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EVIDÊNCIAS E OPÇÕES
INTRODUÇÃO
1
Consultor técnico do Senado Federal cedido pelo BNDES. Economista e técnico em
contabilidade. Doutor em economia pela UNICAMP e mestre pela UFRJ.
2
Economista, consultor e mestre pela UFF.
As opiniões aqui expressas são exclusivamente pessoais e não das instituições a que estão
vinculados. A pedido dos Senadores Francisco Dornelles e Lindbergh Farias, a análise foi
elaborada com estatísticas disponíveis até 30/9/ 2011 e atualiza argumentos anteriormente
desenvolvidos pelos autores no Texto para Discussão da ESAF nº 12, “Tributação do Setor de
Petróleo: Evolução e Perspectivas”, de junho de 2010. Vivian Almeida, Marcia Monteiro e
Marcela Afonso deram apoio na pesquisa.
3
Government take é assim definido em estudo do Banco Mundial (de Chakib Khelil): “The
“price” for the acreage is the government take—the total effect of the fiscal system on the
cash flow of an oil field—and is expressed as a percentage. For example, a government take of
55 percent means that the total government revenues resulting from the fiscal system
represent 55 percent of the cash flow from the oil field” – ver: http://bit.ly/uJbwwL
importações, e propriedades, dentre outros, inclusive na forma de contribuições e
taxas) até as rendas de exploração (as participações governamentais na extração
sob a forma de royalties, participações especiais e bônus).
A matéria poderia até ter despertado maior atenção, porém, tão logo o
governo federal preferiu uma modelagem em que a propriedade seria mantida por
ele e a empresa estatal seria operadora obrigatória em todos os campos, a forma
pela qual se cobra participações e impostos deixou de despertar maior interesse ou
investigações.
4
Há uma oferta ampla de análises sobre a mudança no regime de exploração de petróleo no
Brasil, ver, dentre outros trabalhos: Credit Suisse (2009); Ferreira e Levy (2009); Freitas (2009);
Itaú-Unibanco (2009); MME (2009); Springer (2009); FGV (2010); Gall (2011); Mendes e Kohler
(2011) e Oliveira et al (2011).
5
Além de Afonso e Castro (2010); outros estudos que abordagem a tributação do setor são:
Ramos (2004); Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (2008); Springer (2009);
Gobetti e Orair (2009); e Delloitte (2010), dentre outros.
6
Ver Goldsworthy e Zakharova (2010). Dentre outros trabalhos interessantes sobre a
experiência internacional com tributação e uso dos recursos naturais, ver: Khelil (1995); Davis,
Ossowski e Fedelino (2003); Bregman e Pinto (2009); e Brahmbhatt e Canuto (2010).
2
destinar mais receitas aos governos estaduais e municipais que não produzem ou
são afetados pela exploração.
O que não será objeto deste trabalho é o debate (ou melhor, embate) em
torno da distribuição das rendas governamentais decorrentes da exploração de
petróleo, que contrapõem os níveis de governo e os entes federados, seja sobre
receitas futuras, seja sobre as já existentes.11
7
Ver, respectivamente, http://bit.ly/pcnSMD e http://bit.ly/ratE4N .
8
Respectivamente, artigos disponíveis em: http://bit.ly/r3vGuI e http://bit.ly/nTkANH .
9
Ver, respectivamente, http://bit.ly/onAm9r e http://bit.ly/n3ynUw
10
Para calcular indicadores de carga, foram utilizados os montantes anuais do Produto Interno
Bruto (PIB), apurados nas contas nacionais e divulgados pelo IBGE. Quando foi preciso apurar o
índice para período mais curto, foi adotada a série mensal de PIB divulgada pelo Banco Central
do Brasil (BC).
11
A atitude é justificada para manter o foco na tributação (importa a origem dos recursos e
não a forma como são aplicados) e porque já há uma razoável literatura nacional sobre a
3
ASPECTOS NACIONAIS DA CARGA DO SETOR
questão federativa em torno das participações governamentais (com muito mais trabalhos
tratando do uso dessas receitas do que da forma como são exigidos).
12
A RAD considerada contempla apenas a chamada receita administrada pela antiga Receita
Federal, tais como tributos sobre lucros das empresas (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica
(IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL), vendas (Contribuição para
Financiamento da Seguridade Social (COFINS), Programa de Integração Social (PIS) e
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE), importações e retenções na fonte
(Imposto de Renda (IR) dos empregados). Não são computadas as receitas de Simples,
previdência social e compensações financeiras
13
A arrecadação de ICMS proveniente de combustíveis é informada, mensalmente e por
unidade federada, pelo CONFAZ, no portal do Ministério da Fazenda. Para uma análise
específica sobre sua estruturação, inclusive importância regional, ver Afonso (2010).
14
A fonte primária dessa informação é a ANP, que divulga relatórios periódicos e com máxima
discriminação (inclusive de beneficiários) em seu portal na internet.
