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DIREITO BANCÁRIO- MESTRADO DE DIREITO EMPRESARIAL

INÊS ALFACINHA

Try to live every day like Elle Woods after Warner told her she wasn’t smart enough for Harvard Law
School
O estudo do Direito bancário é o estudo do Sistema financeiro e este decompõe-se em 3 grandes áreas:
1- Área da banca
2- Área do mercado de capitais ou de mercado de valores imobiliários
3- Área dos seguros e fundos de pensões

Estas áreas antes eram tidas como tradicionalmente separadas, sucede que aquilo que é o coração do direito bancário tem a ver com a receção
do deposito, com a concessão de crédito e pagamentos bancários- há aqui 3 serviços principais que caracterizam em termos gerais o objeto do
Direito Bancário.

Um artigo que é muito importante é o artigo 2ºA/1/w) do RGIC que define as instituições de crédito: “instituição de crédito, a empresa cuja
atividade consiste em receber do publico depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder crédito por conta própria”.

Uma das maneiras de olhar para esta contraposição das 3 áreas era dizer que na banca as aplicações são seguras, no seguro o risco é
assumido pela seguradora e o mercado de capitais é que tem o risco e é o objeto central dos instrumentos financeiros.

• Porém acontece que mesmo o produto bancário tem riscos. Por exemplo: BPP e o BES. E mesmo os produtos de seguros, hoje em
dia temos produtos de seguros que podem implicar um risco de perda significativo, há até um conceito de base da atual legislação
seguradora que se chama os produtos de investimento com base em seguros e esta expressão é por si a tradução perfeita que podemos
ter produtos com risco também na área dos seguros. Então, não é sustentável a diferença entre banca, mercado e seguros com esta
ideia de que só há risco no mercado de capitais.

Por outro lado, hoje em dia há uma crescente ligação entre estas 3 áreas, não são áreas isoladas, há uma complementaridade grande entre
a banca, seguros e mercados de capitais.
1- Isto decorre do facto dos bancos serem distribuidores quer de produtos de mercados de valores mobiliários, quer de produtos
segurados. Os circuitos de distribuição são os mesmos de produtos de natureza diferente.
2- Também acontece que em termos de riscos equivalentes que são estruturados de forma diferente, formalmente é um seguro, mas
podem ter um risco semelhante, por exemplo de um fundo de investimentos;
3- Como podemos também ter depósitos que são estruturados, cujo rendimento depende da evolução de determinados índices ou
instrumentos financeiros do mercado de valores mobiliários. Esta realidade hoje em dia é crescentemente interligada e
complementar.
É evidente que esta aproximação de produtos e profissionais, o universo de operações, canais de distribuição e instituições é claramente comum
ou tem zonas comuns entre as 3 áreas- não quer dizer que não haja diferenças, mas há contactos muito relevantes. Isto obriga-nos a ter um olhar
mais atento para aquilo que é verdadeiramente o Direito Bancário e o que é que o distingue

Há duas formas de traçarmos a fronteira:

1- ATIVIDADE BANCÁRIA- Artigo 2ºA/1/w) do RGIC- “instituição de crédito - a empresa cuja atividade consiste em receber
do publico depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder crédito por conta própria”.
Tudo o que é a receção de depósito ou fundos reembolsáveis são chamadas operações bancarias passivas. A concessão de
créditos forma as operações bancárias ativas. Este é o eixo principal daquilo que é a atividade bancária.
2- INSTITUIÇÕES QUE OPERAM NO SISTEMA BANCÁRIO- Por outro lado temos as instituições que operam
profissionalmente na área bancária. Temos a título principal as instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições
auxiliares a estas (autoridades de supervisão).
Hoje há muitas outras instituições que são auxiliares, mas as instituições de crédito e as sociedades financeiras retratam o essencial
das instituições financeiras. O que significa que o Direito Bancário não é apenas o direito dos bancos. Quando falamos em direito
bancário não nos dirigimos apenas aos bancos que são uma subespécie das instituições de crédito. Há outras instituições que
aparecem descritas no artigo 6º e 3º do RGIC e que vão muito alem daquilo que são os bancos no sistema bancário.
Interessa agora perceber que há uma discussão corrente na área bancaria sobre o que se chama as instituições bancarias na sombra
ou o shadow baking. Esta ideia reporta-se a instituições que não sendo embora instituições de crédito ou sociedades
financeiras acabam por cumprir funções económicas ou de recolha de fundos ou de concessão de crédito, não sendo no
âmbito bancário. Por exemplo: cash funds acabam por injetar financiamento em sociedades, o que é uma função próxima da
função bancaria.
O tema coloca-se porque a atividade bancaria é uma atividade intensamente regulada e se existe ao lado dos bancos instituições
que cumprem funções semelhantes às dos bancos podemos ter problemas graves de assimetria regulatória.

CARACTERISTICAS DO DIREITO BANCÁRIO.

Algo que é importante é distinguir Direito Bancário institucional e Direito Bancário material:
• Direito Bancário institucional: compreende o estudo das instituições;
• Direito Bancário material: refere-se aos negócios, contratos e operações bancárias.
É difícil fazer esta separação em termos segregados porque há operações pe. sujeitas a autorizações.
• O que podemos dizer é que o Direito Bancário institucional é por regra direito público e, portanto, é um ramo do direito em que
há prerrogativas de supervisão que se aplicam às instituições, há atos administrativos, há procedimentos administrativos, etc.
• Os negócios bancários são negócios de direito privado, embora haja contaminação de várias normas injuntivas e, portanto, não é
apenas a aplicação pura do Código Civil no resultado final do Direito Bancário material.

Outra classificação do Direito Bancário é a que distingue:


• Direito Bancário comportamental: reporta-se ao conjunto de regras que regulam a relação de clientela, o que é o comportamento
devido das instituições bancárias no relacionamento com os seus clientes, pe. deveres de informação, de segredo, etc.;
• Direito Bancário prudencial: é aquele que se liga à prevenção e à gestão de risco de instituições bancárias.

São duas grandes áreas quando estamos a tratar do componente mais institucional da banca.

Há deveres gerais que se aplicam a qualquer contrato e depois há deveres particulares que se aplicam dependendo do tipo de contrato
bancário em causa.
Pe.: o dever de organização tem uma dimensão comportamental, mas também prudencial. Esta divisão não é académica, é hoje muito importante.
Isto porque em Portugal e em toda a UE temos agora autoridades diferentes para a supervisão comportamental e para a supervisão prudencial.
A entidade competente para a supervisão comportamental é o Banco de Portugal e durante mais de 100 anos, o Banco de Portugal era a
entidade competente em termos de latitude da supervisão A entidade competente para a supervisão prudencial, especialmente para instituições
de grande dimensão é o BCE. Há uma delimitação clara do que é prudencial e comportamental. Mas pe. a governação é tratada como supervisão
prudencial e há um regulamento que enuncia de forma taxativa todas as matérias que são consideradas prudenciais. Esta atribuição de
competência ao BCE insere-se num projeto europeu mais amplo que é a da União Bancária Europeia: há uma autoridade única de supervisão
com competência para supervisionar todos os bancos da zona euro e há identicamente uma entidade de resolução que tratará da resolução na zona
euro (CUR).

A digitalização da banca como novo paradigma


Atualmente também é fundamental entender que a banca funciona num contexto tecnológico totalmente diferente, o paradigma hoje é da
digitalização da banca, o primado das transferências digitais, o homebaking, a utilização de cartões, etc. - são realidades que são triviais
no mundo catual. É imperativo olhar para o Direito Bancário à luz destas realidades.
E, portanto, hoje temos novos deveres bancários, novos temas abrangidos pela legislação bancária, novas fontes de regulação, etc. - há
vários desenvolvimentos recentes a ter em consideração. Em parte, o Direito Bancário tem um tronco fundamental que é a relação das
instituições bancárias com os seus clientes e daí que seja uma área muito regulada. Mas também a relação entre bancos seja igualmente importante.
As principais diretrizes da moderna evolução do Direito das operações bancárias são as seguintes:
• massificação;
• tutela do consumidor bancário;
• informatização/digitalização dos serviços;
• internacionalização;
• relevo (macro e micro) sistémico - temos regras micro que têm a ver com o equilíbrio financeiro de cada instituição e regras macro que
têm a ver com a estabilidade do sistema financeiro.

Operações e instrumentos financeiros híbridos


Podemos ter operações ou produtos bancários que são híbridos, isto é, combinam aspetos da atividade bancária com outras áreas do
sistema financeiro. Exemplos:
• Depósito estruturado: uma parte da rendibilidade ou remuneração do depósito está dependente de instrumentos financeiros. O risco
que está aqui indexado não é apenas o risco do banco,mas também o risco de ações a que está ligado.
• Depósito dual: apresenta-se quando a comercialização de um depósito bancário é feita em paralelo e simultâneo de um outro produto
financeiro (pe. seguro de vida).
A complexidade dos produtos pode ser maior, e por isso, os temas da informação ganham um papel central. Quais são os critérios que são falíveis
para distinguir o Direito Bancário?
• a instituição que assegura a distribuição, ou
• o perfil económico do produto.
Aquilo que caracteriza um depósito bancário, o que é o típico produto bancário, ancora-se na existência de um dever de reembolso. Há
depósito bancário, há produto bancário quando existe dever de reembolso. O dever de reembolso significa que a instituição financeira
deve reembolsar pelo menos 100% daquilo que foi financiado. Houve um entendimento do Banco de Portugal e da CMVM que esclarecem o
que é um depósito bancário: há um depósito bancário quando há garantia do reembolso integral do montante aplicado.
Se há um produto financeiro qualquer que diz que em caso de mau desempenho do produto o cliente apenas tem direito a 90% do que foi investido
esse produto não é um produto bancário, não é um depósito e por isso, não pode qualificar-se como depósito. Se é depósito então é que há uma
garantia integral do montante que é aplicado.
Houve várias decisões jurisprudenciais à volta deste tema porque sendo depósito bancário está coberto do fundo de garantia de depósito, que tem
uma garantia até 100.000€ enquanto que os outros têm garantia apenas até 25.000€.
Este tema da garantia do aforro é um tema muito importante. O fundo de garantia de depósitos tem uma garantia até 100.000€. O sistema de
garantia dos investidores é até 25.000€. E nos seguros não há garantia. A expressão desta diferença é então muito importante. Nós aqui vamos
focar nos produtos bancários, sujeitos às regras bancárias e às fontes bancárias.
Fontes
Caso prático: António pretende constituir um depósito estruturado no seu banco - que alega dispor de um produto adequado ao que procura, mas
de momento não tem informação disponível para lhe facultar. Pode o depósito ser constituído antes da prestação de informação respetiva?
Quando resolvemos os casos devemos:
• qualificar o contrato em causa;
• detetar as fontes.

Neste caso temos fontes europeias (Regulamento no 1286/2014 de 25 de Novembro de 2014) e fontes nacionais (Regime Jurídico dos Depósitos
Estruturados que consta de anexo da lei no 35/2018).

Visão geral das fontes:

Apesar de haver um regime geral, o certo é que há uma grande dispersão de fontes e instabilidade de fontes. Temos vários níveis de
regulação.

• Nas fontes nacionais temos de ter em conta:


o as fontes legislativas - estão em causa leis e decreto-leis;
o as fontes regulamentares - estão em causa avisos e instruções do Banco de Portugal.
• No âmbito da soft law, das recomendações temos as cartas circulares do Banco de Portugal. A aprovação de uma carta circular leva a
que as instituições procurem o seu pleno acolhimento e portanto, não devemos desconsiderar o relevo das cartas circulares.
• Depois temos as fontes europeias:
o as fontes de nível 1 - são os regulamentos ou directivas que estabelecem os princípios gerais em matéria bancária. Pe.:
regulamento sobre matéria prudencial, a CRD IV ou o CRR;
o as fontes de nível 2 - também são fontes legislativas, mas são aprovadas pela Comissão Europeia, ou seja, são
regulamentos da Comissão Europeia. A ideia é a de lhes caber o desenvolvimento analítico daquilo que são as indicações
das fontes de nível 1. Há um complemento, mas são fontes legislativas.
o as fontes de nível 3 - já não são leis, são soft law. Aqui encontramos quer orientações (guide lines), quer respostas (Q&A)
da EBA (Autoridade Bancária Europeia).

Este quadro aplica-se a todo o Direito Bancário financeiro (também vale para mercado e seguros).

Assim, como quadro geral das fontes de Direito Bancário temos:


o Direito Internacional Bancário (pe.: Lei Uniforme sobre o Cheque);
o Atos normativos europeus (incluindo diretiva e regulamentos europeus e do BCE);
o Constituição;
o Legislação interna (ex.: RGIC);
o Avisos do Banco de Portugal;
o Instruções do Banco de Portugal;
o Soft law bancária (Q&A e Orientações EBA, Cartas-circulares do Banco de Portugal).

Visão geral das fontes (slide 48)


Podemos dizer que há normas de direito público e normas de direito privado. Há normas gerais que são sempre aplicáveis, como o Código Civil.
o Temos fontes internacionais, nomeadamente: o regulamento Roma I que também se aplica aos contratos bancários, a Lei Uniforme do
Cheque, etc.
o Fontes europeias- Esta hierarquização das fontes europeias foi concebida para ter apenas o essencial no nível 1 e depois o
desenvolvimento no nível 2 e interpretações no nível 3. Sucede, porém, que o volume regulatório no nível 1 catapultou uma produção
inusitada também no nível 2 e no nível 3. Ex.: o CRR é um diploma com mais de 300 páginas. Temos então um problema de excesso de
produção regulatória que em certa medida é gerado por esta estratificação normativa em vários níveis.
▪ Dentro das fontes de nível 1 temos então a CRD IV ou o CRR pe. E depois temos uma série de diplomas em seu
desenvolvimento.
▪ A European Banking Authority (EBA) tem uma importância grande em termos técnicos porque antes de haver regras de
nível 2 elas são sujeitas a um parecer técnico da European Banking Authority (EBA) - é a proponente das medidas que são
aprovadas pela Comissão.
▪ Fontes de regime europeu financeiro: As diretivas podem ser de harmonização mínima ou máxima. O problema que a
harmonização mínima suscitava fez com que fosse criado o nível 3.
o As fontes de direito interno:
▪ A principal lei portuguesa é o RGIC, tem 14 títulos. Tem várias deficiências, não funciona como verdadeiro
regime geral, não impediu vária legislação que escapa a este diploma. Isto tem a ver sobretudo com legislação sobre
proteção do consumidor bancário.
▪ Depois temos algumas regras no Código Comercial, mas não têm uma importância relevante na prática.
▪ E depois temos muitos diplomas importantes na área do Direito Bancário, que o prof. Paulo Câmara vai
colocando no moodle. Há centenas de diplomas vigentes na área bancária o que dificulta a análise desta matéria.
• O Banco de Portugal tem então poderes regulamentares, aprova regulamentos e instruções. As cartas-circulares têm aqui uma
natureza puramente recomendatória (são os chamados actos quase normativos).

Na preparação das fontes de Direito Bancário, temos o Comité de Basileia - não é uma autoridade, funciona no âmbito do Bank for
International Settlements - é um caso de estudo de estrutura mundial especializada na harmonização prudencial. São regras técnicas com enorme
legitimidade e que se transformam em padrões mundiais das regras prudenciais bancárias.

Caso: É obrigatória a adoção de código de conduta por bancos? Não, só os regulamentos. Os avisos e as instruções é que são fontes
vinculativas. No entanto, há uma regra importante a propósito dos códigos de conduta, que é o art 77o-B do RGIC:
▪ Um código de conduta é um instrumento de Auto vinculação. O autor do código de conduta é o próprio banco, a própria instituição
de crédito. Apesar deste espaço de Auto vinculação, na verdade este art obriga a adoção de códigos de conduta. A lei obriga a
adoção dos códigos de conduta e mais, diz o RGIC que está sujeita a orientações do Banco de Portugal, que pode emitir instruções
para o efeito. Na prática, em muitas situações o código de conduta repete o conteúdo das regras jurídicas aplicáveis aos bancos. À
medida que a densidade regulatória no âmbito do Direito Bancário aumenta, a capacidade de um conteúdo verdadeiramente inovatório
e autónomo do código de conduta é cada vez mais limitado.

Usos bancários: Os usos em Portugal são fonte mediata, só podem valer como fonte jurídica quando a lei expressamente o determinar. Há
dois casos em que a lei bancária confere dignidade normativa aos usos:
▪ Artigo 407º do Código Comercial: os depósitos feitos em instituições de crédito regem-se pelos respectivos estatutos, naquilo que não
estiver disposto na lei. O conceito de estatuto é entendido há mais de 100 anos como usos - tem a ver com os usos dos depósitos.
▪ Artigo 87o/3 do RGIC: na aplicação da legislação da defesa da concorrência ter-se-á em conta os bons usos da actividade bancária e por
isso, nessa medida é importante atender àquilo que são os usos bancários nesta matéria.
▪ Uso em matéria de depósito de cheque só é creditado quando o cheque tem boa cobrança.

O direito bancário abrange normas e princípios jurídicos conexionados com a banca, abarcando o universo relativo aos bancos, às
instituições de crédito, às sociedades financeiras e, em geral, à atividade desenvolvida por essas entidades, com os seus clientes.

O Direito bancário regula duas grandes áreas:

1- DIREITO BANCÁRIO INSTITUCIONAL ou ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO- Debruça-se sobre os bancos e


demais instituições, as condições de acesso à sua atividade, a regulação ou supervisão, a fiscalização e as diversas regras conexas.
Este dispõe de uma forte delimitação:
• DIREITO PÚBLICO: Tem a ver com a função e atuação financeira do estado. Entre nós esse papel é de modo
alargado assegurado pelo Banco Central- O banco de Portugal (lei orgânica- lei nº5/98 de 31 de Janeiro). A este
cabe-lhe gerir as disponibilidades externas do país, agir como intermediário nas relações monetárias internacionais
do estado, velar pela estabilidade do sistema financeiro nacional a aconselhar o governo nos domínios económico e
financeiro – artigo 12º da LOBP. Compete-lhe como banco emissor, emitir moeda- artigo 6º LOBP e artigo 106º
TCE), ser entidade fiscalizadora – artigo 17º LOBP- detendo ainda poder normativo através da publicação de avisos-
artigo 99º RGIC. Acrescentemos ainda o poder de superintendia do governo.
• DIREITO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS
• DIREITO PRIVADO: cumpre referir o título VI do RGIC, atinente a regras de conduta, onde surgem importantes
deveres.
• DIREITOS INSTRUMENTAIS E ACESSÓRIOS: Por exemplo, regras de registo- artigo 65º e seguintes RGIC-
ou regras contraordenacionais- artigo 201º RGIC.

2- DIREITO BANCÁRIO MATERIAL ou ATIVIDADE DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS-


Relações que se estabelecem entre a banca e particulares.
▪ O dinheiro é a razão de ser do direito bancário, pois sendo este a bitola de valor de coisas e meio
geral de trocas, implica a intervenção de entidades especializadas- a banca (intermediação
financeira). À partida é um direito contratual, reportando-se a determinados contratos
comerciais, submetendo-se ao direito das obrigações, com as particularidades ditadas pela sua
natureza comercial. Os atos bancários não esgotam, contudo, o universo do direito bancário
material:
▪ VINCULAÇÕES EXTRANEGOCIAIS: deveres de informação e de lealdade assentes na lei
ou no princípio geral da confiança (pré-negociais ou pós eficazes);
▪ RESPONSABILIDADE BANCÁRIA: Instituto geral da responsabilidade civil;
▪ DEVERES LEGAIS E AS SITUACOES JURIDICAS ABSOLUTAS que devam ser
particularmente aplicáveis nas situações bancarias

Regime Geral das Instituições de crédito e sociedades financeiras- Decreto Lei nº298/92, de 31 de dezembro, artigo 2º:

“São instituições de crédito as empresas cuja atividade consiste em receber do publico depósitos ou outros fundos reembolsáveis, a fim de os
aplicarem por conta própria mediante a concessão de crédito
“São também instituições de crédito as empresas que tenham por objeto a emissão de meios de pagamento sob a forma de moeda eletrónica”.

As instituições de crédito comportam diversas espécies- desde os bancos às entidades enumeradas no artigo 3º do RGIC, realizando os bancos
a generalidade das operações reservadas às instituições de crédito. Às restantes instituições de crédito cabe realizar as atividades que se lhes
apliquem por via legal. As sociedades financeiras podem, também, realizar apenas operações que lhes sejam especialmente facultadas e
não são instituições de crédito – artigo 5º da RGIC, sendo que o legislador enumera quais as sociedades financeiras- artigo 6º nº1 e 2 RGIC.

• Características do Direito Bancário

I. Direito privado O direito bancário é direito privado. O qualificativo público ou privado não cabe a normas isoladamente
tomadas, mas apenas a sistemas ou subsistemas – uma mesma regra pode ser pública ou privada, consoante a sua inserção (uma
obrigação pecuniária, por exemplo, será pública se corresponder a um dever tributário; será privada quando preencha um mútuo).

▪ Direito bancário material é privado: assenta em contratos comerciais, em cláusulas contratuais gerais e na
autonomia das partes.
▪ Direito bancário institucional é privado: nasceu como direito público e ainda hoje postula poderes dele derivados
(supervisão ou fiscalização por poderes públicos). Todavia, o tecido bancário repousa em instituições que, por lei, devem
assumir o tipo de sociedade anónima. Compreende também diversos deveres genéricos estruturalmente privados
(competência técnica, dever de informação e dever de segredo – arts. 73.º, 75.º, 78.º a 84.º RGIC).

O direito privado é subsidiariamente aplicável nas áreas públicas. No campo bancário, esse fenómeno surge mais flagrante, podendo falar-se
numa aplicação direta – veja-se o art. 64.º, n.º 1 da LOBP.

II. Direito funcional específico O direito bancário não é valorativamente neutro. Este acompanha a lógica do dinheiro e da sua
circulação. Os seus vetores e as suas soluções empenham-se na salvaguarda do valor da moeda e dos créditos a ela relativos,
bem como no fenómeno do lucro. Funcionalização de um sector é quando, além do pano de fundo civil, ocorram valores sectoriais
prosseguidos pelo ramo normativo visado. No campo do direito bancário tal é evidente:
a. art. 105.º TCE: objetivo primordial do SEBC é a manutenção da estabilidade dos preços;
b. art. 101.º CRP: o sistema visa garantir a formação, a captação e a segurança das poupanças, bem como a aplicação dos
meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social;
c. art. 12.º, al. c) LOBP: compete ao Banco de Portugal velar pela estabilidade do sistema financeiro.

Estamos perante um sistema que vê atribuído a tarefa de assegurar um sistema financeiro estável, em economia de mercado.

III. Direito técnico - O Direito bancário pode ser apresentado como direito técnico. A expressão tem alguma ambiguidade –
poderia exprimir uma de duas ideias:
a. a de que o estudo e aplicação implicariam conhecimentos de técnica bancária;
b. a de que o direito bancário exige um estudo especializado.

Tal ideia é redutora, pois uma aplicação sábia implica o conhecimento da realidade subjacente.

IV. Direito fragmentário e dependência científica- O Direito bancário tem natureza fragmentária, embora encontremos alguns
institutos que dispõem de regimes bastante completos, como o regime do Banco de Portugal. Para além disso, recorre-se a
institutos civis ou comerciais preexistentes, cuja regulação acolhe na íntegra, introduzindo depois algumas especificidades.

Fontes de Direito Bancário

1) A Constituição e a Lei Orgânica do Banco de Portugal


A nível infraconstitucional temos a LOBP (Lei n.º 5/98, de 31 de Janeiro).A Constituição contém, ainda, outras regras importantes para o
sector bancário, como as que consagram o direito à reserva da intimidade da vida privada (art. 26.º, n.º 1), base do segredo bancário, o
direito de acesso aos tribunais (art. 20.º, n.º 1) e os princípios fundamentais da Administração Pública – legalidade, igualdade,
proporcionalidade, justiça, imparcialidade e boa-fé (art. 266, n.º 2).Na própria Constituição encontramos regras básicas de Direito
bancário [institucional] (arts. 101.º e 102.º CRP), as quais se encontram viradas para a captação e para a segurança dos depósitos dos particulares
e para a sua aplicação produtiva.

2) Código Comercial e legislação extravagante


O Direito bancário material dispõe de uma fonte unitária, mesmo incompleta: o Direito da atividade bancária, designadamente no tocante
às relações entre o banqueiro e o seu cliente, deve ser reconstruído com recurso a uma multiplicidade de fontes. Desde logo, cumpre referir o
Código Comercial de 1888, no seu título IX, livro II (contratos especiais de comércio) com quatro arts: 362.º a 365.º.
O Código Comercial incluíra ainda, no seu título VI (das letras, livranças e cheques – arts. 278.º a 343.º), a matéria atinente aos títulos de
crédito. Temos ainda uma série de leis extravagantes referentes a atos bancários.

3) Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras


Como diploma nuclear (principalmente no campo institucional) surge o RGICeSF (DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro). Temos ainda uma
série de legislação diversa no campo das instituições de crédito e das sociedades financeiras.

4) Usos bancários; as cláusulas contratuais gerais


Cabe aqui papel importante como fonte mediata. Os atos bancários assentam na autonomia privada. Não é, contudo, imaginável que, aquando
da prática de cada ato bancário, se proceda a uma atividade criativa. Daqui resulta uma prática reiterada, ou seja, um uso.
Os usos bancários podem ser juridificados por uma de três vias:
• Autonomia privada – aqui remete-se diretamente para os usos, sendo estes positivados pela vontade das partes. Muitas vezes
ocorre através da «codificação», em cláusulas contratuais gerais, de práticas bancárias consagradas.
• Pela lei, referimos o art. 3.º, n.º 1 CC no Direito civil e no art. 407.º do CCom. O depósito bancário surge, muitas vezes, integrado
em séries negociais complexas, que incluem, como exemplos, abertura de conta, concessão de créditos, entre outros. Podemos admitir a
vigência, ex lege, de usos que abarquem todo esse negócio complexo, via interpretação extensiva do 407.º CCom.
• Pela convicção da sua obrigatoriedade: aqui temos direito consuetudinário, embora no direito português a falta de consagração legal
para o costume frusta a eficácia das normas consuetudinárias.
No campo do Direito bancário material, surgem as cláusulas contratuais gerais, que acolhem muitos usos bancários dando-lhe jurisdicidade.

5) Códigos de conduta e fontes privadas


Trata-se de regras estabelecidas, por aviso, pelo Banco de Portugal, nos termos do art. 17.º LOBP e do art. 77.º, n.º 1 RGIC (códigos de
conduta).
As regras gerais e abstratas aprovadas pelo Banco de Portugal são leis em sentido material cuja positividade deriva das normas que
instruam o poder regulamentar do Banco de Portugal. Estas regras não podem, sob pena de ilegalidade, ser contrárias às leis fixadas por
órgãos de soberania, não se aplicam a entidades que não estejam sujeitas à supervisão do Banco de Portugal e não podem transcender o
âmbito da sua supervisão.
Para além disso, não podem ser constitutivas de direitos para particulares (não é possível constituir direitos para uns sem se onerar outros).
Porém, a violação das regras aprovadas pelo Banco de Portugal, designadamente por parte dum banqueiro, quando provoque danos num
particular, dá azo a um dever de indemnizar, por via da 2.ª parte do art. 483.º, n.º 1 CC – a violação de regras aprovadas pelo Banco de Portugal
é a violação de regras que visam a proteção de interesses alheios, garantida pelos poderes de autoridade do Banco de Portugal.
O art. 77.º, n.º 2 RGIC prevê a elaboração de códigos de conduta pelas associações representativas das instituições de crédito, os quais
serão submetidos à aprovação do Banco de Portugal. No âmbito estritamente associativo, compete às referidas associações aprovar regras
de conduta para os seus membros, cuja jurisdicidade depende da livre adesão aos estatutos que as legitimem.

6) Diretrizes institucionais

7) Diretrizes materiais

8) Regulamentos

I. A tipologia institucional

Vamos falar das instituições do Direito Bancário. É evidente que o ponto de partida é a ideia de que na área bancária o acesso à atividade é um
acesso que é condicionado. Há́ várias figuras que são a tradução dessas limitações, desde logo a necessidade de uma autorização para o exercício
da atividade bancária e a correspondência do tipo de instituição a um dos tipos previstos. Isso tem como referência a tipologia das instituições
financeiras em termos europeus e nacionais.

Há́ uma dificuldade e deficiência na categorização institucional, isto é, nos sistemas das instituições bancárias que decorre de uma excessiva
atomização. O regime europeu centra-se no conceito de instituição de crédito, esta é que é a categoria europeia. E depois, nós acrescentámos
uma série de figuras, de tipos de instituições de crédito, uma categoria que são as sociedades financeiras que não são sujeitos também a
harmonização.

A classificações entre nós, é fundamentalmente tripartida:

• Instituições de Crédito;
• Sociedades Financeiras (não são uma categoria europeia);
• Empresas de Investimento (não vamos falar muito).

Como se desdobram estes tipos de instituições? Art 3º do RGIC, é um artigo retalhado pelo tempo, há́ agora uma técnica legislativa de deixar
evidenciadas as alterações sofridas nos anos recentes. Há́ uma tipologia que é taxativa. Não se depende de uma qualificação de qualquer intérprete
tem que ser a lei a atribuir esta qualificação de instituição como tipo de instituição de crédito. Temos os bancos que são as instituições de crédito
universais e depois há́ outros tipos de instituições de crédito.
O que distingue os tipos de instituições de crédito e os tipos de sociedades financeiras é o âmbito da atividade primitiva. Depois há́
consequências da qualificação, mas o que vai diferenciar cada tipo de instituição de crédito e sociedade financeira é o objeto primitivo. O
que nos interessa é saber qual o objeto primitivo. Dentro desta classificação temos uma repartição excessiva e com isso, uma necessidade
frequente de mudar de tipo de instituições de crédito. Há́ aqui uma atomização que é criticada pelo professor.

II. Instituições de crédito; os bancos

O art 3º do RGIC foi objeto de alterações recentes, que respeitam a uma restrição do conceito de instituições de crédito. Tínhamos uma
série de instituições de crédito que deixaram de ser consideradas como tais, e passaram a ser consideradas como sociedades financeiras. Isto porque
o volume de deveres jurídicos das instituições de crédito é um volume de tal maneira acentuado que seria desproporcionado estar a impô-
lo também a outras entidades que não estão sujeitas ao direito europeu.

O epicentro agora foi restringir as instituições de crédito àquele catálogo mais sumário do art 3º do RGIC.
Por outro lado, é importante termos presentes a definição de instituições de crédito do art 2º-A/w). Esta matriz “receção de depósito e
concessão de crédito” é uma matriz que vemos nas instituições de crédito, mas não vemos nas sociedades financeiras. As sociedades financeiras,
algumas podem conceder crédito, mas nenhuma pode receber depósito do público.

A receção de depósitos é o dever de restituir os depósitos - é o dever principal da atividade bancária. São as instituições de crédito que estão
mais sujeitas a regras prudenciais, para respeito firme do compromisso de reembolso dos depósitos. Voltando ao art 3º do RGIC, cada uma destas
instituições tem diferenças em função do objeto. Os bancos - são instituições universais e por isso, podem à partida realizar qualquer serviço
bancário. O art 4º diz-nos qual a atividade das instituições de crédito.

O art 4º é muito dilatado no de serviços que podem ser prestados por bancos, são as instituições de crédito universais e por isso, têm um perímetro
muito amplo de atividades que podem ser desenvolvidas. Há́ até atividades que têm a ver com seguros alínea m); e serviços de intermediação
financeira no âmbito do mercado de valores, alíneas f) /h) /i) /l) /q). Também é de sublinhar que apresentam muita relevância os serviços de
pagamento (hoje digitais, através de transferências) e emissão de moeda. Não quer dizer que os bancos estejam obrigados a prestar todos estes
serviços. A característica principal dos bancos não é de estarem obrigados a todas estas atividades, mas sim habilitados. Os bancos podem escolher
um âmbito de atividade mais restrito, e por isso temos que distinguir:

- Bancos comerciais - têm o centro na recolha de depósitos e concessão de crédito;


- Bancos de investimento - assentam a sua atividade nas atividades do art 4º que se prendem com serviços que se prendem com o mercado de
valores mobiliários.

Nesta contraposição entre a banca comercial e banca de investimento, tem havido muitos defensores de uma separação entre a banca de
investimento e a banca comercial. Essa separação foi imposta nos EUA, foi várias vezes estudada na Europa, mas nunca foi introduzida no contexto
europeu, nem nacional. O modelo europeu de bancos é de uma banca universal, habilitada a prestar qualquer atividade desta área. O problema de
ter esta separação está em investimentos de risco que possam comprometer o seu património no geral, mas por isso mesmo a Europa tem uma
ponderação de riscos dos bancos que desincentivam esses investimentos de alto risco. Não se perspetiva hoje que venha a ver um reignfencing, ou
seja, separação entre a banca comercial e a banca de investimento.

