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O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA DAS

13 COLÔNIAS
INGLESAS NA AMÉRICA DO NORTE

Inglaterra: presença na América do Norte. A presença inglesa na América do


Norte data de 1585, quando Sir Walter Raleigh fundou a Virgínia - nome dado
em homenagem à rainha Elizabeth I (1558-1603). Porém, a efetiva ocupação
territorial, que dará origem aos Estados Unidos, ocorreu no reinado de Jaime I
(1603-1625)
A ocupação inglesa no Norte assumiu características muito diferentes das
implantadas pelo colonização ibérica.
Os ingleses fundaram na costa atlântica, ao longo dos séculos XVII e XVIII, 13
colônias divididas tradicionalmente em três grupos: colônias do Norte (New
Hampshire, Massachusetts, Connecticut e Rhode Island); colônias do Centro
(Nova York, Pensilvânia, New Jersey, Delaware) e colônias do Sul (Maryland,
Virgínia, Carolina do Norte, Carolina do Sul e Geórgia).
As duas primeiras colônias. Como em outras partes do continente, a tarefa do
povoamento da América do Norte foi entregue a particulares.
Em 1606, Jaime I concedeu uma carta-patente que autorizou a fundação da
Companhia de Virgínia, uma sociedade por ações cujos recursos foram repartidos
entre duas sociedades: a Companhia de Londres e a Companhia de Plymouth.
Por iniciativa da Companhia de Londres, em 1607, uma centena de ingleses,
chefiados por John Smith, iniciou o povoamento da Virgínia, com a fundação da
cidade de Jamestown.
Nos primeiros anos, particularmente duros, os povoadores suportavam doenças
(como o paludismo), fome e ataques indígenas. A situação só começou a
melhorar depois de 1614, quando chegou ajuda da Inglaterra. O plantio do
tabaco, então incipiente, encontrou compradores na Inglaterra a preços
favoráveis, assegurando um pequeno êxito econômico.
Porém, a data decisiva foi 1619, quando navios holandeses trouxeram os
primeiros contingentes de escravos africanos. Nesse mesmo ano, um outro
acontecimento é digno de menção: instalou-se em Jamestown a primeira
assembleia representativa da América inglesa. Esse órgão será o principal
instrumento do autogoverno e educação democrática dos habitantes. Manteve seu
vigor mesmo depois de 1624, quando a Virgínia passou a ser administrada
diretamente pela metrópole, através de um governador nomeado pelo rei.
Em 1620, um navio de pequeno porte, o Mayflower, trouxe para a América um
pequeno número de povoadores, que fundariam a colônia de Massachusetts.
Diferentemente dos aventureiros que desembarcaram com John Smith na
Virgínia, os ingleses do Mayflower eram puritanos (calvinistas) que se
transferiram para a América por motivos político-religiosos. Perseguidos pela
religião oficial - a Igreja anglicana -, os puritanos escolheram a América para
viverem segundo sua consciência religiosa. O processo inglês de cercamento de
terras também explica a transferência dos camponeses para a América. As terras
comunais, condição de sobrevivência dos camponeses pobres, começaram a
desaparecer na medida em que as grandes propriedades individuais tendiam a se
formar. O cercamento de terras foi uma forma de garantir a posse e aumentar o
aluguel da terra, ou seja, privilegiar ainda mais os proprietários. Com isso, grande
parte dos trabalhadores foi expulsa do campo. Restavam duas alternativas: a
cidade ou um lugar fora da Inglaterra.
Desse modo, as perseguições religiosas e o cercamento de terras, a partir do
século XVI e que só se completará no século XIX, são responsáveis pela
migração da população do campo para a cidade. Os excedentes de mão-de-obra,
criados por essa migração, deslocam-se ou para as cidades (êxodo rural),
tentando vida melhor, ou para as colônias inglesas na América, como forma de
recomeçar uma vida nova, sem perseguições. Enfim, como se vê, o objetivo
maior dos povoadores ingleses não era enriquecer, atitude dos ibéricos em
relação às respectivas colônias na América.

ÁREA DA COLONIZAÇÃO INGLESA NA


AMÉRICA DO NORTE
Fonte: Aquino, Rubim Santos Leão de.

