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MATEMÁTICA E GEOGRAFIA: UMA RELAÇÃO POSSÍVEL1

Ademir Basso2 - CEPACS

Eixo – Didática
Agência Financiadora: não contou com financiamento

Resumo

Este artigo é fruto de pesquisas individuais, reflexões teóricas e experiências vividas/aplicadas


em sala de aula pela autoria que trabalha na perspectiva de tornar o ensino de qualquer ciência
muito mais interessante. A ideia é mostrar aos alunos que existe uma grande possibilidade de
se divertir enquanto aprende e de, acima de tudo, relacionar qualquer conhecimento com o
cotidiano e as disciplinas entre si. Dessa forma, este trabalho traz a ideia da inter-relação entre
Matemática e Geografia, buscando mostrar que é possível ensinar duas disciplinas de áreas
diferentes com a intenção de tornar os conhecimentos mais atrativos, mais reais. Neste contexto,
traz à luz das discussões a ideia de que as grandes navegações, que buscavam novas terras,
utilizavam-se de conhecimentos geográficos, mas também de muita Matemática. Não obstante,
traz a ideia da cartografia, conteúdo geográfico que utiliza das escalas matemáticas para
mostrar, em tamanho reduzido, como são os espaços neste planeta. Discute ainda as fórmulas
matemáticas utilizadas em Geografia, utilizadas para calcular a relação do número de habitantes
com a respectiva área de terra ocupada por esta população, a densidade demográfica. Outro
conteúdo explorado pela Geografia que possui muita matemática é o de taxa de natalidade que
relaciona o número de nascimentos pelo total da população. Ainda se tem a relação
Matemática/Geografia quando o conhecimento é renda per capita, que relaciona renda total
pelo número de habitantes, dentre outros conhecimentos/conteúdos. Enfim, este trabalho tem a
intenção de mostrar a relação existente entre uma disciplina da área das ciências exatas e outra
da área das ciências humanas, no contexto da interdisciplinaridade.

Palavras-chave: Matemática. Geografia. Interdisciplinaridade

Matemática e Geografia

A Geografia é a ciência que estuda a superfície terrestre, bem como a distribuição, no


espaço, dos fenômenos que tenham real significância na paisagem. Estuda também as relações

1
Trabalho construído juntamente com o Professor Ms. Adelir Klipel, Mestre e Graduado em Geografia pela
UNIOESTE-PR. Professor da UNIOESTE-PR e do CVNSG.
2
Graduado em Ciências, Matemática e Física pelo Centro Federal de Educação Tecnológica do Parana – CEFET-
PR (Hoje UTFPR). Especialista em Ensino de Matemática pela mesma Instituição. Mestre em Educação
Matemática pelo UNICS – PR. Doutor em Educação Matemática pela Universidade de Salamanaca – Espanha.
Professor de Matemática e Física no Colégio Estadual Presidente Arthur da Costa e Silva – EFM – PR. E-mail:
ademir_basso@yahoo.com.br.

ISSN 2176-1396
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do homem com o meio, as relações de dependência e de exploração que a humanidade vem