III. As sociedades financeiras

A tipologia das sociedades financeiras está no art 6º. Enquanto que temos no art 2º-A um conceito de instituições de crédito, há́ uma ideia
transversal a todos os tipos de instituições de crédito, não há́ um conceito de sociedade financeira. Já́ sabemos que o conceito de sociedades
financeiras não é europeu, mas sim de direito português. O cuidado, o desenvolvimento, a atenção dedicada às sociedades financeiras é bastante
menor no RGIC. Quase todo o regime das sociedades financeiras é construído por remissão para o regime das instituições de crédito, o que em
termos práticos pode causar problemas aplicativos porque há́ remissões em cadeia e o conhecimento deste regime nem sempre é fácil.

Por outro lado, como sociedades financeiras temos as empresas de investimento (6º/1/a) e instituições financeiras (6º/1/b)), onde se incluem:
I. As sociedades financeiras de crédito;
II. As sociedades de investimento;
III. As sociedades de locação financeira;
IV. As sociedades de factoring;
V. As sociedades de garantia mútua;
VI. As sociedades gestoras de fundos de investimento; - gerem patrimónios alheios;
VII. As sociedades de desenvolvimento regional; - concedem crédito com finalidades de desenvolvimento regional;
VIII. As agências de câmbios;
IX. As sociedades gestoras de fundos de titularização de créditos; - a titularização de créditos é a transmissão de créditos de um
banco para uma sociedade que depois emite obrigações titularizadas, mas em vez de sociedades podíamos ter fundos de
titularização de créditos. E a gerir a titularização de créditos, temos as sociedades gestoras de fundos de titularização de
créditos;
X. As sociedades financeiras de microcrédito.
É importante conhecer esta tipologia porque há́ exclusivos das instituições de crédito e há́ exclusivos das sociedades financeiras. As instituições
de crédito são as únicas que podem receber depósitos. A recepção de depósitos não autorizada é considerada como crime, art 200º do RGIC -
vemos os interesses públicos conexionados com este crime. Temos depois os exclusivos das instituições de crédito e sociedades financeiras: todos
os serviços do art 4º são na verdade sujeitos a um exclusivo das instituições de crédito e das sociedades financeiras. Isto é importante. Só́ instituições
autorizadas pelo Banco de Portugal é que podem conceder crédito e outros serviços. O surgimento de novas atividades na área bancária é muito
comum. Uma das recentes tensões com o regime do art 8º tem a ver com o crowdfunding.

Caso prático: “O realizar Albino Costa recorreu ao crowdfunding para através da Internet, obter financiamento para a sua própria película. O
crowdfunding implica uma violação do exclusivo bancário de concessão de crédito ou de recepção de fundos reembolsáveis?”

• O que é o crowdfunding? O crowdfunding assenta em plataformas na Internet. Qual é então a função do crowdfunding? O que é que
permite a plataforma? Tem uma função de aproximação de mediação. Começámos por ver que as instituições de crédito recebem
depósitos e concedem crédito (2º-A/ w)), mas quando o fazem, fazem em nome próprio, por conta própria.
O que é que faz a plataforma de financiamento colaborativo? Põe em contacto quem queira investir e quem precise desse investimento
- com que finalidades? Várias: podem ser doações, constituições de sociedades, mútuos, etc. Assim, o ponto essencial é que a plataforma
não corre risco, são os investidores que correm risco. Não é plataforma que vai fazer uma aplicação.
• Implica uma quebra ao exclusivo bancário? Os investidores estão a realizar atividade bancária? Se não há́ atividade bancária da
plataforma, ela existe do lado dos clientes/dos aforradores? Será́ isto crédito bancário? Não.

Em suma: através do crowdfunding podemos ter contratos de mútuos entre empresas e aforradores (é o peer to peer lending ou P2P lending). O
crowdfunding é uma atividade desintermediada porque há́ um contacto por meios tecnológicos das empresas que precisam de financiamento e
quem pode financiar. As finalidades do crowdfunding podem ser várias:

• produção de uma obra cultural (pe.: disco, filme);


• apoio de uma instituição dedicada a atividades sociais;
• financiamento político;
• financiamento de pessoas singulares ou coletivas;
• constituição de uma empresa.

Podem ter como bases: doação, compra e venda de bem futuro com pagamento antecipado, promessa de contributo não financeiro, uma subscrição
de valores mobiliários, mútuo, etc. O mútuo é o que mais nos interessa, há́ um regime jurídico sobre esta matéria e por isso, há́ uma preocupação
dos aforradores. Quais são as instituições que regulam? CMVM e a Direcção Geral de Atividades Financeiras - não o Banco de Portugal. Haverá́
aqui exclusivo bancário? Não há́ concessão de crédito profissional e por isso, há́ sempre somas muito baixas para empréstimo em cada situação.
Logo, a lei enquadra esta concessão de crédito fora da concessão de crédito profissional. Os limites são fixados através de regulamento da CMVM
(o que também é expressão de uma não profissionalidade):

• Limite máximo de angariação por oferta (€ 1.000.000);


• Limite máximo de investimento por oferta (€ 3.000);
• Limite máximo de investimento anual por investidor (€ 10.000).

Estes limites não são aplicáveis a pessoas coletivas, a investidores qualificados e a pessoas singulares com rendimento anual superior a € 70.000.
Nestes casos, limite máximo por oferta é fixado em € 5.000.000. Não há́ então uma violação do exclusivo bancário. Esta estrutura tem várias
vantagens: reduzem os custos de transacção e introduzem maior concorrência no pricing do crédito. Mas também há́ desvantagens: é mais difícil
avaliar o risco e não há́ as redes de protecção que há́ normalmente. Estamos em muitos casos a falar de start-ups. O crescimento destas formas de
captação de fundos é exponencial, temos uma atividade que é regulada, mas não é atividade bancária e terá́ um crescimento imparável nos próximos
anos.

Nas empresas de investimentos (art 4º-A RGIC) temos:

• sociedades corretoras - atuam apenas em nome de terceiros;


• sociedades financeiras de corretagem - podem atuar quer em nome dos seus clientes, quer em nome próprio e podem ainda
conceder crédito para investimentos em instrumentos financeiros;
• sociedades gestoras de património;
• sociedades mediadoras dos mercados monetário ou de câmbios;
• sociedades de consultoria para investimento;
• sociedades gestoras de sistemas de negociação multilateral;
• outras empresas que, correspondendo à definição das empresas de investimento, como tal seja qualificada pela lei.

Intermediação bancária

A designação destes profissionais que são instrumentais à atividade bancária são diferentes:

• na área do mercado: agente vinculado que tem que ter exclusividade;


• na área dos seguros: mediador de seguros, não há́ exclusividade;
• na área bancária: são promotores de atividades de instituições, há́ exclusividade e há́ intermediários de crédito.
O acesso à atividade bancária está sujeita a dois atos jurídicos:

1. autorização bancária do Banco de Portugal ou BCE e,


2. registo no Banco de Portugal

São dois atos autorizativos. O processo no seu todo é muito moroso e pode implicar há́ volta de 1 ano. Onde há́ uma duplicação injustificada é no
ato de registo. O ato de registo é uma verificação adicional à autorização, fixa os elementos essenciais da empresa bancária para permitir a
constituição em termos corretos, mas é uma duplicação sem que haja uma razão para tal e sobretudo, não havendo nenhuma previsão em termos
europeus que obrigue esta implicação.

O passaporte europeu de prestação de serviços bancários

A Europa impõe uma série de deveres e concede uma vantagem importante às instituições de crédito europeias: que é o passaporte europeu de
serviços bancários. O que está em causa é a autorização para o exercício da atividade bancária poder ser concedida em qualquer estado- membro.
Sucede que esta eficácia extraterritorial da autorização pode ser utilizada através de 2 meios diferentes:

• sucursal - é um estabelecimento. Implica fixar um estabelecimento, contratar pessoas, ter organização - isso vale para as instituições de
crédito portuguesas que queiram exercer atividade bancária fora de Portugal, quer para outras instituições europeias que queiram vir
para Portugal fixar-se através de sucursal;
• livre prestação de serviços - dirige-se a contactos experimentais com outro ordenamento jurídico.

Pode a instituição de crédito prestar os seus serviços bancários no estado de origem, pode desenvolver diretamente através de livre prestação de
serviços, quer através de sucursal. O exercício fora do perímetro do estado de origem pode então ser realizado destas duas formas. Portugal acolhe
mais instituições com passaporte europeu do que envia. Não há́ passaporte europeu para sociedades financeiras, isto porque as sociedades
financeiras não são uma figura europeia e por isso, estão fora deste esquema de eficácia extraterritorial para exercício de atividade. Se uma
sociedade financeira portuguesa quiser exercer a sua atividade noutro país da Europa terá́ que obter uma nova autorização. Neste contexto, é
importante distinguir:

• sucursal - Não tem personalidade jurídica e não é uma pessoa coletiva. Pode haver sucursais domésticas ou fora do país. Temos
o passaporte europeu;
• filial - tem personalidade jurídica e é uma pessoa coletiva. É uma sociedade dominada, está vinculada aos poderes de domínio
da sociedade mãe. Pode haver filiais domésticas ou fora do país. Não temos o passaporte europeu, tem que ser autorizada.

Um conceito a fixar também importante é o conceito de património afeto - Não há́ separação patrimonial, há́ uma extensão, mas o RGIC fala da
necessidade de haver património afeto às dividas da sucursal. Do ponto de vista da governação da sucursal a lei estabelece que deve haver 2
gerentes com poderes bastantes para gerir a atividade da sucursal. O conceito de gerente de sucursal é o conceito da pessoa singular que exerce
funções de administração da sucursal e o registo dos gerentes deve ser feito junto do Banco de Portugal para controlar esta efetividade de poderes
que os gerentes têm entre nós.

Autorizações bancárias

Não é só́ a constituição que está dependente de autorização, há́ outras atos bancários sujeitos a autorização como é o caso das alterações estatutárias,
da designação de membros de órgãos sociedades e de aquisição de participação qualificada. Vamos ver os requisitos que devem ser cumpridos
para haver registo de dirigentes de instituições de crédito, há́ 4 ideias fundamentais:

• idoneidade;
• qualificação profissional;
• independência;
• profissionalidade.

Art 33º-A:
Temos um controlo automizativo de dirigentes aplicável aos administradores e membros de órgãos de fiscalização, mas também aos diretores de
compliance e outras equivalentes. Esta trilogia: compliance, gestão de riscos e auditoria interna formam o sistema de controlo interno. Os
responsáveis por cada uma destas subáreas devem também cumprir critérios de idoneidade, qualificação profissional; independência e
profissionalidade.

1) idoneidade: tem a ver com a análise da capacidade técnica e ética que uma pessoa deve reunir para determinada função. Estão em causa os
atributos profissionais e de integridade (fit and proper) necessários para assegurar a gestão sã̃.

Caso prático: “Um administrador do banco y foi constituído arguido por suspeitas da prática do crime de tráfico de influência. Na base da suspeita
estarão alegados recebimentos, na sede do Banco, em troca de contactos efetuados com dirigentes de empresas relevantes. Deve, nestas
circunstâncias, considerar-se haver falta de idoneidade (art. 30.º RGIC) justificativo do cancelamento do registo no Banco de Portugal (art. 70.º,
n.º 4 RGIC)?”
O que é a falta de idoneidade? Estão reunidos os pressupostos para se considerar a não idoneidade dessa pessoa? Art 30º-D/3/h) RGIC, o aspeto
que mais nos prende nestas situações é saber que fase do processo penal é reveladora desta falta de idoneidade e nesse contexto que critérios
podemos utilizar? Em tensão com a falta de idoneidade temos o princípio da presunção de inocência. O art 30º-D vem no contexto da resolução
do BES, houve um atraso no estabelecimento de medidas que vieram a permitir a resolução do BES. O art 30º-D exige uma decisão judicial? Não,
fala apenas em processo penal e não em decisão transitada em julgado. Há́ interesses públicos por detrás de uma gestão prudente das instituições
de crédito. Há́ valores acima do valor da presunção de inocência, os bancos gerem poupanças de uma vida inteira das pessoas, tem que haver um
grau muito exigente de credibilidade e integridade e isso tem que ver com os interesses públicos subjacentes ao sistema financeiro. Então, não tem
que haver decisão judicial e é importante o tipo de crime que está em causa. Para além de que o crime é praticado na sede do banco.

Pe.: dirigente de um banco que atropelou uma pessoa que acabou por morrer. Foi levantada a questão da idoneidade. O art 30º-D/6 diz-nos que
isso não é revelador da falta de idoneidade, foi isso mesmo que o Banco de Portugal concluiu.

Pe.: dirigente de um banco inglês que viajava de comboio em Londres e foi surpreendido pelo fiscalizar do comboio e disse que não tinha o bilhete
e que nunca tinha comprado o bilhete apesar de apanhar o comboio todos os dias. A autoridade bancária inglesa considerou que essa pessoa
não tinha idoneidade - isto não porque naquele dia tinha sido surpreendido, mas pela sua atitude de desrespeito às normas sociais mais básicas
durante um período prolongado.

Pe.: há́ um banco objeto de contraordenação do Banco de Portugal, na renovação do contrato está ou não comprometida a idoneidade dos
dirigentes ao tempo dessa contraordenação? Depende da magnitude do ilícito, se ilícito de enorme gravidade então aí sim pode comprometer a
idoneidade. O próprio RGIC fala de sanções acessórias, art 212º/ 1/d) - se houver uma sanção grave, isto pode implicar como sanção acessória,
como inibição direta ou na renovação do mandato pode determinar a falta de idoneidade que não permita a recondução no cargo.

A lei é clara quanto à perda da idoneidade, mas não fala quanto à recuperação da idoneidade. Logo, a inidoneidade também não pode ser um juízo
perpétuo, há́ um acompanhamento.

2) qualificações profissionais: As competências profissionais são vitais na escolha de cargos bancários. Há́ uma avaliação ex ante e ex post. Para
efeitos da qualificação profissional dos administradores e fiscalizadores é importante os planos de formação contínua.

3) independência: Art 31º-A, é o critério mais fácil de acolher e dar cumprimento. Capacidade de um administrador decidir por si.

4) disponibilidade: Não permitir um excesso de cumulação de funções (overboarding). Para evitar o overboarding é proibida a cumulação de mais
do que um cargo executivo com dois não executivos ou quatro cargos não executivos.

• Se há qualquer facto gerador de falta de adequação, tem-se que comunicar o facto internamente e comunicar ao supervisor.
• A política de designações complementa o que devem ser critérios de escolha e também a existência de cada vez em maior no de comissões
de nomeações que verificam de forma mais rigorosa as competências pessoais das pessoas em causa.

Operações que podem ser praticadas pelas instituições de crédito e sociedades financeiras:

Caso prático: “Diga qual a forma de empresa financeira adequada para o desenvolvimento das seguintes atividades: 1) Receção de depósitos; 2)
Crédito ao consumo; 3) Execução de ordens em mercado regulamentado.”

Que instituições podem proceder à recepção de depósitos de acordo com o regime português? Apenas as instituições de crédito.
Que instituições podem proceder ao crédito ao consumo? As instituições de crédito, as sociedades financeiras de crédito, as sociedades de
investimento e as sociedades de leasing e factoring. O microcrédito nunca pode ser crédito ao consumo.
Que instituições podem proceder à execução de ordens em mercado regulamentado? As sociedades financeiras de corretagem (brokers - podem
executar de terceiros e em nome próprio), sociedades financeiras corretoras (dealers - só́ podem executar de terceiros) e bancos.

VII: A supervisão

Atividade de acompanhamento das instituições de crédito e das sociedades financeiras - quer a priori, quer a posteriori. É uma atividade de
vigilância permanente e deve ser exercida mesmo que não haja suspeitas de irregularidade. A entidade de supervisão é o Banco de Portugal e tem
outras funções, nomeadamente em termos sancionatórios e é importante distinguir a supervisão prudencial da supervisão comportamental:

• comportamental - dever de conduta;


• prudencial:
• micro-prudencial
• macro-prudencial - BCE em articulação com o Banco de Portugal.
• superintendência

A supervisão está sujeita a vários princípios e deve ser eficaz. O Banco de Portugal:

• No âmbito das medidas corretivas, pode impor uma limitação da atividade bancária (artigo 116.º-C/1 d) RGIC);
• No âmbito de processos de resolução, pode impor a alienação de ativos de bancos (artigo 145 º -M RGIC) ou a sua transferência para
um banco de transição (artigo 145.º -O RGIC);
• No âmbito da avaliação de resolubilidade, goza a competência para exigir a alienação de ativos específicos (artigo 116.º-P/4. d) RGIC);
• Pode opor-se à celebração de contrato de apoio financeiro intra-grupo (artigo 116.º-X/1 RGIC).
Há́ áreas alargadas da supervisão: governo societário de bancos, planos de recapitalização e living wills. Em casos excecionais há́ poderes
intrusivos do Banco de Portugal que podem substituir-se aos órgãos sociais. Em Portugal, o Banco de Portugal é a autoridade de supervisão e a
entidade de resolução o que não acontece em todos os países europeus. Por outro lado, há́ poderes sancionatórios importantes, que implicam
consequências financeiras, patrimoniais, mas também consequências reputacionais que são bastante importantes. No passado recente tivemos
várias comissões parlamentares para a revisão da supervisão, mas na prática são debates muito partidarizados - no entanto, há́ relatórios
interessantes. As decisões do Banco de Portugal são passiveis de escrutínio judicial através do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão.

O Sistema Europeu de Supervisores Financeiros:

Temos um regime europeu de supervisão prudencial e há́ em termos institucionais um sistema institucional que é o sistema europeu de supervisores
financeiros e inclui um conjunto de autoridades de supervisão de cada país, European Systemic Rick Board, European Authorities (EBA, EMA,
EIOPS) e European Central Bank. Estas instituições funcionam em rede e há́ uma grande cooperação entre as autoridades nacionais, o Banco
Central Europeu e a EBA.
Temos o Conselho Europeu de Risco Sistémico: com recomendações. A EBA é também muito importante, o seu regime está no regulamento
1093/20120 e adota principalmente orientações de nível 3.

Temos o projeto da união bancária europeia, que é um projeto de fundo nesta matéria. Este tem 3 fases:

1) mecanismo único de supervisão (que entrou em vigor em 2014);


2) mecanismo único de resolução (que entrou em vigor em 2016);
3) sistema comum de garantia de depósitos (que está ainda por acordar).

Mecanismo Único de Supervisão:

Cuida das instituições da zona euro. Que balanço fazemos deste mecanismo? Este mecanismo pretende alcançar determinados objetivos, esses
objetivos são ou não cumpridos? Os objetivos são:

• Acentuar a convergência no exercício das práticas de supervisão em termos europeus e designadamente reduzir o tratamento assimétrico
a operadores nacionais (country bias) e anular as diferenças de exigência e de metodologia na concretização das práticas de supervisão
- será́ que há́ uma convergência plena? Não há́ uma total convergência de regulação;
• Redução dos problemas de coordenação em crises bancárias internacionais;
• Quebrar a correlação entre risco do Estado e risco dos bancos (doom loop, diabolic loop). Temos muitas diretivas e portanto, o BCE
aplica o direito nacional de cada estado, não há́ coordenação absoluta porque não há́ regime igual em todos os países europeus. Por outro
lado, o sistema de supervisão cobre apenas a zona euro e deixa de fora muitas instituições que podem ter risco sistémico. Continua a
haver investimento doméstico em dívida público, logo há́ a tal ligação entre a solvência de um estado e os bancos que nele funcionam.

Este é um projeto em construção e não podemos deixar de parte que o Mecanismo Único de Supervisão é só́ de supervisão prudencial.
O balanço então que se faz deste mecanismo é que é uma estrutura complexa, temos vários níveis de instituições. Quanto mais instituições, maior
a complexidade e menor a agilidade. Por outro lado, é esperar que haja a conclusão do processo da União bancária europeia. É vantajosa esta
centralização, mas é um projeto que tem fragilidades, tem aspetos que não estão totalmente cumpridos e por isso, é importante esperar que toda a
União bancária europeia seja concluída.

A arquitetura nacional das autoridades supervisão

Em tese, em Portugal podemos ter ou um modelo monista (isto é, reunir numa só́ autoridade as competências); ou podíamos ter um modelo
especializado (ex. banca, bolsa e seguros com supervisores separados); ou um modelo funcional (twin peaks - ideia de duas autoridades que cobrem
todas as atribuições, uma centrada em aspetos prudenciais e outra em aspetos comportamentais). Em Portugal temos o modelo especializado:
Banco de Portugal + CMVM + ASF - mas é impuro porque tem uma entidade de coordenação, que é o CNSF (promove a coordenação). Sucede
que este modelo que temos é criticado e portanto, é um modelo que tem sofrido diversas criticas e diversos ajustamentos. Os ajustamentos
fundamentais prendem-se por um lado com um acréscimo de competências da CMVM. Pe.: no crowdfunding a entidade competente para
supervisionar era a CMVM.

A CMVM é uma entidade mais recente e ágil, com uma capacidade de resposta a temas novos mais afinada. O Banco de Portugal é, em contraste
uma estrutura mais petrificada, parada no tempo e difícil de reformular. Esta evolução tem sido pontuada também por algumas consultas públicas
e houve uma 1ª consulta pública em 2010 para transformar o modelo português no modelo twin peaks. No entanto, esta consulta pública não foi
até ao fim, ficou no papel, mas deu a tónica clara que este é um tema em aberto.

Este modelo vigora desde 1991, mas não é uma solução satisfatória. Quando foi o caso BES houve acusações públicas por parte da CMVM de
que a articulação promovida pelo Banco de Portugal em relação aos outros supervisores tinha sido deficiente. Entretanto em 2017, houve outras
propostas apresentadas por um grupo chefiado por Carlos Tavares e a verdade é que estas propostas de 2017 tinham uma tónica fundamental de
reforçar a coordenação, criando um Conselho de Estabilidade Financeira (CSEF) em substituição dos CNSF. Essa proposta foi criticada por todos:

• foi criticada pelas instituições financeiras porque implicava mais custos;


• foi criticada pelos supervisores porque receavam perder a sua independência.

O resultado deste debate foi o arquivamento novamente desta proposta. Então vivemos em Portugal uma situação curiosa, em que temos um
modelo insatisfatório, mas não houve ainda condições para uma mudança efetiva. Opinião do prof. Paulo Câmara: o problema é sobretudo de
eficiência e de nível de serviço. A supervisão é uma atividade administrativa, mas é também um serviço de interesse público - a capacidade de
resposta e rapidez são vitais. Isto é particularmente complexo quando o Banco de Portugal tem a parte da supervisão prudencial e a CMVM tem a
parte da supervisão comportamental. O tempo de autorização é 1 ano, o que é muito longo. Deve haver uma porta única. Também a questão da
cooperação entre entidades é fundamental, especialmente em alturas de crise.

Por outro lado, há́ uma certa fragmentação no contexto português, mas em termos europeus o panorama é ainda mais preocupante. Na UE temos
o BCE e o CUR (Conselho Único de Resolução), o problema é que as estruturas de fixação de regras em termos mundiais na banca multiplicam-
se e temos ainda que contar com BIS, FSB, IOSCO, Comittee on Payment and Settlement Systems, IASB (Contabilidade) e IAASB (Auditoria).
E, portanto, no contexto global temos um novelo de instituições que é preocupantemente complexo e fragmentado. Há́ aqui uma preocupação
porque se tivermos em termos globais a falência ou uma crise num grande grupo global, pe. falência do Santander, temos que pôr num tempo
muito curto todas estas instituições em articulação umas com as outras. Quanto maior o no de instituições com competências regulatórias maior a
morosidade na resposta quando as crises aparecem. É então um tema em aberto, não só́ em termos nacionais, mas também internacionais devido
a esta proliferação de entidades.

Deveres bancários gerais

Vamos primeiro estudar os deveres que se aplicam a todos os contratos bancários, depois vamos começar a analisar os contratos bancários em
especial e há́ necessariamente outros deveres jurídicos associados a esses contratos. Quando dizemos que o sistema bancário é regulado, dizemos
que há́ regulação por dois motivos:

1. as instituições são sujeitas a regulação e coordenação;


2. as atividades bancárias/os negócios bancários/os contratos bancários também são sujeitos a regulação.

A relação bancária é complexa - no direito civil vimos que sempre que há́ uma relação contratual temos um feixe de obrigações e de direitos, na
área bancária isso tem uma concretização particularmente clara. O contrato bancário é muitas vezes uma salvaguarda de interesses dos clientes e
por isso, tem uma acentuação nos deveres que constitui sobre as instituições bancárias. Por outro lado, em termos de deveres bancários:

• deveres prudenciais - têm a ver com a liquidez das instituições;


• deveres comportamentais - projetam-se sobre a clientela - é por estes últimos que vamos começar.

A densidade de deveres que encontramos é diferente consoante estejam em causa contratos com consumidores bancários (pe.: crédito ao consumo)
ou contratos com outras instituições (pe.: sindicato bancário). Na maior parte dos casos os deveres contratuais são plasmados em CCG, logo temos
também de articular o regime das CCG. O ponto de partida é o RGIC nos art 73º e ss.

• art 73º, competência técnica: é uma cláusula geral, são deveres com grande vocação aplicativa. Tudo isto é um pouco vago;
• art 74º: é mais importante, tem uma linguagem despida, não há́ uma preocupação de densificação dos deveres. Aparece a lealdade, isto
é, o respeito consciencioso dos interesses dos clientes. Se quisermos apontar um dever fundamental ele está já́ aqui: as instituições de
crédito devem atender/comportar-se/proceder com lealdade em relação aos interesses dos seus clientes. Também aparece a diligência,
que é uma extensão da ideia da competência. A neutralidade é depois melhor explicada no âmbito do conflito de interesses.
• art 75º: retoma a ideia da diligência. Temos um enunciado muito largo, o critério de diligência não é o critério do bom pai de família,
mas sim do gestor criterioso e ordenado. Temos ainda a ideia do interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de
todos os clientes em geral. Este elenco da lei é um elenco claramente incompleto, isto é, não é suficiente nós olharmos para os art 73º e
ss. do RGIC para vermos tudo o que é a extensão dos deveres bancários gerais. Esta é uma falha muito grande do RGIC porque podia
ter ensaiado uma codificação mais exigente, mas claramente que não o faz. Por outro lado, a verdade é que há́ vários avanços que,
entretanto, ocorreram, como o avanço trazido pela Lei 35/2018 que tem que ver com os depósitos bancários estruturados - esta lei decorre
da transposição de uma Diretiva, a Diretiva DMIF II e a verdade é que é um produto puro de pós-crise com um reforço quântico do
ponto de vista da protecção dos clientes na sua decisão de aplicação do aforro. De facto, esta preocupação de tutela, protecção, de
favorecer decisões esclarecidas aquando da contratação de produtos bancários ganhou relevância. Ocorreram então vários
desenvolvimentos desde a entrada em vigor do RGIC, temos que fazer uma estratégia para lá chegar. Um dos problemas na prática da
aplicação dos deveres bancários é que há́ muitos produtos bancários que são distribuídos em pacote - ocorrem vendas associadas de
produtos bancários. Sempre que há́ produtos bancários, então os deveres de informação são acrescidos, o cuidado com a distribuição dos
produtos é superior, sobretudo nos pacotes que não se vendem em separado. Hoje em dia há́ grande preocupação em permitir a separação
do pacote e a venda de produtos em separado, para não haver prejuízo da análise do risco por parte do cliente. Isto tem reflexos no art
77º/1/a) do RGIC, mas também há́ reflexos em muitos outros diplomas da atividade financeira, é então uma preocupação transversal e
foi entre nós estudada pelo prof. Fernando Morais:
o art. 4.º do DL n.º 222/2009 (proteção do consumidor na celebração de contratos de seguro de vida associados ao crédito à
habitação);
o art. 27.º do DL 24/2014 (contratos celebrados à distância e fora do estabelecimento comercial);
o art. 11.º do DL n.º 74-A/2017 (contratos de crédito relativos a imóveis);
o art. 24.º Diretiva (UE) 2016/97 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de janeiro de 2016 (DDS).

O prof. diz que temos uma dezena de deveres transversais que têm de ser vistos por uma certa ordem:

1) dever de conhecimento do cliente - sem este não conseguimos aplicar verdadeiramente nenhum dos outros deveres, isso inclui o dever
de análise de solvabilidade dos clientes. É muitas vezes conhecido como “know your customer” ou “know your client” (KYC);
2) dever de governação de produtos - é novo e procura acompanhar a concepção do produto bancário desde o momento em que ele é
primeiro idealizado e quando deixa de ser comercializado;
3) dever de informação;
4) dever de cuidado e diligência - art 73º e 75º do RGIC;
5) dever de lealdade - uma das âncoras do art 74º do RGIC;
6) dever de gestão e prevenção de conflito de interesses - é uma derivação do dever de lealdade, mas tem significado autónomo. Sempre
que há́ conflito de interesses, sempre que haja primazia do interesse do cliente;
7) dever de assistência e de adequação;
8) dever de segredo;
9) deveres relacionados com a prevenção de branqueamento de capitais.
10) dever de conhecimento do cliente:

A razão de ser deste dever reside na circunstância de não haver uma concretização uniforme dos deveres bancários. Os deveres bancários têm uma
intensidade variável e o caso mais claro é o caso dos deveres de informação. Pe.: se há́ pessoa analfabeta que quer contratar um crédito, é claro
que o dever de informação é muito maior do que se o cliente for um prof. de finanças.
Logo, releva a situação financeira, os conhecimentos, a situação familiar, etc. - há́ então uma série de informações que devem ser recolhidas para
o cumprimento dos demais deveres bancários. Não há́ , porém uma sede legal centralizada deste dever de conhecimento do cliente, temos sim a
propósito do branqueamento de capitais, no aviso 2/2018, várias regras sobre identificação do cliente que são regras bastante exigentes. Pe.: cartão
Revolut - é apenas necessária foto frente e verso do cartão de cidadão e uma selfie - são então regras nada exigentes. Pe.: crowdfunding - um dos
desconfortos das instituições de crédito é ver que alguns produtos bancários estão a ser distribuídos com uma significativa simplificação dos
deveres de conhecimento dos clientes.
O dever de conhecimento do cliente tem claro um limite, há́ aspetos do cliente que não serão objeto de pergunta, como as suas características
físicas, convicções políticas e religiosas. Já́ a condição de saúde pode ser relevante.

Por outro lado, no regime dos depósitos estruturados, além da ideia de um conhecimento, há́ uma ideia de classificação/categorização dos clientes.
Este é um regime muito desenvolvido no mercado de capitais. Esta ideia de classificação é também aflorado no Direito Bancário para separar os
profissionais dos não profissionais; as contrapartes elegíveis (que são as instituições) das contrapartes não elegíveis. O conhecer o cliente é
importante para aplicar devidamente os deveres bancários que estão associados a cada relação bancária. Sucede que nos contratos de crédito é
particularmente importante o conhecimento de uma característica do cliente: a sua capacidade de honrar os compromissos financeiros assumidos.
O regime civilístico do contrato de mútuo não tem nenhum destes deveres, é um dever claramente bancário, mas é um dever central obrigando à
recolha de informação atualizada, completa sobre a solvabilidade do cliente utilizando as bases públicas que existam, nomeadamente a CRC
(Central de Responsabilidades de Crédito).

Essa avaliação deve ser feita antes do contrato e também sempre que o montante de crédito seja aumentado, o aviso 4/2017 dá então parâmetros
sobre esta avaliação da solvabilidade. Temos que percorrer diversas fontes até conseguir reconstituir o mosaico de regras que são relevantes para
compreendermos o quadro legal dos deveres gerais. O aviso 4/2017 tem ainda os dados que devem ser perguntados:

1) Natureza, montante e características do contrato de crédito;


2) Idade e situação profissional do consumidor;
3) Rendimentos auferidos pelo consumidor;
4) Despesas regulares do consumidor;
5) Cumprimento das obrigações assumidas pelo consumidor noutros contratos de crédito, designadamente tendo em conta a informação
constante de bases de dados de responsabilidades de crédito enquadradas pela legislação em vigor e com cobertura e detalhe informativo
adequados.

O conhecimento do cliente é então a trave mestra, ainda que a sua consagração surja de forma um pouco dispersa na legislação e por este aviso
4/2017 do Banco de Portugal

• dever de governação dos produtos:

Esta ideia é recente, procura acompanhar o produto bancário durante todo o seu ciclo de vida, desde a sua concepção até à sua distribuição. E,
portanto, a ideia é de haver um cuidadoso calibrar do produto que seja ajustado ao perímetro de clientes a que se vai destinar. Essa ideia de
adequação e ajustamento é fundamental, assim como o conceito de mercado-alvo.
Pe.: se estamos a fazer um contrato de depósito a prazo a 40 anos, não o vamos distribuir a idosos de 80 anos, não faz sentido. Tem que haver um
ajustamento das características dos produtos ao perfil concreto do cliente. Esta caracterização do tipo de clientes a que se destina o produto, é o
que chamamos de mercado-alvo. Temos até uma diferenciação:

• mercado-alvo positivo: envolve o perímetro de pessoas a que se destina o produto;


• mercado-alvo negativo: mercado a que o produto nunca pode ser distribuído.

Este dever concretiza-se no conhecimento do produto, é um “know your product”. A lei confia porém muito na capacidade de cada Banco na
identificação dos clientes.