4
Tabela 1 - Arrecadação Tributária do Setor de Petróleo em % do PIB - 2000/2010
2
Ano RAD¹ ICMS Rendas de Exploração Total
2000 0,78% 1,26% 0,25% 2,29%
2001 0,86% 1,33% 0,31% 2,49%
2002 1,33% 1,31% 0,39% 3,03%
2003 1,60% 1,38% 0,55% 3,54%
2004 1,48% 1,33% 0,53% 3,34%
2005 1,52% 1,31% 0,61% 3,44%
2006 1,51% 1,37% 0,70% 3,57%
2007 1,26% 1,26% 0,55% 3,07%
2008 1,23% 1,27% 0,75% 3,25%
2009 1,00% 1,15% 0,52% 2,67%
2010 0,93% 1,11% 0,59% 2,63%
Elaboração própria. Fonte primária: Angela/SRF, Confaz, ANP e SCN/IBGE.
¹RAD = Receita Administrada pela RFB. Exclui receitas contribuições previdenciárias e simples.
²Compreende royalties e participações especiais arrecadados para ANP.
5
Tabela 2 - Receitas do Setor de Petróleo em % do VBP - 2000/2009
2
Ano RAD¹ ICMS Rendas de Exploração Total
2000 19,02% 30,92% 6,02% 55,96%
2001 20,87% 32,30% 7,53% 60,70%
2002 29,52% 29,05% 8,55% 67,12%
2003 31,23% 26,96% 10,77% 68,95%
2004 27,92% 25,01% 10,02% 62,95%
2005 26,98% 23,19% 10,89% 61,06%
2006 26,53% 24,15% 12,30% 62,97%
2007 23,49% 23,48% 10,26% 57,23%
2008 21,02% 21,73% 12,77% 55,53%
2009 21,32% 24,55% 11,05% 56,92%
Elaboração própria. Fonte primária: Angela/SRF, Confaz, ANP e PIA/IBGE.
¹ RAD = Receita Administrada pela RFB. Exclui receitas previdenciárias e simples.
²Compreende royalties e participações especiais arrecadados para ANP.
Por isso, a proposta para avaliação agora é voltar à carga tributária agregada
do setor (RAD+ICMS+Rendas de Exploração) e comparar sua evolução com a da
6
carga tributária bruta global (no conceito mais amplo, das contas nacionais)15, entre
2000 e 2010, conforme a Tabela 3.
15
Ver levantamento dos mesmos autores disponível em: http://bit.ly/nljNut
Chama-se a atenção que a RFB adota outra metodologia para mensurar a carga tributária que
apura resultados anuais um pouco menos que os encontrados pelos autores – ver o cálculo
oficial em: http://bit.ly/q9inzh
7
arrecadou apenas 0.34 pontos do produto a mais do que em 2000, porém, os
demais setores recolheram a mais 4,9 pontos, de modo que a carga nacional
cresceu 5,24 pontos, líquida da CPMF, ou 4 pontos, se for computada a carga total
(incluindo a CPMF).
8
setores: incremento de apenas 0,15 pontos do PIB em petróleo e de 2,11 para os
demais setores, ou de 0,7 pontos (se considerada a receita bruta, incluindo CPMF). A
discrepância entre os dois setores respeita a oscilação que se dá em petróleo, com a
RAD provocando o mesmo movimento já observado na carga agregada: a razão
quase dobrou entre 2000 e o biênio 2005/06 (de 0,8 para 1,5 pontos do produto),
mas depois decresceu a cada ano. Já para os outros setores, a RAD apresentou uma
expansão contínua, só interrompida pela crise financeira global que a derrubou em
200916, mas já foi parcialmente recuperada em 2010.
9
resultado semestral do setor. A contribuição de petróleo para a receita federal
decresceu semestre a semestre desde que gerou 11,2% da RAD no primeiro
semestre de 2003, tendo contribuído com apenas 5,3% na primeira metade de
2011.
1,7%
1,6%
1,5%
1,4%
% do PIB
1,3%
1,2%
1,1%
1,0%
0,9%
0,8%
20 1
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09
09
10
10
11
20
Semestre
10
decrescente, o que é consistente com a análise apresentada na seção anterior.
Depois do máximo de 31,23% em 2003, a alíquota média caiu para apenas 21,32%
em 2009. Ou seja, nesse último, como já tinha sido visto (na Tabela 4) que a RAD de
petróleo decrescera para 1% do PIB, e dado que o valor bruto da produção (VBP)
desse setor foi estimado em 4,68% do PIB,17 resultou que a alíquota média da
tributação federal foi de 21,32%. Ao cotejar a evolução da RAD e do VBP na tabela
6, se observa que não foi uma expansão da produção mas sim um recuo dos
recolhimentos para a União que derrubaram o nível de tributação do petróleo.
17
Estimativa com base na produção total de óleo e gás natural (mil boed) para 2009, fornecida
pela PETROBRAS.
11
diretamente o comportamento do ICMS e da RAD, com uma queda gradual a partir
do primeiro semestre de 2003.
12
Gráfico 3: Evolução da Receita Administrada Federal dos Setores de Petróleo
em % do PIB: 2000/2011 (ago)
18
A volatilidade dos preços do setor, comparando os da PETROBRAS aos internacionais, é
objeto do slide 12 da apresentação disponível em:
http://www2.PETROBRAS.com.br/ri/pdf/APIMECs_4T09.pdf .
13
Elaboração própria. Fonte primária: Ipeadata.
14
Elaboração própria. Fonte primária: ANP.
Isso tudo demonstra que, seja por quantidade, seja por preço, a base de
tributação federal no setor petrolífero, por princípio, é hoje muito maior que era há
quatro, seis ou oito anos. Não há dúvida de que a base não explica a deterioração
da arrecadação federal do setor – muito pelo contrário, ela deveria estar sinalizando
uma forte expansão, inclusive mais acelerada que o PIB.
