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4 Formas de Niilismo - UM DIAGNÓSTICO NIETZSCHEANO

Razão inadequada

O que eu narro é a história dos próximos dois séculos […] descrevo aquilo que vem: a
ascensão do niilismo. Posso descrevê-lo porque aqui se passa algo necessário – os sinais
disso estão por toda parte; faltam apenas os olhos para tais sinais. Aqui, não louvo, nem
censuro, que ela venha; creio numa das maiores crises, num instante da mais profunda
autorreflexão do homem”– Nietzsche, Fragmentos Póstumos 1887

FORMAS DE NIILISMO
Como negar a vida? Ou melhor, como fazer da negação uma forma de vida?
O niilismo é nossa lenta caminhada em direção ao abismo. O niilista é o acusador: dos
outros, de si, da existência, de tudo. Enquanto o sacerdote, o utópico, o sonhador, o
crente, o fascista, o iludido, são aqueles que criam ficções para justificar suas acusações
a este mundo e assim tornar a vida mais (in)suportável. Pobres negadores, eles preferem
querer o nada a nada querer! Ou seja, o niilista quer viver, mas só pode fazê-lo de modo
doentio, impotente, estendendo uma grande cortina negra sobre a realidade para não
encará-la.
O que significa Niilismo? Que os valores supremos se desvalorizam”– Nietzsche,
Fragmentos Póstumos 1887

