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CAPÍTULO IV

DIREITO BANCÁRIO MATERIAL

Secção I

Atividades Bancárias

1. Os sujeitos e o objeto. Banqueiros e clientes


2. As atividades/operações bancárias. Classificação e caracterizações
2.1. Critérios
2.2. Natureza comercial
2.3. Operações reservadas

Em geral, toda a operação bancária encontra-se traçada em torno da intermediação de


crédito e de investimento, donde os bancos e as sociedades financeiras lucram
grandemente. Por esta razão, o legislador preocupou-se em estabelecer o conceito de
operação de crédito nos termos seguintes: “São consideradas como operações de crédito
as operações de empréstimos, desconto, pensão, aquisição de créditos, de garantia de
financiamento de vendas a crédito e de locação financeira”, art.5º/1, Lei nº10/97;
E define a operação de investimento como “aquisição de participações em empresas
existentes ou em informação e todas as aquisições de valores mobiliários efetuadas por
pessoas públicas ou privadas”, art.5º/2, ambos da Lei n.º10/97. Entretanto, veja-se ainda o
conceito da operação de crédito na actuaL LRB4/2008, arts.2º e 3º.
A Lei n.º 10/97, ao abrigo do seu art.7 e ss, consagra o importante princípio da
exclusividade das operações típicas de crédito e da própria designação dos bancos,
respetivamente, apenas reservadas às entidades constituídas, habilitadas e autorizadas a
exercer a profissão bancária nos termos definidos nos artigos 3º da mesma lei. Porém, no
sentido de que apenas os bancos e os estabelecimentos financeiros autorizados por lei
podem praticar as operações previstas na lei, não se deve utilizar a designação banco,
banqueiro ou bancário sem que para tal esteja autorizado.

Ao abrigo da Lei n.º 04/2008, entretanto, em princípio, os bancos estão vedados de


efetuarem, quer por conta própria, quer por conta de outrem, as atividades comerciais,
industriais, agrícolas ou de serviço, com importante ressalva de estas operações serem
absolutamente indispensáveis ou necessárias ao desempenho da profissão bancária, ou seja,
relevantes para a recuperação ou cobrança dos seus créditos, art.43º, Lei n.º 04/2008

Os bancos não podem comprar as suas próprias ações ou consentir em créditos contra
afetação como garantias das suas próprias ações, art.44º. Lei n.º 08/2008

O art.45.º 3º parágrafo, prevê que “qualquer que seja o montante, todo o empréstimo ou a
garantia concedida por um banco aos seus dirigentes, aos principais acionistas ou
associados ou às empresas privadas nas quais as pessoais mencionadas acima exerçam
funções de direção, administração ou gestão ou detenham mais de ¼ do capital social,
deverá ser aprovado por unanimidade pelos membros do Conselho de Administração do
Banco e apresentado no relatório anual dos revisores de contas à Assembleia de acionistas”;

A lei concede ao Ministro das Finanças a faculdade de, mediante um parecer prévio da
Comissão Bancária, afastar todas as interdições previstas nos termos do art.43º a art.45º, ex
vi do art.46º.

Em suma, a operação bancária constitui uma atividade desenvolvida pelo banco que
consiste, essencialmente, na receção e disponibilidade de dinheiro, de um lado e, do outro,
na multiplicação e intermediação de crédito. Portanto, é impossível conceber uma operação
bancária sem a intervenção do sujeito banco, devendo tratar-se de um banco legalmente
autorizado.

Critério para aferição das operações bancárias. Identificação da questão. Critério


subjetivo e objetivo.

Os contratos e as operações bancárias revestem, em regra e para todos os efeitos, a natureza


comercial, arts. 2.º e 362.º Ccom. Todavia, as operações bancárias comportam algumas
particularidades que se prendem, de um lado, com as intermediações de créditos, e do
outro, com as instituições nelas intervenientes e, consequentemente, nalguns casos, levam
as necessárias derrogações de regras comuns em benefício de aplicações de regras
especiais. Por isso, é indispensável apurar quando é que estamos em face de uma operação
bancária em especial. Assim, contrapõem-se os dois critérios seguintes:
a) Critério subjetivo – estamos perante uma operação bancária sempre que haja
uma intervenção do sujeito-Banco numa dada operação. Portanto, sustentam que
é a presença de um banco que qualifica um contrato bancário, e não a operação
em si, sem a intervenção do banco;
b) Critério objetivo – contrário ao anterior, este critério informa que é a atividade
de intermediação de crédito que carateriza uma operação bancária, e a qualidade
do sujeito que intervenha na atividade;

c) Críticas aos critérios anunciados e adoção da teoria eclética.


