Você está na página 1de 23

Introdução Diabetes melito (DM) é uma endocrinopatia comum em cães, caracterizada pela

deficiência relativa ou absoluta do hormônio insulina. Não é uma doença isolada, e, na maioria
das vezes, é causada por vários mecanismos fisiopatológicos, os quais convergem para um
conjunto de sinais clínicos semelhantes. Nos últimos 10 anos, ocorreu aumento no
conhecimento de fatores primários de diabetes melito e de sua patogênese, embora várias
questões continuem sem resposta. Este capítulo é uma revisão sobre o conhecimento atual,
inclusive da patogênese e do tratamento, com foco particular em achados recentes que têm
um impacto clínico direto. Também é apresentado um protocolo geral para tratamento de
pacientes recentemente diagnosticados; a investigação do cão diabético instável será
abordada no Capítulo 22. Prevalência e epidemiologia A pesquisa mais recente sobre diabetes
na população de cães do Reino Unido indicou taxa de prevalência de DM de 0,32%, com base
nos registros de bases de dados de companhias de seguro (Davison et al., 2005). Maior
incidência de diabetes na população global de cães é sugerida pelo fato de que, nos últimos 30
anos, a proporção de cães diabéticos encaminhados a hospitais veterinários em busca de uma
segunda opinião aumentou de 19 para 64 cães para cada 10.000 pacientes, nos EUA (Guptill et
al., 2003). No entanto, isto também pode estar relacionado com melhores condições de
diagnóstico, com maior frequência de busca por uma segunda opinião do clínico veterinário
antes do tratamento de diabetes, com maior disposição para encaminhar pacientes diabéticos
problemáticos e maior comprometimento dos proprietários de cães diabéticos em procurar
tratamento. Etiologia e classificação da doença Em geral, a insulina é secretada em resposta ao
aumento da concentração de glicose (e aminoácidos) circulante e inibida por vários outros
hormônios, inclusive o glucagon. Como a insulina possibilita que a glicose seja transportada do
sangue às células, a redução na quantidade ou atividade deste hormônio resulta em prejuízo
no controle da concentração sanguínea de glicose e, como consequência, em hiperglicemia.
No animal sadio, a insulina é produzida no pâncreas, um órgão que contém tecidos exócrino e
endócrino. As células exócrinas produzem enzimas, como a tripsina, a qual atua na digestão de
alimentos no intestino delgado. O tecido endócrino, encontrado nas ilhotas de Langerhans
dispersas pelo pâncreas, produz hormônios que são liberados na circulação. As células beta do
pâncreas representam de 60 a 80% de cada ilhota e são responsáveis pela síntese de insulina,
cuja destruição ou disfunção tende a originar diabetes. Outros tipos de células endócrinas
presentes nestas ilhotas são as delta, que secretam somatostatina, e as células alfa, as quais
armazenam glucagon – um hormônio que inibe os efeitos da insulina. As células das ilhotas de
Langerhans podem entrar em exaustão quando houver hiperglicemia persistente, embora
tenham a capacidade de recuperação assim que a concentração de glicose é normalizada. No
entanto, se a lesão das ilhotas se mantiver, ela se torna irreversível, pois as células das ilhotas
pancreáticas não têm capacidade de regeneração. Em ambos, pacientes humanos e caninos, o
diabetes é uma doença multifatorial e acreditase que envolva fatores genéticos (Redondo e
Eisenbarth, 2002; Rand et al., 2004) e fatores ambientais, como dieta e microrganismos
infecciosos (Fleeman e Rand, 2001; Hoenig, 2002; Catchpole et al., 2005). Como várias
enfermidades ocasionam diabetes em cães, são propostos vários sistemas de classificação da
doença, porém nenhum deles é universalmente • • • • • • ° ° • aceito em medicina
veterinária. Em pacientes humanos, inicialmente o diabetes foi classificado como doença
insulinodependente (IDDM) e doença não insulinodependente (NIDDM), considerandose a
necessidade de o paciente receber terapia com insulina exógena; entretanto, atualmente esse
sistema foi substituído pela classificação com base na fisiopatologia. A classificação que
considera a dependência de insulina não é útil no paciente canino, uma vez que todos os cães
diabéticos tornamse dependentes de insulina, com poucas exceções (Catchpole et al., 2005).
Portanto, a classificação mais útil é aquela que define DM em função da doença primária
(Tabela 12.1) (Catchpole et al., 2005, 2008). Essa classificação também tem relevância clínica,
uma vez que a causa primária do diabetes, por vezes, interfere significativamente no controle
da glicemia, que pode ser razoavelmente esperado. Quatro das mais comuns categorias de
etiologia da doença são discutidas com mais detalhes a seguir. Diabetes melito congênito ou
juvenil em cães Há relatos ocasionais de DM em cães com < 6 meses de idade. A histopatologia
do pâncreas é variável, mas é comum poucas ilhotas serem visíveis e as células beta presentes
apresentarem degeneração ou vacuolização (Minkus et al., 1997). Em um estudo com quatro
cães portadores de DM de início em idade juvenil, notouse que a histopatologia era compatível
com a aplasia congênita de células de ilhotas pancreáticas (Atkins et al., 1979). Relatouse uma
maneira hereditária de diabetes de início em idade precoce caracterizada por abiotrofia de
células beta do pâncreas em cães da raça Keeshond. Estudos de acasalamentos mostraram que
é provável que tal condição fosse decorrente de mutação autossômica recessiva, embora sem
elucidar totalmente a anomalia genética (Kramer et al., 1988). Além disso, em cães jovens com
DM é possível que existam anomalias nos receptores de insulina, embora tal anormalidade
ainda não tenha sido relatada. É comum os cães com DM congênita serem tratados com
sucesso com terapia à base de insulina e, embora a instituição de um bom controle da glicemia
nos animais em crescimento seja desafiadora, não é um procedimento impossível.
Antagonismo hormonal Alguns cães tornamse clinicamente diabéticos devido à presença de
hormônios circulantes, os quais são antagonistas da insulina, e isso tem sido comparado com
ambos, diabetes gestacional e tipo 2, em pacientes humanos. Há relatos de diabetes
gestacional em cadelas (Fall et al., 2008b), porém outro exemplo muito comum de
antagonismo hormonal é a fase do diestro, na qual há predomínio de progesterona em cadelas
não castradas (Eigenmann et al., 1983; Rijnberk et al., 1993). As cadelas são monoéstricas não
sazonais; após o cio todas as fêmeas normais entram na fase lútea (diestro), que dura cerca de
60 dias. Assim como há um efeito diabetogênico potencial da progesterona durante o diestro,
por um mecanismo fisiológico único em cadelas, o hormônio do crescimento, sintetizado nas
glândulas mamárias e liberado na circulação, também neutraliza a ação da insulina. Isso resulta
na intolerância à glicose, que tende a progredir para diabetes evidente em algumas pacientes.
Embora, teoricamente, a ováriohisterectomia imediata possa resultar em cura clínica destes
animais, as células beta, por vezes, desenvolvem exaustão irreversível, casos nos quais há
necessidade de terapia contínua com insulina exógena. Tabela 12.1 Classificação veterinária
proposta para diabetes melito em cães. Diabetes por deficiência de insulina Em
cães,adeficiênciadeinsulinasecaracterizapelaperdadecélulasbetadopâncreas.
Atualmente,aetiologiadadeficiência/destruiçãodecélulasbetaem cães
diabéticosédesconhecida, masacreditaseque hajaenvolvimentodeváriasdoenças:
Hipoplasia/abiotrofiacongênitadecélulasbeta Perdadecélulasbetaassociadaàpancreatite
Destruiçãoimunomediadadecélulasbeta
Intoxicaçãoporglicose/exaustãodecélulasbetacomoconsequênciaderesistênciaàinsulinaprolong
ada(verposteriormente) Diabetes resistente à insulina Em
geral,aresistênciaàinsulinasedeveàinibiçãodafunçãodestaporoutros hormônios; também
podeserexacerbadapor infecçãoouinflamação Diabetes nodiestro Outras
formasdeantagonismo hormonal: Secundárioa hiperadrenocorticismo
Secundárioàacromegalia(raro) latrogênica: ° ° • • Glicocorticoides sintéticos Progestágenos
sintéticos Intolerânciaacarboidratoassociadaàobesidade Defeito noreceptordeinsulina,
comoaconteceem pacientes humanos, também ocorreem cães com diabetes,emboraatéagora
nãotenhasidorelatado nenhum caso Também é difícil obter o controle da glicemia com terapia
de insulina em cadelas não castradas e com diabetes, devido aos graus variáveis de resistência
à insulina durante o ciclo estral. Portanto, recomendase a castração de todas as fêmeas
caninas, tão logo possível após o diagnóstico de diabetes. Além disso, relatase que a piometra,
em fêmeas não castradas, e a obesidade, em cães mais velhos, estejam igualmente associadas
a hiperinsulinemia e intolerância à glicose, embora em cães não haja relato de diabetes em
decorrência, diretamente, da obesidade (Matheeuws et al., 1984). Outro hormônio antagônico
da insulina é o cortisol, um hormônio corticosteroide produzido no córtex da adrenal. Os cães
com hiperadrenocorticismo, que é, em geral, associado a tumor de glândula pituitária ou de
adrenal, apresentam alta concentração sérica de cortisol e estão sujeitos a diabetes
concomitante (Hess et al., 1993). Testes da função endócrina do pâncreas em cães não
diabéticos com hiperadrenocorticismo indicaram altas concentrações séricas de insulina, antes
e após teste de estimulação com glucagon por via intravenosa (IV) (Montgomery et al., 1996).
Teoricamente, o diabetes causado por hiperadrenocorticismo pode ser transitório e a
homeostase da glicose do paciente tende a retornar ao normal assim que a doença primária é
adequadamente controlada (Hoenig, 2002). No entanto, em geral, os cães diabéticos e com
hiperadrenocorticismo bem controlado ainda necessitam de terapia com insulina; no caso de
hiperadrenocorticismo mal controlado, com frequência há necessidade de maior dose de
insulina. Em cães, a prevalência de diabetes ocasionado por antagonismo hormonal é incerta,
uma vez que o diagnóstico de vários casos de hiperadrenocorticismo pode ser negligenciado e
a quantidade de fêmeas caninas não castradas no Reino Unido tem diminuído devido ao
aumento de procura por castração eletiva. Um estudo relatou que 34% de todos os cães
diabéticos encaminhados à University of Glasgow Veterinary School apresentavam
hiperadrenocorticismo ou diabetes de diestro (Graham, 1995). Relatase que, em um grupo de
221 cães diabéticos atendidos na University of Pennsylvania, 50 cães (22%) apresentavam
evidência de disfunção adrenocortical concomitante (teste de estimulação do ACTH e/ou teste
de supressão com baixa dose de dexametasona anormal) (Hess et al., 2000a). Em outro estudo
envolvendo 60 cães com hiperadrenocorticismo, notouse que 23 deles apresentavam
hiperglicemia com hiperinsulinemia moderada a grave e que 5 manifestavam DM evidente,
com deficiência relativa de insulina (Peterson et al., 1984). Um modo pelo qual é possível
avaliar a resistência à insulina e, como consequência, a “reserva” pancreática em cães
recentemente diagnosticados com suspeita de antagonismo hormonal é o teste de
estimulação com glucagon IV (Montgomery et al., 1996; Watson e Herrtage, 2004; Fall et al.,
2008a). Este teste avalia o teor sérico de insulina ou do peptídio C da insulina (secretado com a
insulina endógena e não apresenta reação cruzada com a insulina injetável no teste de
insulina), secretado em resposta ao teste com uma dose IV de glucagon. A resposta subnormal
indica depleção pancreática e deficiência de insulina, enquanto a resposta supranormal,
especialmente em um animal com hiperglicemia, implica resistência à insulina devido ao
antagonismo hormonal. Pancreatite Cada vez mais, está claro que a inflamação do tecido
pancreático exócrino também provoca lesão às células beta e, como decorrência, diabetes
melito insulinodependente. Em cães, a pancreatite se manifesta de maneira aguda,
caracterizada por vômito e dor abdominal, ou crônica, cujo diagnóstico pode ser mais difícil em
razão de seus sinais clínicos mais discretos. Quando há inflamação do pâncreas, os precursores
das enzimas digestivas (p. ex., tripsinogênio) são clivados mais nas células acinares
pancreáticas do que no intestino delgado, de modo que as enzimas ativas (p. ex., tripsina) são
liberadas no pâncreas e provocam lesão tecidual local. Essas enzimas são controladas por
proteases, como a α2 macroglobulina, as quais estão ausentes no paciente com pancreatite.
