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after hegemony:

cooperation and discord


in the world political economy
KEOHANE, R.O. After Hegemony: Cooperation and discord in the world
political economy. UK: Princeton University Press. 1984. (p.05-48)

Resumo: Robert O. Keohane busca demonstrar através deste texto, como estratégias
adaptativas sobre construção de instituições tem o poder de mudar a realidade,
promovendo mutuamente a cooperação benéfica. Nesse sentido, o autor aborda temas
relacionados ao institucionalismo, às dinâmicas de riqueza e poder, aos regimes
internacionais e à hegemonia dentro do suporte teórico de diversas abordagens como
realismo e marxismo e particularmente do neoliberalismo.

parte 1 | questões e concepções .

Capítulo 1 | Realismo, Institucionalismo e Cooperação


● A primeira parte do livro discorre acerca do cenário mundial e busca sintetizar o que
será abordado ao longo dos próximos capítulos perante o comportamento dos
Estados no século XX. Dessa forma, Keohane (1984) contextualiza a situação
internacional, diante da crescente expansão da violência real e potencial como
também o aumento da ação estatal relacionado a situação da economia política,
observando que os maiores perigos para a economia mundial, bem como para a paz
mundial, têm suas fontes em conflitos políticos entre as nações.
● De acordo com o autor, a cooperação seguia escassa em comparação com à
discórdia entre os Estados, pois o rápido crescimento da interdependência
econômica internacional desde 1945 e o crescente envolvimento dos governos na
operação das economias capitalistas modernas, criaram mais pontos de atrito
potencial. Esta interdependência pode transmitir más ou boas influências como o
desemprego ou a inflação ou podem ser exportados como crescimento e
prosperidade. Evidenciando que esta resulta em governos democráticos que
expandem sua atividade para proteger seus cidadãos das flutuações do mundo
econômico. Devido a isso, quando o Estado busca forçar os custos do ajuste para
os estrangeiros, resulta-se em discórdia. Deste modo, mesmo em um nível absoluto
crescente de cooperação, haverá a opressão pela discórdia, à medida que a
interdependência e a intervenção governamental aumentadas, criam mais
oportunidades para conflitos políticos.
● Em consideração a isso, Keohane (1984) argumenta sobre como foi e pode ser
organizada a cooperação na economia política mundial quando existem interesses
comuns nas relações entre os países de economia de mercado avançada, onde tais
interesses são múltiplos. Em sua teoria é desenvolvido a existência de interesses
mútuos como dados e examina as condições sob as quais eles levarão à
cooperação, visto que, mesmo onde existem interesses comuns, a cooperação
frequentemente falha, portanto, ele vê a necessidade de buscar um "diagnóstico" às
razões para tal falha, e para os sucessos ocasionais, na esperança de melhorar a
capacidade de chegar a soluções cabíveis.
● Em seguida, Keohane (1984) aborda os estudiosos acerca da cooperação que
muitas vezes compararam a política mundial a um "estado de guerra", os realistas.
Para o autor, se este retrato da política mundial estivesse correto, qualquer
cooperação que ocorra seria derivada de padrões gerais de conflito e não sendo
possível existir padrões institucionalizados de cooperação com base em propósitos,
exceto como parte de uma luta maior pelo poder. As extensas referências de acordo
internacional sobre questões tão diversas como comércio, relações financeiras,
saúde, telecomunicações e proteção ambiental estariam ausentes.
● Em contrapartida, os escritores denominados "institucionalistas" veem a
cooperação como essencial em um mundo de interdependência econômica,
argumentando que interesses econômicos compartilhados criam uma demanda por
instituições e regras internacionais. Apesar de não esperarem que a cooperação
prevaleça sempre e estarem cientes da maleabilidade de interesses para argumentar
que a interdependência cria interesses em cooperação.
● Durante os primeiros vinte anos ou mais após a Segunda Guerra Mundial, as visões
entre realistas e institucionalistas, embora muito diferentes em suas origens
intelectuais e mais amplas implicações sobre a sociedade humana, fez previsões
semelhantes sobre a economia política mundial, e particularmente sobre a economia
política dos países com economia de mercado avançada. Os institucionalistas
esperavam uma cooperação bem-sucedida em um campo para que fosse possível
se ampliar a outros. Os realistas anteciparam relativamente à ordem econômica
internacional estável, como resultado do domínio dos Estados Unidos. Nenhum
conjunto de observadores ficou surpreso com o que aconteceu, embora eles
interpretaram os eventos de forma diferente.
● Após meados da década de 1960 o domínio dos EUA na política econômica mundial
foi desafiado pela recuperação crescente da Europa e rápido crescimento do Japão,
ainda que a interdependência econômica continuou a crescer e o ritmo de aumento
do envolvimento dos EUA acelerou, mesmo após 1970. Em seguida, as previsões
institucionalistas e realistas começaram a divergir. Do ponto de vista institucionalista
estrito, a necessidade crescente de coordenação de políticas, criada pela
interdependência, deveria ter levado a mais cooperação. De uma perspectiva
realista, por contraste, a difusão de poder deveria ter prejudicado a capacidade de
qualquer um para criar ordem.
● A cooperação internacional e a discórdia permanecem, portanto, intrigantes. Com
isso, o autor teoriza mais sobre a tradição institucionalista, argumentando que a
cooperação pode, sob certas condições, desenvolver-se com base em interesses
complementares, e que as instituições, amplamente definidas, afetam os padrões de
cooperação que emergem.