19
Segundo Adriano Pires, “... considerando 2005 como ano base, os preços da gasolina e do
diesel, praticados nas refinarias nacionais, registram um aumento acumulado até agosto de
2011 de 23,06% e 18,60%, respectivamente, enquanto o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA), utilizado pelo Banco Central para fixar a meta de inflação no Brasil, registra
aumento acumulado de 38,31% no período.”
15
intenso recurso a mecanismos de compensação tributária em 2009; segundo, as
mudanças na aplicação das contribuições sobre vendas.
20
No boletim de dezembro de 2009, por exemplo, a SRF (2009) ao comentar o desempenho da
arrecadação federal em neste ano mencionou: sobre a CONFINS e o PIS/Pasep, “[...] os fatores
mais relevantes para esse resultado foram: a) realização de compensações de pagamentos
indevidos ou a maior, no montante de R$ 2,7 bilhões [...]” (p. 12); sobre a CIDE-Combustíveis,
[...] e compensações, nos meses de janeiro a março/09, no valor de aproximadamente R$ 1
bilhão (p. 13). Observa-se complementarmente que, no caso das duas primeiras contribuições,
a tabela da página 13 indica que a arrecadação de Combustíveis diminuiu de R$ 15.415 em
2008 para R$ 12.027 em 2009, a preços de dezembro de 2009 (IPCA). Isto representou uma
queda de R$ 3.387 milhões ou de 22%, que explicou 32,2% do decréscimo total da arrecadação
da COFINS e PIS no ano.
21
A PETROBRAS confessou publicamente as compensações tributárias e justificou sua iniciativa
ao menos por duas vezes: em audiência pública no Senado Federal, do seu Presidente em
reunião na Comissão de Assuntos Econômicos em 24/03/2009; ver: http://bit.ly/qq8l4S/ ; em
nota oficial emitida em 11/05/2009, sob o título: “PETROBRAS adota práticas tributárias
legais”; ver: http://bit.ly/qLZUF4 .
22
A polêmica compreendeu dois aspectos específicos das compensações: primeiro, a
possibilidade de mudar no meio do exercício financeiro o regime de tributação de recursos
externos; segundo, a transferência para outros governos de receita que tenha sido objeto de
compensação. A PETROBRAS defendeu que compensou R$ 2,14 bilhões relativos à variação
cambial porque:
“... até então vinha tributando as receitas de variação cambial pelo regime de
competência, optou por utilizar o regime de caixa para o exercício de 2008... Desta
forma, ainda que por razões sistêmicas a mudança de critério tenha sido
operacionaliza no segundo semestre de 2008, a mesma vale para todo o exercício em
razão da opção pela apuração anual... Essa opção é formalizada, anualmente, no
momento em que a PETROBRAS entrega a DIPJ. Para o exercício de 2008, essa entrega
ocorrerá apenas em 30 de junho de 2009.”
A RFB divulgou em 11/05/2009 esclarecimento a respeito da MP n. 2158-35, de 2001:
16
A criação de um regime especial para tributação de combustíveis pela
COFINS e PIS impactou de forma mais duradoura a evolução da RAD: desde 2004,
passou a ser aplicada uma alíquota ad rem – isto é, as alíquotas foram estabelecidas
como um valor por unidade física vendida.23 Isto em si não era um problema, salvo
que o valor corrente fixado naquela época nunca mais foi corrigido.
17
Ministério da Fazenda assumido que o governo está “neutralizando a elevação dos
custos desses produtos, mantendo o preço ao consumidor inalterado”. Ou seja, de
forma confessa, a CIDE é utilizada como instrumento, simultaneamente, para
subsidiar o refino e para conter uma possível pressão inflacionária.
4. Entre fevereiro de 2010 e abril de 2010, redução para o caso da gasolina pelo
Decreto nº 7.065 : Art. 1º A alíquota específica de que trata o inciso I do art. 1º do
Decreto nº 5.060, de 30 de abril de 2004, fica reduzida para R$ 150,00 (cento e
cinquenta reais) por metro cúbico de gasolinas e suas correntes até 30 de abril de 2010,
retornando para R$ 230,00 (duzentos trinta reais) por metro cúbico de gasolinas e suas
correntes a partir dessa data.
5. Entre 1/11/2011 e 30/6/2011, Decreto nº 7.591 de 2011 reduziu a CIDE no caso da
gasolina para R$ 0,091 e do óleo diesel para R$ 0,047, ambos por litro.
25
Ver http://bit.ly/razowM
26
Gobetti e Orair (2009) também destacaram a diferença nas tendências da arrecadação de
PIS/COFINS/CIDE e de outros tributos na atividade petrolífera:
No caso do setor petroquímico, que também se beneficiou da valorização do preço do
petróleo, entretanto, os dados indicam uma estagnação da receita antes da crise,
influenciada principalmente pelas receitas do PIS/COFINS e da CIDE, que representam
dois terços do total e permaneceram constantes desde 2004. Este fato está
fortemente relacionado à forma como esses tributos são calculados no caso dos
combustíveis, com uma alíquota específica sobre o volume. No caso do PIS/COFINS,
por exemplo, o imposto corresponde a R$ 0,26 por litro de gasolina e R$ 0,15 por litro
de diesel desde 2004, enquanto a CIDE inclusive teve sua alíquota reduzida no ano
passado como instrumento de combate à inflação. Ou seja, o valor do imposto tem
sido mantido fixo (ou menor) em termos nominais e reduzindo-se em termos reais
(Gobetti e Orair, 2009, p.15).
