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Escola Tomista
Professor Carlos Nougué
Aula 44
Bem-vindos à 44ª aula da Escola Tomista. Estamos no Tratado das
Categorias XII, salvo engano.
Pois bem, estamos marchando para o fim do Tratado das Categorias. Ainda
falta alguma coisa, mas estamos marchando para lá. O próximo passo será o
Peri Hermeneias ou sobre a interpretação de Aristóteles. Será nosso passo.
Aliás, a tradução do comentário de Santo Tomás ao Peri Hermeneias de
Aristóteles, um comentário incompleto, mas preciosíssimo já que se trata de
todos os textos de Aristóteles, talvez o mais obscuro, será lançado com tradução
de Renato Romano. Será lançado ainda neste 2018. Será uma obra
indispensável. Eu farei a revisão e a apresentação da obra. Pois bem, a tradução
é muito boa, Renato é um grande tradutor.
Pois bem, Aristóteles salta, em seu opúsculo “As categorias” ou, pelo
menos, nos chegou faltando esta parte, chegou, nos chegou faltando esta parte,
salta o situs, a posição ou situação, o habitus ou posse, a ubiquação e o quando.
Pois bem, vamos tratar rapidamente, rapidamente essas duas categorias ou
predicamentos. A posição ou situação em primeiro lugar.
Pois bem, então fiquemos com o situs ou posição assim. Quanto ao habitus
ou posse, é esse: ou vai armado, vai vestido, está agasalhado, andou calçado...
São posses, é posse.
Pois bem, este ainda parece mais estranho que seja algo real na
substância, mas o é. Tanto é que a nossa própria linguagem, a nossa própria
linguagem contempla-o de certo modo. Quando eu digo “tenho um livro” (é uma
posse), “tenho certo livro”, eu dou a este ter um caráter de ação, sem que o seja
efetivamente. Dou à posse verbalmente um caráter de ação e isto é assim
porque o ter, o possuir, o hábito é algo no indivíduo, se não eu não poderia
interpretá-lo gramaticalmente como se fosse uma ação, como se fosse uma
ação. Falo disso na Suma Gramatical da Língua Portuguesa. Então, quem tiver
curiosidade e estiver com o livro, vá ao capítulo da morfologia ou tratado da
forma das palavras. Ali eu explico que o ato, o ter, possuir é entendido por nós
comumente, pré-filosoficamente como uma ação. Isso só é possível porque o ter
é algo efetivo, o possuir, a posse, o hábito é algo efetivo, algo efetivo no sujeito,
em nós mesmos. Isso é próprio de nós.
Pois bem, e temos, enfim, as duas últimas categorias que são a ação e a
paixão que Aristóteles tratou, mas muito brevemente. Por isso é que não
devemos dar por assentado que houve realmente um salto de Aristóteles, que
ele tratou e se perdeu esta parte de seu tratado relativa ao situs, ao habitus, ao
quando e à ubiquação ou ubi. Pode ser que não, pode ser que não lhe tenha
interessado fazer. Tanto é assim que, quando ele trata, ou seja, as categorias ab
extrínseco, que são ab extrínseco, parece, é possível que não lhe tenha
interessado muito a esta altura da sua produção, ao produzir as suas Categorias.
Então ele trata muito brevemente essas duas categorias da ação e da paixão,
muito brevemente. Ele repete o que disse desde o início: serrar (quem serra a
madeira) é uma ação e ser serrado é uma paixão, é uma paixão. O exemplo que
ele dá: a água esquentar e esfriar. Algo a esquenta e isto é uma ação. Ela é
esquentada pelo fogo: isto é uma paixão. Algo a esfria e este algo procede a
uma ação. Ela é esfriada e este esfriamento que ela padece é uma paixão.
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Bom, atribui-se isso a uma mão que não a de Aristóteles. Não estou seguro.