Acreditase que as cadelas obesas e mais velhas de raças de pequeno porte e as da raça Spaniel
sejam mais predispostas à pancreatite. No entanto, não se conhece a razão pela qual alguns
animais manifestam pancreatite aguda enquanto outros desenvolvem pancreatite crônica
(Watson et al., 2007). De modo semelhante, ainda não foi esclarecido por que alguns cães com
pancreatite desenvolvem diabetes ao passo que outros apresentam boa tolerância à glicose.
Achados preliminares indicam que alguns cães com pancreatite crônica apresentam menor
função de células beta no teste de estimulação do glucagon (Watson e Herrtage, 2004); em
alguns pacientes, é possível que os sintomas de diabetes sejam os primeiros sinais de
pancreatite subclínica de baixo grau. O diagnóstico de pancreatite tem importante impacto
clínico em um paciente diabético, uma vez que pode indicar maior dificuldade em conseguir
bom controle da glicemia em cães, nos quais o diabetes é decorrência de pancreatite. Em
1971, um estudo relatou que 6 entre 10 cães diabéticos examinados após a morte
apresentavam evidência histológica de pancreatite (Cotton et al., 1971) e que o prognóstico
dos cães com evidência clínica ou bioquímica de pancreatite, além do diabetes, era pior. Em
outro estudo, demonstrouse maior prevalência de pancreatite aguda e crônica em pacientes
diabéticos não sobreviventes, em comparação com cães diabéticos bem controlados, os quais
foram submetidos à eutanásia por outras razões (Ling et al., 1977). Mais recentemente, foi
relatada evidência de pancreatite no perfil bioquímico ou no exame histopatológico em 28 a
40% dos cães diabéticos (Alejandro et al., 1988), e estudos histopatológicos pósmorte sugerem
que a prevalência de pancreatite crônica na população canina, como um todo, pode ser
subestimada pelos clínicos (Watson et al., 2007). Outra potencial implicação clínica importante
da pancreatite crônica é o desenvolvimento de insuficiência pancreática exócrina (IPE), na qual
má digestão e má absorção do alimento dificultam muito o controle do diabetes e ocasionam
perda de peso grave. Facilmente, pode ocorrer falha no diagnóstico, caso a doença pancreática
exócrina não tenha sido previamente detectada. Em um estudo (Watson, 2003), verificou se
que 2 de 4 cães com pancreatite crônica confirmada manifestaram diabetes concomitante,
notado após o desenvolvimento de IPE. Esta progressão é semelhante àquela constatada em
pacientes humanos, nos quais o diagnóstico de pancreatite crônica tipicamente antecede o
desenvolvimento de IPE, por vários anos; em geral, o diabetes é manifestado mais tardiamente
na doença do que na IPE. A relação entre diabetes, pancreatite e doença pancreática exócrina
é complexa, com características histopatológicas variáveis (Figura 12.1). Figura 12.1 Corte
histopatológico do pâncreas de um cão com diabetes e pancreatite crônica concomitante.
Macroscopicamente, havia pouco tecido pancreático remanescente e, histologicamente, há
muito pouco tecido exócrino. Notamse alguns resquícios de tecido de ilhota pancreática
(marromescuro) neste corte submetido à coloração imunohistoquímica para sinaptofisina
(clone de rato monoclonal antihumano SY38). Este paciente era totalmente dependente de
insulina, apesar da presença de algum tecido de ilhota, o que sugere que a doença exócrina
também interferiu na função da ilhota do pâncreas. (Aumento original de 40×.) (Cortesia da
Dra. Penny Watson, University of Cambridge.) Uma das dificuldades para determinar a
prevalência de inflamação pancreática aguda ou crônica em cães com diabetes é a
sensibilidade e a especificidade limitadas dos exames complementares disponíveis. Além disso,
a pancreatite crônica pode ser praticamente assintomática e os vários sinais clínicos de
pancreatite aguda (p. ex., letargia e vômito) por vezes são atribuídos, erroneamente, a outras
enfermidades, inclusive cetoacidose diabética. Por esta razão, apesar de sua importância
potencial no prognóstico, os testes para doença pancreática exócrina raramente são realizados
por ocasião do diagnóstico de DM em cães. Marcadores bioquímicos séricos para pancreatite
incluem amilase e lipase, as quais são comumente elevadas na inflamação pancreática. Várias
outras condições influenciam o teor sérico de amilase e lipase, inclusive a função renal, de
modo que é possível o aumento falsopositivo. Além disso, algumas vezes, é útil a mensuração
da imunorreatividade semelhante à tripsina canina (TLI canina) que, com frequência,
encontrase aumentada nos casos de inflamação pancreática ativa; no entanto, a concentração
sérica nem sempre está relacionada com a gravidade da doença (Mansfield et al., 2003). Além
disso, a combinação de insuficiência pancreática exócrina (TLI diminuída) e inflamação
pancreática aguda (TLI aumentada) tende a resultar em valor de TLI no intervalo de referência.
Tem sido proposta a imunorreatividade da lipase pancreática canina (cPLI) como um marcador
mais específico e sensível de inflamação pancreática aguda; sua mensuração deve ser
recomendada para todos os pacientes recentemente diagnosticados com diabetes. Em um
estudo com pequeno número de cães diabéticos, sem sinais clínicos de pancreatite por ocasião
do diagnóstico, detectouse concentração de cPLI acima do intervalo de referência em 5 dentre
os 30 pacientes, embora nenhum deles apresentasse valor acima do limite para diagnóstico de
pancreatite (Davison et al., 2003a). Também, em alguns casos, o exame ultrassonográfico é
eficaz, porém a sensibilidade e a especificidade desta técnica são variáveis, dependendo, em
grande parte, da habilidade do executante. O padrãoouro para o diagnóstico de pancreatite é
a biopsia do pâncreas; contudo, é um procedimento invasivo e difícil de justificar,
particularmente quando há risco de não obter amostra de lesão inflamatória focal, limitada a
uma porção do órgão. Autoimunidade Como os cães diabéticos, quase sem exceção, são
dependentes de insulina, historicamente acreditavase que a DM canina tivesse a mesma
patogênese autoimune primária do diabetes tipo 1 de pacientes humanos. Como já discutido
anteriormente, a pancreatite crônica e o antagonismo hormonal sabidamente são
responsáveis pelo desenvolvimento de diabetes em alguns cães; contudo, em outros cães, é
possível que ocorra destruição autoimune de células beta, embora a evidência para isto seja
menos convincente do que nos modelos da doença em humanos e em roedores. O diabetes
melito (DM) humano tipo 1 (insulinodependente, com início em idade juvenil) é caracterizado
por infiltração linfocitária nas ilhotas pancreáticas, conhecida como “insulite”, bem como pela
presença de autoanticorpos contra proteínas pancreáticas no soro (inclusive insulina, ácido
glutâmico decarboxilase 65 [GAD65] e antígeno 2 do insulinoma [IA2]), antes do
desenvolvimento dos sinais clínicos (Taplin e Barker, 2008). Nos cães, há relato de infiltração
linfocitária nas ilhotas pancreáticas em pequeno número de casos (Alejandro et al., 1988); no
entanto, em geral, estudos de tecido pancreático em cães com diabetes têm mostrado
alterações patológicas heterogêneas variáveis. Há algumas evidências da presença de
anticorpos contra células beta no soro de alguns cães diabéticos, sugerindo que um
mecanismo imunomediado possa ser responsável pela destruição de células beta em alguns
casos (Haines e Penhale, 1985). Atualmente, não se sabe a especificidade do antígeno de
qualquer resposta autoimune em cães diabéticos, embora um trabalho recente tenha sugerido
que um pequeno número de cães diabéticos apresenta autoanticorpos contra GAD65, IA2 e
insulina semelhantes àqueles verificados no diabetes tipo 1 humano (Davison et al., 2008). O
aumento crescente potencial da ocorrência de diabetes em cães é outra semelhança com o
diabetes tipo 1 humano. No Reino Unido e nos EUA, demonstrouse um padrão sazonal no
diagnóstico de DM em cães, que corresponde ao maior número de casos de diabetes tipo 1 no
inverno, em pacientes humanos (Atkins e MacDonald, 1987; Davison et al., 2005). Esta
similaridade no início da doença, entre as espécies, induziu à especulação de que os fatores
ambientais primários envolvidos na ocorrência da doença tendem a ser semelhantes. Sugeriu-
se que tais fatores ambientais desencadeadores têm natureza sazonal como, por exemplo,
infecções virais que predominam nos meses de inverno. Outros fatores incriminados na
ocorrência de diabetes em humanos, e que também surgem no desenvolvimento de DM em
cães, incluem alterações da dieta, conteúdo corporal de vitamina D, obesidade, inatividade e
alteração climática. A idade de início do DM em cães, que tem relação com a “meiaidade”, é
uma das características do diabetes em cães que é diferente do diabetes tipo 1 em pacientes
humanos, o qual, em geral, é diagnosticado em crianças. Portanto, alguns autores (Fleeman e
Rand, 2001; Catchpole et al., 2005) sugerem que o diabetes em cães é mais parecido com o
DM tipo 1 humano com início em idade mais avançada, conhecido como diabetes autoimune
latente do adulto (LADA). Quadro clínico Dados gerais Idade Em geral, o diabetes é uma
doença de cães de meiaidade ou mais idosos, comumente diagnosticado entre 5 e 12 anos de
idade, embora haja alguns relatos da enfermidade em pacientes em idade tão jovem quanto 6
meses (Davison et al., 2005). Raça Na pesquisa mais recente sobre diabetes no Reino Unido,
notouse maior ocorrência da doença em cães das raças Labrador Retriever, Colly e Yorkshire
Terrier, bem como em animais mestiços (Davison et al., 2005). No entanto, como não há um
sistema de registro obrigatório de cães, é difícil calcular a prevalência em cada raça, na
população de cães do Reino Unido. Portanto, não é possível saber se estes dados indicam
aumento verdadeiro do risco de diabetes ou simplesmente refletem a popularidade dessas
raças. O exame do banco de dados de cães com apólices de seguro (Cortesia de PetProtect UK)
sugere que a proporção relativamente alta em algumas raças, na população diabética (p. ex.,
Labrador Retriever), pode simplesmente refletir sua popularidade. Por outro lado, outras raças
(p. ex., Cavalier King Charles Spaniel, Tibetan Terrier, Samoieda e Cairn Terrier) realmente
parecem ser mais acometidas, na população diabética, em comparação com a população geral
de cães. Também é interessante notar o número relativamente baixo de casos em algumas
raças populares, dentre a população diabética, como Pastoralemão, Boxer e Golden Retriever,
o que demonstra que tais raças são menos suscetíveis ao desenvolvimento de diabetes. Em
uma pesquisa recente realizada nos EUA, comparouse a quantidade de cães acometidos em
relação ao número de caninos não diabéticos da mesma • • • • • • • • • • raça atendidos em
um hospitalescola veterinário; concluiuse que as raças Samoieda, Schanauzer miniatura e
Poodle miniatura apresentaram maior predisposição ao diabetes (Hess et al., 2000a). É
possível que a associação entre raça e ocorrência da doença reflita os fatores de risco
genéticos primários. Diabetes tipo 1 humano tem forte associação genética aos genes que
codificam as proteínas classe II do MHC, envolvidas na apresentação do antígeno ao sistema
imune (Todd et al., 1987). Em estudos genéticos recentes sobre diabetes em cães, verificamos
que alguns alelos do MHC (que codificam proteínas do antígeno leucocitário de cão [DLA])
estão associados a maior risco de diabetes em algumas raças (Kennedy et al., 2006). Além
disso, foram identificados alguns polimorfismos em outros genes da resposta imune que
