Você está na página 1de 31

DESENVOLVIMENTO

INFANTIL
Prof. Dr. Rodrigo Lima Nunes
OBJETIVO

 Compreender as nuances referentes ao


desenvolvimento infantil tendo em vista os aspectos
histórico-sociais orientadores da relação entre
criança-cultura e, consequentemente, aprendizagem-
desenvolvimento psíquico.
Concepção de desenvolvimento humano

 Nós não nascemos já com as


características que definem o ser humano.
 Para que nos constituamos enquanto seres
humanos, exige-se a intervenção dos seres
humanos já constituídos com essas
características, ou seja, os adultos.
Como assim?
 Exemplo: O Enigma de Kaspar Hauser:
 É um jovem que, nascido em 1812, fora
trancado a vida inteira num cativeiro,
desconhecendo toda a existência exterior. Em
1828, foi levado ao Quartel de Nuremberg. O
homem que o manteve preso apenas lhe dava
alimentação e tentou ensiná-lo a escrever
dando-lhe papel e tinta, conseguindo que ele
viesse a escrever o próprio nome. Quando
saiu do cativeiro, o jovem Kaspar sequer
conseguia falar ou andar.
O homem, portanto, não nasce homem, Ele forma-se homem. Ele não
nasce sabendo produzir-se como homem. Ele necessita aprender a ser
homem, precisa aprender a produzir sua própria existência.
Portanto, a produção do homem é, ao mesmo tempo, a formação do
homem, isto é, um processo educativo. A origem da educação coincide,
então com a origem do homem mesmo.
O homem é, pois, um produto da educação. Portanto, é pela mediação
dos adultos que num tempo surpreendentemente muito curto a
criança se apropria das forças essenciais humanas objetivadas pela
humanidade tornando-se, assim, um ser revestido das características
humanas incorporadas à sociedade na qual ele nasceu.
Dermeval Saviani (2013)
Concepção de infância: A criança como um ser situado

A criança, primeiramente, é um corpo entre outros corpos, com determinadas


características.
Segundo, ela é um corpo biológico, uma condição necessária e indispensável de
possibilidade da existência humana.
Terceiro: Ela é um corpo psicológico, ou seja, dotada de um mundo interior
bastante complexo. A aprendizagem ocorre a partir das vivências internas. Ela é,
no fundo, a incorporação ao eu anterior de elementos assimilados pelo
ambiente.
Quarto: Ela é um corpo que vive em um uma determinada cultura. Sendo assim,
nasce em um determinado contexto espacial e temporal, construído pelo
homem. Este espaço está cheio de crenças, costumes, histórias, estrutura
específica, que influência, diretamente, seu desenvolvimento.
Então, ela se apresenta enquanto um ser empírico, o que corresponde ao seu
primeiro aspecto.
A criança e a Liberdade
 Contudo, a criança reage à sua situação, ou seja, reage
pessoalmente.
 Alguns elementos da situação são aceitos naturalmente
por ela; outros, ela os rejeita sumariamente; e a outros,
ela procura transformar, isso mostra que ela é capaz de
superar os condicionamentos de sua situação.
 Ela revela-se capaz de intervir pessoalmente na situação
para aceitar, rejeitar ou transformar. A criança é, então,
um ser autônomo; um ser “livre”;
 Sendo assim, encontramos um segundo aspecto: o
aspecto pessoal.
A criança como um ser consciente
 Existe, pois, um terceiro aspecto na estrutura
do homem: o aspecto intelectual.
 Por esse aspecto o homem ou a criança,
intenciona transcender à situação e os pontos
de vistas individuais, para julgar de um modo
objetivo e absoluta (verdadeiro). É esse aspecto
que possibilita a comunicação.
Em síntese...
 Em relação a realidade humana, tornam-se patentes
seus elementos fundamentais. São eles: a situação
(empiria), a liberdade e a consciência.
 Portanto, faz-se necessário saber acerca dessa
estrutura humana para que seja possível uma
atuação pedagógica que, de fato, promova processos
educativos.
A periodização do desenvolvimento
psicológico da criança

