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Escola Tomista
Professor Carlos Nougué
Aula 35
Bem-vindos à trigésima quinta aula de nossa Escola Tomista. Estamos no
Tratado das Categorias III. Não nos percamos.
Pois bem, nesta aula – que não terá, aliás, documento – darei o quarto
antepredicamento; depois darei conclusões gerais a respeito dos
antepredicamentos; e depois falarei já das categorias ou predicamentos em
geral, para que na próxima aula então comecemos a tratar a substância.
não-vivente: eles são diversos e não são subordinados entre si – nem vivente se
subordina a não-vivente, e nem não-vivente se subordina a vivente) [pois bem,
se os gêneros são diversos e não subordinados um ao outro], suas diferenças
são especificamente diversas. Pois bem, entendamos: segundo esta regra,
‘por gêneros subordinados’ devem entender-se não só aqueles dos quais um se
inclui no outro, como animal e vivente, (agora sim, animal se inclui em vivente)
mas também dos gêneros que estão incluídos em um terceiro mais universal; o
exemplo é de Aristóteles: ovíparo e vivíparo dentro de animal (ambos tanto
aquele primeiro caso, como este segundo, vão ter em comum as diferenças que
se predicam de animal; que diferenças são essas?: vivente sensível). Com efeito,
tanto ovíparo como vivíparo são animais e sensíveis. Pois bem, por diferenças
se entende não só as diferenças constitutivas em ato do gênero (se é subalterno,
porque o gênero generalíssimo, [qual é?] a substância, não tem diferença
constitutiva. Eu digo: ‘gênero substância’, mas não posso acrescentar-lhe
nenhuma diferença, porque ele não é divisão de nada) [então repitamos: por
diferenças se entendem não só as diferenças constitutivas em ato do gênero],
se é subalterno, (se for subalterno, porque o gênero generalíssimo não tem
diferença constitutiva, não há nenhuma diferença que o constitua) mas também
as diferenças divisivas em potência, como nos mostram os próprios exemplos
de Aristóteles: “pedestre e bípedo”. “alado e aquático” — são diferenças de
animal.
Pois bem, como vimos quatro predicamentos, temos agora de dar, ainda
que de maneira muito geral, as conclusões gerais (não é um ponto tão simples.
Resumi tudo. Vou tentar ser o mais claro possível, mas insista-se em que tudo
isto que nós estamos vendo – os antepredicamentos – só ficarão de todo claros
quando tratarmos os predicamentos: aí entenderemos perfeitamente as razões
dos antepredicamentos. [“Ante”, lembremos quer dizer “antes”, não “anti” no
sentido de contrário: “combate ‘anti’ droga”, “contra” droga; “ante”, assim como
“’ante’ diluviano”, “’antes’ do dilúvio”]): como a intenção deste tratado é ordenar
e distinguir nada menos que todo os entes (o que são os entes? o que é o ente
é? o que é já o vimos: é o que é; para simplificar: é o que existe; logo, os entes
são; [“que são” para simplificar “o que existe”, porque para simplificar digo?
poder-se-ia usar sempre “existir”, sucede, porém, que Deus é ente e não existe,
Ele “é”]. — A razão de que Deus seja, sem existir propriamente falando, dá-la-
emos no ponto da Metafísica; ou seja, bem adiante), o que não se pode fazer de
modo absoluto (atenção), mas só por meio de conceitos incomplexos (não
estamos na primeira operação? A primeira operação não se chama simples
apreensão ou inteligência dos incomplexos? Então, isto de ordenar e de
distinguir todos os entes, aqui, no âmbito da primeira operação, não se faz de
modo absoluto: faz-se apenas mediante conceitos incomplexos – aqueles que o
intelecto abstrai na primeira operação, aqueles conceitos que ele abstrai dos
fantasmas ou imagens sensíveis que a cogitativa nos fornece ao intelecto) e
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Das cinco condições dos entes enquanto são significados e como foi
explicado – isto é, a equivocidade, a univocidade, a denominação, a
incomplexidade e a complexidade – provêm muitas coisas de grande utilidade
para a doutrina das Categorias ou Predicamentos; primeira: sabemos como fixar
nossa inteligência segundo a primeira operação do intelecto ao se apresentarem
estas vozes ou palavras. O equívoco, não o devemos considerar com
simplicidade porque, na verdade, ele não tem um único conceito. Já vimos que
o equívoco pode ser simpliciter ou absoluto ou secundum quid ou análogo. Em
contrapartida, o unívoco sim: há de ver-se com simplicidade, pois não tem duplo
sentido.