Nietzsche mergulhou na doença europeia para entender o niilismo até sua medula.
Platão, Kant, Schopenhauer e outros conseguiram ir longe, mas apenas o filósofo do
martelo retornou com saúde, mais forte, e capaz de criar valores dentro deste Plano de
Imanência.
Esta é a questão! Transvalorar o niilismo, se utilizar dele como meio para tornar-se mais
potente! É preciso filosofar à sombra do niilismo, sem se afogar em suas águas
traiçoeiras, só podemos superar o niilismo dentro dele.
Se o filósofo alemão diagnosticou seu tempo, foi Deleuze quem posteriormente lendo
sua obra sistematizou suas proposições em quatro formas de niilismo:
Niilismo Negativo: Aqui, nega-se o mundo em nome de outros valores. Mas o niilista
engana a si próprio, ele nunca diz negar o mundo, pelo contrário, ele se diz afirmando
Deus, uma utopia, o que quer que seja. Divisão de dois mundos, um debaixo: sensível,
mutável, corporal, imperfeito, temporal; outro suprassensível: imutável, ordenado,
perfeito, atemporal. O niilista negativo cria outros mundos para poder suportar este.
Este mundo é ruim, portanto, o niilista deve provavelmente ser o escolhido de Deus (um
deus dos fracos, oprimidos, que sofrem), esta é a figura do ressentimento;
Niilismo Reativo: O homem iluminista e racional não nega o niilismo negativo, ele dá
um passo adiante: a morte de Deus. Ah, somos todos ateus! Sim, matamos Deus e ele
mereceu, mas agora o homem é sagrado. Viva os direitos do homem! De que adianta? O
além agora é o futuro, “no dia da revolução todos serão redimidos“. Trabalhe por um
mundo melhor, sirva à sociedade, faça o bem para os seus filhos. A ciência dará todas as
respostas. Enfim, ainda somos religiosos, o homem matou a verdade fora deste mundo,
mas ainda acredita numa verdade metafísica neste mundo, um mundo melhor por vir.
Niilismo Passivo: Aos poucos, a Vontade de Potência se esgota no niilismo, ela vaza,
escoa, procura afirmar-se em outros lugares. O homem cada vez mais doente tem cada
vez menos capacidade de afirmar-se. O niilismo passivo é o dos últimos dos homens
(Zaratustra, parte IV). “Onde está o mar para que eu possa me afogar?“, mas o mar
secou! Estamos chegando perto do fim… a chama se apaga, surge a escuridão sem fim.
Mortos-vivos, não encontram vida dentro de si (mesmo ela estando lá), mas ainda se
movem… perdidos… entorpecidos.
Niilismo Ativo: Por fim, a última forma de niilismo nega a si mesma e se torna ativa!
Há um rompimento, uma enorme mudança na capacidade de valorar. Se destruir
ativamente, eis o objetivo! Destruir o niilismo dentro de si! Como podemos acelerar a
roda do devir? Negando as forças de negação. O que vem depois do homem moderno?
O que está além do homem? Para isso é necessário criar novos valores!
Filósofos Niilistas
Se toda filosofia é pensada por um corpo, ou seja, é secreção de um estado de saúde,
além da pergunta anterior, precisamos pensar também: como viver à sombra do
niilismo? Esta é uma pergunta difícil de responder, pois cada um pode reagir de uma
maneira. Ou seja, o niilismo tem seus personagens.
Sendo assim, veremos que alguns filosofam por desespero, patologia, indigência,
procurando apoio e tranquilidade. Chamaremos estes de niilistas fracos: eles procuram
descanso, céu, eternidade. Já outros filosofam por saúde transbordante, luxo, adorno,
abundância, excesso. Chamaremos estes de niilistas fortes: pois descansam apenas como
meio para novas lutas!
Estes estados de saúde são a porta de entrada para entendermos nosso mundo e a nós
mesmos! Deste modo, Nietzsche nos convida a percorrer toda a geografia da alma
humana, como bons psicólogos, para encontrar as forças que nos habitam e encontrar os
modos de se viver neste mundo. Desta maneira, vemos como o niilismo é o solo de
onde nascem várias filosofias! Nossos personagens serão: Platão, Kant, Schopenhauer e,
claro, o próprio Nietzsche. Cada um enfrenta o niilismo à sua maneira, e cada qual
encontra as suas soluções.
UM MODO DE VIDA
O niilismo é uma maneira de viver e de encarar a vida. Toda filosofia pode ser vista,
segundo Nietzsche, como uma maneira de viver e, segundo Deleuze, de resolver
problemas. Ele será nosso palco, os filósofos serão os atores enquanto os conceitos
serão ferramentas. Podemos pensar em uma enorme arena onde lutadores empunham
armas para enfrentar um problema imposto pelo próprio ato de existir: “como viver à
sombra do niilismo?”. Encontraremos aqui modos de valorar que dizem respeito à
capacidade de cada um habitar este Plano de Imanência e enfrentar suas condições
inóspitas. Eis os personagens:
Personagens da Afirmação
Os filósofos acima são os melhores exemplos dos tipos niilistas. Platão, negativo por
excelência; Kant, fundamentalmente reativo; Schopenhauer, passivo em matéria de
desejo; e Nietzsche, pensando a partir do niilismo. Gostando ou não, eles são os
avatares do niilismo, expressão de uma linha que atravessa a história do homem.
Poderíamos encerrar aqui a análise, mas é possível dar ainda mais um passo.
Deleuze abre a interpretação do niilismo – que Nietzsche tinha dividido apenas em fraco
e forte – em quatro formas, mas ele não para aí. Ele segue pensando quais são os
personagens que Nietzsche move para dar conta dos conceitos que propõe. Toda
filosofia é animada por personagens conceituais que povoam os planos e os percorrem
aceleradamente, explorando suas alturas e profundezas. Sendo, eles mesmos, a
personificação dos conceitos. Precisamos conhecer bem quais destes personagens são
verdadeiramente afirmativos.
É neste sentido que direcionamos o final desta série. Eles não são meros símbolos, são
os mais importantes personagens conceituais da filosofia nietzschiana, são os que dizem
Sim. O fundamental é entender qual é o Sim de cada um deles, pois nem todo Sim é
afirmativo e nem toda afirmação se equivale. Ao final, teremos colocado as condições
próprias àqueles que querem um Sim luminoso e uma afirmação radiante.
Nietzsche e Deleuze: O que é Niilismo?

