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Em espanhol esse conceito é traduzido como “actividad rectora”. Em português esse conceito é traduzido por
“atividade principal” ou como “atividade dominante”. (FACCI, 2004)
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Cada época consiste em dois períodos regularmente ligados entre si. Tem início
como período em que predomina a assimilação dos objetivos, dos motivos e das
normas da atividade e essa etapa prepara para a passagem ao segundo período, no
qual ocorrem a assimilação dos procedimentos de ação com o objeto e a formação
de possibilidades técnicas e operacionais (FACCI, 2004, p.72).
criança, não é instintiva, mas sim atividade objetiva. Para dominar o mundo que a cerca, a
criança se esforça para agir.
A brincadeira então se transforma num processo dominante, por meio do qual a
criança pode se apropriar não somente dos objetos materiais e simbólicos acessíveis a ela, mas
também dos objetos com os quais os adultos operam, mas que ela, criança, ainda não é capaz
de operar. Portanto podemos afirmar que, durante o desenvolvimento da consciência que a
criança constrói sobre o mundo, a relação que ela tenta estabelecer com as coisas que lhes são
acessíveis bem como com alguns conteúdos dos adultos, é uma relação ativa (LEONTIEV,
1988a).
Além de excluir a idéia de passividade e nos remeter à idéia da atividade no ato da
brincadeira, Vigotski (2008) nos traz a concepção de satisfação de algo na criança, por
intermédio do brinquedo. Nas palavras do autor
Esta noção é corroborada por Leontiev (1988a) e este algo que é narrado por
Vigotski (1998) é caracterizado pelo autor como a conciliação entre uma vontade irrealizável
e a realização desta vontade, por meio da brincadeira. Assim, nas palavras dele, verificamos
que
[...] numa criança com mais de três anos, emergem tendências específicas e
contraditórias, de um modo diferente, por um lado, surge uma serie de necessidades
e de desejos não-realizáveis imediatamente, mas que, ao mesmo tempo, não se
extinguem como desejos; por outro lado, conserva-se, quase por completo, a
tendência para a realização imediata dos desejos. É disso que surge a brincadeira,
que deve ser sempre entendida como uma realização imaginaria e ilusória de desejos
irrealizáveis (VIGOTSKI, 2008, p.25).
Assim a atividade lúdica então contempla um lado imaginário, que pode ser
constatado na significação que a criança dá para os objetos. Há objetos, imagens e ações reais
na brincadeira, mas a criança age substituindo o objeto, por exemplo, um pedaço de madeira
que se torna um cavalo. Isso indica que há, na brincadeira, algo de imaginário. Cumpre
ressaltar, que não é a imaginação que determina a ação da brincadeira, mas ao contrário, as
condições da ação que dão origem à imaginação, por torná-la necessária. Assim, como todas
as funções da consciência, a imaginação surge da ação (LEONTIEV, 1988a; VIGOTSKI,
2008).
A atividade lúdica pode ser assim realizada, pois seu objetivo não é o resultado. Seu
objetivo está no próprio processo da atividade. Por exemplo, a criança quer dirigir um carro,
mas sabe que não pode fazê-lo. Ao brincar, ela pode realizar seu desejo com um carrinho de
brinquedo ou mesmo um pedaço de madeira, que faz de conta que é um carro. Deste modo, a
brincadeira não é uma atividade produtiva, pois seu alvo não está no resultado, mas na ação
em si mesma (LEONTIEV, 1988a).
É por intermédio da brincadeira então, que a criança vai realizar suas vontades
irrealizáveis. Isto ocorre, pois só no brinquedo podemos substituir as operações e condições
do objeto, preservando o próprio conteúdo da ação. No brinquedo, os objetos perdem algumas
características, “a criança vê um objeto, mas age de maneira diferente em relação áquilo que
vê. Assim, é alcançada uma condição em que a criança começa a agir independentemente
daquilo que vê” (VIGOTSKI, 1998, p.127, grifos do autor). Deste modo, a criança aprende a
se comportar não somente pela percepção imediata do objeto, mas também pelo significado
da ação, já que o significado toma maior importância, e os objetos são colocados numa
posição subordinada.