conceito complexo e vice-versa: posso ter uma palavra complexa, como lobo-do-
mar, para um só conceito incomplexo. Sob as palavras incomplexas, os
conceitos podem ser complexos ou incomplexos, equívocos, unívocos ou
denominativos. E sabendo isso, sabemos que o que se reúne são só no âmbito
do nosso tratado as incomplexas unívocas; as Categorias ou Predicamentos
trata dos incomplexos unívocos. O tratamento da analogia é posterior – o
estudaremos aqui sobretudo quanto aos transcendentais, que são os análogos
superiores.
Pois bem, outro ponto que se pode concluir é que sabemos agora que
todos os gêneros não podem ser reunidos senão sob um algo equívoco ou antes
análogo – equívoco secundum quid; o quê? O ente. Então, se reunirmos todos
os gêneros que vamos estudar aqui – que já sabemos que são dez; são as
Categorias ou Predicamentos – e que só podem reunir-se não sob um conceito
ou um gênero unívoco; eles têm de reunir-se sobre uma noção análoga ou
conceito análogo ou equívoco secundum quid; e qual é este? É a noção ou
conceito de ente, que é o primeiro dos transcendentais, como estudaremos em
seu momento.
vou dizer aqui com essa parte das Categorias de Aristóteles – quem o tiver em
mãos, mas não é necessário, porque vai haver a transcrição – mas vamos
exercitar a minha memória) das coisas que se dizem “sem complexidade
algumas” – por quê? Porque estamos no âmbito da primeira operação; qual é?
A simples apreensão ou inteligência dos incomplexos, dos não complexos,
então, das coisas que se dizem sem nenhuma complexidade, cada uma significa
substância ou quantidade, ou qualidade, ou, direi em latim, ad aliquid (quer dizer
“à algo” ) ou ubi (“onde” ou “quando”; tanto em português como em latim) ou situs
(situação) ou habere (haver, no sentido de ter, possuir) ou facere (fazer) ou pati
(padecer).
Então, das coisas que se dizem sem complexidade alguma, cada uma
significa ou substância (em latim, substantia) ou quantitas (quantidade) ou
qualitas (qualidade) ou ad aliquid (a algo) ou ubi (quando) ou situs (situação) ou
habere (haver ou ter) ou facere (fazer) ou pati (padecer). Pois bem, Aristóteles
explica cada uma dessas coisas não dando a razão desta divisão, mas com
exemplos. Vamos ver minha memória outra vez.
não quer dizer necessariamente algo sofrido ou ruim: se eu sou queimado pelos
raios do sol, eu padeço a ação dos raios do sol – pois bem, do “padecer” – assim
como do fazer, do facere, ele deu como exemplo “cerrar e queimar” – ele dá
como exemplo do padecer “ser cerrado” e “ser queimado”, já vemos assim que
ação e paixão, fazer e padecer, corresponde, nas línguas, gramaticalmente, à
voz ativa: “cerrar” e “queimar” e à voz passiva “ser queimado, ser cerrado.”
Mas Aristóteles funda de modo sólido toda a sua Filosofia, estão nos
alicerces da doutrina filosófica da filosofia de Aristóteles, ao distinguir, de
maneira perfeitamente adequada, estas dez maneiras como se diz o ente; é o
único acesso que temos ao ser das coisas: por abstração, por composição e
divisão. A abstração no âmbito da primeira operação do intelecto; composição e
divisão no âmbito da segunda operação do intelecto. Consideremos algumas
coisas a partir do que eu acabei de dizer. O ente, aquilo que é, o que é pode ser
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per ser ou per accidens – já vimos. O ente per accidens, diferentemente do ente
per se, não tem uma ratio, ou seja, não tem uma razão ou quididade ou essência
única; exemplo: o homem negro. Há aí duas quididades: o “homem” e “negro.”
Número dois: o ente per se pode dar-se na realidade, fora de nossa alma, ou
pode dar-se só na nossa alma, ou seja, na nossa razão.
em ato; é isto que está em jogo aqui no tratado das Categorias; é o ente per se
e em ato e fora da alma. Por quê? Porque todos os outros modos do ente se
entendem em relação a este, pois é este mesmo modo do ente o que Aristóteles
divide nos dez Predicamentos ou Categorias; são os dez modos de dizer “ente.”