18
Elaboração própria. Fonte primária: ANP e SRF.
Há uma vantagem em apurar dados oficiais dessa empresa é que por ser
uma companhia aberta e submetida aos rigores da governança corporativa do
mercado de capitais brasileiro, a PETROBRAS é obrigada a detalhar informações
sobre os tributos que recolhe em seus balanços e outros instrumentos, inclusive no
19
seu portal na internet. Isso permite fazer uma análise mais circunstanciada com base
em documentos públicos.
27
A exposição foi de livre acesso público e o arquivo correspondente foi disponibilizado no
portal do Senado em: http://bit.ly/o4VC6e .
Esta seção não comentará o artigo já citado de José Gabrielli, “O que pagamos não é pouco”,
porque ele é focado nas participações especiais e, como já foi dito antes, este estudo será
dedicado à tributação como um todo, e sem detalhar as participações governamentais na
extração de petróleo, que merece outra e mais específica análise.
28
As informações tributárias do slide 16 foram prestadas pelo regime de competência (o valor
apurado pode não ter sido efetivamente recolhido, embora, por princípio, a inadimplência
tributária no caso da PETROBRAS é uma hipótese absolutamente remota).
20
Para uma análise adequada, obviamente, é preciso converter os valores
correntes do slide a preços constantes. A evolução real das incidências sobre a
PETROBRAS, conforme a Tabela 7, têm dois movimentos, expansionista até 2008 e
de retração depois. Se 2008 foi o melhor ano da década, com um montante
apurado de R$ 87,9 bilhões, dois anos depois a empresa apurou R$ 3,2 bilhões a
menos ou -3.6%. Tal contenção foi concentrada nas participações que diminuíram
de R$ 23,9 para 19,8 bilhões entre 2008 e 2010, com queda de 17%. Se as ditas
contribuições ficaram estáveis no ultimo biênio, esse não pode ser considerado um
bom resultado relativamente ao resto da economia, como fica mais claro quando os
mesmos valores são expressos em proporção do PIB – ver Tabela 8.
21
Ao converter os valores dessa série histórica em proporção do PIB, na
verdade, os expressamos em termos de carga tributária, que mede a razão entre
arrecadação e produto (ver Tabela 8). Aliás, este foi o ponto central da reportagem
já citada do jornal O Globo que mostra uma discrepância entre a tendência da carga
da PETROBRAS e dos demais contribuintes: tendo decrescido para a primeira,
enquanto aumentava para os outros e o total. A Tabela 8 adota o conceito mais
abrangente de carga tributária bruta global,29 que também compreende as
participações governamentais (ao contrário da metodologia adotada pelo Ministério
da Fazenda). No prazo mais largo, entre 2003 e 2010, a carga da PETROBRAS
(contribuições mais participações) diminuiu em 0.64 pontos do PIB enquanto a carga
nacional aumentou em 2,15 pontos, o que significa que para todos os demais
contribuintes o incremento de carga foi ainda maior, de 2.78 pontos do produto. Se
sozinha a PETROBRAS chegou a gerar 9% da carga tributária nacional em 2003, sua
participação caiu para 6.6% em 2010. Ou seja, enquanto diminuiu a carga da
PETROBRAS, aumentou a do resto da economia e, no final, os governos
conseguiram arrecadar mais.
29
Estatísticas da carga tributária global anual e da mensal extraídas dos levantamentos dos
autores disponíveis em: http://bit.ly/nljNut e http://bit.ly/sujuCN
22
plenos só a partir de 2003 (quando passarem a serem aplicadas as tabelas
definitivas das participações especiais). O índice oscilou entre 0.55% e 0.68% do PIB
de 2003 até 2007. De repente, em 2008, bateu o recorde histórico: 0,72% do PIB em
2008, com o pico de preços. Mas, em seguida, recuou nos dois anos, até fechar em
0.54% do PIB em 2010, que foi um nível inferior ao observado até 2003. Como a
produção de óleo no País foi crescente e até recorde depois da crise global, se pode
inferir que a oscilação dos preços internacionais explicou essa quebra e que o
desenho atual das participações governamentais não acompanhou a expansão da
produção física, das receitas e, sobretudo, de rentabilidade do setor.
23
O próprio slide do Presidente Gabrielli, mesmo expresso em valores
correntes e sem computar inflação ou crescimento, já deixa claro que a PETROBRAS
passou a pagar menos para a Receita Federal enquanto os outros contribuintes
passaram a pagar mais. Para melhor dimensionar essa evolução, a Figura 1
apresenta os valores correntes extraídos do citado slide e, em seguida, os constantes
(deflacionado pelo IPCA) e em proporção do PIB. Foram somadas as arrecadações
da estatal e dos outros contribuintes e, para fins de análise comparativa, também a
carga tributária global. Atentando que, em 2011, os dados se referem apenas ao
primeiro semestre – logo, no cálculo em porcentagem do PIB, também foram
contados apenas o produto dos primeiros seis meses desse ano (fonte BC).
