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13/04/2023 08:42 O xadrez e a equação política da reforma tributária no Brasil

REFORMA TRIBUTÁRIA

O xadrez e a equação política da reforma tributária no Brasil


Setores e agentes econômicos devem estar atentos às movimentações no Legislativo para dimensionar impactos
operacionais

GRUPO DE ESTUDOS SOBRE POLÍTICA TRIBUTÁRIA

Crédito: Pexels

Passados 100 dias do início da nova legislatura, o Poder Executivo apresentou


uma série de medidas para incentivar a economia brasileira que serão analisadas
pelo Congresso Nacional[1]. A despeito das medidas apresentadas, resta claro
que a “bala de prata” do governo federal para o nosso país é a reforma tributária,
conforme dito publicamente pela ministra do Planejamento, Simone Tebet[2].
Isso porque a reforma tributária é a única medida capaz de enfrentar,
simultaneamente, duas questões de extrema importância ao país: a redução de
desigualdades sociais e o reaquecimento da economia.

É inquestionável que o sistema tributário atual é apontado como uma das


principais mazelas do país, na medida em que estimula a regressividade[3],
gerando distorções e desigualdades; além de contribuir para a insegurança
jurídica decorrente da complexidade das normas vigentes, o que afasta
investimentos, tão escassos em um cenário global pós-pandemia. Exemplo disso
é o volume de contencioso assustador que alcança o valor atual de R$ 5,4
trilhões, o qual representa 75% do nosso PIB, segundo dados do estudo
Diagnóstico Judicial Tributário Brasileiro, formulado pelo Conselho Nacional de
Justiça (CNJ) em conjunto com o Insper[4]. Esse mesmo estudo aponta que o
nosso país concentra 99% dos processos judiciais tributários dentre as empresas
transnacionais que aqui operam, razão pela qual investimentos estrangeiros
muitas vezes deixam de considerar o Brasil diante dos riscos existentes.

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Nesse momento, um grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Arthur


Lira (PP-AL), está definindo um texto final substitutivo às PECs 45/2019 e
110/2019, o qual deve ser apresentado até 16 de maio, caso os trabalhos não
sejam prorrogados por mais 90 dias. Após a apresentação do texto final, a
proposta de reforma deve ser submetida para análise do plenário da Câmara dos
Deputados e, se aprovada, será remetida ao Senado. A expectativa do governo
federal é de aprovação em ambas as casas até outubro deste ano, conforme
declarações públicas de autoridades[5].

Diante disso, a grande questão a ser debatida neste momento se relaciona com a
viabilidade de aprovação da reforma pelo Legislativo neste ano, considerando a
complexidade do espectro de interesses políticos, econômicos e sociais para a
aprovação da medida. Em termos práticos, resta saber se o governo possui apoio
político em sua base que supera a maioria qualificada em ambas as casas do
Congresso Nacional (art. 60, §2º da CF/88), o que representa 3/5 dos membros
de cada casa (308 deputados na Câmara e 49 senadores no Senado).

Até o momento, não é possível ter clareza em relação à real “temperatura” para
aprovação da reforma, eis que nenhuma matéria apresentada pelo governo foi
analisada pelos plenário das casas. De todo modo, por uma questão de
sobrevivência política, o governo depende da aprovação das medidas
econômicas apresentadas no início do ano e da reforma tributária para alavancar
o país, razão pela qual envidará todos os seus esforços nas aprovações das
medidas junto ao Legislativo.

A real força da base política do governo no Congresso ficará evidente com a


aprovação (ou não) das MPs 1159 e 1160, apresentadas no início deste ano, cujo
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prazo de validade expira em 1º de junho. Ali está sendo travada uma disputa
política em relação ao rito que deve ser observado pelas Medidas Provisórias, que
merece toda a atenção[6]. Ainda não está claro quais podem ser as
consequências políticas decorrentes dessa disputa, mas fato é que, caso Lira
saia enfraquecido dessa disputa, reflexos serão sentidos na tramitação da
reforma tributária na Câmara.

Não obstante, é possível cravar que até a primeira metade deste ano teremos
clareza acerca da real dimensão da força política do governo junto ao Congresso
Nacional. Tal situação, por si só, determinará o quão bem-sucedido será o
Executivo na aprovação de medidas junto ao Legislativo durante a legislatura em
curso.

A despeito das disputas políticas mencionadas acima, alguns setores produtivos,


como agronegócio e serviços, não estão satisfeitos com a proposta de reforma,
em razão de uma possível majoração de carga pela implementação do Imposto
sobre Bens e Serviços (IBS). Adicionalmente, estados e municípios estão
preocupados com a redação final da proposta acerca da autonomia dos entes
para definição de alíquotas do IBS e, principalmente, acerca da repartição de
receitas, o que pode afetar o pacto federativo previsto na Constituição de 1988.

