstâncias do
país. Foram feitas, nomeadamente, 7 revisões à Lei Constitucional de 1975.

258
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 126.
259
Ibidem, pág. 127.
260
Ibidem, pág. 127.
261
CORREIRA, Adérito & SOUSA, Bornito de, Angola: História Constitucional, pág. 23 apud CAPOCO,
Zeferino, op. cit., 2015, pág. 127.

156
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A primeira revisão à Lei Constitucional de 1975 acontece ao abrigo da


Lei de Revisão n.º 71/76 de 11 de Novembro. Esta alteração incidiu sobre dois
aspectos fundamentais: o reforço dos poderes do Presidente da República e o
reforço do papel dirigente do MPLA262.

A segunda revisão acontece em menos de um ano. A Lei n.º 13/77, de


7 de agosto, mais uma vez, introduziu novo reforço dos poderes do Presidente
da República. Segundo o art.º 32.º, o Presidente da República tinha
competência para nomear, dar posse e exonerar o Primeiro-Ministro e demais
membros do Governo263.

Quer isto dizer, no entender do ilustre Zeferino Capoco, que ao


“Presidente da República era reconhecido um papel interventivo maior no
aparelho governativo que, como acontece em sistemas semi-presidenciais,
aquele não era simples moderador”264.

A terceira revisão constitucional acontece em fevereiro de 1978. Esta


revisão de carácter mais profunda, consagrou princípios importantes do ponto
de vista da estrutura governativa e partidária 265.

A quarta revisão dá-se ao abrigo da Lei n.º 1/79. Destacando-se, nesta


nova revisão, a extinção dos cargos de Primeiro-Ministro e Vice Primeiro-
Ministro, porém, sem supressão dos artigos relativos a esses cargos 266.

4.1.2. Revisão Constitucional de 1980

Trata-se da quinta revisão da Lei Constitucional, introduzida de mais


profunda em relação a todas revisões feitas desde 1975. Esta alteração feita e
Setembro de 1980, por uma Revolução do Comité Central do MPLA, resultou
na alteração do Titulo III da LC, cujo objectivo foi aa criação dos órgãos do
“Poder Popular”, da Assembleia do Povo e das Assembleias Populares
locais267.
262
Cfr. Ibidem, pág. 128.
263
Ibidem, pág. 128.
264
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 128.
265
Cfr. CORREIRA, Adérito e SOUSA, Bornito de, Angola: História Constitucional, pág. 26 apud CAPOCO,
Zeferino, op. cit., 2015, pág. 128.
266
Cfr. Ibidem, pág. 128.
267
Ibidem, pág. 129.

157
REVISÃO CONSTITUCIONAL

A partir de 1980 o titular do poder de revisão passa ser a Assembleia do


povo. A lei constitucional, contudo, continua a não estabelecer quaisquer
limites de revisão. Isto significa que durante os cinco anos de independência o
poder constituinte foi exercido pelo MPLA.

Decorreram seis anos até se proceder a sexta e a sétima revisão


constitucional que teve lugar em fevereiro de 1986 (Lei nº 1/86, de 1 de
fevereiro) constitucionalizando o cargo de Ministro de Estado. No Ano seguinte
procedeu-se a nova revisão (Lei nº 2/87, de 31 de Janeiro), que se traduziu na
alteração da comissão permanente da Assembleia do Povo.

4.2. A IIª República (a Transição Constitucional e a Lei


Constitucional de 1991)

Já vimos que estamos perante a uma Transição constitucional quando


se verifica uma mudança profunda da constituição material podendo
permanecer a constituição instrumental e formal.

Ora, foi o que aconteceu na Lei Constitucional de 1991, deste modo, a


Lei Constitucional de 1991 não foi uma revisão à Lei Constitucional de 1975
como diz no preâmbulo da Lei de revisão. Com a transição Constitucional,
consagrou-se a IIª República Angolana.

Em rigor, as alterações feitas à Lei Constitucional de 1991 tiveram, como


plano de fundo a mudança do regime e ideologia política do Governo que o
Estado vinha seguindo desde a independência.

Com efeito, do ponto de vista político, o texto constitucional de 1991


consagra o pluripartidarismo, constitucionalizando os partidos políticos. O
Presidente da República passa a ser eleito por sufrágio universal, directo e
secreto. Além disso, as Forças Armadas são despartidarizadas. Do ponto de
vista económico, a constituição consagra um sistema assente na economia de
mercado.

Como se constata estamos perante uma nova constituição, cujos


fundamentos políticos e económico já não os da lei constitucional de 1975.

158
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Com a constituição de 1991 nasce um novo Estado, um Estado


democrático de Direito. Mantém-se, contudo, a da constituição instrumental e
formal de 1975. Aliás, foi a Assembleia do Povo, eleita na vigência da lei
constitucional de 1975, que exerceu o poder constituinte, alterando os
fundamentos do Estado, que ela havia jurado defender 268.

Esta transição constitucional tem de ser entendida à luz do processo


político então decorrente em Angola. As negociações com vista assinatura dos
acordos de paz para Angola e os pré-acordos a que havia chegado entre o
MPLA e a UNITA implicavam uma transição constitucional. A nova lei
constitucional foi publicada à 6 de Maio de 1991, e os acordos de paz foram
rubricados a 31 de Maio do mesmo ano. Podemos afirmar que aprovação da lei
constitucional de Maio de 1991 foi uma pré condição constitucional à assinatura
dos acordos de Bicesse269.

4.2.1. A revisão constitucional de 1992 (Lei nº 23/92, de 16


de Setembro)

A transição constitucional de 1991, procurou consagrar


constitucionalmente em primeiro lugar, as transformações económicas e socias
que se viam verificando no país, sobre tudo com as medidas que se pretendeu,
tomar no âmbito do S.E.F (Saneamento Económico Financeiro). Em segundo
lugar, do ponto de vista político, o grande objectivo foi a constitucionalização do
pluripartidarismo e a despartidarização das forças armadas, com vista à
abertura democrática que pretendia ampliar a participação dos cidadãos na
vida política dos cidadãos nacional270.

Após à assinatura dos acordos de Bicesse ficou clara que se iria realizar
as eleições multipartidárias em Setembro de 1992, para a eleição dos
deputados ao futuro parlamento e a escolha do Presidente da República,
através do sufrágio universal directo e secreto.

268
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 92
269
Ibidem, pág 92 e 93.
270
Ibidem, pág. 93.

159
REVISÃO CONSTITUCIONAL

Deste modo tornava-se assim, imprescindível a revisão da Lei


constitucional de 1991, tal como havia ficado acordado, não sou com vista a
estabelecer as competências da Assembleia Nacional a ser eleito (incluindo o
exercício do poder constituinte), mas sobre tudo com vista a alterar a
designação do Estado, (deixando de ser República Popular de Angola,
passando a ser República de Angola).

Esta revisão, serviu também para estabelecer o numero de deputados


que fariam parte do órgão legislativo, introduzir também novos artigos no título
II sobre os Direitos e Deveres fundamentais, ampliando substancialmente estes
direitos e correspondentes garantias. Introduzir alterações de fundo as normas
sobre a organização e o funcionamento do Estado e finalmente, estabelecer
normas sobre a fiscalização da constitucionalidade 271.

No tocante ao poder de revisão, introduzem-se, pela primeira vez na


história constitucional de Angola, normas sobre o procedimento e forma da
revisão constitucional. Prevendo-se a realização de eleições presidências e
legislativas, como já foi salientado, a lei de revisão ditou também as normas
transitórias relativas aos Órgãos de Soberania e outros órgãos previstos
constitucionalmente, mas ainda não criados272.

No âmbito do sistema eleitoral, urge ainda sublinhar, que os partidos


políticos […] concorrem para a organização e para a expressão da vontade dos
cidadãos, participando na vida política e na expressão do sufrágio universal,
por meios democráticos e pacíficos (art.º 4.º, n.º 1) 273.

Desta feita, acontecia, pela primeira vez em Angola, as eleições


presidenciais e legislativas realizadas nos dias 29 e 30 de Setembro do mesmo
ano, o primeiro exercício da soberania do povo (videm ao art.º 3.º da LC de
1992), com expressão da vontade para a designação dos titulares do poder
político. Nas eleições presidenciais de 1992, os resultados foram as
seguintes274:

271
Ibidem, pág. 93
272
Ibidem, pág. 93.
273
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 132
274
Ibidem, pág. 132

160
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Nome do candidato Percentagem de votos Resultados finais


José Eduardo dos 49% 2.ª Volta
Santos (nunca realizada)
Jónas Malheiro Savimbi 41%
Outros candidatos 10% Não eleitos

No tocante as eleições legislativas, registou-se a vitória por maioria


absoluta do MPLA (54% dos votos), enquanto que o maior partido da oposição
aa UNITA, obteve 34% dos votos. A UNITA não aceitou os resultados tanto das
eleições presidenciais como das eleições legislativa, sendo assim houve o
retorno do conflito armado, que consequentemente, causou um grande
retrocesso ao processo de democratização e do ponto de vista constitucional
houve uma estagnação275.

Esta situação levou ao prolongamento das funções da Assembleia e do


Governo eleitos em 1992 até à normalização da situação política que tornou
possível as novas eleições gerais de Setembro de 2008.

5. A Constituição da República de Angola de 2010

A Constituição de Angolana de 2010 tem uma estrutura que contém uma


unidade textual que é suporte da sua unidade normativa, sendo assim uma
constituição unitextual276.

5.1. Procedimento Constituinte

Primeiramente, passemos a um breve estudo da feitura da actual


Constituição e posteriormente, veremos a sua estrutura sistemática.

O processo para elaboração da Constituição de Angola de 2010


demonstrou ser um procedimento diferente e mais solene do que qualquer
outro procedimento, normalmente, usada para os actos legislativos ordinários.
Só isto é sinal de que se tratou de uma Lei superior de carácter programático

275
Cfr. Ibidem, pág. 132.
276
Ibidem, pág. 136.

161
REVISÃO CONSTITUCIONAL

de toda actividade político-jurídica do Estado, como é a natureza da


Constituição escrita277.

Para elaboração da Constituição de 2010 foi necessário a apresentação


de propostas de anteprojecto à Assembleia Nacional pelos partidos políticos
com assento parlamentar. Os anteprojectos foram entregues a uma Comissão
Constitucional, composta por 45 Deputados selecionados de todos os partidos
representados na Assembleia Nacional, encarregues de elaborar a
Constituição através da fusão das propostas dos partidos. Dessa fusão,
resultaram três projectos (A, B e C). Cada um destes projectos constitucionais
consagrava um sistema político de governo278.

A proposta A - consagrava o sistema de governo presidencialista; a


proposta B – consagrava o Semipresidencialismo e a proposta C – consagrava
o Presidencialismo Parlamentar ou Presidencialismo atípico 279.

A Comissão Constitucional, aprovou a anteprojecto ou a proposta C,


sendo assim a Constituição da República de Angola de 2010 resultou da
adopção do projecto C, consagrando o sistema de governo presidencialista –
parlamentar, com amplos poderes concentrado na figura do Presidente da
República280.

5.2. Estrutura sistemática da Constituição de 2010

Do ponto de vista sistemático, a actual Constituição angolana apresenta


a seguinte estrutura:

1.º) O preâmbulo, indica as linhas gerais, objectivos e intenções que


motivaram a feitura ou aprovação da Constituição, bem como a identidade do
titular do poder constituinte que, doutrinalmente, é a Nação ou o povo (We, the
People) através do seu representante (Assembleia Constituinte) 281.

277
Cfr. Ibidem, pág. 136.
278
Ibidem, pág. 136.
279
POULSON, Lazarino, Pensar Direito, vol. III, 2009, pág. 49.
280
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 137.
281
Ibidem, pág. 138.

162
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

2.º) O texto da Constituição, compreende o conjunto de artigos da


Constituição, ou seja, o Conjunto de artigos encontrados em Títulos, Capítulos
e secções, agrupados segundo a matéria que regulam, bem como os anexos
que são disposições de carácter técnico que, pela sua importância política,
figuram na Constituição (Bandeira Nacional, Insígnia e o Hino Nacional).