24
Figura 1
PARTICIPAÇÃO DA PETROBRAS NA ARRECADAÇÃO FEDERAL
- VALORES CORRENTES
em R$ milhões correntes, 2008 a 2011
Ano Petrobras* Outros * Soma Federal Petrobras/Global PIB
2008 60.569 625.106 685.675 8,8% 3.031.864
2009 49.233 649.066 698.299 7,1% 3.185.125
2010 55.960 749.748 805.708 6,9% 3.674.964
2011(Jan/Jun) 29.647 435.963 465.610 6,4% 1.957.590
Fontes: PETROBRAS (empresa e outros); e IBGE/BACEN (PIB)
- VALORES CONSTANTES
em R$ bilhões constantes do primeiro semestre de 2011 (IPCA)
Ano Petrobras* Outros * Soma Federal IPCA médio** Multiplicador
2008 68.828 710.346 779.174 2.827 1,1364
2009 53.339 703.201 756.540 2.965 1,0834
2010 57.719 773.315 831.034 3.115 1,0314
2011(Jan/Jun) 29.647 435.963 465.610 3.212 1,0000
Var.2010/08 -16,1% 8,9% 6,7% 10,2%
Fonte: PETROBRAS. Deflator: IPCA (IBGE).
- PORCENTAGEM DO PIB
- valores convertidos em % do PIB, 2008 a 2011
Ano Petrobras* Outros * Soma Federal Carga Global ** Demais Petrobras/Global
2008 2,00% 20,62% 22,62% 35,50% 33,50% 5,6%
2009 1,55% 20,38% 21,92% 34,68% 33,13% 4,5%
2010 1,52% 20,40% 21,92% 34,97% 33,45% 4,4%
2011(Jan/Jun) 1,51% 22,27% 23,78% 37,04% 35,52% 4,3%
2010-2008 -0,48% -0,22% -0,69% -0,53% -0,05% -
2011-2008 -0,48% 1,65% 1,17% 1,54% 2,02% -
Fontes: PETROBRAS (empresa e outros); e IBGE/BACEN (PIB)
* Arrecadação federal inclui tributos não administrados pela Receita Federal, inclusive participações governamentais.
PETROBRAS e Outros - valores informados por Sergio Gabrielli, CAE/Senado, em 24/8/2011 (slide 17), pelo regime de caixa.
Soma Federal: não informada por Gabrielli, mas inferida a partir da soma dos dois agregados.
** Carga tributária bruta global - apuração dos autores (inclusive participações governamentais).
Demais contribuintes calculado pela diferença entre carga global e contribuições da PETROBRAS.
25
PETROBRAS determinou 70% da perda da carga tributária federal (porque sua
arrecadação caiu em 0.48 pontos). Outra face dessa mesma moeda é que todos os
demais contribuintes recolheram para a União 0.22 pontos do PIB a menos em 2010
do que em 2008 - ou seja, a perda com esse enorme contingente de contribuintes
correspondeu apenas a metade da perda gerada pela PETROBRAS.
30
Ver: http://bit.ly/n4NURB .
26
informa apenas em valores correntes, aqui convertidos em proporção do PIB e em
preços constantes.
Figura 2
CONTRIBUIÇÕES ECONÔMICAS (TRIBUTOS) DA PETROBRAS - 2006/2010
- em porcentagem do PIB
Tributos 2006 2007 2008 2009 2010 2010-08 2010-06
ICMS 0,75% 0,68% 0,76% 0,78% 0,78% 0,02% 0,03%
Cide 0,33% 0,29% 0,18% 0,18% 0,19% 0,01% -0,14%
Pasep/Confins 0,49% 0,45% 0,42% 0,39% 0,40% -0,02% -0,09%
IRPJ/CSLL 0,48% 0,40% 0,51% 0,29% 0,32% -0,19% -0,16%
= Soma Tributos 2,05% 1,82% 1,87% 1,64% 1,69% -0,18% -0,36%
Demais 0,10% 0,10% 0,04% 0,08% 0,08% 0,03% -0,02%
TOTAL CONTRIBUIÇÕES 2,15% 1,93% 1,92% 1,72% 1,77% -0,15% -0,38%
PIB 2.369.483 2.661.343 3.031.864 3.185.125 3.674.964
Fonte primaria: PETROBRAS. Valores correntes convertidos em % do PIB.
A análise da evolução dos principais tributos entre 2006 e 2010 indica, antes
de tudo, que não houve mudanças no ICMS estadual, com uma tendência
ligeiramente crescente entre as pontas: de 0,75% para 0,78% do PIB entre 2006 e
2010 (o pior ano foi o de 2007, quando recuou para 0,68%). Este foi um cenário
bem diferente do observado no âmbito federal (claramente negativo no período),
pois, tanto naquele período mais largo, quanto no último biênio, todo o recuo foi
27
decorrente de menor recolhimento de tributos para a União. É curioso que esse
comportamento tão díspare foi observado mesmo no caso de tributos com base
semelhante – quer dizer, teoricamente, as contribuições para PASEP/COFINS
deveriam ser não-cumulativas como o ICMS, porém, no longo prazo, elas perderam
fôlego enquanto o ICMS se recuperou (da queda em 2007, antes da crise global). O
desempenho mais linear deste imposto estadual contrasta ainda mais se
confrontado ao dos tributos sobre lucros, indicando que não foram as vendas que
comprometeram o resultado.
