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ROBERTO AGUIAR: A JUSTIÇA ENQUANTO LEGITIMAÇÃO DA

DITADURA MILITAR

Anna Gabriela Silva Santos1

RESUMO

O presente trabalho visa apresentar a justiça enquanto legitimação do período da


Ditadura Militar (1964-1985), respaldando-se no livro “O que é Justiça” de Roberto
Aguiar. Durante a ditadura, o sistema de justiça brasileiro foi caracterizado por
práticas autoritárias e violações aos direitos humanos, como a tortura, a perseguição
política e a ausência de garantias fundamentais. Nesse contexto, a obra de Aguiar
pode ser vista como uma reflexão crítica sobre as relações entre política e justiça em
um contexto de violência, repressão e exclusão social.

1. INTRODUÇÃO

À priori, cabe afirmar que Roberto Aguiar (1932-2008) foi um importante


jurista, professor universitário e escritor brasileiro. Ele nasceu em Salvador, Bahia, e
se formou em Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Entre as suas
principais obras estão "O que é Justiça" (1979), "Direito, Democracia e
Desenvolvimento" (1994) e "O Acesso à Justiça" (2002). Aguiar foi um dos principais
expoentes da teoria crítica do direito no Brasil, e suas obras contribuíram para o
debate sobre a relação entre direito, política e justiça em um contexto de
desigualdades sociais e exclusão.

Para Roberto Aguiar, a noção de justiça durante a ditadura militar no Brasil


era marcada pela violação dos direitos humanos, pela perseguição política, pela
censura e pelo autoritarismo do regime. Aguiar defendia que a justiça não poderia
ser reduzida apenas à aplicação formal da lei, mas deveria ser compreendida como
um processo histórico e social que envolve a luta por direitos e a construção de um
sentido de justiça na sociedade.

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1 Acadêmica de Direito e da matéria de Filosofia do Direito – no de matrícula 202100925
Nesse sentido, a reflexão crítica de Aguiar pode ser útil para compreender as
implicações da justiça enquanto legitimidade de um governo violento, como o que
ocorreu no Brasil durante a Ditadura Militar

2. A DITADURA MILITAR
A Ditadura Militar no Brasil ocorreu entre os anos de 1964 e 1985, período em que o
país foi governado por militares das Forças Armadas. Foi um regime autoritário que
se caracterizou pelo uso da violência e da repressão para manter o controle político
e social. O golpe militar ocorreu em 31 de março de 1964, quando o presidente João
Goulart foi deposto. O regime militar iniciou-se então com a promessa de
estabilidade política e econômica, mas rapidamente se tornou um governo autoritário
e repressor.

Durante a Ditadura, foram suspensas as liberdades civis, como a liberdade de


imprensa, a liberdade de expressão, o direito de greve e o direito de reunião. O
regime criou um sistema de censura que controlava a imprensa e a cultura, e criou
tribunais militares que julgavam civis, sem direito a defesa, muitas vezes
condenando-os à prisão, tortura e execução. A tortura era uma prática comum
durante a Ditadura Militar. O regime utilizou-a para extrair informações de
prisioneiros políticos, que eram considerados inimigos do Estado. Centenas de
pessoas foram mortas ou desapareceram durante o período.

A ditadura militar foi a forma mais antidemocrática e violenta da negação dos


direitos civis, e que, ao recordar desses “anos de chumbo”, a liberdade, a
independência dos poderes e as eleições dietas e secretas são ainda mais
valorizadas, visto que representam a democracia que foi reconquistada, já que por
mais de duas décadas foi silenciada, juntamente com os sonhos e a voz do povo
brasileiro.

Os militares que tomaram o poder em 1964 alegavam que o país estava


sendo ameaçado por uma suposta "ameaça comunista", que supostamente se
infiltrava em setores da sociedade brasileira, como universidades, sindicatos e
movimentos sociais. Segundo os militares, era necessário um governo forte e

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1 Acadêmica de Direito e da matéria de Filosofia do Direito – no de matrícula 202100925
autoritário para combater essa ameaça, proteger a nação e promover o
desenvolvimento econômico do país. Além disso, os militares alegavam que o
governo civil da época era corrupto e ineficiente, e que precisava ser substituído por
um regime forte e centralizado, que pudesse promover o progresso econômico e a
modernização do país. Com base nesses argumentos, os militares justificaram a
tomada do poder e a instauração de uma ditadura que durou 21 anos no Brasil.

O regime acabou em 1985, onde, após muita luta, o Estado Democrático de


Direito foi reestabelecido. Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade
das instituições e a prevalência do respeito aos direitos fundamentais. Isso se deu
com a eleição indireta de Tancredo Neves como presidente, após uma longa batalha
da sociedade civil pela redemocratização do país. O regime deixou um legado de
violência, opressão e violações aos direitos humanos, que ainda hoje é objeto de
reflexão e debate na sociedade brasileira.