Cooperação e Valores
● O livro aborda mais uma tentativa de análise teórica, histórica e interpretativa do que
um exercício de ética aplicada, ampliando a compreensão da cooperação, na crença
de que um maior entendimento pode ajudar a melhorar a amizade política e o
bem-estar econômico. Keohane (1984), desaprova a cooperação entre os governos
de Estados ricos e poderosos para explorar os países mais pobres. Mesmo que os
objetivos buscados por meio da cooperação fossem julgados desejável em
princípio, tentativas particulares para alcançá-los poderiam ter efeitos perversos.
Mas defende que, sob condições de interdependência, a cooperação é uma
condição necessária para atingir níveis ideais de bem-estar, através de uma
coordenação mais eficaz de políticas entre os governos ajudaria com frequência.

O plano deste livro


● Após debruçar-se sobre o cenário no qual Keohane (1984) analisa sua teoria, é
abordado um breve resumo sobre o que será tratado ao longo dos próximos
capítulos, assim, os conceitos utilizados da economia para desenvolver uma teoria
política sobre cooperação e discórdia na economia mundial. O autor examina a
"teoria da estabilidade hegemônica" e empenha-se em definir dois termos-chave,
"cooperação" e "regimes internacionais", importantes para a teoria funcional dos
regimes internacionais, elaborada por Keohane (1984), com base nos períodos
históricos apresentados no livro.
● Avaliando, por fim o valor moral da cooperação e examinando as implicações para a
política, no qual, os regimes internacionais contemporâneos são moralmente
aceitáveis, pelo menos condicionalmente, em que, faz sentido aceitar obrigações
que restringem a própria liberdade de ação em situações futuras desconhecidas se
outros também aceitar responsabilidades, uma vez que o efeito dessas ações
recíprocas é reduzir a incerteza.

Capítulo 2 | Política, economia e sistema internacional

● Keohane (1984) estabelece que a economia política, dentro de sua análise, se refere
à interação recíproca e dinâmica de busca de riqueza e poder, dentro das relações
internacionais. Entretanto, destaca a influência do poder nessa relação, uma vez que
a distribuição de poder desenvolve padrões de direitos de propriedade e a partir
desses padrões que a riqueza é gerada e distribuída. Além disso, para o autor , são
as atividades dos atores independentes, como o Estado, que ligam a ideia de
riqueza e poder às relações internacionais. Muito porque eles são atores não
subordinados à hierarquia governamental mundial.
● O autor também faz uma crítica ao repetitivo fato dos atores internacionais
depositarem o fardo de tomadas de decisões de seus respectivos Estados, a outros
atores, ou até mesmo a um ator central, ao invés de arcar com suas
responsabilidades. Keohane (1984) afirma que esse conceito é estudado pelos
internacionalistas e que a ideia mais difícil a ser compreendida na verdade seria a
ideia de riqueza e poder.
● A partir dessa afirmação, o autor (1984), faz uma comparação entre a ideia de
riqueza de acordo com Gilpin, Adam Smith, Karl Polanyi e Lionel Robbins. E a partir
dessas objeções, Keohane (1984) chega em uma definição mais objetiva de riqueza,
como meios de satisfação de desejo que não são apenas escassos, mas
comercializáveis. Nesse caso, na economia política global, a busca por riqueza ou
“pursuit of wealth”, seria então a busca por meios negociáveis de satisfação de
necessidades, independentemente se esses meios são utilizados por seus
detentores, para fins de investimento ou consumo.
● O autor, então, ressalta que a riqueza não é utilizada como categoria primária para
explicar demanda ou preços, de acordo com a teoria econômica neoclássica do
valor. Nesse caso, o valor é alcançado de acordo com a oferta e demanda nos
movimentos de preços dos mercados. A partir dessa observação, Keohane (1984)
compartilha que acredita ser um fator comum entre os conceitos de poder e riqueza
a necessidade de observar o comportamento das relações de poder e dos
mercados.
● Keohane (1984) elabora uma esquematização para esclarecer ao leitor que as
tentativas de separar a esfera de atividade da economia e da política, resultam
apenas na frustração e no fracasso. Isso porque, ambos possuem uma relação de
mutualidade, e são poucos os casos em que a economia não interfere na política, ou
o contrário. O autor então, reforça que pensar sobre economia política internacional
em termos de riqueza e poder não permite desenvolver modelos explicativos
efetivos. Porém, o foco no entendimento de busca da riqueza e pode colaborar para
uma interpretação do assunto com maior desempenho, visto que provê hipóteses
para analisar e identificar as motivações dos atores e seus respectivos interesses.