Os períodos e as atividades
dominantes
 Aquilo que se apresenta enquanto especificamente humano não está
dado ao homem em seu aparato biológico.
 As funções psíquicas de caráter superior (especificamente humanas)
se apresentam como resultado do processo de objetivação dos
indivíduos por meio das apropriações vivenciadas a partir da
mediação das relações sociais, linguagem e da atividade
especificamente humana.
 Esse processo de desenvolvimento humano, no qual o homem produz
e reproduz a cultura humana a partir de sua atividade, se dá de forma
gradativa, durante todo o decorrer de sua vida, sendo que em cada
estágio há a dominância de uma determinada atividade que representa
o modo pelo qual o indivíduo se relaciona com o mundo, tendo em
vista suprir suas necessidades.
 Sendo assim, em cada estágio de desenvolvimento do ser humano há
a dominância de determinadas atividades, que podem ser
denominadas enquanto atividades principais.
 Ao tratarmos da atividade principal, não devemos considerá-la
enquanto a atividade que a criança mais realiza em seu dia-a-dia, mas
aquela em que ocorrem as mudanças mais importantes nos processos
psíquicos e nos traços psicológicos da personalidade dos indivíduos,
em certo estágio de seu desenvolvimento.
 Sendo assim, para que uma atividade seja considerada a principal em
determinado estágio de desenvolvimento, ela precisa apresentar três
atributos fundamentais:
 1. Ela é a atividade em cuja forma surgem outros tipos de atividade e
dentro da qual eles são diferenciados. [...]
 2. A atividade principal é aquela na qual processos psíquicos
particulares tomam forma ou são reorganizados. Os processos infantis
da imaginação ativa, por exemplo, são inicialmente moldados no
brinquedo e os processos de pensamento abstrato, nos estudos.
 3. A atividade principal é a atividade da qual dependem, de forma
íntima, as principais mudanças psicológicas na personalidade infantil,
observadas em um certo período de desenvolvimento.
 É por meio dessas atividades consideradas principais,
portanto, que as crianças se relacionam com o mundo,
produzindo e reproduzindo as condições necessárias à
constituição de sua individualidade, acarretando assim, em
cada estágio de seu desenvolvimento singular, na criação de
necessidades específicas em termos psíquicos.
 Nesse caminho, o desenvolvimento psicológico dos indivíduos
da educação infantil, têm por atividades principais:
Comunicação emocional direta; Atividade objetal
manipulatória; brincadeira de papéis sociais;
Primeiro ano de vida - A comunicação
emocional direta (do bebê com o adulto)
 A comunicação emocional direta dos bebês com os adultos é a atividade
principal desde as primeiras semanas de vida até mais ou menos um ano,
constituindo-se como base para a formação de ações sensório motoras de
manipulação.
 Durante suas relações, o bebê utiliza vários recursos para se comunicar
com os adultos, como o choro, por exemplo, para demonstrar as
sensações que está tendo e o sorriso para buscar uma forma de
comunicação social.
 O sentimento de amor filial, a simpatia por outras pessoas, o afeto
amistoso, entre outros aspectos presentes na relação do bebê com outras
crianças e o adulto, são enriquecidos e transformados no processo
evolutivo da criança, tornando-se a base indispensável para o surgimento
de sentimentos sociais mais complexos.
 Já no primeiro ano de vida, a conduta da criança começa a reestruturar-se
e cada vez mais aparecem processos de comportamento em virtude das
condições sociais e da influência educativa das pessoas que a rodeiam.
 São os adultos que cuidam do bebê, e o caminho por intermédio dos
adultos é a via principal de atividade da criança nessa idade.
Primeiro ano de vida - A comunicação
emocional direta (do bebê com o adulto)
 Vida uterina: O sistema orgânico está sendo formado, e desde o início o seu funcionamento está
submetido às condições sociais da gestante, expressão do movimento dialético entre organismo e
cultura, ou entre o feto e as condições de vida.
 Período pós-natal (até ~ 45 dias): Período de passividade – Criança em dependência absoluta do
adulto, Tem como marca a atividade reflexa; Mas, é a partir do nascimento que se produz a possibilidade
da formação ao longo dos anos e por meio da vida social, de uma consciência individual e autônoma;
Vida psíquica rudimentar; Desenvolvimento das sensações e da atividade sensório-motora;
 Atividade de comunicação direta: Transformações que ocorrem, principalmente, nos processos
