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Francisco Marques

Muitas coisas
poucas palavras
A arte de ensinar e aprender

www.estevaomarques.com
Das idéias e da paixão
Iniciei a leitura da “Didá0ca Magna”, de Comênio, como quem Bastava um novo parágrafo, um pequeno espaço entre as
vai fazer uma solene reverência ao monumento que marcou linhas, a mínima janela, e os meus olhos de leitor voavam para as
profundamente a história da educação e a história das reformas minhas oficinas sobre “brinquedos e brincadeiras”, naquelas
sociais. escolas, com aqueles professores.

Logo na abertura, entretanto, bem ali, na segunda página, a Bastava o esforço sen0mental-muscular de virar uma página e
minha leitura solenemente se espa0fou no chão: os meus olhos de leitor reviravam futuros breves e longos.

“A proa e a popa da nossa Didá0ca será inves0gar e descobrir Quanto mais eu procurava situar historicamente as idéias do
o método segundo o qual os professores ensinem menos e os pensador Comênio, mais o professor Comênio me situava
estudantes aprendam mais.” historicamente no meu Brasil planetário.

Atarantado, alvoroçado, saí catando os cacos daquela idéia Numa bela manhã de chuva, estava matutando, batucando na capa
desafiante, bem-humorada, contemporânea, futurista. da “Didá0ca Magna”:

A par0r daí, a leitura foi uma luta de espadas, um trapezape - Comênio foi um cidadão universal, um dos precursores do diálogo
constante: Comênio me provocava com a sua vitalidade e eu entre religiões, povos e culturas. É natural que ele queira conhecer
sublinhava frases e circulava palavras, Comênio me encantoava o nosso mundo de hoje.
com suas metáforas da natureza e eu anotava nas margens e
Então, para atender ao seu desejo, passei a ler a “Didá0ca Magna”
marcava as páginas com pedaços de barbante.
nos ônibus, nos meus trajetos para as escolas. Assim, enquanto
A minha leitura não fugia do combate, mas teimava em meus olhos de leitor, distraídos, transbordavam das páginas,
escapulir do livro... Comênio observava, com olhos de criança, cada detalhe da cidade,
cada gesto das pessoas.
Bastava um simples ponto final e os meus olhos de leitor
puxavam as lembranças da minha apresentação, ontem mesmo, Numa destas viagens, tomei coragem e fiz a proposta:
naquela escola, com aquelas crianças.
1
- Professor Comênio, o senhor não gostaria de falar para os
professores de hoje? Podemos combinar o seguinte. Na primeira
parte, faço a minha apresentação: conto uma história e mostro
alguns brinquedos. Na segunda parte, o senhor apresenta as suas
idéias.

Sem 0rar os olhos da cidade, Comênio respondeu com uma


pergunta:

- E o que eu teria a dizer aos professores de hoje?

Respondi comenianamente: Para conhecer um pouco mais


- “Muitas coisas em poucas palavras”. Na verdade verdadeira, sobre a palestra cantarolante:
jardineiro Comênio, quero que os professores não apenas ouçam as
suas idéias, quero que eles vejam a sua paixão. https://www.youtube.com/watch?v=ONRLr6RIQGs
E assim nasceu esta mistura de palestra cantarolante, peça
radiofônica e livro em voz alta.

Chico Francisco dos Bonecos Marques

2
INDICAÇÕES
Das idéias e da paixão Canção: Tempo perguntou pro tempo

Canção: A árvore da montanha (pena e flecha)

Muitas coisas, poucas palavras Quadro 5: Fervor e paixão

Canção: Não sei se é fato ou se é fita

Primeira parte: A chegada Canção: A árvore da montanha (fruta e árvore)

Quadro 1: Abraços

Canção: Salve o sol Terceira parte: A arte de ensinar

Quadro 6: Preparar a terra

Segunda parte: A inteligência Canção: Ora põe aqui o seu pezinho

Quadro 2: As sementes Quadro 7: Palavras sólidas

Canção: Não sei se é fato ou se é fita Canção: Parece coisa do outro mundo

Canção: A árvore da montanha (galho e ninho) Quadro 8: Fazer fazendo

Quadro 3: Os cinco mensageiros Canção: Quanto mais a gente brinca

Canção: A árvore da montanha (ovo e pássaro) Quadro 9: A terra das brincadeiras

Quadro 4: Pomar e jardim Canção: Meu cavalinho

3
Quadro 10: A u0lidade das coisas Quinta parte: A despedida

Canção: Bem-te-vi quer que eu te veja Quadro 17: Lentamente

Quadro 11: Ensinar a perguntar Canção: Muitas coisas, poucas palavras

Canção: Cada coisa é uma coisa Canção: A arte de ensinar

Quadro 12: Ensinar a ensinar

Canção: O poema... O poema é a fruta As fontes comenianas

Quadro 13: A fonte da inteligência

Canção: O meu coração voou pelo céu A obra de uma vida

Quadro 14: O Tucano e o Pavão e a vitalidade de uma obra

Canção: Tum Tum jacu0nguelê

Bibliografia

Quarta parte: A disciplina

Quadro 15: O Sol A montagem da peça

Canção: Salve o Sol (Entrevista com Francisco Marques

Quadro 16: Equilíbrio delicadíssimo Vírgula Chico dos Bonecos)

Canção: Foi foi foi

4
Muitas coisas,
poucas palavras

(A oficina do professor Comênio


e a arte de ensinar e aprender)
Francisco Marques

(Chico dos Bonecos)

v
Primeira parte:

A chegada
Quadro 1: Abraços
Vocês não imaginam a minha alegria quando recebi o convite justamente deste livro que eu escolhi para vocês, pais e
para este encontro. É uma dessas alegrias que a gente leva para professores, algumas palavras simples e breves.
toda a eternidade. Agradeço muito, muikssimo.
Bate o sino,
Meu nome é João Amós Comênio. Nasci no coração da
bate o sino,
Europa, na região da Morávia, no dia 28 de março de 1592.
dim dém dom,
- Mil quinhentos e noventa e dois?
dim dém dom.
Já posso imaginar o que vocês estão imaginando:

- E eu heim... Trazer alguém de uma época tão distante para


falar sobre a nossa escola de hoje? Bate o sino sem parar,
Os mais de quatrocentos anos que nos separam são quase bate o sino sem parar,
nada diante dos abraços que nos aproximam e nos emocionam.
Primeiro abraço: assim como vocês, sou professor e dediquei a dim dém dom,
minha vida à arte de todas as artes - a arte de ensinar. Segundo
dim dém dom.
abraço: ajudei a criar esta ins0tuição em que vocês trabalham aqui
e agora – a escola para todos, a escola democrá0ca, a escola (Canção de domínio público)
pública.

Durante muitos anos fiquei ruminando várias ideias que


brotavam do meu trabalho em sala de aula. Escrevi e reescrevi
essas ideias durante muitos e muitos anos. Em 1657, finalmente,
felizmente, tomei coragem para publicar o meu livro “Didá0ca
Magna” – que também poderia se chamar “Didá0ca da Vida”. E é
vii
Segunda parte:

A inteligência
Quadro 2: As sementes
Para começo de conversa, Durante alguns minutos, vamos colocar as nossas opiniões para
descansar e vamos usar apenas os olhos para ver, os ouvidos para
para a conversa começar:
ouvir e a razão para julgar.
respirando profundamente,
Combinado? Combinado de fita ou de fato?
profundamente respirar...
Não sei se é fato
Na nossa escola, os alunos vão aprender com alegria – e nós,
ou se é fita.
professores, vamos ensinar com alegria.
Não sei se é fita
Já posso imaginar o que vocês estão imaginando:
ou se é fato.
- Ei ai ai... Começou mal, Comênio, começou mal... O que significa
isso, professor Comênio? O senhor está sonhando? O fato é que ela me fita.

Por falar em sonho... Isso me fez lembrar de uma pergunta de Ai, me fita, mesmo, de fato.
adivinhação. O que é o que é? Quais as partes do corpo humano
De fato, de fita, de fita de fato.
que mais trabalham?
(Canção de domínio público)
Heim? Heim?

As partes do corpo humano que mais trabalham são as nossas


opiniões. As nossas opiniões... Bem... Onde estávamos?
Vamos fazer um combinado?

ix
- O senhor estava sonhando, professor Comênio. A árvore da montanha.

Ah, sim... Não! Isso não é sonho. Isso é, simplesmente, natureza. Olê aí aô.

- Natureza?! A árvore da montanha.

Quando nascemos, trazemos no corpo a semente do movimento: Olê aí aô.


pegar, puxar, enga0nhar, andar...

Quando nascemos, trazemos na inteligência a semente do


Esta árvore tem um galho.
conhecimento: inves0gar, experimentar, falar, cantar...
Ó que galho! Belo galho!
A natureza dá a semente do movimento, mas não dá os
movimentos. Ai ai ai que amor de galho.
A natureza dá a semente do conhecimento, mas não dá os O galho da árvore.
conhecimentos.

A minha vida de professor, cada dia, cada minuto, foi mo0vada por
esse desafio: A árvore da montanha.

Ora, ora! Em se tratando do corpo e dos movimentos, a criança Olê aí aô.


aprende tantas coisas, e tão rapidamente, com tanta imaginação e
A árvore da montanha.
energia. Ora, ora, carambola! Em se tratando da inteligência e dos
conhecimentos, a criança não poderia aprender assim também: Olê aí aô.
tantas coisas, e tão rapidamente, com tanta imaginação e energia?

x
Este galho tem um ninho.

Ó que ninho! Belo ninho!

Ai ai ai que amor de ninho.

O ninho do galho.

O galho da árvore.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

(Canção de domínio público

- canção com gestos)

xi
Quadro 3: Os cinco mensageiros
- Acorda, Comênio, acorda! Con0nua sonhando? Do jeito que o A árvore da montanha.
senhor fala, professor Comênio, parece tudo muito fácil.
Olê aí aô.
Isso não é fácil. Isso é, simplesmente, a nossa arte de ensinar.
A árvore da montanha.
A inteligência da criança quando entra no mundo é como a
Olê aí aô.
semente da árvore quando entra na terra.

A semente ainda não é a árvore, mas a árvore já está na semente.


Com a luz, o calor e a umidade, a semente, agasalhada na terra, se Este ninho tem um ovo.
desdobra em raízes e brotos. Os brotos se espreguiçam em ramos e
folhas – e despertam flores e frutos. Ó que ovo! Belo ovo!

E tem mais... Ai ai ai que amor de ovo.

A inteligência da criança quando entra no mundo vem O ovo do ninho.


acompanhada de cinco mensageiros: ver, ouvir, saborear, pegar,
O ninho do galho.
cheirar. Atraídos pelo desejo de aprender, a inteligência e seus
mensageiros se lançam pelo mundo afora. O galho da árvore.

E aí? Sen0ram a força da natureza?