A complementaridade da riqueza e poder


● Neste subcapítulo, Keohane (1984), reforça a ideia de vínculo entre a riqueza e
poder, e faz alusão às proposições de Jacob Viner atribuídas aos mercantilistas no
século XVII, que são quatro:

1) A riqueza é um meio absolutamente essencial para o poder,


seja para a segurança, seja para a agressão; 2) o poder é
essencial ou valioso como meio de aquisição ou retenção de
riqueza; 3) a riqueza e o poder são, cada um, fins finais
adequados da política nacional; 4) há uma harmonia de longo
prazo entre esses fins, embora em circunstâncias particulares
possa ser necessário por algum tempo fazer sacrifícios
econômicos no interesse da segurança militar e, portanto,
também da prosperidade de longo prazo. (KEOHANE, 1984, p.23)

● A ideia de harmonia estabelecida por Viner em sua última premissa é considerada


muito importante pelo autor. Isso porque, para ele, de fato existem momentos em
que a busca por riqueza e poder irá se intercalar e o estudante de economia política
internacional tem a tarefa de analisar a possibilidade de atuação de ambos os
fatores de forma separada, mas levando em consideração sua complementaridade
de longo prazo.

Análise Sistêmica da Política Internacional


● De acordo com o autor, a análise de cooperação e dos regimes internacionais
proposta tem o objetivo de destacar os Estados, justamente por esses serem os
atores cruciais para a construção de regras e práticas que serão importantes para
garantir a riqueza e o poder. O autor (1984) toma emprestado a ideia de Waltz,
afirmando que o estudo do comportamento do estado pode ser feito “de dentro para
fora” e “de fora para dentro”. O estudo das fontes de comportamento do ator, seria
um estudo “de dentro para fora”, e a explicação do comportamento do estado com
base nos atributos do sistema como um todo, é o estudo “de fora pra dentro”.
● Keohane (1984) afirma a possibilidade de outras teorias levarem em consideração as
características dos atores, assim como do próprio sistema. Nesse caso, essas
determinadas teorias consideram os atributos internos como variáveis, ao contrário
da teoria sistemática, que os consideram constantes.
● O autor deixa clara sua compreensão de teoria sistêmica como um lugar para se
começar uma análise, o que não implica que a considere uma opção
completamente satisfatória para um “primeiro recorte”. Nesse sentido, em sua visão,
o modelo prevalente de análise sistêmica política vem, particularmente, da
microeconomia. Tal teoria postulava a existência de empresas com base em
algumas funções de utilidade, tentando explicar seu funcionamento com base em
alguns fatores ambientais, como por exemplo, a competitividade dos mercados.
● Deste modo, Keohane (1984) presume a atuação de empresas como egoístas
racionais, sendo a racionalidade aqui, entendida como preferências coordenadas e
consistentes, cujos custos e benefícios são calculados de maneira a maximizar a
utilidade frente a suas preferências. Enquanto isso, o egoísmo seria relacionado ao
fato de que essas funções de utilidade não se relacionam uma com a outra, não se
perdendo ou ganhando utilidade com base nos ganhos ou perdas de outros.
● De forma geral, poderia-se ainda definir que as variações de empresas para
empresas não se contabilizam por conta de seus valores ou ainda organização
interna, mas por conta das variações de característica no sistema econômico.
Segundo Keohane (1984), sem essas suposições acerca do egoísmo e da
racionalidade, variações no comportamento de empresas poderiam ser
contabilizadas com base em seus valores, cálculo ou capacidade de fazer escolhas,
