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Diretor: Luís Ribeiro Assinaturas: 1 ano: 17,50¤ (iva incluído), estrangeiro (1 ano) 19¤
(Presidente da APEI) N.º de registo: ERC: 112028 Depósito legal: 12929/86
ISSN: 2182-8369
Os artigos assinados não exprimem necessariamente o ponto de vista da Direção.
Capa . Anish Kapoor, “Eyes Turned Inward” (1993) 38 À descoberta . Rosário Leote de Carvalho
Museu Berardo Bolas de Sabão
1 Editorial . Luís Ribeiro 39 Convergências . Sofia Esteves
Os desafios da pedagogia e o amor
2 Artigo... Maria Helena Horta
A especificidade da linguagem escrita na educação 40 Contos para acordar . Helena Faria
de infância à luz das OCEPE 2016 Primos à solta
Estatuto Editorial Os Cadernos de Educação de Infância, fundados em 1987, são uma revista quadrimestral, independente e livre, especializada no campo da educação de infância, que pretende contribuir,
através da divulgação de artigos concetuais e de práticas educativas de qualidade, para a discussão da pedagogia e da educação e para o aprofundamento da compreensão da infância. As suas opções
editoriais são orientadas por critérios de qualidade, rigor e criatividade editorial, estabelecidas sem qualquer dependência de ordem ideológica, corporativa, política, social ou económica, valorizando a
pluralidade de olhares que sejam promotores de reflexão e discussão sobre a educação de infância, contribuindo, desse modo, para o desenvolvimento pedagógico e científico dos seus profissionais e para
a definição de políticas educativas a nível nacional e europeu. No campo da informação e da opinião, orienta-se pelas disposições contidas na Declaração dos Direitos da Criança, na Declaração Universal
dos Direitos do Homem, na Constituição da República Portuguesa, no Estatuto do Jornalista, na Lei de Imprensa, no Código Deontológico dos Jornalistas e nos princípios da ética profissional produzida
e assumida no seio da comunidade da informação, de âmbito nacional ou internacional.
A APEI é apoiada pelo Ministério de Educação no âmbito do protocolo de afetação de recursos humanos
# 113
: EDITORIAL
Luís Ribeiro . Presidente da APEI
Este tem sido um ano fértil em iniciativas infância, que continua a ser tão esquecida no qual continuamos a apostar em artigos
APEI. nas políticas educativas (a APEI continua mui- que promovem a dialética entre a investi-
Em janeiro foi publicado o número especial to empenhada na alteração da Lei de Bases gação e o relato de práticas educativas de
dos Cadernos de Educação de Infância, um do Sistema Educativo e em breve daremos qualidade, abrangendo toda a educação de
número com 128 páginas que comemora os conta dos procedimentos adotados). infância e os diferentes domínios do currículo,
30 anos de edições ininterruptas de uma das Em maio, no Jardim da Estrela, em Lisboa, expondo e divulgando o que de melhor se vai
mais antigas revistas sobre educação em Por- pela primeira vez em Portugal, decorreu o fazendo em Portugal.
tugal (e a única sobre educação de infância). Con-Crit 2018, um encontro de dois dias que Em setembro, voltaremos a encontrar-nos
Em abril, foi publicado o número especial reuniu um conjunto de investigadores, peda- com o #114 dos Cadernos de Educação de
do anterior projeto Infância na Europa, que gogos, educadores e outros profissionais de Infância que, como é hábito, trará muitas
compilou os 10 Princípios para o Desenvolvi- educação de infância de vários países euro- novidades.
mento de uma Estratégia Europeia de Servi- peus e que contou, entre outras comunica- Até lá, desejo a todos (e a todas!) um exce-
ços para a Infância, e também o primeiro nú- ções, com duas excelentes conferências de lente resto de ano escolar e umas excelentes
mero do novo projeto editorial internacional Mariana Valente, Janine da Silva e Maria Ilhéu férias!
Infância na Europa Hoje, que envolve, para (Becoming lovers of the Earth: dialogues on Até setembro!
já, oito países do espaço europeu, um projeto education) e de Assunção Folque e Fátima
que vai ganhando dinâmica e relevo. Aresta (Yes we can! Building-up sustaina-
Durante este período, foram organizados bility from early childhood) que mereceram
nove seminários por todo o país, Encontros elevados elogios de todos quantos puderam
Regionais em Aveiro, Braga, Leiria, Madeira assistir.
e Açores e Encontros Ser Bebé nos Açores, Entretanto, os novos cartões de associado,
Faro, Porto e Lisboa (a que ainda se seguirá com uma imagem gráfica mais atual, foram
o XV Encontro Nacional, em julho), iniciati- enviados a todos os associados da APEI, ao
vas de inegável qualidade que promoveram a mesmo tempo que se foram atualizando os
discussão sobre a importância da educação e dados e reorganizando os serviços de apoio
da pedagogia na infância e que continuaram aos associados.
a manter a aposta de grande relevância em E chegamos ao presente número dos CEI, que
ações centradas nos 0 – 3 anos e na primeira é publicado com algum (deliberado) atraso,
Nota introdutória
O mundo que nos rodeia é – ou parece ser –
o aspeto mental que domina a nossa existên-
cia. Contudo, a par desse mundo mental exis-
te um outro mundo paralelo que acompanha
essas imagens de uma forma muito subtil,
mas que por vezes pode ter um significado
tão importante que altera o rumo da parte
dominante da mente, até de forma inevitável.
É o mundo paralelo dos afetos, um mundo
em que encontramos sentimentos que acom-
panham as imagens mais marcantes da nossa
mente (Damásio, 2017).
Seguindo a perspetiva deste neurocientista,
importa diferenciar afetos de sentimentos:
“o afeto é uma vasta tenda sob a qual coloco
não só todos os sentimentos possíveis, mas
também as situações e os mecanismos que
são responsáveis pela sua produção, ou seja,
responsáveis pela produção de ações cujas
experiências se tornam sentimentos”; por
seu turno, os “sentimentos acompanham o Além de um sentimento positivo por este dade, é necessária a produção de ações cujas
desenrolar da vida no nosso organismo, tipo de linguagem, é desejável que os edu- experiências sejam concretas para compreen-
mentalmente, quer estejamos a apreender, a cadores de infância despertem (e alimentem) der o mundo e para se compreenderem a si
aprender, a recordar, a imaginar, a raciocinar, a curiosidade natural da criança, pois são as próprias. É um facto que os estudos recen-
a julgar, a decidir, a planear ou a criar” (idem, neurociências que reforçam a ideia de que tes em neurociência nos vêm confirmar que
p. 146). a procura ávida de novas aprendizagens é a memória semântica (conhecimentos con-
Para que a criança desenvolva prazer e mo- um sinal de vitalidade típico de uma infância ceptuais) e a memória biográfica (aconteci-
tivação para ler e escrever (Lopes da Silva, saudável e que, geralmente, “aprendemos mentos vivenciados através da experiências)
Marques, Mata & Rosa, 2016), importa que melhor quando estamos curiosos sobre o ainda não estão diferenciadas na infância, o
a sua relação com a linguagem escrita seja assunto” (Rato & Castro Caldas, 2017, p. 40), que nos indica que as crianças não apren-
suportada por uma ligação afetiva a este tipo além de que “as crianças procuram, conti- dem (nem apreendem) através de discursos
de linguagem. Por outras palavras, é dese- nuamente, sentido em tudo o que fazem” ou fichas: necessitam de experiências reais
jável que a abordagem à linguagem escrita, (L’Eculyer, 2017), através das constantes (L’Eculyer, 2017) que sejam significativas e
em contexto de educação de infância, seja reinterpretações que fazem do mundo em desafiadoras.
enquadrada por um educador ou educadora que vivem. Acredito, sim, que “a qualidade dos contex-
– na qualidade de agente responsável pela Mesmo enquanto desempenhava funções tos educativos em que as crianças se movem
produção de ações cujas experiências se docentes como educadora de infância, nun- e, em particular, as formas como os adultos
tornam sentimentos (Damásio, 2017) – que ca acreditei no potencial do desenvolvimento se constituem como mediadores entre as
intencionalmente cria “uma cultura pedagó- de atividades propedêuticas e da utilização crianças e a linguagem escrita determinam
gica que promova a motivação para a leitura de grafismos (vulgo fichas pré-elaboradas) o desenvolvimento da sua literacia” (Alves
e para a escrita (…) envolvendo as crianças como oportunidades de aprendizagem que Martins, 2017, p. 53).
em tarefas e atividades de literacia autênticas pudessem, de alguma forma, despertar a Como refere Alves Martins (2017), também a
e significativas” (Alves Martins, 2017, p. 54), curiosidade e o gosto da criança pela lingua- forma como as crianças encaram a linguagem
para que venham a desenvolver sentimentos gem escrita. escrita – que é um “processo socialmente de-
positivos por esta forma de comunicação. Se as crianças aprendem com base na reali- terminado”, pois a aprendizagem da lingua-
gem escrita é alicerçada numa construção so- ta, na área de expressão e comunicação: a gem da leitura e da escrita, entendam as par-
cial que ocorre, na educação de infância, em funcionalidade da linguagem escrita e a sua ticularidades alfabéticas do nosso sistema de
interação com os seus pares e um educador funcionalidade em contexto, a identificação escrita.
ou educadora que intervém intencionalmente de convenções da escrita e o seu prazer e Assumindo que o mundo da infância em ge-
nesse sentido – está dependente de educa- motivação para ler e escrever, pois a “forma ral, e da criança pequena em particular, é um
dores que assumem o seu papel como “guias como o/a educador/a utiliza e se relaciona mundo de descobertas e que brincar “conti-
experimentados”, no desenvolvimento de um com a linguagem escrita é fundamental para nua a ser uma atividade natural na infância,
ambiente “comunicativamente estimulante” incentivar as crianças a interessarem-se e a sendo que a brincadeira permite às crianças
(Horta, 2016). evoluírem neste domínio” (Lopes da Silva et a descoberta do mundo a que pertence e que
al., 2016, p. 67). a rodeia” (Sarmento, Ferreira & Madeira, 2017,
Educadores curiosos, reflexivos e investi- Alves Martins (2017) indica-nos dois tipos p. 7), espera-se que elas aconteçam (as des-
gadores de aquisições necessárias na abordagem da cobertas e a brincadeira) de forma natural e
Devemos assumir, de forma consciente, que leitura e da escrita que estão diretamente espontânea, também em relação à linguagem
a forma como os e as educadoras intervém relacionados com os aspetos referidos an- escrita, através de educadores que reconhe-
(ou não) na sua prática pedagógica irá esti- teriormente: cem (e assumem) a agência da criança no seu
mular ou condicionar as aprendizagens que Aquisições de natureza cultural; modo natural de aprender e apreender este
as crianças possam fazer, designadamente Aquisições de natureza cognitiva/linguística. tipo de linguagem.
em relação à linguagem escrita, pois são eles As aquisições de natureza cultural são aque- O ato de escrita é um processo de reflexão
os responsáveis pelas situações ou oportu- las em que as crianças, para aprenderem a ler que requer uma aprendizagem ativa. Este
nidades de aprendizagem que despontam no e a escrever, têm de se apropriar das práticas processo oferece-nos oportunidades para
dia a dia das vivências das crianças. em torno da linguagem escrita de uma deter- organizarmos o pensamento, o envolvimen-
São estas práticas pedagógicas que desem- minada cultura, isto é, têm de se apropriar to com a sua planificação e permite-nos o
penham um papel essencial na forma como dos usos sociais da linguagem. acesso ao nosso próprio conhecimento sobre
as crianças podem aprender e apreender Por outro lado, as aquisições de natureza determinado assunto. Também nas crianças
três das componentes presentes no domí- cognitiva/linguística são as necessárias para pequenas estas competências são mobiliza-
nio da linguagem oral e abordagem à escri- que as crianças, no processo de aprendiza- das num ato de escrita espontânea – por
exemplo, quando as crianças colocam ques- Alves Martins (2017) – de natureza cultural e de alargar as oportunidades de se exprimirem em
tões ao ou à educadora sobre uma palavra natureza cognitiva/linguística – entendo que a múltiplas linguagens (Balaguer, 2014).