De forma sistemática a Constituição de 5 de Fevereiro de 2010


apresenta a seguinte estrutura:

Preâmbulo
Titulo I – Princípio Fundamentais (art.º 1.º - 21.º)
Titulo II – Direitos e Deveres Fundamentais (art.º 22.º - 88.º)
Capítulo I – Princípios Gerais (art.º 22.º - 29.º)
Capítulo II – Direito, Liberdades e Garantis Fundamentais (art.º 30.º -
75.º)
Secção I – Direitos e Liberdades individuais e colectivas (art.º 30.º -
55.º)
Secção II – Garantia dos direitos e liberdades fundamentais (art.º 56.º -
75.º)
Capítulo III – Direitos e Deveres económicos., sociais e culturais (art.º
76.º - 88. º)

Titulo III – Organização económica, financeira e fiscal (art.º 89.º - 104.º)


Capítulo I – Princípios gerais (art.º 89.º - 98.º)
Capítulo II – Sistema financeiro e fiscal (art.º 99.º - 104.º)

Título IV – Organização do poder do Estado (art.º 105.º - 197.º)


Capítulo I – Princípios gerais (art.º 105.º - 107.º)
Capítulo II – Poder executivo (art.º 108.º - 140.º)
Secção I – Presidente da República (art.º 108.º - 112.º)
Secção II – Mandato, posse e substituição (art.º 113.º - 116.º)
Secção III – Competência (art.º 117.º - 126.º)

163
REVISÃO CONSTITUCIONAL

Secção IV – Responsabilidade, auto-demissão e vacatura do Presidente


da República (art.º 127.º - 133.º)

Secção V – Órgãos auxiliares do Presidente da República (art.º 134.º -


136.º)
Secção VI – Actos, incompatibilidade e responsabilidade dos Ministros
de Estados, Ministros Secretários de Estados e Vice-Ministros (art.º 137.º -
136.º)

Capítulo III – Poder Legislativo (art.º 141.º 173.º)


Secção I – Definição, estrutura, composição e eleição (art.º 141.º 146.º)
Secção II – Estatuto dos Deputados (art.º 147.º - 154.º)
Secção III – Organização e funcionamento (art.º 155.º - 159)
Secção IV – Competência (art.º 160.º - 165.º)
Secção V – Processo Legislativo (art.º 166.º - 173.º)
Capítulo IV – Poder judicial (art.º 174.º - 179.º)
Secção I – Princípios gerais (art.º 174.º - 179.º)
Secção II – Tribunais (art.º 180.º - 184.º)
Secção III – Ministério Público (art.º 185.º - 191.º)
Secção IV – Instituições essenciais à justiça (art.º 192.º - 197.º)

Titulo V – Administração Pública (art.º 198.º - 212.º)


Capítulo I – Princípios gerais (art.º 198.º - 201.º)
Capitulo II – Segurança nacional (art.º 202.º - 205.º)
Capítulo III – Defesa Nacional e Forças Armadas (art.º 206.º - 208.º)
Capítulo IV – Garantia da Ordem e Polícia Nacional (art.º 209.º - 210.º)
Capítulo V – Preservação da segurança do Estado (art.º 211.º - 212.º)
Titulo VI – Poder Local (art.º 213.º - 225.º)
Capítulo I – Princípios gerais (art.º 213.º - 216.º)
Capítulo II – Autarquias Locais (217.º - 222.º)
Capítulo III – Instituições do poder tradicional (art.º 223.º - 225.º)

164
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Titulo VII – Garantias da Constituição e controlo da Constitucionalidade


(art.º 226.º - 237.º)
Capítulo I – Fiscalização da Constitucionalidade (art.º 226.º - 232.º)
Secção I – Princípios gerais (art.º 226.º - 227.º)
Secção II – Fiscalização abstrata preventiva (art.º 228.º - 229.º)
Secção III – Fiscalização abstrata sucessiva (art.º 230.º - 232.º)

Titulo VIII – Disposição finais transitórias (art.º 238.º - 244.º)

6. A Constituição da República de Angola de 2010: IIª ou


IIIª República?

Com a criação e a entrada em vigor da Constituição de 2010, tem


emergido vários debates concernente em que República estamos. A doutrina
angolana tem maioritariamente advogado que com a entrada em vigor da
Constituição de 2010, Angola encontra-se na IIIª República, em contrapartida
poucos autores, inclusive, Bacelar Gouveia, advogam que mesmo com a
entrada em vigor da Constituição de 2010, Angola continua na IIª República.

Antes de frisamos sobre o assunto e consequentemente dizer qual das


posições defendemos, vejamos antes quando é que se consagra uma nova
República.

Ora bem, consagra-se uma nova República, quando surge uma nova
Constituição que possui mudanças profundas a da anterior Constituição.

Todas as Constituições, como vimos, possuem limites de revisão


Constitucional, tais limites defendem o sene ou a estrutura fundamental do país
e caso elas sejam alteradas, mudariam os parâmetros fundamentais do Estado,
como: o Regime de Governo, forma de Estado, o princípio de relação dos
órgãos de soberania, etc. Quando isto, acontecer, estaremos perante a uma
transição ou ruptura constitucional e consequentemente diante de uma nova
República.

165
REVISÃO CONSTITUCIONAL

Agora a questão que se coloca é: será que com a entrada em vigor da


Constituição de 2010, o Estado angolano passou para a IIIª República ou
continua na IIª República?

O celebre constitucionalista Raul Araújo, advoga que com a entrada em


vigor da Constituição de 2010, o Estado angola passou para IIIª República, ou
seja, no entender do emblemático constitucionalista a Constituição de 2010,
trouxe várias mudanças no eu texto constitucional do ponto de vista do sistema
social, no regime político e no sistema económico, mudanças estas, que não se
verificavam no texto constitucional de 1992. Sendo assim, nota-se a passagem
de uma República para outra.

Ao contrário deste, o prof. Bacelar Gouveia não crê que o aparecimento


da CRA tenha determinado a mudança para uma III República, mais o autor
não apouca a importância do novo texto constitucional 282.

Para Bacelar Gouveia, o texto constitucional de 2010 segue as linhas


originalmente traçadas pela Lei Constitucional de 1992, ou seja, a Constituição
de 2010 manteve a identidade constitucional ou as características inauguradas
em 1992, apenas esta, sofreu um aprofundamento jurídico-constitucional.

Quanto a nós, corroboramos com a posição tomada pelo prof. Bacelar


Gouveia.

Para nós a Constituição de 2010, trouxe sim novas mudanças que não
se verificavam no texto constitucional de 1992, mas há que se ter em conta,
que o texto constitucional de 2010 não extrapolou nenhum dos limites revisão
constitucional consagrados na Lei constitucional de 1992 e como frisamos
acima, não se pode falar de transição ou ruptura constitucional, quando não se
viola os limites de revisão constitucional.

Mesmo com a mudança do sistema de governo, que antes era


semipresidencialista passando a ser presidencialista-parlamentar, não houve
transição nem uma ruptura constitucional, porque esta matéria nunca esteve
protegida ao nível dos limites materiais de revisão constitucional de 1992.

282
GOUVEIA, Jorge Bacelar, op. cit., 2012, pág. 124 e ss.

166
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Sendo assim, para nós o Estado angolano continua na IIª República, a


Constituição de 2010 apenas trouxe um aprofundamento das matérias jurídico-
constitucional de 1992. Mas não obstante disso, é necessário aqui salientar
que todos são livres de escolher a sua posição, basta saber como fundamenta-
la.

167
CAPITULO VII

CONTROLO E GARANTIA DA
CONTITUCIONALIDADE
Chegamos a um tema bastante pertinente e mais cobrados aos
estudantes de Direito. Nomeadamente este capitulo concentrar-se-á na
questão das inconstitucionalidades e a fiscalização da
constitucionalidade, temas estes que constituem uma problemática a nível
mundial.

Vale ainda ressalvar, que os temas em destaques contêm vários


conceitos próprios, peculiares, que fogem totalmente ao nosso dia a dia, por
isso, no estudo desse capítulo, mais do que nunca a nossa missão será de
aproximar as matérias de controlo e garantia da constitucionalidade ao nosso
cotidiano, utilizando exemplos práticos, pois só assim tais conceitos serão, de
facto entendidos (e não meramente decorados!).

Tendo dito isso, vamos então partir neste estupendo e maravilhoso


tema.
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

1. Inconstitucionalidade das Leis

De uma forma simples, entende-se por Inconstitucionalidade “como um


desrespeito à Constituição”283, ou seja, quando uma norma ou um acto
desrespeita a Constituição.

Este desrespeito à Constituição, porém, poderá advir de diferentes


comportamentos, por parte dos órgãos públicos.

1.1. Tipos de Inconstitucionalidade

O desrespeito à Constituição poder manifestar-se de vários modos e


gerar por isso diversos tipos de inconstitucionalidade, neste caso destacam-se
as seguintes:

1.1.1. Inconstitucionalidade por Acção e por Omissão

A inconstitucionalidade por acção resulta quando se dá a


desconformidade resultante da actuação de um órgão do poder, ou seja,
quando um acto viola um preceito ou princípios constitucionais.

Por exemplo: o Presidente da República nomeia 10 deputados à


Assembleia Nacional.

A inconstitucionalidade por acção pode ser:

a) Material: resulta da contrariedade do conteúdo de uma lei com a


constituição. Por exemplo: Elaboração de uma lei prevendo a pena
de morte, esta lei violaria o conteúdo constitucional nomeadamente
o artigo 59 da CRA;

b) Formal: ocorre quando a um desrespeito ao processo legislativo da


elaboração da norma, seja no tocante a competência para legislar,
seja no tocante no procedimento legislativo em si. Por exemplo: A
entrada em vigor de uma Lei, sem antes ser promulgada pelo
Presidente da República;

283
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo & DIAS, Frederico, op. cit., 2013, pp.

169
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

c) Orgânica: ocorre quando um acto normativo provém de um órgão


constitucionalmente incompetente para o efeito 284, ou seja, ocorre do
descumprimento de uma regra de competência para legislar, por
exemplo, um decreto versando sobre os impostos, matéria de
competência não para o conselho de ministro, mas sim na
Assembleia Nacional).

A Inconstitucionalidade por omissão resulta de uma lacuna do


legislador na regulamentação de um direito previsto na Constituição ou um acto
insuficiente de um órgão do Estado.

Por exemplo: no modelo de Governo em que a figura de Primeiro-


Ministro coexiste com a de Presidente da República, se este não nomear
aquele há inconstitucionalidade por omissão.

1.1.2. Inconstitucionalidade Total e Parcial

A inconstitucionalidade total é aquela que abrange toda lei (por exemplo,


quando todas as normas ou artigos de uma determinada lei são declaradas
inconstitucionais).

A inconstitucionalidade parcial é aquela que somente atinge uma parte


da lei (por exemplo, somente o art.º 10 de uma determinada lei é declarado
inconstitucional).

1.1.3. Inconstitucionalidade Directa e Indirecta

A inconstitucionalidade directa, resulta quando uma norma inferior


viola directamente a Constituição ou os princípios Constitucionais 285. Dito de
outro modo, ocorre quando actos primários (nomeadamente as Lei da
Assembleia Nacional), desrespeitam a Constituição. Por exemplo, a elaboração
de uma Lei da Assembleia Nacional que viola ou desrespeita a Constituição).

284
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 150
285
Cfr. Ibidem, pág. 149.

170
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A inconstitucionalidade indirecta ocorre quando à Constituição não é


violada directamente, isto é, quando a norma infraconstitucional viola outra
norma a que a Constituição confere um valor superior (ilegalidade).

Por exemplo, se um decreto “X” contrariar directamente uma Lei “y”


estará a contrariar concomitantemente a Lei e a Constituição. Diante do caso
dar-se-á uma mera inconstitucionalidade indirecta (ou reflexa), pois a violação
que o decreto atingiu não foi directa à Constituição.

1.1.3. Inconstitucionalidade Imediata e Derivada

A inconstitucionalidade imediata é quando a declaração da


inconstitucionalidade de uma Lei regulamentada não leva a invalidade de
outras Leis regulamentadoras. Por exemplo se existir duas leis que versam
sobre a mesma matéria e posteriormente declara-se a inconstitucionalidade de
uma delas, a lei que será revogada será a lei que se decretou a sua
inconstitucionalidade.

Por sua vez a inconstitucionalidade derivada, ocorre quando a


declaração da inconstitucionalidade de uma Lei regulamentada leva a
invalidade ou revogação das Leis regulamentadores. Por exemplo, se existir
duas leis que tratam sobre a mesma matéria e posteriormente declara-se a
inconstitucionalidade de uma delas e se verificar que a outra também pode vir a
estar em desconformidade com a Constituição, está deixa automaticamente de
produzir efeitos, a declaração da inconstitucionalidade desta atinge, por
derivação.

1.1.4. Inconstitucionalidade Originária e Superveniente

A inconstitucionalidade originária é aquela que se verifica no


momento da nascença da norma, isto é, uma norma infraconstitucional
contraria a norma de uma Constituição que lhe é anterior.

A inconstitucionalidade superveniente resulta de incompatibilidade


entre a lei e o texto constitucional futuro (futura Constituição ou futura emenda
à Constituição), ou seja, quando uma norma ordinária, inicialmente

171
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

constitucional, se torna inconstitucional por entra em vigor uma constitucional


que a contraria. Só releva se for material.

O esquema abaixo organiza os tipos de inconstitucionalidade

Por acção Quanto um acto ou a elaboração de uma lei contrariar a Constituição

Resulta quando se dá a desconformidade resultante da actuação de um órgão do


poder ou quando um órgão do poder público deve praticar um acto e não o
Por omissão pratica.

Material Ocorre quando o conteúdo da lei desrespeita a Constituição

Formal Ocorre quando há desrespeito ao processo legislativo de elaboração da norma

Ocorre na pratica de um acto por parte de um órgão do poder público quando a


Orgânica Constituição não o confere poder para tal

Total Alcança toda lei

Parcial Atinge parte da lei

Tipos de Directa
Ocorre quando uma norma inferior viola a Constituição
Inconstitucionali
dade Ocorre quando a Constituição é violada por actos infra
Indirecta legais

Ocorre quando a declaração da inconstitucionalidade


da norma regulamentada (primária) não leva a
Imediata invalidade das normas regulamentadoras (secundárias)

Ocorre quando a declaração da inconstitucionalidade da


norma regulamentada (primário) leva ao automático e
inevitável reconhecimento da invalidade das normas
Derivada regulamentadoras (secundárias) que haviam sido expedidas
em razão dela

Originária Resulta do confronto da lei com a Constituição vigente

Superveniente Resulta do confronto da lei com a Constituição futura

172
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

2. Fiscalização da Constitucionalidade e legalidade

Antes de mais, é necessário reconhecer que uma fiscalização visa


sempre apurar a conformidade das leis ou dos actos dos órgãos do poder
Público com a Constituição, ou seja, a fiscalização visa, mormente, contrariar a
pratica de actos desconformes ou irregulares, como pressiona a que as
diferentes estruturas, sujeitos passivos de uma relação de controlo, atuem de
acordo com o constitucional ou legalmente estabelecido e tendo com vista o
interesse público definido pelo poder político. No plano dos efeitos da
declaração de inconstitucionalidade, advoga-se a chamada ressalva dos casos
julgados:

O princípio assim enunciado significa que a declaração de


inconstitucionalidade com força obrigatória geral não de per se a nulidade das
sentenças nela fundadas e não constituir fundamento autónomo da sua
revisão.

Podem reter-se dois aspectos:

Em primeiro lugar, que a inconstitucionalidade da lei aplicada não


impede que a respectiva sentença transite em julgado. E, se isto é assim
mesmo quando a inconstitucionalidade e reconhecida por decisão com eficácia
erga omnes, a mesma conclusão impõem-se por maioria da razão, nos de mais
casos. Por isso, embora esteja pensada para os efeitos da declaração da
inconstitucionalidade com força obrigatória geral referência aos números 1 e 2
dos artigos 231.º sobre os casos julgados que têm força obrigatória geral.