3. A JUSTIÇA ENQUANTO LEGITIMAÇÃO DO GOLPE MILITAR

Em sua obra, Aguiar Afirma que a força ou sabedoria do ditador não é


suficiente para fornecer respaldo para a comunidade de certa ordem constituída,
visto que se esgotam com rapidez. Para ele, são necessários axiomas valorativos
que possuem como função fornecer crenças àqueles que obedecem. Pois, é
necessária uma justa causa que legitime quem está no poder e os seus métodos
que esses grupos desenvolvem.

Nesse sentido, faz- se uma analogia com a ditadura militar, visto que as
forças armadas tomaram o poder alegando que o país estava sendo ameaçado por
uma suposta "ameaça comunista”, que era necessário um governo forte e autoritário
para combater essa ameaça, proteger a nação e promover o desenvolvimento
econômico do país, como dito anteriormente.

Aguiar, afirma em seu livro que:

“A mais comum é a de se declarar que o país estava no caos,


que a corrupção medrava em todos os recantos, que forças
solertes estavam ameaçando a soberania, que a propriedade
estava sendo violada, que as famílias estavam inseguras e
tantas outras, que terão o condão de legitimar um possível

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1 Acadêmica de Direito e da matéria de Filosofia do Direito – no de matrícula 202100925
ato de força que teria ensejado o movimento que lançou
certos grupos no poder.”

Dessa forma, faz-se uma analogia com o período militar, visto que foi a
estratégia utilizada pelos militares para tomarem o poder do Estado brasileiro, e que
fez com que a população aceitasse o que estava sendo imposto.

Além disso, Aguiar diz que “Certos grupos têm a peculiar característica de
acoimar seus movimentos como revoluções, mesmo que eles sejam evidentes
contrarrevoluções.” O que foi uma forte característica do período militar, levando em
consideração o sistema de censura que controlava a imprensa e a cultura, e a
criação de tribunais militares que julgavam civis, sem direito a defesa, muitas vezes
condenando-os à prisão, tortura e execução. Tudo em nome da segurança nacional
que “estava em perigo”.

Robert afirma que o próximo passo é “vestir o voluntarismo e a defesa de


interesses com o manto dos princípios”, como diz essa passagem de sua obra:

“A ordem tem de ser mantida porque ela é justa, ela é representativa


do que há de mais legítimo na sociedade, mas, como essa ordem
justa está ameaçada pelos seus inimigos, implanta-se um sistema
coercitivo em nome da segurança. A justiça torna-se o respaldo da
segurança, o sinônimo das ações arbitrárias que aparecem para
manter uma ordem supostamente justa.”

Dessa maneira, percebe-se que além de fornecer crenças àqueles que


obedecem, é necessário o que haja justa causa para legitimar o exercício do poder,
é preciso que a segurança se manifeste para justificar as ações arbitrárias de
manutenção do poder, como por exemplo o AI-5, decreto que suspendeu diversas
garantias constitucionais, como a liberdade de expressão, o habeas corpus e a
inviolabilidade do domicílio, permitindo a prisão e o exílio de opositores políticos sem
a necessidade de qualquer justificativa. Apenas uma: a “segurança nacional”.

Nesse sentido, no contexto de violência e opressão política citado, Aguiar


criticava a utilização do direito como instrumento de controle social e de legitimação
do regime autoritário. Tendo em vista que todas as instituições do Estado, incluindo o
judiciário, agiam em prol da manutenção do poder dos militares.

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1 Acadêmica de Direito e da matéria de Filosofia do Direito – no de matrícula 202100925
4. CONCLUSÃO

Roberto Aguiar não se dedica especificamente a analisar a Ditadura Militar no


Brasil em sua obra "O que é Justiça", mas é possível identificar elementos em sua
reflexão crítica que podem ser aplicados ao contexto histórico do regime autoritário.
Roberto aborda a noção de justiça em um contexto de violência e exclusão
social, e o autor defende que a justiça não pode ser reduzida a uma mera aplicação
formal da lei. Aguiar afirma que os opressores precisam de uma justificativa justa
para explicar sua ação de tomada do poder ou sua ação de manutenção desse
poder, justificativas estas respaldadas numa “justiça” cega e que é mera expressão
ideológica de um pensamento conservador ou dos interesses de quem detém o
poder.

Ante o exposto, a obra de Aguiar pode ser entendida como uma contribuição
para os debates e lutas pela democracia, pelos direitos humanos e pela justiça
social. Através da sua abordagem crítica e política da justiça.

5. REFERÊNCIAS

AGUIAR. Roberto. O que é justiça: uma abordagem dialética. Brasília: Senado


Federal, Conselho Editorial, 2020.

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1 Acadêmica de Direito e da matéria de Filosofia do Direito – no de matrícula 202100925

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