Nenhum dos critérios acima referidos nos parece inteiramente satisfatório por si só. Ambos
pecam por excesso e por insuficiências, consoante potenciam a inclusão nas operações
bancárias às outras operações comerciais e civis que não se identificam minimamente com
as atividades de intermediações de créditos, ou excluem do seu âmbito algumas atividades
conexas com estas.
Assim, podemos afirmar que o critério subjetivo não colhe porque se inclui no seu conceito
outros contratos ou operações que não se reconduzem no âmbito das operações bancárias,
embora praticadas pelo sujeito Banco, designadamente, um contrato de trabalho celebrado
com os respetivos colaboradores, contrato de arrendamento para instalação de uma agência
ou sucursal bancária, etc. Portanto, a pertinência destes contratos nos bancos não os
transformam, ipso facto, em contratos bancários; continuam sujeitos aos regimes jurídicos
específicos.

Por outro lado, o critério objetivo não consegue superar o anterior, por isso, também não
procede, sobretudo, por não conseguir incluir e explicar outras atividades que, embora não
se tratem de intermediação de crédito, são meramente conexas ou acessórias destas, por
exemplo: depósito em cofre-forte.

Portanto, concluímos que a aferição de operação ou contrato bancário não pressupõe apenas
a existência e intervenção de um sujeito banco.
Pressupõe antes que a atividade praticada tem veste de uma operação de intermediação de
crédito e outras operações típicas bancárias, designadamente, as operações conexas ou
acessórias.

Portanto, a operação bancária corresponde a toda a atividade desenvolvida pelo


banco no âmbito da sua profissão financeira ou bancária.

Classificação de operação bancária.

As operações bancárias são suscetíveis de várias classificações, entre as quais se destacam:

a) Operações ativas – quando o banco assume a veste de credor do cliente,


designadamente nas operações de empréstimo, concessão de crédito, desconto,
antecipação, descoberto em conta, leasing, mútuo, factoring, etc. São nestas
atividades que o banco emprega os fundos e poupanças detidas e recebidas, máxime,
mediante a concessão de crédito;

b) Operações passivas – correspondem àquelas em que o banco recebe dinheiro do


cliente, assumindo o banco a veste de devedor, maxime, nos depósitos de dinheiro,
redesconto, etc. É aqui que o banco capta os fundos ou recebe ”crédito” que aplica
nas suas atividades de intermediações e nos outros fins próprios, designadamente,
investimentos, aforro, custódia, serviço de caixa, etc. Ou seja, nesta operação, no
fundo, o cliente concede crédito ou empréstimo ao seu banco;

c) Operações neutras/atípicas – estas não reconduzem a nenhuma das duas


classificações anteriores, ou seja, nestas operações, o banco não exerce a função
típica de receção e concessão de crédito, mas presta um serviço ao seu cliente.
Acontece nas operações de depósitos de títulos e em cofre-forte, nas de
mediação, nomeadamente na emissão de ação e obrigação, hipotecas, prestação de
garantias bancárias, abertura de crédito documentário, administração de bens e
direitos dos clientes, pagamento e cobrança por conta de terceiros, a própria
transferência bancária, aluguer de cofres, etc.
Os contratos bancários.

Noções gerais e características

Os contratos bancários acompanham toda a dinâmica da atividade bancária. Mediante os


mesmos, os bancos realizam as suas funções típicas essenciais.

Entretanto, o início e a manutenção de qualquer vínculo jurídico entre o banco e o seu


cliente faz-se através de um ou mais contratos bancários. Estes contratos são de
diferentes espécies e assumem naturezas diversificadas. Esta heterogeneidade de conteúdos
e operações, tornam praticamente impossível a tarefa de elaboração de um conceito preciso
do contrato bancário. Por isso, tentaremos elaborar um conceito mais abrangente.

Assim, podemos definir os contratos bancários como um ou mais acordos celebrados


entre os bancos e os seus clientes, no âmbito das suas profissões, que se traduzem, no
fundo, na gestão e tratamento de dinheiro com vista à realização dos lucros, bem como na
prestação de vários serviços em benefício dos seus clientes.

Os bancos gozam de liberdade contratual na conclusão do contrato, art. 405º CC,


contudo, dado o interesse público de serviços e operações bancárias, parece que os
bancos não podem de forma arbitrária recusar prestar serviços ou concluir contratos
bancários com os clientes, salvo se houver uma razão que justifique tal recusa. Os
clientes não gozam do direito de exigir a conclusão do contrato, mas podem sempre
reclamar do facto ao BCEAO.

Nos termos do art. 362.º Ccom fez-se uma enumeração de contratos bancários, entre
os quais se destacam o contrato de abertura de conta – um contrato nuclear concluído
mediante CCG e usos bancários, sendo a partir dele que se iniciam as complexas
relações entre o banco e o seu cliente, traduzindo-se num conjunto de obrigações do
banco perante o cliente, nomeadamente, disponibilização de uma conta em que os
movimentos de dinheiros são efetuados, quer a débito quer a crédito; receção de
depósitos; realização de pagamentos; emissão de cheques; e, em suma, conjuntos de
operações de giro bancário colocadas à disposição da clientela, etc.
Diz-se que é um contrato nuclear porque a partir dele surgem outros tantos contratos,
designadamente, a conta corrente bancária, o próprio contrato do giro bancário, o depósito
bancário e a convenção de cheques, embora cada um destes contratos preservem as suas
autonomias face ao contrato nuclear de abertura de conta.