Neste momento constatamos uma característica importante da atividade lúdica. Em
boa parte das ações, o significado e o sentido coincidem, porém o mesmo não podemos
afirmar sobre as ações na brincadeira. Utilizando o exemplo acima, o pedaço de madeira
ainda retém seu significado, mas no brincar as operações com ele fazem parte de uma ação
distinta deste significado. Um sentido diferente lhe é atribuído: o pedaço de madeira adquire o
sentido de um cavalo. Esta ruptura entre sentido e significado no processo da brincadeira
surge no próprio brincar, não é um pré-requisito da brincadeira.
Elkonin (1987a) aponta neste mesmo sentido quando diz que
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Casi todos los investigadores que estudiaron el juego señalan que es la actividad más
libre del niño preescolar. Este carácter libre se expresa no solo en que el niño elige el
tema del juego, sino también en que sus acciones con los objetos incluidos en él se
diferencian del uso habitual que se les da corrientemente por la marcada
independencia con respecto al destino concreto de esos objetos y están determinadas
por los significados que el niño mismo les otorga en el juego. (ELKONIN, 1987a,
p.85-86)
mudança nos jogos se dá em função das diferenças nas motivações das brincadeiras.
Inicialmente a atividade lúdica visava o domínio dos objetos do mundo. Todavia as relações
com outros participantes se tornam evidentes no jogo, ao passo que estes participantes
tornam-se também conteúdo da atividade lúdica (LEONTIEV, 1988a). Neste momento,
Rossler (2006) afirma que os jogos de grupos tornam-se mais desejáveis e o elemento
determinante passa a ser as relações sociais da própria brincadeira, ou seja, as relações dos
jogadores entre si.
Os jogos com regras são de grande interesse psicológico, pois determinam o
desenvolvimento de traços importantes no psiquismo da criança. Neles, está em jogo a
capacidade da criança de controlar o seu comportamento visando um propósito definido.
Ressaltamos que todos os jogos têm regras, sejam implícitas ou explicitas. No caso dos jogos
de enredo, com regras implícitas, quando a criança brinca de ser professora, mesmo não
verbalizando as regras, ela segue os comportamentos aos quais atribui à professora. Assim,
utiliza como fundamento as relações sociais nas quais está inserida.
Há ainda duas características apontadas por Leontiev (1988a) e por Rossler (2006)
que se referem ao desenvolvimento da personalidade da criança por meio dos jogos com
regras explicitas, quais sejam: 1) estas brincadeiras possibilitam um elemento de auto-
avaliação, já que pela primeira vez surge, na criança, o momento de uma auto-avaliação
referente ao seu desempenho, destreza, habilidades, entre outros; 2) neste processo ocorre a
inserção de um elemento moral na brincadeira. Por exemplo, quando algumas brincadeiras
exigem dos participantes livrar os colegas de castigos internos à brincadeira. Como nas
atividades lúdicas descritas por Leontiev (1988a) de ‘pegador congelado’, em que o
participante, se for pego, deve permanecer imóvel, até que um colega o salve e ele possa
voltar a se movimentar.
Considerando o exposto, constatamos que a atividade lúdica desempenha um papel
fundamental na continuidade da inserção da criança no mundo material e simbólico das
produções humanas, ou seja, das objetivações genéricas em-si, já que esta esfera se constitui
no ponto de partida do processo de formação de todo e qualquer indivíduo. Do mesmo modo,
ao inserir a criança no gênero humano, a brincadeira também possibilita o desenvolvimento
de faculdades e aptidões psíquicas fundamentais para a realização de sua vida e desta maneira
para a constituição da individualidade e do gênero humano, bem como da sociedade, que
realiza a mediação entre o individuo e o gênero.
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Referências
VIGOTSKI, L.S. A brincadeira e o seu papel no desenvolvimento psíquico da criança. Revista Virtual
de Gestão de Iniciativas Sociais. Junho, 2008, pp 23-36.
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