fazendo com que a análise fosse reduzida ao estudo da unidade.
● Keohane (1984) indica que teorias sistêmicas apoiadas em suposições de egoísmo e
racionalidade funcionam melhor quando há um curso de ação superior, entendido
pelo autor como "única saida”. Nessas condições, Latsis (1976 apud KEOHANE,
1984, p. 27), chama o programa de pesquisa de “determinismo situacional”, esse
programa implicaria basicamente no fato de que em determinada situação, o
comportamento dos atores os conduziria a agir de uma maneira particular visto que
se não o fizerem, sua existência poderia estar em risco. Tal programa teve grande
sucesso em situações de monopólio ou concorrência pura. Nessa situação, o
determinismo situacional funciona pois nesta situação não haveria competição por
poder em uma concorrência pura ou monopólio puro, de forma que ambos os atores
ajustariam seus comportamentos de acordo com um mercado impessoal
(competição) ou denominam mercado (em caso de monopólio).
● De acordo com Simon (1974 apud KEOHANE, 1984, p. 28), a teoria microeconômica
não gera previsões precisas sobre o comportamento em situações de
interdependência estratégica. Sobretudo, essa estratégia atormentaria não somente
parte da economia, mas também o estudo da política internacional. Nesse sentido,
Keohane (1984) busca apontar que a análise sistêmica não busca produzir previsões
de Estados perscrutando poder e riqueza. Ainda assim, a teoria sistêmica nos
ajudaria a entender, como as restrições sob as quais os governos atuam na
economia política mundial afetam seus comportamentos.
● O autor ainda considera que tomar como suposições o egoísmo e a racionalidade
(ainda que sejam hipotéticas), possuiria três virtudes importantes. De maneira
análoga, em primeiro lugar, esse ato simplificaria nossas premissas, fazendo com
que as deduções sejam mais claras. Em segundo lugar, nossa atenção seria
direcionada para as restrições que um sistema impõe aos seus atores, uma vez que
detém os determinantes de escolha constantemente. E em terceiro lugar, ajuda a
manter nosso foco nas restrições de sistema, sendo estas resultado da
desigualdade de distribuição de poder e riqueza ou das práticas de instituições
internacionais em detrimento da política doméstica. Em suma, o autor busca
demonstrar através de sua obra, como estratégias adaptativas sobre construção de
instituições tem o poder de mudar a realidade, promovendo mutuamente a
cooperação benéfica.

Capítulo 3 | Hegemonia do mundo de economia política

● Ao versar sobre a hegemonia já presenciada pelo domínio romano, britânico e norte


americano, Keohane (1980 apud KEOHANE, 1984, p. 31) destaca duas proposições
centrais da teoria da estabilidade hegemônica relacionadas a esses eventos: a
ordem na política global é tipicamente criada por uma potência dominante, fazendo
com que a criação de regimes internacionais geralmente dependam de uma
hegemonia. Já o outro princípio, implica que essa hegemonia deve ser constante.
● O autor ressalta, entretanto, que a teoria da estabilidade hegemônica implica que a
hegemonia pode facilitar certo tipo de cooperação, mas que haveriam poucos
motivos para se acreditar que somente a hegemonia seria uma condição necessária
ou ainda, suficiente, para o surgimento de relações de cooperação.
● Além disso, para Keohane (1984), a segunda grande proposição da teoria estaria
incorreta. Nesse sentido, a cooperação não exige necessariamente a existência de
um líder hegemônico após os regimes já terem sido estabelecidos, tornando a visão
sobre cooperação pós hegemônica, possível.