Os bancos celebram contratos de financiamento, através dos quais proporcionam aos


clientes interessados determinados montantes disponibilizados dos seus fundos, durante um
certo tempo e com a finalidade de virem a ser restituídos mediante remuneração fixada ou
acordada, designadamente – contratos de abertura de crédito, de mútuo, desconto bancário,
crédito documentário, locação financeira, cessão financeira, descoberto em conta (open
account), etc. A par destes contratos, avultam ainda outros tantos celebrados pelos bancos,
v.g., contratos de garantias – as garantias bancárias constituem uma operação tipicamente
realizada pelo banco (penhor bancário ou financeiro, cartas de conforto, etc).

O surgimento e desenvolvimento do sistema informático e a informatização da banca


tiveram profundas repercussões nos planos de contratos bancários e, desta forma, sofreram
importantes alterações, permitindo-se que os mesmos sejam concluídos através de meios
eletrónicos, designadamente através de internet, etc. Isto tem particular incidência no
domínio do direito do consumidor, pelo facto de um dos contraentes nos contratos
concluídos mediante o recurso à internet ser um consumidor. Justifica-se, neste sentido, a
adoção de novas medidas ou alteração das já existentes com vista a garantir maior eficácia
à proteção do consumidor neste tipo contratual.

Nos ordenamentos jurídicos Guineense e Português inexistem regulamentações específicas


dos contratos bancários, no entanto, tratando-se de contratos comerciais específicos,
algumas das suas soluções são encontradas mediante o recurso ao regime geral previsto no
código comercial, designadamente, as regras dos arts. 362 e ss e art. 403.º e ss, ambos do
Ccom, que se mostram aplicáveis às estruturas e as atividades bancárias; sem descurar
ainda das regras do CC, sobretudo as regras respeitantes ao direito das obrigações, já que os
arts. 3.º e 362.º Ccom, impõem o recurso ao CC, em relação a qualquer questão que possa
ser resolvida pela lei comercial;
Assim, podemos caracterizar os contratos bancários como contratos comerciais
especializados, praticado exclusivamente por banqueiros no âmbito da sua profissão que,
materialmente se traduz no tratamento e manuseio de dinheiro e nas demais operações a ele
conexas.
Porém, podemos enumerar os seguintes contratos bancários: abertura de conta, o
depósito bancário, a convenção de cheque, o giro bancário, emissão de cartão, etc.

Apesar das diversidades de espécies e conteúdos destes contratos bancários, ambos se


identificam pelas características comuns que os informam, designadamente:

i- Parece possível reconduzir estes contratos à categoria de contratos intuitus


personae, porque as conclusões destes contratos pressupõem uma certa tutela e
investidura de confiança inter-partes, tanto que a falta de confiança constitui a justa
causa para a recusa de contratação por parte do banco. Por exemplo: não pode exigir
ou obrigar ao banco celebrar o contrato de concessão de crédito de consumo com o
mesmo cliente mau pagador.
ii- São concluídos mediante CCG, pré-elaborados pelos bancos, e os clientes limitam-
se a aderir ao mesmo, mas nada impede que nalguns casos pontuais os bancos e os
clientes façam negociações isoladas conducentes a um ou mais contratos bancários.
Os contratos bancários são celebrados mediante cláusulas contratuais padronizadas
uniformemente, prévia e unilateralmente elaboradas pelo banco e destinadas a uma
massa indeterminada de potenciais contrapartes, assistindo-lhes apenas o direito ou
a opção de aderir ou rejeitar, sem quaisquer hipóteses de negociações.
iii- São normalmente contratos duradouros, pois as suas execuções protraem -se no
tempo. Todavia, nada impede que as partes concluam contratos de execuções
instantâneas, designadamente, nas aberturas de contas de passagem, ou quando uma
pessoa se dirige a um guichet de um banco, celebrando um contrato com o fito de
lhe ser prestado um serviço pontual de transferência bancária de determinada
quantia monetária que disponibilizou ao banco.
iv- São contratos onerosos, pois, são sempre realizados devido a uma contraprestação,
quer dos serviços prestados pelos bancos, quer dos benefícios auferidos pelos
capitais emprestados, mutuados ou concedidos. Estas contrapartidas traduzem-se em
“sacrifícios” económicos impostos aos clientes e correspondem a taxas, comissões,
juros cobrados e outras despesas, v.g., de manutenção de contas, etc.

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