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Introdução
Uma das referências mais antigas ao conceito de imunidade foi feita
em Atenas, em 430 a. C. Tucídides, um historiador ateniense, relatou
que indivíduos que já haviam se recuperado da peste foram capazes
de cuidar dos doentes sem recair. Desde então, numerosos estudos
destacaram a complexidade e importância do sistema imunológico.
O sistema imunológico inato é a primeira linha de defesa contra patóge-
nos invasores, compreendendo vários mecanismos de barreiras físicas
aos componentes celulares. Após o reconhecimento de um patógeno,
o sistema imunológico inato fornece resposta imunológica para reduzir
a infecção e, na maioria dos casos, o sistema imunológico adaptativo
é fundamental para conferir proteção mais duradoura. Ao contrário
da imunidade adaptativa, o sistema imune inato não está confinado
somente aos vertebrados e está presente em todas as plantas e animais.
De fato, para sermos capazes de nos defender contra o microambiente
dinâmico que nos rodeia e que está em constante mudança, povoado
por numerosas e potencialmente infecciosas comunidades microbianas,
vários membros do sistema imunológico interagem para criar e manter
uma resposta imune sob medida.
Há grande sinergia entre o sistema imune adaptativo e sua contra-
parte inata, e defeitos ou inabilidades em qualquer dos sistemas podem
2 Células mediadoras da resposta imune
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Mastócitos
Os mastócitos são células de citoplasma abundante e que contêm grânulos
ricos em histamina e outras substâncias relacionadas à permeabilidade vas-
cular (normalmente responsável pelo edema na imflamação), como heparina
e prostaglandinas. Essas células podem ser distinguidas com a coloração
histológica por azul de toluidina e são amplamente distribuídas no corpo,
mas são particularmente concentradas em locais que estão em contato com
antígenos, como o tecido conjuntivo epitelial do tecido respiratório, intestinal
e o sistema urinário.
Temos dois tipos distintos de mastócitos que diferem em sua morfologia,
coloração histoquímica e localização. O tipo 1 é abundante no tecido da maioria
dos órgãos, pode ser obtido da cavidade peritoneal de roedores e foi o primeiro
a ser descobertos, de modo que há muito conhecimento sobre eles. O outro
tipo é geralmente referido como mastócitos de mucosa porque foi observado
predominantemente no tecido da mucosa. A infecção por parasitas induz forte
acumulação de mastócitos e eosinófilos nos tecidos; quando há parasitas nas
mucosas, ocorre uma rápida resposta e expansão da população de mastóci-
tos no local. Tanto os mastócitos da mucosa quanto os mastócitos do tecido
conjuntivo são originários da medula óssea e são liberados no sangue como
células imaturas ou ainda não plenamente diferenciadas. Eles são residentes
em tecidos e não circulam em seu estado totalmente granulado, sendo envol-
Células mediadoras da resposta imune 9
Eosinófilos
Os eosinófilos são leucócitos multifuncionais implicados na patogênese de
numerosos processos inflamatórios, sendo mais classicamente conhecidos
pela atuação contra parasitas, infecções helmínticas e doenças alérgicas. Os
eosinófilos podem ser recrutados em resposta a diversos estímulos a partir da
circulação para focos inflamatórios, onde modulam respostas a partir de uma
série de mecanismos. Recrutamento e ativação de eosinófilos por citocinas,
imunoglobulinas e complemento pode levar à secreção de uma matriz de
citocinas pró-inflamatórias, quimiocinas e mediadores lipídicos. Essas mo-
léculas têm efeito na regulação de sistemas de adesão, ativação e regulação
de permeabilidade vascular, secreção de muco e constrição do músculo liso.
Eosinófilos podem iniciar respostas imunes específicas de antígeno, agindo
como células apresentadoras de antígenos (APCs). Sob condições normais,
a maioria dos eosinófilos migram para o trato gastrointestinal, onde nor-
malmente residem dentro da lâmina própria de todos os segmentos, exceto
o esôfago. Esse recrutamento constante de eosinófilos gastrointestinais é
regulado pela expressão constitutiva de um quimiotaxico específico, chamado
de eotaxina 1. Além de tráfico para o trato gastrointestinal, sob condições
de homeostase, eosinófilos também estão presentes no timo, no tecido de
glândulas mamárias e útero. O tráfico de eosinófilos para locais em que há
processo inflamatório ativo depende de várias citocinas, dentre as quais a
IL-5 e as eotaxinas são as mais eficientes em regular seletivamente o tráfico
de eosinófilos. A IL-5 regula o crescimento, a diferenciação, a ativação e a
sobrevivência de eosinófilos e fornece um sinal essencial para a expansão
e a mobilização de eosinófilos da medula óssea para os pulmões após ex-
posição a alérgenos (MURPHY; TRAVERS; WALPORT, 2010; ABBAS;
LICHTMAN; PILLAI, 2019).
