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Contexto
Os gregos e a morte
1.A escolha de Aquiles e seu significado. O episódio célebre da descida de Odisseu ao
Hades (Odisséia, canto XI). Segundo o fantasma de Aquiles, os mortos não passam de
“fantasmas de homens fatigados”. Suas palavras: “Não tentes consolar-me da morte,
glorioso Odisseu; eu preferiria lavrar a terra a serviço de outrem, de um amo pobre, de
subsistência minguada, a reinar sobre as sombras de todos os extintos.”
2.Fustel de Coulanges e a religião do lar das populações greco-itálicas.
2.1.A ideia de que a vida após a morte poderia ser de recompensas ou de castigos
dependendo da vida presente não era uma ideia dominante. Não havia a compreensão de
que uma segunda vida correspondesse a uma mudança de morada, no caso a morada
celeste, nem tampouco a ideia da metempsicose, ou seja, a ideia de que um espírito
imortal, uma vez evadido do corpo, iria dar vida a um outro corpo, conseguiu enraizar-se
no espírito das populações greco-itálicas. Acreditou-se mesmo que nesta segunda
existência a alma ficava perto dos homens, continuando a viver na terra, junto deles.
Nascida com o corpo, a alma não se separava dele com a morte. Alma e corpo
encerravam-se juntamente no mesmo túmulo. “Na antiguidade supunha-se tão
firmemente que o homem ali vivia sepultado que nunca se deixava de, juntamente com o
homem, se enterrar os objetos os quais se julgava que viesse a ter necessidade: vestidos,
vasos, armas. Derramava-se vinho sobre o seu túmulo para lhe mitigar a sede; deixavam-
lhe alimentos para o apaziguar na fome.” (COULANGES, 1987, p.17) Sem túmulo, a
alma ficava destinada a errar, sem jamais parar, sem nunca receber os alimentos e as
oferendas de que tanto carecia. Se tornava malfazeja. “Toda a antiguidade se persuade de
que, sem sepultura, a alma vive desgraçada e que só pelo seu enterramento adquiria a
felicidade para todo o sempre.” (COULANGES, 1987, p.18) Consequência disso é que
temia-se menos a morte do que a privação de sepultura.
Dois exemplos:
Xenofonte. Helênicas, I, 7. Os generais atenienses, que após uma vitória no mar, foram
condenados à morte por terem abandonado os mortos em batalha. Eram, possivelmente,
discípulos dos filósofos e já distinguiam entre alma e corpo.
Antígona de Sófocles que, apelando às leis não-escritas, desafia decreto de seu tio
Creonte, tirano de Tebas, e sepulta com os ritos fúnebres seu irmão Polinice, morto em
batalha e condenado a jazer sem sepultura, ele que, segundo Creonte, não teria voltado à
sua pátria senão para “aniquilar o país de seus pais e os deuses de sua raça.”
2.2.O culto aos antepassados e os sacrifícios. Para o pensamento dos antigos, cada morto
era um deus e não apenas os grandes homens. Entre os mortos não havia distinção de
pessoa. Não era necessário ter sido homem virtuoso. Tanto era deus o mau como o homem
de bem. “Antes de crerem na metempsicose, que supunha existir uma distinção absoluta
entre a alma e o corpo, acreditaram na vaga e indecisa existência do ser humano, invisível
mas não imaterial, reclamando dos mortais alimento e bebidas.” (COULANGES, 1987,
p. 25) A sociedade entre vivos e mortos se baseava assim na proteção dos vivos por parte
dos mortos e pelos sacrifícios e oferendas permanentes dos vivos aos mortos. O sacrifício,
a oferta de alimento e a libação garantiam aos mortos o repouso e os atributos divinos.
“O homem ficava, então, em paz com seus mortos.” (COULANGES, 1987, p.26) Poder
sacrificar aos mortos, estar em comercio ativo com os deuses exclusivos do lar, era visto
como privilégio, fonte inclusive do direito à propriedade. Por isso, por ser privado do
convívio com os deuses, por não ter esperanças de ser relembrado e mencionado no culto
do lar, o exilado não se encontrava em melhor situação do que o condenado à pena de
morte. “Parece que o sentimento religioso do homem começou com este culto. Foi talvez
pela via da morte que o homem pela primeira vez teve a ideia do sobrenatural e quis tomar
para si mais do que lhe era legítimo esperar da sua qualidade de homem. A morte teria
sido o seu primeiro mistério.” (COULANGES, 1987, p. 27)
COULANGES, Fustel. A cidade antiga. Trad. Fernando de Aguiar. São Paulo: Martins
Fontes, 1987.
ANAXIMANDRO et. al. Os pensadores originários. Trad. Emmanuel Carneiro leão.
Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2005.
PLATÃO. O banquete, Apologia de Sócrates. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém, PA:
EDUFPA, 2001.
________. Fédon. Trad. Carlos Alberto Nunes. Belém, PA: EDUFPA, 2011.