Portanto, o PASEP (a cobrança é igual o PIS, mas por alcançar uma estatal,
vale esta denominação) e a COFINS, adotam a mesma forma de cobrança sobre os
combustíveis da CIDE: um valor fixo para uma unidade do produto. Ou seja, mesmo
em um cenário de aumento do preço dos combustíveis no mercado interno – o que
efetivamente ocorreu até o início de 2009 – as alíquotas, por serem do tipo ad rem,
não acompanham este movimento, o que acaba depreciando a arrecadação do
setor frente aos demais setores que apresentam as alíquotas tradicionais (ad
valorem). Na prática, a alíquota efetiva (quociente entre o valor arrecadado e o valor
do produto), em uma situação como esta seria altamente afetada pelas variações de
preço.
28
Somadas as contribuições discriminadas pela empresa, se confirma a
tendência declinante: queda de 0.36 pontos do PIB entre 2006 e 2010, sendo que
exatamente a metade foi verificada nos dois últimos anos do período.
29
Figura 3
PARTICIPAÇÕES GOVERNAMENTAIS DA PETROBRAS - 2006/2010
Contribuições
Eco.Identificadas 48.631 48.564 56.742 52.092 62.089 5.347 13.458
GOVERNOS 65.050 63.827 78.556 68.651 81.799 3.243 16.749
Fonte primaria: PETROBRAS. Participações governamentais informadas na página de relações com investidores no seu portal =
http://bit.ly/n4NURB
Contribuições
Renda total doseconômicas
governos éidentificadas
o somatório no
de mesmo portal compreendem
participações ICMS,
governamentais comCIDE, PASEP/COFINS
contribuições e IRPJ/CSLL.
econômicas identificadas, ambas
informadas pela empesa.
- em porcentagem do PIB
Rendas 2006 2007 2008 2009 2010 2010-08 2010-06
Royalties 0,32% 0,28% 0,34% 0,25% 0,26% -0,08% -0,07%
Participações Especiais 0,35% 0,27% 0,38% 0,26% 0,28% -0,10% -0,08%
Retenções de Área 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00%
Bônus de Assinatura 0,01% 0,01% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% -0,01%
= PARTICIPAÇÕES 0,69% 0,57% 0,72% 0,52% 0,54% -0,18% -0,16%
Contribuições
Eco.Identificadas
= RENDAS DOS 2,05% 1,82% 1,87% 1,64% 1,69% -0,18% -0,36%
GOVERNOS 2,75% 2,40% 2,59% 2,16% 2,23% -0,37% -0,52%
PIB 2.369.483 2.661.343 3.031.864 3.185.125 3.674.964
Fonte primaria: PETROBRAS. Valores correntes convertidos em % do PIB.
30
um incremento de 2.2% no caso de royalties. Inclusive, em 2007, os royalties
chegaram a superar as participações, em caráter excepcional. Não custa recordar
que essas duas participações têm formas de incidência distintas: os royalties
decorrem de uma alíquota (quase sempre) de 10% sobre a receita bruta, enquanto
as participações especiais seriam progressivas, com alíquotas de 10% até 40%, mas
sobre a receita líquida; logo, uma pior evolução na segunda pode estar refletindo
uma perda de rentabilidade ou demonstrando que a sistemática de cobrança é
ineficiente para alcançar os ganhos do setor (cuja produção e preços subiram
fortemente).
Nas contas nacionais, petróleo e gás não diminuíram, mas sim ganharam
peso relativo nas ultimas estatísticas divulgadas pelo IBGE com corte anual: no
período 2004-2008,31 o detalhamento do valor adicionado bruto por atividade
evidencia que petróleo e gás natural agregou peso relativo na economia, saltando
de 1,1% para 2,1% do total (pag.86), porque, a preços constantes, adicionou valor
em ritmo muito mais rápido que o resto da economia, com surpreendente variação
de 156% entre 2008 e 2004 contra apenas 50% e 54% da indústria e toda a
economia, respectivamente (pag.85). Portanto, quando ponderado o último dado
31
Ver http://bit.ly/oIirel .
31
oficial e anual das contas nacionais discriminada por atividade, se observa que
petróleo e gás ganharam rápida e fortemente espaço na economia brasileira,
justamente em um intervalo de quatro anos em que a principal empresa do setor
diminuiu o que chama de contribuição econômica (sua carga tributária caiu de
2.12% para 1.92% do PIB). A mesma tendência é confirmada por estatísticas mais
atualizadas das contas nacionais trimestrais32 e da pesquisa industrial mensal, 33
ambas divulgadas pelo IBGE.