10 Células mediadoras da resposta imune
Neutrófilos
Em humanos, os neutrófilos respondem por 50 a 70% de todos os leucócitos e são
a primeira linha de defesa do hospedeiro contra uma ampla gama de patógenos,
incluindo bactérias, fungos e protozoários. Além de muito impactantes como
matadores de patógenos e presentes na fase aguda da resposta inflamatória, os
neutrófilos também podem moldar o local da inflamação a partir da comunicação
com monócitos, macrófagos e células dendríticas. Os neutrófilos são células
efetoras rápidas capazes de fagocitose, recrutamento de outras células efetoras
e apoptose. Eles têm quatro mecanismos primários de ataque a patógenos:
fagocitose, geração de rajadas oxidativas, liberação de grânulos e formação de
neutrófilos. Os grânulos primários de neutrófilos são vesículas especializadas
com membrana, bastante semelhantes aos lisossomos, e contêm uma série de
agentes antimicrobianos chamados defensinas que agem sobre bactérias e fungos.
Esses grânulos primários são induzidos a se fundir com fagossomos após a
célula ter englobado um microrganismo, ajudando a matar o alvo. Neutrófilos e
macrófagos também possuem catelicidinas, que são peptídeos inativos compostos
de dois domínios ligados e processados antes da secreção. Nos neutrófilos, os
peptídeos inativos da catelicidina são armazenados em grânulos secundários
(ou tipo dois). A catelicidina é ativada quando se funde ao fagossomo junto
aos grânulos primários. As armadilhas extracelulares de neutrófilos (NETs, do
inglês neutrophils extracelular traps) são uma forma de morte celular única
dos neutrófilos em que ocorre a destruição dos grânulos internos e do próprio
núcleo, sendo a cromatina não condensada liberada no meio extracelular envolto
no conteúdo dos grânulos e efetores antimicrobianos, formando realmente como
se fosse uma rede que aprisiona patógenos, visando otimizar a morte de bacté-
rias e fungos do meio extracelular (MURPHY; TRAVERS; WALPORT, 2010;
ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2019).
Monócitos
Os monócitos desempenham um papel importante na defesa imunológica,
na inflamação e na homeostase, sentindo seu ambiente local, eliminando
patógenos e células mortas e dando início à resposta adaptativa, bem como
fornecendo um conjunto de progenitores que contribui para células dentríticas
inflamatórias e reabastecendo alguns macrófagos teciduais. Os monócitos
também contribuem para o reparo tecidual.
Células mediadoras da resposta imune 11
Células dendríticas
As células dendríticas (CD) detectam patógenos invasores devido à sua
expressão de uma variedade de sensores para componentes derivados de
patógenos, seja na membrana plasmática (por exemplo, receptores Toll-like,
TLR) ou no citosol (por exemplo, NOD como receptores). Em vez de servir
para destruir diretamente patógenos, as CD adotam uma abordagem muito
mais sofisticada. Eles agem para comunicar a presença de patógenos ao
sistema imune adaptativo, iniciando respostas antígeno específica. As CDs
realizam essa função, organizando cuidadosamente o aparato proteolítico no
sistema endossomal-lisossomal (catepsinas e outras hidrolases lisossomais),
bem como no citosol (proteassoma) e no retículo endoplasmático (ER), para
degradar parcialmente as proteínas derivadas do patógeno para produzir
peptídeos, que são carregados em moléculas MHC. Os complexos peptídeo-
-MHC resultantes são transportados para a membrana plasmática, onde são
apresentados às suas células T, que são, então, ativadas e induzidas a proliferar
e a se tornar células efetoras potentes (células T citotóxicas) ou células que
auxiliam no progresso geral do sistema imunológico. Embora outros tipos de
12 Células mediadoras da resposta imune
Macrófagos
Macrófagos são fagócitos profissionais envolvidos na reciclagem de eritrócitos,
remoção de células em apoptose e restos celulares, remodelação tecidual e
resposta a lesões e infecções. Eles são incrivelmente plásticos, mudando
rapidamente sua fisiologia em resposta ao microambiente circundante. Os ma-
crófagos podem ser classificados em dois fenótipos opostos: pró-inflamatórios
M1 e anti-inflamatórios M2.