• dever de governação de produto:

Estes deveres têm uma estrutura complexa e obrigam não apenas a identificar e respeitar o mercado-alvo de cada produto bancário, mas obrigam
também que ao longo de toda a cadeia de distribuição de produto haja o ajustamento do produto ao mercado-alvo, daí que haja preocupações com
a qualificação dos colaboradores. Por outro lado, este dever tem 2 principais vertentes:
• enquanto o criador do produto (deveres do criador);
• de quem distribui o produto (deveres do distribuidor).

Daí a diferença entre os art 90º-B e art 90º-C.

• dever de informação:

Aqui interessa falar do art 77º do RGIC: os clientes devem ser informados sobre as características dos produtos, a remuneração que vai associada
e os preços e encargos a suportar. Estas são as 3 dimensões mais relevantes do dever de informação, mas a lei não é particularmente explicita
quanto às implicações deste dever. São cláusulas abertas que aqui são deixadas. No nº2 descemos de um nível geral, para um nível particular - a
informação pode ser prestada em papel ou noutro suporte duradouro logo, a forma de prestação de informação não tem que ser através de papel.
No nº3 retira-se que deve haver informação pré́ -contratual e quanto à taxa (TAEG), com exemplos que veremos quando estudarmos o DL 133/2009.
Esta rede de deveres de informação (e o que está no 77º é uma amostra sumária) explica-se em função da assimetria de conhecimentos que existe
tendencialmente entre os clientes e o banco. A literacia financeira é baixa entre nós e é precisamente essa literacia financeira que explica e legitima
uma série de deveres de informação, que vão além do art 77º. De qualquer forma, no art 77º há́ o aspeto importante: os contratos devem ter toda a
informação necessária e devem ser redigidos de forma clara e concisa. Fora do RGIC há́ muitos exemplos de regras informativas relevantes. Há́
também diferentes formas de concretizar a informação, ie, pode haver deveres de informação que são recolhidos do cliente, pode haver deveres
de informação que são prestados pelas instituições de crédito e aqui quer quanto ao produto, remuneração e encargos que lhe vão associados.
Depois, vemos que a estatuição/consagração de deveres informativos é repetida em quase todos os diplomas com características particulares e por
isso, as normas do 77º acabam por ser pouco utilizadas porque há́ uma grande rede de diplomas. Por outro lado, os deveres de informação implicam
um reduto mínimo do contrato para assim estabelecer deveres de informação do cliente. No caso do regime dos deveres de informação subsequente
é muito relevante quando há́ taxas de crédito que se alteram ou operações de pagamento que venham a ser concretizadas.

O que acontece se o dever não é cumprido? Caso: “O Banco prestou informações incompletas ao seu cliente, mas alega que não deve ser
responsabilizado por não ter atuado dolosamente. Alega ainda que a culpa na sua actuação não pode presumir-se. Quid iuris?”

Na imputação de danos não é necessária a demonstração de uma actuação dolosa. Como há́ uma relação contratual entre o Banco e o cliente,
aplica-se o art 798º do Código Civil e por isso, temos a presunção de culpa do art 799º.
A posição do Menezes Cordeiro é isolada, num sentido minimalista das normas informativas gerais e nem analisa as normas informativas especiais.
A maioria da doutrina, nomeadamente o Menezes Leitão, diz que havendo relação contratual aplicam-se os art 798º ou 227º do Código Civil. Em
suma, não é necessário dolo, basta imputação a título de negligência e há́ uma presunção de culpa. A responsabilidade por um incumprimento não
é apenas responsabilidade civil. Em primeiro lugar, temos a questão da responsabilidade contraordenacional e para isso temos que ir ao RGIC:

• art 73º e ss. (normas aplicáveis às instituições de crédito)


• art 174º e ss. (normas que estendem a regras, nomeadamente o art 195º às sociedades financeiras);
• art 201º e ss. (responsabilidade contraordenacional, em matéria de incumprimentos):
• art 205º: a negligência e a tentativa são sempre puníveis, embora o limite máximo da infracção seja reduzido para metade.
• art 210º: tem a sanção - tem várias regras, entre as quais se inclui na alínea g) os deveres de conduta e na alínea h) os deveres de
informação. Temos ainda na alínea m) uma cláusula aberta. Assim, temos uma técnica mista, temos normas contraordenacionais típicas
e que têm sanções especificas; a alínea m) é particularmente importante pois é geral.
• art 211º/1/g). Se não subsumirmos o problema a nenhuma das alíneas do 210º (excluindo a alínea m), nem do 211º, aplicamos o 210º/m)

Há́ também responsabilidade disciplinar, se há́ incumprimentos isso pode afetar a relação laboral e dar origem à constituição de procedimento
disciplinar, no limite culminando em despedimento. Quanto é que o incumprimento de um dever bancário determina a invalidade do contrato
bancário celebrado? Por princípio, o incumprimento de um dever de informação obriga a reparar os danos, mas esse incumprimento não põe em
crise a subsistência do contrato, salvo se estiverem preenchidos os pressupostos do erro qualificado por dolo. O incumprimento dos deveres de
informação em princípio, não conduz à possibilidade de anular o contrato bancário em causa.

Vamos agora ver o tema da publicidade, que tem quer ver com a matéria informativa. Caso: “O Banco organizou uma campanha publicitária
sobre depósitos estruturados, onde informa que estes são “o fim da crise” e “uma aposta certa em ganhos certos”. O Banco de Portugal pretende
reagir, alegando que antes deveria ter sido consultado. Quid juris?” Para resolver os casos devemos:

1. qualificar o problema;
2. identificar as fontes jurídicas para a sua resolução.

Que tipo de questões é que vemos nesta hipótese? 77º-C: temos uma série de indicações. O 77º- D fala da possibilidade de intervenção do Banco
de Portugal, podendo ordenar as modificações necessárias para pôr termo às irregularidades, ordenar a suspensão das ações publicitárias em causa
e determinar a imediata publicação, pelo responsável, de retificação apropriada.
As regras da veracidade da informação nesta matéria da publicidade são também muito relevantes. Também as regras da identificação e da
transparência são importantes. Poderá́ então ser aplicado o art 77º-D, bem como as sanções dos art 210º e ss. do RGIC.

Caso prático: “Ernesto, trabalhador rural com 4ª classe, pretende celebrar um contrato de depósito estruturado com o seu banco, indexado ao
desempenho do índice CAC 40. Quid juris?” Que deveres bancários estão em causa numa situação como esta? Nesta situação, os deveres de
informação têm uma concretização mais intensa. É ainda fundamental o dever de conhecimento do cliente, só́ sabemos que tem a 4ª classe se
houver perguntas sobre isto. É também relevante o dever de lealdade. Regressando ao art 77º tem uma epígrafe que nos diz “Dever de informação
e de assistência” o conteúdo deste artigo tem que ver com a informação, mas há́ um aspeto que nos deve manter alerta é então: o que é que é o
dever de cuidado e assistência? O art 77º não esclarece o dever de assistência, mas há́ no regime do crédito ao consumo uma concretização do que
é o dever de assistência, que é o dever de dar informação suficiente ao cliente para que possa avaliar se o crédito é adequado às suas necessidades
e situação financeira. Este dever de assistência tem então um âmbito aplicativo que não é apenas o âmbito do crédito ao consumo, pois é
mencionado no art 77º do RGIC.

No regime especial dos deveres estruturas além de um dever de assistência, há́ também um dever de adequação. O dever de assistência é então dar
a informação suficiente para que o cliente avalie se o produto é adequado. O dever de adequação é um dever que impõe sobre o banco avaliar a
adequação dos depósitos estruturados, deve avaliar se o depósito é adequado às circunstâncias do cliente. Não podemos concluir que o dever de
adequação seja geral porque só́ está estabelecido nos depósitos estruturados. Se o cliente não dá informação necessária ou se se percebe que o
produto não é adequado, deve-se alertar para a falta de adequação e depois o cliente decidirá se quer consumar a celebração do contrato.

• dever de segredo:

Do art 78º/1 resulta que não se pode revelar ou utilizar informações. O que é que é confidencial? Temos duas dimensões: tudo o que é relação com
o cliente e os factos relativos à vida da instituição. O 78º/3 é também importante porque daí retiramos que o dever de segredo tem uma eficácia
pós-laboral e projeta-se sobre instituições, colaboradores mandatários, comissários e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente
ou ocasional. Os art 73º a 77º falam em deveres das instituições e o art 78º abrange também outras pessoas. Pe.: um advogado de um banco pode
ficar sujeito a este regime de dever bancário.

Já́ vimos a questão do que é que o legado confidencial. Caso: “Um acionista do Banco Estrela informou o Banco de Portugal de irregularidades
cometidas na instituição. Com base nessa denúncia, o Banco de Portugal inicia uma investigação e instaurou um processo de contra-ordenação aos
administradores do Banco Estrela. Estes, porém, alegam que o processo é nulo, por ter sido baseado com base em prova obtida em violação do
dever de segredo bancário. Quid juris?”
Se há́ um acionista que comunica informação ao Banco de Portugal, isso só́ por si é uma quebra do dever de segredo?
Pode haver excepções do dever de segredo. Os art 116º-AA (participação interna de irregularidades) e 116º-AB (participação ao Banco de Portugal)
têm essas situações - a esta comunicação de irregularidade nas instituições chama-se de whisteblowing - claro que isto não consubstancia a violação
do dever de segredo bancário. Por outro lado, o conceito de dado confidencial é um conceito bastante amplo e cobre tudo o que não seja um dado
público. A informação pode ser transmitida à autoridade de supervisão ou pode haver uma autorização para a transmissão da informação, art 79º/1
do RGIC. A confidencialidade é então um direito disponível e por isso, o cliente pode autorizar a transmissão da informação.

Caso prático: “O cônjuge separado de facto de x solicita o acesso à informação sobre a conta bancária deste. Deve considerar-se incluído na
esfera de discrição?” Claro que se for titular tem direito a conhecer. O debate existe nas situações em que não haja co- titularidade. Quando há́
rutura matrimonial é frequente na prática estas situações. O Supremo tem esta ideia de que quando a comunhão matrimonial está em crise, então
o cônjuge separado não titular deve ser tratado como um terceiro e só́ poderá́ haver acesso à conta se houver autorização do titular.

• O dever de segredo não é absoluto. Sempre que há́ um dever de comunicação, o dever de segredo cede.

Caso prático: “Um gerente bancário revelou a uma revista “cor-de-rosa” que uma conhecida atriz realizou um pagamento, através de cartão de
crédito, de 1,5 milhões de euros por uma operação plástica. Quais as consequências jurídicas de tal ato?”
Que consequências jurídicas é que se aplicam? Começar pelo art 210º/g) do RGIC, responsabilidade contraordenacional; pode haver
responsabilidade civil; responsabilidade penal, há́ poucas normas bancárias estejam associadas a responsabilidade penal (o art 200º do RGIC é
uma norma penal). Pode também aplicar-se o art 212º do RGIC. Há́ também então responsabilidade disciplinar. Qual é o regime da
crimininalização da violação de segredo? Temos no art 84º do RGIC uma norma remissiva e temos o crime no art 195º (revelação ilícita) e 196º
(aproveitamento ilícito de dados pessoais) do Código Penal. O problema destas situações é que os jornalistas invocam o segredo profissional, neste
caso invoca-se o art 135º do Código do Processo Penal. Vimos a estruturação dos deveres bancários gerais que se impõem aos bancos e sociedades
financeiras.

Caso prático: “O Banco Cinza pretende saber que implicações jurídicas e que cautelas práticas devem ser observadas na celebração de um contrato
de crédito com uma pessoa que não saiba ler ou escrever.” Que deveres jurídicos devem ser aqui tidos em conta? O dever de know your clients
começa por ser um dever de recolha de informação do cliente, nomeadamente o seu nível de literacia e nível de escolaridade. A lei ainda estabelece
o dever de informação, que é de intensidade variável e numa situação como esta apresenta uma composição mais aguda. Informar não significa
dar papel, significa explicar e ler e explicar o conteúdo do contrato a celebrar. Estas pessoas muitas vezes devem vir acompanhadas, mas não deixa
de haver um dever de informação com uma intensidade mais elevada. Outros deveres que falámos também aqui se projetam, como o dever de
assistência, dever de informar de forma suficiente para saber se a pessoa compreende que se adequa ao seu perfil.

Caso prático: “Um banco é instado judicialmente a prestar informações sobre transferências de fundos para sociedades off-shores de um cliente
seu acusado do crime de branqueamento de capitais. Recusa a prestação de informação alegando segredo. Pode a escusa considerar-se legítima?”
Na ordem jurídica portuguesa, o dever de segredo não é absoluto. Segundo os art 79º do RGIC e 135º do Código do Processo Penal, pode haver
quebra do dever de segredo, o que também decorre dos deveres bancários de prevenção de branqueamento de capitais e financiamento do
terrorismo. Temos uma lei completa a esse propósito, estabelece vários deveres para instituições de crédito e sociedades financeiras. Temos o
dever de identificação e deveres organizativos:

• Dever de identificação - a instituição de crédito deve exigir e a verificar a identidade dos seus clientes e dos respetivos representantes
ou das pessoas por conta de quem atuam e dos beneficiários efetivos, nos termos da Lei acima mencionada. Esta verificação é efetuada
antes do momento em que seja estabelecida a relação negocial (arts. 23.º-34.º Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto e Aviso Banco de Portugal
2/2018);
• Deveres organizativos - dever de controlo, dever de gestão de risco, dever de avaliação de eficácia, dever de adoção de procedimentos
e sistemas de informação, dever de estabelecimento de sistema de comunicação de irregularidades.

Temos ainda dever de comunicação de operações suspeitas ao Ministério Público e dever de colaboração quanto a matérias relacionadas com o
branqueamento de capitais. Neste caso, estava em causa o dever de comunicação.
Não interessa mergulhar a fundo neste diploma, mas interessa compreender este regime. Há́ assim mais uma derrogação ao dever de segredo
bancário.

Há́ deveres de comunicação autónomos sempre que há́ desequilíbrios financeiros. É uma questão de tomar a iniciativa de prestar a informação ao
Banco de Portugal. Dever haver uma comunicação ao Banco de Portugal. Este é um dever autónomo que se impõe não só́ à instituição, mas
também aos administradores e membros do órgão de fiscalização. As derrogações ao dever de segredo têm-se multiplicado nos últimos tempos.

Deveres organizativos e de boa governação

Este é um tema com implicações muito importantes hoje em dia. As regras sobre bom governo são regras que na área financeira emergiram
sobretudo na última década, e têm diversas concretizações e vertentes:

• Informação ampla sobre objetivos de gestão, sobre desempenho e sobre situações que o possam condicionar (entre as quais aquelas que
envolvam conflito de interesses);
• Estruturação adequada de incentivos à gestão;
• Incentivos a um exercício ativo e responsável dos titulares de participações sociais;
• Gestão adequada de conflito de interesses;
• Fiscalização robustecida;
• Prestação de contas/ Responsabilização.

Sempre que falamos de governação estamos a falar de um sistema de órgãos, de atores societários, de um sistema de práticas e portanto, há́ diversas
componentes que convergem para estes objetivos em termos que são complementares entre si, apresentam conexões entre si e são entre si
interdependentes. Temos que ter em atenção 3 casos reais, que explicam a realidade portuguesa:

1) BCP - foi o primeiro banco privado português e portanto, depois da época das nacionalizações e imprimiu uma qualidade de serviço nos
anos 80 que era destacada em relação aos outros e foi alargando o seu âmbito através de uma série de aquisições e a dada altura, o
engenheiro Jardim Goncalves (fundador do Banco) decide afastar-se. O processo de transição de liderança não foi o mais perfeito visto
que havia uma série de administradores com expectativas e ambições de suceder ao líder e a verdade é que o então presidente, em vez
de escolher um dos administradores, escolheu o secretário de administração - estava assim criado um ambiente hostil. O ponto mais
crítico nesta transição de liderança, residia na circunstância do engenheiro Jardim Gonçalves ter-se mantido no banco como presidente
do órgão de fiscalização, Conselho Geral e de Supervisão - começou o seu mandato com uma política totalmente intrusiva, queria
basicamente ter o mesmo poder de influência que tinha antes. Dois anos mais tarde, o engenheiro Jardim Gonçalves propõe ter o direito
de designar e destituir o conselho de administração executivo, seria uma maneira de voltar ao poder. Os acionistas não aceitaram esta
proposta e a decisão tomada foi que esse ambiente não era sustentável, os acionistas pressionaram a saída do engenheiro Jardim
Gonçalves e do Dr. Paulo Pinto. O desgaste desta guerra de governação teve um impacto no valor do banco brutal. Em 2000 o valor de
cotação era de 5,56€, em 2007 era de 3,45€ e em 2012 era de 0,08€, tudo isto acontece num contexto de crise claro, por isso claro que a
única causa para esta quebra foi a guerra de governação.
2) BES - havia uma série de operações feitas pelo BES que implicavam operações circulares de colocação de títulos para distribuir dinheiro
a sociedades de acionistas com prejuízo nas contas do próprio Banco. É uma forma de extrair valor do Banco (“tunneling”). Determinou
prejuízo no Banco, não havia uma separação entre a esfera do Banco e as esferas dos seus acionistas. Isso implicou não apenas prejuízos
elevados, mas a 1 de Agosto o BCE corta as linhas de financiamento ao BES. Dois dias mais tarde, o Banco de Portugal teve que atuar
uma medida de resolução ao BES - claro que não atuou cedo, mas também nesta situação temos uma demonstração clara de como falhas
de governação e os conflitos de interesses em benefício dos acionistas do banco determinam o fim de um dos maiores bancos privados
portugueses.
3) CGD - motivou uma comissão parlamentar de inquérito. O que está em causa é a concessão de crédito em muitas situações contra a
recomendação do comité́ de riscos. E, portanto, havia processos que não implicavam a avaliação da solvabilidade do cliente, a função
do comité́ de risco não era independente e o CRO não tinha assento na administração. Daqui decorreram perdas importantes para um
banco público - 1.2000 milhões de euros. É uma elevada danosidade provocada por falhas de governação.

Dentro do sistema de controlo interno temos 3 funções:


1. compliance ou função de cumprimento;
2. auditoria interna;
3. gestão de risco.
Se temos uma função de gestão de risco que não funciona, o sistema todo fica afetado.

Relevo atual do tema

Estas situações descritas são as portuguesas, claro que também poderíamos colher vários exemplos noutros países. Na última década houve várias
situações de deficiência de governação em instituições financeiras, o que determinou um caudal de regras jurídicas sobre governação. Houve uma
falha a determinar muitas regras jurídicas sobre esta matéria. É evidente que as regras têm uma proveniência muito diversa, algumas regras são
mais recomendatórias, mas o grosso das regras têm uma natureza imperativa, são deveres de governação no seu sentido mais próprio. Temos
orientações da EBA, documentos orientadores do FSB, Princípio do Comité́ de Basileia, CRD IV e o regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013 (Capital Requirements Regulation). Há́ ainda avisos do Banco de Portugal. Os deveres de
organização de bancos são hoje centrais. Quais são os 3 princípios fundamentais que aqui se manifestam?

1. princípio da transparência - constituição de uma rede ampla de prestação de informação (pública ou ao supervisor), permite detetar
excessos e desequilíbrios, mas também permite que os clientes possam escolher. Há́ o paradigma implícito do cliente bem informado,
que se quiser até pode fazer comparação de governação entre bancos. A legislação europeia trata os deveres de governação como deveres
prudenciais, estão ligados à salvaguarda do risco prudente. Depois há́ outra vertente que tem que ver com a informação aos acionistas.
Se algum facto belisca essa actuação, os acionistas devem saber (podem querer destituir a pessoa em causa ou não renovar o mandato
do administrador em causa - por isso, é importante fazer funcionar o escrutínio feito pelos acionistas). Também a política de remuneração
está ligada ao risco, daí também a importância do escrutínio.
2. princípio da efetividade - o barómetro decisivo na avaliação de governação não são as intenções, mas as práticas e as ações. Pe.: o BES
tinha vários manuais sobre governação e conflito de interesses, tinha vários administradores não executivos e independentes. No papel
parecia um banco que tinha todas as estruturas em prática para dar resposta ao equilíbrio da governação, mas esse equilíbrio faltava na
defesa do património do banco, fazer afirmar a primazia dos interesses dos clientes. A prioridade não é o exame de intenções ou políticas
que vivem em gavetas, mas análise de práticas concretas (não é lip service). Há́ também uma cultura societária, o que é isso? A cultura
é a capacidade de as práticas de áreas de organização, transversais, serem portadoras dos valores/princípios que o Banco enuncia e
defende. Se estivermos a fazer uma análise da governação baseada neste conceito de cultura percebemos que se a cultura é doente, se é
longe da integridade é difícil de mudar a cultura. É o repositório de actuações, não apenas de uma pessoa ou de um líder, mas de toda a
organização. A cultura é revelada através do comportamento transversal, continuo de todos os dirigentes de cada Banco. O que é o
contrário da cultura? É olharmos para a governance como um mecanismo mecânico de box ticking, nunca podemos resumir a um
catálogo de intenções ou comportamentos que vive apenas no papel, cumprimento mais ou menos mecânico, os deveres de boa
governação obrigam a ir muito além disso. Há́ pessoas que se autoanulam e anulam qualquer forma de desafiar aquilo que o líder diz, é
o group thinking. A ideia de sistema de governação é de haver escrutínio, quem pergunte, quem analise, quem desafie, quem vote em
sentido contrário, etc. - quando isto desaparece, quando o líder perceber que independentemente daquilo que ele decida ninguém vai pôr
em causa essas instruções, esse é o fim do sistema. É mais difícil avaliar a qualidade de governação. Como podemos avaliar a cultura?
Temos 3 exemplos de indicadores importantes para avaliar a cultura:
1. o empoderamento interno das funções de fiscalização e de controlo interno - não basta haver os órgãos no orno grama, é
preciso haver poderes, que pode ter a ver com ter pessoas de qualidade e capacitadas e pode ser dar toda a informação
necessária.
2. ao grau de transparência interna e à circulação interna de informação - também tem que ver com a efetividade.
3. ao nível de risco tolerado e ao desenho de política remuneratória - se temos políticas remuneratórias muito agressivas isto
transforma a cultura do banco, passa a ser um banco com nível de risco de comportamentos mais elevando, riscos de
incumprimento, o que é um aspeto bastante complexo e indutor de muitos prejuízos. Um prémio em si é um estímulo, tudo
tem a ver como podemos equilibrar estes incentivos.
3. princípio de proporcionalidade - one size does not fit all, isto não é um fato de medida única, temos que calibrar as exigências à dimensão,
riscos concretos de cada Banco. É evidente que este princípio não significa que em todas as regras seja ponderada esta proporcionalidade,
isto é, se pe. o órgão de fiscalização deve ter um presidente e um membro independentes, esta é uma regra que não é sensível ao princípio
da proporcionalidade. Temos então algumas regras sensíveis a este princípio, mas há́ outras que não o são. O dever de política de
remuneração é independente da complexidade dos bancos. Este tema é mais premente quando falamos em recursos humanos. Se a lei
nos fala em compliance, é claro que o compliance de um pequeno Banco é diferente da CGD, estamos a calibrar a exigência de
governance em função da dimensão da instituição de crédito. O destinatário deste princípio são as instituições, elas é que têm a
capacidade de parametrizar a intensidade do dever em função da sua dimensão. Esta concretização aplicativa também é parametrizada
em função das características da instituição. É evidente que aspectos que também diferenciam a governação de cada banco têm também
a ver com os estatutos e os regulamentos de funcionamento dos órgãos sociais os regulamentos internos e as políticas, as comissões
societárias e também são relevantes os fluxos de informação. É certo também que a propósito das políticas, há́ uma certa auto-regulação.
Ou seja, política de reclamações, concessão de crédito, de controlo interno, etc. - são preparadas por cada instituição e nessa medida, há́
um grau de autonomia dos bancos na sua preparação. Claro que se há́ um primado da efetividade não podemos também esquecer que é
impossível reduzir o sistema de governação às linhas de defesa, a um catálogo de políticas e manuais e instruções organizativas. Nesta
matéria, tem uma influência decisiva a integridade das pessoas - os modelos de governance não funcionam sem as pessoas. Neste âmbito,
é de sublinhar o papel dos administradores não executivos, são eles que têm esta função de serem desafiadoras e acompanharem
criticamente as decisões e efetividade do controlo interno, acompanharem o processo de prestação de contas e desafiar a própria
estratégia dos bancos - contrariam aquela ideia de pensamento de grupo.

É importante ainda uma diversidade nos órgãos sociais: competências, geografia, idade e género (tem um tratamento normativo, há́ o dever de
cada banco fixar um objetivo de diversidade, objetivos ao nível dos órgãos sociais e funções essenciais - são regras que deixam respirar alguma
margem de autonomia, mas têm um impacto na governação das instituições de crédito).

A expansividade dos deveres dos administradores

Temos aqui deveres que não são apenas deveres da instituição, mas há́ deveres dos próprios administradores. Os administradores podem ser eles
próprios constituídos no regime de whistleblowing (art 116ºAA e 116ºAB), dever de gestão sã̃ e prudente (art. 14.º 1 j), 30.º/2 e 118.º RGIC),
dever de diligência na gestão do banco (art. 75.º RGIC), dever de conhecimento dos riscos inerentes à atividade do banco, dever de conhecimento
da estrutura do banco (know your structure) e de verificar a adequação desta à estratégia do banco e à regulação envolvente e dever de aplicação
de mecanismos de controlo interno que assegurem uma gestão sã̃ e prudente (17.º 2 c) RGIC). Não está apenas em causa a esfera jurídica e o
património do banco, mas também a esfera jurídica e o património dos administradores e dirigentes (art 210º do RGIC). A lei não é tudo, há́
mecanismos sociais importantes para pressionar para haver uma governação mais perfeita e equilibrada que tem que ver com a reputação. Não
podemos subestimar a poderosa influência dos mecanismos de salvaguarda da reputação dos dirigentes, tem um efeito disciplinador importante.
É um mecanismo invisível, mas virtuoso para conduzir a uma melhor governação. Claro que não é um mecanismo perfeito, pois a reputação é em
certa medida manipulável - apesar destas limitações, o elemento da reputação é cada vez mais importante.

A expansividade dos deveres dos membros de órgãos de fiscalização

É importante a fiscalização, acompanhamento e escrutínio do sistema de controlo interno. Há́ um regulamento sobre auditoria que se aplica aos
bancos e acrescenta outros deveres ao orago de fiscalização, nomeadamente:

1. fiscalizar a eficácia do sistema de controlo interno sem colocar em causa a sua independência;
2. controlar e acompanhar a independência do ROC na execução dos serviços (de auditoria ou de serviços distintos de auditoria) por este
prestados.
Isto decorre da lei 140/2015 e da lei 148/2015. Os bancos são identificados como entidades de interesse público e daí as regras particulares que se
aplicam quanto ao órgão de fiscalização. É fundamental a segregação entre a fiscalização e a revisão de contas, deve haver inclusão de uma maioria
de membros independentes e há́ deveres especiais a cargo do órgão de fiscalização.

Caso prático: “A administração do Banco pretende despedir o responsável pela função de risco, alegando como fundamento uma conduta
excessivamente intrusiva em relação à gestão societária. Quid iuris?”
São trabalhadores, estão sujeitos ao poder disciplinar que decorre dos vínculos laborais. Qual é que é a resposta quando ao abrigo dos poderes
disciplinares, a administração do banco diz que o trabalhador é despedido por ter uma conduta excessivamente ativa enquanto responsável pela
função de risco? Art 115º-M/1 - é um colaborador da instituição, mas deve exercer de forma independente, isto é: ter recursos para o desempenho
das suas funções e linhas de reporte dentro do banco. O responsável pelo risco tem que reportar a um membro da administração que não tenha o
acompanhamento de tema de negócio. Este tipo de intervenções só́ pode funcionar com independência, se embora dentro daquilo que é o vínculo
laboral, tem um recurso e reporta a uma administradora que não tem um pelouro de negócio. Então há́ administradores com pelouros de controlo
e administradores com pelouros de negócios. Art 115º-M/2: tem a ver com as linhas de reporte. Art 115º-M/3: além deste reporte dentro do
conselho de administração, pode também haver informação prestada diretamente ao órgão de fiscalização e não pode ser destituído sem aprovação
previa do órgão de fiscalização. Esta garantia existe no responsável do compliance e no responsável da auditoria interna? Não, aqui a lei acautela
mais intensamente a função da gestão de risco.

Caso prático: “O Banco Azul foi objeto de uma ação de supervisão presencial, que revelou deficiências graves na instituição, designadamente:
ausência de um sistema de auditoria interna; recursos insuficientes na área de controlo de cumprimento; área de gestão do risco dependente do
administrador com o pelouro das áreas comerciais. Quais as consequências jurídicas de tal constatação?”

Uma das consequências tem que ver com a actuação do Banco de Portugal que pode determinar medidas corretivas para sanar com urgência esta
situação, art 116º-C/2/d). No incumprimento de deveres bancários, há́ sempre sanções que dependem da instauração de um processo de
contraordenação, há́ sempre sanções em observância de regras de governação, art 210º RGIC.

É também importante a inserção sistemática dos deveres de bom governo, art 14º/1/f)/g)/h)/i) - são requisitos da autorização, se falham os requisitos
pode haver revogação da autorização, art 22º. Não é um catálogo de deveres inconsequente, pode haver consequências contraordenacionais, mas
também pode haver no limite revogação da autorização (22º/1/b)).

Remuneração

A remuneração dos órgãos sociais e das pessoas com funções nas organizações, mesmo os empregados de balcão, condiciona comportamentos.
Cada vez mais a estrutura da remuneração é complexa. Devemos distinguir a componente da remuneração fixa, que é paga ao longo de 12 meses
do ano (se estivermos perante um contrato de trabalho isso ainda inclui subsídio de férias e subsídio de Natal que pode ser pago 14 meses ao ano);
mas hoje em dia, tem uma função importante a remuneração variável (ou componente variável da remuneração). É importante haver uma
componente variável na medida em que isto permite diferenciar quem cumpre mais e quem cumpre menos, se tivermos apenas uma remuneração
fixa, o funcionário que trabalha 8 horas recebe o mesmo daquele que está lá 4 horas e meia (o vício da função pública é esse).

Há́ um princípio importante de que é o princípio do pagamento em função do desempenho, pay for performance. Este princípio diz-nos que se nós
temos uma remuneração variável, então conseguimos alinhar melhor os interesses do colaborador com os interesses do próprio Banco. À partida
devemos ver esta componente como potencialmente virtuosa. Ter uma remuneração atrativa permite atrair os melhores recursos humanos,
atrair/reter/motivar o talento - isto é então algo também importante para termos profissionais mais competentes nas organizações.

Por outro lado, a remuneração deve estar plasmada numa política remuneratória, que fará uma distinção dentro da remuneração variável, entre os
incentivos de:

• curto prazo - pagos no imediato;


• médio prazo - pagos mais tarde;
• longo prazo - pagos mais tarde ainda - é aqui que nos vamos centrar, visto que hoje em dia é obrigatório que haja um diferimento de 3 a
5 anos, de 40% a 60% da remuneração variável.

Porquê este diferimento imposto por lei e constante da política remuneratória? Isto tem tudo que ver com a perversão dos incentivos de curto
prazo. Se temos incentivos de curto prazo podemos ter comportamentos de risco que depois prejudicam a longo prazo a performance ou a
solvabilidade do Banco. A natureza da prestação remuneratória diferida é de uma prestação condicional a dois aspetos fundamentais:

1. solvabilidade da instituição - se a instituição no momento de pagamento entrou num processo de resolução, não há́ nada. O direito
constitui-se no momento da atribuição, mas só́ se torna exigível 3 a 5 anos mais tarde, este período de inexigibilidade da prestação é
considerado como o vesting do crédito.
2. ilícitos - pe.: diretor financeiro que manipula os resultados do Banco para ter um bom prémio ou de um comercial que falseia documentos,
dando a entender que teve melhor resultado do que na verdade teve para receber o prémio. O problema é que pode haver comportamentos
ilícitos, que às vezes são detetados logo, outras vezes um pouco mais tarde.

A lei para acautelar estas situações, impõe um mecanismo adicional que é a consagração de cláusulas malus e de cláusulas claw-back:

• cláusulas malus - os factos que levam à aplicação destas cláusulas são menos graves e leva à redução do montante dos incentivos;
• cláusulas claw-back - os factos que levam à aplicação destas cláusulas são mais graves. Leva a uma reversão da remuneração, em função
de ilícitos. O problema, é a conciliação entre o claw-back e a regra laboral, o principio da irredutibilidade da remuneração. Claro que
um administrador não é um trabalhador, a aplicação do claw- back terá́ uma aplicação plena.

É importante percebermos esta lógica e sobretudo, a natureza condicional da remuneração que é diferida no tempo. Requisitos da política de
remuneração:

• deve estar alinhada com a estratégia de negócio, os valores e os interesses de longo prazo (cf. 92.2.b CRD);
• deve incluir medidas para evitar conflito de interesses (cf. 92.2.b CRD);
• deve nas instituições de crédito, promover gestão sã̃ e prudente e não incentivar risco excessivo (cf. 74.1 e 92.2.a CRD).