O nosso corpo nasce com o desejo de se movimentar. E o que nós


fazemos, pais e professores? Ensinamos o corpo a se movimentar.

A nossa inteligência nasce com o desejo de aprender. E o que nós


fazemos, pais e professores? Ensinamos a inteligência a aprender.

xii
A árvore da montanha.

Olê aí aô.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

Este ovo tem um pássaro.

Ó que pássaro! Belo pássaro!

Ai ai ai que amor de pássaro.

O pássaro do ovo.

O ovo do ninho.

O ninho do galho.

O galho da árvore.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

xiii
Quadro 4: Pomar e jardim
- Calma lá, Comênio, calma lá! Tudo bem. Ensinamos a inteligência
a aprender. Mas... Professor Comênio, o senhor bem sabe que
Tempo perguntou pro tempo:
existem inteligências e... Hum... Inteligências...
-Quanto tempo o tempo tem?
A professora Natureza já nos ensinou que toda pessoa é um
organismo de sabedoria, toda pessoa é um resumo do universo. Tempo respondeu pro tempo
Portanto, a nossa escola, a nossa Oficina de Pessoas, deve ser como que o tempo tem tanto tempo
o sol que ilumina e aquece a terra – para que as sementes, todas as
sementes, possam viver, verdejar, florescer, fru0ficar. quanto tempo o tempo tem.

O que desejamos para o nosso pomar? Desejamos árvores que


produzem frutos precoces, desejamos árvores que produzem frutos
(Canção de domínio público)
de meia estação e desejamos árvores que produzem frutos de fim
de estação. Fruto bom é o fruto no seu tempo. Ora, ora, E tem mais...
carambola! Por que, então, no jardim das letras, queremos apenas
inteligências precoces e velozes? A inteligência da criança se apresenta em diferentes formas. Uma
criança gosta de ler, outra criança gosta de matemá0ca. Uma
A inteligência, portanto, se apresenta em diferentes tempos. criança adora teatro, outra criança adora música. Cada criança é
uma criança. Cada criança tem o seu engenho.

O professor ensina todas as coisas para todos os alunos, mas uma


coisa será de grande interesse para aquela criança – enquanto
outra criança vai se interessar enormemente por outra coisa. O
professor aprende a descobrir o talento de cada aluno, e aprende a
alimentar, generosamente, o engenho de cada criança.

xiv
O que desejamos para o nosso jardim? Desejamos flores e plantas A árvore da montanha.
de diferentes cores e texturas, de diferentes formatos e cheiros. E é
Olê aí aô.
justamente esta diversidade que faz do nosso jardim um espetáculo
para os olhos. A árvore da montanha.

Olê aí aô.

A árvore da montanha.

Olê aí aô. Esta pena tem uma flecha.

A árvore da montanha. Ó que flecha! Bela flecha!

Olê aí aô. Ai ai ai que amor de flecha.

A flecha da pena.

Este pássaro tem uma pena. A pena do pássaro.

Ó que pena! Bela pena! O pássaro do ovo.

Ai ai ai que amor de pena. O ovo do ninho.

A pena do pássaro. O ninho do galho.

O pássaro do ovo. O galho da árvore.

O ovo do ninho.

O ninho do galho. A árvore da montanha.

O galho da árvore. Olê aí aô.

A árvore da montanha.

Olê aí aô.

xv
Quadro 5: Fervor e paixão
- Tudo bem, Comênio, tudo bem. Inteligências em diferentes O problema está em mim, no professor, ou na minha maneira de
tempos, em diferentes formas. Mas... Professor Comênio, e quando ensinar - mas geralmente está grudado nos dois.
o aluno simplesmente não tem vontade de aprender? E aí,
Um, dois. Agora, depois. Três, quatro. De fita, de fato.
jardineiro Comênio?

Esta pergunta me fez lembrar de outra pergunta. O que é o que é?


Qual o doce mais doce de todos os doces? Não sei se é fato
Vou dar uma dica: é o doce que estamos experimentando desde o ou se é fita.
início desta viagem.
Não sei se é fita
Heim? Heim?
ou se é fato.
O doce mais doce de todos os doces é filosofar. Hum... Que delícia!
Filosofar... O fato é que ela me fita.

Nós, pais e professores, precisamos defender a verdade com as Ai, me fita, mesmo, de fato.
armas da própria verdade.
De fato, de fita, de fita de fato.
Se a criança nasce com a semente do conhecimento, se a sua
inteligência e seus cinco mensageiros estão por aí, cheios de
energia, repletos de imaginação, desbravando o mundo... Como (Canção de domínio público)
pode ser possível a criança não ter vontade de aprender? Heim?
Heim? Como?

O problema, claro, claríssimo, não está no aluno.

xvi
Como enfrentar o problema quando ele está grudado no professor? A árvore da montanha.

Aqui, o desafio envolve habilidades subje0vas, misteriosas. Olê aí aô.

Por exemplo... A árvore da montanha.

O professor, que ensina com fervor e paixão, desperta paixão e Olê aí aô.
fervor nos alunos.

O professor, que se encanta e se entusiasma com o conhecimento,


Esta flecha tem uma fruta.
desperta nos alunos o entusiasmo e o encanto pelo conhecimento.
Ó que fruta! Bela fruta!
E agora gudora de gurrunfora de maracutora xiringabutora?
Ai ai ai que amor de fruta.
Como despertar, dentro de mim, a paixão e o fervor? Como
despertar, dentro de mim, o entusiasmo e o encanto? Heim? Heim? A fruta da flecha.
Como?
A flecha da pena.
Paixão, fervor, entusiasmo, encanto... São habilidades subje0vas e
misteriosas, necessárias e decisivas. A pena do pássaro.

- Como é que é? O pássaro do ovo.

São habilidades subje0vas, misteriosas, necessárias, decisivas. O ovo do ninho.

O ninho do galho.

O galho da árvore.

xvii
A árvore da montanha. A árvore da montanha.

Olê aí aô. Olê aí aô.

A árvore da montanha. A árvore da montanha.

Olê aí aô. Olê aí aô.

Esta fruta tem uma árvore.

Ó que árvore! Bela árvore!

Ai ai ai que amor de árvore.

A árvore da fruta.

A fruta da flecha.

A flecha da pena.

A pena do pássaro.

O pássaro do ovo.

O ovo do ninho.

O ninho do galho.

O galho da árvore.

xviii
Terceira parte:

A arte de ensinar
A arte de ensinar
Quadro 6: Preparar a terra
- Chega de mistérios, professor Comênio. Tudo bem... Se o aluno
não tem vontade de aprender, o problema pode estar no professor.
Mas... Senhor Comênio, e quando o problema está grudado na
nossa maneira de ensinar? E aí, misteriosíssimo Comênio?

Com a sua arte de plantar, o jardineiro prepara a terra para que a Ora põe aqui, ora põe aqui o seu pezinho.
semente da árvore se sinta acolhida e agasalhada. E a terra,
acolhedora, aconchegante, faz a semente da árvore germinar. Ora põe aqui, ora põe aqui ao pé do meu.

Com a sua arte de ensinar, o professor prepara o aluno para que a E ao 0rar, ao 0rar o seu pezinho,
semente do conhecimento se sinta acolhida e agasalhada. E o
ai cada qual, cada qual fica c’o seu.
aluno, entusiasmado, encantado, faz a semente do conhecimento
germinar.

A arte de ensinar envolve habilidades obje0vas, claras como os (Canção de domínio público)
dedos das mãos: una, duna, tena, catena, rabo de pena.

A arte de ensinar envolve habilidades simples como dar um passo


seguido de outro passo. Simples como beber um copo d’água...

A arte de ensinar é uma... Uma dança!

Agora, com vocês, os sete passos da ensinança.

xx
Quadro 7: Palavras sólidas
Primeiro passo. Parece coisa do outro mundo,

O professor leva a criança a conhecer as coisas e só depois fala mas é coisa tão comum.
sobre as coisas. É oito, é sete, é seis, é cinco,

Depois que as crianças 0veram tempo de ver, ouvir, saborear, é quatro, é três, é dois, é um.
cheirar e pegar as coisas, aí, sim, as palavras do professor ganham o
poder de explicar as coisas.
Nós vamos cantar agora,
E as palavras do professor são, sempre!, palavras simples, sólidas,
breves, essenciais. não deixamos pra depois.

E a voz do professor é, sempre!, uma voz clara, calma, familiar, É nove, é oito, é sete, é seis,
suave – uma voz que enche de vida todas as coisas.
é cinco, é quatro, é três, é dois.
Portanto, na nossa escola, na nossa Oficina de Pessoas, os ouvidos
devem caminhar junto com os olhos, as palavras devem caminhar
junto com as mãos e as ideias devem caminhar junto com os Não quero cantar sozinho,
gestos.
canto junt~po com vocês.
Este é o rio do conhecimento: nasce nos cinco sen0dos, corre pela
É dez, é nove, é oito, é sete,
imaginação e deságua na memória.
é seis, é cinco, é quatro, é três.

(Canção de domínio público)

xxi
Quadro 8: Fazer fazendo
Segundo passo. Quanto mais a gente brinca,

O professor ensina a fazer fazendo: a falar falando, a cantar mais a brincadeira esquenta.
cantando, a pensar pensando, a escrever escrevendo, a dançar
Não sei se são dez pras dez
dançando...
ou se são nove e cinqüenta.
A criança aprende a imitar. Imitando, aprende a inventar.
Inventando, aprende a conhecer.

Por isso, na nossa escola, na nossa Oficina de Pessoas, os alunos (Melodia de domínio público: “O sapinho da lagoa”
vão experimentar um prazer semelhante às brincadeiras de correr,
um prazer semelhante às brincadeiras de bola. Letra: Francisco Marques)

Por isso, na nossa escola, o professor ensina menos e os alunos


aprendem mais.

xxii
Quadro 9: A terra das brincadeiras
Terceiro passo. Antes de montar no cavalo, a criança transforma um cabo de
vassoura em seu cavalinho.
O professor mistura aquilo que é diver0do com aquilo que é o tema
do estudo.

A criança nasce com a semente do conhecimento – isso nós já Meu cavalinho é ligeiro igual o vento.
sabemos de cor e salteado. Agora, vem aí a grande novidade: a
Meu cavalinho já me deu muita alegria.
semente do conhecimento procura, sempre!, a terra das
brincadeiras. Meu cavalinho é igual o pensamento:
Nós, pais e professores, sabemos que as brincadeiras conduzem as está sempre em movimento
crianças para as coisas sérias.
e se chama ventania.
Por exemplo...

A criança carrega os objetos pra lá e pra cá, arruma de um jeito e


de outro, junta e separa, constrói e destrói... E realiza tudo isso com (Canção: “Meu cavalinho”
entusiasmo e prazer. E todas essas ações, por mais simples que
Compositor: Rubinho do Vale)
possam parecer, representam o esforço de uma inteligência a0va.