ou letra que querem escrever (Cunningham ou o educador em contexto de educação de É precisamente para cada um desses contex-
e Zibulsky, 2014). infância deve ser, por um lado, um mediador tos que aqui deixo algumas possibilidades de
Todavia, importa também que os educadores, (cultural) e, por outro lado, um provocador: ações e estratégias que podem ser entendi-
em uso pleno e consciência destas competên- Um mediador (cultural) entre a criança e a das como promotoras da abordagem à escrita,
cias, em termos de saberes e de atitudes, se linguagem escrita, na medida em que facilita desde que devidamente contextualizadas, so-
assumam também como profissionais refle- “a emergência da linguagem escrita através cial e culturalmente, nas práticas pedagógicas
xivos, que permanentemente se questionam do contacto e uso da leitura e da escrita, em e educativas de cada educador e em função da
sobre a sua prática pedagógica, que fazem por situações reais e funcionais associadas ao realidade em presença.
enriquecer o seu património educativo, contri- quotidiano da criança” (Lopes da Silva et al.,
buindo assim para o seu desenvolvimento pro- 2016, p. 66); O educador deve brincar (muito!) com a
fissional, numa busca incessante de respostas Um provocador na medida em que promove linguagem escrita
às suas permanentes questões e inquietações. situações ou oportunidades desencadeadoras Estas questões que aqui apresento, não tendo
Retomando as aquisições necessárias na abor- de conflito cognitivo/linguístico, em que a a ambição de virem a ser entendidas como “re-
dagem da leitura e da escrita apresentadas por criança é impelida a colocar questões, a orga- ceitas” ou “metas a atingir”, espero que sirvam
nizar e reorganizar o seu pensamento, ajudan- também para que o educador se questione e
do-a a evoluir nas suas conceções precoces. seja levado a refletir sobre as suas próprias
Independentemente do património con- práticas pedagógicas.
ceptual de cada educador de infância relati-
vamente a este domínio, julgo ser de maior Na organização e gestão do ambiente
importância que desenvolva competências de educativo, o educador
análise e de reflexão acerca do seu próprio de- Disponibiliza, na sala de atividades, livros de
sempenho e do modo como as crianças nestas literatura para a infância, livros-álbum, em pro-
idades aprendem (Horta, 2016), para melhor sa e em verso, livros de poesia, enciclopédias,
poderem apoiá-las no seu processo de apro- dicionários, listas de palavras, outros tipos de
priação do valor da leitura e da escrita (Lopes suporte de escrita (jornais, revistas, etiquetas,
da Silva et al., 2016). cartazes, mensagens, receitas, entre outros)?
Adotando a terminologia de Perrenoud (1993), Oferece, nalguma área da sala de atividades
é necessário que os educadores funcionem no (biblioteca, área específica de escrita), utensí-
“mundo real”. São necessárias as práticas de lios e materiais para escrever à disposição das
educadores curiosos, reflexivos, investigadores crianças, tais como: lápis de carvão, esferográ-
(nas e das suas próprias práticas), atentos às ficas de diversas cores, papéis de vários tama-
necessidades das crianças e cooperantes com nhos e formas, blocos, borrachas, agrafador,
quem os possa auxiliar nesse processo. São furador, post-its, clips, entre outros?
necessários, essencialmente, educadores que Estrutura locais próprios para afixar registos
centrem as suas práticas e o seu construto e escritos: placards, cavaletes, costas de armá-
desenvolvimento curricular no património so- rios, biombos?
ciocultural da realidade em presença (Horta, Organiza os locais para afixar os registos es-
2016). critos para que fiquem ao alcance visual das
É no contexto próprio de cada prática peda- crianças, situando-os ao nível do seu olhar ou
gógica que se espera que o educador possa mais abaixo?
contribuir para a melhoria constante da sua re- Tem em atenção a substituição de registos
lação educativa – de base afetiva – que consti- antigos – frequentemente e em acordo com
tui o pilar das aprendizagens das crianças, con- as crianças – por registos recentes?
fiando nelas e no seu potencial, procurando Disponibiliza cadernos onde são compiladas as
sam escrever o seu nome e o dos colegas e Verbaliza a sua escrita (para que as crianças …
dos adultos da sala? vão tendo consciência de que escreve mais
Escreve diferentes tipos de texto (cartas de devagar do que se fala)? Quando as crianças escrevem
correspondência escolar, convites, recados, Quando escreve o nome e a data nas produ- espontaneamente, o educador
vivências das crianças e histórias (re) produzi- ções das crianças, fá-lo no canto superior es- Questiona-as relativamente àquilo que escre-
das e/ou inventadas, entre outros)? querdo da folha (sentido direcional da escrita veram?
Regista o que as crianças espontaneamente alfabética)? Expõe, na sala de atividades ou noutro local da
verbalizam acerca das suas vivências, desem- Disponibiliza e explora diferentes tipos de ma- instituição, as suas tentativas de escrita, evi-
penhando o papel de mediador (cultural) entre terial escrito: jornais, revistas, livros, listas de denciando a valorização dessas experiências?
a oralidade das crianças e a linguagem escrita? compras, documentação variada (faturas da Valoriza as tentativas de escrita espontânea
Assume-se como leitor e escritor das vivências água, luz, gás), e-mail, cartas? das crianças, assumindo que os erros são
que dizem diretamente respeito ao dia a dia Promove jogos de exploração do código es- construtivos no processo de aprendizagem e
das crianças? crito? aquisição da linguagem escrita?
Promove o contacto das crianças com dife- … Dialoga com as outras crianças acerca das
rentes tipos de texto e de suporte de escrita, tentativas de escrita espontânea presentes
explorando as suas finalidades? Quando as crianças querem escrever uma no grupo?
Estimula as crianças a explicar as suas ideias letra, palavra ou frase, o educador Regista de forma convencional a escrita das
através da escrita? Ajuda e incentiva as crianças a procurar as crianças?
Lê diariamente em frente das crianças ajudan- letras e as palavras nos elementos impressos Confronta a escrita das crianças com a sua – a
do-as a adquirir competências de literacia? existentes na sala de atividades? convencional?
Lê para ou com as crianças? Elabora um modelo para as crianças copiarem? …
Envolve as crianças numa “leitura partilhada” Incentiva as crianças a procurar palavras inicia- Por fim, mas não menos importante, o jogo é
(engaging in “shared reading:”: das pela letra do seu nome? a estratégia, por excelência, a que a educadora
Lê o mesmo livro várias vezes ao longo do Incentiva as crianças a procurar nos nomes ou educador recorrem como forma de abordar
tempo? dos colegas (ou noutros suportes de escrita) a linguagem escrita, sendo a atividade lúdica o
Faz pausas na leitura para falar com as crian- a “letra do seu nome”? seu referencial de atuação?
ças? Apresenta propostas em que as crianças se-
Faz perguntas sobre a leitura e explica os even- jam levadas a procurar no meio envolvente O papel do educador como mediador
tos e detalhes mais importantes? (inclusivamente através de saídas ao exterior) de leitura
Faz perguntas que encorajem as crianças a palavras iniciadas pela “letra do seu nome”? A investigação tem demonstrado a importân-
pensar sobre a história? Incentiva as crianças a identificar as letras que cia da aquisição de competências precoces
Faz pausas para questionar as crianças sobre constituem o seu nome noutros contextos/ para a construção da motivação e posterior
as ilustrações? suportes de escrita? aprendizagem da leitura e da escrita, pelo que
Faz pausas na leitura para falar sobre as pala- Constrói um dicionário com as palavras signi- não posso terminar este artigo sem aludir à
vras (vocabulário novo) da história? ficativas que vão surgindo dos interesses das importância (e ao papel) dos educadores de
Fala sobre a história relacionando-a com situa- crianças e das suas necessidades de escrita? infância como mediadores de leitura (entre o
ções na vida das crianças? Fornece-lhes o modelo e/ou o contacto com escrito, o livro e os potenciais leitores).
Coloca questões abertas sobre a narrativa? diferentes tipos de letra – letras maiúsculas e Já Vygotsky (1998) salientava a linguagem
Repete palavras novas em diferentes situa- minúsculas? como fator crucial para o desenvolvimento
ções? Ajuda as crianças a escrever levando-as a re- cognitivo da criança. Sabe-se hoje que a for-
Escreve e lê de modo a que as crianças vejam? fletir sobre o som das letras? ma pela qual os pais e os educadores desde
Lê o que escreve? Pede às crianças que já têm algum conheci- cedo falam com as crianças pode influenciar
Quando lê, segue a orientação da leitura com mento sobre a linguagem escrita que ajudem a aprendizagem, a memória, a compreensão
o dedo? as que estão a despertar para este tipo de e até a motivação para aprender (Rato & Cas-
Quando escreve explicita porquê, para quem linguagem, numa lógica de aprendizagem tro Caldas, 2017), influenciando o processo de
e o que escreve? cooperativa? “aprender a aprender”.
São estes investigadores que citam um coloca a semente e que, em parceria com os va” (Rato & Castro Caldas, 2017, p. 99).
estudo longitudinal, o 1970 British Cohort pais/famílias, a fará germinar. Em todo este processo – de potenciar o
Study, promovido pelo Economic and So- Destaco particularmente o papel do educa- prazer e a motivação para ler e escrever
cial Research Council, em que foi possí- dor de infância como o adulto privilegiado, (Lopes da Silva et al., 2016) – é necessário ir
vel acompanhar as vidas de mais de 17 no desempenho da sua atividade pedagó- colocando andaimes (scaffolding) na leitura
mil indivíduos, desde o seu nascimento gica, como aquele que poderá/deverá co- da criança; é importante ir atuando na sua
, em que 6000 realizaram uma bateria de locar a semente em bebés pré-leitores, que zona de desenvolvimento proximal, criando
testes cognitivos aos 16 anos. Feita a com- ajudará a regar a semente até que possa oportunidades de aprendizagem; é essencial
paração com outras crianças dos mesmos germinar a flor, crianças leitoras, e poste- elogiar a criança, mantendo-a motivada na
contextos sociais que alcançaram os mes- riormente o fruto, adultos leitores. e para a leitura, para que esta compreenda
mos resultados aos 5 e 10 anos, verificou-se Se o conhecimento é a chave da nossa so- “que a leitura e a escrita são atividades que
que aqueles que liam frequentemente livros ciedade, que se conhece como de informa- proporcionam prazer e satisfação” (idem, p.
aos 10 anos e mais de uma vez por semana ção, a leitura será uma via privilegiada de 71).
tinham, aos 16, resultados mais elevados do acesso ao conhecimento, sendo certo que
que aqueles que liam menos. uma criança que (futuramente) lerá será Notas finais
Conclui-se que a leitura por prazer estava certamente uma criança que pensará. Além São Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1999)
ligada a um maior progresso cognitivo, com disso, quanto mais se “questiona, mais se que nos explicam que as crianças, antes de
melhores desempenhos no vocabulário, or- pensa sobre o assunto e isso só pode trazer saberem ler e escrever formalmente, pos-
tografia e matemática. Acrescentam ainda benefícios para o cérebro, como, nomeada- suem muitos conhecimentos sociais sobre
que a “leitura confronta as crianças com no- mente, um aumento de flexibilidade cogniti- a linguagem escrita, o que as leva a afirmar
vas palavras, o que nos permite concluir que
a leitura por prazer promove o desenvolvi-
mento do vocabulário (…) [o que, por sua
vez] ajuda-os a compreender e a absorver
novas informações e conceitos aprendidos
[futuramente] na escola” (Rato & Castro Cal-
das, 2016, p. 97).