contribuem com o risco de diabetes em algumas raças (Short et al., 2009). Considerados
juntamente, em alguns casos de DM em cães estes achados implicam descontrole da resposta
imune, embora vários outros mecanismos e genes de suscetibilidade ainda devam ser
identificados. Sexo Historicamente, relatase predisposição de fêmeas caninas a diabetes. Em
pesquisas iniciais, notouse que cerca de 70% dos cães com diabetes eram fêmeas (Marmor et
al., 1982); contudo, em pesquisas mais recentes, a predisposição das fêmeas é menos evidente
(Davison et et al., 2005). Acreditase que esse fato seja mais possivelmente relacionado com
maior tendência em fêmeas castradas, o que leva à redução no número de casos de diabetes
como resultado do antagonismo da insulina durante a fase do diestro, na qual há predomínio
de progesterona. Sinais clínicos A maioria dos cães diabéticos encontrase “bem” por ocasião
da consulta, sendo as principais queixas do proprietário poliúria, polidipsia e perda de peso. Os
sinais clínicos comuns de diabetes estão resumidos na Tabela 12.2. Tabela 12.2 Sinais clínicos
de diabetes melito. Comuns Possíveis Poliúria Polidipsia Perdadepeso Debilidade muscular
Polifagia Catarata Odordecetona noarexpirado Hepatomegalia Baixatolerânciaaexercício
Infecçõesbacterianas recorrentes Polidipsia e poliúria A polidipsia é secundária à poliúria, que
também tende a ocasionar sinais de micção inapropriada, especialmente quando há infecção
do trato urinário secundária. A poliúria surge quando a concentração sanguínea de glicose
excede o limiar renal para reabsorção (12 a 14 mmol/ℓ) e, como consequência, notase glicose
na urina. Isto tem um profundo efeito na diurese osmótica. Polifagia Grande número de cães
diabéticos também apresentam polifagia, pois há necessidade de insulina para a atividade
adequada do centro de saciedade, no hipotálamo, que está envolvido na determinação do
apetite do cão. Perda de peso Ocorre perda de peso, em parte, devido à glicosúria, mas
também em razão de alterações metabólicas resultantes de células “famintas” por glicose
(visto que não há insulina para permitir a entrada de glicose nas células). O corpo mobiliza
reservas de gorduras e proteínas (músculos) para a gliconeogênese, condição que causa perda
de peso e provoca hiperlipidemia, lipidose hepática (hepatomegalia) e definhamento
muscular. Em geral, a progressão dos sintomas é razoavelmente rápida, mas, em alguns raros
casos, a doença tem início gradativo, e o primeiro sinal notado por alguns proprietários é o
surgimento, aparentemente “agudo”, de catarata (ver posteriormente). Pequeno número de
cães apresenta indisposição aguda, com cetose ou cetoacidose, especialmente quando há
complicações secundárias, como pancreatite ou infecção do trato urinário. Esses pacientes,
por vezes, manifestam colapso, taquipneia (acidose), odor de acetona (no ar expirado) e
histórico de anorexia e vômito. A cetoacidose deve ser considerada uma emergência e requer
tratamento intensivo imediato, o qual é discutido, com detalhes, no Capítulo 24. • • ° ° ° ° • ° °
° ° • • • ° • ° ° ° ° • ° ° • Diagnóstico Em geral, o diagnóstico de diabetes melito em cães é
obtido ao empregarse uma combinação de sinais clínicos e de documentação de ocorrência de
hiperglicemia em jejum persistente (> 14 mmol/ ℓ), com glicosúria. Hiperglicemia e glicosúria
podem ser ocasionadas por diversas síndromes clínicas; a lista de diagnósticos diferenciais é
mostrada na Tabela 12.3. É comum a realização de diversos outros testes para auxiliar no
diagnóstico e na determinação da causa primária. Tabela 12.3 Diagnósticos diferenciais para
hiperglicemia e glicosúria. Hiperglicemia Estresse(até14a15 mmol/ℓ) Latrogênica:
Tratamentocom glicocorticoides Tratamentocom progestágenos Fluidoterapiaintravenosacom
soluçãocontendoglicose Sedativosalfa2 agonistas Antagonismo hormonal:
Hiperadrenocorticismo Diestro Feocromocitoma Acromegalia(rara) Diabetes melito Glicosúria
(limiar renal: 12 a 14 mmol glicose/ℓ) Estresse Latrogênica: Fluidoterapiaintravenosa(IV) com
soluçãocontendoglicose Disfunçãotubular renal: SíndromedeFanconi Glicosúriarenalprimária
Insuficiênciarenal Nefrotoxinas Fatoresqueinterferem noteste: Presençadeglicose
nofrascodecoletadeurinautilizadopeloproprietário(p.ex., frascodegeleia) VitaminaCoupigmento
naurinapodeinfluenciaros resultadosdatirareagente Diabetes melito Achados
clinicopatológicos de rotina Em pacientes com suspeita de diabetes, os exames hematológicos
e bioquímicos séricos de rotina podem ser úteis para definir se há qualquer doença
concomitante e confirmar o diagnóstico. Anormalidades bioquímicas comuns no diabetes
incluem hipercolesterolemia e hipertriacilglicerolemia (hipertrigliceridemia), resultantes da
mobilização de reservas de gordura e da perda de inibição da lipase sensível ao hormônio do
tecido adiposo. É provável que um quadro de lipemia grave interfira nos testes bioquímicos e,
assim, prefirase amostra de sangue obtida em jejum. Alterações gordurosas secundárias no
fígado também induzem elevações discretas, moderadas ou graves persistentes nas atividades
das enzimas hepáticas, como fosfatase alcalina (ALP) e alanina aminotransferase (ALT). É
incomum a constatação de alterações hematológicas marcantes em pacientes diabéticos,
embora, em alguns casos, seja possível detectar leucograma de estresse (linfopenia e
neutrofilia com neutrófilos maduros). Ocasionalmente, constatase elevação do hematócrito,
compatível com desidratação; no entanto, em outros casos, notase anemia não regenerativa
discreta, comum em doença crônica. Mensuração da glicose sanguínea É muito importante
que todo equipamento utilizado para a mensuração da glicose sanguínea em um paciente
diabético seja o mais confiável possível. Historicamente, temse empregado medidor de glicose
sanguínea projetado e calibrado para sangue capilar de pacientes humanos, para a dosagem
de glicose no sangue venoso de pacientes veterinários. Há vários aparelhos disponíveis, muitos
testados para verificar a confiabilidade em sangue de cães, com resultados variáveis. O
aparelho mais apropriado é aquele que permite boa manutenção, que é regularmente
calibrado contra outro aparelho ou com um teste padrãoouro de laboratório externo, o qual
aspira um volume de sangue adequado para a câmara de mensuração. Equipamentos sem
manutenção apropriada, que são raramente utilizados ou que se baseiem em uma “mancha”
de sangue depositada em uma tira reagente que é introduzida no aparelho tendem a ser
menos confiáveis. Além disso, no Reino Unido, atualmente, há disponibilidade de glicosímetros
veterinários específicos, inclusive com calibrador para controle, apropriados para amostras de
sangue de cães e gatos, que são mais confiáveis (Figura 12.2). Também, pode haver variação
individual entre glicosímetros do mesmo tipo; assim, quando são realizadas repetidas
mensurações, aconselhase o uso do mesmo glicosímetro para todas elas, de modo que a
concentração sanguínea de glicose seja mais apropriadamente avaliada. Figura 12.2 A.
Glicosímetro humano que aspira o volume correto de sangue para um teste em um cartucho
descartável. B. Novo glicosímetro disponível especificamente para o exame de sangue de
espécies veterinárias. © Abbot Animal Health. Exame de urina Em cães diabéticos, é
importante realizar exame de urina, principalmente para confirmar a presença de glicosúria,
mas também para verificar evidência de infecção do trato urinário concomitante. Além da
avaliação de hematúria, pH, proteinúria e cetonúria com o uso de tira reagente, sempre deve-
se examinar o sedimento urinário a fim de pesquisar a presença de inflamação ou infecção
bacteriana. Os pacientes diabéticos são particularmente suscetíveis a infecções, visto que alta
concentração de glicose na urina favorece o crescimento de bactérias. Os sinais clínicos de
infecção do trato urinário são muito parecidos com aqueles de diabetes melito, de modo que
facilmente negligenciase a possibilidade de infecção potencial durante a obtenção do
histórico. Sem tratamento adequado, a infecção bacteriana do trato urinário leva à resistência
à insulina e dificulta o bom controle da glicemia; assim, recomendase a realização de cultura
microbiológica e antibiograma de amostra de urina obtida por meio de cistocentese, tanto na
rotina quanto no caso de suspeita de infecção. Qualquer evidência de proteinúria deve ser
monitorada mediante a quantificação de proteína na urina, ao estimarse a proporção
proteína:creatinina urinária. A proteinúria também deve motivar o clínico a mensurar a
pressão sanguínea e a realizar exame de fundo de olho, caso tais procedimentos não tenham
sido realizados como parte do exame clínico geral. Frutosamina e hemoglobina glicosilada
Presença de hiperglicemia, há longo tempo, é confirmada pela mensuração de proteínas
glicosiladas, ou glicadas, do sangue, como frutosamina e hemoglobina glicosilada, as quais se
apresentam elevadas em pacientes diabéticos. Discutidos posteriormente, esses parâmetros
também são utilizados como um guia para o controle de glicemia, uma vez iniciado o
tratamento, em especial em pacientes que resistem a repetidas coletas de sangue para
dosagem de glicose. Frutosamina é o termo utilizado para caracterizar as proteínas
plasmáticas, principalmente a albumina, que sofreu glicosilação não enzimática irreversível em
relação à concentração de glicose que a circunda. Em cães, a concentração sérica de
frutosamina está relacionada com a concentração sanguínea de glicose média em 1 ou 2
semanas anteriores à coleta de sangue; todavia, é influenciada pela taxa de turnover da
proteína plasmática no animal. O termo hemoglobina glicosilada (GHb) é utilizado para
expressar a hemoglobina que se encontra quimicamente ligada à glicose, de modo irreversível,
presente em proporção à concentração de glicose no plasma. Estudos em cães indicam que a
GHb reflete a média da concentração sanguínea de glicose nos 2 a 3 meses anteriores à coleta
de sangue (Jensen, 1995). Atualmente, vários laboratórios veterinários comerciais realizam
testes de frutosamina, os quais são rotineiramente utilizados pela maioria dos clínicos
veterinários; entretanto, atualmente, no Reino Unido, não há teste disponível no mercado
para mensuração de hemoglobina glicosilada em cães. Exames complementares para cetose e
cetoacidose Em todos os pacientes “indispostos”, inapetentes ou recentemente
diagnosticados como diabéticos, sempre se devem mensurar cetonas na urina ou,
preferivelmente, no sangue. É possível obter evidência adicional de cetoacidose por meio de
hemogasometria, com a demonstração de diminuição do pH sanguíneo e da concentração de
bicarbonato no paciente com cetoacidose, como resultado de acidose metabólica. Podese
determinar a presença de cetonas no sangue e na urina de vários modos, em geral ao utilizarse
tira reagente semiquantitativa ou analisador bioquímico. Os corpos cetônicos produzidos por
cães diabéticos incluem acetoacetato, acetona e betahidroxibutirato; a quantificação de
betahidroxibutirato no sangue é considerada um dos métodos mais confiáveis para o
diagnóstico de cetose. É importante ressaltar que, em alguns testes semiquantitativos para
cetonas, como aquele da tira reagente para urina, um resultado negativo nem sempre exclui a
possibilidade de cetose. Isto porque, em alguns pacientes, o principal corpo cetônico é o beta -
hidroxibutirato, e vários testes semiquantitativos detectam apenas acetoacetato ou acetona.