As crianças adoram desenhar – e os traços dos desenhos anunciam


os traços das palavras.

A criança adora cantar e declamar poesia – e o verso registrado na


memória anuncia o verso registrado no livro.

xxiii
Quadro 10: A utilidade das coisas
Quarto passo.

O professor mostra a u0lidade daquele conhecimento no co0diano Bem-te-vi quer que eu te veja.
das crianças.
Louva-a-deus quer que eu te louve.
O aluno, portanto, não aprende apenas para a escola, aprende
Quem me dera se eu caísse, Beija-flor,
também para a vida.
nos braços de quem me ouve.
Assim, ligando o conhecimento à própria vida, o aluno vai aprender
e vai sen0r que está aprendendo. O aluno vai saber duas vezes:
saber a coisa e saber que sabe.
(Melodia de domínio público: “Marcolino”

Letra: Francisco Marques)

xxiv
Quadro 11: Ensinar a perguntar
Quinto passo. Cada coisa é uma coisa,

O professor ensina a criança a perguntar. mas a sombra é diferente.

O professor incen0va, provoca e valoriza as perguntas dos alunos. Cada coisa imita a coisa,

O professor, com delicadeza e doçura, abre portas e janelas para mas a sombra engana a gente.
que a casa do conhecimento receba muitas e muitas perguntas.

Quem? Quando? O quê? Como? Onde? Por quê?


Sombra sobe na parede,
Aproveitando esta ventania de perguntas, o professor espalha
sombra se arrasta no espinho.
muitos exemplos, muikssimos. Exemplos a par0r de coisas
familiares: o espelho, a chuva, o relógio, a sombra... Para cada Pode virar gavião,
pergunta, muitos exemplos.
a sombra de um passarinho.
Assim, entre perguntas que geram respostas e perguntas que
geram novas perguntas, o aluno aprende como as coisas são – e
aprende, principalmente, o “porquê” de cada coisa. A gente mexe com os dedos,

E tem mais... a gente mexe e deduz:

Perguntas e respostas conduzem para o diálogo – e o diálogo é o A planta nasce da terra,

caminho que conduz para todos os lugares. a sombra nasce da luz.

(Melodia de domínio público: “Fui na fonte do Itororó”

Letra: Francisco Marques)

xxv
Quadro 12: Ensinar a ensinar
Sexto passo.

O professor ensina a criança a ensinar. O poema... O poema é a fruta.

A vida não é assim? Quando andamos, levantamos e abaixamos os A poesia... A poesia o sabor.
pés. Quando conversamos, ouvimos e falamos. Quando jogamos
O poema... O poema está no livro.
bola, recebemos e lançamos. Portanto, aprender e ensinar devem
acontecer ao mesmo tempo. A poesia... A poesia no leitor.
As coisas que lemos e ouvimos podem facilmente fugir da
memória. As coisas que ensinamos permanecem vivíssimas na
memória, incorporadas, claras como os dedos das mãos: una, (Melodia de domínio público: “Se essa rua fosse minha”
duna, tena, catena, rabo de pena.
Letra: Francisco Marques)
O mundo é a nossa escola. E no grande teatro do mundo, os nossos
alunos são, ao mesmo tempo, espectadores e atores.

Para superar o professor, o aluno precisa apenas de dois verbos.


Muitas coisas... Perguntar. Muitas coisas... Ensinar.

xxvi
Quadro 13: A fonte da inteligência
Sé0mo e derradeiro passo.

O professor ensina a criança a descobrir a própria fonte da O meu coração


inteligência.
voou pelo céu.
A árvore se alimenta da seiva – a seiva que ela mesma produz. Por
Subiu de vapor
isso, a árvore se desenvolve, ao mesmo tempo e vigorosamente,
para todos os lados: a raiz que se aprofunda na terra, o tronco que e desceu de papel.
avança para o céu, os galhos que se desdobram em folhas, flores e
frutos. Trouxe uma lembrança

Assim, bebendo da própria fonte, a criança aprende a abrir a na aba do chapéu:


inteligência para a compreensão das coisas, aprende a ver com os
uma rosa e um cravo
próprios olhos, aprende a sen0r com o próprio coração.
e um favo de mel.

(Canção: “Favo de mel”

Compositor: Rubinho do Vale)

xxvii
Quadro 14: O Tucano e o Pavão
Uma fábula de Esopo O Tucano queria par0cipar da festa do Pavão. Estava ali matutando,
batucando: “Bico, bico, siribico, quem te deu tamanho bico?” E
vocês bem sabem que nessa terra em se batucando tudo dá.
- Devagar com os passos, dançarino Comênio! Como é que é?
Descobrir a própria fonte da inteligência?! E eu heim... Este sé0mo
passo... Acho que eu não entendi. Ou melhor: acho que o senhor Tum tum jacu0nguelê,
não explicou bem, professor Comênio!
jacu0nga araubê,
Então, vou explicar de outra maneira. Deixe-me ver... Abrir a
jacu0nga 0nga.
inteligência para a compreensão das coisas... Ver com os próprios
olhos... Sen0r com o próprio coração... Hãh! Isso me fez lembrar de Uê uê saruê ubá,
uma fábula de Esopo. Aliás, para qualquer ocasião, sempre existe
uma fábula de Esopo. E sempre de acordo com a momentosa jacu0nga araubê,
tradição milenar e planetária: Quem conta um conto... Quase.
jacu0nga 0nga.
Quem conta um conto omite um ponto e aumenta três.

De repente, de rompante, nesse instante de puf-puf, o Tucano


encontrou uma pena de Pavão. Una, duna, tena, catena, rabo de
pena.

Não! Não me digam? que vocês estão pensando isso que eu estou
pensando que vocês estão pensando.

Assim, espetadíssimo, o Tucano desabou na polvorosa festa dos


pavões. Junto com ele, desabou... O silêncio.
xxviii
Os pavões, aparvalhados, arrodearam: O Tucano entrou na lagoa do Mundaú e caminhou, cabisbaixo, para
as regiões tenebrosas das águas profundas...
- A pena é de Pavão.
De repente, de rompante, nesse instante de puf-puf, o Tucano
- Mas esse bico...
encontrou, no espelho das águas, a sua imagem ridícula,
- Aí tem confusão. espetadíssima. Una, duna, tena, catena, rabo de pena.

- Se isso não é Tucano... O Tucano quase morreu de tanto rir – ainda bem que os sapinhos
vieram acudir.
- Também não é Pavão.
Livre das penas de Pavão, o Tucano tornou a desabar na polvorosa
O Tucano, claro, claríssimo, do jeito que chegou, saiu, zarpou, zuniu festa dos tucanos. Junto com ele, desabou... A música: “Bico, bico,
– “rapido como um relampago”. siribico, quem te deu tamanho bico?” E vocês bem sabem que
nessa terra em se batucando tudo dá.
E o Tucano, finalmente, felizmente, desabou na polvorosa festa dos
tucanos. Junto com ele, desabou... O silêncio.

Os tucanos, encasquetados, arrodearam: Tum tum jacu0nguelê,

- O bico é de Tucano. jacu0nga araubê,

- Mas essa pena... jacu0nga 0nga.

- Deve ser um engano. Uê uê saruê ubá,

- Se isso não é Pavão... jacu0nga araubê,

- Também não é Tucano. jacu0nga 0nga.

O Tucano, claro, claríssimo, do jeito que chegou, saiu, zarpou, zuniu


– “rapido como um relampago”.
(Canção de domínio público)
Desapontado, desesperado, o Tucano decidiu encerrar essa fábula
antes do fim.
xxix
Quarta parte:

A disciplina
Quadro 15: O Sol
- Comênio, Comênio! O que significa isso, professor Comênio? Até
agora não ouvimos uma palavrinha sobre a senhora Disciplina,
Salve o Sol,
senhor Comênio!
salve o Sol,
Na minha terra tem um ditado: “Uma escola sem disciplina é um
moinho sem água.” o Sol da nossa terra,
Mais uma vez vamos aprender com a professora Natureza. o Sol da nossa terra.
O que o sol oferece para as plantas que estão crescendo? Oferece
luz e calor sempre. Sempre calor e luz.
Vem surgindo,
Para a disciplina crescer e se desenvolver, nós, pais e professores,
devemos ser, sempre!, exemplos constantes de todos os bons vem surgindo,
comportamentos. Nós, pais e professores, devemos ser, sempre!,
atrás da verde serra,
modelos vivos de todas as boas a0tudes.
atrás da verde serra.
O calor dos exemplos constantes e a luz dos modelos vivos fazem a
disciplina viver, verdejar, florescer, fru0ficar.

(Canção de domínio público)

xxxi
Quadro 16: Equilíbrio delicadíssimo
- Calma lá, Comênio, calma lá! Senhor Comênio, chega uma hora Se estamos desenvolvendo adequadamente a nossa arte de
que o sol não dá conta do recado. E a paciência tem limite, ensinar, é claro que as crianças vão se encantar com os novos
professor Comênio! conhecimentos.

A disciplina exige, dos pais e dos professores, uma vigilância Respirando profundalentamente...
permanente. Por exemplo...
A disciplina se alimenta deste equilíbrio delicadíssimo: a severidade
O professor vai repreender o aluno que cometeu um erro de como manifestação de afeto, repreender com simplicidade e
comportamento. O professor vai repreender o aluno para que ele sinceridade, modelos vivos, exemplos constantes... Sempre calor e
não erre mais. luz. Luz e calor sempre.

Por isso, a repreensão deve ser feita com simplicidade e Felizes os professores que constroem este equilíbrio. Felizes as
sinceridade, para que a criança perceba que é para o seu bem e crianças que aprendem com estes professores. Felizes os pais que
para o bem de todos – para que a criança perceba que a confiam o seu bem mais precioso a estes preciosos professores.
repreensão é movida pelo afeto.

Portanto, para a senhora Disciplina, a postura afetuosa não exclui a


postura severa – e a severidade não elimina o afeto.

Atenção pão serramatutão ca0biribão fifirififão!

A severidade deve ser exercida apenas em relação aos


comportamentos, às a0tudes. A severidade jamais deve ser
exercida em relação aos estudos. Por quê?

Ora, ora, carambola! Se estamos desenvolvendo adequadamente a


nossa arte de ensinar, é claro que os estudos vão atrair os alunos.

xxxii
Foi, foi, foi,

foi só pra você

que eu troquei a letra

da canção de adormecer.

(Melodia de domínio público: “Boi da cara preta”

Letra: Francisco Marques)

xxxiii
Quinta parte:

A despedida
Quadro 17: Lentamente
A nossa arte de ensinar é uma estrada segura, clara, cercada de Agradeço a paciência que vocês 0veram com este professor de
infinitas coisas para se ver, ouvir, saborear, pegar, cheirar. Por isso, mais de quatrocentos anos de idade – uma pessoa que não vê
nessa estrada caminhamos devagar, calmamente, lentamente. diferença alguma entre ensinar e aprender.