32
As contas nacionais trimestrais não permitem especificar petróleo e gás em meio à indústria
extrativa mineral, mas este setor segue acumulando no longo uma variação de volume
superior ao resto da economia: na última edição, do terceiro trimestre de 2011, o índice de
volume (com base 100 na média de 1995) da extrativa mineral fechou em 207,0, muito acima
de 141,2 e de 163,1 da indústria e do PIB a preços de mercado, respectivamente (pag.29), ou
seja, o setor em que petróleo e gás devem superar minério de ferro e outros cresceram à
frente do resto da indústria, da agropecuária e de muitos serviços, mais uma vez contrariando
a tese de que, no longo prazo, mesmo observando os últimos dados da produção brasileira, a
atividade principal da PETROBRAS estaria perdendo espaço. Ver http://bit.ly/oWTG2H
33
A pesquisa industrial mensal do IBGE confirma a tendência de melhor desempenho do
extrativismo mineral em relação à transformação mesmo para o período pós-crise: tomando o
índice de base fixa mensal da produção, se observa que a posição da extrativa em julho de
2011 era exatamente a mesma de julho de 2008 (índice de 155,6, novamente tomando a
média de 2002 como base), porém, o índice da indústria de transformação registrava um recuo
de 2,5%. Portanto, em termos físicos, isolando qualquer efeito de preço, é observado que a
indústria de transformação ainda não recuperou o nível de produção registrado antes da crise
enquanto a indústria extrativa ao menos conseguiu permanecer no mesmo patamar. Mais uma
vez, a evolução da produção na extrativa não justificaria uma retração da arrecadação
tributária pela principal empresa do setor – e sempre lembrando que em todas as estatísticas
aqui citadas, das contas nacionais anuais até a trimestral, se analisa volume de modo que não
há efeito de preço para provocar qualquer variação na participação relativa. Ver série temporal
em http://bit.ly/ob7ZhJ
34
Ver http://bit.ly/qkCTOg
32
direita), que ambos diminuíram de peso relativo depois de 2008 (ou seja, em um
movimento que está descolado do valor do preço do barril do petróleo).
35
Ver http://bit.ly/n5gyVm .
36
Ver http://bit.ly/pbW0k7
33
(slide 7), inclusive para justificar o cenário que mantém acelerado o aumento do
volume de vendas esperado, além de mostrar uma evolução recente muito mais
favorável na PETROBRAS do que nas outras grandes companhias petrolíferas do
mundo (chamadas de PEERS), tanto em termos de preços (slides 30 a 32), quanto
de rentabilidade (slide 33).
34
o quantitativo de pessoal próprio saltou de 40.541 para 57.498 entre 2005 e 2010,
segundo reportado ao DEST); as vendas de combustíveis no mercado doméstico,
base da COFINS, PASEP e CIDE, mas houve aumento do consumo físico e os preços
estão descolados dos internacionais; e os lucros, base do IRPJ e da CSLL, mas a
própria PETROBRAS destaca que sua margem de lucratividade tem sido melhor do
que das maiores empresas do mundo nesse ramo.
35
Ainda falta, porém, mais atenção à tributação desse óleo, que será
propriedade de um órgão público e não mais de uma empresa, estatal ou privada.
Ora, a Carga Magna prevê, no capítulo tributário, imunidade recíproca para cada
uma das três esferas de governo. Assim, no sistema vigente, a União não é
contribuinte dos maiores impostos e contribuições cobradas no País, a começar
porque não fatura e muito menos lucra, como uma empresa comum, que é
contribuinte de tributos que incidem sobre tais bases. Se o texto constitucional é
claro sobre tal imunidade em relação aos impostos, a jurisprudência tem expandido
tal interpretação para as contribuições.37
36
saúde pública (diretamente, por conta da vinculação do FPE/FPM) e para o
orçamento da seguridade social como um todo (no caso da COFINS/CSLL), ou
ainda para o seguro-desemprego (via PIS, que, aliás, também deixaria de beneficiar
o BNDES). Simulações de Afonso e Castro (2010) apontam que a carga tributária
deixaria de ser elevada na seguinte magnitude: “No ano de pico da produção
(2031), cerca de 0,63% do PIB por ano; o equivalente a R$ 21,5 bilhões a preços
médios atuais; antes desse ano, tal impacto seria crescente, junto com a produção,
começando em 0,02% do PIB em 2013; depois de 2031, a tendência seria inversa,
com o impacto caindo para 0,29% do PIB em 2040; na média, entre 2010 e 2040, o
impacto seria de 0,34% do PIB; o equivalente a R$ 12,3 bilhões a preços médios
atuais.”
37
indiretamente recebem.38 A educação também deixará de se beneficiar da
vinculação sobre o IRPJ que não aumentará junto com os lucros do petróleo do
novo regime. Também deixarão de ganhar contribuições as áreas: da seguridade
social, incluindo saúde (inclusive os repasses do SUS para governos locais) e
assistência social (que compreende o bolsa-família), pois a União não é contribuinte
de COFINS e de CSLL; e do FAT, ou melhor, do seguro-desemprego, do abono
anual e dos investimentos do BNDES, porque o PASEP (devido por governos)
arrecadará bem menos do que o PIS (se a receita fosse de empresas).39
OBSERVAÇÕES FINAIS
38
Vale comentar à parte um arranjo pitoresco e pouco comentado (a exemplo dos impostos)
na definição das participações no regime de partilha. Por sua lei básica, os royalties devidos
pelas empresas acabarão suportados pela própria União, uma vez que, no novo regime de
partilha, as contratadas deduzirão da receita os custos, não só de exploração, como também
dos royalties devidos (ver nova redação do inciso V do art.15; que deixa implícito o que antes
estava explícito no projeto vindo da Câmara, no segundo parágrafo do art. 42; lembrando que
tal regra não constava no projeto original do Executivo). Isto difere do regime atual, em que o
custo dos royalties é suportado pela própria empresa produtora, a mesma empresa poderá
cobrar tal custo do proprietário do óleo (União).