Outra consequência clínica desta sensibilidade limitada do teste é que, à medida que a cetose
regride com o tratamento, o betahidroxibutirato tende a ser transformado em acetoacetato,
induzindo aumento paradoxal da cetonúria, o qual, portanto, não deve sempre ser
interpretado como sinal de agravamento. O diagnóstico e o tratamento de cetoacidose
diabética são discutidos, em detalhes, no Capítulo 24. Teste funcional e avaliação da
inflamação do pâncreas Outros tipos de testes são feitos por ocasião do diagnóstico, com o
objetivo específico de classificar a doença como resultado de resistência à insulina, deficiência
de insulina e/ou pancreatite. Esses testes incluem as mensurações de amilase, lipase, TLI e cPLI
no soro sanguíneo; elevações de alguns ou de todos estes parâmetros podem ser indicativas
de doença pancreática exócrina. Como previamente mencionado, o diagnóstico de pancreatite
concomitante, por vezes, tem um impacto no tratamento e no prognóstico do paciente; assim,
é importante que não se negligencie a possibilidade de inflamação pancreática.
Adicionalmente, quando houver suspeita de resistência à insulina, avaliase a reserva de células
beta em cães diabéticos não tratados, mediante a mensuração de insulina ou do peptídio C da
insulina no soro sanguíneo e da concentração de glicose antes e após injeção IV de glucagon.
Às vezes, há necessidade de testes endócrinos adicionais (p. ex., testes das funções da adrenal
e da tireoide), quando existir suspeita de endocrinopatia concomitante, embora possam ser
obtidos resultados falsopositivos em animais estressados ou naqueles com a síndrome do
doente eutireóideo. Por esta razão, com frequência, preferese tentar a estabilização da
condição diabética antes de realizar testes endócrinos adicionais. Tratamento Uma vez
definido o diagnóstico de diabetes melito, é importante que o tratamento seja iniciado
rapidamente. O comprometimento do proprietário quanto ao tempo que deverá dispensar ao
animal e ao custo financeiro envolvido não deve ser subestimado, informações estas que
devem ser esclarecidas desde o princípio. O tratamento de um animal de estimação com
diabetes requer a administração diária de insulina, o estabelecimento de uma rotina e o
suporte financeiro, suficiente não apenas para a aquisição de insulina e itens de consumo, mas
também para os gastos com monitoramento, exames complementares e períodos de
internação intermitentes. Vários proprietários ficam ansiosos quanto à maneira como eles e
seus cães enfrentarão o tratamento; além disso, por vezes, esses proprietários demoram
vários dias para aceitar a ideia de que seu animal é diabético. No entanto, mesmo quando o
proprietário estiver indeciso quanto ao seu comprometimento inicial, o início do tratamento
não deve ser retardado por mais do que algumas h, pois • • • • há risco de desenvolvimento
de cetose e cetoacidose, o que complica ainda mais a situação do animal. Uma vez assumido o
compromisso, mesmo os proprietários mais ansiosos devem aprender como administrar
insulina a seus animais; na maioria dos casos, especialmente após os primeiros meses de
estabilização, a qualidade de vida do cão é muito boa. Na Suécia, um estudo recente
envolvendo pacientes diabéticos que sobreviveram mais do que 1 dia após o diagnóstico
indicou tempo médio de sobrevida de 2 anos (Fall et al., 2007), o que é animador, ao levarse
em conta a idade avançada da maioria dos cães por ocasião do diagnóstico. Na verdade, assim
que o cão diabético é estabilizado com a aplicação de insulina, a expectativa de vida é
semelhante àquela de cães não diabéticos da mesma idade (Graham e Nash, 1995). No
entanto, também é razoável alertar os proprietários de que é mais difícil estabilizar alguns cães
do que outros e, em geral, aqueles pacientes que apresentam pancreatite, cetoacidose ou
hiperadrenocorticismo concomitante são mais sujeitos ao enquadramento nesta categoria
‘frágil’, com pior prognóstico. Os objetivos do tratamento de diabetes são mencionados na
Tabela 12.4. Dieta e exercício A chave para se obter o controle da glicemia em cães diabéticos
é uma rotina diária estável. À semelhança da dose de insulina, que é a mesma administrada
todos os dias, o tipo e a quantidade de alimento devem ser os mesmos e, de preferência, não
deve haver grandes variações na atividade física realizada pelo animal. Embora a alimentação à
vontade tenha melhor resultado em alguns gatos diabéticos, tal procedimento não é
recomendado em relação a cães. Também, devese evitar “guloseimas” entre as refeições e,
caso sejam fornecidas em algumas situações como, por exemplo, durante treinamento, as
calorias devem ser descontadas do total de calorias na dieta diária; guloseimas à base de
açúcar e amido devem ser evitadas. Tabela 12.4 Objetivos do tratamento do diabetes. Trataros
sinais clínicos, comopoliúriaepolidipsia Manterbom apetiteeestabilizaropesocorporal
Fazeroproprietárioperceberqueopacientetem
boaqualidadedevidaeestáaptoarealizaratividadefísicadiáriarazoável Minimizaras complicações,
comocetose, hipoglicemia, infecçãoecatarata Tipo de dieta O fator mais importante quando se
escolhe uma dieta para um cão diabético é se o paciente considera o alimento palatável e o
consome de maneira constante. Em geral, isto não é um problema, pois o paciente diabético
tende a apresentar polifagia. Preocupações dietéticas relacionadas com doenças
concomitantes (p. ex., insuficiência renal crônica, urolitíase, doença intestinal inflamatória)
também devem ser consideradas e, com frequência, têm prioridade em relação a uma dieta
“diabética” específica. Há disponibilidade de várias rações terapêuticas comerciais muito
eficazes para cães diabéticos. Estão disponíveis preparações úmidas e secas, amplamente
baseadas no princípio de que o alimento deve ser palatável, nutricionalmente equilibrado e
altamente digestível. Adicionalmente, a fim de minimizar a hiperglicemia pósprandial, a dieta
não deve conter grande quantidade de açúcares simples. As calorias têm de ser fornecidas
principalmente como uma combinação de carboidratos complexos e proteínas, embora deva
haver restrição de gordura, em especial, aos pacientes com histórico de pancreatite. Há vários
estudos que abordam o valor de dietas com alto teor de fibra em cães com diabetes; alguns
sugerem que dietas com teor de fibras mais elevado são benéficas, enquanto outros, que elas
são menos apropriadas para cães diabéticos com baixa condição corporal (Fleeman e Rand,
2001; Fleeman et al., 2009). Embora o peso represente um importante guia para controle da
doença, pode ser difícil a recuperação do peso de um cão magro com diabetes. Se a perda de
peso continuar, apesar do controle satisfatório da glicemia, é necessário mensurar a
imunorreatividade semelhante à tripsina canina (TLI), no caso de insuficiência pancreática
exócrina primária. Momento da refeição O fornecimento de alimento precisa ser dividido em,
pelo menos, duas refeições por dia; no entanto, às vezes, é necessário o fornecimento mais
frequente aos pacientes que recebem insulina 2 vezes/dia. A primeira refeição tem de coincidir
com a primeira injeção de insulina; alguns clínicos preferem que a dose de insulina seja
aplicada 30 min antes da refeição, uns preferem que o alimento seja fornecido 30 min antes da
aplicação de insulina, enquanto outros recomendam que ambos sejam administrados ao
mesmo tempo. Este realmente é um problema de preferência pessoal, em função da rotina do
proprietário e do apetite ou histórico do cão. Por exemplo, antes da aplicação de insulina, é
preferível verificar se um cão com um histórico de episódios de inapetência está ávido por
alimento, a fim de minimizar o risco de hipoglicemia posteriormente no dia, se o paciente
recebeu a injeção de insulina, mas não se alimentou. Isto tem importância particular quando o
proprietário, em geral, permanece fora de casa durante o dia. No entanto, alguns animais
necessitam do estímulo da queda brusca da concentração sanguínea de glicose após a injeção
(p. ex., devido ao • • • componente solúvel das insulinas de liberação lenta) para estimular o
apetite e consumir apenas uma refeição completa, assim que se inicia o efeito da insulina.
Nestes pacientes, o melhor é aplicar a insulina tão cedo quanto possível pela manhã, em
especial se o proprietário permanecer fora de casa o dia todo, de modo que a insulina tenha
tempo para atuar e, antes de sair de casa, o proprietário seja capaz de verificar se o cão se
alimentou. Em qualquer situação, é aconselhável solicitar aos proprietários que entrem em
contato com o clínico se o cão diabético não se alimentar, pois isso pode ser um sinal de
problema mais sério, como cetoacidose ou pancreatite. Se o cão recebe insulina 1 vez/dia e se
alimenta duas vezes ao dia, cada refeição deve conter 50% de sua necessidade energética, e a
segunda refeição tem de ser fornecida no momento de efeito máximo da insulina, ou seja, 6 a
8 h após a injeção Se o paciente recebe insulina 2 vezes/dia, ele deve ingerir as refeições com
as injeções do medicamento; cada uma deve conter 30 a 50% da necessidade diária de calorias
Com frequência, cães tratados 2 vezes/dia também se sentem famintos 6 a 8 h após cada
injeção, no momento de efeito máximo da insulina. Caso seja este o caso, pode se fornecer
uma refeição menor (10 a 20% da necessidade energética diária), nessas ocasiões. É comum os
proprietários optarem por fornecer alimento seco nessas pequenas refeições e, para um bom
controle, eles devem fornecer esse tipo de comida também todos os dias, ou não, pois a
variação na alimentação pode ocasionar instabilidade glicêmica. Exercício Os pacientes
diabéticos não têm de ser submetidos à restrição da atividade física, embora a recuperação da
massa muscular perdida na fase inicial da doença, às vezes, demore. Assim como acontece
com o alimento e a insulina, o principal fator é a regularidade da atividade física; não é ideal
para um cão diabético fazer pouco ou nenhum exercício durante a semana e uma ou mais
caminhadas muito longas nos finais de semana. O aumento da carga de exercício sem
aumento da quantidade de alimento implica risco de hipoglicemia; por outro lado, aumentar
muito a quantidade de alimento sem fornecer insulina extra é capaz de induzir hiperglicemia e
diurese osmótica. Sem dúvida, a hipoglicemia é a mais perigosa dessas complicações;
portanto, é de bom senso informar ao proprietário de um cão diabético que leve alguma
guloseima doce ou gel de glicose oral durante uma caminhada, a fim de fornecê la ao animal
caso este manifeste sinais iniciais de hipoglicemia. Tipos de insulina Todos os cães diabéticos
são dependentes de insulina, quase sem exceção. Com frequência, os proprietários
questionam se é possível controlar o diabetes de seus cães sem injeções; por exemplo, ao
utilizaremse, por via oral (VO), medicamentos hipoglicemiantes destinados ao controle do
diabetes tipo 2 humano, como a sulfonilureia. Como vários medicamentos hipoglicemiantes
atuam mediante a estimulação da secreção de insulina, eles não são efetivos na maioria dos
cães, visto que suas ilhotas pancreáticas encontramse irreversivelmente lesionadas por
ocasião do diagnóstico e são incapazes de produzir insulina. O valor efetivo de medicamentos
inibidores de alfaglicosidase, que retardam a absorção de polissacarídios da dieta e, portanto,
podem ser utilizados juntamente com a insulina, ainda não foi comprovado em cães. Também
têm sido realizadas pesquisas contínuas referentes a vias de liberação de insulina alternativas,
como o tratamento VO ou pela mucosa, porém, atualmente, os problemas relacionados com a
degradação de insulina tornam tais procedimentos inaceitáveis para o uso de rotina; desse
modo, a via injetável ainda é o único método efetivo de liberação de insulina. Espécies de
origem Hoje, não há disponibilidade de preparações de insulina canina recombinante para uso
veterinário e, historicamente, a maioria dos cães tem sido tratada com insulina purificada de
pâncreas bovino ou suíno. No Reino Unido, nos últimos anos, foram aprovadas duas
formulações de insulina para tratamento de cães com diabetes: uma preparação de insulina
bovina disponível em formulações solúveis (neutras), de liberação lenta ou na forma de
protaminazinco (PZI); a outra é insulina suína de liberação lenta. No entanto, desde o final de
2010, têm havido problemas significativos com o fornecimento de pâncreas bovino para a
preparação de insulinas de uso veterinário no Reino Unido. Esse fato ocasionou a retirada de
preparações autorizadas de insulina bovina neutra, de liberação lenta ou PZI, sem previsão
para o futuro, tornando a insulina suína de liberação lenta a única preparação autorizada, com
disponibilidade constante. A insulina suína é homóloga à canina, enquanto a insulina bovina
difere em dois aminoácidos; no entanto, ambas têm efeitos clínicos semelhantes. Outra
importante diferença entre as preparações suína e bovina autorizadas é a concentração. Todas
as preparações, humana e bovina padrão, contêm 100 UI/mℓ, enquanto a insulina suína de
liberação lenta é mais diluída (40 UI/mℓ) e, como consequência, requer seringa diferente.