Nessa estrada uma coisa vem depois da outra. Portanto, a demora Já posso imaginar o que vocês estão imaginando:
para consolidar um conhecimento não é sinônimo de perda de
- Professor Comênio, por obséquio, desta longa viagem, o que o
tempo. Ao contrário, é uma economia de tempo, porque, a par0r
senhor gostaria, afinal, que ficasse especialmente guardado na
daí, um novo conhecimento pode ser construído com segurança.
nossa lembrança?
Por isso, nessa estrada, caminhamos rapidamente – lentamente.
Certa vez, os nossos alunos criaram uma bandeira para a nossa
E, por falar em tempo, e por falar em estrada, chegamos ao fim
escola. E no meio de tantos desenhos, bem ali, no centro da grande
desta caminhada.
bandeira, as crianças escreveram a seguinte frase: “Muitas coisas,
Esta viagem começou com uma respiração que vocês consideraram poucas palavras.”
sonhadora. Estão lembrados?
Eu gostaria que a lembrança desta viagem acompanhasse a
“Na nossa escola, os alunos vão aprender com alegria – e nós, bandeira das crianças: Muitas coisas, poucas palavras.
professores, vamos ensinar com alegria.”

E agora gudora de gurrunfora de maracutora xiringabutora? Será


que vocês ainda consideram estas palavras sonhadoras? Heim?
Heim? Ou, pelo menos, tão sonhadoras assim?

Assim pim serramatu0m ca0biribim fifirififim!

xxxv
A arte de ensinar. O professor da arte.

Olê aí aô.

A arte de ensinar. A arte de ensinar.

Olê aí aô. Olê aí aô.

A arte de ensinar.

Esta arte tem um professor. Olê aí aô.

Ó que professor! Belo professor!

Ai ai ai que amor de professor! Esta criança tem um desejo.

O professor da arte. Ó que desejo! Belo desejo!

A arte de ensinar. Ai ai ai que amor de desejo.

Olê aí aô. O desejo da criança.

A arte de ensinar. A criança do professor.

Olê aí aô. O professor da arte.

Este professor tem uma criança.

Ó que criança! Bela criança!

Ai ai ai que amor de criança.

A criança do professor.

xxxvi
A arte de ensinar. Esta brincadeira tem uma pergunta.

Olê aí aô. Ó que pergunta! Bela pergunta!

A arte de ensinar. Ai ai ai que amor de pergunta.

Olê aí aô. A pergunta da brincadeira.

A brincadeira do desejo.

Este desejo tem uma brincadeira. O desejo da criança.

Ó que brincadeira! Bela brincadeira! A criança do professor.

Ai ai ai que amor de brincadeira. O professor da arte.

A brincadeira do desejo.

O desejo da criança. A arte de ensinar.

A criança do professor. Olê aí aô.

O professor da arte. A arte de ensinar.

Olê aí aô.

A arte de ensinar.

Olê aí aô. Esta pergunta tem uma aula.

A arte de ensinar. Ó que aula! Bela aula!

Olê aí aô. Ai ai ai que amor de aula.

xxxvii
A aula da pergunta. A aula da pergunta.

A pergunta da brincadeira. A pergunta da brincadeira.

A brincadeira do desejo. A brincadeira do desejo.

O desejo da criança. O desejo da criança.

A criança do professor. A criança do professor.

O professor da arte. O professor da arte.

A arte de ensinar. A arte de ensinar.

Olê aí aô. Olê aí aô.

A arte de ensinar. A arte de ensinar.

Olê aí aô. Olê aí aô.

Esta aula tem uma escola. Esta escola tem uma arte.

Ó que escola! Bela escola! Ó que arte! Bela arte!

Ai ai ai que amor de escola. Ai ai ai que amor de arte.

A escola da aula.

xxxviii
A arte da escola.

A escola da aula.

A aula da pergunta.

A pergunta da brincadeira.

A brincadeira do desejo.

O desejo da criança.

A criança do professor.

O professor da arte.

A arte de ensinar.

Olê aí aô.

A arte de ensinar.

Olê aí aô.

(Melodia de domínio público: “A árvore da montanha”

Letra: Francisco Marques)

xxxix
As fontes comenianas
As citações estão de acordo com a seguinte tradução:

“Didá7ca Magna” – Tratado da arte universal

de ensinar tudo a todos”

João Amós Coménio

Introdução, Tradução e Notas de

Joaquim Ferreira Gomes

Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1976

Esta tradução está disponível em

www.ebooksbrasil.org/nacionais/ebookpro.html

Em todo o percurso deste trabalho, u7lizei também esta tradução:

“Didá7ca Magna”. Comenius. Tradução: Ivone Cas7lho BenedeX. Aparelho crí7co: Marta FaYori. Editora Mar7ns Fontes, São
Paulo, 2002. Segunda edição.

xli
Primeira parte: A chegada instrução? (...) E não poderá o nele existe já de fato a erva ou a
homem ser facilmente educado planta, como se torna evidente
Quadro 1: Abraços
naquelas coisas para as quais a quando a semente, me0da debaixo
“E S. Gregório Nazianzeno pensa da natureza, não apenas o chama e da terra, lança para baixo as raízes e
mesma maneira quando diz: (...) a conduz, mas até o atrai e arrasta?” para cima os rebentos, os quais,
arte das artes está em formar o Capítulo XII, 14 pouco depois, por uma força ingênita,
homem, o qual é o mais versá0l e o se alongam em ramos e ramagens, se
Outras fontes: Saudação aos leitores,
mais complexo de todos os animais.” cobrem de folhas e se adornam de
3 (alunos; professores; prazer), 4
Saudação aos leitores, 5 flores e frutos.” Capítulo V, 5
(sonho; julgar; olhar; opiniões) * A
Outras fontes: Saudação aos leitores, todos aqueles..., 12 (sombra; opinião; Outras fontes: V, 6 (emissários;
6 (a arte das artes), 7 (a minha obra) opiniões), 34 (ver; ouvir; julgar) * V, sen0dos) * VI, 4 (ap0dão;
* A todos aqueles..., 24 (pais; 4 (nossa mente; aproxima; ergue-se; gradualmente) * XII, 10 (natureza;
educadores) * IX, 1 (todos) inves0ga; conhecimento), 7 (desejo sa0sfação) e 11 (espontaneamente) *
de saber) e 8 (opiniões) * VII, 5 XIV, 6 (instrumento; natureza; força;
Segunda parte: A inteligência
(rapidamente; imaginação) * XII, 2.V relógio) * XVI, 24.II (desejo de
Quadro 2: as sementes (opiniões) aprender), 35 (a raiz do saber)