Noutros aspectos, a ressalva dos casos julgados revela em segundo


lugar, que a declaração de inconstitucionalidade com força geral não constitui
286
qualquer fundamento autónomo de revisão das sentenças firmes .

Sobre a questão da ressalva dos casos julgados, há que evocar também


o n.º 3 do art.º 231.º da CRA, estatuindo que “ficam ressalvados os casos
julgado s, salvo decisão em contrário do Tribunal Constitucional quando a

286
MEDEIROS, Rui, A Decisão de Inconstitucionalidade, 1999, pág. 49 apud CAPOCO, Zeferino, op. cit.,
2015, pág. 151.

173
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

norma respeitar a matéria penal, disciplinar ou de ilícito de mera ordenação


social e for de conteúdo menos favorável ao arguido”.

No tocante a estas matéria leva-se sempre em consideração a norma


que seja mais favorável ao arguido.

2.1. Os Órgãos de Fiscalização da Constitucionalidade

Para o controlo da Fiscalidade a doutrina debruça vários órgãos de


controlo da fiscalização da constitucionalidade consagrados em vários
ordenamentos jurídico-constitucionais. Tais são:

I. Controlo político, para os teóricos e os revolucionários do século


XVIII o povo deve ser o principal fiscal da observância da constituição e a
sansão contra o não cumprimento dessa lei é a revolta ou insurreição contra os
órgãos de soberania287. Desta forma estamos perante a um modo de controlo
politico, se bem que este não estivesse entregue a nenhum órgão. A Criação
deste é proposto por Sieyés, que defende a ideia de confiar a um órgão político
a salvaguarda da Constituição. Para Sieyés o controlo da constitucionalidade
deve ser confiado a um corpo de representantes, a um “jurie constitutiomaire”.
Com base nesta proposta é criada na França o Senado ao qual, lhe incumbe a
missão de “conservar a Constituição. Sendo assim, no Século XIX,
predominantemente na Europa, o controlo político, passou a ser feito por
órgãos políticos, assembleias legislativas ou outros órgãos

II. Controlo Jurisdicional ou difuso, neste sistema de controlo a


fiscalização é levada a cabo por todos os juízes, como nos E.U.A. Nos E.U.A
todo e qualquer juiz, qualquer tribunal pode recusar-se a aplicar uma norma
que considere inconstitucional num litígio que tenha de dirimir. É necessário
realçar, que além de um controlo difuso, trata-se de um controlo incidental e um
controlo concreto.288 O controlo jurisdicional pode ainda ser levado a cabo por
um único órgão jurisdicional, que pode ser o Tribunal Supremo, como na
Áustria (sistema concentrado ou austríaco), a partir de 1920 ou Tribunal

287
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 108
288
Ibidem, pág. 108

174
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Constitucional especialmente criado para esse efeito, como na Alemanha


Federal, a partir de 1949 ou na Itália, a partir de 1947.

III. Controlo misto, neste sistema de controlo a fiscalização é exercida


pelos órgãos políticos e pelos órgãos judiciais. Os órgãos políticos fiscalização
certas matérias e os órgãos jurisdicional fiscaliza as outras matérias 289.

Em Angola, o ordenamento jurídico angolano, estabelece um sistema de


fiscalização do tipo misto, abstracto e concreto da constitucionalidade das
normas jurídicas, mediante o papel activo e de arbitragem pelo Tribunal
Constitucional (art.º 180.º, n.º 2 da CRA). Fundamentaremos isso mais adiante.

2.2. Fiscalização da Constitucionalidade quanto ao modo


de impugnação

Trata-se aqui de técnicas de controlo jurisdicional da constitucionalidade


depois da lei entrar em vigor e ser aplicada em um determinado litígio, este tipo
de fiscalização pode ser por via de acção ou principal, por via de excepção ou
incidental, por via abstracta e por via concreta290.

1ª Fiscalização por via de acção ou por via principal

Nesta modalidade os cidadãos ou certas entidades podem contestar um


acto normativo inconstitucional independentemente da existência de qualquer
litígio. O controlo por via de acção opera, portanto, no quadro de um processo
intentado directamente contra lei que se entende ser inconstitucional, com vista
a obter a sua anulação291.

Esta técnica não é empregada muito frequentemente e tem como


objectivo obter a anulação de uma lei lesada de inconstitucionalidade.

2ª Fiscalização por via de excepção ou incidental

A inconstitucionalidade por via excepcional ou incidental é invocada no


decurso de uma acção submetida à apreciação dos tribunais. Diferente da
fiscalização por via de acção ou principal, a fiscalização por via excepcional ou
289
CAPOCO, Zeferino, op. cit., 2015, pág. 153.
290
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 111.
291
Ibidem, pág. 111.

175
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

incidental, só é invocada quando há existência de qualquer litígio. Ou seja, o


mecanismo é o seguinte: um processo opõe duas partes. Uma delas invoca um
texto legalmente favorável à sua causa; a parte contrária requer ao juiz a não
aplicação das normas constantes desse documento legal, por serem contrárias
à Constituição.

Em termos técnicos diz-se que o segundo litigante levanta a excepção


da inconstitucionalidade. A questão da inconstitucionalidade é, portanto,
levantada incidentalmente.

Diz-se fiscalização por via incidental, na medida em que a


inconstitucionalidade surge a título de incidente processual, ou seja, há um
desvio da tramitação normal do processo.

Nestes termos, o juiz deve antes de julgar o fundo do litígio, decidir


sobre a inconstitucionalidade da lei contestada. Pronuncia, assim, uma primeira
decisão sobre a constitucionalidade da lei e depois, com base nesta primeira
decisão, julga a questão de fundo do processo. A outra parte pode recorrer,
podendo a lei ser definitivamente julgada quanto à sua constitucionalidade.
Assim, o juiz não anula a lei, limita-se a declarar que a mesma ´inconstitucional
e que, portanto, não se aplica ao processo em causa e às partes em litígio
nesse processo. Portanto, a lei continua em vigor até ser anulada pelo órgão
competente, apesar de reconhecida como inconstitucional. O juiz limita-se a
não aplicar ao caso concreto. A decisão tem, portanto, eficácia inter partes 292.

3ª Fiscalização por via abstracta

Na fiscalização ou controlo abstrato a impugnação da


constitucionalidade de uma lei é feita independentemente de qualquer litígio
concreto. Não estamos, portanto, perante a um processo contraditório de
partes, trata-se de um processo que visa a defesa da constituição através da
eliminação de actos normativos contrários à mesma. É, assim, um processo
objectivo, daí que a legitimidade para solicitar esta fiscalização ou controlo é
geralmente reservada a um número restrito.

292
Ibidem, pág. 111.

176
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

4ª Fiscalização por via concreta

Este modo de fiscalização está relacionado ao controlo jurisdicional


difuso. O controlo concreto é a concretização da ideia americana da juricial
review: qualquer tribunal que tem de decidir um caso concreto está obrigado,
em virtude da sua vinculação pela constituição, a fiscalizar se as normas
aplicadas ao caso são ou não válidas293.

2.3. Fiscalização da Constitucionalidade quanto ao


momento em que é feita

A Constitucionalidade pode ser feita antes de entrar em vigor


(fiscalização preventiva) ou depois de estar em vigor (fiscalização sucessiva).

1ª Fiscalização Preventiva

É a fiscalização levada a cabo antes de as normas serem publicados no


Diário da República e concomitantemente estarem em vigor. As normas em
causa ainda não existem como tais. O Tribunal Constitucional, conforme o
caso, é chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade das normas
antes da promulgação das mesmas, com vista a impedir que sejam
promulgados diplomas com normas inconstitucionais.

2ª Fiscalização Sucessiva

A fiscalização sucessiva tem por objecto examinar normas já


pertencentes à ordem jurídica, normas já publicadas no Diário da República de
modo a evitar que normas inconstitucionais permaneçam em vigor.

2.4. Natureza e Efeitos do Juízo de Inconstitucionalidade

- Efeitos gerais e efeitos particulares

Estamos perante a um efeito geral ou com força obrigatória geral de


inconstitucionalidade, quando o acto ou norma é eliminado do ordenamento
jurídico e deixa de produzir efeitos para todos os casos e para todas as
pessoas.

293
Ibidem, pág. 112.

177
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

Em contrapartida estamos perante aos efeitos particulares de


inconstitucionalidade, quando os tribunais se limitam a desaplicar no caso em
juízo as normas que tenham por inconstitucionais, sem que essa decisão tenha
qualquer influência sobre a vigência da norma, continuando esta em vigor e
podendo a vir a ser aplicada noutro processo.

- Efeitos retroactivos e efeitos prospectivos

Verifica-se o efeito retroactivos de inconstitucionalidade, quando a


norma declarada inconstitucional deixa de produzir efeitos ex tunc, e ao mesmo
tempo que determina efeitos repristinatórios de qualquer norma eventualmente
revogada pelo acto normativos ora declarado inconstitucional 294.

Dito de outro modo, os efeitos repristinatórios terão como função pescar


ou resgatar todos os actos normativos anteriormente revogados por causa de
uma outra lei que posteriormente tornou-se inconstitucional, ou seja, este efeito
tem como objectivo devolver o valor normativo de todas as leis que foram
revogadas por causa de uma outra lei que depois tornou-se inconstitucional.

Já os efeitos prospectivos, verifica-se quando a declaração da


inconstitucionalidade faz com que a norma ou lei inconstitucional deixe de
produzir efeitos ex nunc295, ou seja, a partir do momento da sua declaração. Ou
seja, os efeitos prospectivos não resgatam as normas que anteriormente forma
revogas por causa de uma outra norma que posteriormente tornou-se
inconstitucional.

- Efeitos na inconstitucionalidade por acção e por omissão

A declaração da inconstitucionalidade por acção elimina a


inconstitucionalidade a norma ou acto inconstitucional, repondo a legalidade
constitucional.

Já a declaração de inconstitucionalidade por omissão te eficácia


meramente declarativa e não condenatória, limitando-se o Tribunal

294
Ibidem, pág. 113.
295
Ibidem, pág. 113.

178
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Constitucional a verificar o não cumprimento da Constitucionalidade por falta de


adopção de medidas legislativas.

- Efeitos na fiscalização preventiva e sucessiva

Na fiscalização preventiva as normas em causa não existem enquanto


tais. A apreciação do Tribunal Constitucional diz respeito ao processo de
formação das mesmas. A sua função é impedir que o Presidente da República
promulgue diplomas com normas inconstitucionais 296.

Na fiscalização sucessiva estamos perante normas já pertencentes à


ordem jurídica e a sua função é eliminá-las. Aqui o Tribunal Constitucional
declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral ou, juntamente com
os demais tribunais, julga as normas inconstitucionais, com que elas não
podem ser aplicadas297.

- Efeitos de fiscalização abstrata e concreta

Na fiscalização abstrata a declaração de inconstitucionalidade tem


efeitos gerais, com a consequente invalidação dessa norma e a impossibilidade
de ela continuar a ser aplicada por qualquer tribunal ou autoridade 298.

Na fiscalização concreta, os tribunais limitam-se a desaplicar no caso em


juízo as normas que tenham por inconstitucionais, sem que essa decisão tenha
qualquer influência sobre a vigência abstrata da norma, continuando esta em
vigor e podendo a vir a ser aplicada noutro processo, se for o entendimento do
tribunal competente299.

3. Fiscalização da Constitucionalidade na CRA de 2010

Entende-se que, no ordenamento jurídico angolano, estabelece-se um


controlo de fiscalização do tipo misto, abstrato e concreto, assim como já foi
salientado anteriormente.

296
Ibidem, pág. 113.
297
Ibidem, pág. 114.
298
Ibidem, pág. 114.
299

179
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

Segundo a Lei Fundamental angolana, “a validade das leis e dos demais


actos doestado, da administração pública e do poder local depende da sua
conformidade com a Constituição” (art.º 226.º, n.º 1). Assim “são
inconstitucionais as leis e os demais actos (do poder) que violem os princípios
e normas consagrados na Constituição” (art.º 226.º, n.º 2).

A competência apreciativa e declarativa é reservada ao Tribunal


Constitucional, nos termos do art.º 230.º, n.º 1, estatuído que o Tribunal
Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral, a
inconstitucionalidade1 de qualquer norma.

Mas a pronúncia de inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional


não significa que este órgão sane a inconstitucionalidade detectada na norma
assim declarada, senão que o Tribunal devolva a referida norma ao órgão de
proveniência desta para expurgar o vício, conformando-a deste modo, à norma
superior.

A Constituição consagra no Título VII dois institutos de fiscalização


assim dispostos: na Secção II, dispondo a fiscalização abstracta preventiva, e,
na Secção III, a fiscalização abstracta sucessiva.

- A fiscalização abstracta preventiva da constitucionalidade: o art.º


228.º indica dois órgãos com poderes para solicitar a fiscalização preventiva
das normas jurídicas. Tais competências reservam-se:

Primeiramente, ao Presidente da República, que pode usa-las sempre


que estiver perante “uma dúvida” ou para melhor se certificar da
constitucionalidade dos diplomas que lhe sejam submetidos par promulgar,
ratificar ou assinar.

Em segundo, o n.º 2 do mesmo artigo atribui poder de requer a


apreciação preventiva da constitucionalidade de qualquer norma constante de
diploma legal submetido à promulgação aos Deputados NA, indicando-se a
respectiva maioria definida em “um décimo dos Deputados em efectividade de
funções”.

180
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Devemos concluir das disposições em análise que a fiscalização da


constitucionalidade é preventiva quando é feita antes de a norma ser
promulgada, ratificada e assinada pelo Presidente da República, devendo ser
requerida tal apreciação no prazo de vinte dias a contar da data da recepção
do diploma legal (nos termos do n.º 3 do art.º 228.º).