Portanto, é fundamental assegurar que os proprietários tenham as seringas adequadas às
preparações de insulina utilizadas. A insulina suína de liberação lenta tem a vantagem de que
pequenos ajustes na dose são mais precisos; contudo, quando são necessárias altas doses para
cães mais pesados, o volume de insulina injetado por dia não é prático para alguns
proprietários. Caso seja necessário modificar a preparação de insulina que o paciente esteja
recebendo, aconselhase utilizar uma dose inicial que corresponda à diminuição de 10 a 30%
em relação à dose da preparação prévia, a fim de evitar o risco de hipoglicemia, pois a cinética
de absorção da insulina é variável entre as preparações. Duração da ação A duração de ação da
insulina depende não apenas da preparação, mas também da via de aplicação e do indivíduo a
ser tratado. Há muito tempo, a insulina bovina solúvel (neutra) era a única preparação
autorizada para aplicação IV e intramuscular, bem como para injeção subcutânea padrão. No
entanto, este produto não está mais disponível e, atualmente, nenhuma preparação de
insulina solúvel está autorizada para uso no Reino Unido. A insulina solúvel (neutra) é a única
preparação apropriada para o tratamento intensivo de cetoacidose diabética, uma vez que
apresenta início de ação mais rápido (dentro de 1 h) e duração do efeito mais curta (até 4 a 6
h); a injeção IV tem o efeito mais rápido e de menor duração. Quando não houver
disponibilidade do produto veterinário autorizado, devese utilizar insulina humana
recombinante solúvel ou bovina neutra em pacientes com cetoacidose grave. As preparações
de liberação lenta apresentam atividade bifásica, com 30% da insulina presente solúvel, com
ação mais imediata. Os 70% restantes de insulina são uma maneira de liberação ultralenta,
cujo efeito máximo ocorre dentro de 6 a 8 h e dura até 12 a 24 h. No uso clínico, as insulinas
de duração mais longa tendem a ser aquelas nas quais a insulina é preparada com protamina e
zinco (PZI), que apresenta início de ação retardado, mas pode ter pico de ação mais longo e
duração do efeito de até 24 h, em alguns pacientes, embora atualmente não exista preparação
disponível no Reino Unido. Outros tipos de insulina Há outros tratamentos com insulina,
inclusive com insulina isófana (NPH, do inglês neutral protamine Hagedorn), insulina humana
recombinante de liberação semilenta e ultralenta (algumas disponíveis em “canetas” de
insulina semiautomáticas) e insulina mista de origem bovina e suína, porém nenhum delas está
autorizada para uso em cães no Reino Unido. De interesse futuro particular, existe a insulina
“glargina”, que é um análogo da insulina recombinante obtida por engenharia genética com
base na sequência de aminoácidos da insulina humana, mas com uma asparagina na cadeia A
de insulina, em substituição à glicina, e duas argininas extras no radical C terminal da cadeia B.
Isso desvia o ponto isoelétrico da insulina, que origina uma solução totalmente solúvel em pH
4, mas forma microprecipitados subcutâneos quando injetada e exposta ao pH fisiológico de
7,4. Isto possibilita a liberação lenta da insulina, que dura até 24 h, em pacientes humanos,
com pico mínimo e atividade decrescente. Estudos iniciais sobre o seu uso em gatos diabéticos
têm sido estimulados, embora um pequeno número de relatos publicados sobre uso de
insulina glargina em cães sugira que os efeitos nesta espécie sejam menos confiáveis (Francassi
et al., 2011); o produto, com outros análogos da insulina, como a insulina detemir, continua
não autorizado para uso veterinário, no Reino Unido, até o momento. Protocolo de
estabilização Há relatos de vários protocolos para a estabilização inicial de pacientes
diabéticos; cada um tem suas vantagens e desvantagens particulares. Nenhum protocolo único
é apropriado para todos os pacientes, proprietários ou clínicos veterinários, porém um aspecto
comum fundamental para todos é a excelente comunicação entre o proprietário e o clínico.
Educação do proprietário Os dias imediatamente após o diagnóstico também representam um
período vital do “ensino” de diabetes ao proprietário. Fatores importantes que devem ser
abordados incluem o estabelecimento da rotina diária de dieta e exercício para o paciente
diabético e a prática de armazenamento da insulina e a técnica de aplicação, bem como o
monitoramento dos sinais clínicos e das emergências potenciais para diabéticos, como a
hipoglicemia. Além disso, é importante definir a castração das fêmeas diabéticas tão logo se
consiga algum grau de controle da glicemia. Há alguma possibilidade de que, caso se realize
ováriohisterectomia oportunamente, as células beta possam se recuperar e o animal talvez
não continue dependente de insulina. Muitas dessas informações iniciais são fornecidas pelos
clínicos veterinários e enfermeiros da clínica; contudo, também o reforço com outros materiais
disponíveis, como DVD, literatura e website poderá ser muito valioso. Ademais, é possível que
seja bastante útil ao proprietário de um animal diabético manter o registro diário do
comportamento geral, de apetite e sede de seu animal de estimação, para fins de
monitoramento. Os proprietários devem ser alertados sobre a importância de a insulina ser
mantida, com certeza, no refrigerador, de modo a evitar condições extremas de luminosidade
e temperatura, de não utilizar o medicamento após o prazo de validade, de movimentar, com
cuidado, o frasco, em vez de agitar, antes de cada injeção e de utilizar a seringa adequada para
a aplicação de insulina. As técnicas de aplicação injetável do medicamento têm de ser
demonstradas aos proprietários, até que se sintam seguros para executálas, inclusive a
aspiração da solução sem a formação de bolhas de ar (Figura 12.3) e os locais seguros para a
injeção. Em geral, a insulina é injetada por via subcutânea, na região dorsal do pescoço, e o
proprietário precisa ser orientado a revezar os locais de injeção nesta região ocasionalmente.
No Reino Unido, há pouco tempo, foi autorizado o uso de insulina suína lenta, a qual está
disponível na forma de “caneta” para aplicação semiautomática, auxiliando aqueles
proprietários que têm dificuldade em manusear a seringa. Dose e frequência A maioria dos
pacientes diabéticos que passa “bem” não manifesta cetose e tem apetite excelente, de modo
que a estabilização pode ser realizada sem a internação do paciente, se preferir. Essa decisão é
tomada mais em função do quadro clínico do animal, mas também considera o estilo de vida
do proprietário, sua boa vontade/capacidade para ir até a clínica e sua segurança na
administração das injeções de insulina. É possível, até mesmo, estabilizar os pacientes que
estejam “bem” com cetonúria, sem internação, desde que estes sejam bem alimentados e
apresentem boa evolução clínica; todavia, se eles manifestarem inapetência ou, por outro
lado, se mostrarem indispostos, recomendase monitoramento mais rigoroso e tratamento
mais intensivo (ver Capítulo 24). Uma vez feita a escolha do tipo de insulina (ver
anteriormente), devese decidir sobre o tratamento com uma ou duas doses diárias. A insulina
PZI, em razão de seu tempo de ação mais longo, em geral, é administrada 1 vez/dia, enquanto
as preparações de insulina de liberação lenta costumam ser aplicadas a cada 12 h. Problemas
recentes com a disponibilidade de uma preparação PZI autorizada para cães têm impedido seu
emprego aos novos pacientes. Em razão dessa disponibilidade limitada, atualmente
recomendase iniciar o tratamento com insulina suína lenta, de preferência 2 vezes/dia, em
todos os cães recentemente diagnosticados com diabetes. Embora a maioria dos proprietários
prefira aplicar o medicamento apenas 1 vez/dia, a evidência clínica sugere que os cães ficam
mais estáveis (com menor risco de hipoglicemia) quando se utilizam duas aplicações ao dia
(Hess e Ward, 2000; Fleeman e Rand, 2001), por isso fazse esta recomendação. Outra
vantagem do tratamento com duas aplicações ao dia é que é menos provável que a “perda” de
uma injeção de insulina, que acontece por motivos inesperados, ocasione problema, pois o cão
apenas fica sem insulina por 24 h, em vez de 48 h. Figura 12.3 Devese ter cuidado, sempre, ao
aspirar a insulina sem quaisquer bolhas de ar, visto que essas bolhas podem influenciar
significativamente a dose. © Intervet Schering Plough. Quando uma insulina de ação mais
duradoura é clinicamente necessária, atualmente não há disponibilidade de preparações
autorizadas no Reino Unido. No entanto, é possível obter PZI bovina, atualmente disponível
para uso humano; na América do Norte, uma preparação de PZI humana recombinante é
comercializada para uso em gatos com diabetes; contudo, nenhum desses produtos deve ser
considerado como insulina de primeira escolha. Como orientação, é normal a dose inicial de
insulina ser de cerca de 0,5 UI/kg, mas, em alguns casos, é possível que seja necessária uma
dose maior. No entanto, é preferível iniciar com uma dose baixa, aumentandoa
gradativamente, de modo a minimizar o risco de hipoglicemia. Com frequência, são realizados
ajustes da dose inicial em função da condição corporal e do peso, visto que cães muito grandes
ou obesos tendem a receber uma dose menor, e cães muito pequenos, uma dose ligeiramente
maior. Também devese levar em conta a presença de infecção, inflamação ou antagonismo
hormonal concomitante, que pode resultar em resistência à insulina, embora isto deva ser
resolvido com o tratamento apropriado da causa primária. Recomendase monitorar, com
cuidado, o paciente ao longo de várias h após a primeira dose de insulina, pois o animal talvez
seja mais sensível à insulina do que o esperado e desenvolva hipoglicemia. Monitoramento e
ajustes da dose Dependendo do paciente e do proprietário, o cão é estabilizado em casa, com
retorno deste à clínica, pelo menos 1 vez/dia, no momento previsto de efeito máximo da
insulina (com a menor concentração de glicose [nadir]), a fim de mensurar o teor de glicose
sanguínea, ou a estabilização pode ser alcançada com o paciente internado. O principal
objetivo do monitoramento da menor concentração sanguínea de glicose (nadir) não é avaliar
o controle da glicemia em suas minúcias, mas, sim, verificar se a glicemia tem atingido um
nível perigosamente baixo (< 4 mmol/ℓ) em cães mais sensíveis à ação da insulina, do que o
esperado. A desvantagem desse procedimento é que, com uma única mensuração da glicose
sanguínea, o clínico consegue apenas estimar o momento em que a concentração sanguínea
de glicose, provavelmente, encontrase em seu menor valor. Como orientação geral,
aproximadamente entre 4 e 8 h após a injeção é um ponto de referência útil para a
determinação da glicose sanguínea, quando se utiliza uma preparação de insulina lenta, em
comparação com 9 a 12 h após a injeção, que seria o momento mais apropriado para a
obtenção de amostras de pacientes tratados com PZI. As características farmacocinéticas e
farmacodinâmicas da insulina são variáveis entre os cães; como consequência, o menor valor
da glicemia tende a ocorrer mais cedo ou mais tarde do momento em que se mensurou a
glicose sanguínea, o que torna o resultado enganoso. No entanto, o procedimento de
estabilização sem a internação do paciente ainda é particularmente útil aos cães que não se
alimentam no ambiente hospitalar e cujos proprietários permanecem em casa a maior parte
do dia e são capazes de monitorar a ocorrência de sinais de hipoglicemia. Como alternativa,