Além disso, existem subconjuntos de macrófagos residentes especia-
lizados cujos fenótipos são únicos e adaptados à sua localização, como,
no fígado, as células de Kupffer, osteoclastos na medula e macrófagos al-
veolares. A ativação com um agonista do receptor tipo Toll, em resposta
a lipopolissacrídeo bacteriano, conjuntamente com interferon-γ, promove
a diferenciação a M1. Essa população de macrófagos tem uma capacidade
melhorada de apresentar antígeno, produz grandes quantidades de óxido
nítrico, secreta quantidades de quimiocinas e citocinas pró-inflamatórias e
promove a expansão de linfócitos T via MHC-II. Portanto, os macrófagos
M1 são vitais na defesa contra bactérias. A exposição a IL-4 ou IL-13 pro-
duzida principalmente por células T CD4+ promove a diferenciação em M2.
Esses macrófagos estão envolvidos na resposta a parasitas e fungos, além
de expressarem quantidades elevadas de arginase e proteínas relacionadas
com a matriz extracelular. Portanto, os M2 têm a capacidade de limitar a
inflamação e jogam um importante papel no reparo/remodelamento teci-
dual e na cicatrização (MURPHY; TRAVERS; WALPORT, 2010; ABBAS;
LICHTMAN; PILLAI, 2019).
Células mediadoras da resposta imune 13
Células NK
As células natural killer (NK) apresentam atividade citolítica espontânea contra
células sob estresse, como células tumorais e células infectadas por vírus.
Elas também secretam várias citocinas, como interferon-γ, fator de necrose
tumoral α, fator estimulante de colônias de macrófagos e um vasto número de
quimiocinas. A ativação e a função efetora da célula NK é bastante complexa
e discutida ainda hoje, sendo dependente da integração de sinais derivados
de dois tipos distintos de receptores ativadores e inibitórios. Assim, primeiro
ocorre a verificação de receptores ativadores e inibitórios entre a célula-alvo
e a NK; se o resultado for ativador, os grânulos da NK juntam-se à membrana
da NK e ela joga seu conteúdo diretamente no citoplasma da célula-alvo,
degranulando principalmente perforina e granzima (MURPHY; TRAVERS;
WALPORT, 2010; ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2019).
Linfócitos T e B
Os linfócitos T e B estão envolvidos na resposta imune adquirida ou antígeno-
-específica, uma vez que são as únicas células do organismo capazes de reco-
nhecer e responder especificamente a cada epítopo dos antígenos. As células
B têm a capacidade de se transformar em plasmócitos e são responsáveis pela
produção de anticorpos. Assim, a imunidade humoral depende das células B,
enquanto a imunidade celular depende das células T.
Genericamente, do ponto de vista morfológico, os linfócitos T e B são indis-
tinguíveis, pois ambos são pequenos e com núcleo grande com heterocromatina
densa e citoplasma com pouco volume. Quando são ativados, podem crescer,
aumentando, assim, seu citoplasma e o número de organelas. Os linfócitos
apresentam receptores para reconhecimento de antígeno receptor tipo T para
os linfócitos T e tipo B para os linfócitos B, com diferentes especificidades.
Os genes que codificam essas estruturas sofrem uma série de recombinações
de DNA, o que lhes confere uma imensa diversidade fenotípica. A ativação
e diferenciação das células T é dependente da confluência de três fatores:
interação do receptor de célula T com o peptídeo apresentado pela molécula
HLA; sinalização através de moléculas coestimulatórias; e participação de
citocinas que iniciam a expansão clonal. Tanto células apresentadoras de
antígeno quanto anticorpos podem ativar o receptor de linfócito B, que induz
uma intensa sinalização celular que muda a expressão celular do linfócito de
acordo com sinais acessórios ao estímulo do receptor (MURPHY; TRAVERS;
WALPORT, 2010; ABBAS; LICHTMAN; PILLAI, 2019).
14 Células mediadoras da resposta imune
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