“Com efeito, se aprendemos sem Quadro 3: Os cinco mensageiros Quadro 4: Pomar e jardim
grandes dificuldades a fazer aquilo
“Em conseqüência disso, a mente do “Além disso, gostamos de ter nos
que é próprio do corpo, a comer, a
homem que entra no mundo pomares, não apenas árvores que
beber, a caminhar, a saltar e a exercer
compara-se com muita razão a uma produzem frutos precoces, mas
profissões manuais, porque não
semente ou a um caroço, no qual, também árvores que produzem frutos
havemos de aprender também as
embora não exista ainda em ato a de meia estação, e frutos serôdios,
coisas que são próprias da mente,
figura da erva ou da árvore, todavia, porque cada coisa é boa no seu
desde que não falte a necessária
xlii
tempo (como diz algures o da matéria a estudar.” Capítulo XVIII, assim também o professor, antes de
Eclesiás0co) e, embora tarde, acaba 16.1 se pôr a instruir o aluno à força de
por mostrar, em determinada altura, regras, deve primeiro torná-lo ávido
Outras fontes: X, 12 (doce; filosofar) *
que não exis0a em vão. Porque é que, de cultura, mais ainda, apto para a
XII, 17 (professores) * XVI, 3 (arte;
então, no jardim das letras, apenas cultura e, conseqüentemente, pronto
habilidade; empenho) * XVII, 13.I
queremos tolerar as inteligências de a entregar-se a ela com entusiasmo.
(inflamar-se) e 14 (desejo) * XIX, 16
uma só espécie, as precoces e ágeis?” Mas quem alguma vez pensou nisso?”
(prazer; ardoroso) * XX, 12 (iluminar;
Capítulo IX, 4 Capítulo XII, 17
despertar; sedenta) * XXVI, 4 (doçura;
Outras fontes: A todos aqueles..., 33 encantam; delicadeza) * XXX, 12 Outras fontes: XVI, 3 (certeza), 4
(oficinas de homem) * V, 3 (verdade) * XXXII, 16 (voz do (sólido), 9.II (organizando), 45
(organismo de sabedoria), 5 (resumo professor; suave e simples) (coordenação, pouco a pouco) * XVII,
do universo) e 9 (jardim; variedade) * 23 (pouquíssimos princípios)
Terceira parte: A arte de ensinar
IX, 3 (sol) * X, 3 (oficinas de
Quadro 7: Palavras sólidas
humanidade) e 18 (todos; todas; Quadro 6: Preparar a terra
úteis) * XI, 1 (oficina de homens) * “O conhecimento deve
“Portanto, em primeiro lugar, é
XIX, 53 (engenhos; vontade) * XXIX, 2 necessariamente principiar pelos
necessário expulsar desses jovens
(vocação; engenho; desenvolve-se) sen0dos (uma vez que nada se
aquele torpor advenkcio, e
encontra na inteligência, que primeiro
Quadro 5: Fervor e paixão reconduzir a natureza ao seu vigor
não tenha passado pelos sen0dos).
próprio; regressará, então, com
“Ao começar-se seja que estudo for, Porque é que então o ensino há-de
certeza, o ape0te do saber. Mas
desperte-se um amor sério por ele principiar por uma exposição verbal
quantos daqueles que assumem o
nos alunos, por meio de argumentos das coisas, e não por uma observação
encargo de formar a juventude
0rados da excelência, da u0lidade, do real dessas mesmas coisas? Somente
pensam em torná-la primeiro apta
encanto e de qualquer outro aspecto depois de esta observação das coisas
para receber essa formação? (...)
xliii
ter sido feita, virá a palavra, para a Assim, finalmente, pelos bons natureza e como existem, poderá
explicar melhor.” Capítulo XX, 7 resultados da prá0ca, todos acreditar nelas, mas a sua crença não
experimentarão a verdade do cons0tuirá ciência. Mas se se lhe
Outras fontes: XVI, 15.1 (discurso;
provérbio: fazendo aprendemos a mostrar qual é o obje0vo de cada
coisas) * XVII, 28.VII (sen0dos;
fazer (Fabricando fabricamur).” coisa, é como meter-lhe na mão, para
memória; imaginação) e 42 (mão;
Capítulo XXI, 5 que saiba que sabe e se habitue a
olhos; gestos) * XIX, 14.V (breve;
u0lizá-la.” Capítulo XVII, 44
eficaz) e 34 (sólida; fixas) * XX, 6 Outras fontes: Abertura – terceiro
(coisas; sen0dos) * XXI, 13 (breves; parágrafo (ensinem menos; Outras fontes: XVII, 30 (quem
claras) aprendam mais) * XXI, 10 (imitação; aprende) * XIX, 47 (para a vida) e 52
livremente), 14 (invenções), 15 (escola; vida) * XX, 16 (mundo de
Quadro 8: Fazer fazendo
(análise; conheçamos) e 16 hoje) e 22 (saiba que a sabe)
“Os mecânicos não detêm os (examinem-se; invenções)
Quadro 10: A terra das brincadeiras
aprendizes de suas artes com
Quadro 9: A u0lidade das coisas
especulações teóricas, mas põem-nos “Portanto, para que possam aprender
imediatamente a trabalhar, para que “Aumentar-se-á ao estudante a as coisas sérias que, ao seu tempo,
aprendem a fabricar fabricando, a facilidade da aprendizagem, se se lhe serão de u0lidade ao homem sério, e
esculpir esculpindo, a pintar pintando, mostrar a u0lidade que, na vida aprendê-las com facilidade e prazer,
a dançar dançando, etc. Portanto, quo0diana, terá tudo o que se lhe importa misturar por toda a parte o
também nas escolas, deve ensina. (...) Sem este cuidado prévio, ú0l ao agradável, o qual atraia os
aprender-se a escrever escrevendo, a acontecerá que tudo o que lhe espíritos por meio dos seus encantos
falar falando, a cantar cantando, a contarem lhe parecerá um monstro quase conknuos, e os conduza até
raciocinar raciocinando, etc., para que de um mundo desconhecido; e a onde desejamos.” Capítulo XXIX, 10
as escolas não sejam senão oficinas criança, ainda não muito interessada
Outras fontes: Abertura – primeiro
onde se trabalha fervidamente. em saber que essas coisas existem na
parágrafo (agrado; solidez) * XI, 3
xliv
(prazer; brincar; pedrinhas; bola; Quadro 11: Ensinar a perguntar Quadro 12: Ensinar a ensinar
corridas) * XV, 12 (brincadeiras; jogos;
“Consolidar todas as coisas com “Terceira: as sisciplinas, que por
música) * XVII, 16 (afetuosamente;
razões, significa ensinar todas as natureza são conexas, eram ensinadas
encanto; prazer), 17 (passeios; jogos;
coisas pelas suas causas, isto é, sem atender às suas relações mútuas,
recrearem; gostosamente) e 18
mostrar não só como é que alguma mas mantendo-as separadas. (...) De
(atraem; agradável) * XVIII, 36
coisa é, mas também porque não igual maneira, obrigava-se apenas a
(dulcíssimo prazer; desejosos) e 47
pode ser de outra maneira. Com aprender, e nunca a ensinar. Embora
(passear) * XIX, 34 (diálogo;
efeito, saber significa conhecer as todas essas coisas (ler e escrever,
comediógrafos; agradáveis), 46
coisas por meio de suas causas.” palavras e coisas, aprender e ensinar)
(pintar; deleitar-se-ão; imagina0va) e
Capítulo XVIII, 36 devam ser feitas tão
49 (recrear; coração; brincadeiras;
simultaneamente como, quando se
prazer; agradável) * XXII, 7 (dança; Outras fontes: XII, 2.IV (delicadeza;
anda, se levantam e se abaixam os
cavalgar) * XXIII, 11 (diver0mento; doçura) * XVII, 24.III (numerosos
pés, quando se conversa, se ouve e se
gracejos) * XXVI, 13 (adaptado à sua exemplos) e 27 (ensina o
responde, quando se joga bola, se
capacidade; espontaneamente; desconhecido por meio do
a0ra e se recebe, como vimos já atrás,
prazer) * XXVIII, 12 (transportar; conhecido) * XVIII, 44 (perguntar) *
nos seus devidos ligares.” Capítulo
construir; destruir; prazer) * 15 XIX, 20.8 (perguntarem) e 34.I
XIX, 5
(conversas familiares; tom de voz) e (familiar; conduzido; perguntas;
16 (poesia; poemas; rítmicos) * XXIX, respostas) * XX, 18 (causas) e 19 Outras fontes: III, 3 (este mundo;
6.V (cantar), 17.I (recreações), 17.II (perguntas) * XXI, 7 (exemplos), 9 nossa escola) * X, 1 (espectadores;
(as mãos e a voz) * XXXI, 14 (viagens) (coisas familiares; exemplos), 13 atores) * XII, 31 (instrua) * XVI, 45.II
(exemplos) e 16 (outros e outros (por si mesmo) * XVIII, 39 (dizê-las),
exemplos) * XXVII, 13 (interrogar) 44 (ensina; instrui-se; reforça;
penetrar) e 47 (passear; ensinar e
aprender) * XIX, 36 (teatro do
xlv
mundo), 44 (dizê-la; exprime; Quadro 14: O Tucano e o Pavão Outras fontes: VIII, 7 (exemplos;
sen0mentos) * XXX, 13 (fala) imitá-lo-á) * O pequeno e precioso
“Até aqui, as escolas não se têm
capítulo XXVI, “Da disciplina escolar”
Quadro 13: A fonte da inteligência proposto realmente como obje0vo
habituar os espíritos a irem buscar o Quadro 16: Equilíbrio delicadíssimo
“Que todos se formem com uma
vigor às próprias raízes, como fazem
instrução não aparente, mas “Antes de tudo, creio que é doutrina
as árvores, mas têm-lhes ensinado
verdadeira, não superficial mas aceite por todos que a disciplina se
apenas a munirem-se de pequenos
sólida; ou seja, que o homem, deve exercer contra quem exorbita,
ramos arrancados de outro lugar, e,
enquanto animal racional, se habitue mas não porque exorbitou
assim, a enfeitarem-se com as penas
a deixar-se guiar, não pela razão dos (efe0vamente, o fato não pode
dos outros, como o corvo de Esopo
outros, mas pela sua, e não apenas a desfazer-se), mas para que não
(...)” Capítulo XVIII, 23
ler nos livros e a entender, ou ainda a exorbite mais. Deve, por isso,
reter e a recitar de cor as opiniões dos Quarta parte: A disciplina aplicar-se a disciplina sem paixão,
outros, mas a penetrar por si mesmo sem ira e sem ódio, com tal candura e
Quadro 15: O Sol
até ao âmago das próprias coisas e tal sinceridade, que aquele mesmo a
0rar delas conhecimentos genuínos e “Um ó0mo método de regular a quem a aplicamos se aperceba de que
u0lidade.” Capítulo XII, 2.V disciplina – é-nos ensinado pelo Sol, o a pena disciplinar se lhe aplica para
qual ministra às coisas que crescem: seu bem (...)” Capítulo XXVI, 3
Outras fontes: XVIII, 3 (ele próprio
1. sempre, luz e calor; 2.
aprende), 22 (compreensão das Outras fontes: O pequeno e precioso
freqüentemente, chuva e vento; 3.
coisas) e 23 (vigor; raízes; cavar a capítulo XXVI, “Da disciplina escolar”!
raras vezes, raios e trovões, embora
fonte da inteligência), 25 (olhos; * Capítulo XXXIII, 12 (confiança; pais;
estas coisas tenham também a sua
coração; fontes; interna) e 26 (seiva fogo; luz)
u0lidade.” Capítulo XXVI, 8
própria; vigorosa) * XIX, 41 (árvore;
desenvolve-se; ao mesmo tempo)

xlvi
Quinta parte: A despedida tanto) * XVI, 45 (pouco a pouco; Observação
pouco depois), 46 (gradualmente) e
Quadro 17: Lentamente As numerações do Capítulo XIX,
49 (a uma se suceda sempre outra) *
“Fundamentos para ensinar com
“Importa, por isso, abster-se de toda XVII, 2.VI (lentamente) * XIX, 40 (luz;
vantajosa rapidez”, apresentam
a precipitação, para que nunca se muitas coisas em poucas palavras) *
diferenças em relação à edição da
passe às coisas que vêm a seguir, XXVII, 2 (crescer lento; tempo
Mar0ns Fontes. As diferenças
antes de se haver consolidado com o necessário)
ocorrem a par0r do número 20. Por
necessário cuidado as coisas que
exemplo: o número 34 da edição da
estão primeiro. Caminha
Fundação Calouste Gulbenkian
suficientemente depressa quem
equivale ao número 35 da edição da
nunca se afasta do caminho. E o
Mar0ns Fontes. E assim por diante: 46
tempo que se gasta para consolidar
de uma equivale a 47 de outra; 49 de
bem os rudimentos não é tempo
uma equivale a 50 de outra...
perdido, mas representa uma grande
economia de tempo e de fadiga,
porque permi0rá dominar facilmente,
rapidamente e seguramente as coisas
que vêm a seguir.” Capítulo XXI, 12

Outras fontes: Saudação aos leitores,


8 (arte de ensinar e aprender) e 21
(ensinar e ser ensinado) *VII, 6
(desenvolvimento; tempo;
dedicarmos) * XV, 14 (tempo;
devagarinho; crescem; um pouco;

xlvii
Comênio:

a obra de uma vida e a vitalidade de uma obra


Para começo de conversa
“Ao começar-se seja que estudo for, desperte-se um amor sério por
ele nos alunos, por meio de argumentos 0rados da excelência, da
u0lidade, do encanto e de qualquer outro aspecto da matéria a
estudar.” Capítulo XVIII, 16.I

A excelência, a u0lidade e o encanto da “Didá0ca Magna”


despertaram, em mim, um profundo interesse pelo momento
histórico vivido por Comênio.

E é o próprio autor que nos anima para este trabalho:

“Porque é evidente que o conhecimento da história é uma parte


belíssima da instrução e é como que os olhos de toda a vida.”
Capítulo XXX, 15

xlix
Período de transformações
João Amós Comênio nasceu na região da Morávia, no coração da movimentos vigorosos: o Renascimento (séculos XIV a XVI) e a
Europa, no dia 28 de Março de 1592. Atualmente, este região Reforma (século XVI).
pertence à República Tcheca. O seu falecimento ocorreu no dia 15
O Renascimento erguia o Homem como o centro do mundo e trazia
de Novembro de 1670, na cidade de Amsterdã, na Holanda.
novas referências para a ciência, a filosofia, a literatura e as artes
O seu nome de ba0smo é Jan Amos Komensky. plás0cas.
Internacionalmente, o seu nome é conhecido na versão la0nizada:
A Reforma ques0onava prá0cas e conceitos da Igreja Católica e
Comenius. Em Portugal, usa-se Coménio. Aqui, usa-se também uma
contestava os seus poderes polí0cos e econômicos.
versão abrasileirada: Comênio. Nesta peça radiofônica, a escolha da
versão “Comênio” tem uma especial mo0vação teatral: a Os pais de Comênio, e toda a sua comunidade, par0cipavam de
sonoridade familiar acentua o ambiente acolhedor destas palavras uma das igrejas precursoras da Reforma: a Unidade dos Irmãos
reflexivas e cantarolantes. Morávios.
A sua vida está concentrada no século XVII, mas precisamos Estas novas igrejas apresentavam um ponto em comum: promover
sobrevoar também os séculos XV e XVI para compreender as ações a leitura da Bíblia nas línguas nacionais.
e as idéias do nosso professor.
Já nos primeiros anos de 1500, a Unidade dos Irmãos Morávios
Neste período, a Europa vive a agitada passagem da Idade Média publicou vários livros para auxiliar o trabalho de evangelização. Em
(séculos V a XV) para a Idade Moderna (séculos XV a XVIII): a 1593, lançou a Bíblia totalmente traduzia para a língua tcheca.
expansão do comércio, as grandes navegações, o crescimento das
cidades, a centralização do poder, as novas formas de trabalho, os
progressos técnicos...