39
Como a tributação do petróleo se confunde com os ciclos de centralização e
descentralização fiscal na Federação Brasileira foi objeto da análise de Afonso e Almeida
(2011).
38
pode ser mera coincidência o provável resultado da nova modelagem proposta
para exploração do pré-sal, que permitirá reduzir a incidência tributária sobre a
receita futura e, ao mesmo tempo, centralizar tal renda pública nas mãos do
governo federal, em claro detrimento dos governos estaduais e municipais e
também da aplicação compulsória na seguridade social, no amparo ao trabalhador
e mesmo na educação e saúde.
Não se pode esquecer que a defasagem nos preços dos combustíveis (em
relação aos preços internacionais e aos custos internos) impôs inegáveis e pesadas
perdas financeiras às empresas que atuam no setor. O governo federal nem
esconde que usa a tributação para atenuar tais efeitos ao menos quando reduz a
incidência da CIDE, e declara abertamente que visa melhorar a rentabilidade do
setor e garantir que os preços aos consumidores sejam mantidos. Adriano Pires
estimou recentemente as perdas da PETROBRAS na casa de R$ 10 bilhões. 40
39
pode estar uma visão imediatista de governo - isto é, priorizar acima de tudo o
controle da inflação. Para tanto, foram congelados os preços internos de
combustíveis, provavelmente por imposição do controlador da sociedade de
economia mista, que, apesar de ser regida pelo direito privado e ter acionistas
privados, parece que acabou transformada ou reduzida a um instrumento de
política anti-inflacionária. O mesmo efeito decorre de outra visão, e aí sim
estruturalista – o viés estatizante. Não é a toa que a PETROBRAS foi definida como
sócia obrigatória de qualquer campo que vier a ser explorado no regime de
partilha.41 Não há a menor dúvida de que será monumental o esforço de
investimento exigido da PETROBRAS para se aprovar as riquezas recém-descobertas
do pré-sal, seja qual for o regime, sejam quais forem as parceiras. A imperiosidade
de gerar cada vez mais recursos próprios para inversões tão enormes só agrava o
problema decorrente da defasagem de preços. Por ambas óticas, imediatista ou
estruturalista, se colhem razões que poderiam eventualmente explicar, tanto a
possível flexibilização na tributação do setor, já promovida no regime de concessão
e reproduzida e potencializada no novo regime de partilha, quanto a certa
despreocupação com a inegável redução da carga tributária do setor e de sua
maior empresa. Talvez tenha sido montado um grande e crescente círculo vicioso,
em que um artificialismo puxa outro, uma distorção provoca outra.
Não se quer fazer juizo de valor se são corretas ou não tais decisões. Mas,
cabe defender que é premente dar total transparência, fiscal, política e social, a esse
processo. Controlar inflação manipulando preços de uma empresa estatal ou
estatizar investimentos e produção de um insumo estratégico da economia
recorrendo a mesma empresa pode ser a opção da política econômica, e porque
não dizer do próprio Estado Brasileiro, mas elas devem ser feitas de forma aberta à
sociedade. É premente que essa escolha seja feita de forma aberta, com total
transparência e clareza, das razões, das medidas e das consequências.
41
A comprovação definitiva desse viés estatizante seria se fosse mantido no projeto de lei
recentemente votado no Senado e que trata da divisão federativa das participações
governamentais, uma norma inusitada que permitiria a União formar joint venture e se tornar
diretamente proprietária de campos de exploração de petróleo. A iniciativa do Relator,
Senador Vital do Rego, não foi bem explicada, e a própria Liderança do Governo também foi
rápida ao derrubar a medida sem maiores debates.
40
Referências Bibliográficas
AFONSO, J. R., ICMS Estadual sobre Petróleo e Energia Elétrica. Audiência Pública no
Senado Federal, 30/06/2010. Disponível em: http://bit.ly/nWp28w
41
FERREIRA, S. G.; LEVY, N. O novo marco regulatório do petróleo no brasil: uma
análise das implicações fiscais do PL nº 5.938/ e seu Substitutivo. Nota
Técnica Sefaz/RJ 2010.01. Subsecretaria de Estudos Econômicos, 2009. p. 29.
Disponível em: http://bit.ly/rd6wvV
GOBETTI, S. W.; ORAIR, R. O que explica a queda recente a receita tributária federal?
Nota Técnica da Dimac IPEA. Brasília, ago/2009. p. 18. Disponível em:
http://bit.ly/razowM
KHELIL, C. Fiscal Systems for Oil. Privatesector, World Bank, May 1995.
http://bit.ly/uJbwwL
42
MENDES, M.; KOHLER, M. Os estados e municípios devem receber royalties de
petróleo? IFB/Brasil, Economia e Governo. 06/06/2011. Disponível em:
http://bit.ly/kO3Neu
Relação de Siglas
43
CSLL – Contribuição Social sobre Lucro Líquido
IR – Imposto de Renda
44
ANEXO ESTATÍSTICO
Participações Governamentais (milhões de R$) 6.108 5.168 4.769 5.144 5.100 20.181 19.076 22.505 15.754 17.311
Imposto e contribuições (milhões de R$) - 20.083 17.905 16.369 15.416 69.773 59.057 62.608 54.851 54.730
Imposto de Renda e Contrib sobre o lucro 3.456 2.237 3.595 2.993 2.903 11.728 9.144 15.484 10.683 11.430
45