Segundo Cunningham e Zibulsky (2014), não
são as pessoas inteligentes que leem mais,
mas o facto de ler muito pode tornar as
pessoas mais inteligentes! Nesse contexto,
apresentam-nos um esquema que reflete
este processo que se desenvolve de forma
recíproca:
Porque todos “nós, para nos envolvermos
em qualquer atividade, temos de ter motivos
e razões para o fazer [e porque] esses mo-
tivos podem ser muito diferenciados, pas-
sando pelos benefícios diretos ou que daí
poderemos retirar, pela satisfação que a si-
tuação nos proporciona ou pelo sentimento
de realização e competência” (Lopes da Silva
et al., 2016, p. 71), é importante que o edu-
cador tenha consciência dos benefícios que
pode trazer às crianças enquanto mediador
de leitura, podendo ser mesmo aquele que
No contexto educativo atual, o termo com- formalmente organizados, sistematizados e da comunidade no planeamento, implemen-
petência é referido com frequência, especial- teoricamente fundamentados. tação e avaliação das aprendizagens.
mente no âmbito das políticas educativas da A aprendizagem de competências sociais e O CASEL (2012) concorda que existem cinco
Comissão Europeia em relação à Estratégia de emocionais (Social & Emotional Learning, SEL) grupos de competências-chave que devem ser
Educação e Formação para 2020. De acordo é definida pelo Collaborative for Academic, desenvolvidas como base para a manutenção
com a Comissão Europeia (2014), a falta de Social and Emotional Learning (CASEL, 2012) de relações sociais de alta qualidade e para
competências essenciais está a contribuir pa- como o processo de aquisição e aplicação dos adaptar-se aos desafios na vida. Estes grupos
ra a crise económica mundial, pois os cidadãos conhecimentos, atitudes e competências ne- são: autoconsciência, autogestão, consciên-
não apresentam as capacidades necessárias cessárias para identificar, compreender e gerir cia social, gestão de relações e tomada res-
para se adaptarem, com flexibilidade, à inter- emoções, definir e alcançar metas positivas, ponsável de decisões. No entanto, segundo
nacionalização crescente, ao ritmo rápido das sentir e mostrar empatia pelos outros, esta- Reinoso (2006), a formação tradicional tem
mudanças e à vertiginosa sucessão de novas belecer e manter relações positivas e tomar maioritariamente focado os seus esforços no
tecnologias. Como consequência, a educação decisões responsáveis. Este processo deve desenvolvimento da dimensão social destas
tem uma função essencial tanto social como começar na educação pré-escolar e continuar competências, isto é, nas dimensões de cons-
económica de assegurar que os cidadãos ad- até ao final do secundário e é mais eficaz se ciência social e gestão das relações, demons-
quiram as competências básicas necessárias a for realizado através da instrução na escola, trando pouco interesse no desenvolvimento
estas alterações. com o envolvimento das crianças através de das competências pessoais como a autocons-
A Comissão Europeia (2007) e a OCDE – Or- atividades positivas dentro e fora do jardim ciência ou autogestão. Isto torna-se paradoxal,
ganização para a Cooperação e Desenvolvi- de infância, com o envolvimento dos pais e considerando que é muito difícil desenvolver
mento Económico consideram as competên-
cias sociais e emocionais como essenciais
para a vida dos seus cidadãos (OECD, 2015).
Competências essenciais são as necessárias
a todas as pessoas para a realização e de-
senvolvimento pessoal, para exercerem uma
cidadania ativa, para a inclusão social e para
o emprego. A Comissão Europeia (2007) con-
sidera que os sistemas de educação e de for-
mação inicial dos Estados-membros deveriam
apoiar o desenvolvimento destas competên-
cias essenciais por parte de todos os jovens
porque cada uma delas pode contribuir para
uma vida bem-sucedida na sociedade do co-
nhecimento.
Assumindo as competências sociais e emo-
cionais como uma combinação de conheci-
mentos, aptidões e atitudes que permitem
elaborar e executar de forma coerente os
seus pensamentos, sentimentos e compor-
tamentos para melhorar a sua autoestima e
capacidade de adaptação para alcançar um
equilíbrio na sua dimensão pessoal e social
(Goleman, 2009; Bar-On, 2001), defendemos
a possibilidade de promover estas competên-
cias em contexto educativo através de pro-
gramas de aprendizagem social e emocional,
Metodologia
Medir o impacto do programa KidsTalentum na
adquisição de competências socioemocionais,
de dimensão pessoal. Para tal, foi utilizada
uma metodologia quantitativa e optámos por
um desenho quase experimental, uma vez que
eticamente, dentro do contexto socioeduca-
tivo, não podemos constituir aleatoriamente
grupos que permitam controlar algumas va-
riáveis que já demostraram ser importantes ro masculino. A idade variava entre os 3 e 5 Utilizando o coeficiente de Kuder-Richardson
para o desenvolvimento de competências. anos, sendo os grupos heterogéneos. como medida de fiabilidade, foram encontra-
dos níveis aceitáveis de consistência interna
Outdoor training como metodologia Instrumentos (KR-20 = 0,72).
de aprendizagem Para avaliar o desempenho da criança na com- Para avaliar a perceção das crianças em relação
O outdoor training (OT) é uma metodologia petência emocional foi utilizada a versão por- à dimensão pessoal das suas competências
que pretende trabalhar diversas competên- tuguesa traduzida por Roazzi, Dias, Minervino, socioemocionais foi utilizado o questionário
cias, nomeadamente as socioemocionais, Roazzi e Pons (2008) do Test of Emotion Com- de inteligência emocional de Bar-On (EQ – i:
ao ar livre, fazendo-o através de diversas prehension (TEC), de Pons, Harris, e De Ros- YV; Candeia & Rebocho, 2007), que avalia:
atividades de aventuras. Para que tal acon- nay (2004), que avalia o nível de compreensão Competências intrapessoais (α = 0,78), a ca-
teça, os participantes são retirados da sua emocional. A compreensão emocional é a ca- pacidade de estar atento a si próprio e as suas
zona de conforto e estimulados a enfrentar pacidade sociocognitiva de reconhecer emo- emoções;
desafios, vencer os seus limites e transpor ções, compreender as causas das emoções Gestão de stress (α = 0,76), a capacidade de
os problemas impostos. É caracterizado por dos outros e das situações emocionais, e uma lidar com o stress e de controlar emoções;
modalidades que atraem e satisfazem todos serie de capacidades e conhecimentos relacio- Adaptabilidade (α = 0,84), a capacidade para
os estilos de aprendizagem, pois proporciona nados com as emoções, como a compreensão ser flexível e alterar os sentimentos e pensa-
o desenvolvimento de capacidades e compe- das relações entre emoções e outros estados mentos em função da situação;
tências comportamentais (Santos, 2012). mentais, o conhecimento de estratégias de re- Humor geral (α = 0,75), a capacidade de ser
gulação de emoções e a compreensão de res- otimista e expressar sentimentos positivos.
Participantes postas emocionais ambivalentes (Pons et al., Este teste também fornece uma medida de
Os participantes no programa KidsTalentum 2004). Assim, o TEC avalia nove componentes inteligência emocional total (α = 0,84), que
são crianças de dois grupos do Jardim de In- da compreensão emocional, sendo atribuído considera também a competência interpes-
fância do Centro Social e Paroquial de Santa um ponto por cada componente com resposta soal da dimensão social. A pontuação bruta
Cecília, Região Autónoma da Madeira (RAM), correta. Cada criança pode obter um mínimo obtida nesta escala foi estandardizada com
Portugal. No grupo de controlo participaram de zero e um máximo de nove pontos. Esta base numa amostra de 426 crianças da RAM
15 crianças, 10 de género feminino e 5 do pontuação bruta foi normalizada e transfor- e transformadas em notas T em função da ida-
género masculino. No grupo experimental 15 mada em notas T, em função da idade, com de. Neste estudo, a escala apresentou bons
crianças, 10 do género feminino e 5 do géne- base numa amostra de 478 crianças da RAM. índices de fiabilidade (α = 0,80).
de forma a reconhecerem os seus próprios prias ações, tendo a possibilidade de aclarar o ças da educação pré-escolar, este estudo teve
recursos; a identificarem o que é necessário significado e a validade das suas condutas e como principal objetivo avaliar os efeitos do
mudar para obter uma ação mais efetiva; a crenças (Dewey, 2004). É importante assinalar programa KidsTalentum na dimensão pessoal
conhecerem-se melhor a si próprios e ao res- que perceber as suas dificuldades nesta com- das competências sociais e emocionais. Con-
to dos companheiros; a aprenderem a prestar petência não diminuiu o seu autoconceito. sideramos que, ao utilizar a metodologia do
atenção, a estarem despertos e a saberem dis- Também na escala de humor geral encontra- outdoor training para o desenvolvimento das
criminar o valor da informação recebida, pelo mos efeitos positivos do programa. Enquanto competências sociais e emocionais, o índice
que o processo de aprendizagem se amplifica as crianças mantiveram os seus estados de de aproveitamento será superior às demais
(Reinoso, 2006). humor positivos, as crianças do grupo de metodologias e que a vida ao ar livre favorece
Paradoxalmente, observamos que na com- controlo diminuíram a sua capacidade de oti- a quebra de paradigmas, a superação de limi-
petência de gestão de stress as crianças que mismo e de satisfação. É possível que, como tes e de desafios, a capacidade de lidar com
participaram no programa apresentaram uma indica a fundação EYFS (Early Years Founda- emoções, vivenciando-as, controlando-as, fa-
diminuição na perceção das suas capacidades, tion Stage, 2007), as atividades fora da sala vorecendo a mudança.
apesar de a adaptabilidade e a gestão de stress de atividades apoiem o desenvolvimento de Assim, o outdoor training proporciona padrões
corresponderem a competências e disposições atitudes positivas através de novas oportuni- de aprendizagem de relações pessoais e inter-
diretamente envolvidas na forma como se lida dades, desafios e responsabilidades e deem pessoais que desenvolvem a personalidade
com situações adversas, problemas e mudan- a oportunidade de levar a beleza, a alegria, a (Santos, 2012). Podemos inferir que, apesar de
ças (Sousa, 2010). Esta diminuição poderá es- maravilha e a exuberância da Natureza ao dia não haver efeitos significativos do programa
tar relacionada com uma maior perceção das a dia das crianças. na compreensão emocional, o KidsTalentum
suas dificuldades (geradas pelo aumento das teve efeitos positivos significativos na auto
suas competências intrapessoais). Graças à Conclusão e heteroperceção das competências intrapes-
experiência, as crianças foram confrontadas, Sendo poucos os estudos sobre a metodolo- soais, de adaptabilidade e humor positivo.
de forma direta, com o resultado das suas pró- gia de outdoor training realizados com crian- Os resultados encontrados por esta pesqui-
sa apontam a metodologia outdoor training
como uma ferramenta facilitadora do desen-
volvimento das competências socioemocionais
que poderá ser utilizada tanto em programas e
ações de prevenção e promoção de competên-
cias e poderá beneficiar indivíduos e grupos,
principalmente aqueles submetidos a riscos
psicossociais, potenciais ou reais. Esperamos
que esta pesquisa possa motivar não apenas
novas investigações científicas acerca das van-
tagens do outdoor training, mas também o
desenvolvimento e a implementação de outros
programas educativos como o KidsTalentum,
adaptados a populações específicas, que utili-
zem esta metodologia como uma ferramenta
de desenvolvimento humano, de promoção
da saúde integral dos indivíduos e do aprimo-
ramento da capacidade de enfrentar riscos e
lidar com as adversidades de modo mais adap-
tativo e construtivo.