O niilismo é um de nossos maiores desafios. Mas afinal, como enfrentá-lo sem encará-
lo de frente? Sim, muitos fugiram, mas nós precisamos ter coragem o bastante para
fazer isso. Foi exatamente esta a atitude de Nietzsche e Deleuze. O primeiro como
fisiopsicólogo, capaz de ver os sintomas do niilismo à nossa volta, o segundo como
sistematizador da obra e dos conceitos nietzschianos. O filósofo alemão foi o primeiro a
mergulhar na doença de seu tempo e fazer um diagnóstico preciso: “o homem prefere
ainda querer o nada a nada querer”. Já Deleuze é capaz de sistematizar o niilismo em
um plano de imanência e mostrar as várias maneiras com que seus personagens criam
conceitos. Nesse curso, partimos da leitura de Deleuze no livro “Nietzsche e a
Filosofia” e passamos pelos seguintes temas:
• Niilismo Negativo: Nega-se o mundo em nome de outros valores, afirmando
Deus, uma utopia, ou o que quer que seja. Divisão de dois mundos, um debaixo:
sensível, mutável, corporal, imperfeito, temporal; outro supra-sensível: imutável,
ordenado, perfeito, atemporal. Platão cria o conceito de Ideia;
• Niilismo Reativo: Sim, matamos Deus e ele mereceu, mas agora o homem é
sagrado. Viva os direitos do homem! De que adianta? Enfim, ainda somos religiosos, o
homem matou a verdade fora deste mundo, mas ainda acredita numa verdade metafísica
neste mundo, uma realidade melhor por vir. Kant cria o conceito de Razão;
• Niilismo Passivo: O homem cada vez mais doente de si mesmo tem cada vez
menos capacidade de afirmar-se. O mar secou! A chama se apagou! Surge uma
escuridão sem fim. Mortos-vivos não encontram vida dentro de si, mas ainda se
movem… perdidos… entorpecidos… seguindo lentamente para o abismo.
Schopenhauer cria o conceito de Vontade;
• Niilismo Ativo: Se destruir ativamente! Destruir o niilismo dentro de si! Como
podemos acelerar a roda do devir? Negando as forças de negação. Afirmando as forças
de afirmação! Nietzsche é o filósofo da morte do homem! Para que? O que vem depois
do homem moderno? Para criar novos valores! Nietzsche cria o conceito de Vontade de
Potência.
Nosso curso tem como objetivo encontrar explicações claras, diagnósticos preciso e
saídas criativas para o niilismo. Seguir seu percurso, olhar fundo para o abismo,
mergulhar em suas águas turvas sem nos afogar. Mas estamos em grande companhia
nesta empreitada, como aliados nós temos Nietzsche e Deleuze. Principalmente na
inovadora interpretação deste último para o filósofo alemão. É importante atualizar os
conceitos e torná-los novamente úteis dentro de nosso modo de vida, faremos isso passo
a passo.
Se o Niilismo é um fato, se não há como olhar para o outro lado, então faremos isso
com a maior rigor e seriedade possíveis. Aprender a filosofar à sombra do niilismo,
viver sem
temê-lo. Somente dentro destas condições seremos capazes de encontrar novos modos
de vida, potentes, criadores!

Bibliografia
DELEUZE. Nietzsche e a Filosofia, Editora n-1
DELEUZE, Nietzsche, Edições 70
KANT, Crítica da Razão Pura, Editora Vozes
NIETZSCHE, Ecce Homo, Companhia das Letras
NIETZSCHE, Gaia Ciência, Companhia das Letras
NIETZSCHE, Crepúsculo dos Ídolos. Companhia das Letras
NIETZSCHE, Assim Falou Zaratustra, Companhia das Letras
NIETZSCHE, O Anticristo e Ditirambos de Dionísio, Companhia das Letras
PLATÃO, A República, Ed. Nova Fronteira
SCHOPENHAUER, Mundo como Vontade e Representação, Ed. Unesp

NIETZSCHE – COMO FILOSOFAR COM MARTELO – 180,00


NIETZSCHE E ESPINOSA – FUNDAMENTOS E COMPARAÇÕES – 360,00
ESPINOSA SUBVERSIVO – 180,00
INTRODUÇÃO À ESQUIZOANÁLISE – 360,00

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