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FEIRA USP E AS PROFISSÕES 2020 na Biblioteca Brasiliana

BBM NO VESTIBULAR
diálogo entre o acervo da biblioteca
e o vestibular da Fuvest

A BRASILIANA O QUE VOCÊ ENCONTRARÁ NA LINHA DO TEMPO?


Encontra-se a seguir uma linha do tempo que busca apresentar Textos curtos que tratam de temas da história, literatura,
o acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) aos geografia e biologia a partir de documentos disponíveis na
vestibulandos e estudantes do Ensino Médio. Para isso selecionamos BBM Digital. Você encontrará também textos sobre questões da
algumas obras disponíveis BBM Digital que dialogam com temas e atualidade, como trabalho informal, violência contra os negros
conteúdos que fazem parte do programa da FUVEST. Dessa forma, e luta pelo direito das mulheres.
será possível ao mesmo tempo conhecer um dos mais importantes
acervos de livros sobre o Brasil e se preparar para o vestibular.
A Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin é um órgão da
Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da Universidade
de São Paulo (PRCEU-USP). Seu acervo foi formado pelo casal de
bibliófilos (amante e colecionador de livros raros e especiais) José
e Guita Mindlin ao longo de mais de 80 anos e, em 2006, foi doado
à USP, que construiu um moderno edifício para abrigar a coleção.
O acervo da BBM é composto principalmente por livros raros e
especiais sobre o Brasil, que tratam de assuntos como história,
literatura, artes e ciências sociais. Parte do acervo está disponível
online na BBM Digital.
1500 Descobrimento do Brasil

1534 Estabelecimento do sistema de Capitanias hereditárias

1549 Fundação de Salvador, primeira capital brasileira

1580 Início da União Ibérica, em que o reino


1557 de Portugal torna-se dependente do reino
da Espanha
Hans Staden e os Tupinambá -
Literatura de viagem no século
XVI
Os livros de viagem do século
XVI são importantes fontes para 1595
o conhecimento do início da Aprender a língua dos índios
colonização europeia do território para catequizá-los
brasileiro e dos seus povos originais.
No século XVI, a principal língua
Uma das obras mais famosas
da costa do Brasil era o tupi. A
desse período é a de Hans Staden,
publicação da Arte de gramática
um aventureiro alemão que, em
da língua mais usada na costa do
sua segunda viagem ao Brasil,
Brasil, em 1595, a primeira gramática
foi capturado e aprisionado pelos Página de rosto da Arte de
do tupi, pelo padre jesuíta José de
índios tupinambá, que ameaçavam gramática da língua mais usada
Anchieta era parte da estratégia na costa do Brasil, de 1595
comê-lo em um ritual antropofágico.
missionária de “conquistar as almas”
Depois de meses em cativeiro, Staden
dos indígenas. A catequização dos
consegue escapar e volta para a
povos originais do Brasil foi um dos
Alemanha, onde escreve o relato de
pilares do início da colonização
suas aventuras, que contém preciosas
portuguesa no Novo Mundo.
informações sobre a sociedade e
Compreender bem a língua e a
cultura dos tupinambá.
cultura dos povos indígenas era
um meio de ter mais sucesso nessa
missão.
DO PASSADO AO PRESENTE

Da invasão colonizadora às ofensivas desenvolvimentistas:


por que é importante estar ao lado dos povos originários no
contexto brasileiro?
No Brasil, existem atualmente mais de são alguns dos exemplos iniciados em um
duzentos e cinquenta povos indígenas, passado mais recente, mas que se man-
fa­lan­­
tes de mais de cento e cinquenta têm como problemas graves até os dias
línguas distintas. Embora esses números de hoje. Além disso, no século XIX, o Brasil
sejam extensos, na época em que os colo­ passou a se organizar em torno de projetos
wnizadores europeus chegaram a essas de “integração” das populações indígenas
terras, eles eram ainda maiores. Com esti- à sociedade nacional. Um discurso que
mativas que alcançam a casa dos milhões demonstra a intolerância estatal com a
de indígenas, falantes à época de mais de existência de populações tradicionais.
mil línguas diferentes, notamos a existên- Ao falarmos de povos indígenas no Brasil,
cia de um problema em relação a como é impossível não citar as lutas pelo direito
esses primeiros contatos foram travados à demarcação territorial, já que se entende
com as populações locais. Os registros que o acesso à terra é fundamental para
históricos remontam um cenário marcado garantir a manutenção dos modos de vida
por cons­tantes processos de dizimação e particulares e a segurança alimentar des-
tentativas de aniquilamento dos modos de sas populações. A Constituição Federal de
vida nativos. Entre as inúmeras formas de 1988 já reconhecia os direitos indígenas às
Imagem do livro Yanomami (1978),
de Cláudia Andujar dar iní­cio ao projeto colonizador, podemos terras. Foi ela a responsável por promover
citar a atua­ ção dos bandeirantes e dos um modelo político que pretendia aban-
missio­nários jesuítas no período colo­wnial. donar os projetos de integração, afirman-
Embora a história do contato e da colo- do, por outro lado, a pluralidade étnica e
nização tenha sido bastante violenta, o cultural dos povos.
tempo não fez com que essas populações Com efeito, mesmo com o genocídio ao
deixassem de sofrer ataques. Por parte do qual estiveram e estão submetidos, os
Estado, é possível citar o projeto desen- povos indígenas seguem ocupando cada
volvimentista de expansão econômica no vez mais espaço de destaque na política,
país. O avanço, em terras indígenas, de nas artes e nos debates públicos em nosso
atividades seringueiras durante os ciclos país, afirmando seu direito à existência
Luta esportiva dos povos indígenas
do Xingu da borracha, a exploração e extração de e a riqueza que sua diversidade de lín-
guas, culturas e costumes pode prover ao
Crédito: Marcello Casal/Agência Brasil
minérios e a construção de benfeitorias
para a criação de novas estradas e cidades Brasil.
1597 Primeiro registro sobre a existência do
Quilombo dos Palmares
Do século XVI ao XVII
Comércio atlântico de escravos
1630-1654
Entre meados do século XVI e meados
A resistência contra as
do século XIX, cerca de 10.000.000 de
Invasões holandesas
africanos foram trazidos da África
para as Américas por comerciantes Em 1640, o padre António Vieira
de escravos europeus ou de origem pregou um de seus mais célebres
europeia. Chegados nas Américas, sermões, o Sermão pelo Bom Sucesso
os africanos eram escravizados das Armas de Portugal contra as Ataque de portugueses contra um engenho
de Holanda. Nessa época, grande controlado pelos holandeses
e vendidos como mão de obra
em plantações, minas, atividades parte da Região Nordeste estava
domésticas etc. Muitos desses sob controle dos holandeses, que
africanos não sobreviviam à travessia tinham invadido o território em 1630.
do Atlântico, dadas as péssimas Nesse sermão, Vieira se dirige a Deus
condições de acomodação, higiene para argumentar em favor do lado
e alimentação dos navios negreiros. português (católico) e contra o lado
O Brasil foi o maior destino dos holandês (calvinista): Segue uma
negros escravizados: cerca de 38,5% passagem da obra:
dos desembarques de africanos nas “Os ventos e tempestades, que
Américas ocorreram no Brasil. descompõem e derrotam as nossas
armadas, derrotem e desbaratem
as suas; as doenças e pestes, que
diminuem e enfraquecem os nossos
exércitos, escalem as suas muralhas
e despovoem os seus presídios, (...)”
O sermão era também uma forma
de incentivar a resistência de
brasileiros e portugueses contra os
holandeses, que só foram expulsos
definitivamente do Brasil em 1654.
Gregório de Matos (1636-1696)

Ilustração para edição no 13 da


publicação satírica Cabrião (1866-1867)