sensoriais, de motricidade e de percepção; A vivência da criança está vinculada à qualidade das relações
organizadas e oportunizadas pelo adulto e promotoras do desenvolvimento global do bebê; Afeto e
reações emocionais como motor do desenvolvimento psíquico.
 Primeiro ponto: contradição entre total dependência e falta da linguagem articulada = comunicação
emocional;
 Segundo ponto: Atividade antecipadora do adulto = o adulto se comunica com o bebê quando esse não
é capaz de se comunicar = motor do des. Da linguagem e pensamento (fala, gestos, objetos e
movimentos.
 Terceiro ponto: Complexo de animação = primeiras reações emocionais dirigidas ao adulto
(concentração no adulto, sorrido, exclamações e excitação motora geral).
Primeira Infância: Atividade Objetal Manipulatória
 A partir desta atividade tem lugar a assimilação dos procedimentos
elaborados socialmente de ação com os objetos e, para que ocorra essa
assimilação, é necessário que os adultos mostrem essas ações às
crianças.
 A comunicação emocional dá lugar a uma colaboração prática. Por meio
da linguagem, a criança mantém contato com o adulto e aprende a
manipular os objetos criados pelos homens, organizando a comunicação
e a colaboração com os adultos.
 A primeira função da linguagem é a comunicação, um meio de
expressão e compreensão entre os homens, que permite o intercâmbio
social.
 Até mais ou menos os 18 meses, a criança ainda não consegue
descobrir as funções simbólicas da linguagem, que é uma operação
intelectual consciente e altamente complexa.
 Por volta dos dois anos, a criança apresenta grande evolução da
linguagem, dando início a uma forma totalmente nova de
comportamento, exclusivamente humana. Inicia-se a formação da
consciência e a diferenciação do “eu” infantil.
Primeira Infância: Atividade Objetal Manipulatória
 Primeira infância (1 – 3 anos): Fator propulsor = capacidade locomotora.
 A qualidade das ações com os objetos é dependente da forma como o adulto irá
promover as relações da crianças com os objetos; maior acuidade óculo-manual;
o adulto deixa de ser o centro da atenção, passando aos objetos que agora
podem ser explorados por elas “livremente”.
 Situação social: Dependência da situação concreto-visual; “para a criança nesta
idade, tomar consciência n]ao equivale a perceber e elaborar o percebido com a
ajuda da atenção, da memória e do pensamento. Essas funções não estão
diferenciadas e atuam na consciência integralmente subordinadas à percepção”.
Primazia da função “percepção”.
 Entrecruzamento entre linguagem e pensamento = “a convergência entre
pensamento e fala constitui o momento mais importante no desenvolvimento de
um indivíduo e é exatamente essa conexão que coloca o pensamento humano
numa altura sem precedentes”.
 Mediação fundamental: Adulto disponibilizar, nomear, explicar e demonstrar a
função social dos objetos pelas diferentes formas de linguagem.
 O jogo nesse período ainda não possui sua característica fundamental enquanto
atividade guia, qual seja, a situação fictícia.
Idade pré-escolar: A brincadeira de papéis sociais
 No período pré-escolar, a atividade principal passa a ser o jogo ou a brincadeira.
 Utilizando-se dessas atividades, a criança apossa-se do mundo concreto dos
objetos humanos, por meio da reprodução das ações realizadas pelos adultos
com esses objetos.
 As brincadeiras das crianças não são instintivas e o que determina seu conteúdo
é a percepção que a criança tem do mundo dos objetos humanos.
 A criança opera com os objetos que são utilizados pelos adultos e, dessa forma,
toma consciência deles e das ações humanas realizadas com eles.
 A criança, durante o desenvolvimento dessa consciência do mundo objetivo, por
meio da brincadeira integra uma relação ativa não apenas com as coisas
diretamente acessíveis a ela, mas, também, com o mundo mais amplo, isto é, ela
se esforça para agir como um adulto.
 Ela ainda não dominou e não pode dominar as operações exigidas pelas
condições objetivas reais da ação dada, como, por exemplo, dirigir um carro,
andar de motocicleta, pilotar um avião.
 Mas, na brincadeira, na atividade lúdica, ela pode realizar essa ação e resolve a
contradição entre a necessidade de agir, por um lado, e a impossibilidade de
executar as operações exigidas pela ação, de outro.
 O principal significado do jogo de papéis é permitir que a criança
modele as relações entre as pessoas.
 O jogo é influenciado pelas atividades humanas e pelas relações entre
as pessoas e o conteúdo fundamental é o homem – a atividade dos
homens e as relações com os adultos.