Há Vida na Horta
Helena Colaço. Educadora de infância, Jardim de Infância Nossa Senhora da Piedade, Odemira
Vera Poeira . Educadora de infância, Jardim de Infância Nossa Senhora da Piedade, Odemira
Da minha aldeia vejo quanto da terra se tureza é uma presença necessária nas escolas. “Nunca pensei que isto pudesse acontecer, vir-
pode ver no Universo Enquanto profissionais de educação, estamos mos brincar aqui na terra! Isto é mais giro do
Por isso a minha aldeia é tão grande como certas de que a exploração do meio natural que brincar às escondidas” (Inês, Sala do Rio).
outra terra qualquer é promotora da felicidade e traz benefícios “Eu nunca brinquei com a lama porque não
Porque eu sou do tamanho do que vejo à criança: fortalece o sistema imunológico e tenho horta” (Beatriz, Sala do Rio).
E não do tamanho da minha altura... mantém-na em atividade física; promove a “Gostei de cavar na terra com a pá, fiz bura-
Fernando Pessoa socialização durante as brincadeiras; possibili- cos” (Joana, Sala do Pátio).
ta a descoberta do meio próximo através da
Atualmente a oferta de jardins de infância com observação e exploração de diversos materiais No princípio era uma terra pequenina, es-
espaços exteriores estandardizados e pouco naturais e, consequentemente, o desenvolvi- quecida, triste e sem beleza…
convidativos à descoberta e exploração do meio mento cognitivo. Além disso, permite-lhe ava- O projeto pedagógico Há Vida na Horta, há
é uma realidade no nosso país e priva a criança liar os perigos através da reflexão do que pode muito desejado, teve início no ano letivo de
de contactar com a Natureza. Os materiais na- e não pode fazer no lugar onde se encontra. 2007/2008 e permanece até aos dias de hoje
turais são substituídos por infraestruturas fixas Perante esta última ideia, entendemos existir na nossa instituição, trazendo uma nova cor
e pavimentos que condicionam a capacidade de cada vez mais uma superproteção da criança. ao quotidiano pedagógico. Numa terra que
resposta em caso de desequilíbrio, que pouca Não queremos colocar em causa as questões em tempos se dizia abandonada, avistam-
(ou nenhuma) margem de manobra oferecem de segurança, que são por demais importan- -se atualmente diversas sementeiras que
para o experienciar pelas próprias mãos (Colaço, tes, mas realçar que uma proteção em demasia são cuidadosamente tratadas pelas mãos
2013). Tal como Pérrisé (2011, para. 10), entende- acaba por limitá-la no seu desenvolvimento e das crianças no terreno sobranceiro ao rio
mos que é importante a presença da Natureza aprendizagem. Mira (no Jardim de Infância Nossa Senhora
no lugar onde as crianças brincam, isto é, onde As árvores, as plantas, os animais e os chei- da Piedade) e nos espaços exteriores da Casa
elas possam manusear as pedrinhas, sementes ros característicos do mundo natural são uma Beatriz Gambôa e da Casa Maria Luísa Cordes
e amêndoas, apalpar as diferentes texturas das realidade no nosso jardim de infância, num da Ponte, situadas na localidade de Boavista
ervas, cavar na terra, juntar gravetos e tocos, lugar que se pretende rico em oportunidades dos Pinheiros, Odemira. Foi nossa intenção,
aspirar os diferentes aromas, caminhar sob as e momentos de descoberta, bem como apela- enquanto equipa pedagógica, “fazer da terra
sombras de árvores e observar os insetos no tivo a todos os sentidos do ser humano (Colaço, abandonada um jardim bonito e agradável ao
seu habitat. Brincar na Natureza e com a Na- 2013). olhar de quem o visse” (Geraldo, Matias &
regar e depois deixarmos ela apanhar sol” (Bár- Segundo Augusto Matias Op, teólogo que “Eu gosto de ir à horta plantar plantas porque
bara, Sala do Rio). participou no nosso livro E eis que tudo era eu gosto dos alimentos que saem das plantas
“As linhas dos nossos canteiros são onduladas bom, “Nós somos colaboradores de Deus na quando elas crescem” (Francisca, Sala do Rio).
como o pelo de uma ovelha” (Adelaide, Sala continuação e desenvolvimento de tudo o Mais recentemente, surgiu a nível institucio-
do Rio). que existe. Por isso, as nossas atitudes para nal um projeto de intervenção no sentido de
com a natureza devem ser de conservar, re- sensibilizar as crianças para o desperdício ali-
Temos na nossa horta ervas aromáticas (coen- produzir e cuidar de tudo o que a terra nos mentar. Pretende-se deixar nelas o sentimento
tros, salsa, hortelã, poejos, alecrim e lúcia-lima) dá” (Geraldo, Matias & Zacarias, 2009, p. 34). que não se deve deitar comida fora, que é im-
e vegetais (brócolos, espinafres, couves, na- Efetivamente, as ocasiões de descoberta e de portante cuidar do planeta e respeitar as ações
biça, favas, alhos, rabanetes) que são cuida- exploração na horta possibilitam às crianças dos outros. Por exemplo, o padeiro não dorme
dosamente plantados ou semeados de acordo saber cuidar e respeitar a Natureza, os outros de noite para fazer o pão que será saboreado
com as técnicas agrícolas, tendo-se em con- e o mundo. por nós na manhã seguinte.
sideração o rigor científico das experiências Em termos práticos, cada grupo tem um re-
proporcionadas às crianças. “As plantas precisam de água e de sol e de cipiente transparente onde coloca os restos
Para trabalhar na horta trazemos de casa carinho para sobreviverem e crescerem” (Ni- alimentares do almoço e procede à sua pe-
as nossas botas de borracha e temos vários colau, Sala do Rio). sagem. No final, são avaliados e discutidos
utensílios como regadores, sachos, ancinhos, os resultados em contexto de sala com vista
baldes, etc. Tentamos transmitir às crianças que o modo à valorização e reajustamento de comporta-
como cuidamos das nossas plantas deve ser mentos. A par da exploração de conteúdos
“Fico alegre porque vou à horta com as bo- o modo como tratamos todas as pessoas que matemáticos associados à noção de número
tas de borracha e piso a terra” (Sara, Sala do nos rodeiam. Efetivamente, nas idas à horta, e à organização e tratamento de dados que
Pátio). as crianças vivenciam valores como a solida- é feita, pretende-se que esta prática de não
riedade, a cooperação, a partilha, o respeito desperdício alimentar traga repercussões nas
O envolvimento dos pais/famílias é valorizado e a entreajuda, valores estes que acabam por vidas futuras das crianças.
como preconizam as OCEPE (Lopes da Silva transportar para as suas vivências diárias. E eis que tudo era bom.
et al., 2016). Na verdade, os pais/famílias, jun-
tamente com os filhos, comprometem-se a Nada nasce do nada
trazer as botas de borracha no respetivo dia Uma vez que um dos objetivos das hortas é
e, além disso, contribuem com plantas e se- alimentar as pessoas – tendo em vista uma ali-
mentes de modo a enriquecer as vivências e mentação saudável – e que as crianças passam REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
os conhecimentos das crianças. grande parte do seu tempo na escola, emergiu Colaço, H. (2013). A Criatividade na Educação Pré-Escolar
outro projeto institucional, o Garfo Verde. Este como forma de Expressão e Comunicação. Relatório de
Mestrado em Educação Pré-Escolar. Faro: Universidade
Saber e acreditar projeto visa sensibilizar as crianças para uma do Algarve – Escola Superior de Educação e Comunica-
O Projeto Há Vida na Horta está intimamen- alimentação saudável, tendo como incentivo ção.
te relacionado com outro projeto pedagó- os alimentos colhidos da sua horta. De facto, Geraldo, M. T., Matias, A. & Zacarias, F. P. (Orgs.) (2009).
E eis que tudo era bom. Lisboa: Paulinas.
gico da instituição, o Génesis, que aborda estes alimentos, depois de cuidados e colhidos Périssé, P. (2011). Fábricas de anjos barrocos. Acedido a
a espiritualidade na infância. As crianças, da horta pelas mãos das crianças, são levados 25 de março de 2018 em: https://www.educare.pt/tes-
nesta fase, “estão mais recetivas e dispo- até às cozinheiras da instituição, que acabam temunhos/artigo/ver/?id=12645&langid=1
Lopes da Silva, I. (coord.), Marques, L., Mata, L. & Rosa,
níveis para descobrirem e desenvolverem por confecioná-los. Todas as sextas-feiras, o M. (2016). Orientações Curriculares para a Educação Pré-
a sua relação com a dimensão espiritual e almoço é à base de legumes e verduras e tem -Escolar. Lisboa: Ministério da Educação/Direção-Geral
como tal é importante valorizar o desper- o contributo das crianças. Observamos que da Educação (DGE).
Outros documentos consultados:
tar de grande curiosidade para as questões existe uma maior recetividade a estes alimen- Projeto Educativo (2016-2020). Jardim de Infância Nossa
espirituais, pois a formação espiritual das tos pelo simples facto de as crianças terem Senhora da Piedade – Odemira/Boavista dos Pinheiros.
crianças cruza-se com a descoberta da sua participado com alimentos colhidos da horta
própria identidade (Projeto Educativo, 2016- para a sua refeição.
2020, p. 19).
"Educados pela arte – todos os seres obras de arte, mostrei-lhes obras para eles
humanos devem sê-lo. Pois que outro se inspirarem e para reproduzirem em con-
componente melhor e mais propício a formidade (que é quase a mesma coisa),
fazer florescer a divindade interior do contei-lhes histórias de vida, mostrei-lhes o
indivíduo, senão o de colocá-lo desde moderno, o barroco, o abstrato e o renasci-
cedo sob o que realmente inspira a sua mento – tudo sem ordem, com muita von-
alma? Toda a criança pode crescer sob o tade e muitas ideias, mas sem fio condutor.
signo do equilíbrio se, ao lado do pão, Assim como as crianças gostam de histórias
da ideia, da experiência e do brinquedo, ou canções, também apreciam a observação
lhe derdes o alimento que a conecta com de obras de arte. Ao repetir-se esta ação, as
a sua essência. Se ela própria puder fa- crianças adquirem o hábito de observar arte.
zer os seus primeiros ensaios de criação Com a gramática visual adequada, imagens
livre e espontânea, percebendo e intuin- apelativas, histórias verídicas associadas ao
do diretamente a sua infinita capacidade objeto de observação, a criança envolve-se
de criar e produzir. Sem a imposição de e dá-se o processo cognitivo e emocional
modelos e padrões, permitindo que, pela (Gardner, 1994).
experimentação, encontre a sua própria Foi então que decidi ingressar no mestrado
expressão” em Educação Artística, na vertente das Ar-
(Cura-dor Wozen, 2018). tes Plásticas na ESE de Lisboa, uma verda-
deira lufada de ar fresco, que veio susten-
Comecei a amar a arte como uma criança tar toda esta necessidade de aprender mais
ama brincar e explorar, sem regras, sem sobre esta área tão vasta e diversificada e
preconceitos, um amor puro, daqueles onde consegui encontrar as respostas que
que temos necessidade de partilhar com o precisava para criar um programa com fio
mundo. Queria partilhá-lo com as minhas condutor e proporcionar assim o contacto
crianças de jardim de infância, mas não com a obra de arte de forma lúdica, contí-
sabia como. nua e deslumbrada.