Quanto aos seus efeitos, a fiscalização preventiva tem um carácter


suspensivo da norma declarada inconstitucional, isto é, impeditivo por acto do
veto pelo Presidente da República, sendo devolvida ao órgão que a aprovou,
de acordo com o art.º 229.º. Neste caso, o n.º 2 do mesmo artigo sugere o
“efeito correctivo” da norma declarada inconstitucional, que depois de devolvida
ao órgão que a emitiu deve este expugnar a norma julgada inconstitucional (n.º
3).

- A fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade: a


fiscalização sucessiva é um procedimento posterior à entrada em vigor de
diplomas legais e pode incidir sobre aqueles que tenham sido fiscalizados
preventivamente ou sobre os que não passaram pelo acto de fiscalização
prévia. Visa, por isso, detectar eventuais desconformidades ou violações contra
a Constituição que tenham passado despercebidas quer ao legislador, quer ao
Presidente da República no acto da promulgação.

Devemos notar que a entrada em vigor de diploma legais promulgados,


ratificados ou assinados pelo Presidente da República não é, por si só, a
garantia total da pureza constitucional das normas contantes em tais diplomas
legais.

Os órgãos com legitimidade para requer a fiscalização sucessiva, assim


designados conformes o n.º 2 do artigo 230.º da CRA em apreço:

a) O Presidente da República;
b) Um décimo dos Deputados à Assembleia Nacional em efectividade
de funções (desempenhado, desta forma, um aspecto da função
fiscalizadora e legislativa do órgão que represento);

181
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

c) Os Grupos Parlamentais (como órgão da NA competência para


apresentar propostas de leis, traduzindo o requerimento num aspecto
de alteração de diplomas);
d) O Provedor-Geral da República (na qualidade de órgão do Estado
desempenhado a função de representar o Estado nos termos do n.º 1
do art.º 189.º);
e) O Provedor de Justiça (exercendo, como entidade pública
independente, uma função de defesa dos direitos, liberdades e
garantias, nos termos dos n.os 1 e 4 do art.º 192.º);
f) A Ordem dos Advogados de Angola (como instituição essencial à
administração da justiça como estatui o n.º 1 do art.º 193.º).

4. Recurso de inconstitucionalidade

Recurso é o meio para submeter uma decisão judicial a uma nova


apreciação por um tribunal superior (no caso em concreto, o Tribunal
Constitucional). Urge ainda realçar que só pode haver recurso, se a questão de
inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo, tendo o juiz a
possibilidade de sobre ela decidir, caso contrário não é admitido o recurso para
o Tribunal Constitucional.

O recurso de inconstitucionalidade pode ser: ordinário ou


extraordinário.

a) Recurso ordinário de inconstitucionalidade: estes recursos têm


natureza incidental e apenas podem ser apreciados pelo Tribunal
Constitucional após sentença final proferida pelo Tribunal da
causa300. Podem ser objecto de recurso ordinário de
inconstitucionalidade as sentenças dos que:

- Se recusem à aplicação de qualquer norma com fundamento em


inconstitucionalidade;

- Apliquem norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada


durante o processo;

300
ARAÚJO, Raul, Introdução ao Direito Constitucional Angolano, 2018, pág. 253

182
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

- Apliquem norma anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal


Constitucional;

- Se recusem à aplicação de norma com fundamento na violação pela


mesma de uma convenção internacional de que Angola seja parte;

- Apliquem norma constante de convenção internacional em


desconformidade com acórdão anteriormente proferido pelo Tribunal
Constitucional.

Para interpor este tipo de recurso, a Lei atribui legitimidade ao Ministério


Público e as pessoas envolvidas no processo em causa, desde que como
antes frisamos, tenham suscitado a inconstitucionalidade perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida e em termos de este estar obrigado a dela
conhecer.

b) Recurso extraordinário de inconstitucionalidade: são objecto


deste tipo de recurso as sentenças dos demais tribunais que
contenham fundamento de direito e decisões que contrariem
princípio, direitos, liberdades e garantias previstos na CRA, assim
como actos administrativos definitivos e executórios que contrariam
princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na
Constituição301.

Os recursos extraordinários de inconstitucionalidade apenas podem ser


interpostos depois de esgotamento da cadeira rescisória dos tribunais de
jurisdição comum (art.º 49.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho).

Têm legitimidade para interpor este tipo de recurso:

- No caso de sentença, o Ministério Público e as pessoas que, de acordo


com a lei reguladora do processo em que a sentença foi proferida, tenham
legitimidade para dela interpor recurso ordinário;

- No caso dos actos administrativos, podem interpor recurso


extraordinário de inconstitucionalidade as pessoas que tenham legitimidade
para os impugnar contenciosamente (art.º 50.º da Lei n.º 3/08, de 17 de Junho).
301
Ibidem, pág. 254

183
CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

4.1. Distinção entre o Recurso ordinário e extraordinário


de inconstitucionalidade

O recurso extraordinário de inconstitucionalidade tem uma natureza bem


diversa do recurso ordinário de inconstitucionalidade a que se referem as
alíneas d) e e) do n.º 2 do art.º 180.º da Constituição.

Enquanto que o recurso ordinário tem sempre como objecto a


apreciação da constitucionalidade de uma norma aplicada ou desaplicada cuja
constitucionalidade seja controvertida num qualquer processo judicial, o
recurso extraordinário tem como objecto um acto, seja ele judicial ou
administrativo cujo conteúdo (seus fundamentos ou decisão) contrariem
princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição (art.º 49.º
da Lei do Processo Constitucional).

Outra distinção entre dois recursos é que o recurso ordinário pode ser
interposto para o Tribunal Constitucional, directamente do tribunal da causa,
enquanto o recurso extraordinário requer que antes da sua apreciação pelo
Tribunal Constitucional tenham sido previamente esgotados todos os recursos
legalmente previstos.

Pelo efeito das suas decisões, o recurso extraordinário de


inconstitucionalidade a decisão anula o acto administrativo, no recurso
ordinário a decisão que dê provimento ao recurso, ainda que só parcialmente,
obriga a que os litigantes baixem ao Tribunal de onde provieram, a fim de que
este reforme a decisão em conformidade com o julgamento sobre a questão
inconstitucionalidade (n.º 2 do art.º 47.º da LPC).

Convém ainda relembrar que ambos os recursos só podem ser


interpostos com decisões finais com valor equivalente a sentença.

184
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

185
CAPÍTULO VIII

DIREITOS HUMANOS E LIBERTADES


FUNDAMENTAIS

Ekova liyetimba, olondunge k’utima

(A pele cobre o corpo humano, mas o juízo – ou a responsabilidade moral –

cobre o coração humano).

Provérbio Umbundu

Como diz a famosa máxima latina “ubi Societas ibi jus”, “ibi jus, ubi
Societas” (onde há sociedade há Direito, onde há Direito há sociedade), ou
seja, para que exista sociedade é necessário que existam normas jurídicas que
preservam a ordem e a paz entre os homens. Mas mesmo com certas normas
jurídicas tem-se sempre constatado a violação de certos direitos inatos aos
homens, por isso, houve a necessidade de se criar uma Declaração que
defendesse os direitos dos homens, não só a nível nacional, mas também a
nível internacional, desta feita surge a Declaração dos Direitos Humanos.

Tendo dito isso, vejamos agora o que são Direitos Humanos?


Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Os Direitos Humanos (DH) são aqueles direitos que todos nós gozamos
pelo simples facto de sermos seres humanos, ou ainda, podem ser entendidas
como “garantias jurídicas universais que protegem os indivíduos e os grupos de
indivíduos contra acções e omissões que interferem com as liberdades e os
direitos fundamentais ou com a dignidade humana” 302.

Os DH e liberdades fundamentais aparecem enunciados na Declaração


Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e em diversos tratados (também
chamados de “pacos” e “convenções”), declarações, directrizes e conjuntos de
princípios elaborados pelas Nações Unidas e organizações regionais 303.

Dentro desta definição podem ser extraídas 4 características


fundamentais dos DH304:

1.ª. Inalienáveis: não os podemos perder, estão ligados à existência


humana, mas alguns (não todos) podem ser restringidos ou suspensos.
Exemplo: uma pessoa que está preso, tem restringido o seu direito à liberdade.

2.ª. Indivisível: não podem separar-se. Isto é, um Estado não pode


reconhecer uns e negar os outros. Exemplo: aceitar o art.º 3.º e 7.º; e negar os
outros artigos da DUHU.

3.ª. Interdependentes: cada direito só se pode perceber no conjunto de


todos os direitos fundamentais.

4.ª. Inter-relacionados: Todos os DH estão directamente ligados entre


si.

1. Alguns exemplos de Direitos Humanos

- O direito à vida;

- A proibição da tortura e das pernas ou tratamentos cruéis, desumanos ou


degradantes;

- A proibição da prisão ou detenção arbitrária;

302
PÉREZ, Suzana, Manual de Formação Básica em Direitos Humanos (Conhece e Defende os teus
Direitos), 2012, pág. 13.
303
Ibidem, pág. 13-14.
304
Ibidem, pág. 13.

187
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

- O direito a um julgamento justo;

- A proibição da discriminação;

- O direito a igual proteção da lei;

- A proibição de intromissões arbitrárias na vida privada, família domicílio ou


correspondência;

- As liberdades de associação, expressão, reunião e manifestação;

- O direito de procurar e de beneficio de asilo;

- O direito a uma nacionalidade;

- As liberdades de pensamento, de consciência e de religião;

- O direito de voto e de tomar parte na direção dos negócios públicos do país;

- O direito a condições de trabalho justas e favoráveis;

- O direito a condições adequadas de alimentação, abrigo, vestuário e


segurança social;

- O direito à saúde;

- O direito à educação;

- O direito à propriedade;

- O direito de participar na vida cultural;

- O direito ao desenvolvimento.

2. Dimensões dos Direitos Humanos

Os direitos humanos apresentam as seguintes dimensões:

 Dimensões Clássicas:

- Direitos Civis e Políticos: os Direitos Civis garantem a liberdade de


pensamento, de consciência e de religião; de opinião e de expressão e outras e
nos protegem contra todas as formas de discriminação, incluindo a igualdade
total entre mulheres e homens. Já os Direitos Políticos são relativos à

188
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

participação na vida pública do Estado, por exemplo: direito a eleger e ser


eleito, direito de associação e outros.

- Direitos Económicos, Sociais e Culturais: os Direitos económicos velam


pela subsistência, por exemplo: Direito ao Trabalho, Direito à Segurança
Alimentar, etc. Direitos Sociais velam pela proteção da família e privacidade
dos cidadãos, por exemplo: Direito à Segurança Social, Direito à Educação,
Direito à Saúde, etc. e por fim, os Direitos Culturais estão ligados à cultura dos
povos, por exemplo: Direito a participar na vida cultural da comunidade e
outros.

 Dimensões Tradicionais:

- Direitos Difusos: são todos aqueles direitos que não podem ser
atribuídos a um grupo específico de pessoas, pois dizem respeito a toda a
sociedade. São por exemplo, os direitos referentes às parcelas do meio
ambiente, que atribuem a todos o direito de viver num ambiente sadio e não
poluindo, bem como o dever de o defender e preservar, nos termos do n.º do
art.º 39.º da CRA305.

 Outras dimensões:

- Direitos de Solidariedade: nos anos 80, foi adicionado aos Direitos


Humanos uma nova dimensão, estamos a falar de Direito à Paz e à Segurança;
Direito ao Desenvolvimento; e o Direito a um Ambiente Saudável, mas para
isso implicam cooperações internacionais e aspiram à construção da
comunidade.

3. Evolução e Constitucionalização dos Direitos Fundamentais

Encontramos história acontecimentos dos mais quadrantes da vida


humana referente à condição da pessoa como ser capaz de viver
racionalmente em sociedade (como se entende da formulação de
Aristóteles)306.

305
Ibidem, pág. 17
306
CAPOCO, Zeferino, op. Cit., 2015, pág. 267.

189
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

Como enumera Jorge Miranda citado por Zeferino Capoco, há que


registar os seguintes factores como estando na origem dos Direitos
Fundamentais307:

1º) A prevalência do factor pessoal sobre o factor territorial, como


elemento definidor da comunidade política na Grécia e em Roma (apesar de
não se reconhecer ao homem, só por ser homem, necessariamente
personalidade jurídica);

2º) A reflexão e a criação cultural da Grécia clássica, quando


questionam o poder estabelecido, afirmam a existência de lei que lhes são
superiores e reivindicam um direito de desobediência individual, de fica sendo
emblemática a atitude de Antígona;

3º) A formação em Roma do ius Gentium como complexo de normas


reguladoras de relações jurídicas em que interviessem estrangeiros (peregrini)
e a atribuição progressiva aos habitantes do Império de direitos e até da
cidadania;

4º) O reconhecimento com o cristianismo da dignidade de cada homem


ou melhor como filho de Deus, do destino e da responsabilidade individual, da
unidade do género humano e da autonomia do espiritual perante o temporal;

5º) A doutrina da Lei injusta e do direito de resistência formulada pela


Escolástica medieval;

6º) A conquista de algumas garantias básicas de liberdade e segurança


pessoal, na Inglaterra, a partir da Magna Carta de 1215;

7º) O contributo do cristianismo elevou a pessoa humana à dignidade de


criatura de Deus, feita à Sua imagem e semelhança 308. O cristianismo trouxe o
preceito segundo o qual a pessoa humana prevalece sobre quaisquer leis, e
que estas estão para o homem. Sendo assim, o próprio conceito de “como acto
livre de Deus, pelo que o homem deve ser livre e liberto de quaisquer

307
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV, págs. 15-18 apud CAPOCO, Zeferino,
op. cit., 2015, pág. 268.
308
OTERO, Paulo, Instituições e Constitucionais, Volume I, Almeidina, Coimbra, 2007, págs. 94-121 apud
CAPOCO, Zeferino, op. Cit., 2015, pág. 268.

190
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

opressões e assuas relações devem basear-se no princípio da “fraternidade”,


ou seja, «vós todos sois irmãos, porque um só é o vosso Pai».