É importante este ponto de ligação entre a política de remuneração e o nível de risco de cada instituição. Por outro lado, a certa erosão do princípio
pay for performance, isto é, não é uma avaliação pura de desempenho, temos que ter em consideração outros elementos: a solvabilidade do Banco,
a integridade do trabalhador, para ponderar essa atribuição ou não do incentivo. Há́ aqui um conceito fundamental sempre que se fala de
remuneração variável, isto é, a remuneração variável é uma remuneração que impõe e depende de objetivos. Se os objetivos são cumpridos, a
remuneração é devida, se os objetivos não cumpridos, a remuneração não é devida.

A fixação desses objetivos é fulcral, a esses objetivos chamamos os KPIs (critérios centrais de desempenho, key performance indicators). Os KPIs
são os critérios para medir o desempenho esperado que leva ao merecimento da remuneração variável. É evidente que fundamental é que a estrutura
ou o órgão que determine os KPIs seja independente de quem os vai cumprir. Pe.: se é a própria administração a fixar os indicadores de
desempenho, pode fixar indicadores muito fáceis de atingir e então acaba a função disciplinadora da remuneração variável.

A remuneração variável pode ter uma função disciplinadora, nós dizemos pe.: se houver algum incumprimento perante o Banco de Portugal e
CMVM ninguém tem prémio - claro que isto coloca uma pressão sobre toda a organização para não haver nenhuma falha de compliance. Pe.: se
não houver redução da utilização de plástico dentro da organização para ser mais sustentável, ninguém tem prémio.

A fixação dos KPIs deve ter uma estratégia do Banco - o que é que o Banco considera fundamental, o que é que vai valorizar como prioritário,
como metas decisivas para aquilo que é o sucesso de cada colaborador e da organização.
Outro aspeto importante a focar é que ter KPIs que não sejam apenas quantitativos, mas que também qualitativos que são mais difíceis de
manipular. Para além, disso ter KPIs que tenham em vista não apenas a pessoa ou o seu departamento, mas o Banco no seu todo. Pe.: na TAP, foi
dada uma remuneração variável porque o seu departamento foi ótimo. Mas esta empresa, esta empresa teve prejuízos muito grandes, como é que
não estamos a considerar isto também nos KPIs?! O sistema tem que funcionar em termos integrados, não podemos estar aqui a dar estímulos que
são totalmente isolados e não atendem àquilo que é a visão integrada do Banco.

O art 399º do CSC disciplina a possibilidade de haver uma delegação dos poderes de fixação das remunerações a uma Comissão de Remuneração
e a verdade é que estas regras já́ têm uma complexidade tão grande que a Comissão de Remunerações gere melhor a especialização do tema,
conflitos de interesses que possam surgir e às vezes, casos que podem ser sensíveis porque até afetam os administradores. Portanto, ou a fiscalização
é que vê̂ isto ou a Comissão de Remunerações. O art 399º do CSC, diz-nos então que nunca são os administradores a ajuizar a sua própria
remuneração. Isso vale para a fixação dos KPIs, mas também para a verificação da aplicação do malus e do claw-back - deve haver uma estrutura
independente dentro do Banco, designado por Comité́ de Remunerações ou órgão de fiscalização, para que possam decidir a aplicação do malus e
do claw-back.

Mecanismos de alinhamento:

1- Temos aqui atribuição de ações ou instrumentos financeiros com restrições de transmissibilidade, é o restricted stock, isto é, no sentido
de com uma transmissibilidade limitada;
2- As cláusulas malus e claw-back;
3- Maior diversidade de indicadores de desempenho, que não sejam apenas individuais, mas indicadores também coletivos e atendam aos
resultados globais da instituição;
4- O bonus cap é um limite na remuneração variável, o variável não pode ir além da 100% do fixo, a não ser com uma autorização da
Assembleia Geral, mas ainda assim não pode ser mais que o dobro do fixo;
5- O diferimento de uma parte da remuneração variável;
6- Limitação de cláusulas de compensação em caso de cessação de funções - as chamadas golden parachutes, aqui fazendo como que haja
um reflexo do desempenho em função destas mesmas cláusulas e portanto, não haver aqui pagamentos que sejam totalmente cegos ao
desempenho.

Comissão de remunerações

É uma solução muito importante para o cumprimento destas regras, cada vez mais há uma procura por juristas que dominem bem estas regras
sobre remuneração. A política de remunerações deve ser levada a uma aprovação anual por parte da Assembleia Geral, é evidente que esta
aprovação anual depois acaba por ser um pouco contraditória com os objetivos de longo prazo da própria política, mas tem também o mérito de
implicar uma maior transparência na política, o que é bastante relevante.
Nota: Por vezes a forma mais fácil de esvaziarmos certos órgãos é termos pessoas não serem remuneradas e que por isso, não têm qualquer tipo
de estímulo para estar presente. Isso é também uma forma de conduzir ao esvaziamento das funções em causa.

Conflitos de interesses

É importante termos presente como aspeto transversal o tema dos conflitos de interesses. No fundo, sempre que haja um interesse que seja
contraditório com o interesse do Banco, de forma a que a satisfação de um interesse prejudique um interesse do banco, isso é um caso de conflito
de interesses e deve ser como tal identificado, gerido e evitado.

Isto é tratado primeiro dentro da organização, a existência de políticas de conflitos de interesses a serem aplicadas não apenas pela área de
compliance, mas também pela área de gestão de riscos. Não é uma obrigação, mas uma prática de promover o Chief Risk Officer ao nível da
administração. O art 115º-M não o obriga, pode ser um quadro superior na organização.

E depois na relação dos Bancos com os seus clientes, nomeadamente na concessão de crédito há́ regras relevantes nos art 85º e ss. do RGIC sobre
conflito de interesses na concessão de crédito - levanta muitas situações, há́ a solução extrema que é proibir a concessão de crédito quando há́
conflito de interesses. Há́ uma pressão para haver primazia dos interesses dos acionistas, sob os interesses do Banco. Há́ um mosaico muito rico
de regras e todas as regras confluem com o bom governo dos Bancos. Basta uma parte destas regras referidas não estar bem cumprida ou ser
analisada de forma mais superficial para toda a qualidade do sistema poder ficar afetada.

Deveres prudenciais

Há́ uma grande contraposição entre o direito comportamental e o direito prudencial. É importante fazer um quadro mais amplo de como é que
injetamos capital nas instituições de crédito, hoje cada vez mais com taxas de juro negativas. O tema de como é que os bancos se financiam é mais
central, pode haver financiamento:

• através do mercado de valores mobiliários - fazem-no cada vez menos;


• através de capital de risco - significa não celebrar contratos de mútuo, mas significa comprar uma participação social. Pe.: caso de
aquisição do Novo Banco. Há́ não apenas a tomada de posição financeira, mas também um cunho de know-how. Hoje em dia, o papel
do capital de risco é crescente, são estruturas sujeitas a menor regulação que os Bancos e levar ao levantamento de montantes muito
elevados;
• bancário - tem vários tipos de contratos por detrás disso. Quando o Banco financia, o Banco dispõe-se ao risco de os devedores não
cumprirem. O risco é natural a toda a atividade Bancária.

Há́ vários tipos de riscos que gravitam em torno da atividade bancária:

• de liquidez - não ter liquidez imediata. Uma grande preocupação são as corridas aos depósitos quando há́ duvidas sobre a solvabilidade
do Banco;
• de mercado - quando os Bancos investem e compram participações que se podem valorizar ou desvalorizar, estão expostos ao risco de
mercado;
• de crédito - pode ser mitigado através da prestação de garantias, “colateral”. Eliminar o risco de crédito é ter uma colaterização (ter um
valor de garantia superior ao empréstimo);
• de contraparte;
• sistémico - não é um risco micro-prudencial, mas sim macro-prudencial. Não está em causa a solvabilidade de uma instituição, mas sim
a estabilidade financeira. É um risco de contágio e dificilmente previsível. Há́ até um departamento no Banco de Portugal de risco
sistémico. Pe.: se há́ uma guerra nos EUA, isso pode afetar a estabilidade financeira mundial, afeta em termos transversais os mercados;
• operacional;
• cambial.

Como contrariar o risco sistémico? Que regras nos interessam para contrariar o risco sistémico? Em primeiro lugar, o dever de gestão sã̃ e prudente
dos administradores, dos órgãos de fiscalização, dos titulares de participações de instituições financeiras - é uma cláusula geral da qual transpiram
todas as regras prudenciais, sempre com o objetivo da instituição poder solver os contratos em que seja parte e honrar os compromissos. Este dever
transversal, tem depois várias medidas corretivas, o Banco de Portugal faltando este requisito pode retirar a idoneidade dos administradores ou
dos membros de órgãos de fiscalização. Esta gestão sã e prudente é um dever das instituições de crédito e sociedades financeiras e dos membros
dos órgãos da instituição financeira a título pessoal. Há́ vários deveres complementares:

• diligência, art 75º do RGIC;


• dever de aplicação de mecanismos de controlo interno, art 17º/2/c) do RGIC;
• no plano sancionatório, a consideração como contraordenações especialmente graves tudo o que tenha a ver com dificultar ou impedir
uma gestão sã̃ e prudente.
• Há́ depois os deveres prudenciais, art 94º do RGIC: as instituições de crédito devem manter níveis adequados de solvabilidade
(suscetibilidade de satisfazer compromissos financeiros em termos duradouros. Há́ rácios de solvabilidade para medir este requisito) e
liquidez (capacidade de entrega monetária imediata).

Há́ requisitos de capital social mínimo, em função do tipo de instituições o capital é diferente, não são os 50.000€ que o CSC diz:
• Bancos e caixas económicas bancárias - € 17 500 000;
• Caixas de crédito agrícola mútuo - € 5 000 000 ou € 7 500 000, conforme façam ou não parte do SICAM;
• Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo - € 17 500 000;
• Sociedades de investimento - € 5 000 000;
• Sociedades de locação financeira - € 3 000 000, se tiverem por objeto apenas a locação financeira mobiliária, ou € 5 000 000, nos
restantes casos;
• Sociedades de factoring - € 1 000 000;
• Sociedades financeiras de corretagem - € 3 500 000;
• Sociedades corretoras - € 350 000;
• Sociedades mediadoras do mercado monetário ou de câmbios - € 50 000 ou € 500 000, consoante operem exclusivamente no mercado
monetário ou simultaneamente nos dois mercados;
• Sociedades gestoras de fundos de investimento mobiliário e sociedades gestoras de fundos de investimento imobiliário - € 125 000.
• Sociedades gestoras de patrimónios - € 250 000;
• Sociedades de desenvolvimento regional - € 3 000 000;
• Sociedades administradoras de compras em grupo - € 500 000 ou € 250 000, consoante administrem ou não administrem grupos
constituídos para a aquisição de bens imóveis.
• Agências de Câmbios - € 100 000;
• Sociedades de garantia mútua - € 2 500 000;
• Sociedades financeiras de microcrédito - € 1 000 000;
• Instituições financeiras de crédito - € 10 000 000;
• Sociedades financeiras de crédito ‐ € 7 500 000;
• Caixas económicas anexas ‐ € 1 000 000.

No entanto, o conceito de capital social é insuficiente a uma disciplina prudencial. Por influenciam do Comité́ de Basileia temos um conceito
âncora: fundos próprios, as composições do património dos Bancos tem que ser prudente, se um Banco tiver depósitos noutra instituição ou ações
numa start-up, o risco é diferente, há́ uma ponderação do risco.O regime dos fundos próprios complementa o regime do capital social, os fundos
próprios não podem ser inferiores ao capital social. É uma definição dos ativos das instituições de crédito que depois determina a constituição de
uma série de reservas. Há́ uma classificação entre diversas rubricas dos fundos próprios. E há́ a obrigação de constituição de várias reservas, que
são especificas e talhadas de forma especial às instituições de crédito (não se aplicam às sociedades financeiras):

• reserva de conservação;
• reserva contracíclica - quando estamos num momento bom do ciclo, os Bancos devem preparar-se para um momento menos bom;
• Reserva para instituições de importância sistémica global - não temos;
• Reserva para outras instituições de importância sistémica - temos;
• Reserva para risco sistémico. Estas reservas são limitações à gestão patrimonial das instituições de crédito que visam concretizar a gestão
sã̃ e prudente.

Os rácios de capital e de solvabilidade são regras que têm um sentido e consequências. O que é que acontece se as regras não são cumpridas? Será́
que isto são recomendações ou normas jurídicas em sentido próprio? Quais são as consequências jurídicas se houver incumprimento destas regras
prudenciais? Em primeiro lugar, há́ a aplicação de contraordenações. Também pode haver sanções acessórias. A supervisão efetuada pelo Banco
de Portugal é continua, especialmente neste tipo de tema.

O Banco de Portugal quando sente que há́ instituições de crédito em situação difícil faz deslocar equipas de supervisão dentro das instituições a
fazer análises da informação para que não haja surpresas, art 96º/3. Pode também fazer auditorias.
Mas se se prolongar o problema, o que é que o Banco de Portugal pode fazer? Há́ uma administração provisória. Uma última medida seria a
revogação da autorização. Em suma, o que temos é (art 139º e ss. do RGIC):

1. Intervenção corretiva: dirigidas ao incumprimento ou risco de incumprimento, 141º a 145º do RGIC;


2. Administração provisória, 145º-A do RGIC;
3. Resolução, 145º-C a 145º-AU do RGIC.

O capítulo VIII tem duas partes gerais: tem uma primeira parte geral e tem uma segunda parte geral nos art 145º-AV e seguintes.

As atividades bancárias, as operações bancárias

Vamos ver os contratos estabelecidos:

1. conta e contracorrente bancárias;


2. depósito bancário;
3. depósitos especiais.

Qualquer relação bancária implica uma conta bancária, que é a expressão contabilística de todos os contratos estabelecidos, que abrange vários
contratos: depósito, abertura de crédito, convenção de cheque, contrato de utilização de cartão e ordens de pagamento, por exemplo. É evidente
que a forma de vermos qual é a natureza do direito a ter conta é perguntar: pode um cliente dirigir-se a uma instituição de crédito e exigir a abertura
de uma conta bancária? Existe ou não um direito a abrir uma conta? O que fundamenta o conceito de serviços mínimos é a ideia de inclusão
bancária ou financeira, há́ uma série de serviços a que só́ podemos ter acesso através de conta e cartão bancário. É essa preocupação que leva à
constituição de um regime de serviços bancários mínimos.

Houve uma reflexão inicial pela Comissão Europeia que desembocou no DL 27o-C/2000, que é o diploma que estabelece os serviços mínimos
bancários, e dentro destes está a abertura de uma conta bancária. O diploma indica como serviços mínimos os serviços relativos à constituição,
manutenção e gestão de conta de depósito à ordem e ainda cartão de débito que permita a movimentação da referida conta mediante transferência
ou recuperação eletrónica dos fundos nela depositados, instrumentos, manuais ou mecanográficos, de depósito, levantamento e transferência
interbancária desses fundos.

É evidente que a atividade bancária é empresarial, procura um intuito lucrativo e por isso, estas regras são sempre excecionais. E há́ regras que
também procuram proteger o Banco. Há́ possibilidade de resolução do contrato quando há́ falsas informações ou não utilização da conta durante
muito tempo - não é um direito sem restrições, mas não deixa de ser um direito.
Os serviços mínimos, não cobrem serviços de crédito. A ideia é ter uma conta e não cumular várias contas em vários Bancos.

Conta-corrente
Se temos uma conta, temos um mecanismo contabilístico que anula ativos e passivos e leva a uma cifra final. Resume a uma só́ cifra movimentos
que podem ter origens distintas. Aqui surge como importante o contrato de depósito. As instituições de crédito são aquelas que recebem do público
depósitos e outros fundos reembolsáveis para concederem crédito por conta própria.
Há́ vários tipos de depósitos e não podemos tomar a parte pelo todo:

1. depósito de joias;
2. de valores mobiliários;
3. de metais preciosos;
4. de dinheiro;
5. administrado;
6. de cofre-forte;
7. de juro negativo;

A lei traz uma tipologia de depósitos, está em causa o DL 430/91 de 2 de Novembro, que tem o regime geral dos depósitos e fala:

1. à ordem - Possibilidade de movimentação a todo o tempo. Levantamento e transparência, podemos fazer uma movimentação a todo o
tempo.

I. com pré́ -aviso


II. a prazo

Só́ pode haver uma movimentação depois do prazo convencionado.

2. a prazo não mobilizáveis antecipadamente Não admite a movimentação.


3. constituídos em regime especial

Caso: O titular de um depósito a prazo não mobilizável antecipadamente solicita o levantamento do dinheiro depositado antes de decorrido o
prazo. Quid iuris? A faculdade de modificar o prazo está vedada.

Depósitos em regime especial (não interessa conhecer):

• Depósitos «poupança-reformados»: Decreto-Lei n.º 138/86, de 14 de Junho;


• Depósitos «poupança-habitação» : Decreto-Lei n.º 27/2001, de 3 de Fevereiro;
• Contas «poupança-condomínio»: Decreto-Lei n.º 269/94, de 25 de Outubro;
• Depósitos «poupança-emigrante»: Decreto-Lei n.º 323/95, de 29 de Novembro e Portaria n.º 909/2003, de 29 de Agosto.

Caso: Um Banco comercializa um depósito especial para poupança-férias. Pode fazê-lo?


DL 430/91, art 2º, é preciso uma mera notificação previa ao Banco de Portugal. Porém, o Banco de Portugal não admite a utilização da expressão
depósito, quando o contrato não se configure como depósito.

Características do depósito bancário em dinheiro:

• contrato real quanto à constituição - real quoad constitutionem;


• contrato real quanto aos efeitos - a entrega do montante depositário, determina logo um efeito obrigacional, que é a obrigação de
restituição do montante. Um outro efeito importante é um efeito real. Quando entregamos o dinheiro ao Banco, ele transfere-se para a
titularidade do Banco, é uma aplicação do art 1144º, aplicado através do art 1206º do Código Civil. Isto é a chave de todo o sistema
bancário porque é a transferência de titularidade que permite que o Banco tenha poderes de disposição sobre o dinheiro e possa conceder
crédito sob o dinheiro em causa. São bens fungíveis pois estamos a falar de dinheiro, por outro lado, o efeito translativo que aqui se
desprende é que permite a concessão de crédito a título oneroso e por isso, os poderes de disposição sobre o montante depositado.
Supondo que fazemos um depósito de notas raras no Banco isto tem o efeito translativo ou não? Não, pois, não são bens fungíveis. O
depósito de bens infungíveis nunca tem efeito translativo; o depósito de bens fungíveis só́ tem efeito translativo no caso de dinheiro, não
o tem no caso de valores mobiliários. Transformação das maturidades: se temos um depósito à ordem, temos uma relação de maturidade
a curto prazo, ao passo que as relações de crédito na maior parte das vezes, são a longo prazo. É também o efeito translativo que
fundamenta o que se chama a função económica da banca na transformação das maturidades. Transforma uma responsabilidade de curto
prazo numa responsabilidade de longo prazo - o Banco é devedor numa relação a curto prazo e credor numa relação a longo prazo.
• contrato de custódia - se é assim, já́ não temos uma obrigação de guarda, pois não estamos a guardar a mesma coisa. O que é que substitui
os deveres de guarda do conceito civilística? Os deveres de custódia radicam da ideia dos deveres prudenciais.
• contrato restitutório

O efeito jurídico-real

Quando falamos em direitos reais falamos em direitos sobre bens corpóreos, mas isto tem como objeto bens incorpóreos, a transferência de
dinheiro. A expressão correta é falar em transferência de propriedade, mais do que em transferência de titularidade. O ambiente bancário é o
ambiente digital e esse ambiente obriga-nos a fugir das categorias mais categorizadoras dos direitos reais.

Caso: Pode haver um levantamento na mesma data de constituição de um depósito bancário? Depende do depósito. Há́ um conceito de dupla
disponibilidade: temos a instituição de crédito que recebe depósitos e concede crédito em nome próprio, isto porque o dinheiro é transferido para
a sua propriedade. O cliente pode dispor para levantar a todo o momento. Há́ quem começa a entrar numa teorização se um depósito não é bem
um depósito bancário, ou não, mas não vamos dar a natureza do depósito, o que interessa é o regime.

Quando medimos esta disponibilidade, quando meco essa disponibilidade sou remetida para o conceito de data valor - é o conceito jurídico do
momento a partir do qual o montante depositado se torna disponível por parte do cliente. Há́ um diploma, DL 18/2007 que trata do regime de data
valor e que fixa em termos injuntivos aquilo que é a disponibilidade do saldo do credor para um depositante: “(...) a data a partir da qual a
transferência ou o depósito se tornam efetivos, passiveis de serem movimentados pelo beneficiário e se inicia a eventual contagem de juros
decorrentes dos saldos credores ou devedores das contas de depósito.”

• Depósitos em numerário efetuados ao balcão: data valor do dia da sua realização.


• Depósitos em numerário efetuados em terminais automáticos: data valor no dia útil seguinte
• Depósitos em numerário efetuados em terminais automáticos que disponham da possibilidade de conferência de notas implicam:
a) Quando realizados em dias úteis, a disponibilização imediata do saldo credor, sendo-lhes atribuída a data valor do
dia da sua realização;
b) Quando realizados aos sábados, domingos e feriados, a disponibilização do saldo credor no dia útil seguinte,
sendo-lhes atribuída a data valor deste mesmo dia útil.

Então, saber se pode haver levantamento na mesma data da constituição de um depósito depende de ser um depósito a prazo ou não e se é um
depósito em balcão ou não. Logo, o conceito de data valor é um conceito bancário central.

Modalidades dos depósitos coletivos

É comum a existência de contitularidade de depósitos, isto é, os depósitos coletivos. Quais são as modalidades principais de depósitos coletivos?

1. solidários - qualquer dos depositantes (ou co-credores) pode fazer uma movimentação no depósito.
2. conjuntos - reclama a intervenção de todos os titulares, para que a movimentação possa eficazmente proceder. É a regra supletiva.
3. mistos - pode ser regime solidário até 50€, e mais será́ regime conjunto.

Não confundir os depósitos coletivos com os depósitos de uma pessoa coletiva que podem ser feitos por várias pessoas.

Caso: O levantamento antecipado num depósito solidário pode ser feito por iniciativa de apenas um dos cotitulares?
Não. O levantamento antecipado não é o cumprimento normal do contrato, estamos a alterar um elemento do contrato que é o seu prazo, art 406º
do Código Civil. Há́ a alteração do contrato que só́ pode verificar-se por acordo de todos os contraentes.

Caso: os títulos representativos de depósito a prazo são transmissíveis? Não, DL 430/91, art 3o - pode haver uma titulação de depósitos, mas esses
títulos não são transmissíveis entre vivos, apenas transmissão mortis causa. É importante sublinhar que na prática esta titulação é rara. No entanto,
esta resposta não é a resposta concreta porque outro diploma de 91 (DL 372/91) fala-nos dos certificados de depósitos e esses sim podem ser
endossados e transmissíveis entre vivos. Os certificados de depósitos não são comuns, mas realmente existem.

Depósitos especiais

Há́ aqui duas figuras de depósitos especiais que nos vão interessas em particular:

1. depósitos estruturados;
2. depósitos com função de garantia.

Depósitos estruturados:
O DL 430/91 deveria regular todas as modalidades de depósito e isso não aconteceu. Art 2º/a) - depósito estruturado é um depósito, não é uma
figura afim do depósito, é uma modalidade de depósito e remete-nos para o RGIC, art 155º/4, a propósito do Fundo de Garantia de Depósitos, o
fundamental é: “que deva ser restituído”. Se não há́ uma restituição 100%, não há́ um depósito bancário. Mas para medir a rentabilidade do depósito
vamos utilizar instrumentos financeiros ou outras variáveis financeiras ou económicas relevantes, designadamente:

I. Um índice ou uma combinação de índices, com exclusão de depósitos com taxa variável cujo retorno está diretamente ligado a um índice
de taxa de juro como a Euribor ou a Libor - ou seja, exclui-se a Euribor ou a Libor. Se é um depósito bancário simples indexado a Euribor
não é depósito estruturado;
II. Um instrumento financeiro ou uma combinação de instrumentos financeiros;
III. Uma mercadoria ou uma combinação de mercadorias ou outros ativos não fungíveis físicos ou não físicos - a rentabilidade obriga a
conhecer outro instrumento financeiro, se falamos em mercadorias pode ser um depósito indexado ao valor do trigo. Há́ regras de maior
protecção do depositante;
IV. Uma taxa de câmbio de divisas ou uma combinação de taxas de câmbio de divisas.

Há́ o dever de restituição, daí ser então um depósito. Podem apresentar uma rentabilidade superior a um depósito normal.

Caso: Uma viúva de 80 anos pretende constituir um depósito estruturado de 5 milhões de euros indexado à curva do preço do chá́ . Pode fazê-lo?
Que deveres jurídicos é que são aplicáveis? Dever de conhecer o cliente; dever de adequação, art 3º do regime jurídico dos depósitos estruturados.
Há́ questionários de conhecimentos e experiência. O nº2 tem a ver com o bundling, a lei obriga que haja
uma avaliação de adequação do pacote. Se o produto não é adequado ou houver falta de informação, o Banco envia uma
advertência expressa, no entanto, pode acontecer haver os clientes insistentes. A partir daqui é fundamental que o Banco consiga demonstrar que
cumpriu os deveres do art 3º/3/4. Certos Bancos recusam produtos que não sejam adequados, mas a lei não proíbe que perante uma insistência do
cliente venha a haver a celebração de um contrato de depósito nessas circunstâncias.

Em relação à consultoria, art 10º/1. Estas regras não se aplicam senão a depósitos estruturados.
Um outro dever relevante são os deveres de governação do produto: o Banco ao conceber este contrato, tem que ver qual o mercado-alvo destes
depósitos estruturados, art 15º (comercialização) e 14º (concepção). Os deveres aqui associados também envolvem o dever de categorização dos
clientes, isto é, classificar, art 7º do RJDE - podemos ter clientes menos conhecedores (que são os clientes não profissionais), clientes relativamente
conhecedores (que são os clientes profissionais) e outras instituições financeiras (que são as contrapartes elegíveis). O dever de assistência consiste
em dar a informação suficiente para que o cliente avalie se o produto é adequado - é um dever qualificado de informação. No dever de adequação
é o Banco que faz esse juízo - desdobra-se em 3 deveres: 1) recolha de informação (testes sobre o conhecimento e experiência); 2) dever de
avaliação (análise sobre o perfil do cliente em face das características concretas do produto); 3) advertência ou abstenção de contratar no caso da
consultoria (a estrutura do dever de adequação, no caso de não ser adequado, resulta ou numa advertência ao cliente ou numa abstenção de contratar
no caso da consultoria).

Há́ então deveres reforçados para consultoria independente, art 11º do RJDE e há́ restrições na admissibilidade de comissões e benefícios, art 16º
e 17º do RJDE. Há́ uma Diretiva, a DMIF II que é o canto do Direito Bancário com maior influência dos Valores Mobiliários. Estas regras são
então a transposição desta Diretiva 2014/65/UE. Atenção: o depósito também tem risco porque o Banco pode entrar em dissolução.

Depósito de cheque:

Não tem nenhum efeito imediato porque só́ há́ crédito em conta quando é confirmada a provisão do cheque. Até há́ jurisprudência que diz que o
crédito em conta só́ é feito no dia útil posterior à sua cobrança.

Depósito com função de garantia (ou depósito escrow)

Pode ter por objeto ações, uma receita culinária, dinheiro, segredo industrial, um código nuclear, etc. O Banco apenas está obrigado e autorizado
a entregar os bens depositados nas condições que forem descritas no contrato. É um depósito muito utilizado quando as partes não se conhecem,
os Bancos são intermediários.

Caso: Tendo havido a constituição de um depósito escrow, o Banco transfere um código de licença informática para o beneficiário, por ter ocorrido
um evento contratualmente relevante (cessação de pagamento do depositante). A transmissão do código de licença informática, porém, irá subtrair
ao depositante o único ativo que o permitir escapar da insolvência. Pode, em caso de cumprimento das instruções, o Banco ser responsabilidade
pelo depositante?

Se o Banco executa o comportamento contratualmente devido, essa actuação será́ licita e por isso, o Banco não poderá́ ser responsabilizado pelo
depositante. Se não implica a transferência da titularidade o que é que acontece se o Banco entra em insolvência? Estes documentos não integram
a massa falida, não há́ um risco de insolvência do Banco. 95% dos contratos de escrow têm esta característica.

Caso: É celebrado um contrato de depósito com função de garantia que investe o Banco na titularidade do bem depositado. Se o Banco falir, deve
o bem depositado ingressa na massa falida? É a transferência de bens em garantia de uma operação, é uma transferência fiduciária. É possível que
isto aconteça, apesar de raramente.

Isto tem a ver com a natureza fiduciária da transmissão de titularidade. Há́ uma transmissão de titularidade para o Banco, mas que está ligada a
um objetivo. Logo, a doutrina tem entendido que se aplica aqui o art 1184º do Código Civil que diz que os bens que são atribuídos ao mandatário
integram o património autónomo e por isso, em caso de falência do mandatário não integram a massa falida. Posição defendida por Pestana
Vasconcelos; mas há́ quem seja contra como o prof. João Tiago Antunes.
O Fundo de Garantia de Depósitos, art 155º do RGICA caracterização do depósito vem com uma malha de protecção, de 100.000€ por depósito,
não abrange depósitos de investimento. Depósito excluídos: institucionais fundamentalmente, art 165º do RGIC.
Recentemente, o Fundo de Garantia de Depósitos passou a integrar o Fundo de Garantia do Crédito Agrícola Mútuo.

Depósitos de valores mobiliários

Há́ uma grande diversidade estrutural e funcional dos depósitos bancários. Há́ apenas uma modalidade de depósitos bancários que não falamos na
última aula: depósito de instrumentos financeiros. Há́ deveres jurídicos especiais que se constituem quando há́ depósitos de instrumentos
financeiros, pe. depósito de ações e obrigações. Esse contrato de depósito desencadeia o dever de segregar o depósito do cliente do depósito do
banco, há́ restrições a sub-depósito (sub- contratação da relação de depósito) e uma vez que o depósito de valores mobiliários incide em larga
medida sobre valores mobiliários escriturais, não falamos então de contrato de depósito, mas sim de contrato de registo de valores mobiliários e
há́ várias regras de organização dos registos e a própria transmissão dos valores mobiliários.

Qual é o principal traço do regime? O efeito translativo, isto é, o efeito de transferência de titularidade que acontece do dinheiro (depositante para
o Banco, o depositante é um credor) e, portanto, o Banco sendo titular dos montantes em dinheiro depositados pode dispor dos mesmos concedendo
crédito não existe no depósito de instrumentos financeiros. No depósito de instrumentos financeiros, esse efeito translativo não ocorre, apesar de
estarmos perante também bens fungíveis. Os valores mobiliários são emitidos em massa, são fungíveis, representam situações jurídicas
homogéneas, uma ação representa uma situação jurídica homogénea de outra ação (mesmo que a numeração seja diferente). Apesar da
fungibilidade não há́ uma transferência de titularidade para o Banco. Nem em todos os sistemas jurídicos assim sucede, mas o direito português
acolhe um sistema de titularidade direta de valores mobiliários, isto é, o acionista é um titular direto de um direito sob uma ação, embora a ação
esteja integrada em depósito ou registo num intermediário financeiro. Esta permanência da titularidade que não é afetada com o registo ou depósito
de instrumentos financeiros é importante e tem uma implicação clara no caso de insolvência da instituição que faz o registo dos instrumentos
financeiros. Havendo insolvência, os valores titulados não são apreendidos pela massa falida, são totalmente segregados, podem ser reclamados,
não como credores, mas titulares dos instrumentos financeiros.

Claro que o depósito de instrumentos financeiros não está coberto pelo fundo de garantia de depósitos. Ver art 100º do Código dos Valores
Mobiliários.

Pagamentos bancários

Há́ um grande aglomerado de temas, a que chamamos FinTech - é uma designação genérica de instituições, contratos, serviços, operações, etc.
que sejam realizados a partir da aplicação de nova tecnologia ao sistema financeiro. Tudo o que envolva a aplicação de nova tecnologia ao sistema
financeiro tem esta designação de FinTech. Claro que podemos ter aplicações noutras áreas que não a área bancária, um dos territórios centrais na
última década do FinTech é a área dos pagamentos bancários.

Querendo estudar o Direito Bancário tal como existe em 2020, não podemos alhearmo-nos desta importante realidade. Quais são as principias
manifestações e riscos do FinTech?

• temos novas instituições a entrar no sistema financeiro e, portanto, há́ novos serviços: serviços de iniciação de pagamento (pe.:
paypal), de emissão de cartões bancários (pe.: revolut) que vivem à margem da instituição de crédito - não são instituições
vocacionadas para receber depósitos e conceder crédito, mas prestam serviços no âmbito de pagamentos. Realidade que veio
a modificar o sistema institucional bancário.
• estas instituições são sujeitas a uma regulação mais ligeira do que a regulação dos Bancos, DL 91/2018.
• por outro lado, o modelo de negócio destas instituições é muito apelativo para as novas gerações e por isso, algumas dessas
empresas têm um facturação muito assinalável e um peso assinalável nas quotas de mercado. Há́ evidentemente uma assimetria
grande no modelo de operar dessas instituições, os Bancos ainda estão a livrar-se do modelo muito assente em balcões, estas
instituições têm um modo de contactar com o cliente que é quase sempre totalmente digital. Não há́ transmissão de informação
pessoalmente, há́ um modo de prestação dos serviços bancários que são totalmente distintos.
• estes negócios também se expõem a riscos importantes, como riscos de cibersegurança, temos a questão da robustez e
segurança informática que é absolutamente central e tem que ser acautelada em termos legislativos.