alguns proprietários preferem que o paciente receba as primeiras doses de insulina no
hospital, às vezes visitando seu animal para aprender a administrar as injeções sob a
supervisão de veterinário ou de enfermeiro. O cão pode, então, retornar à casa assim que se
tiver estabelecido, mediante a mensuração da glicemia, que a dose de insulina é segura. Após
4 a 7 dias de tratamento, recomendase obter a curva glicêmica de 12 a 24 h, a fim de avaliar a
evolução. A curva glicêmica varia de um dia para outro e é influenciada por vários fatores, de
tal modo que sempre deve ser interpretada com cautela (Fleeman e Rand, 2003). As principais
informações obtidas na curva glicêmica são discutidas com mais detalhes a seguir; todavia,
informa se a ação da insulina está sendo consistente, o tempo de efeito da insulina e se a
menor concentração de glicose (nadir) está perigosamente baixa. É provável que, nesta fase,
haja necessidade do ajuste da dose ou a recomendação de alteração do tratamento para 2
vezes/dia, caso o efeito de insulina seja < 24 h e o procedimento de estabilização seja iniciado
com apenas uma dose diária. As alterações do tratamento também dependem de outros
parâmetros clínicos, como apetite, sede e comportamento geral do paciente, sendo preferível
não modificar mais do que um parâmetro (alimento, insulina, intensidade de exercício) por vez
durante esta fase. Quando se altera o tratamento do paciente, de uma aplicação ao dia para
duas aplicações, a dose a ser utilizada dependerá de vários fatores, mas é preferível ter certeza
de que a dose de cada injeção seja a mesma e que as injeções sejam aplicadas em intervalos
de 12 h. Caso a curva glicêmica tenha mostrado que uma dose de insulina ao dia é segura, mas
seu efeito dure < 12 h, devese recomendar o uso da mesma dose 2 vezes/dia. Se o efeito
parecer durar pouco mais que 12 h, porém menos de 24 h, uma orientação para uso de duas
doses ao dia seria uma dose que corresponda a 75% de uma dose diária. Uma vez estabelecida
a frequência do tratamento com insulina, os ajustes de doses têm de ser pequenos
(preferivelmente, 1 UI de cada vez, para cães menores, e 1 a 2 UI para cães maiores). Caso
sejam feitos ajustes de doses maiores devido à persistência de alta concentração sanguínea de
glicose, nunca devem ser > 10% da dose. A exceção a isto é a redução da dose quando se
detecta hipocalcemia marcante, situação na qual se pode fazer redução drástica da dose (de
até 50%). Esta fase de estabilização lenta requer paciência do proprietário, do paciente e do
clínico veterinário, e é preferível que cada alteração de dose seja acompanhada de um período
de ajuste de 3 a 5 dias, em casa, seguido de obtenção de uma curva glicêmica de 12 a 24 h. A
estabilização do paciente e a abordagem cautelosa nas semanas seguintes após o diagnóstico
aumentam a chance de se obter uma dose apropriada de insulina em 1 a 2 meses, pois a dose
adequada não será excedida por bruscos e grandes ajustes da dose. Dependendo do paciente
e do proprietário, em geral se utiliza uma combinação de curva glicêmica e de avaliação de
parâmetros clínicos, como o consumo de água em 24 h e a mensuração de frutosamina, para
avaliar e obter o controle da glicemia na fase de estabilização. Caso seja necessária internação,
comumente são utilizados ajustes de doses mais frequentes; contudo, o paciente apenas deve
ser liberado quando não for necessário ajuste da dose há, pelo menos, 3 dias consecutivos.
Monitoramento do controle da glicemia A introdução de exames complementares que
mensurem as concentrações de frutosamina e hemoglobina glicosilada auxiliou na melhora do
monitoramento do controle da glicemia em pacientes veterinários e na prevenção de
complicações secundárias. Alterações nesses parâmetros possibilitam ajustes seguros da
terapia de insulina e das decisões a serem adotadas como, por exemplo, se há necessidade de
investigações adicionais. Em termos práticos, isto significa que, se o paciente não estiver
disponível para repetidas curvas glicêmicas, uma alternativa para o ajuste da dose de insulina,
a qual costuma ser mais demorada, é a mensuração da concentração sérica de frutosamina,
como um guia para o controle da glicemia. No entanto, é importante que isto seja realizado
com o monitoramento dos sinais clínicos, como alteração de peso e verificação do consumo de
água. Concentração sanguínea de frutosamina Podese a fazer mensuração da concentração de
frutosamina a cada 2 a 3 semanas, em uma única amostra de sangue, com a vantagem de que
este teste tem como ser realizado em qualquer momento do dia, em vez de feito em
momentos específicos, como aqueles necessários para a obtenção da curva glicêmica. É mais
útil no monitoramento do progresso longitudinal do paciente, ou seja, ao compararse o cão
com ele mesmo ao longo do tempo, e ao verificar se o controle da glicemia obteve piora ou
melhora. Neste caso, é fundamental que seja utilizado o mesmo laboratório para a realização
de todos os exames, pois é possível variação substancial nas análises e nos intervalos de
referência. Quando o paciente recebe uma dose apropriada de insulina, a concentração de
frutosamina permanece constante, o peso corporal se estabiliza e o cão deixa de consumir
água em excesso. Com frequência, este modo de estabilização é mais bemsucedido em cães
que recebem insulina 2 vezes/dia, pois é difícil determinar se a duração do efeito da insulina é
adequada em cães tratados com uma dose diária do medicamento, ao mensurarse,
exclusivamente, a concentração de frutosamina. Embora o intervalo de referência varie
amplamente entre os laboratórios, em geral concentrações de frutosamina < 400 μmol/ℓ são
consideradas indicativas de controle glicêmico muito bom, enquanto concentrações > 550
μmol/ℓ sugerem controle muito ruim. Esses valores devem ser interpretados com cautela: a
mensuração de frutosamina não é o ideal para determinar se um paciente se enquadra em um
controle da glicemia ‘ruim’, ‘aceitável’, ‘bom’ ou ‘muito bom’, em comparação com a
população geral de pacientes diabéticos. Isto ocorre porque os valores que representam esses
graus de controle variam entre os pacientes, pois a concentração de frutosamina não é
influenciada exclusivamente pelo teor de glicose no sangue, mas também por outros fatores,
como o turnover de proteínas. Como consequência, o valor de frutosamina sempre deve ser
interpretado considerando os sinais clínicos e as mensurações prévias do mesmo paciente. É
importante notar que, embora seja desejável que a concentração de frutosamina seja
consistente com adequado controle da glicemia (e concentração sanguínea de glicose de 5 a
12 mmol/ℓ, em uma curva glicêmica), isto nem sempre é totalmente obtido. É mais importante
alcançar os objetivos clínicos do tratamento mencionados na Tabela 12.4. Por exemplo, um
valor de frutosamina tranquilizador em um paciente que ainda manifeste sinais clínicos de
instabilidade não demonstra bom controle glicêmico, o que pode configurar o valor médio de
uma combinação de períodos de hipoglicemia e hiperglicemia ao longo do dia. Por outro lado,
a elevação na concentração de frutosamina não deve ser muito alarmante em um paciente
que mostre boa avaliação dos critérios clínicos (como mostrado na Tabela 12.4). Mais do que
ajustar um protocolo que resolva satisfatoriamente os sinais clínicos do paciente, seria
preferível manter o mesmo protocolo e repetir a mensuração de frutosamina e a avaliação
clínica após 2 a 4 semanas. Caso a frutosamina continue a se elevar, é justificável a
investigação adicional; contudo, se os sinais clínicos e o teor de frutosamina permanecerem
estáveis, qualquer ajuste deve ser feito com muita cautela, pois podem mais agravar do que
melhorar a condição de um animal estável e com razoável qualidade de vida. Concentração de
glicose na urina Caso os proprietários tenham facilidade em coletar a urina de seus cães, temse
uma maneira adicional de avaliação do controle da glicemia, uma vez que há tira reagente que
permite a avaliação semiquantitativa de glicosúria e cetonúria. Notase glicose na urina quando
sua concentração no sangue excede o limiar renal (12 a 14 mmol/ℓ), que não é incomum, pelo
menos, em alguma parte do dia, em vários cães diabéticos. Portanto, é importante que a
mensuração de glicose na urina seja avaliada no mesmo momento do dia, preferivelmente
pela manhã, e que os valores sejam interpretados com outras informações clínicas. Uma
pequena quantidade de glicose na amostra de urina coletada de manhã é aceitável, mas se
esta quantidade aumentar em um padrão consistente ou caso se notem, também, cetonas, o
proprietário deve procurar aconselhamento veterinário. Por outro lado, caso não se detecte
glicose alguma na amostra de urina da manhã, é possível que o cão se encontre em risco de
hipoglicemia e devese rever a dose de insulina. Portanto, é necessário ter muito cuidado ao
modificar a dose de insulina com base, exclusivamente, na concentração urinária de glicose,
especialmente em cães que recebem uma dose do medicamento ao dia, os quais quase
sempre apresentam glicosúria pela manhã. O aumento da dose não resolve a glicosúria se o
efeito da insulina durar < 24 h; além disso, a tentativa de normalizar o teor de glicose na urina
por meio de aumento gradativo da dose de insulina é uma causa comum de hiperglicemia
induzida pela insulina (efeito Somogyi – discutido no Capítulo 22). Em cães com histórico de
cetoacidose, o exame de urina periódico no próprio domicílio também é muito útil como alerta
precoce de cetonúria. Curva glicêmica Outro método muito valioso para estimar a eficácia do
tratamento com insulina em pacientes diabéticos é a obtenção de curvas glicêmicas seriadas,
em repetidas amostras de sangue coletadas a cada 1 a 2 h, durante um período de 12 a 24 h. A
curva glicêmica é uma importante parte da avaliação do controle glicêmico em alguns
pacientes, porém, em outros, fornece escassas informações úteis, como acontece, por
exemplo, em paciente que não se alimenta durante a permanência no hospital ou quando é
difícil obter repetidas amostras de sangue. Em pesquisas recentes, ficou evidente que mesmo
em pacientes estáveis a curva glicêmica tende a variar a cada dia; desse modo, devese ter
cautela para não superestimar os achados. Por exemplo, nas h seguintes a um episódio de
hipoglicemia grave, a presença de hormônios antagonistas, com glucagon, epinefrina e
cortisol, é capaz de impedir a obtenção de qualquer valor hipoglicêmico, apesar da
administração da mesma dose de insulina. O estresse também pode contribuir para a elevação
da concentração de glicose no sangue de cães internados (embora não na mesma extensão
verificada em gatos internados), de tal modo que a curva obtida no hospital tende a ser muito
diferente da curva glicêmica que seria obtida no paciente não internado. É 1. 2. 3. 4. • • • •
especialmente importante evitar a união dos vários pontos de uma curva de 1 h ou de 2 h com
linhas, uma vez que isso dá impressão de que a curva não contém pico ou depressão entre as
amostras, e isso pode ser um engano. Além disso, é importante esperar vários dias para que o
paciente se ajuste a uma nova dose de insulina antes de realizar a curva; por exemplo, envie o
para casa por alguns dias, no intervalo entre curvas repetidas, caso seja seguro e prático fazê -
lo. Em um paciente diabético ideal, a concentração sanguínea de glicose deve situarse entre 4
mmol/ℓ e 12 mmol/ℓ, o dia todo, na curva glicêmica. No entanto, como as curvas glicêmicas