“Importa que, também no jardim de infância, “O que devíamos ensinar é a atitude dialógica
haja imagens de obras de arte à disposição para com a arte, a capacidade não apenas de descontextualizada – agrupados por ativi-
das crianças, que as poderão rever e utilizar ver o mundo significativo que transcende os dades, reduzidos à investigação em sala e
para recriar as suas produções, dialogar em meios expressivos, mas também de nos re- não permitindo às crianças que desenvolvam
grupo sobre elas, partilhando as suas desco- lacionarmos pessoalmente com este mundo, competências naturais e implícitas ao seu
bertas e interpretações, de modo a que sejam de nos abrirmos a ele e de nos enriquecermos desenvolvimento –, também a obra de arte
um meio de alargamento e enriquecimento com os significados aí descobertos” (Leon- não deve aparecer por si só como um evento
cultural e de desenvolvimento da apreciação tiev, 2011). isolado, mas sim como parte integrante da
crítica” (OCEPE, 2016). Assim como já se chegou à conclusão de que cultura escolar, da comunidade e do quotidia-
O meu percurso foi natural. Comecei por existem certos temas que não devem ser no. Refletindo sobre hipóteses de apresentar
sugerir às crianças que copiassem outras apresentados de forma compartimentada e a obra de arte de forma sistemática, lúdica e
1ª sessão Leitura de imagem das obras correspondentes à corrente estética determinada onde as crianças falam sobre o que estão a
visualizar. São abordados os conteúdos da gramática e da linguagem visual.
2ª sessão Exploração de diferentes técnicas observadas nas obras.
3ª sessão Expressão de ideias e ideais da época através da pintura ou desenho.
4ª sessão Construção de uma obra tridimensional.
coerente, esbocei algumas ideias e foi assim estéticas, e, particularmente, um olhar sobre pois de apresentadas as curiosidades asso-
que nasceu “Grandes Obras, Grandes Artis- si e sobre as suas vivências e emoções. ciadas à época, obra ou artista, é necessá-
tas, Uma viagem pela arte”, que consiste na O projeto intitulado “Grandes Obras, Grandes rio dissecá-las, para que as resolvamos bem
abordagem da Educação Artística na vertente Artistas, Uma viagem pela arte” foi concebido no espetro emocional, as crianças e eu, que
das artes plásticas, para idades compreendi- de modo a ser abordada uma corrente es- tanto aprendo a conversar com elas, que
das entre os 3 e os 6 anos. Um projeto sus- tética por mês. O planeamento das sessões ajusto as informações e as minhas expec-
tentado numa metodologia e estrutura pró- repete a forma, mas difere no conteúdo, tativas normalmente são largamente ultra-
prias, mas apoiado sempre nos interesses do estruturando-se da seguinte forma: passadas pela inteligência emocional de
grupo de crianças. A leitura de imagem é orientada segundo as quem analisa ainda a vida com inocência.
Começámos este ano na Tutor T, com as salas normas do Programa Visual Thinking Strate- É maravilhoso!
de pré-escolar a realizar as sessões de Educa- gies, as sessões colocam três questões de Normalmente são três obras por mês, o que
ção Artística uma hora por semana. resposta aberta, que permitem às crianças no início me pareciam muito poucas, mas
Os objetivos que estão na base do desen- dialogar e pensar sobre o que estão a ver: depois entendi que as crianças precisavam
volvimento deste projeto e o orientam visam - O que está na imagem? de mais tempo para conversar sobre o que
o contacto da criança com a obra de arte, - O que vês que te faz dizer isso? viam. Não é possível mostrar a Mona Lisa e
através da leitura de sentido e de um diálogo - Que podemos encontrar mais? a Criação de Adão sem referir os mistérios
em que a criança expresse e verbalize o que É-me difícil descrever o que acontece e mensagens subliminares que estão nas
vê e como vê a obra, dando-lhe a oportuni- durante as sessões de leitura de imagem, obras. É claro que eles gostam de saber
dade de dizer como se sente e o que pensa, porque são tão cheias de tanto, somos que Miguel Ângelo teve de pintar deitado
promovendo o desenvolvimento da literacia envolvidos numa esfera, que difere de e de pé o teto da Capela Sistina, mas quan-
em artes visuais, o conhecimento de diferen- grupo para grupo, em que as crianças do se explica que o artista pintou Deus
tes meios de expressão, a aquisição de gra- relacionam a sua vida com as obras apre- dentro de um cérebro quando este tenta
mática da linguagem visual, a aquisição de sentadas, e é necessário ter tempo para alcançar Adão, para que as pessoas quan-
conhecimentos relativos a algumas correntes nos envolvermos num diálogo em que de- do olhassem para cima a rezar pudessem,
antes de o fazer, pensar um pouco pelo
seu “cérebro”… Podem imaginar a avalan-
che de questões. É preciso tempo para eles
colocarem as suas dúvidas sobre a Igreja, o
clero e a sociedade da altura. Uma criança
de 4 anos, no meio da conversa sobre esta
obra, comparou a hierarquia da nossa esco-
la à hierarquia do clero, dizendo: “A Teresa
(diretora) é o papa, vocês (educadoras) os
padres e nós somos o povo que vai à mis-
sa.” A Mona Lisa do Norte, A menina do
brinco de pérola, de Vermeer, proporciona-
-nos momentos fascinantes quando imagi-
namos o que ela está a pensar e a sentir,
revelando muito do nosso ser, e adoramos
a história do Edvard Munch que fez O Grito
porque a “namorada” (mulher casada com
quem tinha um caso) terminou a relação
com ele e o deixou de coração partido. São
construções mentais que requerem tempo
para sedimentar. Não o podemos fazer em
apenas 10 minutos… Como passar rapida-
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Museu Berardo porque a filha queria fo- nosso dia a dia. Para já não falar, obviamente,
tografar todas as obras para mostrar aos da cultura geral decorrente dos projetos que
amigos no ateliê. Os pais vão partilhando vão fazendo e que lhes dá uma visão da his-
episódios e conversas que surgem em fa- tória da arte mundial. Ainda ontem me sentei
mília sobre obras de arte e essa partilha é com eles, com um livro sobre arte, porque
demonstrativa da importância que a obra ambos procuravam saber mais sobre Miró,
de arte ganhou na vida dos seus filhos e de quem tinham falado nas respetivas aulas
consequentemente nas suas. de arte uns dias antes. Pelo caminho fomos
Termino esta partilha com o testemunho encontrando outras obras que captavam a
da mãe Marta Neves, que reflete na perfei- sua atenção. Lembro-me também do orgulho
ção a génese do Programa “Grandes Obras de ambos os meus filhos a entregarem-me as
Grandes Artistas, Uma viagem pela arte”: suas primeiras “obras de arte”, que ainda ho-
“Para mim foi absolutamente surpreendente je estão expostas no nossa sala de estar, e de
ver a reação dos meus dois filhos ao estudo falarem nos pintores que os tinham inspirado
da arte, nas suas variadas formas. para a fazerem. A verdade é que a presença
A primeira recordação que tenho dessa in- da arte lhes abre precisamente isso, formas
fluência é de a minha filha Francisca, com 3 diferentes de ver o mundo e de o apresentar,
anos, numa visita à fábrica da SPAL, apontar sejam pessoas, locais ou emoções. Maneiras
para um prato e dizer: “Olha, mãe, este prato de se inspirarem, alargando-lhes o horizon-
tem o homem de Vitrúvio!” A curiosidade de- te. E que melhor altura para terem acesso a
les quanto ao mundo que nos rodeia, sobre este “instrumento” senão quando estão pre-
o que é (ou não) uma obra de arte, o espírito cisamente a descobrir o mundo, ainda sem
crítico, apurando o que gostam e o que não qualquer pré conceito?”
gostam, as sensações que lhes trazem a cor,
a forma, a textura é evidente nos dois no
Em idade pré-escolar as crianças requerem “um padrão de repetição é um padrão no qual padrões (dois problemas) e criação de padrões
aprendizagens ricas, significativas e multidisci- há um motivo identificável que se repete de (dois problemas).
plinares. Cabe ao educador proporcionar-lhes forma cíclica indefinidamente” (p. 20) ou uma Nas tarefas de continuação de padrões era
experiências matemáticas enriquecedoras, re- sequência que se repete, posteriormente, a dado à criança um padrão iniciado, havendo
lacionadas com o seu quotidiano. A vontade um determinado número de termos, como espaços em branco para que pudesse ser con-
de aprender e desenvolver noções matemáti- explicam Frobisher, Monaghan, Orton, Orton, tinuado. Na tarefa da “Lagarta”, as crianças
cas surge muito cedo, sendo fundamental que Roper e Threlfall (1999). Estes padrões podem continuaram o padrão indicado no corpo de
os educadores sejam capazes de dar continui- ser trabalhados desde muito cedo na educa- uma lagarta (ver figura 1) molhando a ponta
dade a essas aprendizagens e curiosidades e ção pré-escolar, onde as crianças têm a pos- do dedo na tinta guache com a cor adequada.
que forneçam o apoio necessário (Silva, Mar- sibilidade de continuar e construir sequências Na tarefa das “Folhas”, as crianças tinham de
ques, Mata & Rosa, 2016). Todavia, de acordo em que o padrão se repete. Nos padrões de
com Vale (2009), embora se reconheça cada crescimento, segundo Barbosa, et al. (2011),
vez mais a relevância dos padrões na mate- “cada termo muda de forma previsível em re-
mática, não lhes tem sido dada importância lação ao anterior” (p. 20). Esses autores afir-
nos currículos nacionais. mam que existem “padrões de crescimento
Na matemática, o termo padrão relaciona-se lineares e não lineares” (p. 20) e outros “cuja
com alguns tipos de regularidade, formas ou descoberta conduz a invariantes que permitem
números. Noutros contextos, pode relacionar- o estabelecimento de propriedades numéricas
-se com cores e sons, onde se detetem regu- ou geométricas” (p. 19).
laridades. Orton (1999) elucida que a noção de
padrão é polissémica e não tem uma definição A importância dos padrões
concreta. Segundo Palhares e Mamede (2002), na educação pré-escolar
a ausência de uma definição concreta deste Realizou-se uma intervenção em que se pro-
termo pode conduzir a uma reduzida signifi- curou compreender as ideias das crianças de
cância por avaliarem tratar-se de uma simples uma sala de jardim de infância na exploração
repetição ou considerarem um padrão algo ba- de padrões figurativos de repetição. Para tal,
nal e que tudo pode ser considerado padrão. observaram-se 17 crianças (9 de 4 anos, 8 de
O termo em questão pode, em determinados 5 anos) na resolução de tarefas de padrões
casos, significar uma particular disposição ou e identificaram-se as dificuldades por elas
arranjo de formas, sem regularidade aparente. sentidas na exploração de tarefas de padrões
Um padrão envolve, obrigatoriamente, repe- figurativos de repetição.
tição ou mudança. São conhecidos dois tipos As tarefas incidiam na exploração de padrões
de padrões, os de repetição e os de cresci- de repetição através da continuação de pa-
mento. Barbosa, Borralho, Barbosa, Cabrita, drões (dois problemas), descoberta de intru-
Vale, Fonseca e Pimentel (2011) afirmam que sos em padrões (dois problemas), tradução de
Figura 1 - Criança durante a resolução do problema Figura 2 - Crianças durante a resolução do problema Figuras 3, 4, 5, 6, 7 e, 8 e 9
"Lagarta". "Folhas".