Alimentando-se destas transformações – e fornecendo novos


alimentos a estas mesmas transformações -, surgem dois

l
A prensa gráfica
Já posso imaginar o que vocês estão imaginando:

- Calma lá! Como é que os livros entraram nessa história?

Vamos, com calma, sobrevoar o surgimento deste objeto


surpreendente...

Em 1450, na cidade de Mainz, na Alemanha, Gutenberg


aperfeiçoou a prensa gráfica e abriu caminho para a criação de um
meio de comunicação insuperável: o livro.

Será que nós somos capazes de imaginar o significado da chegada


do “livro” neste ambiente repleto de descobertas, idéias e
debates?

É fácil de imaginar...

Basta olharmos para a nossa história recente e verificar o impacto


da internet na nossa capacidade de trocar informações e
conhecimentos, de estabelecer intercâmbios e cooperações.

li
E tem mais!
Com a chegada da internet, a dinâmica da leitura saiu da
linearidade para o hipertexto: a fusão do texto com vídeos, áudios,
links, intera0vidades...

Inspirado na arte dos 0pógrafos, Comênio inventou a palavra


“didacografia” – mistura de “didá0ca” com “0pografia”. Capítulo
XXXII, 5

Inspirados na arte da internet, podemos inventar a palavra


“dida0nternet”...

Ou seja: o significado da chegada do livro foi simplesmente


gigantesco, oceânico. Em 1500, apenas cinqüenta anos após a
invenção de Gutenberg, a Europa contava com mil e setecentas
prensas gráficas em funcionamento – com vinte e sete mil ktulos
publicados. Em meados do século XVI, a Europa contava com oito
milhões de ktulos publicados.

lii
O encontro
Bem... Onde estávamos? Ah, sim! Na Unidade dos Irmãos
Morávios, nos livros, na Bíblia...

O nosso professor costuma repe0r que “o espírito sopra onde quer,


e nem sempre começa a soprar em determinado tempo”. Capítulo
XXIX, 2

E o vento s da história soprou e provocou o encontro cria0vo entre


Comênio e a Educação:

- Ora, ora! Se a igreja traduzia a Bíblia para a língua do povo, se a


igreja publicava a Bíblia na língua nacional, se a igreja queria que o
povo se relacionasse diretamente com as palavras da Sagrada
Escritura... Ora, ora, carambola! O que está faltando nesta história?

Isso! Estas igrejas começaram a ensinar o povo a ler.

Para a Unidade dos Irmãos Morávios, portanto, a educação das


crianças era um compromisso que se fortalecia na própria
concepção religiosa.

É por isso que a educação pública – e muito especialmente o
ensino fundamental público – nasce com o sopro da Reforma...

liii
Aluno e professor
Em 1608, aos dezesseis anos, Comênio vai estudar na escola de
Prerov, man0da pela Unidade dos Irmãos Morávios. Da sua
trajetória de aluno, Comênio reuniu experiências e reflexões que
fortaleceram o seu projeto de mudar radicalmente a maneira de
ensinar:

“Eu próprio, mísero homúnculo, sou um desses muitos milhares


que passaram e gastaram miseravelmente a ameníssima primavera
da vida e os anos florescentes da juventude nas banalidades da
escola. Ah! Quantas vezes, mais tarde, quando comecei a ver as
coisas um pouco melhor, a recordação do tempo perdido me
arrancou suspiros do peito, lágrimas dos olhos e gritos de dor do
coração.” Capítulo XI, 13

Em 1614, Comênio foi nomeado professor na escola em que


estudou. E promoveu grandes mudanças: além de eliminar todos
os cas0gos corporais, incluiu novas disciplinas, introduziu
conversas, passeios, teatros, brincadeiras e canções.

liv
O exílio
A expansão das novas igrejas nascidas da Reforma provocou uma “Didá0ca Magna”; teceu várias crí0cas nega0vas, apontou
reação da Igreja Católica: o movimento da Contra-Reforma. equívocos, lacunas e contradições.

Muitas guerras foram alimentadas por este conflito entre católicos Em 1657, em Amsterdã, na Holanda, a “Didá0ca Magna” foi
e membros das novas igrejas – também chamados de protestantes. publicada – seguindo a redação de 1638.

A Guerra dos Trinta Anos - de 1618 a 1648 – foi uma tragédia que
atravessou a vida de Comênio e de seu povo. A par0r de 1628,
Comênio foi obrigado a deixar a sua terra e se transformou num
homem em permanente exílio, mas sempre pensando, escrevendo
e trabalhando pela melhoria da educação em diversos países:
Polônia, InglaterrA, Suécia, Hungria e Holanda.

Comênio escreveu mais de duzentos obras. Em 1631, publicou a


obra que espalhou o seu nome em diversos países: “A porta aberta
das línguas”. Em 1658, lançou uma obra inovadora: “O mundo
sensível das imagens”. Associando as palavras às gravuras, esta
obra é um dos primeiros livros didá0cos ilustrados para criança.

Em 1632, em Leszno, na Polônia, Comênio concluiu a obra


“Didá0ca Tcheca”. Em 1638, concluiu a tradução da “Didá0ca
Tcheca” para o la0m – quando foi ba0zada com o nome de
“Didá0ca Magna”.

Em 1639, recebeu uma carta do amigo Joaquim Hübner. Nesta


carta, Hübner, a pedido de Comênio, fez a sua avaliação da

lv
Ontem e hoje
Em 1957, em comemoração aos trezentos anos da publicação da No nosso entender, tais crí0cas não prevalecem, denotam
“Didá0ca Magna”, a UNESCO lançou a obra “Jean Amos Comenius incompreensão do que significava, para Comênio, Método
(1592 – 1670) – Páginas escolhidas”. Na introdução desta Universal: previsão de técnicas, processos, procedimentos de
coletânea, Jean Piaget aponta o critério fundamental de uma ensino, aplicáveis de acordo com as possibilidades de cada
“pedagogia a0va”: professor, dentro dos recursos do meio, tendo-se em conta as
diferenças individuais, com resultados diferenciados. Previsão
“quando o aluno redescobre ou reconstrói a verdade através de
ainda de mestres eruditos, sábios, devotados, de livros-texto de
ações materiais ou interiorizadas que consistem em experimentar
alta qualidade, de meios auxiliares concretos, naturais e ar0ficiais.”
ou raciocinar por si mesmo. Ora, este critério decisivo nos parece
ter sido claramente percebido por Comênio.” Para compreender o papel do professor em relação ao aluno,
Alaíde Lisboa, com a sensibilidade de uma grande educadora,
Em ar0go publicado em 1968, na Revista da Universidade Federal
recolhe, da “Didá0ca Magna”, uma das idéias mais desafiantes:
de Minas Gerais, a educadora e escritora Alaíde Lisboa de Oliveira
evidencia a contemporaneidade deste pensador: “Quanto mais entusiasmo 0ver o mestre, maior será a a0vidade do
aluno.”
“Comênio representa como que uma síntese das mais variadas
idéias renovadoras no momento atual. (...)

Compreende Comênio a necessidade de a aprendizagem levar em


conta a idade maturação) e a experiência prévia (aquisições) como
recomenda qualquer psicólogo da atualidade. (...)

Defende a ordem psicológica do ensino a que chama a ordem


natural: primeiro as coisas, depois o nome das coisas. (...)

Comênio tem sido cri0cado por pretender indicar um método


universal de ensinar tudo a todos.
lvi
Bíblia e pedagogia
Cmênio era um pensador movido pela fé e profundamente ligado à Os temas estudados devem ser registrados nas paredes das salas
sua igreja – foi Sacerdote, Pastor e Bispo da Unidade dos Irmãos através de pinturas e relevos: capítulo XVII, 17 e 42; capítulo XIX,
Morávios. 36.

Nesta passagem da “Didá0ca Magna”, Comênio revela a A escola deve ser um local bonito, iluminado e limpo: capítulo XVII,
fundamentação bíblica de sua pedagogia: 17.

“E a nós disse: “Se não converterdes e vos não tornardes como Junto à escola, deve ter um espaço para brincar e um amplo jardim
meninos, não entrareis no reino dos céus” (Mateus, 18,3). com grande variedade de árvores e flores: capítulo XVII, 17.

Mas que palavras são estas?! (...) Eis que nós, adultos, que Ao analisar a Bíblia, Comênio revela o mesmo olhar cria0vo para as
julgamos que só nós somos homens e vós sois macaquinhos, só nós condições concretas da vida co0diana. Para mostrar, mais uma vez,
sábios e vós doidinhos, só nós faladores inteligentes e vós ainda o papel privilegiado que Cristo atribui à criança, Comênio focaliza,
não aptos a falar, eis que, enfim, somos obrigados a vir à vossa nos evangelhos, um detalhe surpreendente:
escola! Vós fostes-nos dados como mestres, e as vossas obras são
“E parece que o Senhor tenha querido mostrar esta mesma
dadas às nossas como espelho e exemplo!” A todos aqueles..., 15 e
verdade alegoricamente quando, no momento de par0r para
16
Jerusalém, ordenou que lhe fossem buscar uma jumenta e o
Na arte de ensinar, tpodos estão ligados a todos, tudo está ligado a jumen0nho, filho da jumenta; todavia, não montou a jumenta, mas
tudo: “é precisamente na parte mais pequenina que reside a força o jumen0nho. E o evangelista acrescenta que o Senhor “enviou dois
das partes maiores” (Capítulo XX, 20). Na arte de ensinar, dos seus discípulos, dizendo: Ide a essa aldeia, que está fronteira;
dependemos de todos os detalhes: “a rodinha mais pequena, o entrando nela, encontrareis um jumen0nho atado, em que nunca
eixo mais pequeno, o parafuso mais pequeno” (Capítulo XIII, 14). montou pessoa alguma” (Lucas, 19,30). Será que tudo isso foi feito
Por exemplo... e consagrado no Evangelho para nada? Nem pensar nisso. Todas as
coisas, as de mínima e as de máxima importância, ditas e feitas por
Cristo, assim como também todas as vírgulas da Sagrada Escritura,