Há́ assim uma realidade nova que nos obriga a encará-la com as nossas ferramentas, as ferramentas de juristas. Vamos ver que negócios jurídicos
estão por trás e que deveres jurídicos se constituem. O 1º negócio que interessa analisar é o negócio da ordem bancária

Ordem bancária

É o 1º impulso para haver a prestação de determinado serviço. A ordem é um comando de direito privado, as ordens são legitimadas por contratos-
quadros que as preveem e as enquadram no âmbito da relação. A ordem inicia a operação bancária. Há́ vários tipos de ordens:

• ordens de pagamento - ex. cheque (ordem titulada, é o formato tradicional da ordem bancária);
• ordens de transferência - pode ser dada ao telefone, no telemóvel, no computador, num terminal com acesso de ATM, etc. onde quer que
nos situemos, mesmo no estrangeiro. É um negócio muito comum no sistema bancário, mas pouco estudado.

É um negócio unilateral e, portanto, a vontade do cliente manifesta-se em termos perfeitos, não depende para a sua perfeição de uma aceitação
(podemos é ver se a ordem é cumprida ou não, mas isso está para lá da própria ordem). A ordem é legitimada por um contrato bancário. Estes
contratos por seu turno são contratos-quadro, temos uma vocação aplicativa mais larga, embora possa haver também ordens isoladas (são menos
comuns). A verdade é que não há́ , mesmo no regime 91/2018, uma regulação sistemática das ordens. As ordens são mais tratada no Código dos
Valores Mobiliários porque há́ um regime antigo das ordens de bolsa.
O Código dos Valores Mobiliários tem dois princípios importantes das ordens: respeito pela vontade do ordenador (a ordem deve ser cumprida tal
como o cliente a delimita, no montante e modo determinado pelo cliente) e são limitados os casos em que é legitima a recusa da ordem (pe.: se há́
uma falsidade no acesso ao sistema ou se há́ uma declaração que não é autêntica, tudo isso significa que pode haver a recusa para a ordem ser
executada). A lei quando regula os pagamentos bancários, fá́ -lo abstraindo do concreto modo de transmissão da ordem. Se dissermos ordem
transmitida de IPADs, daqui a 10 anos pode não haver - isto tudo para resistir ao tempo e evolução tecnológica que é muito rápida.

Como central de pagamentos bancários temos os sistemas de pagamentos. Os sistemas de pagamentos evoluíram bastante, no início assentavam
em papel, hoje em dia são informações informáticas entre Bancos e podem haver participantes diretos (podem liquidar os pagamentos diretamente
junto do Banco Central) e participantes indiretos.

Um conceito também aqui importante é o conceito de liquidação - o cumprimento da ordem é o ato de liquidação. O ato de liquidação é um ato
de cumprimento de obrigações que se gerem entre bancos. Ler livro do prof. Francisco Mendes Correia.

Que sistemas de pagamentos é que conhecemos? Fundamentalmente dois:

• sistema europeu, que é o TARGET2, que envolve a ligação dos vários pagamentos em euros, entre Bancos, de elevados montantes;
• sistema doméstico, SICOI, que é o português, para pagamentos inferiores a 100.000€.

DL 91/2018:

Art 4º - vem enunciar o que são serviços de pagamento. Nesta descrição de serviços de pagamento há́ uma neutralidade em relação ao suporte
tecnológico do serviço. A lei tem esta preocupação de regulação neutra em relação ao dispositivo tecnológico que em concreto é utilizado. Procura
evitar que haja desactualização rápida destas normas jurídicas. Esta legislação é feita para resistir ao tempo. Para além disso, também está aqui
cobertos alguns serviços de carácter habitual ou pontual, pe.: o titular da conta dá ordem de débito permanente, sempre que todos os meses há́ um
valor a pagar de certo serviço; transferência a crédito, se for pagar salários, pe. Estas ordens podem ter uma habitualidade, e essa repetição pode
implicar domiciliação junto de determinada instituição bancária. Sucede, porém, que este elenco foi alargado recentemente. temos um Diretiva
Europeia, já́ transposta, que é a Diretiva DSP II (Diretiva de Serviços de Pagamento), que acrescentou ao art 4º as alíneas g) e h): g) Serviços de
iniciação do pagamento; h) Serviços de informação sobre contas. Há́ prestadores de serviços que não fazem propriamente o pagamento, mas que
fazem a iniciação de pagamento e prestam o serviço de informação sobre contas.

É importante agora e perante o novo conceito de “iniciação de pagamento”, irmos ao art 2º/uu: “Serviço de iniciação do pagamento» um serviço
de pagamento que consiste em iniciar uma ordem de pagamento a pedido do utilizador de serviços de pagamento relativamente a uma conta de
pagamento por si titulada noutro prestador de serviços de pagamento.” - o que está em causa é a utilização de um serviço, pe. estou a comprar
uma carteira através da internet e não há́ uma ligação direta entre o meu banco e o prestador desse serviço, então há́ empresas que fazem a ligação
entra o prestador do serviço e o meu banco, e são remunerados por isso. Pe.: a PayPal. Para que este serviço tenha que ser cumprido, tem que haver
acesso depois, por parte do prestador do serviço de iniciação de pagamento, acesso aos dados do cliente no Banco e esta partilha de informação é
causa de um grande desconforto por parte dos Bancos. Os Bancos sentem que há́ aqui um serviço complementar, é também útil, mas implica o
acesso a informação que não era evidentemente facultada a terceiros até este momento. Temos aqui mais uma derrogação ao segredo bancário.
Para que este serviço de iniciação de pagamento possa em bom rigor ser concretizado tem que haver acesso a informação, que é informação
confidencial, mas é acedida em função da execução deste mesmo serviço. Então, temos aqui o conceito de serviços de pagamentos.

É importante também ver o art 5º, em que temos a exclusão, diz o que não são serviços de pagamento:

1. O conceito de serviço de pagamento, é um conceito que envolve o sistema bancário. Pe.: devo 10€ à Joana, e simplesmente dou-lhe esse
10€, isso não é regulado.
2. Tem que haver uma intermediação bancária. se há́ alguém que só́ trabalha com o ordenante e beneficiário, não há́ um envolvimento do
sistema bancário. Pode haver uma relação jurídica, mas não é um serviço de pagamento regulado neste diploma. pe.: autocarros da
prosseguir, tudo o que são serviços de segurança, não é isso um serviço de pagamento. os pagamentos sem uma lógica remunerada no
quadro do terceiro sector (sector social, sem finalidade lucrativa), também está fora deste diploma. o beneficiário fornece o numerário
ao ordenante no seguimento de um bem ou serviço, é um caso concreto e por isso, também está excluído. O câmbio, quando os fundos
não sejam detidos. Ou seja, quando vou a um guichet no aeroporto e digo que quero comprar libras, isto já́ não é serviço de pagamento.

Nota: O serviço de pagamento não é aquele que implica o transporte físico das notas e moedas, estamos a falar de transferências digitais.

3. Tudo o que sejam instrumentos de pagamentos com suporte em papel (os típicos do século XX), ainda são utilizados hoje, mas não são
regulados por este diploma porque o que está aqui em causa são instrumentos digitais e não estes instrumentos em suporte de papel.
4. pagamentos sobre valores mobiliários.
5. pagamentos sobre valores mobiliários.

A partir daqui temos várias situações, com maior relevância as alíneas m) e seguintes.

6. “Contratos de crédito que resultem de transação em tribunal ou perante outra autoridade pública.”
7. “Contratos de crédito que se limitem a estabelecer o pagamento diferido de uma divida preexistente, sem quaisquer encargos.”
8. quando são os pagamentos entras as próprias instituições por sua conta também não há́ uma sujeição a este regime. É o cumprimento de
ordens por conta de outrem, por conta do cliente. Sempre que haja ordens por conta própria não é necessária a tutela dos clientes e
estamos fora do regime jurídico.
9. pode haver operações de tesouraria entre empresas do grupo, no momento de injecções, e nesta circunstância não estão sujeitos a este
regime.
10. o levantamento de numerário, se é feito por uma empresa que não presta outros serviços, também está fora do conceito de serviço de
pagamento que aqui é utilizado.

Temos aqui de facto esta caracterização em termos positivos e em termos negativos. Este conceito central do serviço de pagamento, delimitado
positivamente no art 4º e negativamente no art 5º. O pagamento bancário concretiza-se através de atos jurídicos: débito e crédito (no beneficiário).
A ordem de pagamento pode ser transmitida através de cartão, de dispositivo informático, telefone ou documento em papel. O conceito de FinTech
levou a uma evolução legislativa importante, que tem o seu foco no direito europeu. A Diretiva DSP II (2015/2366), veio trazer uma evolução
legislativa, que está já documentada e transposta no DL 91/2018. Que novidades há́ ? Existem dois novos serviços:

1. serviço de iniciação do pagamento;


2. serviço de informação sobre contas - os prestadores deste serviço têm como missão a prestação de informações consolidadas e os Bancos
não podem negar-lhes o acesso. É motivo de desconforto profundo por parte da banca tradicional.

Por outro lado, quanto maior o número de operações que se processa digitalmente, quanto maior a variedade de dispositivos na base das ordens
bancárias, maior a preocupação com a segurança, autenticidade da ordem. A lei tem esta preocupação aguda que é a de acautelar que quem
transmite a ordem é de facto a pessoa que é titular da conta e tem os poderes de transmissão.

Art 2º do DL 91/2018:

c) pe.: cartão com coordenadas. É importante também a validade do instrumento de pagamento, os cartões bancários têm validade
determinada e se o cartão tiver caducado não pode ser utilizado para aquela ordem. E então para confirmar a autenticidade do titular e
confirmar a validade do instrumento utilizado.

d) conceito mais exigente, temos em 1º lugar conhecimento, ou seja, pode ser um no de código que seja só́ conhecido pelo utilizador; 2º
posse, ou seja, algo que só́ o utilizador possui, pode ser um SMS enviado pelo telemóvel; 3º inerência, ou seja, algo que é do utilizador,
pe.: através da impressão digital e da rede de vasos sanguíneos no dedo (em rigor, o finger vein supõe que é uma pessoa viva, e as veias
do dedo estejam ativas) ou ocular. A lei não vai discriminar que modos há́ de autenticação forte, também há́ aqui o cuidado para que não
haja uma desactualização da lei, daí esta formulação mais aberta.

Relativamente ao DL 91/2018, este diploma tem 3 partes:

1. disposições gerais, que são muito importantes pois trazem à luz os conceitos fundamentais com que vamos trabalhar (art 2º, 3º, 4º e 5º);
2. autorização dos prestadores de serviços de pagamento, art 11º e ss. Este título II, para nós tem uma importância mais reduzida;
3. execução dos serviços de pagamento, esta é a componente mais importante, art 75º e ss. (sobretudo 76º e ss.).

Quanto ao acesso às contas de pagamento, regulado no art 68º: ideia de aceder às contas de pagamento por parte dos prestadores de serviços.
Também é de sublinhar os art 70º e 71º quanto aos riscos operacionais e de segurança. Colocando a questão da cibersegurança com uma dignidade
legislativa que acontece pela 1ª vez num diploma com esta natureza na área bancária. Temos o dever de comunicação de incidentes ao Banco de
Portugal, este dever é um dever muito importante para procurar suster danos maiores que venham a ser provocados. Por outro lado, os art 76º e ss.
são os que mais nos interessam. Há́ nesta configuração sistemática das matérias, uma divisão importante entre operações de carácter isolado (art
82º e ss. - regime mais sintético) e no âmbito de contrato-quadro (art 89º e ss. - regime mais desenvolvido). Há́ a ideia de que o envolvimento com
o Banco, à medida que seja maior, a confiança também é maior, há́ uma relação duradoura, que obriga a que haja em termos proporcionais um
maior volume de exigências regulatórias na prestação de serviços de pagamento. Esta é a matriz desta comparação entre um ponto e outro.
Os art 100º e ss. são também importantes.

Transferência bancária

Vimos o conceito de ordem bancária, outro conceito fundamental é o conceito de transferência bancária. Tomamos sempre por base que as
transferências bancárias têm uma valência fundamental. Quais são os sujeitos envolvidos na transferência bancária? Temos transferências
bancárias mais simples e outras mais complexas.

• Pe.: A faz transferência para B e têm ambos o mesmo Banco. É uma transferência que envolve apenas uma instituição de crédito.
• Pe.: A faz transferência para B num Banco para a Malásia, mas o Banco de A não tem uma relação com o Banco da Malásia. então é
utilizado um circuito entre Bancos para chegar ao Banco da Malásia. Então o Banco PT de A, faz transferência para um Banco inglês,
que faz transferência para Banco da Austrália e por fim, há́ a transferência para o Banco da Malásia.

Temos assim casos mais simples e casos mais complexos. A designação é diferente numa situação e noutra. Na 1ª hipótese temos uma transferência
intra- bancária; na 2ª temos uma transferência inter-bancária. O que nos vai interessar são apenas as transferências reguladas no plano europeu. O
regime dos pagamentos é europeu e por isso, vamos ter situações como:

• Pe.: A faz transferência para B num Banco para o Letão, mas o Banco de A não tem uma relação com o Banco de Letão. então é
utilizado um circuito entre Bancos para chegar ao Banco do Letão. Então o Banco PT de A, faz transferência para um Banco espanhol,
que faz transferência para Banco da francês e por fim, há́ a transferência para o Banco do Letão.

Composição da transferência bancária:

Estamos perante uma operação e não um contrato. Não é um ato de execução instantânea, é um processo, é uma operação bancária.
Modalidades de transferências:

• intra bancárias e interbancárias;


• Internas e internacionais;
• De crédito (pe.: entidade empregadora que transmite para os seus empregados) ou de débito (quando se transmite a débito na conta do
ordenante por impulso do prestador de serviço, no caso da prestação de serviços de eletricidade, por exemplo).
• Transferências em cadeia: já́ vimos que pode haver vários bancos em cadeia e não há́ cessão da posição contratual. Se há́ utilização de
vários bancos em cadeia, o 1º da ordem não se exonera transferindo para outro banco, permanece vinculado.
Há́ aqui verdadeiramente um sub-contrato, pois a instituição contratada, tem que subcontratar outra e por aí em diante. Todos
permanecem vinculados para satisfação do cumprimento da ordem iniciada pelo ordenador.
• Temos também algumas redes interbancárias a conhecer:
o redeTARGET;
o rede SWIFT - tem a possibilidade de fazer transferências por todo o Mundo e que é estruturada através de uma associação do
direito belga. Logo, o modo de concretizar transferências internacionais é através desta rede SWIFT. Sucede, porém, que hoje
em dia com a interligação dos serviços de pagamento, conseguimos fazer pagamentos através da utilização de cartões com
grande facilidade. Nos anos 80 e 90, a SWIFT tinha uma grande importância, mas que tem vindo a ser erudita.

Deveres jurídicos das partes:

É um contrato oneroso, que vincula ambas as partes e tem complexidade variável, no qual o Banco tem a obrigação. O momento de
cumprimento da ordem é de grande importância.

• Há́ também vários deveres de informação, art 83º e ss. (carácter isolado) e 90 e ss. (contratos- quadro). Embora haja peso importante da
informação pré́ -contratual (art 90º e 91º), também há́ uma preocupação na informação sobre a execução (art 95º, 96º e 97º).
Complementam os deveres gerais de informação. Grande parte destas relações de pagamento são estabelecidas no âmbito de contratos
de banca à distância, o Homebanking. O Homebanking pode envolver a utilização de telefone, computador e no fundo é o novo normal
no estabelecimento de relações bancárias. A banca digital vai sendo a regra e não a excepção. Este contrato impõe mandatos para
pagamentos, deveres de conservação das palavras de acesso aos clientes e deveres de segurança informática aos Bancos. É então não
apenas fundamental os deveres do Banco, mas também do utilizador. Há́ jurisprudência a valorar o comportamento do cliente, se o
cliente não é cuidado (pe. post it no computador com a pass) isso pode ter consequências jurídicas quando o cliente se expõe a situações
de risco.
• Por vezes há́ problemas nos pagamentos. Há́ duas formas de delitos principais:
o phishing - envolve a recolhe ilícita de dados para mails maliciosos. É uma extracção maliciosa/ camuflada, mas direta de dados
importantes junto do cliente;
o pharming - é mais sofisticado, quando julgamos que estamos num site do nosso Banco, estamos na verdade a ser redirecionados
a sites não autorizados. Houve casos de pharming em máquinas. Em Portugal há́ muita jurisprudência sobre esta matéria, a
prof. Regina Guimarães foi das que mais trabalhou com esta matéria. Nem sempre a jurisprudência superior conseguir
diferenciar corretamente o phishing do pharming e é evidente que é mais censurável, do ponto de vista do cliente, o phishing.
O que os tribunais muitas vezes determinam é que quando há́ casos de pharming a culpa é do Banco. Por outro lado, o elevado
nº de acórdãos e decisões jurisprudenciais nesta matéria representam um indício de que estas situações na prática acontecem
com enorme frequência. Muitas vezes, os clientes não conseguem identificar quem é o causador do delito e, portanto, o que
normalmente fazem é intentar ações contra os Bancos.

Caso prático: Se é efetuada uma transferência bancária em euros, qual o momento em que é devida a respetiva execução? Art 123º e ss. + art
2º/l), data-valor é a data na qual o pagamento se tem por efetuado e o pagamento começa a gerar os devidos juros em função do que é creditado
na conta de pagamento. Então, o prazo devido de pagamento é segundo o art 124º, “(...) até ao final do primeiro dia útil seguinte”, há́ , no entanto
outras regras:

• “O prazo referido no número anterior pode ser prorrogado por mais um dia útil no caso das operações de pagamento emitidas em
suporte de papel.” (nº2) - pe.: pessoas que não tenham cartões e vão a um balcão de um banco e exigem uma ordem de pagamento.
• “O prestador de serviços de pagamento do beneficiário deve estabelecer a data-valor e disponibilizar o montante da operação de
pagamento na conta de pagamento do beneficiário após receber os fundos nos termos do artigo 128.º” (nº3)
• “O prestador de serviços de pagamento do beneficiário deve transmitir as ordens de pagamento iniciadas pelo beneficiário ou através
deste ao prestador de serviços de pagamento do ordenante dentro dos prazos acordados entre o beneficiário e o respetivo prestador de
serviços de pagamento, por forma a permitir a liquidação, quando se trate de débitos diretos, na data de execução acordada.” (nº4).

Tem havido uma grande evolução nos últimos anos e a âncora é sempre o conceito “data-valor”, ao fazer a movimentação a data-valor fixa o
momento relevante para a contagem dos juros remuneratórios sobre o pagamento feito.

Caso prático: Se a transferência é feita com atraso imputável ao banco intermediário quem deve indemnizar? O Banco do ordenante ou o banco
intermediário? E a quem assiste legitimidade para exercer a pretensão indemnizatória? Em transferências internacionais temos que ver o dia útil
para cada Estado, aqui vamos supor que eram dias úteis iguais.
• art 130º/1: a regra é que quem responde perante o ordenante é o seu Banco (responsabilidade objetiva, mesmo não havendo culpa do
Banco do ordenante ele tem que responder). O Banco do ordenante pode então não ter culpa nenhuma, mas isso não impede que tenha
de responder. Depois pode é haver direito de regresso, art 134º. Porém há́ duas excepções importantes:
o art 129º/1/2/3: o identificador único é o NIB ou IBAN. Se o banco transfere para o IBAN indicado está a cumprir. Se o cliente
se engana, a responsabilidade é do cliente (transfere a responsabilidade do Banco para o cliente). Na prática, o regime do nº3
é pantanoso porque a responsabilidade é do cliente, o Banco deve ajudar, mas aqui é uma obrigação de meios - qual o grau de
diligência exigido ao Banco? Esforços razoáveis e há́ muitas situações, em que há́ transferências de valor elevado e que
demoram anos a recuperar. Não se diz então que o Banco tem que garantir que consegue recuperar. Por vezes tem-se que
recorrer à figura do enriquecimento sem causa para recuperar o dinheiro (é a regra subsidiária).
o art 135º - o Banco também não tem que responder nos casos de força maior, pe.: terramoto, ataque terrorista, etc.

Caso prático: O cliente transmite uma ordem de transferência ao seu Banco e, três dias mais tarde, procede à sua revogação. Tal revogação é
valida e eficaz? O art 121º tem um princípio de irrevogabilidade, mas há́ excepções:

• Em caso de débito direto: revogação pode ocorrer até final do dia útil acordado para o débito dos fundos;
• Em caso de transferência agendada para momento posterior: revogação pode ocorrer até final do dia útil anterior à data acordada;
• Se houver cláusula contratual em sentido diverso.

Sobre pagamentos ainda interessa falar sobre:

1. Convenção de cheque
2. Cartões bancários

Convenção de cheque

O que distingue o cheque da convenção de cheque? O cheque é uma ordem de pagamento, transmitida pelo cliente ao seu Banco. A convenção de
cheque é o contrato celebrado entre o Banco e o seu cliente, que pode ser um contrato tácito, pe.: solicito os cheques e o Banco dá. O contrato de
cheque é o contrato cujo conteúdo é o de permitir a este movimentar em parte ou na totalidade os montantes depositados através da emissão de
cheques (art.3º Lei Uniforme do Cheque).

Caso: Na compra de uma televisão, Fernando combina com o lojista que o preço será́ pago através de 3 cheques pós-datados, com as datas de 1
de janeiro de 2019, 1 de marco de 2019 e 1 de maio de 2019. O lojista, porém, apresou os cheques a pagamento no dia de ontem. Assiste ao
Banco o direito ou o dever de proceder ao pagamento do cheque?

Há́ 3 hipóteses (interessa-nos a posição do Banco quando o cheque é apresentado a pagamento):

1. O Banco pode pagar;


2. O Banco não pode pagar;
3. O Banco deve pagar.

Art 29º da Lei Uniforme do Cheque, o Banco tem que pagar. Claro que há́ um incumprimento do lojista. O cheque é pagável à vista.

Caso: Assiste ao Banco o direito ou o dever de proceder à rescisão da convenção de cheque em caso de emissão reiterada de cheque sem provisão
pelo seu cliente?

DL 454/91, art 1º: o Banco deve rescindir a convenção. Este tipo de incidente vais logo para a base de dados de responsabilidade de crédito.

Caso: O cliente do Banco Branco emite um cheque no valor de 140 euros tendo a sua conta um salvo de 100 euros. Deve o Banco sacado proceder
ou não ao pagamento?

Art 8º do DL 454/91, o Banco deve responder até 150 euros. Supondo que o cheque é no valor de 200 euros e o cliente tem na sua conta 199,99€,
pode o Banco pagar 0,01€? Está em causa o princípio da literalidade, falta 1 cêntimo, mas se não há́ o dinheiro, não há́ pagamento algum, o Banco
não está obrigado a nada. Nas letras há́ um desconto bancário, mas não há́ desconto bancário de cheques sem provisão.

Para a semana vamos começar a falar de crédito ao consumo. Ler Gravato Morais, Crédito aos consumidores Dl nº 133/2009. E crédito à
habitação.

Cartões bancários

Vamos continuar a ver o diploma sobre os pagamentos bancários, nomeadamente os cartões - o diplomas fala em instrumentos de pagamentos
baseado em cartão, envolvendo todos os dispositivos que fazem referência a um cartão logo, mesmo quando estamos a aceder num telemóvel, se
estamos baseados num cartão isso é sempre instrumento de pagamento em cartão. Por outro lado, no art 2º/jj) temos o que se considera operação
de pagamento baseada num cartão. Situação de evitar discrições tecnológicas minuciosas que possam fazer com que o regime jurídico se
desatualize rapidamente.

Os cartões são meios de pagamento, instrumentos que servem para proceder à transmissão de ordens bancárias (levantamento, transferência,
crédito e outros serviços, como consulta da conta). O cartão supõe a celebração de um contrato, o contrato de utilização de cartão, é um contrato-
quadro dentro da lógica sistemática do DL, este contrato assenta sobretudo em CCG, sujeito a forma escrita e deve haver uma expressa aceitação
do titular quando há́ este contrato de utilização de cartão, não pode ser um contrato celebrado de forma tácita.

Por outro lado, o contrato de utilização de cartão está ligado a um contrato de provisão, normalmente de depósito e por isso, há́ uma união de
contrato bastante complexa - tudo para dar origem à relação bancária complexa (feixe de direitos e obrigações jurídicos emergente de vários
contratos celebrados entre o cliente e o Banco).

A titularidade do plástico do cartão é do Banco (não é do cliente) e o Banco tem sempre a faculdade de retirar o cartão, caso as regras de utilização
prudente do cartão não sejam pontualmente observadas. Não há́ uma transmissibilidade do cartão, não são títulos de crédito, são instrumentos de
legitimação de propriedade do próprio Banco.

É importante distinguir entre:

• cartões de débito - movimentação de uma operação bancária passiva e portanto, tem por base movimentação de depósitos;
• cartões de crédito - falamos de operações a crédito.
• Há́ cartões mistos, em que podemos ter movimentação a débito ou a crédito e nessa circunstância, o utilizador fará a indicação de qual
é a modalidade de que quer utilizar.

Cartão de débito

O cartão de débito é utilizado mediante um pin e a rede de terminais permite o acesso a clientes de outros bancos. Não é então preciso que o
terminal do Banco utilizado tenha uma relação contratual com o Banco e do cartão. Quanto ao pagamento feito em POS (point of sale), qual é a
forma de explicar esta operação? Há́ aqui um mandato de pagamento aos fornecedores do bem, em que a entidade que faz o pagamento assume o
débito do cliente e depois procede ao pagamento através de um terceiro interveniente, que funciona como delegado nesta operação.

Os terminais de utilização dos cartões de débito estão unidos a uma central do Banco que emite o cartão no entanto, pode suceder que essa ligação
seja uma ligação em tempo real e portanto, com uma possibilidade de haver transmissão continua sobre o saldo da conta, mas também podem
haver ligações offline, isto é, sem que o terminal utilizado tenha um acesso continuo à informação, designadamente ao saldo da conta. Isto permite
que possa haver levantamentos superiores ao saldo disponível.

Caso: Qual a qualificação e solução jurídica se o utilizador de cartão de débito procede a um levantamento em montante superior ao do saldo
disponível? Há́ duas maneiras de olhar para isto:

• Há a possibilidade de dizer que isto é um crédito, é um descoberto. Há́ um limite tolerado que permite levantamentos além do saldo
disponível. Pode nalguns casos haver descobertos, que é um tipo de contrato de crédito. Numa hipótese como esta, utilizado um cartão
de débito nunca podemos presumir que há́ um contrato de descoberto autorizado que seja estabelecido. Esta é uma hipótese que nalgumas
circunstâncias se pode verificar, isto é, pode o Banco convencionar que há́ levantamentos além do saldo e haverá́ juros remuneratórios,
mas não é em todas as situações. O importante é a data-valor para saber a data a que começa a contar os juros remuneratórios.
• Há́ a possibilidade de dizer que isto é um incumprimento contratual, a forma mais normal de construirmos esta situação é de entender
que há́ verdadeiramente o desrespeito pelo contrato estabelecido (contrato de utilização do cartão) e nessa medida, o cliente deve
responder pelos danos causados ao Banco. O importante é a data-valor para saber a data a que começou o incumprimento.

Quando há́ serviços de pagamento, o prestador dos serviços de pagamento que faz a gestão da conta deve confirmar se há́ disponibilidade da conta
que permita a utilização do cartão. Esta confirmação é feita em termos automáticos. É assim um dever do prestador dos serviços de pagamento.
Para além disso, se o montante a debitar não for ainda determinado/conhecido, então não pode haver um bloqueio dos fundos em causa. Pe.:
encomendamos livro na Amazon, que ainda não está disponível, não sabemos o preço, não podemos ser debitados desse montante, até ser
determinado.

Cartão de crédito

Quanto ao cartão de crédito, aqui também há́ pagamentos, temos um cartão concebido para a prorrogação do prazo de pagamento. Basicamente, o
emitente do cartão substitui-se ao vendedor e permite a prorrogação do prazo do cartão, normalmente é uma prorrogação que não implica juros se
até ao final do mês for pago, se para além disso há́ pagamento de juros. Temos 3 intervenientes nesta relação:

1. estabelecimentos aderentes;
2. emitente;
3. titular do cartão.

É um instrumento de crédito ao consumo, o que prevê̂ precisamente a concessão de crédito em função do cartão de crédito, art 4º/1/c) do DL
133/2009. Há́ nalgumas jurisdições cartões bilaterais, em que o próprio estabelecimento emite o cartão, em Portugal apenas há́ cartões trilaterais.
A estrutura contratual é da mesma maneira de um contrato de utilização de cartão, sucede que há́ um aviso de 11/2001 que diz que este contrato
não é de duração indeterminada, tendo um período de validade pré́ -determinado (mas haverá́ normalmente uma prorrogação automática) e supõe
uma cessão de créditos. Alguns estabelecimentos não aceitam pagamento em cartão. Por outro lado, o estabelecimento é satisfeito quanto ao seu
crédito, é uma cessão feita em termos definitivos e por isso, extingue-se.

O cartão supõe a existência de um limite quantitativo de utilização. Pe.: limite de 1000€. Se o titular utiliza 500€, então tem 500€ disponíveis. Mas
se, entretanto, paga aqueles 500€, então volta a ter 1000€ disponíveis. À medida que são feitos os reembolsos, esses reembolsos reabrem o limite
máximo a poder ser utilizado. A estas cláusulas de reutilização, chamamos cláusulas de revolving. É uma técnica dos contratos de crédito muito
comum.
Na sua estrutura, a utilização do cartão tem por base cessões de crédito, são cessões de crédito em massa para permitir que o emitente do cartão
possa exigir, se necessário judicialmente, a realização e o cumprimento do crédito que está titulado pelo cartão de crédito.

Caso: Quais são as consequências jurídico-penais decorrentes da utilização abusiva do cartão de crédito?
A utilização de cartão de débito não é punida criminalmente. É evidente que podemos chegar à relevância penal de comportamento através da
utilização do cartão de débito se houver pe. burla, mas não do crime de abuso de cartão, art 225º do Código Penal. Fala-se em cartão de garantia
no Código Penal, o que é isso? É uma figura histórica e com pouca utilização prática. A dada altura, nos anos 80, para que os estabelecimentos
aceitassem o pagamento de cheque tinha que haver um cartão de garantia, mas esta figura caiu em desuso. No Código Penal temos então
fundamentalmente o abuso de cartão de crédito, facto punível criminalmente com pena até 3 anos.

Crédito bancário

Há́ conceitos-base a saber:

• entrega de fundos de crédito - supondo que celebro com um Banco qualquer contrato de crédito e o Banco faz-me entrega dos fundos -
como se chama esse contrato de entrega dos fundos? é o desembolso.
• E quando há́ cumprimento do contrato de crédito? É o reembolso.

São duas operações simétricas, o desembolso e o reembolso.

• O serviço da dívida é o pagamento de todos os encargos associados ao crédito, pe.: juros, comissões, etc. Isto não inclui o reembolso de
capital. São expressões técnicas que qualquer contrato de crédito contém.
• revolving é a permissão de reutilização do montante creditado já́ reembolsado.

É preciso distinguir, embora no art 4º/1/c) do DL 133/2009 estes conceitos pareçam ser equivalentes, mas não são:

• crédito - em sentido estrito é quando o credor faculta fundos à disposição do devedor (ou cliente).
• financiamento - não há́ disponibilização de créditos direta. Pe.: leasing, crowdfunding.

Tipos de contratos de créditos principais:

• mútuo;
• abertura de crédito;
• descoberto bancário - tipo de contrato de crédito que permite a utilização do cartão de crédito, pode ser contratado ou tolerado, visa
suprir necessidade de crédito de curto prazo. Estruturalmente, o descoberto bancário não tem prazo, é uma obrigação pura;

Caso: Pode, após a autorização do descoberto, o Banco exigir o pagamento imediato do montante utilizado?
Tem que haver um ato de interpelação.