mantendo desde seu surgimento no planeta. Dessa forma é impensável pensar em evolução do
homem sem se reportar ao estudo da Geografia.
No entanto, esta ciência utiliza-se da Matemática para provar muitas de suas hipóteses
e mostrar dados e resultados coerentes. Não obstante, é importante citar que os avanços
territoriais do ser humano foram ancorados em construções que usaram de muita Matemática.
Desde a construção de casas, as pirâmides, as grandes muralhas, os pequenos e grandes veículos
ou embarcações que se locomoviam em terra ou na água, foram construídos tendo as medidas
e proporções matemáticas como base.
As grandes navegações, que expandiram a visão geográfica que se tinha do mundo, e
que propiciaram ao homem ganhar o planeta, foram feitas utilizando-se de inúmeros cálculos,
permitindo sair do velho mundo (Europa) e chegar ao novo mundo (América). Esses cálculos,
baseados em muita trigonometria, trabalhavam com os mapas, na época bastante rudimentares,
já que não conheciam o resto do mundo e utilizavam da Matemática para se localizarem
(MUCELIN, 2006).
Os navegadores utilizavam o astrolábio; aparelho semelhante ao teodolito que se usa na
maioria das escolas atualmente, que de acordo com a literatura teria sido inventado por volta
do ano 150 a.C., provavelmente pelos gregos e aperfeiçoado mais tarde pelos árabes. Tratava-
se de um instrumento composto de dois discos, um deles representava a superfície terrestre,
com linhas que mostravam a latitude, a longitude, o horizonte para o observador e ainda outras
linhas que mostravam os ângulos acima do horizonte. O outro disco era um mapa simples do
céu que mostrava as estrelas e permitia a orientação aos navegadores.
Nesse sentido, os aventureiros, faziam a leitura do mapa no astrolábio, usavam régua e
compasso e traçavam possíveis rotas para seus itinerários. Utilizavam de trigonometria para
calcular a distância até seus destinos e também quais os ângulos deveriam ser considerados nas
manobras das embarcações, ou seja, a Matemática auxiliando-os na tarefa de descobrir novas
terras. Nesses cálculos utilizavam provavelmente escalas para ter uma ideia de onde se
encontravam e quanto ainda restava de caminho a seguir até seus destinos, caso não fosse ele
desconhecido.
O astrolábio também foi muito utilizado na agrimensura para medir a altura de
montanhas, por exemplo, utilizando-se de processo parecido ao que utilizou Tales para medir a
altura da famosa pirâmide de Quéops, utilizando-se da sombra. Esse feito, mesmo tendo sido
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realizado com os parcos recursos da época, resultou no cálculo da altura da pirâmide com uma
pequena margem de erro3.
Na cartografia, que é uma parte da Geografia, utilizam-se os conhecidos mapas. Para
Martins, Bigotto e Vitiello (2010), qualquer mapa é uma representação geométrica plana
bastante simplificada da superfície terrestre ou de uma parte dela, ou seja, qualquer mapa é uma
representação matemática da superfície terrestre geográfica que fica muito bem representada e
serve para que os viajantes se localizem com facilidade. São elementos indispensáveis: os
símbolos, a orientação e a escala. Os símbolos podem variar dependendo do tema que está sendo
tratado no mapa. A orientação, serve para posicionar o mapa de modo a indicar os pontos
cardeais. Por sua vez, a escala, tem a finalidade de passar uma ideia do espaço que está sendo
representado em termos proporcionais.
Quando se busca saber, por exemplo, qual é a distância de um local a outro que está
representado em um mapa, como provavelmente faziam os grandes navegadores, usa-se da
ciência Matemática para resolver o problema. Todo mapa possui uma escala, que nada mais é
do que uma relação matemática. Por exemplo; quando um mapa mostra em sua legenda, uma
pequena anotação de 1:500 000 (que se lê: um por quinhentos mil), isso significa que 1
centímetro no mapa corresponde a 500 000 centímetros na realidade. Se o mapa mostrar 1:2
500 000 (que se lê: um por dois milhões e quinhentos mil), cada centímetro do mapa, na
realidade corresponde a 2 milhões e 500 mil centímetros.
Ainda em se tratando de mapas, a sua produção depende da Matemática, no que se refere
à sua forma geométrica. Isso fica evidente quando se observam alguns dos estados que
compõem os países da América do Norte, por exemplo, cujas divisas são traçadas por linhas
praticamente retas que formam verdadeiros polígonos irregulares4. Como exemplo pode-se citar
a Província de Saskatchewan, cuja capital é Regina, no Canadá, esta Província é praticamente
um quadrilátero5 visto de muito longe, ao aproximar um pouco se percebe que ele estaria mais
para um pentágono6 irregular.
Podem ser citadas ainda, províncias como do Colorado e de Wyoming, que formam
retângulos7 quase perfeitos, ou ainda Utah que em seu delineamento forma um hexágono8

3
Atividades semelhante à essa, são repetidas nas escolas até os dias atuais.
4
Polígono é uma figura plana limitada por vários ângulos e lados, é uma figura fechada.
5
Polígono de quatro lados.
6
Polígono de cinco lados.
7
Polígono de quatro lados, sendo, geralmente, lados iguais dois a dois e com quatro ângulos retos.
8
Polígono de seis lados.
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irregular. Isso pode ser constatado facilmente observando qualquer mapa mundial, onde fica
evidente a geometria, que é uma parte da Matemática, presente na Geografia.
Não obstante, quando a Geografia se ocupa em estudar a população, o faz sob inúmeros
aspectos, por exemplo: ao falar da constituição do povo brasileiro em termos de cor de pele,
Martins, Bigotto e Vitiello (2010), destacam que é constituída de 48,8% de brancos, 43,8% de
pardos, 6,5% de negros e 0,9% de amarela/indígena/sem declaração. Com esses dados é
possível construir um gráfico para mostrar a diferença numérica entre os indivíduos brasileiros
e suas corres de pele, o que não deixa de ser Matemática.
Por meio da aplicação da Matemática na Geografia, é possível também demonstrar o
aumento ou a diminuição de uma população, bem como a densidade demográfica (concentração
de pessoas em um determinado espaço ou porção de terra). A densidade demográfica de
qualquer região nada mais é do que uma razão, uma divisão matemática, cuja fórmula é
representada a seguir, onde: dd é a densidade demográfica, calculada tomando-se a população
total, dividindo-se pelo perímetro, que é dado em quilômetros quadrados.

𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 ℎ𝑎𝑏𝑖𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒𝑠
𝑑𝑑 =
á𝑟𝑒𝑎

Segundo Martins, Bigotto e Vitiello (2010), os países mais populosos do mundo em


2009, eram, em primeiro lugar, China com 1 345 milhões de habitantes, tendo um espaço
territorial de 9 596 961 km2. Em segundo lugar a Índia, com uma população de 1 198 milhões
de habitantes e com uma área territorial de 3 287 590 km2. Estes países eram seguidos por
Estados Unidos com 314 milhões de pessoas e área de 9 363 520 km2, Indonésia com 23 milhões
de pessoas e com área de 1 904 569 km2 e por fim, o Brasil, com 193 milhões de pessoas com
uma área de 8 514 876 km2.
Significa dizer que tratam-se de países com número de habitantes e área diferentes,
fazendo com que alguns sejam populosos e povoados e outros, embora populosos não são
necessariamente povoados. Essa diferenciação é dada justamente pelos indicadores da
densidade populacional, ou seja, quanto maior a densidade populacional, mais povoado será o
país.
Para obter a densidade demográfica no Brasil em 2009, por exemplo, efetuam-se os
cálculos, tomando-se o número de habitantes, dividindo pela área territorial: ou seja,
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193.000.000 pessoas em uma área de 8.514.876 km2, conforme representado nas equações a
seguir:
193000000
𝑑𝑑 =
8514876
ℎ𝑎𝑏
𝑑𝑑 = 22.66
𝑘𝑚2

Dessa forma, a densidade demográfica no Brasil, em 2009, era de 22.66 hab/km²,


considerada baixa. Importante lembrar que trata-se de uma média, pois há regiões mais
povoadas (Região Sudeste), onde esse número é maior, e outras onde a densidade é menor
(Região Norte), de sorte que o Brasil, embora seja considerado um país populoso, não é
densamente povoado.
Estudos geográficos utilizando-se de dados matemático/estatísticos permitem aos
governos definirem planos e projetos sociais, adequados a cada realidade regional. Neste
aspecto, cabe mencionar dados censitários coletados em períodos decenais pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que para além da simples contagem da população,
coletam dados diversos, que resultam em indicadores sociais e econômicos da população
brasileira.
Esses indicadores servem para balizar diversas ações, tanto governamentais quanto
empresariais, uma vez que é possível definir, por exemplo: o valor da terra urbana; áreas
potencialmente promissoras do ponto de vista econômico; viabilidade econômica para
instalação de empreendimentos comerciais ou industriais; potencial de consumo;
disponibilidade de mão de obra, entre outros aspectos, como o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH), calculado à partir de dados fornecidos sobre escolaridade média da população;
expectativa de vida e renda per capita, esta última obtida pela divisão do Produto Interno Bruto
(PIB), representado pelo produção total de um país, pelo total da população (população
absoluta).
Se a intenção é saber a renda per capita de um estado, região ou município, procede-se
da mesma maneira, de acordo com a fórmula apresentada a seguir:

𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙
𝑅𝑃𝐶 =
𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 ℎ𝑎𝑏𝑖𝑡𝑎𝑛𝑡𝑒𝑠
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Conforme anteriormente mencionado, a Matemática também é utilizada para calcular


os índices de natalidade e mortalidade de um município, de uma região, de um estado ou até
mesmo de um país. Segundo Martins, Bigotto e Vitiello (2010), a natalidade é calculada
multiplicando-se o número de nascimentos em um ano por 1000, o resultado de tal cálculo é
dividido pelo número de pessoas deste mesmo local e ano, conforme demonstrado na fórmula
a seguir:

𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 𝑛𝑎𝑠𝑐𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜𝑠 𝑥 1000


𝑁=
𝑝𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙

Já a mortalidade é calculada pelo número de óbitos (pessoas mortas), multiplicado por


1000, o resultado é dividido pela população total do local em estudo, conforme também
demonstra a fórmula seguinte:

𝑛ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 ó𝑏𝑖𝑡𝑜𝑠 𝑥 1000


𝑀=
𝑝𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙

Ainda em se tratando de população, a Geografia utiliza-se da matemática para outros


cálculos populacionais como a taxa de fecundidade (número de filhos por mulher em idade
fértil); índice de escolaridade média; expectativa média de vida por região, entre outras. Enfim,
inúmeras outras fórmulas matemáticas usadas para provar conceitos geográficos, além de
gráficos e outros cálculos que unem essas duas disciplinas, tornando os conhecimentos de
ambas mais atrativos, mais interessantes e, por isso, com melhores possibilidades de
aprendizagem.

Considerações Finais

É importante considerar esta relação entre a Matemática e a Geografia principalmente


no ambiente escolar, já que as teorias educacionais prezam, atualmente, pela
interdisciplinaridade, ou seja, de que os professores não ensinem seus conteúdos apenas
“fechados” em suas ciências, conhecimentos separados como se fossem caixas ou gavetas que
ora se abra uma, depois outra, posteriormente outra, e assim sucessivamente.
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Neste contexto, ao recorrer-se aos fundamentos dos conhecimentos de todas as ciências,


observa-se que desde o início da civilização humana, os conhecimentos adquiridos, pesquisados
e experimentados, não estavam, de forma alguma, separados. Quando um homem conseguiu,
por exemplo, criar uma arma, uma lança para caçar seu alimento, ele conhecia seu ambiente,
sua geografia, sabia em que terreno estava atuando e ao mesmo tempo, por experiências, sabia
qual o ângulo certo, a força e velocidade certas para alcançar sua preza em um lançamento.
Dessa forma, calculava, matematizava sua ação para conseguir o alimento para sua subsistência.
Não obstante, ao procurar uma casa/caverna para se abrigar, além de estudar a Geografia
no entorno, considerando segurança, distância de fontes de água, de alimentos, etc., nosso
ancestral, certamente observava o tamanho da futura moradia, observava a umidade e outras
características. Ele, portanto, relacionava a Geografia com a Matemática, constantemente,
mesmo de modo inconsciente.
Na atualidade, ao planejar um simples jardim em uma casa, são utilizadas essas duas
ciências em parceria para deixar o ambiente mais belo, mais aconchegante. Primeiro o relevo
escolhido para construir a casa e consequentemente o jardim é muito importante, o tipo da
grama, as espécies de plantas escolhidas, que darão a harmonia da paisagem. A Matemática
entra com a forma do jardim, a área plantada, as distâncias entre plantas e os possíveis
ornamentos, estatuas, chafarizes, etc.
No cotidiano, quando um indivíduo, ao pensar em um passeio com a família,
normalmente o planeja, considerando inúmeras variáveis: a distância que irão ter que percorrer;
o meio de transporte que será utilizado; o tempo necessário para chegar ao destino; os custos
de viajem; os locais de estadia; enfim, “pura matemática”. No entanto, ao realizar a escolha,
sem dúvida, o indivíduo deve levar em conta o relevo; o clima; a vegetação; as praias; os rios;
e outros aspectos dos locais que pretende visitar, enfim, “pura Geografia”.
Estes são apenas alguns dentre tantos exemplos de relações entre estas duas ciências,
fazendo-nos pensar sobre a necessidade destes conteúdos serem trabalhados conjuntamente,
visando tornar os conhecimentos de ambas mais interessante para o aluno. Pela
interdisciplinaridade, o professor certamente conseguirá melhores resultados, já que os alunos
deverão perceber que toda ciência, independentemente de ser exata ou humana, não tem
condições de explicar sozinha o complexo funcionamento deste planeta.

REFERÊNCIAS
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MARTINS, M. A.; BIGOTTO, J. F.; VITIELLO, M. A. Geografia: sociedade e cotidiano 1 -


fundamentos. São Paulo: Escala Educacional, 2010.

MARTINS, M. A.; BIGOTTO, J. F.; VITIELLO, M. A. Geografia: sociedade e cotidiano 2 –


espaço brasileiro. São Paulo: Escala Educacional, 2010.

MARTINS, M. A.; BIGOTTO, J. F.; VITIELLO, M. A. Geografia: sociedade e cotidiano 3 –


espaço mundial. São Paulo: Escala Educacional, 2010.

MUCELIN, N. I. S. Venha navegar por outros mares. Matemática Ensino Médio. Curitiba:
SEED-PR, 2006.

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