Não me convenço totalmente, não me convenço totalmente, eles dão como
exemplo, como justificativa pra dizer que é mão de outrem o uso de certa palavra
“hiper”, ou seja, “sobre” o que Aristóteles não usaria. Isso não me convence
completamente, mas tá! Não nos interessa grandemente agora.
Pois bem, eu vou fazer hoje, com relação ao primeiro dos pós-
predicamentos (os opostos) vou fazer o mesmo que fiz com o ad aliquid, vou –
ad aliquid – vou primeiro ler o texto mesmo de Aristóteles comentando – será
uma lectio, uma leitura comentada – para, na próxima aula, então, concluir o
assunto de forma mais sistemática que a que pôs Aristóteles quanto aos opostos,
que são demasiado importantes para todo o restante de nosso percurso. Então,
por isso, vou deter-me no assunto por duas aulas, porque realmente é muito
necessário que o façamos.
Pois bem, vou ler lentamente comentando. Não sei se termino hoje, é um
pouquinho grande. Se não terminar hoje, termino na aula que vem e passo, enfim
à sistematização dele. Diferentemente de como pôs Aristóteles a sua parte
relativa à relação ou ad aliquid, em que, como mostrei, ele estava ainda no
campo do dialético, aqui parece que ele já conclui com suficiência. Então
vejamos, isto ainda está por ver-se.
Pois bem, para mostrá-lo com exemplo, cada uma das coisas destes tipos
se opõe ou como ad aliquid (por exemplo, o dobro e a metade, isto é uma
oposição, o dobro se opõe à metade assim como a metade se opõe ao dobro),
ou como contrários (por exemplo, o bom e o mau, o mau e o bom, o mau é o
contrário do bom e o bom é o contrário do mau – mau com “u”; transcritores, mau
com “u” – bom. O mal com ele é o oposto, o contrário de “bem”. Bem-mal, bom-
mau com “u”), como privação e possessão (a cegueira e a visão: a visão é uma
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Pois bem, assim, pois, todas as coisas que se opõem como o ad aliquid,
dizem-se, aquilo que elas mesmas são – essa é a definição de Aristóteles original
para o ad aliquid – aquilo que elas mesmas são dizem-se de seus opostos.
Aquilo que é ser o dobro, diz-se, por oposição, àquilo que é ser metade ou se
relacionam de alguma outra maneira como estas. É a mesma coisa. O dobro,
aquilo que o dobro é em si mesmo chama-se dobro da metade. Claro! E a metade
do dobro. E o conhecimento se opõe ao cognoscível como o ad aliquid e que o
conhecimento é em si mesmo diz-se do cognoscível. Também o cognoscível –
aquilo que ele é em si mesmo – diz com respeito ao conhecimento como a seu
oposto, pois o cognoscível se chama cognoscível para algum conhecimento,
enquanto o conhecimento se chama conhecimento de algum cognoscível.
Lembrem-se de que o ad aliquid usa ou “de” (a preposição “de”), ou a preposição
“a” ou “para”. Está certo?
Pois bem, assim todas as coisas que se opõem como o ad aliquid dizem-
se aquilo que elas são, elas mesmas em si mesmas, seus opostos, ou se
relacionam de alguma outra maneira umas com as outras. Em contrapartida, as
que se opõem como contrárias de nenhum modo se dizem aquilo que elas são
em si mesmas uma com respeito à outra. Vocês já entenderão pelos exemplos
muito bons. No entanto se chamam contrárias uma de outra. Com efeito, nem o
bom se chama bom do mau, mas contrário do mau – o bom é o contrário do mau
– nem o branco se diz branco do negro, mas contrário do negro, de modo que
essas oposições diferem entre si.
Vejam, os números: todo número é par ou ímpar. O corpo: todo corpo tem
saúde ou doença. Mas nem todo corpo é branco ou negro.