• Desconto bancário - é um contrato de crédito em que o Banco adianta uma percentagem de um título de crédito ainda não vencido. Esse
adiantamento é um crédito e o crédito é descontado em função dos encargos e do tempo até ao vencimento. Há́ transmissão do título ao
Banco. E se não houve cumprimento no final do título? Aquela transmissão do crédito não é uma transmissão pro soluto, mas sim pro
solvendo, só há́ extinção da dívida se houver boa cobrança do título.
• Mandato de crédito - alguém encarrega outrem de dar crédito a outrem, isso é o que resulta do Código Civil. Será́ um contrato de mandato
em sentido próprio? Quem concede o crédito, concede em nome próprio ou em nome de quem manda o encargo? Temos 3 figuras: 1)
autor do encargo, que transmite a uma instituição de crédito instruções para a concessão de crédito; 2) encarregado, que pode ou não
aceitar o mandato de crédito. Se aceitar concede crédito em nome próprio; 3) mutuário. Se não houve cumprimento por parte do mutuário,
então o autor do encargo e o mutuário são solidariamente responsáveis por aplicação das regras da fiança, art 629º do Código Civil. A
instrução do autor de encargo ao encarregado é uma ordem e não uma recomendação (isto é importante para distinguir o contrato de
crédito da carta de conforto). Enquanto o crédito não é concedido, é permitido ao autor do encargo revogar ou denunciar o crédito.
• Antecipação bancária - é basicamente um contrato de concessão de crédito mediante um penhor constituído sobre instrumentos
financeiros ou outros bens. Uma expressão equivalente na gíria bancária é o crédito caucionado. Há́ um regime de penhor financeiro que
é quando há́ constituição de relação de garantia. É uma natureza que combina um contrato de crédito (ou mútuo ou abertura de crédito)
e um penhor. Deve assim haver proporcionalidade entre o crédito e o valor dos bens que são empenhados, para não haver um fenómeno
de sobre garantia.
• Promessa de crédito - o Banco compromete-se a celebrar um contrato de crédito. É importante distinguir a promessa de crédito das cartas
de intenção (ou letters of intent) que não corporizam uma vinculação a celebrar contratos de crédito).
• Prorrogação de pagamento

As regras aos profissionais são muito mais flexíveis, impera o regime contratual, muitas vezes os contratos são celebrados em inglês. No âmbito
dos contratos celebrados entre profissionais tem relevância no mercado interbancário, que pode ser crédito garantido (e aí chamamos antecipação
bancária) ou crédito não garantido.

Quando celebramos um contrato de crédito é importante ter elementos essenciais acautelados:

• Montante do crédito concedido;


• Maturidade/prazo de vencimento;
• Taxa de juro: se variável ou fixa, se variável quais são os indexantes bancários;
• O spread: diferença entre a aplicação - aplicação do indexante utilizado e a taxa contratualmente acordada;
• Base de cálculo dos juros
• Os events of default: casos de incumprimento, pe. se houver incumprimento perante terceiro se isso é incumprimento do contrato;
• Garantias: pe.: hipoteca, aval, etc.

Os indexantes são médias de taxas de juros, de operações. Podemos ter indexantes da EURIBOR a 3 anos, pe. é a taxa média dos contratos
celebrados neste período. Hoje há́ indexantes interbancários. No passado recente, tivemos um caso muito grave de manipulação de indexantes, o
caso Libor em 2012. Os Bancos mantinham os indexantes em valores baixos, falseavam os dados na base do apuramento da Libor. Houve processos
de contraordenações muito pesados por todo o Mundo e tudo tinha que ver com a informação que era falsa sobre a celebração do contrato de
crédito e das taxas de juro que eram aplicadas em cada momento.

Houve uma série de recomendações de modificação do funcionamento da Libor, nomeadamente o relatório The Wheatley Review of LIBOR:
Final Report. Hoje em dia a manipulação de indexante é considerada manipulação de mercado e por isso, tem consequências penais associadas.
No contexto atual é possível que haja indexantes negativos e nessa circunstância temos o regime de reflexo necessário do indexante negativo no
contrato do cliente e por isso, pode haver uma vantagem para o cliente se a taxa de juro for negativa. A classificação do crédito em função da sua
duração temos:

• Curto prazo - prazo de vencimento não superior a um ano. Existem os mini perm loans, muito curtos mesmo, pe.: de um dia ou apenas
algumas horas, mas em regra os contratos têm uma duração superior.
• Médio prazo - prazo de vencimento não superior a 5 anos;
• Longo prazo - prazo de vencimento superior a 5 anos.

Por outro lado, o reembolso do crédito pode ser feito em prestações (mensais, trimestrais, anuais, consoante a duração do contrato), num só́
pagamento (pagamento bullet) ou num pagamento final significativo (pagamento baloon).
Também há́ casos de crédito de escopo, isto é, o crédito é criado com certa finalidade. Há́ situações em que resulta da lei ou do contrato uma
finalidade vinculada, isto é, o cliente só́ pode utilizar o crédito para a finalidade expressamente prevista. Pe.: microcrédito (DL 12/2010), crédito
de pequenos montantes, não pode ser utilizado numa finalidade diferente daquela para o qual foi concedido. A ideia é sempre ter um apoio aos
microempresários.

Crédito ao Consumo

Não temos um regime geral sobre crédito, temos vários regimes especiais sobre crédito e um dos mais importantes é este DL 133/2009. É
fundamental termos presente a delimitação do âmbito deste diploma, e para esse efeito temos que ler os art 4º e 2º.
Art 4º/1/a)/c) - são as definições importantes para percebermos este contrato. Temos uma delimitação muito generosa do que é o contrato de
crédito. É deste encontro entre o art 4º e o conceito de consumidor e contrato de crédito que se determina o âmbito do diploma. Mas, para além
disso temos que ver o art 2º, que tem um elenco das operações excluídas:

• Crédito imobiliário é o DL 74-A/2018, e por isso não aplicamos este regime (al. a)).
• Depois temos a questão do montante do crédito. Tudo isto decorre da opção de regulação europeia, ou seja, créditos baixos não precisam
de grande regulação, nem créditos de grande valor (al. b)).
• Quando não há́ juros ou apenas juros simbólicos, também está fora deste regime (al. f) e g)).
• Tudo o que são casos particulares ou em que não haja taxas de mercado estamos fora deste regime.

Temos dois grandes troncos do regime do crédito:

1. DL 133/2009 (o que estamos a analisar);


2. DL 74-A/2017 de 23 de Junho (vamos analisar na próxima aula).

DL 133/2009:
Para efeitos do teste de saber quando é que se aplica este diploma, pode-se perguntar

1. Crédito para aquisição de instrumento musical por flautista da Orquestra Metropolitana de Lisboa - temos de saber se é um consumidor
à luz do DL. Temos que ver qual a finalidade do contrato pois, daí resulta a qualidade em que aparece o cliente. Não sabemos se o
instrumento musical é uma flauta, mas um instrumento musical tem uma conexão evidente com a sua atividade profissional, logo não
há́ aplicação do DL 133/2009. Então aplicamos as regras gerais do RGIC e o que está estabelecido no contrato. É um regime com
protecção menos rigorosa.
2. Crédito para aquisição de viatura por delegado de propaganda medica, através da utilização de cartão de crédito - quanto ao meio há́
contrato de crédito (art 4º/1/c)), no entanto temos que ver se é um consumidor à luz do art 4º/1/a). O carro poderá́ não ser utilizado apenas
para a sua atividade profissional. Quando temos finalidade múltiplas temos que interpretar o regime, descortinando qual a atividade
preponderante. Se é preponderante a atividade profissional, então é uma utilização profissional e por isso está fora do regime DL
133/2009. Também poderíamos chegar a esta conclusão através do valor do bem, pe. se fosse um Tesla provavelmente já́ seria
consumidor.
3. Crédito para aquisição de livros jurídicos e leitor de DVD por advogado - o leitor de DVD nada tem a ver com a sua vida profissional e
por isso, poderíamos estar perante um caso em que o DL se utiliza, apenas poderia haver uma exclusão mediante o valor do bem, art
2º/1/c).
O regime também tem umas regras sobre descoberto bancário: o sentido geral deste regime é fortalecer significativamente os direitos do credor,
daquele que concede crédito, do mutuário, deveres de informação, assistência, direito de livre revogação e direito de reembolso antecipado. Há́
também um regime de invalidades que torna isto muito mais rígido e por isso, é impossível contornar o efeito de protecção que daqui decorre.

Os deveres de informação pré́ -contratual aplicam-se também aos mediadores de crédito. Pe.: crédito automóvel, os intermediários de crédito são
os senhores dos stands que têm eles próprios também deveres de informação pré́ -contratual.

Caso: Uma empregada doméstica dirige-se ao seu banco para contrair crédito para a aquisição de um Ferrari, novo, de topo de gama. Quid iuris?

Está em causa os deveres de informação e os deveres de assistência, há́ ainda o dever de avaliação de solvabilidade, que é um dever específico.
Tudo isto leva o cliente a perceber se o crédito é ajustado ao que pretende e à sua situação financeira. O dever de assistência vem previsto no art
7º do DL 133/2009.

Caso: Para a aquisição de uma sofisticada consola de jogos num estabelecimento comercial, Bento celebrou um contrato de crédito com uma
sociedade financeira para aquisição a crédito. O contrato de crédito, porém, não observou a forma escrita. Pode a SFAC alegar a invalidade do
contrato de crédito?

Art 13º/5, este vício de forma só́ pode ser alegado pelo cliente e não pela instituição. Ligação entre a nulidade do contrato de consumo e contrato
de crédito. Pode haver reclamação pelo exato cumprimento do contrato ou pode haver redução do crédito por causa do contrato de compra e venda
ligado.

Caso: Um banco promete a concessão de crédito para realização de férias em Honululu aos clientes que subscreverem fundos de investimento aos
seus balcões. Pode fazê-lo?

Art 29º, é vedado fazer depender a celebração de contratos de crédito ao consumo da aquisição de outros produtos ou serviços financeiros, é a
proibição do tying.

Caso: Jorge celebra um contrato de crédito para aquisição de um parapente, a 5 ano. Pode antecipar o reembolso do crédito contratado? Caso
afirmativo, está obrigado a pagar os juros por inteiro?

Art 19º, sim pode antecipar, mas não, não está obrigado a pagar os juros por inteiro. No Código Civil, o art 1147º diz-nos que o mutuário pode
antecipar o reembolso, desde que satisfaça os juros por inteiro, mas temos um regime especial no DL 133/2009. Todo o regime bancário está
moldado para se descolar do art 1147º do Código Civil.

Próxima aula: crédito à habitação 74-A/2017 e cláusulas de salvaguarda nos contratos de crédito (covenants).
• André́ Figueiredo, O poder de alteração unilateral nos contratos bancários celebrados com consumidores;
• Leite Campos, Responsabilidade pela concessão e não concessão de crédito.

Crédito à habitação

O que acontece paradoxalmente é que temos uma enorme dispersão nas fontes, cada novo Governo que regula a área bancária acaba sempre por
mexer no crédito à habitação. São intervenções legislativas por camada, sem ter em vista o quadro global, sem procurar uma unificação do material
legislativo. No ano 2012 houve uma série de medidas que tiveram que ver com o sobre-endividamento das famílias nos tempos de crise. Então
houve um regime que procurou suavizar, especialmente situações de mora de incumprimento, nomeadamente com as Lei 58/2012 e 59/2012 - mas
esta matéria não está consagrada de forma uniforme.
Os dois diplomas principais são o DL 74-A/2017 e DL 349/98. O DL 74-A/2017 é sobre o crédito à habitação a consumidores, não provoca uma
revogação integral do regime de 98, logo o regime de 98 tem uma regulação ainda parcelar que se materializa em contratos celebrados não com
consumidores.

Caso: Pode ser celebrado contrato de mútuo para aquisição de habitação própria consensual - isto é, cujos efeitos independam da data da entrega
do montante mutuado?

O entendimento do direito civil é o de que o contrato de mútuo é um contrato que é constituído no momento da entrega. É importante como se
trava a relação entre o direito bancário e o direito civil. O direito bancário é um direito especial, tem componentes de direito privado e de direito
público. Temos que olhar sempre com abertura quando temos uma questão destas. Haverá́ algum interesse para alguém querer o contrato celebrado,
mesmo antes do reembolso? Pe.: há́ concursos públicos que exigem financiamento e que tem que haver uma prova dos financiamentos acordados
e, portanto, é totalmente legitimo ter essa consensualização fechada, mesmo antes da entrega dos fundos. E, portanto, a resposta é por um lado,
não temos necessariamente um contrato real quanto à constituição na área bancária, pode haver pelo contrário motivos legítimos para permitir o
mútuo consensual. Há́ só́ um autor que tem uma visão mais conservadora, o prof. Menezes Leitão, mas mesmo este admite a promessa de mútuo.
Temos que conceber o Direito Bancário funcionalizado para as finalidades bancárias. O prof. Menezes Leitão fala não do mútuo bancário, mas
sim do mútuo em geral, e na área bancária parece ser pacifico haver um mútuo consensual em termos bancários. É importante distinguir entre:

• Mútuo;
• Abertura de crédito - a obrigação do mutuante é de entregar o montante mutuado, é o desembolso. Neste contrato, o Banco limita-se a
pôr à disposição uma linha de crédito que será́ utilizada pelo cliente, em função das necessidades, no montante e momento que o cliente
entender. O Banco chama-se neste contexto o creditante, o cliente é o creditado. Pode acontecer que o cliente não utilize nada? Pode.
Não há́ nenhum dever de utilizado do contrato de utilização de crédito. Então como é que o Banco se remunera? Há́ uma comissão de
imobilização. Na abertura de crédito há́ então duas remunerações: uma certa (comissão de imobilização, que remunera o Banco pelo
facto de pôr à disposição os fundos independentemente da utilização desse montante) e uma eventual (juros, em função do que for
utilizado). Sucede que, o esquema de utilização da linha de crédito é a mesma que vimos suceder no cartão de crédito. Se for restituído
o que faltava do crédito, volta-se a ter o montante máximo disponível, a estas cláusulas dá-se o nome de cláusulas de revolving ou de
reutilização. As comissões são calculadas com base no montante e também com o risco do cliente.

Regressando, ao crédito à habitação, temos que ter em conta:

• DL74-A/2017;
• DL 349/98 (com relevo residual).

É assim importante olhar para o DL 74-A/2017, há́ algumas semelhanças com o regime do crédito ao consumo (nos conceitos e em algumas regras
que vamos analisar) e isso não pode ser desligado da circunstância de este regime também decorrer da transposição de uma Diretiva europeia e
por isso, desse ponto de vista há́ uma similitude óbvia.

• Art 1º: a ideia é temos regras aplicáveis a créditos a consumidores, temos então o conceito de consumidores (art 4º/1/d), conceito igual
ao crédito ao consumo). Temos uma averiguação feita no momento de contratação, temos de ver a utilização a dar ao montante do crédito
e deve ser para atividade diversa a comercial ou profissional.
• Art 2º: o que seja construção ou aquisição de habitação própria ou de terrenos já́ existente ou para construção, não nos choca. O que é
mais diferente é o que está na alínea c), se houver hipoteca ou outra garantia aplicamos este diploma, independentemente da finalidade;
esta regra leva a que a designação inglesa seja “diretiva do crédito hipotecário”. Por outro lado, também o leasing sobre imóveis estará́
coberto sobre as mesmas regras.
• Art 3º: há́ aqui uma lógica de que sempre que não haja encargos, seja um crédito fora das regras do mercado não há́ tutela que justifique
a aplicação deste diploma, nesta circunstância aplicar-se- á o DL 349/98. Por outro lado, o diferimento de um pagamento é em si crédito
e esse crédito, sendo relativo a um imóvel, apenas não se encontra sujeito a este diploma se o diferimento não significar encargos.

Tendo visto a delimitação positiva (art 2º) e negativa (art 3º), estas são as balizas fundamentais deste regime. É evidente que há́ pontos em
comum com o DL 133/2009 como:

• Conceito de consumidor;
• Deveres de informação e de assistência;
• Dever de avaliação de solvabilidade;
• Reembolso antecipado.

Caso: Marta dirige-se ao seu Banco para pedir uma simulação do crédito para aquisição de um apartamento para habitação própria. Que
informação deve ser facultada pelo Banco?

Dever de entrega da ficha de informação normalizada, há́ um modelo próprio que implica, mesmo no caso da simulação (ainda que o cliente nunca
venha a contratar o crédito), deve o Banco entregar esta ficha de informação normalizada (FINE), art 13º. Há́ aqui dois momentos: 1) simulação,
em que é logo enviada a FINE; 2) aceitação do crédito, é enviada novamente a FINE e a minuta do contrato. Há́ muitos elementos que devem ser
facultados ao cliente - há́ uma antecipação da tutela informativa do cliente, havendo logo uma exigência maior do ponto de vista dos deveres de
informação a ser observada no crédito à habitação logo no momento da simulação do crédito.

Segundo o art 13º/4, com o envio da proposta, o Banco fica vinculado a manter a proposta contratual. No art 13º/5, temos que não pode haver uma
aceitação imediata. Por lei, há́ um tempo obrigatório de reflexão, o cliente não pode aceitar imediatamente. A lei proíbe que haja aceitação imediata,
obriga a um período mínimo de reflexão/comparação, e só́ ao fim dos 7 dias é que pode haver uma aceitação válida e eficaz do crédito à habitação.
Logo, também aqui temos elementos especiais que não encontramos no crédito ao consumo. Isto por causa do relevo de compromisso financeiro
envolvido nestes contratos. Este relevo financeiro tem esta implicação importante: visa evitar casos de pressão para aceitação imediata, aliás essas
situações não são de todo toleráveis. O período de reflexão vale identicamente para o mutuário e quando existente, para o fiador, art 13º/6.

Quanto à avaliação do imóvel:

Caso: A avaliação do imóvel pode ser feita pelo cliente? Se a contratação de seguros e a realização de avaliação ao imóvel forem contratados
diretamente pelo cliente, é necessário que os respetivos custos constem da FINE?

Art 18º/1, mesmo que o cliente seja um perito avaliador este não poderá́ avaliar, visto que não será́ independente. O cliente pode ter que suportar
a 1ª e até a 2ª avaliação (se for pedida por ele), se a 2ª avaliação for pedida pelo Banco, cabe-lhe a este suportar as respetivas despesas. É comum
haver uma 2ª avaliação, pe.: quando as habitações são novas. Quanto à avaliação, a lei não permite que seja o cliente a relacionar-se diretamente
com o perito avaliador, deve ser o mutuante a contratar um perito avaliador independente. O Banco diz que tem que haver seguro de vida, e se for
feito na seguradora do seu grupo custa mais 300€, mas pode o cliente ir a outra seguradora. A possibilidade que o Banco tem de cumprir o dever
de informação é de dispor os elementos que dispõe, ou seja, se fizer seguro com a seguradora do grupo então esses valores constarão da FINE.

• A simulação é feita antes da avaliação. Pode acontecer o cliente pagar a avaliação e o Banco não aceitar o crédito ou pode acontecer o
cliente pagar a avaliação, o Banco aceitar o crédito e o cliente não contratar. Ou seja, pode até compensar pagar avaliações em Bancos
diferentes, para tomar uma boa decisão visto que estão em causa normalmente grandes montantes.
Caso: Pode considerar válido: O manual de política de remuneração de um Banco que atribua um prémio de desempenho de 10.000€ aos
colaboradores que angariem clientes para a contratação de crédito à habitação com idade superior a 80 anos? Um contrato de crédito à habitação
celebrado com um cliente que é posteriormente contratado pelo Banco para ser seu colaborador?

Temos restrições à política de remuneração que se aplicam aos trabalhadores envolvidos na elaboração e comercialização dos créditos de
remuneração. Não atinge então apenas os administradores, mas também os funcionários de balcão e todos os que estejam envolvidos. Por outro
lado, a remuneração não pode ter um prémio relacionado com o no de contratos de crédito celebrados.
Além disso, em função de ser cidadão sénior pode ser uma questão do risco tolerado e da compreensão do contrato de crédito, da sua necessidade
e adequação à situação concreta do mutuário e não ser compatível com as suas circunstâncias, estar a assumir um compromisso duradouro com
aquelas características - art 5º/1/b)/c).

O crédito a colaboradores é uma das exclusões, não está sujeito a este regime, art 3º/c). Qual é o estatuto deste contrato? Num primeiro momento
não há́ qualquer problema, estará́ sujeito ao regime; mas, num 2º momento teremos um trabalhador e, por isso, temos que levantar 2 sub- hipóteses:

1. O contrato não será́ modificado;


2. O contrato será́ modificado, isto para se aplicar uma taxa mais favorável. Se temos um regime padrão, todo o sistema de protecção
mantém-se até ao fim. No caso de haver uma alteração ou uma novação do contrato (extinção e celebração de outro contrato), nessa
circunstância nem a modificação nem o contrato modificado se regem por este regime, mas sim pelo DL 349/98. Esta modificação só́
poderá́ ser no sentido mais favorável do mutuário.

Caso: Tiago, recém-licenciado à procura do primeiro emprego, dirigiu-se ao seu banco para a celebração de um mútuo destinado à aquisição
de uma vivenda no valor de 3,5 milhões de euros. Quid iuris? Temos que começar por ver os deveres bancários gerais, nomeadamente:

• Dever de know your client;


• Dever de governação do produto bancário;
• Dever de informação;
• Dever de assistência.
• Há ainda, o dever de avaliação da solvabilidade, art 16º.
• É ainda importante o art 14º acerca do dever de assistência.

Quanto aos intermediários de crédito: são as instituições que servem de ponte entre o cliente e a instituição de crédito. Pe.: há́ determinadas
imobiliárias que são intermediarias de crédito. Então, os sujeitos abrangidos por estes deveres não são apenas Bancos, podem ser outras entidades.

Caso: Afonso, empresário, depara-se com uma resolução do contrato de crédito à habitação em que é mutuário após incumprir o pagamento de
duas prestações. Quid iuris?

Nesta hipótese, aplica-se o art 27º - tem a ver com a protecção da situação das famílias, a protecção de situações de sobre endividamento. Além
do art 27º, há́ outros 2 diplomas sobre o amparo que a lei pretende salvaguardar:

1. PARI (plano de ação para o risco de incumprimento), DL 227/2012 - os bancos têm que estabelecer um plano de ação sempre que haja
indícios de degradação da capacidade financeira dos seus clientes. Pe.: divórcio, despedimento, perda patrimonial (desastre natural que
afeta a casa), incêndio no imóvel. Deve então haver contacto com os clientes, para ver se é necessário uma reavaliação do crédito para
evitar um incumprimento;
2. PERSI, DL 227/2012 - perante a situação de incumprimento é imposto um procedimento por lei para haver uma renegociação do contrato
de crédito e este regime impõe, durante um determinado período, a impossibilidade de haver resolução do contrato de crédito e a
apresentação de ações judicias para cobrança do crédito.

Além disso, é importante referir o regime sobre a comissão de recuperação de valores em dívida (DL nº 58/2013, de 8 de Maio). Os Bancos
conseguiam resolver o incumprimento, mas cobravam comissões altíssimas, o que agravava o cenário e levava a novo risco de incumprimento.
Temos assim, um plafonamento a montantes máximos das comissões que podem ser cobrados e não podem exceder 4% do valor da prestação
vencida e não paga - havendo assim um equilíbrio entre a comissão e o valor da prestação.

Caso: Tendo sido celebrado um contrato de mútuo bancário, quid iuris se o indexante se tornar negativo?

Art 21º-A: a mensagem é de que pode haver uma aplicação imediata nas prestações vincendas, ou não havendo há́ uma compensação em função
do montante deste crédito. Sendo que se o crédito decorrente do indexante negativo for superior ao crédito à habitação, então o Banco tem que
ressarcir. Há́ aqui uma opção de escolha das instituições de crédito, normalmente escolhem o 21º-A/3. Mas de uma maneira ou de outra, o indexante
negativo é refletido no contrato de crédito.

Caso: Tendo sido celebrado um contrato de mútuo bancário, pode o mutuário antecipar a data de reembolso? Caso afirmativo, é devida uma
redução dos juros? E se ao cliente tiver sido atribuído um prémio promocional (ex.: cheque-oferta, computador, máquina de café́ ) pela celebração
do contrato de mútuo?

Aqui aplica-se o art 23º, pode haver cumprimento antecipado, há́ redução de juros e há́ um limite máximo das comissões. De novo, estarmos a
desviar-nos do regime geral do mútuo civil (artigo 1147º/2 do Código Civil: o mutuário pode antecipar o cumprimento, desde que satisfaça os
juros por inteiro) para termos um regime mais alinhado com os interesses dos clientes (a disciplina legal do crédito bonificado prevê̂ regime
adaptado, artigo 19.º do DL 349/98).
Caso: Supondo, que quando o cliente estabelece o contrato de crédito, recebe um prémio se se mantiver com cliente durante 2 anos. Como é que
calculamos o montante máximo da penalidade se há́ um contrato de fidelização que implicou a atribuição de um bem?

Vamos supor que a penalidade máxima seria de 50.000€. O valor do computador (2.000€) fica limitado por esse valor ou é calculado
separadamente? Então o que se paga será́ 50.000€ ou 50.000€ + 2.000€? O prof. Paulo Câmara diz que o contrato de fidelização é eventual, isto
é, o cliente só́ adere ao contrato se quiser. Sendo assim, este contrato de fidelização assume uma natureza autónoma do contrato de crédito à
habitação. Se o cliente, não quiser manter-se cliente, isto significa o incumprimento do contrato de fidelização. Os 2.000€ são uma penalidade
contratual pré́ -estabelecida para o caso de incumprimento. São contratos e prestações, distintos com natureza distinta. Isto não cai dentro da
limitação do art 23º. E isso que vale para o contrato de fidelização, vale para outras relações contratuais que sejam autónomas do contrato de
crédito.

• Sobre esta matéria ver o artigo escrito pelo prof. Calvão da Silva, “Direito de cumprimento antecipado do contrato pelo mutuário de
crédito à habitação.”

Os limites das comissões são limites máximos e se o contrato for omisso, não há́ comissões.

Caso: Um Banco dirige uma circular aos seus clientes a informar que aceita reduzir o spread no crédito à habitação já́ contratado se aqueles
subscreverem PPR comercializados pelo banco. Pode fazê-lo?

A lei fala em vendas associadas (que é uma má designação), art 11º. Nã há́ vendas associadas obrigatórias, mas há́ excepções, e dentro dessas
excepções está incluído o contrato ao crédito e por isso, isto é possível. Não é um caso de tying (venda obrigatória), mas sim de bundling (venda
associada facultativa, o que é possível nos termos do art 11º/3).

Caso: Um contrato de crédito pode prever uma taxa de juros indexada à Euribor a 6 meses acrescida de um spread de 0,4% arredonda à
décima?

Art 21º/3, tem que haver arredondamento à milésima.

Caso: Um cliente decide entregar ao Banco o seu apartamento, cuja aquisição foi feita através do recurso ao crédito. Tal facto extingue
automaticamente a sua dívida?

Isto será́ a dação em cumprimento, para que esta exista é necessário primeiramente um acordo entre as partes, não basta o cliente chegar ao Banco
e entregar a chave. No contrato de mútuo, o cliente obriga-se a entregar dinheiro ao banco, se entrega bem diverso, estaremos perante uma dação
em cumprimento, e está só́ extinguirá a responsabilidade do cliente se o Banco concordar, art 14º/3/b). A poder haver dação em pagamento, isso
tem que estar no contrato; se não constar do contrato essa possibilidade fica arredada.

Por outro lado, a Lei 58/2012 tem também algumas restrições adicionais para devedores em situação difícil porque só́ pode haver extinção da
dívida quando o valor do imóvel for igual ao capital mais juros. Portanto, não é só́ uma questão de manifestação do Banco, há́ mesmo restrições
injuntivas à dação em pagamento nesta situação. Isto porque aquilo que aconteceu a partir da crise foi que os Bancos começaram a ter um balanço
cheio de imóveis, com grande dificuldade em fazer essa gestão e uma grande desvalorização dos imóveis. Este processo de limpeza do balanco
dos Bancos e transferência de NPLs dos seus balanços demorou mais de uma década, é um processo ao qual ainda estamos a assistir.

Caso: Um seguro de vida associado ao contrato de crédito à habitação pode prolongar a sua vigência além da declaração de invalidade deste?
Pode haver uma penalização contratual pela cessação antecipada do contrato de seguro em caso de reembolso antecipado do empréstimo?

Pode haver a imposição de seguros, é uma excepção ao tying. Isto encontra-se regulado no DL 229/2002, a validade e eficácia do contrato de
seguro depende da validade e eficácia do contrato de crédito à habitação, há́ uma acessoriedade. No entanto, o contrato de seguro poderá́ manter-
se se o cliente manifestar essa vontade.

Caso: Em caso de pluralidade de mutuários, o Banco só́ poderá́ exigir um seguro com a cobertura total do montante dos empréstimos ou 2 seguros
(um por cada mutuário) com coberturas parciais do valor do empréstimo?

DL 229/2002, art 5º/6: o Banco não pode exigir dois seguros de vida para garantir o total do capital em dívida, mas poderá́ exigir dois seguros de
vida parciais, que juntos perfaçam o capital em dívida. Até agora estivemos a falar em crédito com consumidores, mas há́ diferenças substantivas
quando o crédito é celebrado com profissionais - os montantes são mais elevados e em função dessa diferença é normal haver a realização do due
diligence, que é uma auditoria à pessoa cliente que visa avaliar a sua situação fiscal, laboral, contabilística e ver se existem litígios. Será ́ então
importante esta auditoria por ser um sucedâneo do dever de avaliação da solvabilidade do consumidor. Isto pode ser feito antes ou depois do
contrato ser decidido, só́ depois haverá́ ajustamento da taxa de juro. Se a due diligence é feita antes, poderá́ estar na base da contratação ou não
contratação e a fixação da taxa de juro.
Estes trabalhos envolvem juristas e não juristas (contabilistas, financeiros, arquitetos ou outras especialidades relevantes) A due diligence é um
relatório feito para o Banco, logo o Banco será́ o titular daquela informação e em função disso poderá́ contratar, não contratar ou contratar em
função de cláusulas de salvaguarda. A profundidade da due diligence dependerá do montante a dispor.
A empresa a financiar deve disponibilizar uma série de informação, quer fisicamente (forma mais tradicional), quer através de sites.

Sindicato bancário
O sindicato bancário é a contratação como mutuante de mais de uma instituição financeira, relacionada entre si através de sindicatos bancários.
Quando são montantes muito elevados (pe.: construir estradas), então há́ sindicatos bancários, implica o consórcio com várias instituições
bancárias. No sindicato bancário há́ um líder do consórcio que organiza as decisões do sindicato.

As vantagens do sindicato bancário, para o mutuário, são: consegue financiar-se em montantes mais elevados, há́ a concentração de peças
contratuais, maior rapidez e menos partes envolvidas (não envolve, por exemplo, ratings - usuais no mercado de capitais).

Para os financiadores, as vantagens são: a partilha de risco, participação em operações de financiamento de maior envergadura, cumprimento de
rácios prudenciais e limites à concentração de grandes riscos, daí a grande utilização dos sindicatos bancários.

Para o banco agente também existem várias vantagens: comissões e ligação mais próxima ao cliente.

O sindicato bancário implica não só́ o acordo com o cliente, mas também o acordo interbancário. Isto exige algum alinhamento entre os membros
do sindicato. Quando não existe este alinhamento, os bancos não fazem o sindicato bancário e fazem sim o clubdeals - sem nenhuma relação entre
os bancos, nem consórcio, quando há́ decisões entre os bancos não há́ nenhum princípio de maioria, têm que ser decisões tomadas por todos.

Também pode acontecer que os bancos entrem nestes negócios e depois queiram salvaguardar- se em relação ao risco assumido e por isso, fazem
uma cessão parcial de crédito (loan participation), que por vezes é uma cessão de créditos com garantia (recourse loan participation). É também
comum existirem cláusulas entre institucionais:

• Condições suspensivas - são as condições na falta das quais o crédito não é concedido: podem depender de avaliações, processos de due
diligence, deliberações, autorizações ou outros atos;
• Material adversa clause (MAC) - servem para situações desfavoráveis do mercado, colocam um ónus muito pesado do cliente. São as
cláusulas que preveem o vencimento antecipado do empréstimo em caso de verificação de alguma circunstância adversa, que possa
alterar a base de contratação com o banco.

É ainda importante ter em canto os convenants (ou cláusulas de salvaguarda) - cláusulas que os financiadores impõem aos financiados para que o
risco subjacente ao crédito não se altere. Que tipos de convenants temos?
- meramente informativos - deve-se informar sempre que haja alterações nos órgãos sociais, pe. Mas pode haver cláusulas mais intrometidas, são
técnicas importantes de influenciar, dizendo pe. que não pode haver fusões:

• Cláusulas de salvaguarda financeira: obrigam o emitente, ou o grupo de sociedades em que se insere, a cumprir níveis de desempenho
financeiro que traduzem as situações em que não terá́ dificuldades em solver o seu débito;
• Cláusulas de no mergers and amalgamations: resultam na dependência de autorização ou proibição para a realização de investimentos
de elevado risco ou na assunção de limitações de novos investimentos, fusões e aquisições;
• Também se incluem neste grupo as já́ clássicas disposições contratuais de limitação da constituição de novas garantias sobre o património
societário (negative pledge) ou de proibição de graduação superior em relação a nova dívida emitida, mantendo-se a igualdade em
relação aos demais credores (pari passu). Saliente-se tratar-se de cláusulas contratuais com eficácia inter partes, não podendo como tal
ser qualificadas tecnicamente como garantias.