História das sociedades americanas /Rubim Santos Leão de Aquino, Nivaldo Jesus
Autogoverno e tolerância religiosa. A tolerância religiosa e o autogoverno são
as duas características complementares que marcaram o povoamento inglês na
América do Norte.
Tendo experimentado na metrópole a perseguição por motivos religiosos, os que
buscaram a América tinham em mente viver de acordo com sua consciência
religiosa. Pretendiam fazer da América sua morada definitiva, ao contrário dos
portugueses e espanhóis, que encaravam sua estadia aqui como temporária e
lucrativa. Diferiam ainda num outro ponto: não vieram imbuídos da ideia
missionária que caracterizou, ao menos no início, o povoamento ibérico.
Mesmo os católicos ingleses que se instalaram em Maryland, por terem sofrido
perseguições na Inglaterra, eram favoráveis à tolerância religiosa. Lá, uma lei que
dispunha sobre assuntos religiosos (Act concerning religion), afirmava:
"... Considerando que a imposição da consciência em matéria de religião se
verificou frequentemente de perigosa consequência nas comunidades em que foi
aplicada (...) fica, pois, estabelecido (...) que nenhuma pessoa ou pessoas nesta
Província (...) que professam crer em Jesus Cristo serão doravante de modo
algum perturbados, molestados ou incomodados em sua prática religiosa nem seu
exercício da mesma nesta Província (...) nem de nenhuma maneira constrangidos
a confessar ou exercer qualquer outra religião contra seu consentimento (...)"
Outro exemplo, William Penn procurou fazer da Pensilvânia o refúgio dos
quacre. A cidade que fundou para esse fim foi batizada de Filadélfia, que
significa "cidade do amor fraternal". Teve ainda o cuidado de redigir leis -
conhecidas como Great Law - que garantiam a liberdade de escolha e de prática
religiosa, o direito de voto para os que pagassem impostos e o acesso aos cargos
eletivos e funções públicas a todos os cristãos.
Tais princípios vigoraram, em maior ou menor grau, em todas as colônias.

A relação com os indígenas. Com a chegada dos ingleses, teve início a guerra
contra os índios, que perdurou por 250 anos.
Na Virgínia, os povoadores estavam rodeados por uma federação das tribos
Powhatan, com as quais viveram em relativa paz até 1618. A partir dessa data,
com a ascensão do novo chefe Opechancano, eclode uma longa guerra que só
terminará em 1643, com a captura e execução de Opechancano.
Na Nova Inglaterra, após uma tentativa infrutífera de desalojar os ingleses, os
Pequot são finalmente derrotados em 1637, por não terem conseguido a
pretendida aliança com a tribo dos Narraganset - que permaneceram neutros
graças à influência de Roger Williams.
À medida que chegavam novos povoadores, a pressão inglesa sobre os índios
aumentava. Deixando de lado as rivalidades tribais, os indígenas uniram-se para
enfrentar a invasão dos brancos. Daí resultaram três grandes guerras: a guerra do
rei Filipe (1675-76) na Nova Inglaterra, a guerra dos Tuscarora (1711-12) na
Carolina do Norte e a guerra dos Yamasse (1714-15). Rei Filipe era o nome dado
pelos ingleses ao chefe dos Wampanoag, cujo nome verdadeiro era Metacomet.
Mas, nem todo núcleo de povoadores hostilizava os índios. Roger Williams
(Rhode Island), por exemplo, estabeleceu relações pacíficas com os Narraganset.
Na Pensilvânia, os seguidores da religião adotaram o hábito de comprar as terras
aos índios e chegaram, inclusive, a constituir um conselho partidário - isto é, com
igual número de representantes índios e brancos - para resolver os litígios.