Além disso, não está claro como setores produtivos que usufruem de benefícios
fiscais concedidos em virtude de contrapartidas de investimentos e cumprimento
de requisitos previstos em lei serão efetivamente tratados pela proposta. Tal
situação é ponto de extrema atenção, na medida em que pode gerar contencioso,
em razão de entendimento pacífico do STF (Súmula 544) no sentido de que
“isenções tributárias, concedidas sob condição onerosa, não podem ser
livremente suprimidas”. Ambos os textos das PECs 45 e 110 se posicionam pela
impossibilidade de implementação dos benefícios fiscais para o IBS e pela
redução gradual e proporcional dos benefícios vigentes na medida em que for
implementado o novo tributo.

Nosso país urge por regras mais claras e que estimulem segurança jurídica e
previsibilidade ao ambiente econômico do país. Todavia, espera-se que a
mudança a ser proposta não afete os investimentos já realizados no país e não
traga aumento de carga tributária. Como visto, existe um cálculo econômico e
outro político necessários a serem realizados para aprovação da reforma no
Brasil e o “tabuleiro político” com as principais peças já estão postas. Os setores
e agentes econômicos devem estar atentos a todas essas transformações, haja
vista que terão impacto direto no dia a dia das atividades das empresas.

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13/04/2023 08:42 O xadrez e a equação política da reforma tributária no Brasil

Autoria

Alberto Carbonar – Advogado, mestre em direito tributário (LL.M.) pela


Georgetown University. MBA em Gestão de Negócios Internacionais pela
Fundação Getulio Vargas (FGV). Especialista em Direito Tributário pelo Instituto
Brasileiro de Estudos Tributários (IBET). Bacharel em Direito pelo Centro
Universitário de Brasília (UniCEUB). Cofundador do Grupo de Estudos sobre
Política Tributária (GEPT)

[1] Entre as normas apresentadas, destacam-se as Medidas Provisórias (MPs) nºs 1.159 e

1.160, que discutem, respectivamente, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da


COFINS e o retorno do voto de qualidade no CARF. Sobre a MP 1.160/2023, recomendamos a
leitura do artigo publicado no JOTA: “Retorno do voto de qualidade: Retrocesso rumo à
insegurança jurídica” – Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-
analise/artigos/retorno-do-voto-de-qualidade-retrocesso-rumo-a-inseguranca-juridica-
27012023>. Acesso em: 11.04.2023. Além dessas medidas, foi apresentado também o
“arcabouço fiscal” que reflete um conjunto de normas para controle dos gastos e receitas do
governo, a fim de transmitir previsibilidade às contas públicas e permitir o financiamento de
serviços, mantendo a dívida pública sob controle. O texto final do arcabouço fiscal ainda não
foi enviado ao Congresso.

[2] Vide “Simone Tebet diz na Câmara que a reforma tributária é a ‘bala de prata’ do governo“.

Fonte: Agência Câmara de Notícias. Disponível


em: <https://www.camara.leg.br/noticias/950785-simone-tebet-diz-na-camara-que-a-
reforma-tributaria-e-a-bala-de-prata-do-governo/>. Acesso em: 11.04.2023.

[3] Sobre o tema da regressividade, recomendamos a leitura do artigo “O efeito perverso da

regressividade no sistema tributário brasileiro” redigido por Laura Romano Campedelli e


Giselle Barra Bossa. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2014-nov-06/efeito-perverso-
regressividade-sistema-tributario-brasileiro>. Acesso em: 11.04.2023.

[4] Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/02/relatorio-

contencioso-tributario-final-v10-2.pdf>. Acesso em: 11.04.2023.

[5] Vide “Haddad fala em concluir reforma tributária no Congresso até outubro e descarta

volta da CPMF”. Fonte: G1. Disponível em:


<https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/03/13/haddad-fala-em-votar-reforma-

https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/o-xadrez-e-a-equacao-politica-da-reforma-tributaria-no-brasil-13042023 4/6
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tributaria-ate-outubro-no-senado-e-descarta-volta-da-cpmf.ghtml>. Acesso em:


11.04.2023

[6] Vide “Entenda em 7 pontos o impasse entre Lira e Pacheco”. Fonte: Poder360. Disponível

em: <https://www.poder360.com.br/governo/entenda-em-7-pontos-o-impasse-entre-lira-
e-pacheco/>. Acesso em 11.04.2023.

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