Substância é aquilo que subsiste por si, aquilo que é por si, aquilo que é
em si, aquilo que é algo por si, que tem existência por si, que tem ser por si e
acidente é aquilo que se dá na substância, por isso é que a substância também
se chama, relembrem-se, suporte de acidentes; esta é a primeira divisão das dez
Categorias. Uma é a substância, as outras nove Categorias são acidentes de
que a substância é suporte porque a substância é o que é por si, enquanto as
nove Categorias de acidentes outros só são em outro, são em que outro? Na
substância.
Pois bem, isto não é tão difícil e viemos vendo desde o início de nosso
curso, mas a própria distinção dos gêneros de acidentes já não é tão manifesta,
já não é tão patente, já não é tão evidente; ela é bem mais delicada e sempre se
prestou a discussão e ainda se presta; é uma questão disputada. Repita-se que,
se a distinção entre substância e acidente ou acidentes é evidente, é patente, é
manifesta, não assim a distinção entre as nove Categorias de acidentes. De que
modo a obteve Aristóteles? De que modo Aristóteles obteve essa divisão em
nove Categorias de acidentes? Ela não parece ser resultado de uma série de
visões essenciais – o que são as divisões essenciais? Já o vimos, é a nossa
árvore: substância, vivente, não-vivente, etc – mas parece resultar de uma
análise direta, digamos, se há falta de uma palavra melhor, uma análise empírica
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da linguagem; parece isto. Parece que Aristóteles partiu daí; mas uma coisa é
de onde partiu e outra coisa é o ponto a que chegou.
Vou permitir-me ler aqui porque agora minha memória já não está para
tanto; pois bem, nas Categorias e nos Tópicos, sem dúvida, Aristóteles enumera
dez Categorias ou Predicamentos; no seu livro Analíticos Posteriores, no seu
livro Física e no seu livro Metafísica, enumera oito – e não dez.
Pois bem, já na Metafísica ele escreve o seguinte: “por si, se diz que são
todas as coisas significadas pelas figuras da predicação: pois, quantos são os
modos em que se diz, tantos são os significados do ente. Pois bem, dado que,
dos predicados, uns significam substância, outros, qualidade, outros,
quantidade, outros, relação, outros, ação”, ou paixão, “outros, lugar e outros,
tempo, o ente significa o mesmo que cada um destes.” Em outros lugares da
Metafísica – não vou desgastá-los com as citações – ele já não refere oito
Categorias, mas apenas sete. Na Ética a Nicômaco, que estudaremos ao
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estudarmos a Ética, ele só refere seis. Mas, seja como for, fora das Categorias
estão sempre ausentes o situs e o habitus, ou seja, o situs e o habere, a
“situação” ou “posição” e o “ter” ou “haver” ou “possuir” – haver também quer
dizer “ter” ou “possuir”, por isso que nós, na linguagem vulgar, usamos “ter” no
lugar de “haver” ou “existir”: “tem dois carros na rua”, ou seja, ao invés de “há
dois carros”, usamos “tem dois carros”: isso, a origem deste engano da
linguagem popular, é que na verdade o verbo “haver” antes de tudo quer dizer
“ter”, então, se chama em gramática de analogia cruzada, passou, na linguagem
popular, a usar “ter” ao invés de “haver” – não é conveniente, mas é um fato.
Pois bem, o primeiro modo de predicar, ou seja, quando se diz aquilo que
o sujeito é, funda o predicamento substância. Os outros dois modos dividem a
predicação acidental – que é sempre denominativa – e fazem-no de uma maneira
perfeitamente manifesta (segundo a denominação se tome de algo intrínseco ou
extrínseco ao sujeito.)
como passio, pois, com efeito, a paixão termina no sujeito paciente – aquele que
é queimado ou cerrado para que nos atenhamos aos exemplos mesmos de
Aristóteles.
Creio que posso dar por encerrada esta aula. Espero que lhes tenha sido
de agrado, mas antes, como sempre, qualquer dúvida e qualquer dificuldade não
me deixem de escrever de maneira alguma. Muito obrigado pela atenção e até
a nossa próxima aula.