Em Nova York, os sucessivos governadores conviveram pacificamente com os


índios da região, pois o interior era dominado pela confederação das cinco nações
da família iroquesa. Atrás do território iroquês estava o domínio francês do
Canadá - a Nova França -, cuja ameaça ao povoamento inglês era conhecida. Por
isso, o governador de Nova York, Sir Edmund Andros, cuidou para que as
relações entre índios e brancos transcorressem sem graves conflitos, resolvendo
com imparcialidade os litígios.
A amizade com os iroqueses mostrou-se muito útil quando estourou a guerra
contra os franceses: a guerra dos Sete Anos (1756-1763), que terminou com a
vitória inglesa.
Uma vez superado o perigo francês, o conflito de interesses entre índios e
ingleses tornou-se inevitável.
É de se notar que as relações entre índios e povoadores ingleses também
deixaram marcas profundas, como na colonização portuguesa, espanhola e
francesa. Isso porque o povoamento dos Estados Unidos atuais começou quando
o tráfico negreiro estava bem implantado no Atlântico. Os ingleses das cinco
colônias do sul limitaram-se a adotar a solução já existente, ou seja, a escravidão
africana, descartando a escravidão indígena. Nas colônias do norte e do centro, o
povoamento seguiu uma outra direção, que também dispensou a escravidão
indígena, como veremos. Diferentemente do que ocorreu na América ibérica, o
indígena e o negro não contaram com a proteção do trabalho missionário. Esse
fato os deixou mais fragilizados, isto é, à mercê da exploração dos brancos e, no
caso dos negros, da escravidão.
O fato, porém, de não terem sido escravizados não foi propriamente uma
vantagem para os índios. Enfrentando povoadores muito melhor equipados e
dispostos, desde o princípio, a permanecer na América, os índios foram
simplesmente dizimados.

A economia na Nova Inglaterra. Em razão das condições geográficas, as quatro


colônias do Norte desenvolveram-se com base na pequena e na média
propriedade e na policultura (milho, alfafa, centeio, cevada e frutas). Ao lado da
mão-de-obra familiar, portanto livre, empregou-se paralelamente o trabalho dos
servos por contrato (indentured servants). Tratava-se, em geral, de pessoas que,
não tendo recursos para a viagem à América, tinham suas passagens financiadas
pelos fazendeiros, em troca das quais trabalhavam, sem remuneração, por um
tempo pré-estabelecido.
Além da agricultura, expandiu-se também nas colônias do Norte a atividade
pesqueira. Em razão da costa acidentada, dotada de excelentes portos naturais e
abundante vegetação costeira, desenvolveu-se muito cedo, na Nova Inglaterra, a
construção naval. A pesca era realizada na região da Terra Nova, riquíssima em
bacalhau, arenque e cavala. Além do mais, os barcos pesqueiros dedicavam-se
ainda à captura de baleias, cujo óleo era utilizado para iluminação noturna das
casas. Paralelamente, desenvolveu-se a atividade de salgamento de peixes que,
logo depois, passaram a ser exportados.
A vocação comercial das colônias nortistas revelou-se precocemente. No
essencial, as relações mercantis eram mantidas com as Antilhas e com a África,
através de um círculo comercial conhecido como comércio triangular.
Nesse comércio nota-se uma peculiaridade: a Nova Inglaterra não estava
impedida de realizar o comércio com portos estrangeiros, ao contrário do que
ocorria com as colônias espanholas e portuguesas mantidas sob o exclusivo
metropolitano.

A economia no Sul e no Centro. As cinco colônias do Sul, apesar de terem sido


povoadas segundo os mesmos padrões nortistas, acabaram por ser dominadas
pelo escravismo colonial, diretamente inspirado no modelo português. Com a
monocultura do tabaco (e, mais tarde, do algodão), a grande propriedade e o
trabalho escravo (plantation), as colônias do Sul cresceram dentro dos padrões
típicos do antigo sistema colonial mercantilista em vigência nas Américas
espanhola e portuguesa. Do mesmo modo, desenvolveu-se aí uma aristocracia de
proprietários em tudo diferente da sociedade nortista.
As colônias do Centro, por sua vez, embora semelhantes às do Norte em termos
econômicos, delas diferiam quanto ao povoamento. Enquanto no Norte, a
população era essencialmente formada por calvinistas ingleses, no centro,
destacavam-se os holandeses (que ocupavam a região de Nova York, antiga Nova
Amsterdã) e os suecos de Delaware (colônia originalmente sueca), além de um
contingente apreciável de huguenotes franceses.
Em torno de Filadélfia (capital da Pensilvânia), e também em Nova York,
desenvolveram-se manufaturas metalúrgicas e têxteis de alguma importância.
Nas colônias do Centro, as terras férteis estimularam o crescimento da agricultura
e da pecuária, com predomínio da pequena e média propriedade (embora as
grandes propriedades não fossem raras). Plantavam trigo, cevada, centeio, e
criavam bois, cabras e porcos. Muito depressa essas colônias ficaram conhecidas
como "colônias do pão", tornando-se o grande celeiro da América.
As colônias do Centro também desenvolveram o comércio e, junto com as do
Norte, formaram no Atlântico uma complexa rede comercial que dinamizou
notavelmente suas economias.
O comércio triangular