Dizemos, então, que cada coisa está privada das cosas susceptíveis de
posse, quando estas não se dão de nenhum modo naquilo em que é natural que
se deem e quando é natural que se deem. Com efeito, chamamos desdentados
aos que não têm dentes, mas que, por natureza, têm dentes. E cego não ao que
não tem visão, mas ao que não a tem quando é natural que a tenha, pois algumas
coisas carecem, desde o nascimento, de visão e de dentes, mas não se chamam
desdentadas nem cegas.
Não chamamos uma pedra desdentada nem cega; não chamamos uma
planta desdentada nem cega; não chamamos o animal naturalmente destituído
de visão de cego; não chamamos ao animal naturalmente destituído de dentes
de desdentado. Então, para que seja, haja cegueira e desdentamento é preciso
que naturalmente o ente tenha visão e dentes. Se não tiver naturalmente não se
lhe aplica o par de opostos privação e possessão, só se o ente tiver naturalmente
a posse daquilo a que nos referimos, no caso a visão e os dentes.
O que cai sob a afirmação e a negação não é afirmação nem negação, pois
a afirmação é um enunciado afirmativo e a negação um enunciado negativo,
enquanto nada do que cai sob afirmação e a negação é um enunciado.
não se diz da oposta, pois a visão não é a visão da cegueira, nem se diz com
respeito a ela de nenhuma outra maneira. Do mesmo modo, tampouco a
cegueira se chamará cegueira da visão, senão que a cegueira se chama
privação da visão.
Então não é relativo. Ele tá insistindo em que não há relação tampouco aqui
quanto à privação e posse.
Pois bem, que tampouco se opõem como, ou seja, não se opõem como ad
aliquid, mas tampouco, como veremos agora, se opõem como contrários. Então,
que tampouco se opõem como os contrários às coisas que se dizem segundo
privação e possessão, é evidente a partir do que se segue, do seguinte. Com
efeito, dos contrários nos quais não há nenhum intermediário, é necessário que
um e outro se deem, se um ou outro se dê sempre naquelas coisas em que surge
por natureza ou das quais se predica.
Pois bem, com efeito não há nenhum intermediário entre aqueles dos quais
um e outro, ou outro é necessário que se dê na coisa que capaz de admiti-los,
como no caso da doença e da saúde e do ímpar e do par. Em contrapartida,
daqueles entre os quais há um intermediário, nunca é necessário que um ou
outro se deem em cada coisa. Negro e branco: não é necessário que aquilo em
que naturalmente se dão o negro e o branco – que é o corpo – seja negro ou
branco. Ele pode ser cinza, ele pode ser pálido, ele pode ser verde, ele pode ser
azul.
Com efeito, não é necessário que toda coisa que pode ser, sê-lo, seja
branca ou negra – é isso que eu acabo de dizer – nem quente ou fria – pode ser
morna – pois nada impede que, entre esses, haja um intermediário. Ademais, há
um intermediário entre aqueles dos quais não é necessário que um ou outro se
dê na coisa capaz de admiti-los, a não ser naquelas coisas nas quais se dá por
natureza só um (está mal escrito, é um texto complicado de Aristóteles). Por
exemplo: no fogo, ser quente, e, na neve, o ser branca. Nestes casos, é
necessário que um dos dois se dê de maneira definida, e não qualquer deles ao
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acaso, porque a neve é sempre branca e o fogo é sempre quente. Não é possível
que o fogo seja frio, nem que a neve seja negra. Pois o fogo não admite o ser
frio nem a neve admite o ser negra, de maneira que não é necessário que um ou
outro se dê naquela coisa capaz de admiti-los, mas só naquelas em que, por
natureza, se dá um só e, então, se dá um de maneira definida e não de qualquer
maneira ao acaso.
Novamente, o fogo é quente e não pode ser frio. O fogo é quente e não
pode não ser quente. O fogo tem que ser quente e nunca frio. A neve não pode
não ser branca e nunca pode ser negra.
Não está bem posto por Aristóteles, ao meu ver, vamos sistematizar melhor
na aula seguinte.