podem ser confusas e raramente parecem exemplos de livrostextos, é importante que ambos,
proprietários e clínicos, sejam realistas quanto à expectativa de qual será o custo/benefício da
informação obtida. No entanto, a análise metódica da curva glicêmica, em geral, permite uma
estimativa do controle da glicemia e de potenciais alterações no tratamento. A seleção de caso
também é importante para a obtenção do valor máximo da curva glicêmica, que, muitas vezes,
é desconfortável ao paciente e requer muito esforço dos funcionários da clínica. Em pacientes
diabéticos não estabilizados e naqueles recentemente diagnosticados que estão sendo
estabilizados com insulina, é mais provável o benefício de uma curva glicêmica de 12 ou 24 h
de hora em hora. Por outro lado, a obtenção de uma curva glicêmica simplesmente para
avaliar um paciente que já satisfaz todos os objetivos do tratamento mencionados na Tabela
12.4 é de valor questionável, pois é improvável que altere o tratamento clínico. Há várias
questões que podem ser formuladas quando se examina uma curva glicêmica, embora as
recomendações sobre alterações do tratamento variem entre os clínicos. Como um guia de
referência, devemse considerar as seguintes questões: A insulina apresenta algum efeito? Isto
é confirmado se a concentração sanguínea de glicose diminuir em qualquer ponto, no período
de 6 a 8 h após uma injeção. Também é importante verificar quanto tempo após a alimentação
notase este efeito e se a redução do teor de glicose estava associada ao apetite Quanto tempo
dura esse efeito? É possível confirmar isso pela constatação do primeiro momento em que a
concentração sanguínea de glicose começa a se elevar novamente, o que pode ser tão breve
como poucas horas após a injeção. É particularmente importante verificar se o teor de glicose
no sangue se eleva ou se ainda está controlado quando o cão se alimenta algumas horas após
a injeção O nadir (o menor valor da glicose sanguínea) é seguro ou está perigosamente muito
baixo? Quando a concentração sanguínea de glicose diminuir para menos de 3 a 5 mmol/ ℓ,
mesmo com o paciente internado para realizar uma curva glicêmica, o paciente se encontra
em risco de hipoglicemia clinicamente relevante. Isto acontece porque o paciente não está
consumindo a quantidade de alimento que normalmente consumiria em seu domicílio; isso
ainda ocorre quando a dose de insulina é muito alta. Se houver qualquer preocupação em
relação à hipoglicemia durante a realização da curva, o paciente deve ser alimentado e a
glicose sanguínea mensurada novamente 30 min mais tarde, com monitoramento contínuo e
cessação da terapia com insulina até que a glicemia comece a se elevar Há fatores que
também podem contribuir na ocorrência dos achados verificados? É improvável que a curva
glicêmica seja representativa do controle da glicemia no dia a dia normal do paciente se o cão
estiver enfermo (p. ex., com pancreatite, infecção de trato urinário, cetoacidose), se não
consumir sua dieta habitual ou se, muito recentemente, apresentou episódio hipoglicêmico
grave ou a dose de insulina foi alterada. De modo semelhante, o estresse que acompanha a
coleta de amostras de sangue, um glicosímetro não confiável ou amostras
hemolisadas/lipêmicas também influenciam o resultado da curva glicêmica. Esses fatores
sempre devem ser considerados como possíveis explicações de resultados inesperados ou
erráticos. Monitoramento da concentração de glicose em domicílio Em alguns casos,
especialmente quando os pacientes são facilmente manuseados, mas não serão internados, o
proprietário tem como obter uma curva glicêmica no próprio domicílio, sem realizar
venopunção (Casella et al., 2003). Isto pode ser feito ao utilizarse um dispositivo com lanceta
automática, com punção de uma área da pele sem pelos, como a parte inferior da orelha. Esse
aparelho contém uma agulha descartável que dispara sob pressão, fazendo uma incisão tipo
alfinetada na pele, a qual permite a saída de pequeno volume de sangue capilar, às vezes com
o emprego de vácuo. Assim, a concentração de glicose é mensurada em um glicosímetro que
aspira um volume correto de sangue (Figura 12.4). No entanto, devese ter cautela, para ter
certeza de que o bemestar do paciente não será comprometido por qualquer um desses
testes, pois são dolorosos se realizados de maneira incorreta. Os problemas possíveis em razão
dos testes podem ser decorrentes de um dos seguintes fatores: Realização muito frequente do
teste Teste realizado por uma pessoa sem treinamento apropriado Realização do teste em
paciente que não tolera o exame Teste realizado pelo proprietário, sem supervisão veterinária
direta dos resultados obtidos. O monitoramento da glicose no próprio domicílio é mais comum
nos casos de diabetes estabelecidos do que na fase inicial da estabilização, a menos que o
proprietário já tenha experiência no tratamento do diabetes. Monitoramento contínuo da
concentração de glicose A obtenção da curva glicêmica por meio de repetidas punções da veia,
ou mesmo com utilização de uma lanceta, pode ser estressante e doloroso para o cão;
também, há risco de o pico significativo da glicose sanguínea ou seu menor valor (nadir)
ocorrer no intervalo de coleta das duas amostras e não ser registrado. Um avanço tecnológico
recente no controle de diabetes em humanos envolveu o desenvolvimento de um sistema de
monitoramento contínuo da glicose (CGMS; Medtronic MiniMed, Northridge, EUA), o qual
também tem sido feito com êxito em cães (Davison et al., 2003b) (Figura 12.5). Figura 12.4 Uso
de glicosímetro para mensurar a glicose em uma amostra de sangue capilar obtida da orelha,
com um aparelho com lanceta. O sistema requer introdução subcutânea do sensor de glicose
de platina com um dispositivo sob pressão, o qual é deixado no local por até 72 h. O CGMS não
elimina totalmente a necessidade de coleta de amostras de sangue, pois pelo menos uma
mensuração de glicose sanguínea deve ser realizada em um período de 12 h, a fim de calibrar o
aparelho e verificar se o sensor permanece ativado. As concentrações de glicose no fluido
intersticial são mensuradas, pelo sensor, a cada 10 segundos, e um valor médio é registrado
em intervalos de 5 min. As concentrações de glicose do sangue e do fluido intersticial estão em
equilíbrio e, em geral, estudos experimentais mostram que as diferenças são notadas apenas
quando a concentração de glicose sanguínea se altera bruscamente, com uma espera de 3 a 14
min. O sensor é conectado diretamente ou por meio de radiotelemetria a um monitor do
tamanho de um pager, mantido no paciente ou próximo a ele (1 a 2 metros de distância). O
monitor também armazena informações referentes às injeções de insulina e à alimentação, de
modo que podem ser sobrepostos na curva glicêmica gerada em um programa de computador
associado. É comum os dados serem transferidos para um computador, para análise, ou, nos
modelos mais novos, avaliados em tempo real no próprio monitor. A principal vantagem do
CGMS é que uma grande quantidade de dados pode ser coletada e analisada sem a
necessidade de repetidas coletas de sangue. No entanto, atualmente seu uso é limitado
apenas a centros de pesquisa de grande número de pacientes diabéticos, em razão do custo
do aparelho e dos sensores de platina descartáveis. A taxa de variação de operação do
aparelho também impede seu uso em pacientes com teor sanguíneo de glicose acima do limite
de detecção (> 22 mmol/ℓ). Este equipamento é especialmente útil na investigação de
pacientes diabéticos instáveis, tema discutido com mais detalhes no Capítulo 22. • • Figura
12.5 Uso de um dispositivo de monitoramento contínuo. A. O sensor de monitoramento da
glicose é introduzido abaixo da pele, por meio de um dispositivo que dispara sob pressão. B. O
sensor é conectado ao dispositivo de monitoramento contínuo da glicose e é mantido no local
por até 72 h. C. Este dispositivo pode ser colocado no paciente e fixado a um suspensório
(também há disponibilidade de um sistema de radiotelemetria sem fio). D. Os dados são
usados para gerar um traço contínuo da concentração de glicose no fluido intersticial,
analisado por um programa de computador. Monitoramento de longa duração Recomendam-
se consultas regulares com o clínico veterinário, mesmo nos casos aparentemente bem
controlados. Diferentemente de gatos, é muito raro que os cães tenham um período de “lua
de mel diabética” após o tratamento com insulina, necessitando de redução de dose ou
interrupção da terapia com insulina. No entanto, às vezes, é necessário um ajuste adicional da
dose de insulina devido ao ganho de peso, à doença concomitante ou à alteração no controle
do paciente, como maior atividade física ou alteração da dieta. O planejamento com avaliação
regular do paciente diminui a possibilidade de emergências porque as alterações no controle
da glicemia podem ser identificadas e tratadas precocemente. O envolvimento da equipe de
enfermeiros da clínica na avaliação regular dos pacientes diabéticos também é muito
importante, pois estes compartilham as responsabilidades dos cuidados, de modo que várias
pessoas estejam familiarizadas com cada caso. É essencial que uma consulta clínica de rotina
seja programada, aproximadamente, a cada 2 meses, para um paciente diabético bem
controlado, ao considerarmos os fatores listados na Tabela 12.5. Nos pacientes estáveis com
rotina definida, essa consulta é uma excelente oportunidade para o pessoal da enfermagem se
envolver em cuidados com os cães diabéticos. Se o proprietário relatar qualquer problema ou
se constatar qualquer fator mencionado na Tabela 12.6, devem ser realizados exames
adicionais. Tabela 12.5 Condições que têm de ser avaliadas na consulta regular do paciente
diabético. Mensuraçãodopesocorporal (mensalmente) Revisãodos registrosdiários com
oproprietárioàbuscadequaisqueralterações: ° ° ° • • • • • • • • • • • • • • • • Apetite Sede
Comportamento Examedeurina,a fim deverificarevidênciadeinfecçãoe/oupresençadecetonas
Monitoramentoda higienedental Discussãosobretodasaspreocupações sobredieta/alimentação
Se necessário, revisãodatécnicadeinjeçãodeinsulina Averiguar
seosproprietáriosestãopreparadosparaemergênciasdiabéticaspotenciais Mensurar
frutosaminaacada4a6 meses,oucom mais frequência, se houverqualquerproblema Tabela 12.6
Achados constatados em uma consulta regular do paciente diabético que devem motivar
exames adicionais. Episódiosderespiraçãoofeganteoucomportamento nãousual (hipoglicemia)
Alteraçãorelevantedoapetiteousede(diabetes instáveloudoençaconcomitante,porexemplo,
insuficiênciapancreáticaexócrina, insuficiênciarenal) Presençadesangue,proteínaoucetonas
naurina(deveserealizarexamecitológico, culturabacterianaeantibiogramaem todosos casosde
hematúriaem pacientes diabéticos) Alteraçãosignificativadopesocorporal
Sinaisdeinfecção,porexemplo,doençaperiodontal Deterioraçãodavisão(cataratas)
Aparecimentode nódulos nos
locaisdeinjeção(areaçãoàinjeçãotendeaocasionarabsorçãoerráticadeinsulina) O
animalestáquietooudeprimido(possivelmente hipoglicemiaoudoençaconcomitante)
Ocorrênciadevômitooudiarreia(vômitosem alteração nadosedeinsulinapodeocasionar
hipoglicemiapreocupante)
Alteraçãodopelameoudoformatodocorpo(istosugereoutraendocrinopatia,porexemplo,
hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo) Tratamento de doença concomitante Toda doença
concomitante em um paciente diabético precisa ser tratada o mais rapidamente possível.