Figura 10 - Resolução do problema "Formas geométri- Figura 11 - Resolução do problema "Formas geométri- Figura 12 - Resolução do problema "Texturas" pelo gru-
cas" pelo grupo dos 4 anos. cas" pelo grupo dos 5 anos. po dos 4 anos.
numa dada sequência, tendo a criança de pro- padrão de figuras geométricas (quadrados,
ceder à correção desse elemento. Na tarefa círculos, triângulos e retângulos), as crianças
das “Frutas”, apresentaram-se sucessivamen- acordaram, em pequeno grupo, qual das fru-
te às crianças quatro padrões de repetição tas iria corresponder a cada uma das figuras
em que tinham de descobrir a peça de fruta para depois traduzirem o padrão das frutas no
“intrusa” e substituí-la pela peça de fruta na correspondente padrão das figuras geométri-
Figura 13 - Resolução do problema "Texturas" pelo gru- posição correta (figuras 5-7). cas (figuras 10-11).
po dos 5 anos. Na tarefa “Pauzinhos coloridos”, as crianças No problema das “Texturas”, que consistiu na
tinham de descobrir qual o pauzinho intruso tradução de um padrão formado por folhas de
continuar um padrão feito com folhas de três no padrão dado e substituí-lo corretamente. variados tipos, as crianças recorreram a qua-
tamanhos e cores distintas, colando as folhas A figura 8 mostra a resolução de crianças de 4 drados de materiais, cores e texturas variadas
em cima da linha (figuras 2-4). anos em dois dos padrões apresentados, a fi- e acordaram entre si qual a textura que iria
A continuação de padrões foi algo que as gura 9, a resolução de crianças de 5 anos num corresponder a cada tipo de folha, para assim
crianças apreciaram imediatamente. Apesar outro padrão proposto. Nas tarefas de des- poderem traduzir os padrões do tipo AAB-
disso, revelaram dificuldades em entender coberta do intruso, a maioria das crianças foi BAABB para o grupo dos 4 anos (figura 12)
que tinham de continuar o padrão apresen- capaz de identificar o intruso, mas não foi fácil e ABBCABBC para o grupo dos 5 anos (figura
tado e não de recomeçá-lo. Algumas crianças mencionar de imediato qual o seu substituto. 13), tendo as crianças acordado entre si qual
dispuseram os elementos aleatoriamente, não As crianças sentiram dificuldades em descobrir a textura que iria corresponder a cada tipo de
tendo noção da regularidade e da unidade de intrusos menos evidentes ou quando inseridos folha, traduzindo assim o padrão.
repetição. Outras inventavam novos elemen- em padrões mais complexos e na sua correta Depois, procederam à continuação do mesmo
tos, sem fazer qualquer referência aos ante- substituição. Estas tarefas foram acessíveis padrão. As tarefas de tradução de padrões fo-
riores. Este fenómeno está descrito por Rus- pelo facto de os intrusos terem, maioritaria- ram as mais complexas. As dificuldades das
tigian (citado por Threlfall, 1999) e carateriza mente, cor distinta dos restantes elementos. crianças centraram-se na perceção do objetivo
uma fase inicial de contacto com padrões por Com a prática, as crianças foram capazes de da tarefa e no que tinham realmente de fazer.
crianças pequenas. No decorrer do estudo as resolver estas tarefas confortavelmente. As suas atividades foram explicadas de forma
crianças ficaram familiarizadas com este tipo As tarefas de tradução de padrões consisti- mais detalhada e realizadas em pequeno grupo.
de tarefas e concretizaram as atividades com ram na substituição integral e regrada de cada O facto de serem realizadas em pequeno grupo
sucesso, tendo-se colmatado as poucas difi- um dos elementos do padrão, de acordo com gerou entreajuda e partilha de conhecimentos
culdades com apoio e dedicação. regras previamente definidas. No problema entre as crianças durante a resolução da ativi-
As tarefas de descoberta do intruso consistem das “Formas geométricas”, que consistiu na dade. Estas atividades exigiram algum apoio às
na identificação de um elemento inadequado tradução de um padrão com frutas por um crianças de 4 anos, mas em contrapartida as
Figura 14 - Crianças durante a resolução do problema Figura 15 – Criação de padrão com rolhas coloridas (4 Figura 16 - Criação de padrão com rolhas coloridas (5
"Rolhas coloridas". anos). anos).
Na creche, cada minuto é uma novidade, mas é uma característica que quero alimentar ao a funcionar como uma espécie de comunida-
aos poucos começamos a perceber o porquê longo da vida. Por isso dei por mim muitas de, ou talvez um laboratório de ideias. Atra-
de estarmos ali. Chegamos a casa com um vezes a refletir sobre “quem sou eu e qual vés deste registo, agir com intencionalidade
cansaço fora do comum, mas começamos a o meu papel neste grupo?” Num dos livros educativa passou a ter outro sentido: era
gostar logo desde o primeiro dia. que me fascinaram na minha formação inicial, estar a desencadear procedimentos racio-
Quando comecei a desenvolver a minha prá- lê-se que o invulgar e o inesperado atraem nais determinantes para o futuro, ou, como
tica com bebés e crianças pequenas dediquei facilmente as crianças (Katz, 1997), e não só descrevem as Orientações Curriculares para
tempo a conhecer um pouco mais esta faixa esta como outras frases encaminharam-me a Educação Pré-Escolar (OCEPE) (Lopes da
etária até então desconhecida para mim. As no arranque de vários projetos. Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016, p. 4), “um
ferramentas que recebi na formação inicial adulto plenamente capaz para um exercício
foram fundamentais, mas desbravar o mun- Educador facilitador: como assim? de cidadania ativa”.
do logo após o nascimento eram “mares O educador é um primeiro modelo pedagó- Não é só a partir dos 3 anos de idade, pois
nunca dantes navegados”. Degrau a degrau, gico para este passo evolutivo. O estímulo também a creche é considerada um contexto
fui adequando aquilo que considerava uma à mudança na relação aluno/criança-profes- de grande responsabilidade social. O viver a
boa intervenção, mas com o tempo percebi sor/educador é descrito por David Kennedy comunidade desde tenra idade pode passar
que afinal havia muito mais por descobrir. (2004) como uma forma de criação do mun- por experienciar momentos sérios e estimu-
Hoje consigo perceber que fui amadurecendo do colaborativo, dialógico e playful.1 Para lantes que, de forma divertida, façam “cóce-
ideias, refletindo e dando significado àquilo este autor, o facilitador deve ser um mo- gas no pensamento” e encorajem a pensar
que fui descobrindo, ou melhor, descons- delo pedagogicamente forte para que haja de forma cativante durante períodos carrega-
truindo. Fascinada por metodologias que um passo evolutivo. Quando desmistifiquei dos de significado, pois, como refere Alberca
possibilitam a descoberta, por considerar este papel, rapidamente a minha sala passou (2014, p. 23), “a inteligência do ser humano
que tudo tem uma magia própria, comecei 1 A palavra playful, na tradução para a língua portugue-
é infinita”.
a focar-me mais no processo em si do que sa ganha um sentido que não se enquadra na que pre- Através da experiência fui percebendo o va-
nos resultados. A minha única certeza era tendo atribuir ao conceito. Não encontrei uma única lor desta responsabilidade profissional/social
palavra que fizesse jus ao termo neste enquadramen-
que tinha muitas dúvidas. Sempre tive e vou to, mas reconheço que ser playful poderá ir mais além
e passei a estar mais atenta a este compro-
continuar a ter. Sou curiosa por natureza e do que brincar de forma intencional e pedagógica. misso comigo própria, com as crianças e suas
famílias, auxiliares de ação educativa e todos
aqueles que de uma forma ou de outra con-
seguimos contagiar.
Envolvimento foi um ingrediente fundamen-
tal. Importava conhecer as crianças desta
idade e entendê-las. Esta personalidade,
que Mathew Lipman2 nos inspira a enten-
der como capaz, contraria a vulnerabilidade
que a criança ganha perante o imenso poder
do adulto. Se para Lipman a infância é uma
dimensão da experiência humana, importa
alimentar esta fome de sentido, potencian-
do experiências ou, se quisermos parafrasear
Gopnik, vivenciar os “mundos possíveis”.
Os projetos fluíam, as ideias surgiam de
tantos lados, era quase inconcebível haver
tempo para corresponder a tanta motivação.
2 Matthew Lipman, filósofo conhecido como o “pai” da
filosofia para crianças, uma abordagem feita através
do diálogo onde é potenciado o pensamento multidi-
mensional (crítico, criativo e colaborativo).
Recetividade à mudança
A primeira e talvez a maior mudança que fiz
teve a ver com o respeito. Respeitar a criança,
na prática, é muito mais do que isso. No seu
livro O Bebé Filósofo, Gopnik (2010) explica
de forma surpreendente que evidências po-
demos ver nos comportamentos dos bebés
que nos levam a acreditar que a infância é de
facto uma parte profunda da condição huma-
na. Não menorizar os bebés foi um passo fá-
cil de dar, mas exigente, visto que importava
alargar esta postura a toda a equipa. Talvez
este tenha sido o maior desafio. No entanto,
trabalhar com uma equipa motivada é meio
caminho andado para o sucesso de qualquer
intervenção, e os obstáculos deixam de o ser. to e desenvolvimento, direta ou indiretamente. ta disposição para agir em vez de passivamen-
Até aos dias de hoje, nos diálogos fluentes do As crenças que fixamos raramente são definiti- te existirem, que sabem que podem investigar
dia a dia, são ouvidas expressões tais como vas e muitas podem ter tido a sua origem nos ativamente para serem adultos que querem
“por favor” e “obrigada” quando há necessi- primeiros anos da nossa vida. Nunca a idade mudar o mundo.
dade de questionar alguém, ou quando é feito foi elemento impeditivo de explorar o que quer
algum pedido. Há todo um cuidado de nunca o que seja com as crianças. Apesar da adequa- Saber como é que sabemos
fazer sem dar uma explicação criteriosa e fun- ção que deve ser feita, é importante perceber Na creche, todos os dias são diferentes. O iní-
damentada, e isto aplica-se tanto aos adultos a criança como um ser holístico num meio cio de um projeto não precisa de partir sempre
como às crianças. cheio de contextos que ainda não conhece e com uma história. Mas os projetos dão origem
que precisa de experimentar. Experimentar é a muitas histórias. Foram vários aqueles que
Reinventar a gramática diferente de apenas conhecer. Identifico-me, me marcaram. Segundo Katz (1997, p. 179), “Os
Outro passo muito importante foi quase que como profissional, com o que Horta refere projetos podem ser iniciativas a curto prazo ou
anular o uso da palavra “não”. Esta foi uma (2016, p. 90): “E se a individualidade de cada podem animar uma sala durante oito sema-
mudança morosa e exigente, no entanto, de- um reflete o profissional que é, então consi- nas ou mais”. Recordo-me do relato de uma
safiante. Mais do que reinventar uma gramá- dero que esta é a forma mais adequada para, auxiliar de ação educativa que me disse: “Até
tica própria, a maioria da equipa teve oportu- como educador de infância, transmitir às crian- nós aprendemos tanto com estas coisas!” A
nidade de participar, de forma descontraída, ças o gosto por esta forma de estar, também verdade é que eu às vezes sinto que o meu
num processo de reflexão contínua. O que na educação.” cérebro é um autêntico laboratório de ideias e
digo e como o digo determinam aquilo que Mathew Lipman, num documentário sobre a o melhor é ter percebido de que forma consi-
eu oiço. importância do programa que criou, Filosofia go contagiar as crianças e quem está à minha
para Crianças3, referiu que estas têm uma cer- volta, ao mesmo tempo que sou contagiada
Construir conhecimento 3 FpC – Filosofia para Crianças, programa desenvolvido também.