Fonte: História das sociedades modernas às sociedades atuais /Rubim Santos Leão
de Aquino [at al.] – 3ª ed. rev. e atualizada. – Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico,
1988.
Estruturas da colonização inglesa. O mapa na folha anterior, indicado pelo
historiador francês Frédéric Mauro, mostra o quanto se desenvolveram as
colônias do Norte e do Centro, fora da restrição metropolitana, típica da
colonização mercantilista. Disso resultou uma forma peculiar de colonização.
Enquanto as colônias ibéricas e as do sul dos Estados Unidos são de exploração,
as colônias inglesas do norte e do centro são de povoamento. Portanto, as
diferenças são de estrutura e de funcionamento.
A explicação não está no grau de bondade do colonizador inglês e na maldade do
colonizador ibérico. É preciso analisar a metrópole inglesa no momento da
colonização, ou seja, as sucessivas crises político-religiosas que caracterizavam a
intolerância religiosa do absolutismo inglês. Essa atitude buscava reafirmar a
unidade de crença, tão preciosa ao poder do Estado absolutista. Também fazia
parte desse quadro, o processo de cercamento de terras que levou à emigração de
ingleses cujo objetivo era recomeçar uma vida nova, sem perseguições, como
uma continuidade da Inglaterra.
Outro fator que não pode ser esquecido é o interesse inglês no Oriente. A
Inglaterra, no começo do século XVII, estava muito interessada em conseguir
privilégios e lucros no comércio oriental. Ora, o controle desse comércio vinha
sofrendo mudanças. O pioneirismo ibérico cedeu lugar aos avanços ingleses,
holandeses e franceses no sentido de garantir privilégios de compra e venda dos
"produtos exóticos" (especiarias), tão lucrativos no Ocidente. A crise desse
comércio do Oriente para os ibéricos representava a abertura de promissoras
fontes de lucro, especialmente aos ingleses. Assim, o "olhar" do Estado inglês, ao
que parece, estava voltado para o Oriente, minimizando o significado da
ocupação e do povoamento de suas colônias na América por perseguidos
religiosos e indivíduos sem posses.
A colonização inglesa na Nova Inglaterra promoveu o que se convencionou
chamar de colônias de povoamento, as quais, nos termos característicos do
sistema colonial mercantilista, podem ser consideradas como atípicas. Toda a sua
organização econômica não está montada, como já vimos, em função dos
interesses da metrópole, ou seja, não se constituiu como economia
complementar. Sua estrutura é baseada na pequena propriedade; o trabalho é livre
e assalariado; a técnica tende a desenvolver-se, pois não há o bloqueio da
escravidão e a policultura garante a diversificação dos produtos. Assim, seu
funcionamento não está atrelado ao mercado externo, de modo que o mercado
interno pode crescer, garantindo maior estabilidade.
O comércio triangular permite relações econômicas com outras colônias inglesas.
O trabalho livre, atenua as diferenças sociais e favorece a formação de uma
classe média que amortece os choques inevitáveis entre a classe dominante e a
classe não-proprietária.
Politicamente, há mais autonomia. O autogoverno (self-government) elimina a
ação direta da metrópole, permitindo a movimentação partidária e possibilitando
o aparecimento de lideranças locais.
As colônias de exploração, ao contrário, podem ser consideradas típicas da
colonização mercantilista europeia. Sua estrutura baseia-se na grande
propriedade, no trabalho escravo, na monocultura, na produção em larga escala
com uma técnica rudimentar. O crescimento fica comprometido pela implantação
do trabalho escravo.
As diferenças sociais são imensas, pois, neste caso, a sociedade divide-se
simplesmente entre proprietários e não proprietários, existindo uma "camada
flutuante", segundo Caio Prado Jr., pouco densa, que não amortece os conflitos.
Politicamente, as colônias de exploração estão atreladas fortemente as suas
metrópoles. Leis e representantes diretos da Coroa garantem o total domínio
político do Estado metropolitano, marginalizando a todos, inclusive as classes
dominantes locais, que enriquecidas, querem abrir seu espaço político - o que
significaria romper com a metrópole. O mercado externo é o grande regulador
dessa estrutura, que funciona de acordo com os interesses da metrópole.
São gritantes as diferenças entre as colônias de povoamento e as colônias de
exploração. Certamente, aí estão as raízes profundas de caminhos tão desiguais
dos Estados Unidos e da América Latina.