E se as cláusulas não são cumpridas? Pode haver o vencimento automático da dívida ou então pode determinar uma alteração nos termos do
empréstimo e, portanto, implicar um agravamento da taxa de juro que é imposta pelos Bancos. Tudo isto são efeitos possíveis das cláusulas de
salvaguarda, que em termos mais adversos do mercado são muito utilizadas.

Outras cláusulas muito utilizadas em tempos difíceis são as cláusulas comuns no tráfego:

• Cláusulas de sindicação - permitem a cessão parcial da posição contratual a outros mutuantes;


• Market disruption - em caso de turbulência extrema, as cláusulas de market disruption facultam a possibilidade de utilização de
indexantes diversos dos indexantes correntes. Tal cláusula aplica-se em caso de perturbação extrema do mercado interbancário, tornando
necessário obter fontes alternativas de pricing das operações;
• Market flex - as cláusulas de market flex são aquelas que preveem, por exercício unilateral da parte financiadora, uma revisão ulterior
das condições contratuais do financiamento em caso de alteração das condições de mercado envolventes.

Estas cláusulas têm uma utilização mais intensa para facilitar o ulterior processo de sindicação. Todavia, podem operar de diversas formas, quer
para uma correção ao financiamento, já́ após a sindicação ou, por fim, independentemente desta. O efeito das cláusulas incide usualmente nas
taxas de juro do financiamento, mas pode ter por objeto outros aspetos do conteúdo contratual. Entre as modalidades destas cláusulas, contrapõem-
se as cláusulas de flexibilidade condicionada, que admitem variações limitadas nas taxas acordadas ou prazos de vencimento, bem como cláusulas
de flexibilidade irrestrita. A sua celebração justifica-se em períodos de elevada turbulência ou volatilidade.

Próxima aula: remuneração do crédito bancário, responsabilidade pela concessão de crédito e garantias (bancárias e financeiras).

Responsabilidade pela concessão de crédito

Caso: Um Banco celebrou sucessivamente com uma empresa, entre 2002 e 2010, 8 contratos de mútuo, com vencimento anual, no valor total de
16 milhões de euros. Pedida a renovação do mútuo para 2011, o Banco recusa-se a fazê-lo.
O cliente, por seu turno alega que o corte de crédito foi abusivo, e pretende ser indemnizado por esse facto. Aprecie a atendibilidade das pretensões
em confronto.
Resolução: O ato de interrupção, a recusa do Banco na concessão de crédito é lícito ou ilícito? Existe o dever de solvabilidade e esse dever é
especialmente relevante quanto a empresas. Demos os serviços bancários mínimos, mas não há́ um dever de concessão de crédito. Os serviços
bancários mínimos facultam a abertura de conta, mas não é de todo tolerado invocar esse regime para fundarmos no direito português um dever
de concessão de crédito. E na colocação normal, este dever de concessão de crédito também poderia repugnar esta ideia visto que há́ liberdade
contratual, e ligando esta matéria ao dever de solvabilidade isso implica que o dever de avaliação da solvabilidade implica o dever de não contratar
quando o cliente não seja solvente. Nunca podemos assumir uma ilicitude quando o Banco decide não contratar. É evidente que situações de
fronteira existem, quando se de alguma maneira houve uma mensagem, expressa ou tácita, que pudesse instigar algum sentimento de confiança de
que o crédito se manteria, apenas nessa situação é que podemos com granu salis, ver espaço para aplicação de uma responsabilidade pela violação
dos princípios da boa fé́ . Se houve um contrato de promessa de concessão de crédito o Banco já́ teria o dever de contratar, e caso fosse incumprido
já́ haveria consequências diferentes.

• Ver artigo do prof. Leite de Campos. Há́ uma inexistência do dever de concessão de crédito. Nas operações de crédito como nas demais,
os bancos atuam no âmbito da sua autonomia privada: não lhes são impostos deveres de concessão de crédito. Nem o regime de serviços
bancários mínimos (DL n.º 27-C/2000) força a concessão de crédito aos clientes

Responsabilidade por corte brutal de crédito

Problemas mais delicados coloca, porém, o corte de crédito. Aqui há várias hipóteses se podem colocar.

1. Em primeiro lugar, pode haver um incumprimento contratual se o banco se vincula à concessão de crédito, que acaba por não cumprir.
2. Para num contrato de crédito se reconhecer também uma promessa tácita de concessão de crédito futuro devem estar verificados os
pressupostos respetivos às declarações concludentes. O que se tem atendido quanto ao corte brutal de crédito é que isso é considerado
abusivo. Um corte de crédito apenas em casos extremos pode ser considerado como abusivo (art. 334.º CC) quando seja (critérios
alternativos e cumulativos):
a. Brutal;
b. Abrupto;
c. Inesperado;
d. Revelador de uma quebra ilegítima de um investimento de confiança.:

Caso: Um Banco celebrou um contrato de descoberto bancário no valor máximo de 2,5 milhões de euros a uma empresa em situação de colapso
financeiro iminente. O contrato foi divulgado na imprensa como sendo “um balão de oxigénio” para a sobrevivência da empresa financiada.
Esta, por seu turno, 3 meses depois, apresenta-se ao processo de insolvência. Podem os credores da empresa financiada apresentar, com êxito
um pedido de indemnização ao Banco por este, com o crédito concedido, ter criado uma aparência de solvabilidade?

Resolução: um dos critérios para aplicação da responsabilidade é a ilicitude, mas não há́ ilicitude.

Consequências de não cumprimento do dever de solvabilidade:

• Contraordenação, art 210º RGIC;


• Responsabilidade disciplinar;
• Substituição dos administradores que decidiram a concessão de crédito por força do Banco de Portugal;
• Necessidade de reforçar os mecanismos de governação.

Remuneração

Caso: As cláusulas contratuais gerais de um contrato de crédito podem prever uma alteração de spread se as condições do mercado assim o
obrigarem?

Resolução: No regime das CCG, art 22º/c) diz-se que não pode haver alteração em princípio. Mas temos o art 22º/2/a), aplica-se aos fornecedores
de serviços financeiros e por isso, aplica-se quer à taxa de juro, quer a outros encargos. Quais são os 3 requisitos para esta previsão contratual de
alteração da taxa de juro?

1. Variações do mercado - não pode ser uma variação de juro numa instituição. Tem que ser uma variação generalizada das taxas de juro
que justifique essa alteração;
2. Comunicadas de imediato por escrito;
3. Faculdade de resolução do contrato.

Em geral, muitos dos contratos continham uma cláusula como esta. Em 2011, os Bancos começaram a posicionar-se para exercer esta faculdade e
o Governo protestou e ameaçou mudar o regime geral das CCG. No final do dia, não houve alteração legislativa, nem houve uma utilização (que
seria licita) da faculdade de agravar os spreads. Isto porque os bancos perceberam que se o fizessem perderiam uma quota de mercado muito
relevante.

Há ́ empresas prestadoras de serviços (que não financeiras, e por isso não são regidas pelo RGIC), são intermediárias de crédito, cuja função é só́
renegociar os contratos de créditos. Então, o seu objeto social é o de, perante pessoas que têm contratos de crédito celebrados, promover a uma
alteração do Banco, sendo que essas empresas não cobram nada aos clientes, mas sim aos Bancos. O mercado do crédito é competitivo e o ponto
essencial neste regime das CCG é a faculdade de resolução que a lei impõe.

Variação da remuneração do crédito consoante a tipologia contratual


A estrutura da remuneração do crédito bancário depende do tipo contratual utilizado:

• Contrato de abertura de crédito - neste contrato, o Banco apenas tem o dever de disponibilizar o dinheiro, mas o beneficiário não tem
um dever de utilizar esse dinheiro, se houver utilização haverá́ revolving. Haverá́ juros então pagos. Mas poderá́ não haver utilização do
crédito, e aí aplicar-se-á́ apenas a comissão de imobilização (que será́ sempre paga, mesmo que haja utilizações).
• Desconto bancário - a técnica de remuneração é baseada num juro calculada em função do prazo até ao vencimento e neste caso, pode
haver cobrança desta comissão. Se não houver boa cobrança do título endossado, o cliente terá́ que restituir o montante adiantado porque
não há́ uma extinção da sua dívida pelo crédito concedido no contrato de desconto bancário. A remuneração do Banco é através de um
juro calculado em função do tempo remanescente para o vencimento.
• Project finance - o Banco financia um empreendimento e é remunerado através das receitas do empreendimento em causa. Há́ umas
participações de uma pessoa coletiva, com uma finalidade especial de construir uma obra, pe. construir uma ponte, aeroporto ou
autoestrada e depois o pagamento feito ao Banco é através dos frutos financeiros gerados pelo empreendimento e portanto, não é uma
lógica de reembolso, mas sim uma lógica de recebimento das receitas geradas com o empreendimento em causa. Há́ vários tipos de
financiamento:
• Financiamento inicial: up-front fees, custos do desenvolvimento do projeto, concepção e construção;
• Financiamento da construção usualmente progressivo, para acompanhar evolução da obra;
• Financiamento de contingências.

Caso: Um contrato de crédito pode estabelecer o vencimento de juros de juros? Resolução: A isto chama-se anatocismo, art 7º do DL 57/2018
(não vamos ao regime geral do Código Civil). Não depende de notificação, mas deve haver acordo das partes reduzido a escrito, quer em relação
aos remuneratórios, quer aos juros moratórios.

Garantias bancárias em geral

Por vezes é necessário que o crédito seja acompanhado das garantias adequadas dos clientes. Há́ assim solicitação frequente de garantias quando
o contrato de crédito é celebrado. As garantias são um fenómeno comum da atividade bancária, quer a exigência de garantias aos clientes, quer o
serviço de prestação de garantias.

Uma garantia é um alargamento da massa patrimonial que responde por dividas. O que é relevante é a prestação de garantias como atividade
bancária, art 4º/1/b) do RGIC. Está sujeito ao exclusivo das instituições de crédito e sociedades financeiras, art 8º/2 do RGIC (isto não acontece
em todos os países).

O que é conceder uma garantia? Há́ novos modos de prestação de garantia (pe.: México que comprou a garantia, caso o valor do petróleo baixe a
partir de certo valor, este é um contrato de swap). Que contratos há́ ?

• Garantia bancária;
• Contrato de derivados (pe.: swap);
• Contrato de seguro (pe.: seguro-caução).

há́ outras modalidades de garantias que escapam daquilo que é a aplicabilidade do RGIC (apenas se aplica a garantias bancárias).
Focando nos bancos, quando estes prestam garantias, o modo paradigmático pelo qual o fazem é através da fiança bancária. O Banco assume uma
garantia pessoal e o cliente é o seu fiador e esta garantia está dependente da obrigação afiançada. Os livros de referência sobre fiança é do prof.
Januário Gomes e do prof. Miguel Pestana de Vasconcelos.

A fiança pode ser subsidiária ou solidaria, consoante seja civil ou comercial a obrigação afiançada. Se houver fiança civil, a obrigação do fiador é
subsidiária (benefício de excussão prévia), não no caso da fiança mercantil.

Caso: Um Banco assina um termo de fiança relativa ao pagamento de rendas em contrato de arrendamento para comércio. Verificado um
persistente incumprimento das rendas pelo arrendatário, o Banco é demandado para pagar. Recusa-se, porém, a fazê-lo, com base em dois
fundamentos:

• Deve ser previamente excutido o património do locatário;


• Este argumento não é procedente visto estarmos perante uma fiança mercantil, não haverá́ o benefício da excussão prévia.
• A garantia foi assumida através de negócio jurídico unilateral, sendo por isso nula, atento o art 457º do Código Civil.

Só́ há́ casos de negócios unilaterais que vinculem, se previstos na lei, art 457º do Código Civil. Qual é a estrutura da fiança? A prestação de fiança
do Banco é um contrato, a estrutura é bi-vinculante, o Banco obriga-se a prestar a garantia e o cliente a pagar.

Sucede, porém, que o princípio da acessoriedade comporta grandes desvantagens porque não sabemos bem qual é a extensão e a validade da fiança
bancária, na medida em que essa depende da validade do negócio afiançado. Perante partes que não se conheçam pode ser difícil por isso, a partir
do século XIX começou a haver uma nova modalidade de garantia bancária, que é a garantia autónoma. Esta faz relevar apenas as excepções
previstas no contrato de garantia, de forma muito clara. O contrato de garantia é que determina que excepções é que podem determinar o não
apagamento da garantia pelo Banco quando a garantia é acionada, o que significa que o grau de autonomia das garantias bancárias autónomas é
variável. É uma questão de grau. A vontade é das partes e determina uma autonomia gradativa, consoante o que esteja determinado. Se tivermos
mais excepções, estamos a defender mais os Bancos, e vice-versa. Mas pressupõe sempre uma verificação da obrigação garantida.

Porém, este contexto levou ao aparecimento de uma nova modalidade de garantia, que é a garantia autónoma à primeira solicitação, aqui além da
autonomia há́ uma averiguação sobre a extensão. Nas garantias à primeira solicitação (first demand), a obrigação do banco assume o cunho de
automaticidade. Nestas garantias, o banco obriga-se ao pagamento ao primeiro pedido, salvo excepções limite.

Caso: Em que casos é que um Banco que tenha prestado garantia on first demand pode licitamente eximir-se ao pagamento do montante
garantido?

Resolução: Casos de fraude manifesta ou não cumprimento das regras sobre a notificação.

Caso: Pode um Banco assumir uma garantia de todas as “responsabilidade advenientes de quaisquer operações em direito consentidas e
independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha”?

Resolução: O objeto do contrato deve ser determinado (este é um problema geral). É evidente que esta indeterminação é relevante não apenas para
o direito civil, mas também para o direito bancário na medida em que, perante uma garantia desta natureza nem sabemos que previsões podem ser
feitas.

• O que é uma contragarantia? É uma garantia assumida pelo beneficiário da garantia, ou seja, em defesa da posição do Banco.

Como se chamam estas garantias em tudo consentidas? Garantias omnibus. Há́ um AUJ (n.º 4/2001, de 23 de Janeiro de 2001) que diz que as
garantias omnibus são nulas, mas se tiverem alguma determinação podem ser válidas e eficazes.

Caso: Pode um Banco constituir um penhor em seu benefício, mantendo o devedor a posse do bem empenhado?

Uma instituição de crédito pode constituir um penhor em relação a uma divida que seja titular, mantendo o devedor a posse do bem empenhado?
Pe.: crédito para aquisição de um automóvel e o Banco quer constituir um penhor sobre esse bem móvel, não quer ficar com o automóvel nas suas
instalações e pergunta se podem criar um penhor e o cliente fica com a posse do bem. Isso é possível?

Resolução: seguindo o Código Civil, isso não é possível. Segundo, o Código Comercial a resposta será́ mista. A entrega do penhor mercantil pode
ser simbólica, mas são casos contados.

Penhor sem desapossamento: DL 29.883 que permite apenas para as instituições bancárias um penhor sem desapossamento. É evidente que o tema
do penhor se articula também com a questão dos vários direitos constituídos na esfera dos clientes, são direitos bancários, e não bens corpóreos.
Pode ser constituído penhor sobre conta bancária?

Caso: Pode um Banco constituir um penhor sobre conta bancária, para segurança em relação a créditos concedidos aos seus clientes?

Resolução: A primeira dúvida é sabermos como construímos esta figura. Concluímos a dada altura que no momento da constituição de um depósito
há́ aqui um efeito translativo da titularidade do dinheiro depositado. E, portanto, na verdade o cliente já́ não é titular do dinheiro e não o sendo,
como é que pode dar o dinheiro em penhor? Posso dar em garantia um bem de que não sou titular? Não. Está em causa a oneração de um bem, só́
que o dinheiro está na esfera jurídica do Banco. O cliente não é titular do dinheiro. Então como é que consigo construir um penhor sobre conta
bancária? O cliente tem sob o Banco o dinheiro de crédito, o direito a dispor do dinheiro depositado efetuando o levantamento (que depende se é
a prazo ou não). Então como constituo aqui um penhor? Há́ penhor sobre o direito de crédito ao saldo do depósito bancário. Então, o penhor de
conta vai envolver:

• A actuação de depósito ao pagamento de divida;


• Compromisso de não levantamento dos montantes necessários para cobrir a divida;
• A autorização do débito.
o Ac. Rel Porto (3 Out 2006): é fiança e não penhor (em sentido próximo, M Cordeiro)
o Maioria da doutrina: é penhor sui generis

Dever haver um penhor de direitos nos termos dos art 679º e ss. do Código Civil. No entanto, esta solução coloca um problema porque o penhor
de direitos rege-se subsidiariamente pelo regime da hipoteca (que se rege pelo regime das coisas), nos termos do art 694º. Na hipoteca vigora a
proibição de pacto comissório, isto é, o estabelecimento de utilidade de uma comissão através da qual se possa fazer sua a coisa onerada.

Como é que conseguimos resolver o problema? Este é um obstáculo superável. Qual é o fundamento do pacto comissório? Que tipo de interesses
é que procurará acautelar? A lei o que quer evitar é que o credor se aproprie de um bem e que é em valor superior ao valor da divida em causa e
haja enriquecimento indevido em razão de uma execução direta do seu crédito. Para além disso, o objeto garantido no art 694º é um imóvel, que é
mais difícil avaliar, pode haver elementos que não são óbvios, temos que recorrer a peritos de imóveis que é uma classe supervisionada - por isso,
de facto se não houvesse este regime, o risco dos credores seria um risco efetivo.

Uma hipótese seria dizer que aquelas remissões, são com as devidas adaptações, aqui temos um objeto diferente e por isso não se aplica. Esta é a
posição do prof. Januário Gomes, mas o prof. Paulo Câmara não acha essa justificação suficiente. A lei proíbe o pacto comissório, mas não proíbe
o pacto marciano. O pacto comissório é o que investe no credor o direito de fazer sua a coisa onerada, é um direito de execução, de apropriação e
de transferência da titularidade sobre o Banco na sua totalidade. O pacto marciano é a convenção através da qual o credor se obriga a apropriar-se
apenas do valor respeitante à dívida subjacente.
Resumindo:

• 1a via de resolução é dizer que o bem objeto de garantia no penhor não é de difícil avaliação e por isso, a avaliação de bens empenhados
não tem problema, então não se aplica. (o prof. Paulo Câmara não gosta desta solução).
• 2a via de resolução é dizer que se deve celebrar um pacto marciano que significa circunscrever o valor ao valor da dívida. Com isto
elimina-se a incerteza jurídica.

Cartas de Conforto

Declaração jurídica emitida por um banco ou não (porque pode ser confortante ou confortado) através de alguém que tranquiliza alguém quanto
ao provável cumprimento da obrigação subjacente.
Confortante e confortado. Isto corresponde a uma garantia? Depende das diferentes modalidades. Pode o banco ser demandado? Há garantia? Falar
numa carta de conforto não é suficiente para tirar os efeitos que dela decorrem. Há variabilidade quanto ao conteúdo e quanto à natureza e
vinculação que decorre dessa mesma carta de conforto. Tudo resulta da interpretação do contrato.

➢ CC fraco: apenas implicam a prestação de informação e dever genérico de diligencia


➢ CC médio: implicam obrigação de meios
➢ CC forte: implicam obrigação de resultados

Na prática, vê-se mais cartas a nível fraco e médio. Normalmente, não há garantia em sentido próprio, mas uma declaração em sentido fraco ou
médio. Só dizer que há carta de conforto não nos permite tirar uma garantia. Nas CC, a ocorrer incumprimento, não pode haver cumprimento
coativo, mas apenas lugar a indemnização (no limite). Trata-se de uma garantia indemnizatória.

O Banco pode ser o confortante (autor da declaração de conforto) ou o confortado (beneficiário). É uma declaração através da qual uma pessoa
jurídica vem confortar outra quanto à seriedade do compromisso ou probabilidade de cumprimento de um compromisso de crédito por outra
entidade (que pode ser participada ou dominada). O texto das cartas de conforto pode ser muito variável.

Caso: Um Banco concede uma carta de conforto quanto à capacidade de um cliente seu solver os seus compromissos. O cliente, porém, acaba
por não cumprir a dívida. Pode o Banco ser demandado para responder pela dívida do cliente confortado?

Resolução: Há́ uma classificação entre cartas de conforto fracas, médias e fortes. Nas cartas de conforto fracas, o Banco apenas será́ responsável
se essa informação for falsa. Pe.: o Banco diz: “ele não tem incidentes”, mas depois na realidade ele tem, então aí haverá́ responsabilidade do
Banco. Então só́ haverá́ garantia nas cartas de conforto fortes. Pe.: o banco diz: “Eu Banco X conforto quanto à capacidade de cumprir do cliente
Y, comprometendo-me a honrar esta mesma declaração pagando por inteiro a obrigação se Y vier a incumprir no prazo contratualmente referido.”
Só́ aqui há́ garantia indemnizatória. Ler prof. Menezes Cordeiro.

Cartas de desconforto

Carta emitida pelo banco que diz que aquela pessoa não tem capacidade de solver. A pessoa tem uma situação precária e frágil. Isto serve quando
estamos perante um dever de contingência de ser aplicada uma coima ou benefício que só se aplica a instituições com situação económica difícil.
A confirmação factual dessas informações pode ser obtida através da declaração do banco, dizendo que vai atestar a existência de dificuldades
financeiras, dado que o saldo é de x.

Aquilo que a nossa doutrina não fala é nas cartas de desconforto, que em vez de sublinharem a capacidade de certa pessoa honrar uma dívida,
sublinham a sua incapacidade. Nestes casos, o Banco apenas pode responder pela exatidão da informação prestada. Ou seja, o dever de dizer
verdade. Isto é aplicado a quem está em risco de ser condenado ao pagamento de uma coima, pe.

Caso: O Banco Branco instrui o Banco Azul para que este conceda crédito a um cliente daquele, prestando além disso informações comerciais
favoráveis. O crédito é concedido, mas o cliente não procede ao seu reembolso. Pode o Banco Branco ser demandado para responder pela dívida
do devedor?

Resolução: Qual é a natureza desta ordem do Banco Branco para o Banco Azul? A palavra “instrui”, significa ordenar. Isto não é uma carta de
conforto. O Banco Branco está a prestar informações, mas está a ordenar. Esta figura é o mandato de crédito. Ele transmite a ordem, ele pode ou
não aceitar, art 607º do Código Civil. Qual a posição jurídica do autor do encargo? Constitui-se fiador. O Banco pode ser demandado porque
responde como fiador pela dívida do cliente. Podemos ter então um mandato de crédito com informações acessórias.

Na carta de conforto não há́ qualquer vínculo direto quanto à obrigação cortada. Já́ no mandato de crédito, o Banco é mandatado a conceder
crédito, assumindo o mandante a obrigação de fiador, art 629º do Código Civil.

Qualificação é sempre o elemento que nos aponta para o regime. “Instrui” = mandato de crédito. Neste existe uma ordem, que o banco pode de
escolher não aceitar o encargo, mas se assim o fizer, quem transmite a ordem responde a título de fiador e há responsabilidade solidária. Partes no
contrato de mandato: encarregado e autor do mandato. Isto é diferente da CC.
Alienação Fiduciária em Garantia

Aqui há́ uma transmissão da titularidade com função de garantia, portanto, há́ uma transmissão fiduciária sobre os bens garantidos que pode ser
revertida havendo o cumprimento da obrigação subjacente, o exemplo clássico é a operação de reporte. Alienação fiduciária em garantia: tutela
mais intensa que pode acontecer relativamente ao beneficiário da garantia. Para a proteção extrema do beneficiário, isto é investido na
titularidade do bem sobre que incide a garantia.

REPORTE - Definição: o contrato de reporte é considerado uma modalidade de alienação fiduciária em garantia (art. 2.º, n.º 3 DL n.º 105/2004).
O reporte envolve a compra, a dinheiro e a contado, de títulos de crédito negociáveis e pela revenda simultânea de títulos da mesma espécie, a
termo, mas por preço determinado, sendo a compra e a revenda feitas à mesma pessoa (artigo 477.º Código Comercial). O art. 284.º CVM reconhece
o reporte como garantia que pode estar associada a sistemas de liquidação, considerando que não é afetado pela abertura de processo de insolvência,
de recuperação de empresa ou de saneamento da entidade garante. simboliza aquilo que é uma operação em sentido estrito. É insuficiente dizer
que estamos perante um contrato. é uma operação porque temos o momento de encontro das partes, o consenso contratual. Mas depois temos
operações materiais em 2 fases que são logo inicialmente contratadas. 2 partes: reportado e reportador. Significa a transmissão para o reportador
de títulos. Este é um negócio com uma função de garantia e apenas haverá um dever de retransmissão se à data do vencimento do dever, a dívida
subjacente tiver sido cumprida. Se isso não acontecer, o reportador retém a titularidade dos instrumentos financeiros. É uma operação que envolve
um contrato de transmissão e por isso envolve 2 movimentos translativos em períodos temporais sucessivos e distintos. Ao reportado interessa
ceder valores mobiliários ou instrumentos financeiros que podem ter um risco de desvalorização. Já o reportador, uma vez que compra num
momento e revende num momento distinto, isso alarga o património que responde pela dívida e na pendência do reporte, tem todos os direitos
inerentes aos bens garantidos. É uma figura ancestral do direito comercial.

Há́ uma compra a pronto e uma revenda a prazo dos mesmos ativos às mesmas pessoas. Porque é que isto pode acontecer? Para já́ para ser garantia,
mas pode haver um interesse de termos as ações num período particular, para exercer o direito de receber dividendos ou de participar em
Assembleia Geral depois com a obrigação de revenda. As partes envolvidas são:

• Reportador - aquele que adquire titularidade temporária;


• Reportado - aquele que recebe o dinheiro em função da primeira transmissão e depois que readquire os instrumentos financeiros mais
tarde. Tudo isto é uma forma de rentabilizar os instrumentos financeiros.

Caso: Celebrando-se contrato de reporte ao abrigo do DL 105/2004:

a) Pode a primeira venda ser a termo? Pode haver um reporte consensual que produza efeitos antes mesmo da primeira transmissão?
Sim, tendo por ideia a autonomia privada. No conceito do CCOM, a ideia é que o reporte implique o dinheiro a pronto. Porém, a
interpretação hoje feita da norma é que ela não limita a possibilidade de celebração de reportes em que a primeira tradição seja a
termo. – art.º 447 CCOM.
b) Pode o reporte produzir efeitos antes da entrega dos instrumentos financeiros? Segundo o artigo 6º/2 tem de haver uma transferência
da posse do instrumento financeiro, mesmo não havendo a entrega tem que haver mecanismos equivalentes à entrega como o registo de
valores mobiliários escriturais. Art.º 6/2 para estarmos sujeitos ao diploma, temos de observar as regras gerais. Aqui, vale a ideia de
desapossamento ou situação jurídica equivalente. Se só titulados, pode haver entrega. Se são escriturais, tem de haver o registo.
c) Pode o reportador, no fim da operação, entregar instrumentos financeiros equivalentes aos que lhe forem confiados? É o conceito
de fungibilidade – é assim que medimos o critério de equivalência. Podemos ter ações que não são fungíveis. Temos regras particulares
que impedem a celebração de acordos de celebração fiduciária em garantia com investidores não profissionais. Fungibilidade. De entre
um universo de bens, são equivalentes aqueles que não se distinguem para efeitos de cumprimento das obrigações. Possibilidade de
celebrar acordos de garantia financeira com transferência de titularidade: art.º 306 E CVM.

Caso: Se for celebrado reporte sobre ações emitidas pela Apple: Pode o reportador alienar as ações reportadas? Sim, sendo o reportador
titular dos instrumentos financeiros, então ele é titular e tem o direito a fruir e dispor desses bens e isso significa que pode vender, desde que no
final entregue o bem.

Suponha que a Apple durante este período paga dividendos. Quem recebe os dividendos? Reportador ou reportado? Reportador. Quem recebe os
dividendos? Credor. Da mesma maneira que falamos no direito a dispor e alienar, isso vale para qualquer direito que seja relativo e incorporado
naqueles instrumentos financeiros. Há uma transferência de titularidade para o reportador, que recebe dividendos, desde que na altura acabe por
obviar a garantia prestada ou o objeto equivalente (art.º 14).

Resolução: na pendência do reporte o que pode fazer o reportador? Artigo 14º. Se no penhor financeiro não havendo titularidade havia o poder de
alienar aqui a resposta não poderia deixar de ser diferente. Pode haver transmissão com as consequências fixadas no artigo 14º, da restituição de
equivalente.

Caso: Se for constituído reporte financeiro sobre ações: Quem é titular do direito de voto na pendencia do reporte?

Resolução: O esvaziamento do voto é uma situação em que há́ uma atribuição formal de um direito de voto por ações, embora as consequências e
o risco dos interesses do ponto de vista económico associados a esse direito estejam na esfera de uma outra pessoa. À luz do CVM, quem é titular
tem a legitimidade para o exercício das posições jurídicas associadas ao valor, nomeadamente o direito de voto. O reportador, está a exercer o
direito em nome próprio (regra da unidade de voto). O único desvio permitido no ordenamento português à regra da unidade de voto é no art 23º-
C do CVM, quando haja exercício de direitos de voto por investidores profissionais, mas em nome de terceiros. Ele aqui está a atuar em nome
próprio, portanto não pode fracionar o sentido de voto.
Se se transferem as ações, também se transferem os direitos inerentes às ações. Será o reportador. Pode haver casos em que haja um acordo de
voto que permita o reportado a reter o direito de voto, mas numa questão colocada assim, a resposta é que o titular das ações é titular de todos os
direitos inerentes às ações. Vale o mesmo pra o direito aos dividendos.

No entanto, esta resposta não deixa de suscitar alguma apreensão: o efeito da aplicação deste regime significa que investir no direito de voto
1- Há de estar alguém que é o titular de curto prazo das participações sociais.
2 – Pode nem sentir os efeitos económicos da deliberação.

Nestas situações em que há o exercício formal imensurável do direito de voto, mas fora do risco económico inerente às participações sociais, isto
é o que se chama de esvaziamento do voto, empty voting. Há estudos que chamam à atenção para os efeitos económicos da votação, embora a
licitude do exercício do direito de voto não pode ser contestada. Nós dissemos que o titular pode exercer o voto. Na pendencia do reporte, pode
haver uma AG e ele pode participar nela, pedir informações e exercer o voto. Ele é titular do crédito. Mas a verdade é que ele é o titular transitório
porque está obrigado a revender as participações.

Caso: No contrato de constituição de reporte pode prever-se outros eventos a desencadear o vencimento antecipado, além do incumprimento da
obrigação garantida? Artigo 15º que remete para o art 12º, sim. Aqui temos o regime simétrico do que vimos há́ pouco.

• Garantias financeiras - DL 105/2004, matéria que sai sempre no exame.


• Envolve a parte institucional, o regime das garantias, etc.

Composição de litígios bancários

Banca relacional: modo de caracterização da atividade bancária que supõe vínculos contratuais de acentuada estabilidade temporal e negociações
reiteradas com os mesmos clientes para obtenção de ganhos mútuos de eficiência. Para isso, a relação bancária funda-se na proximidade e
fidelização dos clientes.

Operações bancárias ativas: o objetivo legislativo é o de fomentar as boas práticas na concessão responsável de crédito (reponsible lending). A
título principal: reforço dos deveres de prestação de informação e constituição de deveres de assistência e de avaliação de solvabilidade do cliente.
A área bancária é uma área que é tradicionalmente responsável por uma sobrecarga muito grande dos tribunais judiciais, há́ muita litigância entre
pequenos clientes e bancos, que incidem muitas vezes pequena monta, mas não é por isso que são menos relevantes, quer do ponto de vista jurídico,
quer do ponto de vista da ocupação dos tribunais, quer evidentemente do ponto de vista social quando estão em causa pe. crédito à habitação. A
banca sempre viu este tema como um tema a resolver, porque para os bancos é muito complexo ter um litígio com um cliente seu e gosta sempre
de encontrar vias de composição alternativa ou não judicial de resolução de litígios com os seus clientes. Portanto, esta ideia da banca relacional
favorece muito uma composição extrajudicial de litígios. Por outro lado, os tempos de crise financeira que vivemos na última década também
reforçaram as medidas suavizadoras das ações judiciais intentadas contra clientes bancários, tendo em conta que em causa está a protecção das
famílias, protecção da habitação de família, o fomento do crédito responsável e portanto, há́ uma série de regras relativamente recentes que devemos
considerar nestas matérias. Qual o melhor meio extrajudicial de composição de litígios bancários?

Mecanismos extrajudiciais que promovem a composição de litígios envolvendo instituições de crédito e os seus clientes. São 4:

1. Provedores bancários internos;


2. Mediador do crédito;
3. Reclamação para o banco de Portugal;
1. Estes são os três canónicos.
1. Plano de ação para o risco de incumprimento (PARI);
2. Procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI).

Provedores bancários internos – colaboradores da instituição de crédito aos quais é confiada a função funcional de receber, tratar e responder
às reclamações de clientes dirigidas às instituições de crédito. É a terminologia mais usada na carta circular do Banco de Portugal. São 2 as suas
funções principais:
➢ Função comunicativa: ao encarregar-se da centralização na receção de comunicações e na resposta aos clientes, a qual deve observar
forma escrita. Esta comunicação serve para desfazer equívocos ou para esclarecer dúvidas que podem ser causas de reclamação. E
também a comunicação favorece a coerência das respostas e a igualdade de tratamento de clientes nas mesmas condições
➢ Função de extensão ao sistema institucional de controlo interno: ao dirigirem recomendações internas de aprimoramento funcional nas
instituições de crédito nas situações em que concluam pela bondade da reclamação.