Outra grande mudança teve a ver com a con- por Matthew Lipman e Ann Sharp onde as crianças Há efetivamente uma idade mínima para com-
ceção de projetos. Eu gosto de chamar conce- aprendem através de uma prática dialógica, em co- preender certos conceitos, mas acredita-se
munidades de investigação filosófica. Trata-se de uma
ção, pois acredito que tal como o ser humano, abordagem diferente da metodologia de projeto. Con- que não haja uma idade mínima para obser-
um projeto também é concebido, construído, tudo, refiro-me a ambas por considerar que a primeira var, investigar, experimentar, perceber e refle-
acompanhado e está em constante crescimen- poderá ter um efeito prático enriquecedor na segunda tir. Saber como sabemos é uma característica
e em outras conceções teóricas.
transformar atitudes e padrões de comporta- que siga os seus focos de interesse. Para nós é evidente esta função da educação.
mento, o que determinará as personalidades Goldschmied (2006, p. 148) refere que “no Escutar e observar a criança deve ser um prin-
dos indivíduos”.4 Esta personalidade para a segundo ano de vida, as crianças sentem um cípio. Há quem refira que o corpo que sente
qual somos inspirados a entender como ca- grande impulso de explorar e descobrir por si não pode ficar parado.
paz contraria a vulnerabilidade que a criança mesmas a maneira como os objetos se com- A título de conclusão, gostaria que estas
ganha perante o imenso poder do adulto. portam no espaço quando são manipulados linhas fossem uma espécie de estímulo, ou
por elas”. até mesmo um convite para que os leitores
Considerações finais A descrição supra citada reflete de forma compreendam a importância de deixar a ex-
Considerando que o brincar heurístico5 po- clara o que foi vivido e sentido nesta comu- ploração com olhos de quem quer ver, com
tencia a experiência criadora da criança, para nidade específica. as mãos de quem quer tocar, com o desejo
além de diminuir os conflitos e despertar pa- As crianças precisam de tempo para viver o de quem quer sentir, cheirar, criar e experi-
ra as múltiplas funcionalidades dos objetos abstrato. Precisam de descodificar aquilo que mentar um mundo cheio de oportunidades
e suas transformações, também concretiza lhes inquieta o pensamento, de fazer trocas, daquilo que, por ora, se apresenta como des-
uma vasta quantidade de processos inves- de experienciar situações modificáveis. conhecido.
tigativos. “Se nesta forma de expressão artística se coloca
O adulto/facilitador fica numa situação privi- muitas vezes a ênfase no fazer, é fundamental “Não deixes nunca de sonhar, porque os
legiada pois, interferindo o mínimo possível, que, para além de experimentar, executar e sonhos tornam o homem livre”.
consegue criar as condições adequadas em criar, as crianças tenham oportunidade de Walt Whitman
torno do momento, potenciando a explora- apreciar e de dialogar sobre aquilo que fazem”
ção. Desta forma está a permitir à criança (Lopes da Silva et al., 2016, p. 49).
Estes diálogos que surgem da apreciação,
4 “Si hay un objetivo claro a lo largo de la escuela infan- da construção, do contacto, que desen- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
til este es el de crear hábitos que se acabarán trans-
volvem a sensibilidade estética da criança, Alberca, Fernando. Todas as Crianças Podem Ser Einstein.
formando en actitudes y pautas de comportamento, Planeta. Lisboa. 2014.
que determinarán la personalidade de los indivíduos” representam meios para desenvolver o seu Clay, Mary. The Patterning off Complex Behavior. Virginia.
(Puig, 2015, p. 19). pensamento crítico. Importa sublinhar a ideia 2009.
5 Definição de Goldschmied que define este brincar Goes, Lúcia Pimentel. Introdução à Literatura Infantil e
como uma proposta para qualificar as oportunidades de que o educador deve potenciar estes con- Juvenil. São Paulo: Pioneira, 1984.
educativas através de uma abordagem por meio da textos e privilegiá-los. Goldschmied, Elinor & Jackson, Sonia. Educação dos 0
exploração. Da exploração à simbolização. aos 3 anos. O Atendimento em Creche. Artmed. 2006.
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Viana, Fernanda, Ribeiro, Iolanda & Batista, Adriana (coor-
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Refletir sobre a minha experiência de supervi- na ‘necessidade que obriga’ a pôr de lado o de cidadãos informados, críticos e atuantes.
são, algo que mal acabo de iniciar, afigurou- incessante queixume da falta de condições e Reevoco, se me é lícito, a questão dos sérios
-se-me, num primeiro momento, como um im- a substituí-lo pela procura de estratégias efi- compromissos que o trabalho com crianças
perativo prematuro, ainda que adequadamen- cazes de observação da criança, por exemplo. acarreta, para desenganar quem ousar apla-
te apoiado pela formação em Estratégias de Atitude nada heroica, por sinal, mas própria de nar levianamente a disparidade de poder e
Supervisão. A tarefa de opinar sobre o resulta- quem não pretende a perfeição e apenas re- estatuto existente entre adultos e crianças,
do da minha introspeção enquanto educadora conhece a obrigação de se formar e informar, perigoso disfarce de uma permissividade
cooperante na formação inicial surgiu-me de qual professor intelectual crítico e prático re- anárquica, deitada à sombra do “aqui man-
forma muito turva, pouco delineada, resultado flexivo, deitar mão de tudo o que tiver à dispo- damos todos” que em nada contribui para o
da parca experiência na área e inevitavelmen- sição para prosseguir, descobrindo e fazendo desenvolvimento equilibrado da criança. Se
te evocativa do meu percurso profissional em ‘desabrochar’ cada criança. E descobrir é ir ao algum saber educativo eu detiver, advindo de
educação de infância, matizado de sucessos e encontro. E quantas maravilhas se encontram, qualificações inerentes à prática profissional,
realização pessoal, mas também de obstáculos sobretudo se me disponho honestamente a pois então que verse no desenvolvimento
e perplexidades. implementar estratégias de diferenciação pe- de uma ação consciente e contagie as es-
Povoaram-me então a memória inúmeras dagógica orientadas para o desenvolvimento tagiárias. A ética, por exemplo, deve estar
crianças, únicas, com histórias, sensibilidades, de práticas inclusivas, não porque se fala mui- sempre presente no quotidiano do educa-
interesses e características irrepetíveis, peran- to delas, mas porque o trabalho com crianças dor e constitui um verdadeiro desafio para
te as quais tantas vezes quase sufoquei sob acarreta sérios compromissos. Depois vêm as encontrar formas de quebrar o poder desi-
uma esmagadora responsabilidade, à qual ten- surpresas. “Desta forma, a criança até conse- gual que flagrantemente existe entre ele e a
tava responder com competência ou impotên- gue!” E a alma enche e vai alimentando o tal criança. Aprendi, com o passar dos anos e a
cia (?) ao perceber que muito destas histórias encanto que não esmorece com o passar dos experiência adquirida, que quanto mais me
singulares de vida me iriam escapar por entre anos… É como um ciclo, afinal. Ao longo da empenho em ir ao encontro daquilo que as
os dedos quando, ao longo de 11 anos, traba- vida vou reconstruindo o pensamento e a ação crianças têm para dizer, tentando anular os
lhei com grupos de 29 crianças, sem direito a na medida em que me informo, procuro e me meus ruídos adultos, mais me encontro como
auxiliar. Depois, a pressão aliviou um pouco… descubro, critico e atuo. A competência vem pessoa e me redefino enquanto profissional
Mas os anos passam e, como o encanto não a seguir, por acréscimo, mas não enaltece, de educação. Verdadeiro dilema este, por si-
desaparece, lanço-me confiante, substituin- ao invés, coloca-se ao serviço da construção nal, que me leva a estender o compromisso e
do a angústia pela esperança, até porque a de uma escola que, paulatinamente, se vai a questionar até onde posso ir na minha ação
vontade de fazer sempre melhor se traduz tornando cada vez mais reflexiva e formadora com as estagiárias que comigo percorrem
este semestre de trabalho com crianças, no acarreta) não tem resultado em desprimor entrega, cada dia, tantas vezes incompreen-
jardim de infância. Aqui confluem igualmente da minha pessoa, antes recoloca o respeito dida e desperdiçada por quem vê o mundo e
individualidades inevitavelmente diferentes já e a confiança no lugar que lhe é devido. E as crianças com olhos diferentes. E lá vem ele
que estão em causa ritmos, tempos, opor- o deleite de ver a competência partilhada e de novo, até o consigo vislumbrar: o encanto.
tunidades e experiências, também eles, dife- mutuamente reconhecida aparece no brilho O encanto apaga qualquer mágoa ou incom-
rentes. Mas muito embora estejam em pre- dos olhos de quem se implica no processo. preensão do sistema, convida à persistência,
sença competências diferentes, no caso das Depois, consegue-se ver crescer o desejo de inspira, reclama o direito à relação com a
estagiárias, não as poderei considerar, neces- fazer mais e melhor. criança, porém… vem sempre acompanhado
sariamente, na ordem do deficit. Porque o Escusar-me-ei à afirmação forçada e engano- da estranha sensação de estar aquém da res-
potencial já o têm, acredito, só precisam de sa de que me apraz levar a cabo a produção ponsabilidade e de ter sempre, sempre, muito
oportunidade e motivação para o expandi- desta reflexão escrita – três preciosas tardes que aprender, a começar com as crianças, cla-
rem. Não receio admitir já ter visto, espe- subtraídas ao convívio familiar, na quadra ro. Pergunto-me: como poderei eu transferir
lhadas nelas, intervenções desajustadas que natalícia. Soaria a falsa modéstia, pretensão o encanto que me sustém e alenta para as
em tempos eu própria cometi. E por que não inoportuna. É, sim, um esforço, admito-o. educadoras/professoras estagiárias que co-
convocar ora aqui a ética? Não estarão em Contudo, à medida que o texto se enforma migo dividem os dias e que em breve iniciarão
causa poderes desiguais? Como devo atuar dou-me conta de quão significativas foram a sua prática? Passará necessariamente pela
enquanto orientadora cooperante? Que estilo para mim as temáticas da ação, sobretudo relação, acredito.
supervisivo devo assumir? Alternar entre eles as relacionadas com a supervisão da prática No trabalho do jardim de infância a relação é
(não-diretivo; colaborativo; diretivo), confor- profissional, a observação e a investigação- inevitável. Convivemos, crianças e adultos, indi-
me o feedback das estagiárias? Dou por mim -ação na formação de professores e, claro, vidualidades e características tão próprias mas,
a conjeturar… A liderança é-me conferida e as relacionadas com a supervisão e didática estando juntas, a relação acontece. Esta rela-
dela não me livro. Mas a oportunidade de específica à educação pré-escolar. Pese em- ção poderá assumir uma pluralidade de formas:
correr riscos e experimentar é um direito de bora a minha franqueza, devo admitir que a autoritária, adversativa, transmissiva, passiva,
quem aprende – as estagiárias – ou, de que revisão das mesmas me impulsionou a mer- etc., ou pode assumir uma forma de poder par-
outro modo poderão elas refletir sobre as in- gulhar na reflexão do meu dever ser profis- tilhado e de participação onde se promove o
tervenções desajustadas e evoluir? Assumir- sional e revisitar os porquês do meu percurso respeito e a singularidade de cada um.