O homem ao nascer traz consigo certos direitos inalienáveis que não


devem ser postos em causa por quaisquer acções dos homens, pelo que
devem ser salvaguardados.

4. As Várias Gerações dos Direitos Fundamentais

Como escreve Paulo F. Da Cunha, citado outra vez por Zeferino


Capoco, podem considerar-se quatro gerações dos direitos fundamentais
assim definidos309:

a) Uma geração que consagrou certas liberdades e direitos de primeira


respiração individual, ao espaço vital da dignidade, como são
precisamente a liberdade de consciência, de culto e de expressão;

b) Uma segunda geração que tentou recuperar num contexto novo e


desenvolvido, a ideia de participação política dos Antigos. E aí surge
a representação, o sufrágio, a soberania nacional e popular, que são
elementos essenciais do conceito do constitucionalismo moderno;

c) Terceiro, o advento da democracia e da democratização incorpora


elementos sociais, e nascem os direitos económicos, sociais e
culturais;

d) Finalmente, num tempo de signo pós-social passam a preocupar


direitos de coisas novas, como as informáticas, a par de coisas muito
velhas, mas negligenciadas como o ambiente, fazendo nascer um
novo ramo de Direito do homem a viver em meios naturais dignos e
que qualificam os seus deveres e obrigações para a natureza e as
questões ambientais.

309
CUNHA, Paulo Ferreira da, Teoria da Constituição: Direitos Humanos, Direitos Fundamentais, pág. 94.
Apud CAPOCO, Zeeferino, op. Cit., 2015, pág. 270.

191
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

5. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH)

Ela foi redigida na sequência das mais graves violações da dignidade


humana, em particular, a experiência do Holocausto durante a Segunda Guerra
Mundial. O ponto central é a pessoa humana. Hoje já são 193os países das
Nações Unidas signatários da DUDH. Angola aderiu em 1976.

5.1. Processo de Elaboração da DUDH

O Conselho Económico e Social das Nações Unidas criou a Comissão


de Direitos Humanos, formada por 18 representantes dos Estados membros
das Nações Unidas com o objectivo de elaborar uma serie de instrumentos
para a defesa dos Direitos Humanos.

O projecto foi apresentado á Assembleia Geral das Nações Unidas a 10


de Dezembro de 1948 e foi aprovada pelos 58 Estados membros da
Assembleia Geral, com 48 votos a favor, 8 abstenções (União Soviética, os
países da Europa do Este, Arábia Saudita e África do Sul).

A DUDH resultou de um compromisso entre as opiniões do grupo


ocidental e as do grupo socialista.

Os representantes das democracias ocidentais propunham a


proclamação apenas dos Direitos Civis e Políticos.

Os representantes dos Estados da área socialista queriam o


reconhecimento universal só dos Direitos Económicos e Sociais.

Os debates acerca de certos direitos prioritários e o universalismo


versus o relativismo cultural fizeram parte das agendas das duas conferências
mundiais sobre Direitos Humanos, em Teerão e em Viena, respetivamente. A
conferência de Teerão, em 1968, clarificou que todos os direitos humanos são
indivisíveis e interdependentes, e a Conferência de Viena, de 1993, acordou,
por consenso, que compete aos Estados, independentemente dos seus
sistemas políticos económicos e culturais, promover e proteger todos os
Direitos Humanos e liberdades fundamentais.

192
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Considera-se a DUDH como a lista dos Direitos civis, políticos,


económicos, sociais e culturais básicos que deve desfrutar todo ser humano.
Tem sido aceite de forma generalizada como um instrumento que contém as
normas fundamentais de Direitos Humanos que devem ser respeitadas,
protegidas e realizadas.

Ainda que o conceito moderno de Direitos Humanos tenha emanado


sobre tudo da Europa, deve ser sublinhado que as noções de liberdade e de
justiça social, que são fundamentais para os Direitos Humanos, são parte de
todas as culturas.

5.2. Estrutura da DUDH

A DUDH compõe-se de um Preâmbulo e de 30 artigos que recolhem


Direitos Civis, Políticos e Direitos de carácter Económico, Social e Cultural.

Artigos 1º e 2º: recolhem os princípios básicos que se assentam na


DUDH: liberdade, igualdade, fraternidade e não discriminação.

 Artigos 3º a 11º: Direitos de carácter pessoal;


 Artigos 12º-17º Direitos do individuo com relação á comunidade;
 Artigos 18º-21º: Direitos de pensamento, consciência, de religião e
liberdades políticas;
 Artigos 22º-27º: Direitos económicos, sociais e culturais;
 Artigos 28º-30º: recolhem as condições e os limites com que estes
direitos se devem exercer.

6. Direitos e Liberdades Fundamentais na Constituição


Angolana
A CRA acolhe e integra um extenso catálogo de direitos, liberdades e
garantias fundamentais. Os principais são:

O princípio da universalidade, enquanto princípio geral encontra-se


disposto no art.º 22.º, 26.º n.º 1 e 2 da CRA. Já o art.º 22.º n.º 2 destaca que os
cidadãos angolanos que residam ou se encontrem nos estrangeiros gozam dos
deveres consagrados na Constituição e na lei.

193
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

O princípio da igualdade: está consagrado no art.º 23.º, esta também


acolhe o princípio da igualdade social, o que implica, em certos casos de um
tratamento diferenciador, positivamente discriminatório, em benefício de certos
grupos ou situações.

Direitos fundamentais exclusivos: são direitos vedados aos cidadãos


estrageiros e reservados pela Constituição no n.º 2, al. h) do art.º 25.º

7. Meios de Proteção dos Direitos Fundamentais

Qualquer que seja o redime, dos Direitos Fundamentais no Direito


Constitucional, visam sempre a defender a liberdade e a autonomia da
sociedade, não defender segmentos do poder contra outros segmentos de
poder, ainda que pontualmente se possam admitir excepções 310.

Os meios de defesa e proteção dos direitos fundamentais estão


consagrados na Secção II da CRA como Meios de garantias pelo Estado (art.º
56.º CRA).

Restrição dos direitos, liberdades e garantias (art.º 57.º)

Limitação ou suspensão dos direitos, liberdades e garantias (art.º 58.º).

7.1. Meios de Proteção Jurisdicional

A proteção dos direitos fundamentais não se pode bastar nem por si


próprios (pelo simples facto de existirem), nem pelo seu elenco
constitucional311. Desta forma o Direito Constitucional conta com duais
instâncias do poder público que podem desempenhar um papel indiscutível,
numa dicotomia entre duas espécies de tutela dos direitos fundamentais: a
tutela não contenciosa e a tutela contenciosa.

A tutela não contenciosa, reúne mecanismo que definem a defesa dos


direitos fundamentais sem recurso aos tribunais. Neste sentido, a sua defesa
muitas vezes passa pela consciencialização do poder público para o respectivo
cumprimento, com a activação do poder público para o respectivo

310
GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Constitucional, Vol II, pág. 1075.
311
Ibidem, pág. 1092.

194
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

cumprimento, com a activação de instrumentos que interferem junto dos


próprios titulares do poder que ofende esses direitos.

Está aqui em causa em primeiro lugar, a própria Administração Pública


cabendo-lhe boa parte da responsabilidade nas violações que são cometidas.
Ora, há meios destinados a fazer ver à actuação administrativa a necessidade
de rever os actos praticados, com isso se restabelecendo a juridicidade no que
respeita aos órgãos administrativos312.

Os órgãos que não fazem parte dos tribunais podem exercer um controlo
no tocante à defesa dos direitos fundamentais, com a sua actuação
independente, como é o caso do Provedor de Justiça, classificado
constitucionalmente no elenco da “Instituições Essenciais à Justiça” (n.º 1 do
art.º 192.º da CRA).

A tutela contenciosa, consiste nos mecanismos que levam aos “órgãos


de natureza jurisdicional” de defesa dos direitos fundamentais. A Constituição
Angolana consagra o art.º 29.º para o “acesso à tutela jurisdicional efectiva”.
Tal preceito resulta na garantia de que «a todos é assegurado o acesso ao
direito aos Tribunas para defesa dos seus direitos e interesses legalmente
protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência dos meios
económicos» (art.º 29,º n.º 1.). Continua o mesmo artigo: «para defesa dos
direitos, liberdades e garantias pessoas, a lei assegura aos cidadãos
procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a
obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses
direitos» (n.º 5).

Assim, como salienta Gomes Canotilho, “a proteção jurídica através dos


tribunais implica a garantia de uma proteção eficaz temporalmente adequada.
Neste sentido, ela engloba a exigência duma apreciação, pelo juiz, da matéria
de facto e de direito, objecto de litígio ou da pretensão do particular, e a
respectiva resposta plasmada numa decisão judicial vinculativa (em termos a
regular leis de processo”313.

312
Cf. Idem, op. Cit., pág. 1092
313
CANOTILHO, J.J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2000, pág. 499.

195
DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

7.2. Habeas Corpus

A CRA coloca ao dispor e todas as pessoas o instrumento de habeas


corpus como meio de reação contra prisão ou detenção ilegal. A providência de
habeas corpus pode ser interposta, nos termos da lei, perante o tribunal
competente, pelo próprio ou por qualquer pessoa no gozo dos seus direitos
políticos (art.º 68 da CRA). Habeas corpus, aplicáveis as disposições do
Código de Processo Penal (art.º 312.º e seguinte).

Nos termos do disposto na CRA, o habeas corpus tem natureza jurídica


de acção constitucional, e não de mero recurso, podendo ser intentada por
qualquer pessoa, no gozo dos seus direitos políticos, perante o tribunal
competente, em qualquer altura, mesmo não havendo uma acção principal em
curso, de cuja decisão se deva recorrer314.

7.3. Habeas Data

Nos termos do art.º 69.º da CRA, todos têm direito à providência de


habeas data. Este instrumento destina-se a permitir a qualquer pessoa
“assegurar o conhecimento das informações sobre si constantes de ficheiros,
arquivos ou registos informáticos, de ser informados sobre o fim a que se
destinam, bem como de exigir a rectificação ou actualização dos mesmos, nos
termos da lei e salvaguardados o segredo de Estado e o segredo de justiça” (art.º 69.º,
n.º 1 da CRA).

314
MACHADO, Jónatas E. M.; COSTA, Paulo Nogueira & HILÁRIO, Esteves Carlos, Direito Constitucional
Angolano 2013, pág. 215.

196
CAPÍTULO IX

DEMOCRACIA E DIREITO ELEITORAL

O direito eleitoral (ou direito sufrágio) só tem o seu cumprimento nos


sistemas eleitorais de governos representativos próprios dos regimes
democráticos. O direito ao sufrágio é materializado pela capacidade de votar e
de ser votado, representando, pois, a essência dos direitos políticos.

O direito ao sufrágio deve ser visto sob dois aspectos: capacidade


eleitoral ativa e capacidade eleitoral passiva.

A capacidade eleitoral ativa representa o direito de votar, o direito de


alistar-se como eleitor (alistabilidade). A capacidade eleitoral passiva
consiste no direito de ser votado, de eleger-se para um cargo político
(elegibilidade)315.

O direito ao sufrágio poderá ainda ser: universal ou restrito.

315
VICENTE, Paulo & ALEXANDRINO, Marcelo, Direito Constitucional Descomplicado, 14.ª Ed., 2015, pág.
275.
Democracia e Direito Eleitoral

O sufrágio é universal quando assegurado o direito de votar a todos os


nacionais, independentemente da exigência de quaisquer requisitos, tais como
condições culturais documentais, capacidade física ou metal, etc.

O sufrágio será restrito quando o direito de votar for concedido tão


somente àqueles que cumprirem determinadas condições fixadas pelas leis do
Estado. O sufrágio restrito, por sua vez, poderá ser censitário ou
capacitário316.

O sufrágio censitário é aquele que somente outorga o direito de voto


àqueles que preencherem certas qualificações econômicas. Seria o caso, por
exemplo, de não se permitir o direito de voto àqueles que auferissem renda
mensal inferior a um salário mínimo.

O sufrágio capacitário é aquele que só outorga o direito de voto aos


indivíduos dotados de certas características especiais, notadamente de
natureza intelectual. Seria o caso, por exemplo, de se exigir para o direito ao
voto a apresentação de diploma de conclusão do curso fundamental, ou médio
ou superior.

O sufrágio ainda pode ser direito ou indireto

O sufrágio é direto quando os eleitores, sem intermediários fazem, de


modo pessoal e imediato, a designação de representantes ou governantes. Por
exemplo: Angola, França, Portugal, Nigéria, RDC, Moçambique, etc. 317

É indireto quando recai a escolha sobre delegados ou intermediários,


incumbidos de proceder à eleição definitiva.

Esses delegados recebem também a denominação de


“compromissários”, eleitores de segundo grau, eleitores secundários, eleitores
presidenciais, senatoriais, etc., conforme, neste último caso o nome dos
magistrados a serem providos no exercício da função pública 318. Por exemplo:
E.U.A, Alemanha, etc.

316
Ibidem, pág. 275.
317
BONAVIDES, Paulo, Ciência Política, 10.ª Ed., 2000, pág. 310
318
Ibidem, pág. 310.

198
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

1. O Sufrágio, da democracia directa à democracia


representativa
Em Atenas, a Assembleia Geral do Povo reunia-se diariamente para
tomar decisões, o que implicava a participação de todos os cidadãos nas
decisões governamentais. Era o correspondente à forma perfeita do exercício
da soberania popular para Rousseau, o sistema de governo democrático
directo, que ele próprio considerava impraticável ao dizer no contrato social que
“... não se pode conceber o povo incessantemente reunido para despachar os
negócios públicos”319.

Os Estados Modernos não se baseiam num tal sistema. Os governantes


são eleitos pelos governados. A eleição consiste na escolha dos governantes,
feita através da expressão dos votos dos cidadãos. Cada uma dessas pessoas
chamam-se eleitor e esta classificação depende da posse de certos requisitos
legais da capacidade eleitoral. O conjunto dos eleitores costuma designar-se
por colégio eleitoral. Só podem ser eleitos pessoas que reúnam, os requisitos
de elegibilidade e, assim, sejam elegíveis. O acto de escolher mediante o voto
chama-se sufrágio320.

