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O Poder Soberano
A soberania como poder político:
Numa perspetiva substancialista, o poder é algo que se usa para adquirir outros bens.
Deste ponto de vista, o poder político caracterizar-se-ia pelo uso da força na
prossecução do interesse público.
Numa perspetiva subjetivista, o poder é definível como a capacidade de um sujeito
alcançar certos efeitos.
De acordo com a perspetiva relacional, o poder é a relação entre dois sujeitos que
implica a possibilidade de um deles obter do outro um comportamento determinado.
Poder Político: desde o momento em que começamos a viver em comunidade usamos a força
e esta é usada não só para segurança, mas para organização.
O exercício da força consiste numa ultima ratio, sendo primeiro utilizados outros meios como
a persuasão, oferta de incentivos, ameaça de sanções… Não é frequente o confronto do
cidadão com o exercício efetivo da força física por parte do Estado, apesar desta conferir
credibilidade à atuação do poder público e contribuir para a sua eficácia.
No sistema político medieval, o poder político é exercido por um vasto conjunto de pessoas e
organizações (rei, senhores feudais, Igreja, ordens religiosas, corporações) – a mundividência
medieval reconhece a legitimidade da detenção e exercício do poder político por essas
entidades.
A soberania e o Direito:
A soberania de um Estado adquire-se, antes de mais, pela posse e concentração dos meios
adequados à imposição da força exclusiva num território, isto é, pelo comando dos
instrumentos fácticos do poder: força militares e policiais, desde logo, mas também tribunais,
serviços de cobrança de impostos e criação de moeda, entre outros.
Mas, a evolução histórica implicou, pelo menos no mundo ocidental, que a soberania tivesse
uma expressão jurídica: a possibilidade de adotar atos jurídicos de autoridade. Atos jurídicos
de autoridade correspondem a declarações que produzem uma transformação na esfera
jurídica dos destinatários, designadamente nos seus direitos e deveres, sem necessidade do
seu consentimento. Podem estar em causa normas ou atos não normativos.
O Direito passou a ser usado como instrumento de poder político, embora contivesse a
virtualidade de impor limites ao exercício do poder. O uso que faz do Direito transforma o
poder político, de tal modo que podemos dizer do mesmo, como poder jurídico-político, que é
a capacidade de condicionar o comportamento dos elementos de um grupo social através da
manipulação da respetiva esfera jurídica, bem como da execução pela força das obrigações
assim impostas, de modo a produzir os resultados desejados pelos titulares do poder.
O poder político, desta forma, encontra-se na conjugação de um poder jurídico com um poder
social fáctico, podendo dizer-se com Zippelius que o Direito e o Estado “fazem parte um do
outro como as duas faces de uma medalha”. Podem ser identificados três pontos de contacto
particularmente relevantes entre o poder jurídico e o poder social fáctico:
Para Bodin, a soberania não foi configurada como um poder ilimitado. Para este autor, o
Direito divino e o Direito natural, os princípios jurídicos universais e certas leis fundamentais
do reino constituíam limites que o poder soberano não poderia ultrapassar. A ideia de que a
soberania é um poder limitado, embora desconsiderada pelos monarcas absolutistas, veio a
ser retomada com as revoluções liberais que em documentos com a força de “Constituição”
dividiram os poderes antes concentrados no monarca por diversos órgãos de soberania,
concretizando o princípio da separação doe poderes.
Ao mesmo tempo, postularam regras inultrapassáveis para esses poderes constituídos. Estes
poderes, além de estarem submetidos às normas constitucionais, passaram a estar sujeitos às
regras que eles próprios emanam, nomeadamente no exercício da função legislativa. No século
XIX é clara e definitivamente ultrapassado o princípio princeps a legibus soluto: agora, todos os
órgãos do Estado estão sujeitos à Constituição e à lei. Deste modo, pode dizer-se que a
soberania está sujeita a limites jurídicos positivos, constituídos pelas normas de Direito
emanadas pelo poder constituinte ou pelos poderes constituídos. Esses poderes podem alterar
aquelas normas, mas têm de seguir, para o efeito, procedimentos de revisão que exigem a
participação de diversos órgãos do Estado e, portanto, do acordo destes. Finalmente, quer a
aprovação originária das normas constitucionais e ordinárias quer a sua revisão, estão sujeitas
a limites jurídicos suprapositivos e internacionais, bem como a limites fácticos ou sociológicos.