A rivalidade anglo-francesa: a guerra dos Sete Anos (1756-1763). Quando os


ingleses chegaram na América do Norte, os franceses já dominavam o Canadá.
Favorecidos pela rede fluvial - rios São Lourenço, Ohio, Mississipi -, os
franceses deslocaram-se do norte para o sul e atingiram o golfo do México, como
vimos.
No tempo em que se iniciou a ocupação inglesa, o imenso vazio que separava os
ingleses dos franceses dava pouca margem a desentendimentos. Porém, à medida
que o litoral atlântico, no qual instalaram-se as 13 colônias, passou a comportar
uma população cada vez maior, os povoadores ingleses puseram-se em marcha
para o oeste, cruzando os montes Alleghanies. A crescente valorização das terras
litorâneas deixava poucas oportunidades de instalação aos povoadores
desprovidos de recursos e, nas colônias do Sul, além disso, o rápido esgotamento
do solo, provocado pela cultura predatória do tabaco, exigia a busca de novas
terras.
A expansão dos ingleses para o oeste tornou inevitável o choque com os
franceses. Mas a luta era desigual. Em meados do século XVIII, havia na
América do Norte mais de um milhão de ingleses, contra sessenta mil franceses.
Por essa razão, os franceses foram gradualmente desalojados. Em 1748, os
ingleses dominaram a embocadura do rio São Lourenço e tomaram a Terra Nova
e a Acácia aos franceses.
A crescente tensão na região fez eclodir, finalmente, a guerra dos Sete Anos, na
qual ingleses e franceses, ajudados por seus aliados nativos - respectivamente
iroqueses e algonquinos -, travaram um combate encarniçado pelo domínio do
vale do Ohio.
A guerra dos Sete Anos - denominada pelos ingleses de "guerra francesa e
indígena"- teve duas frentes: a americana e a europeia, na qual guerrearam a
Inglaterra e a França. Os franceses, vencidos nas duas frentes, foram obrigados a
ceder o Canadá, o vale do Ohio e parte das Antilhas para os ingleses, mantendo o
Haiti, Guadalupe e Martinica. Cediam o oeste do Mississipi, Luisiana e New
Orleans aos espanhóis, seus aliados na guerra. A Luisiana foi retomada pelos
franceses mais tarde, no tempo de Napoleão. A vitória dos colonos ingleses deu
também à Inglaterra a posse do vale do Ohio. A influência francesa na América
do Norte, a partir daí, entrou em rápido declínio.
AS TRANSFORMAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS NA EUROPA
Do século XVI ao XVIII, uma quantidade incalculável de riqueza foi produzida
na América pelo trabalho forçado indígena e negro. Porém, graças aos
mecanismos do sistema colonial, somente uma pequena parcela dessa imensa
riqueza permaneceu na colônia - concentrada, ainda assim, nas mãos da elite dos
grandes proprietários que exploravam diretamente os índios e os negros. A maior
parte foi transferida para a Europa, nas mãos da burguesia.
Estimulada por essa maciça transferência da riqueza, a economia de mercado
ampliou-se. Os obstáculos feudais, que ainda resistiam na Europa, foram sendo
removidos, facilitando o caminho da consolidação do capitalismo.
O avanço da economia em direção ao capitalismo significou naturalmente o
crescente fortalecimento da burguesia.
Ao longo do mesmo período (séculos XVI-XVIII), a burguesia encontrava-se em
luta contra a nobreza. Na medida em que enriqueciam e se tornavam poderosos,
os burgueses começaram a contrapor-se também aos reis que, na Europa, ainda
eram absolutistas.
Na Inglaterra, com a Revolução Puritana (1649) e a Revolução Gloriosa (1688), a
burguesia e a gentry derrubaram o absolutismo - pela primeira vez em toda a
Europa - e organizaram o Estado segundo seus interesses. Livre das restrições
absolutistas que lhe barravam o caminho, a classe dominante britânica tornou-se
rapidamente a mais rica e poderosa da Europa. No século XVIII, esse processo se
acentuou com a Revolução Industrial.
Com a industrialização da Inglaterra implantou-se um novo sistema que
substituiu definitivamente o feudalismo. Esse novo sistema, o capitalismo
industrial, foi adotado, mais tarde, pelos demais países europeus.
Enquanto a Inglaterra fazia sua Revolução Industrial, surgiam na França
importantes pensadores que elaboraram uma nova filosofia: o iluminismo. O
iluminismo ou ilustração, caracterizou-se pela crítica tanto ao absolutismo dos
reis quanto aos privilégios da nobreza e suas ideias serviram de base para a
Revolução Francesa (1789-1799). Muito antes, porém, de serem aplicadas na
França, as ideias iluministas inspiraram os colonos ingleses na América em sua
luta pela independência, em 1776.
A revolução inglesa (puritana e gloriosa), a revolução industrial, o iluminismo, a
independência dos Estados Unidos, a emancipação da América espanhola e
portuguesa e a Revolução Francesa são acontecimentos intimamente
relacionados.
Estados Unidos
Com a emancipação colonial da América nascem os diversos países modernos do
continente. Enquanto a maioria deles luta ainda hoje contra a estagnação
econômica, a miséria e o subdesenvolvimento, encontra-se igualmente na