Avaliando a teoria de estabilidade hegemônica


● Segundo Keohane (1984), a teoria da estabilidade hegemônica, aplicada à política
mundial econômica, define hegemonia como preponderância dos recursos
materiais. Alinhado a isso, quatro conjuntos de recursos se fazem importantes: os
poderes hegemônicos devem controlar as matérias primas, fontes de capital,
mercados e vantagens competitivas na produção daqueles bens considerados
altamente valorizados. Historicamente, o autor aponta o fato de o controle de tais
fontes terem sido consideradas como assunto de máxima importância, ação esta,
que se tornou justificativa tradicional para a expansão territorial imperialista ao passo
que também apoiava a expansão da influência informal. A título de exemplificação, o
autor nos oferece os casos da Holanda, Grã Bretanha e Estados Unidos,
especialmente nos dois últimos séculos.
● Em se tratando da relação entre importaçoes e exportaçoes, Keohane (1984), aponta
que ainda que cortar o acesso de algum ator singular sobre determinado mercado
seja, historicamente, uma arma potencial importante referente ao poder econômico,
abrir seu mercado próprio para outros exportadores em troca de concessões ou
deferência também pode ser uma ferramenta influente. Quanto maior a liberdade de
ação administrativa, maior seria o poder econômico potencial de alguém. Em suma,
para o autor, a dimensão final da preponderância econômica é a superioridade
competitiva na produção de bens.
● Keohane (1984) elabora algumas observações críticas acerca da teoria da
estabilidade hegemônica, que prevê uma correlação entre hegemonia e cooperação
na economia política global, segundo a qual a cooperação é condicionada pela
hegemonia e esta, por sua vez, depende basicamente dos recursos materiais da
liderança hegemônica. O autor demonstra que, ao contrário do que prevê a teoria da
hegemonia, a ausência de uma liderança hegemônica não necessariamente leva à
discórdia e ao conflito, visto que “entre 1900 e 1913, um declínio no poder britânico
coincidiu com uma diminuição, em vez de um aumento no conflito por questões
comerciais” (KEOHANE, 1984, p. 34) 2 . Em sequência, o teórico complementa
afirmando que interpretar a prevalência da discórdia em detrimento da cooperação
no período entre guerras é difícil por conta da dificuldade em se estabelecer se havia
ou não uma hegemonia clara em termos de recursos materiais à época.
● Entretanto, o autor aborda uma versão refinada da teoria da estabilidade
hegemônica e que difere da original ao não estabelecer a relação entre poder e
liderança como algo determinado e automático na economia política global,
afirmando que a hegemonia é definida como uma situação em que "um Estado é
poderoso o suficiente para manter as regras essenciais que governam as relações
interestatais e está disposto a fazê-lo" (Keohane e Nye, 1977, p. 44 apud KEOHANE,
1984, p. 35) 3 . Assim, faz menção às motivações e características internas dos
Estados, como as atitudes domésticas, a estrutura política e processos de tomada
de decisão, que são importantes para as resoluções dos mesmos em relação ao
estabelecimento de uma hegemonia; porém, ressalta o autor, mesmo levando-se em
consideração essas variáveis, a causa das mesmas permanece indeterminada, a
menos que se realize uma profunda investigação interna sobre o país.
● Assim, ao continuar expondo as limitações do que chama de modelos causais e de
força básica, Keohane (1984) examina as características da hegemonia britânica ao
final do século XIX, que, mesmo detentora de vastas capacidades materiais, se
mostrou insuficiente para estabelecer suas regras, citando o fato de que ao contrário
da posição britânica favorável à livre navegação dos mares, a maioria das potências
continentais não manteve políticas comerciais liberais. Portanto, o autor afirma que a
teoria da estabilidade hegemônica ampara-se em poucos casos históricos e opera
de maneira mais sugestiva do que definitiva. Como resultado da escassez de
evidências empíricas, na visão de Keohane (1984), o argumento de que a hegemonia
baseada no poder é necessária para criar uma ordem estável onde floresce a
cooperação é teórico e empíricamente insuficiente.
● Entretanto, o autor não descarta a utilidade desta mesma abordagem, visto que a
mesma fornece um ponto de partida para investigações mais aprofundadas acerca
de sistemas cujas lideranças são exercidas por um único Estado. Abandonando sua
premissa inicial de que o poder é uma condição necessária e suficiente para a
cooperação, o conceito de hegemonia, definido em termos de vontade e
capacidade de liderança pode promover investigações mais frutíferas acerca das
condições e incentivos para o estabelecimento de uma hegemonia, bem como
analisar o papel de terceiros Estados neste contexto, o que muitas vezes é ignorado
pela premissa inicial.