Infecção Os pacientes diabéticos são particularmente predispostos a infecções bacterianas e
fúngicas devido ao alto teor de glicose no sangue e no fluido intersticial, condição que favorece
o crescimento desses microrganismos, e em razão da imunossupressão inerente (Hess et al.,
2000b). Se a infecção e a inflamação não forem detectadas e tratadas, ocorre resistência à
insulina, hiperglicemia mais grave e exacerbação da infecção. O uso de antibiótico em
pacientes diabéticos tem de se basear no resultado da cultura bacteriana e do antibiograma;
na maioria dos casos, há necessidade de tratamento durante, no mínimo, 2 a 3 semanas. No
caso de doença fúngica ou infecção bacteriana mais grave, por vezes, são necessários
tratamento por mais tempo e controle intensivo da glicemia para um acompanhamento
adequado. Inapetência ou vômito Toda doença que reduz o apetite ou provoque vômito
também interfere no controle da glicemia. Como mencionado anteriormente, os proprietários
sempre devem entrar em contato com o clínico caso seu cão diabético não se alimente ou
apresente vômito. No caso de redução da ingestão calórica por qualquer motivo, há risco de
hipoglicemia no momento do efeito máximo da insulina. Na doença discreta, bem como no
caso de vômito relacionado com a imprudência alimentar, é aceitável uma redução da dose de
insulina em 50%, por 1 ou 2 dias, até o retorno ao apetite normal. Períodos de inapetência
prolongados, como aqueles associados à pancreatite aguda, requerem exames
complementares adicionais e monitoramento cuidadoso da concentração sanguínea de
glicose. O tratamento do paciente diabético com pancreatite aguda precisa seguir os mesmos
princípios daquele dispensado ao paciente não diabético, o que inclui analgesia, pequenas
refeições com baixo teor de gordura caso o paciente não apresente vômito e, se necessário,
tratamento antiemético. Em tais casos, é mais eficaz controlar a glicemia com várias doses
baixas (0,1 a 0,3 UI/kg) de insulina solúvel (neutra), administrada por via intramuscular,
durante todo o dia (dependendo da quantidade de alimento consumido e da concentração de
glicose no sangue), do que utilizar a preparação de ação mais prolongada, que, em geral, é
injetada (ver notas anteriores sobre a disponibilidade). A insulina solúvel (neutra) tem a
vantagem de apresentar rápido início de ação e, também, efeito de curta duração, o que
significa que o animal tem menor risco de hipoglicemia, caso não se alimente durante várias
horas. Medicamentos Outro desafio em pacientes diabéticos é o uso de medicamentos que
antagonizem a insulina ou contenham açúcar, na forma de xarope. Em particular,
corticosteroides como a prednisolona têm efeito prejudicial no controle da glicemia e
requerem aumento da dose de insulina para compensar isto. Se possível, devese evitar o uso
dessas substâncias, porém nem sempre isto é prático. Por exemplo, em casos graves de
doença alérgica ou de imunomediada, por vezes, é necessário o uso de corticosteroides,
porém devese evitar a ministração desses medicamentos em pacientes diabéticos, em casos
menos graves. É menos provável que o tratamento tópico ocasione problema, mas, em alguns
casos, mesmo as formulações para afecções de olhos, orelhas e pele tendem a induzir
resistência à insulina. Se o uso de corticosteroide for inevitável, administrase a dose efetiva
mínima e são recomendados outros fármacos “poupadores de esteroides” apropriados (p. ex.,
azatioprina, na doença imunomediada). A ação e a duração do efeito das soluções injetáveis
de corticosteroides de liberação lenta são mais variáveis, sendo muito difícil prever as
alterações na dose de insulina necessária; assim, tais preparações têm de ser evitadas, dando-
se preferência àquelas de ação mais curta, de uso oral, 1 vez/dia. Temse proposto o uso de
ciclosporina como fármaco imunossupressor para o tratamento de doença imunomediada em
pacientes diabéticos, embora, sabidamente, em pacientes humanos ela interfira na
concentração sanguínea de glicose por meio de inibição da secreção de insulina. É menos
provável que isso cause problema em cães diabéticos, pois, em geral, não apresentam ilhotas
pancreáticas remanescentes funcionais e são totalmente dependentes de insulina exógena
para o controle glicêmico apropriado. Anestesia geral O período de jejum necessário para
anestesia geral em pacientes diabéticos pode ser preocupante quanto ao controle da glicemia.
As indicações mais prováveis para anestesia geral do paciente diabético incluem ovário -
histerectomia, cirurgia de catarata ou tratamento de doença dental grave. Pacientes diabéticos
apresentam risco de desenvolvimento de hipoglicemia e lesão cerebral durante a anestesia, e
a concentração sanguínea de glicose tende a permanecer descontrolada por várias horas após
o procedimento cirúrgico. Recomendase que a anestesia do paciente diabético seja feita o
mais cedo possível, no dia, para que o animal se recupere a tempo de se alimentar antes do
início do efeito máximo da insulina. Após uma noite em jejum, a partir da meia noite, um
protocolo comum implica a aplicação de metade da dose usual de insulina pela manhã, mas
sem alimento. O paciente deve ser submetido à fluidoterapia com solução salina e dextrose,
IV, ao longo da anestesia. A concentração sanguínea de glicose tem de ser monitorada
regularmente durante todo o procedimento; caso a glicemia seja < 5 mmol/ℓ, administrase um
bolus de glicose IV (até 1 a 2 mℓ de dextrose 25%/kg). Durante a recuperação, devese
estimular o paciente a se alimentar tão logo seja possível (de preferência, com sua dieta usual)
e monitorar a glicose sanguínea em intervalos de 1 ou 2 h. Pacientes que recebem insulina 1
vez/dia têm como retornar à rotina normal na manhã seguinte, enquanto aqueles que
recebem insulina 2 vezes/dia, quando se recuperam bem, podem receber insulina e alimento,
como a rotina normal, ao anoitecer. Complicações a longo prazo Embora tenha como ser
utilizada com êxito a terapia com insulina na maioria dos cães com diabetes, o controle da
glicemia abaixo do desejado pode ocasionar complicações secundárias, como convulsões
hipoglicêmicas, formação de catarata, infecções recorrentes ou cetoacidose diabética.
Acreditase, também, que, em cães, o diabetes seja um fator de risco para o desenvolvimento
de aterosclerose, embora isto, em geral, seja evidente apenas no exame pósmorte, e é comum
não provocar sinais clínicos (Hess et al., 2003). Diferentemente do que acontece em pacientes
humanos com diabetes, os cães diabéticos, em geral, não manifestam sinais clínicos associados
a nefropatia diabética ou neuropatia periférica. É possível que isto represente uma diferença
na fisiopatologia, nas duas espécies, sendo mais provável que esteja relacionado com a
diferença do tempo de vida. Em pacientes humanos, o desenvolvimento de complicações
secundárias, por vezes, demora várias décadas; além disso, é comum os cães diabéticos
viverem somente alguns anos após o diagnóstico. Doença ocular A frequência de manifestação
das complicações oculares é variável, sendo a formação de catarata (Figura 12.6) uma das mais
comuns. Acreditase que seja decorrente de distúrbio osmótico do cristalino devido ao acúmulo
de sorbitol (um produto da metabolização do excesso de glicose); é mais comum nos pacientes
com diabetes mal controlado. Trabalhos recentes mostraram, também, alta atividade da via
aldose redutase no cristalino de cães, em comparação com o de gatos, condição que, acredita-
se, participe na formação de catarata (Richter et al., 2002). É provável que, mesmo os
pacientes mais bem controlados desenvolvam catarata dentro de 2 anos a partir do
diagnóstico, a qual, por fim, resulta em cegueira. Embora os proprietários, com frequência,
relutem em permitir a cirurgia de seu animal de estimação diabético, podese obter grande
melhora na qualidade de vida do paciente mediante o tratamento cirúrgico das cataratas.
Outras complicações oculares do diabetes incluem ceratoconjuntivite seca, conjuntivite
bacteriana e uveíte; a ocorrência de retinopatia diabética, constatada em pacientes humanos,
é muito rara. Figura 12.6 Cataratas em pacientes diabéticos. A. Catarata diabética madura –
note as fissuras aquosas no cristalino. A íris frouxa escura é resultado da uveíte induzida pelo
cristalino. B. Catarata diabética inicial, com vacúolos, antes do início súbito de opacidade do
cristalino madura. (Cortesia do Dr. David Williams.) Complicações cutâneas Há relatos
ocasionais de lesões cutâneas ulceradas e xantomas cutâneos em cães diabéticos com quadro
clínico instável. A síndrome hepatocutânea é uma complicação rara do diabetes e de algumas
doenças hepáticas. Notamse graves lesões crostosas nas patas e nas partes distais dos
membros, face e períneo; acreditase que estejam relacionadas com o excesso de glucagon. O
diagnóstico é confirmado mediante biopsia de pele, mas é comum o prognóstico desta
complicação ser ruim. Hipoglicemia A ocorrência de hipoglicemia é rara em cães, contudo,
quando se instala, pode representar risco à vida do animal; assim, os proprietários precisam
ser bem orientados sobre como evitar e tratar esta anormalidade. Em geral, os cães são
protegidos da ocorrência de hipoglicemia pela ação de outros hormônios produzidos quando a
concentração sanguínea de glicose diminui, como o glucagon, a epinefrina e o cortisol. É mais
provável que ocorra hipoglicemia quando o animal não consome a quantidade usual de
alimento, exercitase mais do que o usual e recebe uma dose muito alta de insulina (às vezes,
acidentalmente). Os sinais clínicos de hipoglicemia discreta incluem letargia, alterações de
comportamento, como agressividade ou inquietação, tropeço ao caminhar e aumento do
apetite. Caso o animal não seja alimentado e se permita a progressão da hipoglicemia, a
condição neurológica se agrava com ocorrência de convulsões ou coma e, por fim, resulta em
lesão cerebral e morte. A hipoglicemia discreta tem como ser controlada mediante o
fornecimento de qualquer alimento que não seja rico em fibra, em particular, rico em açúcar,
como doces ou biscoitos. Se o animal não conseguir se alimentar voluntariamente, podese
aplicar glicose na membrana mucosa bucal do cão, na forma de gel de dextrose ou solução de
glicose, o qual pode ser diretamente absorvida até que o animal tenha se recuperado o
suficiente para ser alimentado. No animal em colapso, em especial após uma dose excessiva
de insulina, devese administrar glicose IV, imediatamente, a fim de limitar a lesão cerebral.
Uma dose IV inicial de 2 mℓ de dextrose 25%/kg, na forma de bolus, é adequada, seguida de
infusão de solução de dextrose 4%, a qual pode ser aumentada se houver baixa resposta
clínica. Também temse utilizado glucagon para o controle de hipoglicemia aguda induzida por
dose excessiva de insulina. O conteúdo de um frasco de 1 mg de glucagon deve ser adicionado
a 1 ℓ de solução de cloreto de sódio 0,9%, sendo, em seguida, administrado na dose de 50
ng/kg, na forma de bolus, seguido de taxa de infusão constante de 10 a 40 ng/kg/min, o que
dependerá da resposta.

Você também pode gostar