Estes provedores regem-se pelo princípio da instância (atuam em resultado do impulso dos reclamantes e em função do conteúdo das reclamações
recebidas). A este cabe a formulação de pareceres ou de recomendações. As conclusões dos provedores não são vinculativas naturalmente nem
percludem o direito das partes de recurso aos tribunais. A eficácia do provedor é variável. Indicadores mais relevantes: tipo de reporte orgânico-
funcional em termos hierárquicos; grau de prontidão de resposta; capacidade de articulação interna com outras unidades orgânicas; proporção de
recursos afetos a esse serviço; percentagem de recomendações acolhidas internamente.

• Pontos fortes: haver um interlocutor, que tem função comunicativa; é gratuito para o cliente; está perto da fonte de informação.
Pontos fracos: não vinculatividade das decisões (pareceres e recomendações); há́ um défice de imparcialidade do Banco; há́ cada vez
menos provedores bancários internos (figura que nos anos 80 tinha uma expressão bastante significativa e agora, são menos os
provedores bancários internos).

Nota: uma das medidas de governance de que se fala, é colocar tudo o que seja compliance, auditoria interna, gestão de riscos, gestão de
reclamações ao provedor por debaixo de administradores que não tenham pelouro de negócio. Isto porque se é um administrador ou um membro
da administração com pelouro de negócio, é claro que a sua tentação vai ser a de secundarizar essas funções de controlo interno (incluindo a função
de provedor interno) em benefício das áreas de negócios.

Mediador do crédito

É um órgão independente do Estado a funcionar junto do Banco de Portugal, também relevante na composição de litígios bancários. Compete-se
coordenar a atividade de mediação entre clientes bancários e instituições de crédito, exercida com a finalidade de contribuir para melhorar o acesos
ao crédito junto do sistema financeiro. . A sua independência está assegurada, não apenas pela sua autonomia formal em relação ao BP, mas
também pelos deveres que lhe são explicitamente impostos.

Configuração do processo de mediação:

➢ Inicia-se através de um pedido de mediação dirigido ao mediador do crédito.


➢ O processo não se inicia caso haja indeferimento liminar
➢ Pode ser encerrado se houver revisão da decisão da instituição de crédito e acordo do cliente
➢ A decisão final do mediador é: ou arquiva o processo por entender que o pedido não tem fundamento; ou emite uma recomendação para
que o procedimento ou ato seja corrigido ou para que a situação irregular seja sanada. O não acatamento da recomendação tem de ser
fundamentado, e deve-se dar conhecimento ao Mediador

Na instrução do processo, as instituições de crédito envolvidas e qualquer outra entidade publica com atribuições na área do Mediador do Crédito
(ex. próprio banco de Portugal) estão vinculados a deveres de cooperação, devendo prestar todos os esclarecimentos e informações solicitados
pelo mediador. No entanto, as funções do mediador não se cingem às relações entre instituições de crédito e clientes, na medida em que também
se estendem aos fiadores com fiadores de contratos de crédito.

Pontos fortes: é um processo gratuito; há́ uma maior independência relativamente ao provedor bancário interno (funciona ao serviço do Banco de
Portugal); o mediador pode ou arquivar o processo ou elaborar uma recomendação, sendo que existe um ónus de fundamentação da recomendação
não acautelada; celeridade; deveres legais de cooperação com o mediador de crédito, as instituições têm de os cumprir.

Pontos fracos: a recomendação não é vinculativa, não há́ uma garantia de resolução ou de reparação dos direitos dos clientes; se houver a
descoberta de um facto ilícito o mediador não pode comunicá-lo ao Banco de Portugal;

Se há́ descoberta de um facto ilícito, o mediador de crédito pode comunicar ao Banco de Portugal? Não, por causa do dever de sigilo do art 14º.
Isto porque o processo de mediação ancora-se na confidencialidade e na imparcialidade do mediador. Se o mediador não cumpre o dever de
confidencialidade é evidente que toda a credibilidade da mediação sai prejudicada. O estatuto do mediador de crédito encontra-se no DL n.º
144/2009.

Reclamação junto do Banco de Portugal

É competente o BP para apreciação das reclamações apresentadas às instituições de crédito. As instituições de crédito devem remeter no prazo de
10 dias úteis ao BP:
➢ O original da reclamação
➢ Resposta entretanto dirigida ao reclamante
➢ Alegações da instituição visada e eventuais elementos documentais acessórios relevantes

Se a reclamação for dirigida diretamente ao BP, este faz uma seleção das reclamações a remeter às instituições, que desejavelmente procedem ao
tratamento e sendo o caso, sanação da reclamação no prazo de 20 dias úteis.

Pontos fortes: mecanismo célere (há́ um prazo para transmitir informações - as instituições têm que ter procedimentos internos para tratamento
de reclamações, artigo 77º-A do RGIC). O cliente entrega a reclamação diretamente ao Banco de Portugal, este aprecia as reclamações, identifica
as realidades de reclamações, promove as diligências necessárias, torna tudo público com um relatório anual sobre as reclamações e sobre o
tratamento dado às reclamações. Hoje em dia, o fluxo de reclamações é muito grande; reclamação é feita diretamente ao Banco de Portugal, a
entidade que supervisiona; é uma autoridade imparcial (enfâse no facto de ser uma autoridade), as instituições de crédito não querem nunca passar
uma imagem de mau serviço ou incumprimento de regras. O Banco de Portugal tem à sua disposição diversa instrumentos de atuar como pe.: fazer
auditorias, ter equipas permanentes de inspecção junto das instituições de crédito, etc.; é gratuita a reclamação; esta é uma via mais promissora.

Ponto fracos: atrasos do Banco de Portugal (o nível de serviço e agilidade do Banco de Portugal, enquanto autoridade de supervisão não são
brilhantes).

O Banco de Portugal pode: ou não dar razão ao reclamante (faz uma análise imparcial), pode dizer que o reclamante tem razão, mas a instituição
demorar até vir fazer pagamentos que estejam em dívida ou redução da taxa, pe. - mas, claramente que este é o mecanismo de composição
extrajudicial de litígios que é mais eficaz. Aqui não há́ sequer sombra de comparação com os demais, embora não havendo aqui uma garantia de
dar sempre razão ao cliente, o cliente não tem sempre razão. Às vezes, há́ um grande desconhecimento de regras e quais os produtos em causa -
existe uma baixa literacia financeira que não é confessada.

PARI (plano de ação contra o risco de incumprimento)

Foi determinada a cominação de um dever aplicável às instituições de crédito de elaboração e de adoção de um PARI. O Plano deve conter uma
descrição dos procedimentos para acompanhamento dos contratos de crédito, deteção de indícios de degradação de capacidade financeira e de
medidas a propor aos clientes em caso de risco efetivo de incumprimento. Natureza do plano: servir de uma politica de prevenção do não
cumprimento por parte dos clientes a aplicar por parte de cada instituição de credito.
Há exigências quanto à informação a constar do plano: quanto à divulgação aos trabalhadores das instituições de crédito, seja ainda quanto ao
prazo máximo de contacto com o cliente que indicie sinais de degradação de capacidade financeira. Se os indícios de degradação da capacidade
financeira forem sérios, o primeiro deve ser feito num prazo que não exceda 10 dias. O PARI é um plano que complementa o procedimento de
gestão de situações de incumprimento.

Aqui temos basicamente o dever de organização interna de modo a assegurar um contacto precoce com o cliente perante os primeiros indícios de
degradação financeira. É evidente que isto é mais uma concretização do know your costumer e portanto, quanto à necessidade que este dever
pressupõe de acompanhar a par e passo a evolução da situação financeira dos clientes, no caso das pessoas singulares a evolução da sua situação
profissional, familiar, às vezes estado de saúde, etc. No caso das pessoas coletivas, apresentação ao processo de falência, acidentes na central de
registos de crédito, etc. - tudo isso são factos que devem ser acompanhados por parte da instituição, que são bastante relevantes nesta concretização
dinâmica no dever de conhecimento do cliente.

PERSI (procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento)

O regime é aplicável a clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito. A mora
do devedor consiste no atraso culposo no cumprimento da obrigação (804/2). Requer-se que a obrigação perante a instituição de crédito seja
determinada quanto à sua existência, coercibilidade e montante. O Âmbito do diploma que consagra o PERSI é objeto de uma dupla delimitação.
Ficam afastadas do âmbito do PERSI os contratos de crédito para utilização profissional. Estão fora de aplicação os contratos de locação financeira,
contratos de aluguer de longa duração e contratos de crédito ao consumo de montante superior a 75 mil.

Pontos fortes: garantias dadas àquele que é integrado no PERSI. Há́ um primeiro contacto, depois inicia-se o PERSI e durante o PERSI há́
informação, avaliação da capacidade financeira e apresentação de respostas e negociação. No papel, isto parece algo interessante para promover a
regularização.

Pontos fracos: isto na prática acaba por ter limitações. É um sistema cego às características concretas do cliente; não é um regime geral, ou seja,
só́ abrange alguns regimes (âmbito de aplicação reduzido); retira margem de negociação ou de alargamento dos prazos, ou seja, por vezes pode
ser insensível ao decorrer do processo de negociação e desse ponto de vista, pode ou não ser desajustado.

Nota: Este é um mecanismo de tal maneira pouco inteligente, pouco adaptável à situação dos clientes e do processo de negociação, que os bancos
tornam isto quase um algoritmo de expedição de correspondência, que em termos práticos implica sobretudo uma moratória e um prazo adicional
de regularização. Tanta coisa acaba por se concretizar num período de 30 dias para evitar que haja nesse entretanto apresentação de ações judiciais
ou resolução de contratos bancários.

Garantias bancárias: sujeita ao princípio da acessoriedade, garantia autónoma. Garantia mais enérgica: penhora.

O sentido de fundo da disciplina é de ter garantias cada vez mais prontas a defender o seu beneficiário. É como corolário desta evolução que
chegamos ao regime das garantias financeiras, DL 55/2004. Para navegar num diploma que ainda não conhecemos, temos de perceber o seu âmbito
de aplicação.

As 2 modalidades principais de garantis financeiras são: penhor financeiro e transmissão fiduciária de garantia, sendo que a distinção está na
circunstância de que nesta última, o objeto sobre que recai a garantia é transmitido para a titularidade do beneficiário da garantia. Um dos exemplos
desta é o contrato de reporte.

Critérios de aplicação do diploma:

➢ Art.º 3 b): quando haja instituições publicas prestadoras ou beneficiárias de garantias, pode aplicar-se este regime.
➢ c) instituições de crédito, nomeadamente instituições financeiras.
➢ d) o que é uma contraparte central, agente de liquidação? Entidades que se encarregam de fazer os pagamentos ou garantir os pagamentos
em mercado. Temos os agentes que fazem a liquidação, as camaras de compensação, e as contrapartes centrais que são entidades que se
entrepõem entre comprador e vendedor e garantem o cumprimento de ambos. Liquidação nos mercados: multilateral, para fazer isto com
rigor e sem risco operacional, há entidades especializadas para o efeito que são as contrapartes centrais, etc.
➢ e) exclusão clara: pessoas singulares. Pela primeira vez, não é comum termos legislação em sede de relações bancárias entre
institucionais. É um caso importante e interessante.

Garantias financeiras

O DL 105/2004 decorre da transposição de diretivas europeias por isso, este regime tem paralelo em todos os EM e é conhecido em inglês como
“financial collateral”. Um ponto fundamental prende-se com o âmbito de aplicação deste diploma. E para o efeito, diz o art 2º quais são os
contratos de garantia financeira (são os que preencham os requisitos dos art 3º a 7º).

Casos: Pode ser estabelecido um contrato de garantia financeira relativamente a:

a) Garantia prestado por um Banco perante uma pessoa singular, constituída sobre notas de banco raras, algumas das quais sem curso legal?

Não pode ser sob notas de raras, art 5º. E o facto de ser perante uma pessoa singular? Art 3º, exige-se que prestador e beneficiário seja um dos que
estão nas alíneas. Há́ um regime particular para alguns tipos de entidades. Não há́ aplicação deste regime a garantias prestadas por ou perante
pessoas singulares. Por outro lado, em termos do objeto, devemos olhar para o art 5º. Se houver um crédito a consumidores constituído fora da
relação de instituições públicas, essa relação de crédito ao consumo não é passível de constituição de garantias financeiras. É um regime de
garantias entre entidades profissionais e não envolvendo consumidores. Temos um problema quanto ás partes, as pessoas singulares estão
excluídas. E o resto dos aspetos? Banco pode ser beneficiário de uma garantia financeira? Sim, c) i). Mas que outros aspetos? Objeto, art.º 5. Há
uma característica das notas raras que não temos no saldo bancário: fungibilidade. Enquanto que o saldo numa conta bancária é igual no BCP ou
CGD, as notas raras em função da data podem ter um valor diferente, ou se estão amarrotadas ou não. têm de ser objetos que sejam fungíveis e
facilmente reconhecíveis.

b) Garantia prestada por uma sociedade unipessoal por quotas perante uma sociedade corretora, constituída sobre ações BCP?

• A sociedade corretora não pode conceder crédito, atua em nome de terceiro e não pode atuar em nome próprio. Já́ a sociedade de
corretagem podem conceder crédito, atua em nome de terceiro, mas também pode atuar em nome próprio. A sociedade unipessoal por
quotas apenas caberá́ no art 3º/1/f) o que significa que a contraparte tem que caber nas outras alíneas, o que se verifica visto que a
sociedade corretora é uma sociedade de investimento, art 3º/1/c)/ii).
• Sociedades corretoras: podem executar ordens por conta de outrem
• Sociedades financeiras corretoras: podem executar ordens por conta de outrem, mas também podem conceder crédito para aquisição de
instrumentos financeiros e podem executar ordens para a carteira própria
• Corretora: têm um nível de riscos muito menor. As financeiras de corretagem podem financiar por conta de terceiros.
• Quanto às partes, não temos problemas.
• Quanto ao objeto: pode haver garantias sobre ações? Art.º 5/1 b) são instrumentos financeiros e como tal, não tem problema.

O facto de ser cotada em mercado facilita a avaliação do valor. é menos comum termos a constituição de garantias financeiras sobre pequenas
sociedades que não tenham correção, porque aí pode haver dificuldade maior de avaliação. Mas à partida, os instrumentos financeiros estão
abrangidos.

c) Garantia prestada por um Banco perante uma sociedade gestora de fundos de investimento imobiliário, relativamente ao bom cumprimento
de obrigações decorrentes de contrato de empreitada?

• Objeto: uma coisa é uma obrigação emitida por uma entidade competente, e essa entidade é um valor mobiliário. O que está em causa
são obrigações decorrentes de um contrato de empreitada, são as obrigações de um empreiteiro no sentido de construir um projeto. Art.º
4: aquilo que é garantido são prestações que consistam em liquidação em numerário ou entrega de instrumentos financeiros. O art.º 3
apenas inclui os créditos pecuniários, não outro tipo de créditos decorrentes de um acordo perante o qual uma instituição de crédito
concede um crédito sobre a forma de empréstimo.
• Nunca pode haver garantias sobre as obrigações de um empreiteiro.
• A sociedade gestora de investimento imobiliário caberá́ no art 3º/c) /vi) e o Banco inclui-se na instituição de crédito. Quanto ao objeto
das garantias financeiras, temos que ver o art 5º. Mas, aqui nem temos qualquer informação sobre o objeto da garantia, assim há́ que
ver o art 4º. O tipo de obrigações que podem estar em causa é limitativo, isto não se inclui neste artigo.

d)Garantia prestada pela Portugal Telecom, SGPS perante a EDP, constituída sobre saldo de depósito bancário?

• Art.º 5/1 a) o objeto está certo. Aqui, o objeto é um saldo disponível em conta bancária, o que significa que a garantia incide sobre o
direito de crédito do depositante.
• Sujeitos: uma delas tem de ser ou instituição publica ou instituição financeira, logo aqui não pode ser. Aplicamos art.º 6 CSC.

e) Garantia prestada pela Parpública relativo a créditos por esta detidos sobre a TAP?

• Sujeitos: art.º 3 Parpública é instituição pública gestora de participações sociais detidas pelo estado
• TAP: capital maioritariamente público, logo 3/1 a) pode ser prestado a favor dessas pessoas coletivas
• Créditos: temos a informação de quem presta a garantia, mas não de quem é o beneficiário da garantia.
• Temos um direito de crédito. Quais os requisitos que este diploma enuncia para que os direitos de crédito sejam objeto de
garantia financeira cobertos por este diploma? Crédito pecuniário – aqui sim mas a Parpública não é uma instituição de crédito!
Logo não cabe no 5/1 c).

Temos sempre de analisar:


• Partes
• Objeto
• Disposição física sobre o objeto garantido: art.º 6 a garantia deve implicar o desapossamento. Na atua realidade do sistema bancário,
a maior parte das transferências dos fundos ocorrem por via digital. Os sistemas normais das operações de pagamento têm que ver
com transferências que se processam a débito na conta do transmitente e crédito na conta do beneficiário, não envolvendo como tal
coisas corpóreas. Esta constituição de resto aplica-se também aos valores mobiliários escriturais, na medida em que nesse caso, a
sua incorporação é feita num registo em conta a e a sua transmissão é feita por créditos na conta do adquirente e débitos na conta
do alienante. Quando se fala em posse, é a apropriação física de uma coisa corpórea. Temos de fazer uma adaptação dos sistemas
jurídicos aqui presentes para poder compreender e aplicar este regime. é a única maneira de darmos o sentido efetivo. /2: quando
estamos perante numerário, o que interessa é o registo do penhor no saldo em conta. deve estar na conta empenhada, deve estar
registada a existência de penhor. Essa e a maneira técnica de haver este desapossamento. O que é totalmente contrário ao regime
de 1949. A única maneira é fazer um registo em conta. se formos aos instrumentos financeiros: há que distinguir, se são os
instrumentos financeiros titulados ou escriturais. Titulados: suporte em papel, tinha de haver entrega dos instrumentos financeiros
ao beneficiário da garantia; ou escriturais: tem de haver mecanismo equivalente, o registo em conta. /3. O que é o equivalente do
desapossamento quando falamos dos créditos sobre terceiros? O legislador basta-se pelo contrato. no /2 podemos dizer que é o
equivalente jurídico do desapossamento. Mas no /3 nem é isso. quando dizemos que o contrato provoca o desapossamento, o que é
isto? Uma ficção jurídica, é como se fosse. Não há posse de direitos. O efeito é suficiente para o contrato, o que é o mesmo dizer
que não é necessária posse.
• Quanto à prova da garantia: deve poder ser suscetível de prova por documento escrito (incluindo informático) – art.º 7. Saber o que
é documento escrito: qualquer registo eletrónico em suporte duradouro é prova de documento escrito.

Garantias financeiras

Tínhamos falado sobre o regime jurídico vigente na lei 105/2004. Sempre que estivermos a verificar se há́ ou não aplicação deste regime contido
no DL 105/2004, temos que ver quais as partes, qual o objeto pelo qual recai a garantia, se há́ ou não apropriação física sobre o objeto garantido,
sendo que a garantia deve implicar desapossamento e deve ser suscetível de prova por documento escrito.
É evidente que quanto à questão do desapossessamento estamos a falar de uma adaptação do conceito clássico de posse, estamos sempre aqui a
falar sobre coisas incorpóreas (dinheiro, valores mobiliários) e, desse ponto de vista, pode esse desapossessamento ser traduzido através de um
registo informático, de uma transmissão entre contas e não propriamente envolvendo uma posse tangível como estudámos em direitos reais. Por
outro lado, é importante referir que uma extensão da diretiva e do regime das garantias financeiras respeita à possibilidade de constituir garantias
financeiras sobre créditos. E, portanto, essa possibilidade passou a ser admitida a partir de 2011 em Portugal (DL n.º 105/2004).

Existem duas modalidades fundamentais de garantias financeiras:

1. Penhor financeiro;
2. Alienação fiduciária em garantia.

Penhor Financeiro

Caso: Se for constituído penhor financeiro sobre ações a garantir mútuo bancário. Pode o banco beneficiário do penhor alienar as ações
empenhadas?

O beneficiário do penhor é um banco. O credor pignoratício pode alienar as ações empenhadas? Art.º 9/2 sim pode alienar. Este art.º 9 é
emblemático no regime das garantias financeiras. Mas antes, ir ao 9/1: a partir daqui, há 2 requisitos para poder haver poder de disposição do bem
empenhado:
• Que não esteja em causa crédito sobre terceiros
• Depende de estará consagrado no contrato

Muitas vezes, não está.

O artigo 9º/1 diz-nos “O contrato de penhor financeiro pode conferir ao beneficiário da garantia o direito de disposição sobre o objeto desta,
salvo no caso de créditos sobre terceiros.” Esta é uma regra paradigmática no regime da garantia financeira. Aqui não estamos na presença de
consumidores e portanto, não há́ pessoas físicas envolvidas, mas há́ uma preocupação muito vincada de protecção do beneficiário da garantia, que
é como quem diz do credor - esta preocupação vai ao ponto de se permitir a alienação por parte de quem não é titular de ativos (há́ legitimidade,
mas não há́ titularidade relativamente à disposição dos bens empenhados).

Perante uma hipótese destas, a resposta é “sim pode” ou “sim se”? “Sim, se”, isto tem que ver com requisitos a observar previamente para que este
direito de alienação possa ser exercido. O requisito em causa é que esteja previsto no contrato de penhor financeiro. Podemos ter contratos de
penhor financeiro que acolham esta permissão e outros que não acolham a permissão, e portanto, não é um direito automaticamente decorrente da
lei, é necessário haver uma previsão contratual direta para que surja esta possibilidade de alienação das ações. Se o contrato nada dispuser, a esse
propósito, não há́ direito de alienação das ações empenhadas.

Quais as consequências do direito de disposição? Artigo 10º/1. Porque é que pode haver interesse em vender o ativo enquanto ele está empenhado?
Estamos a falar sobretudo relativamente a instrumentos financeiros, que têm uma volatilidade - há́ períodos de depreciação e períodos de
apreciação.

• Momento A - constituído um penhor financeiro sobre determinadas ações


• Momento B - depois da constituição do penhor financeiro, as ações desvalorizam-se, em princípio, não há́ vantagem em fazer a alienação
das ações.

A hipótese está sobretudo pensada para os casos em que os instrumentos financeiros (ou ações) valorizam.
Se quando foi constituído o penhor valia 1, e de repente passa a valer 1,5 quer dizer que podemos vendar a 1,5 e esperar para o momento em que
as ações voltem a descer para depois comprá- las outra vez mais baratas e devolvê-las ao devedor.
E portanto, esta hipótese é bastante vantajosa para o credor, na perspetiva de uma gestão das garantias - é o aproveitamento de períodos em que
haja uma valorização dos ativos empenhados, para vender quando estão em alta e comprar quando estão em baixa, e desta maneira haver um ganho
financeiro na pendência do contrato de garantia financeira. O ponto essencial é que os ativos empenhados podem ter valorizações que podem ser
aproveitadas pelo credor, ou seja, faz com que o credor possa beneficiar de valorizações dos ativos empenhados. A segunda nota a fazer é que
pode ou não estar no contrato, e estando no contrato o credor não é obrigado a alienar as ações - é uma faculdade/opção/direito que se inscreve na
esfera do credor, mas que pode não ser exercido. O penhor não envolve uma transmissão da propriedade para o beneficiário e aqui é que se
distingue o penhor financeiro da alienação fiduciária em garantia, ou seja, não há́ transmissão de titularidade com a constituição da garantia, há́
sim uma atribuição de legitimidade se o contrato o previr para a alienação.

Não há transmissão do bem empenhado, mas pode haver poderes de disposição sobre o bem empenhado. É um caso de legitimidade sem
titularidade. O credor pode vender o bem e não é titular do mesmo. quando é que isso faz sentido do ponto de vista económico? Vamos supor que
o objeto da garantia é uma farmacêutica que tem a sua cotação a 5€ no momento em que a garantia é segura. De repente, essa farmacêutica anuncia
que tem uma vacina covid prestes a ser licenciada. A cotação salta dos 5 para os 20€ por ação. O que acontece aqui? Se uma instituição for titular
de um penhor sobre as ações de 5, ao vender a preço de 20€, está a consumar um ganho muito grande. Qual a consequência? Vai ter de repor o
objeto da garantia. Se essa farmacêutica licencia e depois vende, o objeto de 20 pode não ser interessante se houver a previsão de continuar a
valorizar o valor das ações. Mas vamos supor que há defeitos na vacina e não venha a ser licenciada e por baixar para menos de 5. Pode haver
valorização de 20, mas ela é transitória. O que pode fazer o beneficiário? Vende em alta e depois recompra em baixa.

Quando é constituída a garantia vale 5. Depois vai valorizar e chega aos 10. Se eu vender a 10, depois vou ter de recomprar. Se pensar que é um
movimento de subida transitório e depois vai descer para 3, é muito interessante pra o credor pignoratício fazer a disposição dos bens quando está
em alta e depois recompra quando está em baixa. Mas não há risco? Há, mas isso faz parte da análise financeira por parte do beneficiário da
garantia.

Caso: Sendo constituído penhor financeiro sobre ações a garantir mútuo bancário. Quid júris se o credor pignoratício alienar as ações
empenhadas e entrar em insolvência antes de as substituir por garantia equivalente?

Art.º 10. Se o penhor incidir sobre dinheiro, não há problemas de avaliação. Se incidir sobre créditos, pode haver problemas. Percebemos que há
o dever de repor o equivalente. Mas quando o beneficiário da garantia exerce o direito de disposição e entra em liquidação, quais as consequências?
Há uma inversão de posições, o que significa que o credor pignoratício teria de apresentar uma prestação de crédito. O direito de disposição deve
ser contratualmente consagrado. Há um risco que não é despiciendo para o devedor no contrato de garantia. Como acautelamos este risco? É um
risco que corre não para o credor, mas que há uma inversão de posições. Seria um risco para o devedor.

O que está em causa é um regime transversal aplicável sempre que há constituição de garantias sobre instrumentos financeiros e a previsão da sua
reutilização. Estamos perante um regime mais transversal. O que está em causa são restrições para o direito de reutilização até mais amplas do que
aquelas que decorrem do âmbito do dl 105/2008. Ao abrigo do artigo 9º há́ uma utilização da faculdade de disposição, as ações são alienadas e
depois o próprio credor pignoratício entra em falência. Temos uma inversão de posições, aquele que era devedor passa a ser credor em relação às
ações que foram transmitidas e depois será́ apurado qual o maior crédito em sede de processo de reclamações de crédito.

É muito importante este aspeto: o risco que corre o devedor ao entrar num contrato de garantia financeira com a faculdade de disposição - já́ não
estamos a falar do risco de credor, é o risco de devedor, é um novo risco de crédito que daqui emerge do art 9º.

Esse risco tem levado a muita retracção nesta faculdade e isto tornou-se particularmente patente no caso da falência da Lehman Brothers, que
quando entrou em insolvência tinha transmitido diversas ações sobre as quais incidia penhor financeiro e, portanto, isto teve um grande impacto
na dificuldade de reaquisição dos valores mobiliários.

Esta mesma circunstância levou a uma intervenção legislativa europeia, a restringir os casos de transferência de titularidade, dizendo que essa
transferência de titularidade só́ pode ocorrer quando há́ uma informação escrita à contraparte (as partes percebem o que é que estão a contratar), e
quando haja um consentimento prévio, expresso de que pode haver o direito de disposição nos termos do artigo 9º do DL 105/2004. Há́ um apelo
a uma vontade esclarecida aquando da celebração destes acordos de garantia financeira.

Caso: Se for constituído penhor financeiro sobre ações a garantir mútuo bancário. Pode o credor pignoratício executar o penhor e fazer seus os
instrumentos financeiros empenhados?

Art.º 11/1 pode o beneficiário proceder à execução, fazendo seu o penhor. Mas isto não colide com a proibição do pacto comissório? Art.º 11/2 o
direito é de princípio hostil áquilo que seja a justiça privada, a execução das garantias extrajudicial. Na prática contratual, o modo de obviar esta
objeção é de estabelecer que o penhor é formado, mas apenas pode ser executado na medida do montante da dívida subjacente à data do vencimento
da mesma. Essa convenção é o que se designa por pacto marciano, que é admissível à luz do direito português. O que está em causa no penhor
financeiro não é um regime contraditório coma contradição do pacto comissório, porque traduz um regime que é colado ao pacto marciano, imposto
por lei, diz que apenas há execução na medida do montante das obrigações financeiras acordadas.

Podemos ter acordos de garantia financeira em que não haja possibilidade de execução do penhor. Tem de haver acordo de execução e acordo
sobre a avaliação do bem executado. Se falhar o acordo sobre os termos do bem executado, então essa regulação convencional é ineficaz e o penhor
não pode ser executado.

Vamos supor que há́ penhor financeiro e depois há́ incumprimento da obrigação garantida: Aqui é um problema também de risco do credor, foi
constituído um penhor financeiros e afinal, não há́ cumprimento da obrigação. O credor pignoratício pode executar o penhor e fazer seus os
instrumentos financeiros empenhados? Artigo 11º. Como é que este regime resolve de modo equilibrado o problema da proibição de pacto
comissório? Artigo 11/º2. O fundamento da proibição do pacto comissório é de uma apropriação em excesso por parte do credor, ora esse risco é
neutralizado no nº2 do art 11º. Ou seja, o que é que está aqui em causa? Está aqui em causa um pacto marciano. Quando a condição de execução
direta de uma garantia é a restituição daquilo que for o excedente em benefício do executado, então aqui existe não um pacto comissório, mas sim
um pacto marciano. De novo uma regra importante de favorecimento do credor, de novo uma permissão sujeita a acordo das partes e que esse
acordo preveja a restituição em excesso por parte do credor beneficiário da garantia.

Caso: No contrato de constituição de penhor financeiro pode prever-se outros eventos a desencadear o vencimento antecipado, além do
incumprimento da obrigação garantida?

Artigo 12º + Artigo 20º. É muito comum haver em contratos de garantia financeira um catálogo muito extenso de factos que determinam o
incumprimento, o que é totalmente permitido ao abrigo do artigo 12º. Art.º 12 events of default – partes atribuem um significado contratual
equiparado ao do incumprimento. Que tipo de situações podem traduzir o risco do incumprimento? Cross-default. A clausula é aquela que equipara
incumprimentos noutros contratos relevantes ao incumprimento. Outros casos: prejuízos ou eventos de força maior que signifiquem a diminuição
da garantia patrimonial para o credor. E.: condenação penal do principal acionista e presidente da administração da empresa, isso pode ser
equiparado também. A lei diz.: qualquer facto a que as partes atribuam efeito análogo.
Penhor financeiro

Close-out netting: compensação operada a partir do vencimento antecipado da obrigação garantida (art.º 12). Tal não é prejudicado por processo
de saneamento ou insolvência, art.º 20.

Caso: Pode um banco efetuar contactos com os clientes com prestações bancárias em mora às 7h e às 23h, para assegurar maior eficácia dos
contactos efetuados? Deve haver aqui correcção e proporcionalidade de evitar tons agressivos e intimidatórios.

Caso: Um cliente integrado no PERSI pode ver resolvido o seu contrato de crédito com a instituição de crédito? Resolução: Não, enquanto está
pendente não pode haver resolução, ações judiciais, transmissão de crédito e cobrança de comissões bancárias por renegociação do contrato de
crédito. Ou seja, na pendência do PERSI, as instituições não podem:

• Resolver o contrato com base em incumprimento;


• Intentar ações judiciais para a cobrança do crédito, embora possam ser utilizados procedimentos cautelares;
• Ceder crédito ou ceder posição contratual, salvo se a outra instituição de crédito ou titularização do crédito;
• Cobrar comissões bancárias por renegociação do contrato de crédito.

Causas de extinção obrigação do PERSI:


• O pagamento integral dos montantes em mora ou a extinção, por outro motivo, da obrigação em causa;
• O acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento;
• A declaração de insolvência do cliente bancário;
• O decurso de 90 dias subsequentes à data de integração do cliente bancário no PERSI, salvo se as partes acordarem, por escrito, na
respetiva prorrogação.

Balanço final:

O PERSI tem uma lógica muito mecanicista - o que é pena porque podia haver aqui um tratamento mais equilibrado destes procedimentos. Não
há́ distinção do perfil do cliente, o que compromete a eficácia, podíamos ter outros mecanismos equivalentes. Para além de que temos uma grande
dispersão, todos estes mecanismos (os provedores bancários internos, o mediador do crédito, a reclamação junto do Banco de Portugal, o PARI e
o PERSI) são objeto de diplomas avulsos e esta dispersão é totalmente contrária aos interesses dos clientes bancários. A balconização normativa
do direito bancário foi uma critica recorrente que fomos fazendo ao longo destas aulas e nesta matéria volta a ter todo o sentido falar aqui na falta
de uma concentração do material normativo e de um modelo verdadeiramente codificador das regras bancárias, nomeadamente aquelas que
envolvam os pequenos consumidores bancários.

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