América o mais poderoso país capitalista, a mais poderosa potência mundial do
todos os tempos: os Estados Unidos da América.
Sua origem, entretanto, é bem diferente. Seus colonizadores, protestantes
fugitivos da Inglaterra devido aos cercamentos e às perseguições religiosas,
buscavam na América do Norte um lugar permanente de moradia. Mais do que a
riqueza, procuravam um lugar onde pudessem viver segundo sua consciência
religiosa. Valorizando a tolerância religiosa e contrários à opressão,
estabeleceram o sistema de autogoverno no Norte e no Centro.
Da tradição política da Inglaterra, os povoadores das 13 colônias trouxeram a
ideia de que nenhuma taxa deveria ser paga sem o consentimento do povo.
O entrelaçamento econômico das colônias do Norte e do Centro com a Europa,
África e Antilhas favoreceu o desenvolvimento de uma economia extremamente
dinâmica que possuía, além disso, um sólido apoio no mercado interno.
A pequena faixa litorânea em que estavam confinadas as colônias tornou-se
muito estreita, impelindo os novos povoadores em direção ao oeste, para além
dos montes Alleghanies. No vale do Ohio lutaram com os franceses, o que deu
origem à guerra dos Sete Anos (1756-1763). A vitória no conflito abriu aos
colonos ingleses a oportunidade de explorar as riquezas do vale.
Porém, tão logo a guerra terminou, Jorge III, rei da Inglaterra, proibiu o acesso
dos colonos ingleses ao vale do Ohio, através do Ato de Proclamação de 1763. A
medida tinha em vista pacificar os índios da região para, em seguida, possibilitar
ao rei explorar, em benefício da Coroa inglesa, o rendoso comércio de peles, até
então dos franceses. Mas, essa medida arbitrária irritou os colonos que tinham
sido, afinal, os principais responsáveis pela expulsão dos franceses da região.
A separação. No ano seguinte (1764), sob pretexto de que os colonos deveriam
arcar com as despesas da guerra, o rei instituiu o Ato do Açúcar, fixando um
imposto sobre as importações de açúcar e melaço. Ainda sob o mesmo pretexto,
no ano de 1765, foi imposta a Lei do Selo, estabelecendo uma taxa que recaía
sobre os jornais e documentos: sem o pagamento do selo real os jornais não
tinham permissão para circular e os documentos não tinham validade oficial.
Uma revolta contra essa lei fez o rei revogá-la no ano seguinte, substituindo-a em
1767, pela Lei Townshend que estabelecia um imposto sobre o vidro, a tinta, o
chumbo, o ferro e o chá. (ver gráfico da página 11)
Com o novo imposto, o rei pretendia financiar as tropas inglesas que
permaneceram nas 13 colônias depois da guerra dos Sete Anos. Os colonos,
dessa vez, reagiram com o boicote dos produtos taxados. Novamente o rei voltou
atrás, mas para preservar o imposto sobre o chá, entregou o monopólio de sua
venda à falida Companhia das Índias Orientais.
Em 1773, três navios da Companhia atracados em Boston foram invadidos por
colonos fantasiados de índios, que atiraram ao mar 300 caixas de chá. O rei
respondeu, então, com as Leis Intoleráveis (1774), que ordenavam a ocupação
militar de Boston.
As relações entre as colônias inglesas e a Inglaterra, anteriormente baseadas na
política de negligência salutar, começaram a mudar a partir da segunda metade
do século XVIII, com a revolução industrial. Era preciso garantir as colônias
como fornecedoras de matéria-prima (especialmente as colônias do Sul, que
produziam algodão) e como mercados consumidores da produção industrializada
metropolitana. Isso significava impor restrições para garantir a dependência, ou
seja, proibir a produção manufatureira colonial, tornar ilegal o comércio entre as
colônias na América do Norte e as Antilhas e, até mesmo, alterar a política fiscal
para cobrir os gastos feitos na guerra contra a França, impondo novas tarifas e
aumentando as já existentes.
Ora, as mudanças descontentaram profundamente os colonos, sobretudo os da
classe dominante, que se sentiram ameaçados em sua riqueza e na liberdade do
controle político. Essa situação era evidente no Norte, onde a influência do
iluminismo mostrava-se mais forte do que no Sul, região mais conservadora e
impermeável às transformações divulgadas então pelos filósofos franceses.
De modo semelhante ao que ocorreu posteriormente na América espanhola
(1810) e na América portuguesa (1822), o desejo inicial dos colonos não era a
separação. No I Congresso da Filadélfia (1774) ficou claro que o objetivo não era
a independência, mas "a taxação com representação", ou seja, os colonos queriam
participar das decisões metropolitanas que envolvessem as colônias na América.
Com a negativa da metrópole, que resistia em dar mais liberdade a suas colônias,
reuniu-se o II Congresso da Filadélfia (1775). Só nesse momento a ideia de
separação tomou corpo resultando, em 1776, na Declaração de Independência,
nitidamente inspirada no liberalismo de Locke e nos iluministas franceses.
A nova postura dos colonos levou à guerra de Independência, que durou de 1776
até 1783, quando a Inglaterra aceitou a derrota e reconheceu a independência das
ex-colônias.