Os governos governam em nome dos eleitores, ou seja, estes dão


àqueles o direito de agirem em seu nome, o direito de os representarem. Esta
forma de seleção dos governantes opõem-se à transmissão hereditária de
funções e à cooptação, em que os membros ou titulares de um determinado
órgão escolhem outros membros e à nomeação, caso em que o titular de um
órgão é designado pelo titular de outro órgão 321.

Contudo até ser aplicado nos Estados modernos o sufrágio universal, o


direito eleitoral, sofreu uma grande evolução, indissociável das concepções
sobre a soberania, por um lado, e da luta dos trabalhadores pela conquista de
direitos democráticos por outro lado.

319
ROUSSEAU, Contrato Social, Livro IV, Cap. II e III Ed. Prença apud CORREIRA, Adérito, op. cit., 2011,
pág. 157.
320
CORREIA, Adérito, Lições de Direito Constitucional, 2011, pág. 157.
321
Ibidem, pág. 157.

199
Democracia e Direito Eleitoral

2. Os Sistemas eleitorais

Tal como o direito ao sufrágio ou direito de voto, os modos como se vota


ou modos der escrutínio são meios de expressão da soberania dos
governados. Os modos de escrutínio são igualmente designados regimes
eleitorais ou sistemas eleitorais, termos sinónimos. Estes sistemas são
indispensáveis para designar os eleitos, porque as eleições supõem regras que
permitem calcular como é que os sufrágios favoráveis aos candidatos
determinam aqueles que de entre eles serão eleitos 322.

Com efeito, diferentes métodos opõem-se este respeito: sistema


maioritário de uma ou duas voltas, sistema de representação
proporcional, sistemas mistos e sistema de Hare.

2.1. Sistema Eleitoral Maioritário

O escrutínio maioritário é mais simples e o mais antigo. Ele pode ser de


uma ou de duas voltas.

No sistema maioritário de uma volta, o candidato que tiver mais votos,


mesmo que seja a maioria simples, é o vencedor. Não importa qual a
percentagem obtida nem o número de eleitores. Aqueles que contabilizar todos
votos, alcançou o maior número de votos, validamente expressos, é o
vencedor. O sistema eleitoral maioritário de duas voltas funciona da seguinte
forma: é realizada a eleição e se um dos candidatos conseguir alcançar a
maioria absoluta dos votos validamente expressos (50% +1), vence as eleições
logo na primeira volta323.

Se nenhum dos candidatos vencer na primeira volta com a maioria


absoluta dos votos, realiza-se uma segunda volta, em que concorrem apenas
os dois candidatos mais votados na primeira volta, e vence o candidato que
alcançar o maior número de votos (seja maioria simples, absoluta ou relativa).
A qualidade da maioria obtida é indiferente. Basta que um candidato obtenha
mais votos do que o outro para vencer as eleições 324.

322
Ibidem, pág. 157.
323
ARAÚJO, Raul, Introdução ao Direito Constitucional Angolano, 2018, pág. 154.
324
Ibidem, pág. 154.

200
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Este sistema eleitoral é utilizado quer em eleições presidenciais, quer


em eleições para o Parlamento e autárquicas.

O sistema eleitoral maioritário de duas voltas era o adoptado para a


eleição do Presidente da República na Lei Constitucional de 1992 (artigo 57.º),
que foi utilizado apenas uma vez, nas eleições gerais realizadas neste ano.

Como nenhum dos candidatos às eleições presidenciais obteve maioria


absoluta dos votos na 1.ª volta, os dois candidatos mais votados (José Eduardo
dos Santos e Jonas Malheiro Savimbi) foram habilitados a concorrer à 2.ª volta,
que não se realizou porque o candidato do Partido UNITA (Jonas Savimbi,
segundo candidato mais votado) não aceitou os resultados das eleições.

2.1.2. Escrutínio uninominal e escrutínio de lista

O escrutínio pode ser uninominal ou de lista. É uninominal quando cada


circunscrição eleitoral pode eleger um deputado; é de lista (plurinominal),
quando cada circunscrição elege vários candidatos que, geralmente, se
agrupam por listas325.

2.2. Sistema de Representação Proporcional

O sistema de eleição proporcional é aquele em que os lugares a


preencher são repartidos proporcionalmente segundo o número de votos
obtidos pelos deputados dos partidos que concorreram.

Nos últimos anos do séc. XIX desenvolveu-se nos países europeus um


movimento em favor da representação proporcional como modo de escrutínio
para a eleição legislativas, este sistema tem como epicentro possibilitar que os
partidos políticos mais pequenos pudessem eleger os seus candidatos nas
eleições parlamentares e locais, concorrendo com os partidos políticos mais
fortes.

O princípio que está na base deste modo de escrutínio é o de garantir


uma representação das maiorias em cada circunscrição eleitoral, na proporção
exata do número de votos obtidos.

325
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 167.

201
Democracia e Direito Eleitoral

Este sistema funciona da seguinte forma: define-se o número de


deputados (em eleições parlamentares) a eleger em cada circunscrição
eleitoral. Os diversos partidos apresentam-se às eleições, a concorrerem nas
distintas circunscrições eleitorais, com listas que contêm o número de
candidatos a serem eleitos e alguns suplentes (a determinar a lei) 326.

Os sistemas eleitorais de representação proporcional podem apresentar-


se de formas diferentes quando se pretende fazer a operação de apuramento
dos resultados do escrutínio e o número de mandatos obtidos por cada
concorrente. Os modelos mais utilizados são o de representação proporcional
integral e o modelo de Hondt.

O primeiro, representação proporcional integral, é simples. Após a


eleição, determina-se, em primeiro lugar, o quociente eleitoral, que é o
resultado da divisão do número dos sufrágios validamente expressos pelos
números de lugares a eleger. De seguida, divide-se o número de votos que
cada partido obteve nessa circunscrição eleitoral pelo quociente eleitoral e
obtém-se o resultado final, ou seja, o número de deputados que cada um dos
partidos conseguiu eleger nesse apuramento dos resultados no circulo eleitoral.
Esse modo de escrutínio é usado, em Angola, para o apuramento dos
resultados no círculo eleitoral nacional, para a eleição dos deputados à
Assembleia Nacional327.

O outro modelo é o sistema de Hondt, (criado pelo matemático belga


Victor d’ Hondt), consiste em dividir o número de votos obtidos por cada lista
sucessivamente por 1, 2, 3, etc. (conforme o número de lugares a serem
preenchidos) e em classificar os quocientes assim encontrados por ordem
decrescentes, até à concorrência do número de deputados a serem eleitos. O
último quociente obtido é designado de divisor comum ou número repartidor.
Cada lista tem tantos eleitos quantas vezes o número de sufrágio por ela obtido
contenha o divisor comum328.

326
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 155.
327
Ibidem, 155.
328
Ibidem 155-156.

202
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Analisaremos melhor estes métodos quando estudaremos a forma de


eleição dos deputados à Assembleia Nacional pelos círculos eleitorais
provinciais.

Uma das questões mais complexas neste sistema eleitoral é a


determinação dos restos, ou seja, quando sobrar votos no momento da sua
distribuição.

Para a repartição dos restos, isto é, no cado se representação


proporcional integral, pode-se seguir três formas:

a) Sistema de resto mais fortes: quando os lugares a preencher são


atribuídos aos partidos com o resto mais forte, isto é, aos partidos
que tenham o maior número de votos que não tenham sido
representados;
b) Sistema do resto mais fraco: quando os lugares a preencher
forem atribuídos aos partidos políticos que tenham o menor
número de votos não transformados em assentos
c) Sistema de maior votação global: neste sistema, será
contemplado com a sobra o partido político que obtiver a maior
votação global na eleição.

2.3. Sistemas Eleitorais Mistos

Este sistema foi preconizada em 1846 pelo teórico socialista Victor


Considerant, e que posteriormente implantou-se progressivamente na Europa
no decurso dos anos 1900 a 1945 (com excepção para os países anglo-
saxónicos)329.

Actualmente o sistema eleitoral misto é utilizado na Alemanha. Cada


eleitor vota duas vezes. O primeiro voto serve para eleger metade (328) dos
deputados do Bundestag (Parlamento alemão que representa o povo da
federação), através da utilização do sistema eleitoral maioritário de uma volta.

O segundo voto é para eleger a outra metade dos deputados do


Bundestag (328), através do sistema eleitoral de representação proporcional.

329
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 169.

203
Democracia e Direito Eleitoral

Depois destas duas operações, calcula-se proporcionalmente (sistema


de Hondt) o número total de lugares que obteve cada partido no conjunto dos
membros do Bunderstag, por aplicação da representação proporcional,
acrescentando-se eventualmente lugares para assegurar uma repartição
exatamente proporcional330.

2.4. Sistema de Hare

Este sistema eleitoral é conhecido por sistema de voto único transferível


(single tranferable vote). Este sistema é muito complicado quanto às regras de
contagem. É utilizado no Eire, Ulster, em vários estados da federação
australiano e na Áustria.

Na linha doutrinal de Adérito Correia, cada eleitor dispõe de um único


voto que ele dá a um candidato no quadro de circunscrições eleitorais com três
lugares, no mínimo (quer dizer que pode eleger três deputados no mínimo),
mas o eleitor indica também várias preferências por ordem decrescente para
outros candidatos sendo o seu voto atribuído apenas a um deles. São eleitos
os candidatos que assim obtenham um número de voto igual ou superior ao
quociente necessário para ser eleito (quociente resultante da divisão dos
sufrágios exprimidos pelo número de lugares a preencher mais um) 331.

Segundo o mesmo autor, quando assim se dá, estamos perante ao


sistema da representação proporcional sem listas, pois cada candidato
apresenta-se individualmente332.

3. Sistema Eleitoral Angolano

Em Angola, as eleições do Presidente da República e dos deputados à


Assembleia Nacional são realizadas num acto único, denominado de Eleições
Gerais. A sua regulamentação vem expressa na Lei n.º 36/11, de 21 de
Dezembro, Lei Orgânica das Eleições Gerais.

Conforme o estabelecido na Constituição da República, no seu art.º


107.º, os processos eleitorais são organizados por órgão de administração
330
Ibidem, pág. 170.
331
Ibidem
332
Idem, op. cit., 2011, pág. 170.

204
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

eleitoral independentes, no caso, a Comissão Nacional Eleitoral. A organização


e o funcionamento deste órgão vêm regulados na Lei n.º 12/12, de 13 de Abril,
Lei Orgânica sobre a Organização e Funcionamento da Comissão Nacional
Eleitoral.

Como frisa Raul Araújo, as eleições gerais são um processo complexo,


em que intervêm várias entidades do Estado, nomeadamente o Presidente da
República que, na qualidade de Chefe de Estado, convoca as eleições (art.º
112.º da CRA); a Administração Pública, que faz o registo eleitoral (Lei n.º 8/15,
de 15 de Junho – Lei do Registo Eleitoral Oficioso); o Tribunal Constitucional,
que aprecia as candidaturas (art.º 36.º e seguintes da Lei n.º 36/11, de 21 de
Dezembro), este também tem a função de dirime os conflitos relativos ao
registo eleitoral e os representantes ao contencioso eleitoral, assim como
decide, definitivamente, sobre os resultantes finais das eleições (art.º 155.º e
16.º da Lei Orgânica das Eleições Gerais); e a Comissão Nacional Eleitoral,
que organiza e dirige todo o processo eleitoral propriamente dito 333.

Segundo estipulado na Constituição e na Lei, o direito de votar constitui


um dever cívico, pessoal e inalienável. Do não exercício desse direito não
advém quaisquer sanções jurídicas ou administrativas.

Nestes termos são eleitores os cidadãos angolanos maiores de 18 anos de


idade, residentes no território nacional, registados como eleitores, que não
estejam abrangidos por quaisquer incapacidades previstas na lei. Possuem,
igualmente, capacidade eleitoral activa os cidadãos angolanos que se
encontrem no estrageiro por razões de serviço, estudo, doença e similares,
bem como os cidadãos acompanhados ou dependentes destes.

Estão impedidos de votar (incapacidade eleitoral activa): os interditos por


sentença transitada em julgado; os notoriamente reconhecidos como
dementes, ainda que não estejam interditos por sentença, quando internados
em estabelecimento hospitalar, ou como tais declarados por atestado médico, e
os definitivamente condenados em pena de prisão, enquanto não hajam

333
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág 166

205
Democracia e Direito Eleitoral

cumprido a respectiva pena, excepto os liberados condicionalmente, nos


termos da lei (art.º 9.º da Lei n.º 36/11, de 21 de Dezembro).

3.1. Distribuição dos mandatos dentro das Listas

Os deputados à Assembleia Nacional são eleitos segundo o sistema de


representação proporcional, obedecendo-se, para a conversão dos votos em
mandatos, aos seguintes critérios (art.º 27.º da LOEG) 334:

3.1.2. Círculo eleitoral nacional

Para o circulo eleitoral nacional utiliza-se o sistema de representação


integral, e que funciona da seguinte forma:

a) Apura-se o total de votos validamente expressos em todo o país e


divide-se pelo número de deputados a eleger (centro e trinta), apurando-
se, assim, o quociente eleitoral nacional;
b) Divide-se, em seguida, o número de votos que cada partido obteve em
todo o país pelo quociente eleitoral nacional. O resultado obtido
corresponde ao número de mandatos que cada partido elege para o
Parlamento;
c) No caso de restarem algumas vagas ou mandatos, os deputados são
distribuídos em ordem do resto mais forte de cada partido político.