lvii
contêm um mistério para a nossa instrução.” A todos Portanto, a nossa escola, a nossa Oficina de Pessoas, deve ser como
aqueles..., 21 o sol que ilumina e aquece a terra – para que as sementes, todas as
sementes, possam viver, verdejar, florescer, fru0ficar.” (Quadro 4:
A arte de ensinar deve ser um processo lento e gradual. Para
Pomar e jardim)
fundamentar esta idéia, Comênio inves0ga as intenções divinas:
Qual a origem destas palavras? Esta confiança na capacidade das
“Para que o homem pudesse formar-se “ad humanitatem”, Deus
pessoas nasce do estudo sobre o processo de aprendizagem ou
concedeu-lhe os anos de juventude, durante os quais, sendo inábil
nasce da afirmação de um mistério?
para outras coisas, fosse apto apenas para a sua formação. É certo,
com efeito, que o cavalo, o boi, o elefante e todos os outros
animais, de qualquer tamanho, em um ano ou dois, a0ngem uma
estatura perfeita: o homem, porém, só o consegue em vinte ou
trinta anos. Se algum, porém, julgar ter chegado a essa estatura
perfeita por um mero acaso ou devido a quaisquer causas
segundas, certamente despertará admiração. A todas as outras
coisas, Deus fixou uma medida; só ao homem, senhor das coisas,
permi0u passar o seu tempo ao acaso? Ou pensaremos que,
rela0vamente ao homem, Deus tenha concedido à natureza a graça
de proceder a passo lento, a fim de que mais facilmente possa
realizar a sua formação?” Capítulo VII, 6 e Capítulo XXVII, 2

Nesta palestra cantarolante, deixei a dimensão religiosa para as


entrelinhas:

“A professora Natureza já nos ensinou que toda pessoa é um


organismo de sabedoria, toda pessoa é um resumo do universo.

lviii
Apontar os erros
Este livro em voz alta anuncia uma proposta pedagógica, um
projeto de escola. Deixei também para as entrelinhas as palavras de
Comênio, tantas e vigorosas!, que apontam os erros de concepção
e denunciam as omissões dos professores e da ins0tuição escolar.

Comênio aponta os erros da mesma Maneira como aponta o


caminho a seguir – com palavras simples, sólidas, breves,
essenciais:

“Efe0vamente, se não se oferecerem ao aluno aquelas coisas que


ele deve saber, de onde as virá a saber? Abstenham-se, portanto,
os professores de manter qualquer coisa escondida dos alunos,
quer intencionalmente, como fazem habitualmente os invejosos e
os desleais, quer por negligência, como costumam fazer aqueles
que querem terminar o seu trabalho o mais cedo possível.”
Capítulo XX, 15.I

No derradeiro capítulo, “Dos requisitos necessários para começar a


pôr em prá0ca este método universal”, Comênio lança uma
advertência que poderia figurar nas paredes de todas as salas de
professores:

“Sobretudo, parece serem de temer os pseudo-sábios, cujo coração


se compraz na ro0na dos velhos hábitos e que olham tudo quanto
é novo com um franzir de sobrancelhas e uma per0naz relutância”.
Capítulo XXXIII, 7

lix
O relógio
A arquitetura literária de Comênio é coerente com a sua proposta
educa0va: “o conhecimento deve necessariamente principiar pelos
sen0dos” (Capítulo XX, 7.I). Por isso, as idéias se desenvolvem,
sempre!, através de comparações: semente, planta, flor, árvore,
pomar, fruto, jardim, vento, chuva, raios, trovões, sol, relógio,
0pografia, navio, canhão, carruagem, penhasco, espelho, martelo,
peneira, alavanca, roldana, tesoura, moeda, selo, rede, pescador,
jardineiro, arquiteto, pintor, padeiro, cavalo, pássaro, ovo, abelha,
aranha, peixe, formiga, corpo humano...

E agora gudora de gurrunfora de maracutora xiringabutora, deixo


para vocês, amigos leitores, pais e professores, a comparação do
relógio – conforme consta do capítulo XIV, 6. Claro, claríssimo, vou
apresentar esta comparação devidamente recriada ao sabor
comeniano: “que todas as coisas, mesmo as mais sérias, sejam
apresentadas num tom familiar e agradável, isto é, sob a forma de
conversas ou de charadas, que os alunos, em compe0ção,
procurem adivinhar; e, enfim, sob a forma de parábolas e
apólogos” (Capítulo XVII, 19).

lx
O presente
Heitor, o inventor, inventou um drama nada original: o inventor O inventor Heitor, a0ngido por esta celes0al pergunta, desabou em
Heitor amava a bela Estela, mas Estela, a bela, não amava Heitor, o si, muito silencioso, proparoxitonamente desanimoso:
inventor. melodramá0co, isbrogló0co, sorumbá0co...

Melodramá0co, isbrogló0co, sorumbá0co, Heitor contemplava a Já estava caindo de sono, muito sono, quando, de repente, de
natureza: o espetáculo de uma noite estrelada. rompante, nesse instante de puf-puf... A corda!

Observando apaixonadamente o movimento dos astros no O que fez o nosso inventor?


firmamento, Heitor imaginou, finalmente, uma invenção original: o
Numa ponta da corda, amarrou um peso. Amarrou a outra ponta
relógio, um aparelho dedicado a medir o tempo, o tempo todo.
no eixo da roda mestra – e enrolou a corda neste eixo.
Esta máquina, complexa e delicadíssima, traria em seu coração
uma roda dentada que giraria incessantemente sobre o seu próprio O que aconteceu?
eixo e ainda faria girar outras rodas dentadas.
O peso, naturalmente, pesou. A corda, naturalmente, desenrolou. E
De repente, de rompante, nesse instante de puf-puf, uma estrela a roda mestra, naturalmente, girou. E fez girar as outras rodas
cadente, que ouvia tudo atentamente, riscou no céu uma pergunta dentadas – naturalmente.
surpreendente:
Assim, o relógio, máquina complexa e delicadíssima, funcionou, na
- Ora, ora, senhor Heitor! Aqui, no firmamento, nós, os astros, nos verdade verdadeira, a par0r de um simples impulso da natureza: a
movimentamos, perpetuamente, a par0r de uma energia própria. força da gravidade.
Onde o senhor pretende buscar esta infinita energia capaz de
oferecer o mesmo movimento perpétuo à roda mestra, à grande Podemos comparar este relógio com a arte de ensinar...
roda dentada? Heim? Heim? Onde? Como?

lxi
A educação da criança, arte complexa e delicadíssima, funciona, na
verdade verdadeira, a par0r de um simples impulso da natureza: o
desejo de aprender.

Como? Quem?

Dizem que Heitor, o inventor, construiu o primeiro relógio e deu de


presente para Estela, a bela.

Não! Não me digam? que vocês estão pensando isso que eu estou
pensando que vocês estão pensando.

Dizem que Heitor e Estela viveram felizes cada hora de suas vidas –
só interrompiam a felicidade para dar corda ao relógio...

lxii
Bibliografia
DidáOca Magna Obras sobre Comênio “O conceito de teologia e pedagogia na
Didá0ca Magna de Comenius”. Edson
“Didác0ca Magna – Tratado da arte “Comenius – o pai da pedagogia
Pereira Lopes. Editora Mackenzie, São
universal de ensinar tudo a todos”. João moderna”. Olivier Cauly. Tradução: Maria
Paulo, 2003.
Amós Coménio. Introdução, Tradução e João Batalha Reis. Ins0tuto Piaget, Lisboa,
Notas de Joaquim Ferreira Gomes. 1999. “Comenius, a Educação e o Ciberespaço”.
Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Luis Augusto Beraldi Colombo. Editora
“Comenius: a persistência da utopia em
1966. Esta tradução está disponível em Comenius, Bragança Paulista/SP, 2006.
educação”. Wojciech A. Kulesza. Editora
www.ebooksbrasil.org/nacionais/ebookpr
Unicamp, Campinas, 1992. Outras obras
o.html
“Comênio ou da arte de ensinar tudo a “História da educação e da pedagogia”.
“Didá0ca Magna”. Comenius. Tradução:
todos”. João Luiz Gasparin. Editora Papirus, Lorenzo Luzuriaga. Tradução e notas de
Ivone Cas0lho Benede€. Aparelho crí0co:
Campinas/SP, 1994. Luiz Damasco Penna e J. B. Damasco
Marta Fa•ori. Segunda edição. Editora
Penna. Nona edição. Editora Nacional, São
Mar0ns Fontes, São Paulo, 2002. “Comênio – A emergência da
Paulo, 1977.
modernidade na educação”. João Luiz
“Didá0ca Magna”. João Amos Comênio.
Gasparin. Segunda edição. Editora Vozes, “História do brinquedo e dos jogos –
Tradução: Nair Fortes Abu-Merhy. Editora
Petrópolis/RJ, 1998. brincar através dos tempos”. Michel
Organização Simões, Rio de Janeiro, 1954.
Manson. Tradução: Carlos Correia
“Comenius: A construção da pedagogia”.
“Jean Amos Comenius (1592 – 1670) – Monteiro de Oliveira. Editorial Teorema,
Sergio Carlos Covello. Editora Comenius,
Pages choisies”. Homenage de l’Unesco à Lisboa, 2002. (Capítulo VIII: A entrada dos
Bragança Paulista/SP, 1999.
l’occasion du trois cen0ème anniversaire brinquedos nos tratados sobre educação.)
de la publica0on des Opera Didac0ca “Comenius”. Alaíde Lisboa de Oliveira.
“História da leitura”. Steven Roger Fischer.
Omnia (1657 – 1957). Introduc0on de Jean Revista da Universidade Federal de Minas
Tradução: Claudia Freire. Editora Unesp,
Piaget – directeur du Bureau interna0onal Gerais – UFMG. Belo Horizonte, 1968.
São Paulo, 2006.
d’éduca0on: “L’actualité de J. A.
Comenius”. Unesco, Paris, 1957. “Comenius & a educação”. Mariano
Narodowski. Editora Autên0ca, Belo
Horizonte,, 2004.