Poder Militar e a Hegemonia na Economia Política Internacional


● Analisando a hegemonia do ponto de vista militar, Keohane (1984) afirma que a
teoria da estabilidade hegemônica prevê que um Estado hegemônico deve possuir
poder militar capaz de proteger das investidas dos adversários os seus interesses e
áreas importantes na economia política global. Para exemplificar, menciona a
utilização por parte dos Estados Unidos de seus recursos e poder militar para
garantir seu acesso ao petróleo do Oriente Médio durante e após a Segunda Guerra
Mundial.
● Ainda, o autor enfatiza que o poder militar não tem de necessariamente estender-se
por todo o mundo, alegando que nem o poder militar britânico e estadunidense o
foram nesta magnitude. Entretanto, os recursos militares devem ser tais quais
assegurem as capacidades para garantir e manter a preponderância e hegemonia
econômica. Contudo, o autor acende um alerta acerca do debate sobre o poder
militar, afirmando ser necessário levar em consideração as mudanças atravessadas
pela economia política global após a Segunda Guerra Mundial, onde observa-se
maior conexão entre sociedades e economias nacionais, que resulta no que o autor
denomina de “interdependência complexa”, afetando também a lógica das questões
militares.

Noções Marxistas da Hegemonia


● Keohane (1984) se propõe a discutir também as noções críticas acerca do conceito
de hegemonia. Ao introduzir a análise marxista, afirma que para esta abordagem as
forças fundamentais da economia política global são a luta de classes e o
desenvolvimento desigual. Neste sentido, a discussão da hegemonia ou instituições
internacionais seria fútil, visto que estes fatores operam sob a lógica, contexto,
padrões e requerimentos do sistema capitalista - que é o grande objeto de críticas
da abordagem marxista. O autor afirma que o conceito de hegemonia pode ser
compreendido como um sinônimo de dominância na doutrina marxista, e as análises
que debruçam-se sobre este conceito são parciais, visto que ignoram as
contradições que o capitalismo enquanto sistema produtivo tende a apresentar.
● A abordagem crítica marxista, conforme o autor, quando empregada na economia
política global geralmente passa a empregar uma terminologia distinta da tradicional,
focando-se em abordagens baseadas no Estado e em conceitos como imperialismo
- que possui como um exemplo, na visão dos autores críticos, a própria hegemonia
estadunidense. Ainda, Keohane (1984) afirma haver certa similaridade entre a
questão chave de sua obra - que visa compreender como a cooperação
internacional pode ser mantida entre os Estados capitalistas após a ausência da
hegemonia estadunidense - e a preocupação geral dos teóricos críticos. Esta última
consiste em descobrir “se o ultraimperialismo poderia ser revivido por novos
esforços de colaboração intercapitalista ou, pelo contrário, se contradições
fundamentais no capitalismo ou na convivência do capitalismo com o sistema
estatal impedem tal recuperação” (KEOHANE, 1984, p. 43) .
● Por outro lado, o autor afirma que a base da teoria crítica marxista compartilha
premissas em comum ao realismo, ao descrever o conceito de hegemonia baseado
em poder. Porém, o autor ressalta a validade de outras contribuições teóricas
marxistas, como o conceito de hegemonia gramsciano, que corresponde a uma
unidade de forças materiais objetivas e ideias ético-políticas, resultando em uma
ideologia que incorpora compromisso e consenso entre dominantes e dominados.
Keohane (1984) afirma que a o conceito gramsciano é importante para a
compreensão das condições de aceitação da hegemonia por parte de Estados
terceiros, e ainda diferencia os conceitos de hegemonia e imperialismo, afirmando
que o primeiro possui um caráter consensual maior que o segundo, que é
fundamentalmente coercitivo.

Conclusão
● Ao encerrar, o autor conclui que as reivindicações acerca da validade geral da teoria
da hegemonia são frequentemente exageradas, ainda que a teoria ofereça
importantes contribuições para a área, que serão levadas em consideração
posteriormente por Keohane (1984), especialmente a relação de uma liderança
hegemônica com a cooperação e o estabelecimento de regimes e instituições
internacionais. Ao ressaltar que a hegemonia e cooperação são mutuamente
dependentes, o teórico faz menção ao papel do consenso e por último, da coerção,
visto que essa pode ser livremente empregada em situações de conflito, que,
ressalta-se, são situações passíveis de ocorrer até mesmo em ambientes de
cooperação; para Keohane (1984), portanto, ambientes de cooperação não seriam
necessariamente ausentes de conflito, mas sim processos que utilizam o uso da
discórdia e diferenças para estimular ajustes mútuos.

Questão proposta pelo grupo:


Como Keohane compreende a noção de cooperação? A cooperação, na visão do autor,
poderia ser mantida sem a manutenção de uma hegemonia internacional?

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