 Ao mesmo tempo, ele exerce influência sobre o desenvolvimento
psíquico da criança e sobre a formação de sua personalidade, a
evolução do jogo prepara para a transição para uma fase nova, superior,
do desenvolvimento psíquico, a transição para um novo período
evolutivo (atividade de estudo).
 Característica: substituição do significado dos objetos; colocar-se no
papel de outro; controle de suas ações a partir dos modos de ação
adultos.
 Funções psíquicas envolvidas: memória, atenção, imaginação,
pensamento...
“o professor assume a importante tarefa de sujeito
mediador no processo de socialização das crianças,
no sentido de criar condições efetivas de
desenvolvimento na escola de educação infantil” .
Referências utilizadas para a aula:
 ABRANTES, A. A. Educação escolar e desenvolvimento humano: a literatura no contexto da educação
infantil. In: MARSIGLIA, A. C. G. (Org.). Infância e pedagogia historico-crítica. Campinas: Autores Associados,
2013.
 ARCE, A. Pedagogia da infância ou fetichismo da infância? In: DUARTE, N. (org.) Crítica ao fetichismo da
individualidade. Campinas: Autores Associados, p.129-150, 2012.
 BORONAT, M. E. El juego em la edad preescolar. La Habana (Cuba): Pueblo y Educación, 2001.
 BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Brasília: MEC, 1996.
 DUARTE, N. As pedagogias do “aprender a aprender” e algumas ilusões da assim chamada sociedade do
conhecimento. Revista Brasileira de Educação, v. 18, p. 35-40, 2001.
 DUARTE, N. “Vamos brincar de alienação?” A brincadeira de papéis sociais na sociedade alienada. In:
ARCE, A.; DUARTE, N. Brincadeira de papéis sociais na educação infantil: as contribuições de Vigotski,
Leontiev e Elkonin. São Paulo: Xamã, 2006. p. 89-97.
 ELKONIN, D. B. Psicologia do jogo. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
 FACCI, M.G.D.A Periodização do desenvolvimento psicológico individual na perspectiva de Leontiev,
Elkonin e Vigotski. Caderno Cedes, Campinas, vol.24, n. 62, p. 64-81, abril de 2004.
 SILVA, J. R. A Brincadeira na Educação Infantil (3 a 5 anos): uma experiência de pesquisa e intervenção. 2012.
171 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual
Paulista, Presidente Prudente, 2012.
 KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 2005.
 MAGALHÃES, G. M.; MARTINS, L. M. A análise histórico-cultural da atividade infantil: Teoria, pesquisa e implicações
pedagógicas para o primeiro ano de vida. In: MARSIGLIA, A. C. G. (Org.). Infância e pedagogia historico-crítica. Campinas:
Autores Associados, 2013.
 MARINO FILHO, A. Implicações psicopedagógicas da brincadeira: aprender a fazer, aprender a ser. In: VIOTTO FILHO, I. A.
TUIM; PONCE, R. de F. (Org.) Psicologia e educação: perspectivas críticas para a ação psicopedagógica. 1. ed. Birigui: Boreal
Editora, pp. 136-163, 2012.
 MARTINS, L. M.; ABRANTES, A. A.; FACCI, M. G. D. (Org.) Periodização histórico-cultural do desenvolvimento psíquico: do
nascimento à velhice. Campinas: Autores Associados, 2016.
 MUKHINA, V. Psicologia da idade pré-escolar. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
 NUNES, R. L. Atividade do jogo e desenvolvimento infantil: Implicações sociais para a construção da consciência da criança na
escola. 2013. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista,
Presidente Prudente-SP.
 PASQUALINI, J. C. A educação escolar da criança pequena na perspectiva histórico-cultural e histórico-crítica. In:
MARSIGLIA, A. C. (org.) Pedagogia histórico-crítica: 30 anos. Campinas, SP : Autores Associados, p.59-89, 2011.
 PASQUALINI, J. C. Contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a educação escolar de crianças de 0 a 6 anos:
Desenvolvimento infantil e ensino em Vigotski, Leontiev e Elkonin. 2006. Dissertação (Mestrado em educação escolar) –
Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara-SP.
 PASQUALINI, J. C.; MARTINS, L. M. A Educação Infantil em busca de identidade: análise crítica do binômio “cuidar-educar”
e da perspectiva anti-escolar em Educação Infantil. Psic. da Ed., São Paulo, 27, 2º sem. de 2008, pp. 71-100.
 PASQUALINI, J. C. Periodização do desenvolvimento psíquico à luz da escola de Vigotski: A teoria histórico-cultural do
desenvolvimento infantil e suas implicações pedagógicas. In: MARSIGLIA, A. C. G. (Org.). Infância e pedagogia historico-
crítica. Campinas: Autores Associados, 2013.
 SAVIANI, D. Infância e Pedagogia Histórico-crítica. In: MARSIGLIA, A. C. G. (Org.). Infância e pedagogia historico-crítica.
Campinas: Autores Associados, 2013.

Você também pode gostar