Emancipação política, independência e revolução. Esses três conceitos estão


relacionados e aqui vamos utilizá-los com diferentes significados. Por
emancipação política entendemos o rompimento dos laços políticos com a
metrópole, possibilitando à ex-colônia constituir um governo próprio (Estado
nacional). Porém, como aconteceu com o Brasil e a América Espanhola, a
emancipação política não significou independência econômica.
Os Estados Unidos, por sua vez, conseguiram a emancipação política e, ao
mesmo tempo, a independência econômica, graças às colônias de povoamento
que tipificavam a Nova Inglaterra. A economia, que já se desenvolvia no sentido
do mercado interno, ainda na fase colonial, expandiu-se a partir da
independência. E isso apesar do caráter escravista das colônias do Sul, com as
quais, no século XIX, irão se chocar as colônias do Norte, dando origem à Guerra
de Secessão (1861-1865).
Contudo, os Estados Unidos mantiveram, mesmo depois da ruptura política, a
estrutura econômica de tipo colonial e escravista nos estados sulistas. De modo
que, apesar de firmar a sua independência econômica, o movimento de libertação
colonial das 13 colônias não assumiu um caráter revolucionário. Somente o Haiti
uniu, em sua luta anticolonial, a emancipação política a uma revolução social que
aboliu a escravatura, alterando radicalmente a estrutura social. Entretanto, não
logrou estruturar uma economia independente apoiada, como nos EUA, no
mercado interno. Ao contrário, a sua economia permaneceu frágil e dependente
do mercado externo, comprometendo suas mudanças sociais.
Em resumo, nenhuma colônia conseguiu reunir, num único movimento, a
emancipação política, a independência econômica e a revolução social. A
América Espanhola e o Brasil apenas se emanciparam politicamente da
metrópole. Não realizaram nenhuma revolução social do tipo haitiano, nem
conseguiram reorientar a sua economia no caminho da independência ou do
crescimento autossustentado. Os Estados Unidos romperam politicamente com a
Inglaterra, ao mesmo tempo em que lançaram as bases de sua independência
econômica. O Haiti conjugou a emancipação política a uma revolução social mas
permaneceu, como o Brasil e a América Espanhola, colonial em sua economia.

Fragmentos de: KOSHIBA, Luis, Denise M. Frayze Pereira –

Américas: uma introdução histórica/São Paulo –

Atual 1992

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