Nem tampouco são dos que têm intermediário, pois é necessário que, em
toda coisa capaz de admiti-lo, se dê em determinado momento um deles: ou a
cegueira, ou a visão. Com efeito, quando houver algo dotado por natureza para
ter visão, então se chamará ou cego ou com visão e não uma das duas coisas
de maneira definida, mas qualquer delas segundo seja de fato – se seja de fato
cego, ou se seja de fato com visão. Com efeito, não é necessário que seja cego
ou com visão, mas qualquer das duas coisas segundo seja de fato: cego ou com
visão. Em contrapartida, no caso dos contrários – branco e negro – entre os quais
há um intermediário – cinza, pálido, verde, azul – nunca é necessário que se dê
um ou outro em cada coisa, mas só em algumas coisas e, então, um só e de
maneira definida. Se alguém é branco, será branco e não negro; se alguém é
negro, será negro enquanto é negro e não branco; mas pode não ser negro, nem
branco, senão que pode ser cinza ou pálido, ou amarelo, ou azul.
pequeno que seja, está claro, é claro que ou poderia acabar mudando, ou
poderia fazer um grande progresso, pois cada vez se move com mais facilidade
para a virtude – este que progride do desonesto para o honesto vai progredindo
cada vez mais para a virtude – seja qual for o progresso realizado desde o
princípio, de modo que é verossímil que faça cada vez mais progresso. É
verossímil. E, sempre que isto se produz, acaba devolvendo a pessoa ao estado
contrário se o tempo não o impede. A pessoa está progredindo da desonestidade
para a honestidade, do desonesto para o honesto, do desonesto para a virtude
e, de repente, falece. Então o tempo impediu o progresso.
Pois bem, tudo o que se opõe – passemos – tudo o que se opõe com
afirmação e negação é manifesto que não se opõe de nenhum dos modos
mencionados anteriormente, pois só nestes casos é sempre necessário que um
seja verdadeiro e o outro falso. Lembrem-se que a verdade e a falsidade entra
em jogo apenas na segunda operação do intelecto ou da razão, ou seja, na
composição ou divisão. Com efeito, nem os contrários, nem nos contrários é
sempre necessário que um seja verdadeiro e o outro falso, porque será
verdadeiro que um seja branco ou negro, ou seja, não tem sentido isto – branco
e negro estão na primeira operação do intelecto em que ainda não intervém a
falsidade e a verdade – nem no ad aliquid, nem na posse e privação. Por
exemplo: a saúde e a doença são contrários e nenhuma das duas é verdadeira
nem falsa. Vejam agora a validade daquilo que dissemos ao estudar as três
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Mas tampouco nesses casos é necessário que sempre uma das duas
coisas seja a verdadeira e a outra falsa, pois, existindo Sócrates, será verdadeiro
um e falso o outro, mas, não existindo, as duas coisas serão falsas. Se eu digo
que Sócrates está doente ou que Sócrates está são, sadio, saudável, ambas
serão falsas se Sócrates não existir.
Muito bem, com efeito, nem que Sócrates esteja doente, nem que esteja
são, sadio, saudável, são verdade em si se, definitivamente, não existe Sócrates,
o próprio Sócrates.
Pois bem, como ainda temos um tempinho, vou alterar meus planos e vou
ler também o próximo pós-predicamento, que são os contrários, um dos pares
de opostos. Vimos que os opostos são ad aliquid ou contrários, ou privação e
possessão, ou afirmação e negação.
Pois bem, fico hoje por aqui, não vou sobrecarregá-los. Na próxima aula
ainda estudaremos o anterior, o simultâneo, o movimento e o ter os outros pós-
predicamentos e, depois de fazê-lo então, é que eu sistematizarei o conjunto dos
pós-predicamentos. Em princípio pretendo fazê-lo – pensando agora – pretendo
fazê-lo na próxima aula integralmente se não for sobrecarregá-los demasiado.
Mas hoje uma aulinha um pouco mais curta para compensar a aula mais árdua
passada, passada e muito obrigado pela atenção. Até nossa próxima aula.