-me como humana (com todas as limitações de educadora, a razão do meu persistir apesar Estarei eu a caminhar na direção certa? Aque-
e ‘deslizes’ no trabalho pedagógico que isso de tanta adversidade, os para quê? da minha la para a qual tende o campo da supervisão
que, segundo Alarcão e Roldão (2008, 15)
ganhou uma dimensão colaborativa, autorre-
flexiva e autoformativa, à medida que os pro-
fessores começaram a adquirir confiança na
relevância do seu conhecimento profissional
e na capacidade de fazerem ouvir a sua voz
como investigadores da sua própria prática e
construtores do saber específico inerente à
sua função social? Bom, as solitárias tardes
natalícias parecem começar a ganhar pontos.
Vou-me tornando numa profissional mais co-
laborativa, autorreflexiva e autoformativa se
me disponho (mas não só) a frequentar ações
deste cariz? Admito então ter encontrado
outros ‘ingredientes’ que, aliados ao encanto
pelas crianças e pela profissão, me suscitam
autoconfiança e diluem a sensação de estar
sempre aquém do meu dever ser profissio-
Bolas de sabão
Rosário Leote de Carvalho . Licenciada em Química
Fazer bolas de sabão é uma atividade de que cula concentrar-se nas partes mais baixas. Esta Glicerina (2 medidas)
todos gostamos, independentemente da ida- fragilidade faz que rebentem quando encontram Água (destilada se necessário) (40 medidas)
de. Normalmente adquirimos a mistura já feita uma superfície. Copo de medidas
e apenas temos de fazer as bolas de sabão. Outro fenómeno interessante que ocorre nas Recipiente para realizar a mistura
Quando acaba a mistura comprada, raramente bolas de sabão é a formação de faixas coloridas, Argolas e dispositivos para fazer as bolas de
conseguimos produzir uma com efeitos seme- devidas a fenómenos de interferência construti- sabão
lhantes. va e destrutiva da luz refletida.
De facto, a química das bolas de sabão é bas- A variedade de receitas que existem reflete a di- Procedimento
tante complexa. Uma bola de sabão pode ser ficuldade de controlar todos os fatores associa- Foram referidas acima as quantidades em ter-
definida como uma bolha de uma fina película, dos à formação de bolas de sabão. Salientam-se mos de medidas, pois as quantidades dependem
composta por moléculas de água e de sabão a qualidade da água (pode ser substituída por da quantidade final desejada. Apresenta-se de
(ou detergente), circundada por um gás (nor- água destilada); o tipo/marca de detergente/ seguida um exemplo para 2000 g de mistura
malmente o ar). sabão; condições atmosféricas (o vento é um final. Esta “receita” é adequada para realizar
A água possui uma elevada tensão superficial, o inimigo para a formação de bolas de sabão); o grandes bolas de sabão.
que tem como consequência a elasticidade da tipo de dispositivo usado para fazer as bolas e,
superfície livre da água líquida, a esfericidade claro, a habilidade do operador. Mostrar o sabão líquido
das gotas de água, o rápido colapso das bo- Deve notar-se que, apesar das inúmeras “recei- Questione as crianças sobre as propriedades
lhas de água, formando gotas, na ausência de tas” disponíveis, não existe a receita certa para deste (cor, estado físico, utilização, etc.)
um agente tensioativo. Assim, para se forma- nenhuma atividade experimental. Todas devem
rem as desejadas bolas de sabão é necessário ser adaptadas às condições físicas e humanas Mostrar a glicerina
adicionar detergente, pois este possui agentes disponíveis. Cabe ao educador escolher o mo- Questione as crianças sobre as propriedades
tensioativos que são compostos por uma parte mento adequado para a realização da atividade, desta (cor, estado físico, etc.)
hidrófila e uma parte hidrófoba. Dada a natu- assim como os materiais a utilizar, não esque-
reza destas duas partes e do seu contacto com cendo que normalmente temos todo o equipa- Medir 5 medidas de sabão líquido e colocar
a água, na formação de uma bola de sabão as mento essencial ao nosso dispor, só que por no recipiente
partes hidrófobas do agente tensioativo procu- vezes temos de o adaptar às necessidades. No Discuta qual é o material adequado para estas
ram afastar-se da água e as partes hidrófilas são entanto, estas atividades devem ser planeadas medidas e que este depende da quantidade de-
atraídas para esta. Assim, a fina película de uma e testadas antes de serem realizadas em sala de sejada.
bola de sabão é constituída por duas camadas aula. E tão importante como a própria experiên- • Medir 2 medidas de glicerina e colocar
de agente tensioativo no meio das quais existe cia são as questões orientadoras, que permitem no recipiente
água. No início esta película tem uma espessura guiar as crianças no decorrer da atividade. • Medir 40 medidas de água e colocar no
considerável, mas esta espessura diminui rapi- recipiente
damente, quer por evaporação, quer por efeito Materiais necessários • Misturar o sabão, a glicerina e a água
da gravidade, que faz a água do interior da pelí- Sabão líquido (5 medidas) • Fazer as bolas de sabão
BIBLIOGRAFIA
Mário Nuno Berberan e Santos, Clementina Teixeira, Bolas de
Sabão: preparação, estrutura e propriedades, Química, Bole-
tim da Sociedade Portuguesa de Química, 94, 31-36 (2004).
Todos os dias, pais e educadores são confron- seres únicos e especiais, que não podem nem preceitos, pois são os únicos realmente eficazes
tados com inúmeros desafios educacionais. devem, ser formatados por conceitos, teorias e e pertinentes em pedagogia.
O que anteriormente parecia “fácil”, num mode- modelos diversos. Uma criança é um universo Deixemos de lado os conceitos abstratos e as
lo tradicional onde o pai ordenava e o filho obe- multifacetado, que se vai alterando continua- experiências dos outros.
decia, hoje tornou-se um desafio de proporções mente. O que hoje funciona, amanhã pode já Recusemo-nos a aceitar de forma passiva e
hercúleas, onde pais e educadores veem-se a não funcionar. absorvente as pseudo-fórmulas educacionais.
braços com uma quantidade gigantesca de Mas garanto-vos que há algo que nunca falha A vida, tal como as relações humanas, não se
informação e contrainformação sobre teorias/ (ou que nunca deve falhar) que é o amor. resolve através de equações matemáticas.
modelos pedagógicos, comportamentais e afe- O amor é o sentimento mais perfeito que exis- Há que viver a vida tal e qual ela nos é apresen-
tivos, veiculados por inúmeros meios de comu- te, porque é naturalmente imperfeito. Porque tada, de braços abertos e, se sentirmos dor, an-
nicação, que os levam, muitas vezes, a ter mais cresce à medida que o tempo passa, amadurece gústia ou algum tipo de receio, lembremo-nos
dúvidas do que certezas. Para já não falar do com os desafios que a vida nos impõe e fortale- que o que importa é o amor que sentimos por
“bicho papão” chamado trauma. ce-se com os laços que se criam com verdade, aquele ser tão especial, que surgiu nas nossas
Onde devia imperar o amor, impera o medo, empatia, aceitação e compromisso. vidas para nos melhorar enquanto pessoas.
a raiva e a frustração. Um sentimento de im- Sermos verdadeiros, aceitarmos as limitações A parentalidade, tal como a vida ou a felicidade,
potência, perante uma perfeição inalcançável, e as diferenças, desenvolvermos a empatia e é um caminho que se percorre em conjunto,
vivida em permanente angústia e sofrimento. comprometermo-nos connosco próprios e com com todas as falhas, limitações, conquistas e
É de suma importância relembrar que a fun- o outro é meio caminho andado para criar seres fracassos. É isso que a torna tão única e es-
ção da informação é de esclarecer, mas esta humanos genuínos, seguros e felizes. pecial!
“sangria” na busca da mesma deixa-nos pou- Para vivermos a parentalidade de uma forma
co tempo para reflexão e observação do que mais saudável e menos traumatizante, para nós
realmente importa: as nossas crianças. São e para as nossas crianças, devemos seguir estes
Primos à solta
Helena Faria . Contadora de histórias
Em casa da Tia Carolina e do Tio Afonso tu- nosso verdadeiro banquete, pendurados nos Medo ficava para lá do muro que confinava
do era fino e chique e havia portas fechadas ramos onde nêsperas e cerejas nos maquilha- com a estrada (essa estrada de saída da aldeia
nos dia em que a família se reunia e os primos vam as caras, as mãos e as roupas. Aí era a e que me fez perguntar pela vida fora: “onde é
pequenos se encontravam. Era uma espécie verdadeira aventura porque, gente da cidade o fim da estrada?”). Ficava para lá da estrada.
de medicina preventiva para que a nossa ocu- que éramos, podíamos conhecer a Natureza Na floresta do outro lado. No meio da flores-
pação selvagem não atormentasse os cristais, pelos nossos próprios pés. Aí rebolávamos no ta. Numa clareira no meio das árvores velhas.
as pratas e as porcelanas. Sim, eu pertencia chão, tomávamos banho no tanque de rega, Num casebre sujo e em ruínas que nunca víra-
ao grupo dos primos pequenos. Eram primos fazíamos lutas de índios atirando a fruta podre mos mas que imaginávamos e ansiávamos. O
afastados, filhos dos primos da mãe, que vi- do chão uns aos outros, claro que só depois Grande Medo era a casa da bruxa. O Grande
viam em Lisboa e no Porto e que a Tia Carolina de construirmos paliçadas com canas para nos Medo era a Bruxa. Aquela de quem diziam
e o Tio Afonso reuniam no dia do seu aniver- protegermos. Aí deixávamos que o ranho cor- que tinha mais de duzentos e quarenta e três
sário de casamento. resse livremente até à ponta dos lábios antes anos! Aquela que diziam que não tinha cabelo,
Durante esses almoços, os primos pequenos de o limpar na manga do casaquinho de ve- mas uma farripas de pelo em pasta por entre
só permaneciam na mesa o tempo suficiente ludo, esfolávamos os joelhos e esquecíamos as crostas da cabeça! Aquela que tinha esca-
para emborcar duas colheres de sopa, umas as lágrimas da dor dos arranhões. Caíamos e mas na pele dos braços e das pernas e que se
garfadas de arroz (à valenciana) e uma enor- voltávamos a levantar. Era assim durante uma vestia com os restos de um saco de batatas!
me fatia de bolo. Depois, saíamos da grande tarde inteira uma vez por ano. Aquela que só tinha dois dentes e que quando
sala de jantar, corríamos corredor fora, atra- Não foram raras as vezes em que voltámos abria a boca deitava um cheiro que era capaz
vessávamos a fronteira do portão (à socapa), para casa em corrida desenfreada, a gritar de de matar um touro! Aquela que comia olhos
atravessávamos a estrada (proibida) e adentrá- susto, por nos depararmos com alguma vaca de sapo e fazia unguentos e punha o mau
vamo-nos pelos campos de erva alta, alheios ou alguma cabra a pastar. olhado às pessoas que apareciam doentes
às carraças e às cobras que aí habitavam. Mas o Grande Medo não era ali, a uma escas- de repente! Aquela que nos comeria (se nos
Então trepávamos às árvores e comíamos o sas centenas de metros da aldeia. O Grande apanhasse!). Aquela!
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