É o mesmo que dizer que a soberania está sujeita a estes limites.
Quando o poder soberano é exercido de forma originária, não se pode desconsiderar que a
Constituição que há de ser aprovada é elaborada para um determinado povo, com uma certa
História e uma particular cultura, que se encontra num determinado estádio de
desenvolvimento económico e social. A consagração de normas que implicassem uma rutura
total com essa história ou essa cultura ou que não tivessem em conta as possibilidades
económicas e sociais do momento poderia gerar uma reação popular contra a Constituição ou,
ao invés, poderia implicar a não aplicação efetiva das normas em causa.
Limites Fácticos Internos: limites que resultam do contexto interno em que o poder está a ser
exercido, resultam da própria comunidade em que o poder soberano é exercido. Exemplo:
quando uma Constituição é elaborada e aprovada; quando o poder de uma forma geral é
exercido destina-se a um determinado povo com uma certa história e a uma certa cultura,
situado num determinado patamar de desenvolvimento económico e social. Assim, se a
Constituição criada ou o exercício de poder conduzir a uma rutura total com essa historia e
cultura ou se não tiver o enquadramento económico e social poderá levar a uma reação
popular contra a Constituição ou à sua não aplicação;
Limites Fáticos Internacionais: um Estado encontra-se sempre em relação com outros Estados,
nomeadamente, aqueles mais próximos do ponto de vista geográfico, económico, militar ou
cultural, cujos interesses deve ter em conta, sob pena de se isolar na cena internacional ou, no
limite, gerar conflitos armados. direito internacional convencional; ius cogens.
O Direito Internacional, que rege tradicionalmente as relações entre Estados, assume uma
nova função: regular as relações entre cada Estado e a respetiva população. Tal resulta de os
sujeitos estatais assumirem o compromisso, através da celebração de convenções
internacionais, de não violarem os direitos humanos fundamentais.
Hoje o poder político é partilhado por um conjunto vasto de órgãos e, mais do que isso, por
um conjunto amplo de entidades públicas, nacionais e internacionais, com personalidade
jurídica distinta do Estado. Pode-se, deste modo, questionar se o Estado continua a ser o poder
supremo e independente num território e, portanto, um poder soberano.
A partilha de poder político foi assumida como consequência necessária, em primeiro lugar, do
princípio da separação de poderes. O abuso do poder verificado no Antigo Regime levou à
consagração desse princípio e à consequente divisão do poder: o parlamento exerce a função
legislativa, o governo exerce a função administrativa e os tribunais exerce a função
jurisdicional. Acresce que, ainda dentro da pessoa coletiva do Estado, foram sendo
desconcentrados poderes em órgãos situados em patamares hierárquicos inferiores (ex.
tribunais de comarca ou os chefes de repartição de finanças). Por outro lado, naqueles Estados
que assumiram a forma federal (como os EUA), a essa separação horizontal dos poderes
acresceu uma sua separação vertical: entre o Estado federal e os Estados federados. O mesmo
sucede em outros Estados, unitários, que acabam por descentralizar poderes para entidades
situadas em níveis territoriais ou institucionais inferiores e com personalidade jurídica própria,
de que são exemplo em Portugal as regiões autónomas, as autarquias locais e as associações
públicas.
Pode concluir-se que os poderes públicos são exercidos, em cada Estado, por milhares de
órgãos e entidades públicas diferentes.
Na distribuição de poderes do Estado por órgãos seus ou por entidades infraestatais, assume
um papel especial o princípio da subsidiariedade: fixe o critério que deve ser seguido nessa
distribuição: os poderes públicos devem ser exercidos por aquelas entidades que se
encontrem mais próximas dos problemas a resolver ou das populações interessadas, salvo se o
seu exercício por entidades situadas em patamares superiores for mais eficaz ou mais
eficiente. Consagrado nos artigos 6º nº1 e 7º nº6.