3.1.3. Círculo provinciais

A conversão dos votos em mandatos relativos a cada círculo provincial


(eleição de 5 deputados em cada província) é feita de acordo com o método de
Hondt, que obedece aos seguintes termos335:

a) Apura-se, em separado, o número de votos validamente expressos e


recebidos por cada lista no respectivo círculo eleitoral provincial;
b) O número de votos apurados por cada lista é dividido, sucessivamente,
por 1, 2, 3, 4 e 5, sendo os quocientes alinhados pela ordem crescente

334
Ibidem, pág. 172
335
Ibidem, pág 173.

206
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

da sua grandeza, nunca série de cinco termos, correspondentes ao


número de mandatos de cada círculo eleitoral;
c) Os mandatos pertencem às listas a que correspondem os termos de
série estabelecida pela regra anterior, recebendo cada uma listas tantas
mandatos quando os seus termos na série;
d) No caso de restar um só mandato para distribuir e de os termos
seguintes serem iguais aos das listas diferentes, o mandato cabe à lista
que tiver obtido o menor número de votos não transformados em
assentos.

Tomamos agora, um exemplo: suponha-se que no mesmo período de


eleições, em uma determinada província, que para este caso concreto é
considerado um círculo eleitoral, apurou-se 200.000 sufrágio validamente
expressos, e os partidos participantes obtiveram os seguintes votos:

Partido A – 38.000 votos;

Partido B – 56.000 votos;

Partido C – 86.000 votos;

Partido D – 20.000 votos.

Resolução:

A princípio, divide-se o número de votos obtidos por cada partido,


sucessivamente, por 1,2,3, 4 e 5, correspondentes ao número de deputados a
eleger, obtendo-se o seguinte quadro:

Partidos 1 2 3 4

A 38.000 19.000 12.666 9.500

B 56.000 28.000 18.666 14.000

C 86.000 42.000 28.666 21.000

D 20.000 10.000 6.666 5.000

207
Democracia e Direito Eleitoral

Em seguida, obtém-se os maiores números também chamados de


Logaritmos, desta feita temos: 28.66666, 38.000, 42.000, 56.000 e 86.000.
Depois coloca-se estes números por ordem decrescente até 5.º lugar, temos:
86.000, 56.000, 43.000, 38.000 e 28.666. Este último número (28.666) chama-
se repartidor diferente do quociente eleitoral.

E por último, divide-se o número de votos obtidos por cada partido pelo
repartidor diferente do quociente eleitoral (28.666) e obtém-se o número de
assentos de cada um destes partidos:

Partido A 38.000 : 28.666 = 1 Deputados

Partido B 56.000 : 28.666 = 1 Deputados

Partido C 86.000 : 28.666 = 3 Deputados

Partido D 20.000 : 28.666 = 0 Deputados

Desta feita estão eleitos os deputados desta província. É importante


sublinhar, que este processo continua, isto para todas as províncias até se
obtiver os 90 deputados pelos círculos provinciais.

3.2. A Eleição Presidencial

Nos termos da CRA, o Presidente da República é eleito por sufrágio


universal, directo, secreto e periódico pelos cidadãos residentes no território
nacional.

O sistema utilizado para sua eleição é o como já sabemos, o sistema


maioritário de 1 volta, em caso de empate realizar-se as 2.º voltas entre os dois
candidatos mais votados (vence quem obter a maioria dos votos). O mandato
do Presidente da República tem duração de 5 anos e termina com a tomada de
posse do novo Presidente da República eleito (art.º 113.º).

As candidaturas para o cargo podem ser apresentadas pelos partidos


políticos ou coligações de partidos ou por mínimo de cinco mil e um máximo de
dez mil cidadãos eleitores. As candidaturas são apresentadas ao Presidente do
Tribunal Supremo, até 60 dias antes da data prevista para eleição 336.
336
CORREIA, Adérito, op. cit., 2011, pág. 175.

208
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

A eleição do Presidente da República realiza-se até 30 dias antes do


termo do mandato do Presidente em exercício. O Presidente da República
toma posse perante o Presidente do Tribunal Supremo (art.º 114.º, n.º 1, da
CRA).

3.3. Financiamento Eleitoral

A campanha eleitoral dos candidatos pode ser financiada por entidades


públicas e privadas, pelos eleitores, pelos próprios candidatos e por partidos
homólogos. A Lei proíbe o financiamento por parte de governos e organizações
governamentais estrangeiras. Cabe ao C.N.E. aprovar os critérios de
distribuição dos fundos de financiamento público referentes às eleições
presidências e legislativas, devendo, no segundo caso, ter em canta a
proporção dos candidatos apresentados.

A Lei estabelece um regime de fiscalização e prestação de contas


relativamente a tais verbas.

3.4. Contencioso eleitoral

A Lei Eleitoral consagra normas relativas ao contencioso da votação. As


irregularidades verificadas durante o apuramento eleitoral são feitas, em
primeiro lugar, nos actos onde tenham sido detetadas, mormente nas mesas de
votos, Comissões Municipais Eleitorais, Comissões Provinciais Eleitorais ou
Comissões Nacional Eleitoral (art.º 153.º e seguintes da Lei n.º 36/11, de 21 de
Dezembro).

Estas irregularidades devem ser acompanhadas dos elementos de


prova, devendo ser incluída a acta da mesa de voto em que a irregularidade,
objecto da impugnação, ocorreu337.

Os recursos contenciosos são apresentados ao Tribunal Constitucional,


podendo ser objecto de recurso:

a) As decisões proferidas pela Comissão Nacional Eleitoral sobre as


reclamações referidas no art.º 154.º da LOEG;

337
ARAÚJO, Raul, op. cit., 2018, pág. 175

209
Democracia e Direito Eleitoral

b) As decisões proferidas pela Comissão Nacional Eleitoral sobre as


reclamações referentes ao apuramento nacional do escrutínio.

O prazo de interposição do recurso é de 48 horas a contar da notificação


da decisão da CNE. A interposição do recurso suspende os eleitos da decisão
de que se recorre.

Recebido o recurso, o Tribunal Constitucional notifica os


contrainteressados no prazo de 48 horas, para, querendo, apresentarem as
suas contra-alegações. O Plenário do Tribunal Constitucional decide,
definitivamente, no prazo de 72 horas a contar do termo do prazo da
apresentação das contra-alegações. A CNE e as partes interessadas são
notificadas da decisão Tribunal338.

3.5. Nulidades das eleições e infracções eleitorais

A votação realizada numa mesa de voto é julgada nula se forem


verificadas irregularidades que possam influenciar substancialmente o
resultado geral da eleição.

A Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais, Lei n.º 36/11, de 21 de


Dezembro, determina quais infracções eleitorais e as penas e sanções a ser
aplicadas (art.º 162.º e seguintes), nomeadamente as relativas à apresentação
de candidaturas, à campanha eleitoral, e as respeitantes às eleições
propriamente ditas339.

3.6. Proclamação e validação dos resultados das eleições

O Presidente da CNE, deve fazer o anúncio dos resultados definitivos


das eleições gerais até 15 dias contados a partir da data do encerramento da
votação. Ao Tribunal Constitucional compete fazer apreciação e a validação
das eleições gerais, nos termos estabelecidos no art.º 6.º da LOEG, conjugado
como o n.º 1 do artigo 26.º da Lei Orgânica o Tribunal Constitucional, Lei n.º
2/08, de 17 de Junho340.

338
Ibidem, pág 175.
339
Ibidem, pág. 176
340
Idem, op. cit., 2018, pág. 176.

210
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

4. Partidos Políticos

4.1. Natureza e funções dos partidos políticos

Os partidos políticos caracterizam-se pelos seus objectivos de


organização interna e externa, com especial relevo para o facto de proporem
um programa de atuação política visando não apenas o exercício de influência
política, mas acima de tudo a apresentação de candidaturas aos cargos
políticos.

4.2. Os partidos na Constitucional e na Lei

Em Angola, os partidos desempenham uma importante função


constitucional no processo de formação e representação da vontade política
democrática (art.º 17.º, n.º 1, da CRA), o que permite que se fale da existência
de um Estados de partido.

Os elementos fundamentais do estatuto jurídico dos partidos políticos


encontram-se consagrados na CRA.

O n.º 2 do art.º 17.º da CRA vincula os partidos políticos aos seguintes


princípios fundamentais: carácter e âmbito nacionais; livre constituição;
prossecução pública dos fins; liberdades de filiação e filhação única; utilização
exclusiva de meios pacíficos na prossecução dos seus fins e interdição da
criação ou utilização de organização militar, paramilitar ou militarizada;
organização e funcionamento democráticos; representatividade mínima fixada
por lei; proibição de recebimento de contribuições de valor pecuniário e
económico provenientes de governos ou de instituições governamentais
estrangeiros; prestação de contas do uso de fundo público.

São ainda deveres dos partidos, no que tange aos seus objectivos,
programa e prática: a consolidação da nação angolana e da independência
nacional; a salvaguarda da integridade territorial; o reforço da unidade nacional;
defesa da soberania nacional e da democracia; a proteção das liberdades
fundamentais e dos direitos da pessoa humana; a defesa da forma republicana
de governo e do carácter laico do Estado (art.º 17.º, n.º 3, da CRA).

211
Democracia e Direito Eleitoral

Por outro lado, a Constituição reconhece como direitos fundamentais


dos partidos políticos: o direito à igualdade de tratamento imparcial da
imprensa pública; o direito de oposição democrática (art.º 17.º, n.º 4, da CRA).

Aos partidos políticos representados na Assembleia Nacional é também


reconhecido o direito de resposta e de réplica às declarações do executivo
(art.º 45.º, n.º 2, da CRA).

Os Presidentes dos partidos políticos e das coligações de partidos


políticos representados na Assembleia Nacional integram o Conselho da
República [art.º 135.º, n.º 2, al. f), da CRA]

Os partidos políticos são regulados pela Lei n.º 02/2005, de 1 de julho,


Lei dos Partidos Políticos.

4.3. O financiamento dos partidos políticos

De um modo geral, o financiamento dos partidos pode ser interno


(quotas dos membros, património, publicações, etc.) ou externo. Neste caso, o
mesmo pode ser público ou privado.

No casso de entidades privadas, nacionais e estrangeiras, as mesmas


podem ser indivíduos, associações, sociedades comerciais, partidos políticos,
empresas públicas, etc.

No que diz respeito ao financiamento dos partidos políticos por parte do


Estado, o mesmo pode ser direto (subsídios) ou indireto (tempo de antenas;
benefícios fiscais; dedução fiscal de donativos, etc.)

Tem havido múltiplos casos de financiamento de partido políticos por


Estado estrangeiros (E.U.A, ex-URSS, RFA, França), diretamente ou mediante
os serviços secretos, fundações públicas ou empresas públicas (ELF),
geralmente em violação da legislação nacional do Estado dos partidos
recipientes. A CRA proíbe expressamente o recebimento de contribuições de
valor pecuniário económico, provenientes de governos ou de instituições
governamentais estrangeiros [art.º 17.º, n.º 2, al h), da CRA].

212
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

213
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

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216
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Prova Simulada 1

I Grupo
1 – Com base a tudo que vimos estabeleça um conceito sobre Direito Constitucional.

a) Diga de qual ramo do Direito pertence o Direito Constitucional e porquê?

2 – Diga por tuas palavras, qual é a diferença entre o Direito Público e o Direito Privado
e exemplifique.

3- Porque é que a Constituição é considerada o estatuto jurídico do Estado e do


Político?

5 - Porque é que o Direito Constitucional goza de uma posição hierárquica normativa


superior?

6 - Quando a Classificação das Constituições diga:

a) Quanto a estabilidade como podemos se classifica a Constituição Angolana.


Fundamenta com base legal.
b) Porque é que a Constituição Norte Americana é considerada uma Constituição
sumária?

7 - Com bases doutrinárias diga qual é o sistema económico vigente em Angola e


porquê?

8 – Esmiúce sobre a função constitutiva legitimadora da Constituição.

II Grupo
1 - Caso prático:

Aurio Miguel, também conhecido como o “Rei delas”, é proprietário de um


terreno localizado no Benfica propriamente na zona verde. O bairro onde este terreno
está localizado encontra-se em situações precárias e necessita urgentemente de um
Hospital, por isso a Administração local, expropriou o terreno do Rei delas para a
construção do mesmo hospital, mas sem a observância da indemnização devida ao
217
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

legítimo proprietário. Nestes termos o Rei delas quer saber se este procedimento da
administração do Estado está de acordo com a Constituição. Quid ius?

Prova Simulada 2

Grupo I

1 - Quais formaram os antecedentes do Constitucionalismo?

2 – Segundo o critério da posição dos sujeitos qual é a distinção entre o Direito Público

e o Direito Privado.

3 – Comente a seguinte afirmação:

“Apesar do Direito Constitucional ser um ramo do Direito Publico, é necessário


ter em conta que a Constituição contém na verdade uma força geradora de
direito privado”.

4 – Diferencie Teoria da Doutrina Constitucional?

5 – Porque é que o Direito Constitucional é aberto?

6 – Qual é o antagonismo existente entre ciências afins e ciências auxiliares do Direito

Constitucional. Exemplifique.

7 – Explique o processo de transição constitucional de 1992.

8 - Explique os dois sentidos da Constituição desenvolvidos por Hans Kelsen.

Grupo II

1 – Desenvolva os seguintes tópicos.

a) O Direito Constitucional como Direito Politico

218
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

b) Tendências actuais do Direito Constitucional

Prova Simulada 3

1 – Comente a seguinte afirmação:

“Enquanto que os demais ramos do Direito buscam fundamento de validade na


Constituição, as normas do Direito Constitucional encontram fundamento de validade
em si próprias”.

2 – Que importância teve o surgimento do Constitucionalismo moderno para a


formação e constituição das actuais Constituições.

3 – Quanto a estabilidade quais são os tipos de Constituições que estudaste e qual delas
admite um processo árduo para sua modificação.

4 –Será que podemos considerar a Constituição Angolana como uma Constituição


ideal? Justifique a tua resposta.

5 – Quantos aos sentidos do termo Constituição, dica como podemos classificar a


Constituição Angolana?

6 – Porque é que podemos considerar a economia angolana, uma economia social de


mercado?

7 – Diferencie Nacionalização de Privatização. Exemplifique.

8 – Qual é a relevância que o território tem para a formação de um Estado?