64
“As fábulas de Esopo”. Tradução direta do “Enseñar com textos e imágenes. Una de
grego, prefácio, introdução e notas de las aportaciones de Juan Amós Comenio”.
Manuel Aveleza de Sousa. Thex Editora, Maria Esther Aguirre Lora. Revista
Rio de Janeiro, 1999. Electrónica de Inves0gación Educa0va.
México. 2001, Volume 3, Número 1.
Internetografia
h•p://redie.uabc.mx
Site oficial da República Tcheca:
“Orbis Sensualim Pictus”. John A.
www.czech.cz
Comenius. The Virtual Museum Educa0on
Site oficial da União Européia: Iconics. Museum Directory. The Galleries.
www.europa.eu The College of Educa0on & Human
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Site da Rádio Praga: www.radio.cz Estados Unidos.
h•p://educa0on.umn.edu/EdPA/iconics/O
“Comenius e a internacionalização do
rbis/Orbis_Text.htm
ensino”. Maria Fernanda Mar0ns
Gonçalves. Millenium – Revista do
Ins0tuto Politécnico de Viseu. Número 11.
Julho de 1998. Portugal. Imagens e vetores:
www.ipv.pt/millenium
Muitas imagens deste livro foram
El juego y el juguete en la herencia cultural u0lizadas do site h•p://br.freepik.com/
de uma nación”. Viera Zbirková. “Correo
Licença dos arquivo são atribuídas a
del Maestro – Revista para professores de
Freepik
educación básica”. Número 43. Dezembro
de 1999. México. 'h•p://br.freepik.com/vetores-gra0s/crian
www.correodelmaestro.com cas-felizes-que-leem-um-livro-imagina0vo
_831102.htm'

65
A montagem da peça

Entrevista com Francisco Marques Vírgula Chico dos Bonecos


De onde nasceu a idéia de criar esta peça? minutos – e logo em seguida entra uma cantoria. As falas reflexivas
de Comênio, entretanto, são falas poé0cas, vibrantes, bem
Nasceu da leitura da “Didá0ca Magna”. Fiquei encantado pelas
humoradas, repletas de comparações – todas elas ligadas à
idéias, pela linguagem e, principalmente, pela paixão do professor
natureza: semente, sol, terra, árvore... E tem mais! Na “Didá0ca
Comênio. Misturei este encantamento com a minha experiência em
Magna”, Comênio dialoga com um leitor imaginário – um leitor
formação de professores e temperei tudo com a minha vivência de
ques0onador, provoca0vo. Este recurso literário foi incorporado de
poeta, con0sta e desenrolador de brincadeiras.
maneira teatral – e está sempre presente nas falas reflexivas.

E como se desenvolve a peça?


E por que você pensou o “livro em voz alta” com esta dinâmica?
A peça é, simplesmente, Comênio falando para os pais e os
Apenas segui a orientação do próprio Comênio: misturar o ú0l ao
professores de hoje. A peça pode ser classificada como um
agradável. Se esta é uma postura importante em relação às
monólogo, mas podemos chamar de “palestra cantarolante” ou
crianças, por que não usar esta mesma proposta em relação aos
“peça radiofônica” ou ainda “livro em voz alta”.
pais e aos professores?

Por que “palestra cantarolante”?


Através desta “palestra cantarolante”, podemos conhecer a
É cantoria o tempo todo. A peça se divide em dezessete quadros. “Didá0ca Magna”
Cada quadro é composto por uma fala reflexiva e uma canção:
Todos os conteúdos, quadro a quadro, estão fundamentados na
Comênio canta e convida a platéia a cantar. E o cd, que acompanha
“Didá0ca Magna”: as idéias, a construção dos argumentos e as
este livro, é um convite para o leitor cantar também.
comparações. E, é claro, a sensibilidade, a emoção, a paixão. O
texto final é de minha autoria – reescrevi tudo para que a fala
0vesse a fluência de uma conversa entre amigos.
Qual a duração da “peça radiofônica”?

Cinqüenta minutos: trinta minutos de falas reflexivas, quinze


minutos de canções e cinco minutos de história – uma recriação de Você respondeu a uma parte da pergunta. Afinal, assis0r a esta
uma fábula de Esopo. Cada fala reflexiva ocupa, no máximo, dois peça radiofônica” equivale a conhecer a “Didá0ca Magna”?

67
Vamos brincar com os números? A “Didá0ca Magna” tem, acolhedora, cria0va e crí0ca. Na verdade verdadeira, Comênio e
aproximadamente, quatrocentas páginas. Se eu gasto um minuto e teatro formam um par perfeito.
meio para ler uma página, vou gastar seiscentos minutos para ler o
livro. Como transformar dez horas de leitura em apenas trinta
minutos de falas reflexivas? É claro, claríssimo, que quem “recorta e “Par perfeito”, por quê?
seleciona” já está adotando um ponto de vista, uma interpretação.
Assis0r a esta “palestra cantarolante” equivale, portanto, a Comênio dedicou um enorme carinho ao teatro na escola: montava
conhecer algumas idéias centrais deste clássico da pedagogia. peças com os alunos e apresentava para toda a comunidade. Ele
Equivale, também, a um convite para se banhar diretamente na também escrevia peças para seus alunos – como, por exemplo, “A
fonte da “Didá0ca Magna”. escola lúdica”. E tem mais! Ele mesmo adaptou algumas de suas
obras para o teatro – como, por exemplo, “A porta aberta das
E qual foi o seu ponto de vista para escolher os conteúdos? línguas”.
O ponto de vista foi a palavrinha “hoje”. Selecionei algumas idéias
essenciais que precisam ser co0dianamente relembradas por todos
nós, pais e professores de hoje. Tudo gira em torno de três temas: a Então, par pefeikssimo! Bem, onde estávamos? Ah! E como é a
inteligência, a arte de ensinar e a disciplina. A beleza das reflexões e montagem da peça “Muitas coisas, poucas palavras”?
a clareza das argumentações de Comênio revitalizam estas idéias,
A mais simples possível: o ator e a platéia, sem qualquer cenário ou
criam um novo poder de convencimento em torno destas idéias. E
objeto de cena. Eu sou, ao mesmo tempo, o Comênio que traz as
o teatro, claro, claríssimo!, tem um papel importante na
suas reflexões e o ouvinte imaginário que ques0ona e provoca – e
revitalização destas reflexões.
sou, ainda, o Comênio que puxa as cantorias com a platéia.

O teatro? Como assim?


E você imagina outras montagens?
Comênio não é uma personagem de ficção, mas o espaço cênico
Imagino, pelo menos, duas possibilidades mirabolantes. Na
tem a capacidade de criar um ambiente ficcional em torno deste
primeira montagem, teríamos dezessete atores, dezessete
professor de mais de quatrocentos anos de idade. Esta súbita
Comênios, um para cada quadro. Isso tornaria a montagem
mistura de realidade e imaginação estabelece uma rede de
rela0vamente simples e rápida, porque os atores iriam decorar e
cumplicidade entre o ator e a platéia – e gera uma recepção mais

68
ensaiar textos curtos. Assim, a peça se transformaria em um jogral coisas. Ou seja: antes de falar sobre a arte de ensinar, eu preciso
cantarolante. mostrar a arte de ensinar em ação.

E a segunda montagem? E o que você mostra neste espetáculo-surpresa relâmpago?

Um ator faria o papel de Comênio e um grupo musical interpretaria Mostro alguns brinquedos milenares e planetários, sempre
as canções – com muitas vozes e diversos instrumentos. Aqui, o contemporâneos e futuristas: a escada de maracá, o jabolô, o
lado cantarolante da peça se transformaria num espetáculo teatro de fantoches...
musical. Poderíamos, ainda, misturar as duas montagens: muitos
instrumen0stas, muitos cantores e muitos Comênios.
Já estou vendo aí um terceiro espetáculo: o encontro do professor
Chico dos Bonecos com o professor Comênio. É isso mesmo?
No início desta conversa, você falou que trabalha com formação de
É isso aí. Inventei um jeito de trabalharmos juntos. “Muitas coisas,
professores. Como é este trabalho?
poucas palavras” é o relato sincero de um encontro. Eu não quero
As minhas oficinas para professores giram sempre em torno deste falar sobre “aquilo que eu acho que os outros deveriam ouvir”. Eu
tema: “O brincar na educação”. E o meu encantamento por quero falar apenas sobre aquilo que eu gostei de ouvir, aquilo que
Comênio, na verdade verdadeira, está diretamente ligado a este me tocou profundamente. Esta peça reúne as palavras de Comênio
tema. A “Didá0ca Magna” está povoada de palavras que brotam da que falaram dentro de mim – e estas são as únicas palavras que
terra das brincadeiras: entusiasmo, fervor, diálogo, prazer, afeto, podem ter a pretensão de falar à razão e ao coração do outro.
coração, alegria... Por isso, antes de apresentar a “palestra
cantarolante”, apresento um espetáculo-surpresa relâmpago.

Como é que é? Um espetáculo antes do espetáculo?

Mais uma vez, estou apenas seguindo a orientação do professor


Comênio: antes de falar sobre as coisas, eu preciso mostrar as

69
E agora, a derradeira pergunta. Por que você resolveu escrever este
texto em forma de entrevista?

Mais uma vez, estou apenas seguindo a orientação do professor


Comênio: nada mais atraente do que uma conversa. Perguntas e
respostas conduzem para o diálogo – e o diálogo é o caminho que
conduz para todos os lugares.

Curso online de brincadeiras musicais:


Música, dança, histórias, cantigas,
instrumentos mirabolantes e muita
criatividade
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Para saber mais sobre o curso

https://www.youtube.com/watch?v=ta4N-fZRyRQ
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70
Francisco Marques (Chico dos Bonecos)
Francisco Marques, conhecido como Chico dos Bonecos, é poeta e
arte-educador. Trabalha desde o início da década de 80 com o
resgate de brinquedos e brincadeiras anOgas, incluídas nessa
categoria os "brinquedos invisíveis", como histórias, contos, lendas e
fábulas provenientes da literatura oral. Sua matéria-prima de
trabalho parece ser a impalpável riqueza da oralidade brasileira,
mesclada com o humor e o resgate da vontade de brincar. 

Suas oficinas e performances para o público infanOl são conhecidas
nos quatro cantos do país. Chico anda pelas cidades brasileiras
carregando duas maletas-baús, daquelas de caixeiro viajante,
repletas de peças e objetos insólitos, como chapeuzinho de papelão,
funil, chuveiro, parafuso de tampa de privada, fazendo a mágica de
despertar a imaginação de plateias às vezes anestesiadas pelo
coOdiano. Além disso, ele desenvolve também uma elaboração em
torno da cultura da infância voltada para os educadores. Uma das
expressões desse trabalho encontra-se no livro Muitas coisas, poucas
palavras - A oficina do Professor Comênio e a arte de ensinar e
aprender.

71
Outras obras literárias do
Francisco Marques
Advertência
Todo o conteúdo desta obra literária é protegida por lei e
pertence ao autor Francisco Marques.
A divulgação e distribuição deste livro pertence ao curso
online “Baile do Colherim”.
www.estevaomarques.com
Sendo de usufruto unicamente de seus alunos.
Estão proibidos quaisquer outras formas de uOlização tais
como: copiar, editar, adicionar, reduzir ou praOcar qualquer
ato de comercialização.
A violação de quaisquer destes direitos exclusivos do
Otular, acarretará sanções previstas no código penal.
Obrigado pela compreensão

72
FIM

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