9 – De forma sucinta e clara debruce sobre os fins e funções do Estado.

10 - Distinga nacionalidade de cidadania. Exemplifique.

219
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Prova Simulada 4
Grupo I

1 – Segundo a teoria da soberania do Estado, quem é o titular do poder soberano e


porque?

2 - Destrinça poder constituinte originário histórico do poder constituinte originário


revolucionário.

a) Segundo o conteúdo supracitado, qual destes poderes foi usado para a formação
da Constituição de Angola de 2010 e porque?

3 – De forma clara e sucinta, debruce sobre as condições sine qua non para revisão da
Constituição Angolana.

4 – Segundo a sua opinião diga em que República nos encontramos e porque?

5 - O desrespeito à Constituição poder manifestar-se de vários modos e gerar por isso


diversos tipos de inconstitucionalidade.

a) Debruce sobre os modos de Fiscalização para evitar a violabilidade das normas


Constitucionais.
b) De há exemplos de Inconstitucionalidade por omissão.
c) O que acontece quando há um incidente processual ou um desvio normal do
processo?

Grupo II

Analise solucionando o caso sub judice.

Faustino Martinho, mais conhecido por Pretinho Que Cuia, é um deputado independe
na Assembleia Nacional. Devido aos problemas que se têm emergido em Angola nos
últimos tempos, mormente no que concerne a criminalidade, o deputado entende que a

220
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Constituição Angolana em vigor já não consegue acompanhar a nova realidade social,


portanto, necessita urgentemente de ser revisada. Pretinho Que Cuia, conseguiu
convencer um Grupo Parlamentar formado por 14 deputados. O presente grupo
parlamentar já solicitou uma revisão constitucional e pretende alterar a Constituição o
mais breve possível. Quid Juris!

Provas Simuladas 5
Grupo I

Escolha as opções falsas:


1 – O termo Povo distingue-se do termo população, porque:
a) O termo população tem significado económico e meramente
demográfico ou estatísticos;.
b) O termo população se traduz no conjunto de estrangeiro, apátridas e
polipátrida que se encontram no território de um Estado;
c) O termo população se traduz no conjunto de cidadãos, estrangeiros,
apátridas e polipátrida que se encontram no território;
d) Todas as afirmações são verdadeiras..
Escolha a opção falsa:
2 – É nacional de origem:
a) Quem o toma pelo nascimento;
b) O indivíduo que recebe a nacionalidade dos seus pais
independentemente do local onde nasceu;
c) Quando o local do nascimento determina a nacionalidade;
d) Todas são falsas..
Escolha a opção verdadeira:
3 – Os limites formais são aqueles:
a) Que visam garantir a permanência do núcleo essencial da Constituição;
b) Que se referem ao tempo em que é realizada uma revisão na
Constituição;
c) São aqueles que prescrevem os momentos específicos em que não
podem ser realizadas qualquer tipo de revisão constitucional;
d) São todas falsas..

221
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

Grupo II

Em não mais de 25 linhas debruce sobre o Sistema de Governo de Angola

Provas Simuladas 6

Grupo I

1 – Diga o que entendes por coabitação e de que sistema é característico.


2 – Diga o que entendes por moção de confiança e de que sistema faz parte.
3 – Diferencie impeachment de responsabilidade política.
4 - Diga qual é a discrepância entre um Estado Federal e um Estado Federado.
5 – Quando é que estamos perante a uma bicefalia politica no sistema de governo
presidencialista
6 - Porquê é que os doutrinadores consideram o sistema de governo angolano um
sistema presidencial atípico?
7 - Que papel é atribuído ao Presidente Português na governação de Portugal e porque?

Grupo II

Resolva o caso em apresso, isto é, segundo o Direito.

Deu-se a entrada na Assembleia Nacional a uma proposta de lei que vem da parte dos
deputados, sobre o aumento da maioridade penal, a mesma foi discutida na generalidade
e aprovada para sua entrada em vigor e não havendo estipulado o dia da mesma. A
presente Lei que foi recentemente aprovada não diz qual das leis penais venho revogar e
por isso tem emergido bastaste babilónia para os homens do Direito. Por isso,

222
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

advogados, juristas, professores e estudantes de Direito, afirmam que a presente lei


possui vários vícios e apelam que o Tribunal Constitucional declare a sua
inconstitucionalidade. Quid Juris!

Provas Simuladas 7

Resolva os casos práticos, que se seguem:

I. A Assembleia Nacional aprovou uma lei ordinária por maioria simples, que, no
entanto, é contestada por um grupo de parlamentares que entende que essa mesma lei
padece do vício de inconstitucionalidade. Por exemplo, uma lei que proíbe a entrada das
mulheres no ensino superior. Constantino Campos e Alexandre Muata, deputados da
oposição, afirmam que apresente Lei é inconstitucional porque viola alguns princípios
constitucionais e o Tribunal Constitucional deve imediatamente declarar a sua
inconstitucionalidade.

a) No teu entender a presente Lei é inconstitucional ou não?


b) Se for, diga que tipos de inconstitucionalidades se verificam?
c) Diga quem têm legitimidade para interpor a inconstitucionalidade para TC, no
caso em concreto?
d) Como o TC deve sanar ou lidar com este caso?

II. Suponhamos que no ano de 2018, foram realizadas eleições gerais em todo território
nacional, pelo qual concorreram 4 partidos políticos. A Nível Nacional contabilizou-se
um total de 28.561.361 votos validamente expressos pelo qual o partido A obteve
8.450.180 votos, o partido B obteve 7.800.280 votos, o partido C obteve 3.860.720
votos e o partido D obteve 8.450.181 votos. Suponha-se que no mesmo período de
eleições, em uma determinada província, que para este caso concreto é considerado um

223
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

círculo eleitoral provincial, apurou-se 245.000 sufrágio validamente expressos, e os


partidos participantes obtiveram os seguintes votos: Partido A – 48.000 votos; Partido B
– 66.000 votos; Partido C – 94.000 votos; Partido D – 15.000 votos.

À LUZ DO SISTEMA ELEITORAL ANGOLANO, QUID IUS!

Provas Simuladas 8

1 – Caso prático:

Lucinda Fernandes era filha do já falecido Leonel Afonso, também conhecido por
muitos de o “come todas e o prova todas”, (alcunha atribuída pelo facto de ele
enquanto vivo ser muito mulherengo). O falecido deixou como herança várias
propriedades para sua filha amada “Lucinda Fernandes”. Mas posteriormente, surgiu
uma jovem chamada Yara Coelho que alega ser filha de um relacionamento que o
malogrado teve com a sua mãe já há algum tempo.
Yara Coelho, afirma que também tem direito à herança deixada pelo dê cujo, pois ela já
comprovou através de um teste de DNA, que de facto é filha do falecido. Lucinda
Fernandes não aceitou partilhar a herança com a Yara Coelho, alegando que no
testamento do seu falecido pai dizia categoricamente que 100% da herança caberia
somente a ela. Devido a esta controversa, as duas decidiram levar o litigio a um
Tribunal competente. Postos lá, o Tribunal decide a favor da Lucinda Fernandes,
afirmando que a Lei estabelece que são herdeiros, somente aqueles que são citados no
testamento deixado pelo dê cujo.
Yara Coelho muito constrangida com a decisão tomada pelo Tribunal, afirma que
durante a resolução do litigio houve um incidente processual, pois a parte contrária
invocou uma Lei que não a favorece, e que também é inconstitucional, porque atenta
contra o principio da igualdade estabelecido no art.º 23 da Constituição da República, e
por este motivo ela merece um tratamento igual no que concerne a repartição da
herança. Yara Coelho, pensa interpor recurso a um Tribunal Superior o mais breve
possível para reapreciação da decisão tomada pelo Tribunal em causa.
a) Diga se houve inconstitucionalidade na decisão domada pelo Tribunal em causa
e porque?
b) Identifica o tipo de inconstitucionalidade em causa?

224
Manual de Ciência Política e Direito Constitucional

c) Quanto ao modo de impugnação, identifica e debruce sobre o tipo de


fiscalização que se deve levar a cabo para se identificar o tipo de
inconstitucionalidade?
d) Se o Tribunal Superior declarar inconstitucionalidade da decisão tomada pelo
anterior Tribunal, que tipo de efeito de inconstitucionalidade se verificará e
porque?
e) Identifica o tipo de recurso que a Yara Coelho deve interpor?
f) Nas vestes de um Tribunal Superior, resolva o caso em apresso.

225
Índice

PRELIMINARES

1. Conceitos............................................................................................................. 7

2. Critérios de Distinção entre o Direito Publico e o Direito Privado.........................8

3. O Método da Ciência Política e do Direito Constitucional...................................11

4. Tendências Actuais do Direito Constitucional.....................................................12

4.1. Jurisprudência Constitucional....................................................................12

4.2. Direito Constitucional Comparado..............................................................14

4.3. Acompanhar as Novas Leituras dos Problemas Político-Constitucionais...14

4.4. O Direito Constitucional e as Novas Técnicas de Informação....................15

5. O Ensino do Direito Constitucional em Angola...................................................17

6. Estudo do Direito Constitucional nalguns países europeus e nos E.U.A............17

6.1. Alemanha.......................................................................................................17

6.2. França............................................................................................................ 18

6.3. Portugal.........................................................................................................18

6.4. Grã-Bretanha.................................................................................................19

6.5. E.U.A............................................................................................................. 20

CAPÍTULO I - DIREITO CONSTITUCIONAL

1. O Direito Constitucional como Direito Público...................................................21

2. Teoria e Doutrina do Direito Constitucional.......................................................22

3. O Direito Constitucional como Direito Político...................................................23

226
4. Características do Direito Constitucional..........................................................24

5. As Ciências afins e auxiliares do Direito Constitucional....................................27

CAPÍTULO II - DIREITO CONSTITUCIONAL E A CONSTITUCIONAL

1. Constitucionalismo...............................................................................................29

1.1. Conceito.........................................................................................................29

1.2. Constitucionalismo Antigo..............................................................................30

1.3. Constitucionalismo Moderno..........................................................................31

2. A Constituição......................................................................................................35

2.1. Sentido do Termo Constituição......................................................................36

2.2. Classificação da Constituições......................................................................43

2.3. A Constituição Económica.............................................................................52

2.3.4. A Constituição Económica e a Economia Social de Mercado.....................57

2.3.5. O Sistema Económico Constitucional.........................................................57

2.3.6. Os Sectores de Propriedades e a Iniciativa Económica..............................58

2.3.7. Expropriação, Nacionalização e Privatização.............................................61

2.3.8. A Constituição Financeira...........................................................................63

2.4. Funções da Constituição...............................................................................64

CAPÍTULO III - REGIMES POLÍTICOS E SISTEMAS POLÍTICOS DE


GOVERNOS

1. Nota Preliminar...................................................................................................67

2. Regimes Políticos...............................................................................................68

3. Sistema de Governo...........................................................................................71

3.1. Surgimento do Parlamentarismo....................................................................71

3.2. Surgimento do Sistema Presidencial.............................................................76

3.3. Surgimento do Semipresidencialismo............................................................78

3.4. Sistema de Governo de Alguns Países da Europa e das Américas...............79

3.4.1. Sistema de Governo Britânico.................................................................79

3.4.2. Sistema de Governo dos E.U.A..............................................................87

227
3.4.3. Sistema de Governo Francês.................................................................97

3.4.4. Sistema de Governo Português............................................................104

3.4.5. Sistema Constitucional Brasileiro..........................................................110

3.5. Sistema de Governo de Angola..................................................................112

3.5.1. Órgãos de Soberania............................................................................113

CAPÍTULO IV - TEORIA GERAL DO ESTADO

1. Os Elementos do Estado................................................................................123

2. Formas de Estado...........................................................................................127

3. Classificação jurídico-internacional de Estados..............................................134

4. Fins e Funções do Estado..............................................................................136

CAPÍTULO V - O PODER CONSTITUINTE

1. O Que é o Poder Constituinte?.......................................................................143

2. A Origem da Teoria do Poder Constituinte.....................................................144

3. Titularidade do Poder Constituinte..................................................................144

4. Quem é o Titular do Poder Constituinte..........................................................147

5. Formas e Exercício do Poder Constituinte......................................................147

6. Poder Constituinte Originário e Derivado........................................................148

7. Limites do Poder Constituinte.........................................................................150

CAPÍTULO VI - REVISÂO CONSTITUCIONAL

1. Modalidades de revisão da Constituição.........................................................152

2. Limites de revisão constitucional....................................................................153

3. Limites de revisão na Constituição de Angola.................................................153

4. A História Constitucional de Angola e as Revisões Constitucionais................156

5. A Constituição da República de Angola de 2010............................................162

6. A Constituição da República de Angola de 2010: IIª ou IIIª República?..........166

CAPÍTULO VII - CONTROLO E GARANTIA DA CONSTITUCIONALIDADE

228
1. Inconstitucionalidade das Leis........................................................................170

2. Fiscalização da Constitucionalidade e legalidade...........................................174

3. Fiscalização da Constitucionalidade na CRA de 2010....................................180

4. Recurso de inconstitucionalidade...................................................................183

CAPÍTULO VIII - DIREITOS HUMANOD E LIBERDADES FUNDAMENTAIS

1. Alguns exemplos de Direitos Humanos..........................................................187

2. Dimensões dos Direitos Humanos.................................................................188

3. Evolução e Constitucionalização dos Direitos Fundamentais.........................189

4. As Várias Gerações dos Direitos Fundamentais.............................................191

5. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH).................................191

6. Direitos e Liberdades Fundamentais na Constituição Angolana.....................193

7. Meios de Proteção dos Direitos Fundamentais...............................................194

CAPÍTULO IX - DEMOCRACIA E DIREITOS ELEITORAL

1. O Sufrágio, da democracia directa à democracia representativa....................199

2. Os Sistemas eleitorais....................................................................................200

3. Sistema Eleitoral Angolano.............................................................................204

4. Partidos Políticos............................................................................................211

BIBLIOGRAFIA...................................................................................................214

PROVAS SIMULADAS

229

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