DO PASSADO AO PRESENTE aguçar o senso crítico da sociedade. Já as “Cabrião” (1866), no Segundo Reinado, e “O vinha; / Não sabem governar sua cozinha, /
fake news são notícias falsas que não se Pasquim” (1969), na ditadura militar, foram E podem governar o mundo inteiro.”, do
Sátira ao poder e liberdade de
atêm aos fatos, manipulam o público e são periódicos que fizeram uso da sátira ao poema Descreve o que era naquele tempo
expressão usadas para tirar algum proveito econômi- poder e aos costumes. a cidade da Bahia. Nesses versos, o poeta
A sátira e as fake news geram um debate co ou político. Os criadores das fake news Um dos primeiros satíricos da história bra- utiliza a diminuição dos conselheiros para
intenso sobre a liberdade de expressão. apoiam-se na liberdade de expressão para sileira foi Gregório de Matos. Nascido em criticar a nobreza que ocupava o poder. No
Apesar de ambas tenderem ao absurdo, defender suas atividades e com isso forma-­ Salvador no ano de 1633, o poeta cursou soneto À Bahia, Matos escreve sobre o es-
notamos diferenças em como se desen- se um terreno de disputa acerca dos limi­ Direito em Coimbra, Portugal. Retornou tado de desgraça da Bahia por conta da
volvem e nos objetivos que almejam. A tes desse direito. ao Brasil em 1682, após ficar viúvo e fazer ascensão da mesma nobreza. Nos versos
sátira é uma técnica que utiliza mecanis- Embora pareçam novidades, a história votos religiosos. Atuou como vigário-geral “Ninguém vê, ninguém fala, nem impug-
mos como o exagero e a diminuição para brasileira apresenta alguns exemplos de e tesoureiro-mor do arcebispado. Em con- na, / E é que, quem o dinheiro nos arranca, /
lançar um olhar crítico a uma pessoa ou fake news e sátiras. O Plano Cohen, fraude traposição aos cargos religiosos, Gregório Nos arrancam as mãos, a língua, os olhos.”,
grupo social, podendo até ocasionar o riso, apresentada pelo governo Vargas que começa a levar uma vida boêmia e próxi- o poeta faz uso do exagero para mostrar o
como fazem os sites de sátira jornalística enumerava atividades terroristas do Par- ma dos populares. quão apáticos eram os colonos diante da
Sensacionalista e The piauí Herald. Ela é tido Comunista Brasileiro e outras organi- A sátira em Gregório de Matos é vista em opressão vinda da ascensão dessa classe.
um exercício de liberdade de expressão, zações comunistas, é um exemplo de fake versos como “A cada canto um grande con- Assista à palestra sobre os Poemas escolhi­
pois vemos que essa técnica ambiciona news antes desse termo ser popularizado. selheiro, / Que nos quer governar cabana e dos de Gregório de Matos.
1750 Assinatura do Tratado de Madrid,
1705 Publicação de Música do Parnasso, primeira tentativa de estabelecer os limites
primeiro livro impresso de um autor estre as colônias de Portugal e Espanha na
brasileiro, Manuel Botelho de Oliveira América do Sul

1711
“Os escravos são os pés e as
mãos do senhor de engenho”
O missionário jesuíta italiano André
João Antonil viveu mais de trinta Século XVIII Primeiras edições dos livros:
anos no Brasil, de 1681 a 1716, ano de O Uraguay (1769) de Basílio da Gama,
sua morte. Em 1711, Antonil tentou
Arcadismo no Brasil Caramuru (1781) de Santa Rita Durão
Obras (1768) de Cláudio Manuel da Costa
publicar em Portugal o livro Cultura A atividade mineradora foi a causa do
e Opulência do Brasil por suas desenvolvimento de um importante centro
Drogas e Minas, no qual descreve urbano em Minas Gerais nos meados do século 1ª edição de Marília de Dirceu (1792)
de Tomás Antônio Gonzaga
as principais riquezas da colônia XVIII. Além de centro econômico, a cidade de Vila
naquele momento: cana de açúcar, Rica (hoje Ouro Preto) tornou-se nessa época o
tabaco, minas de ouro e criação de mais importante centro cultural da colônia, que
gado. A Coroa portuguesa, contudo, reuniu os principais escritores árcades brasileiros.
temia a divulgação de informações A escola Árcade estava baseada no resgate da
detalhadas sobre a produção cultura e autores clássicos (gregos e romanos)
econômica de sua principal colônia e renascentistas (como Camões). Os autores
e proibiu a circulação da obra – de maior destaque dessa escola são Basílio da
quase todos os exemplares foram Gama e Santa Rita Durão, que produziram os
apreendidos e destruídos. O livro só poemas épicos O Uraguay e Caramuru, que
voltou a ser publicado novamente relatam fatos históricos envolvendo indígenas e
em 1837. A obra de Antonil é uma europeus. Na poesia lírica, destacam-se Cláudio
das principais fontes de informação Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga,
sobre a economia do Brasil colonial. que, seguindo os ideais clássicos, valorizavam
Numa famosa passagem, Antonil a simplicidade, a vida no campo, a natureza.
diz que “os escravos são os pés e as Publicado em 1792, Marília de Dirceu, de
mãos do senhor de engenho”, frase Escravos mineram diamantes sob Gonzaga, foi o primeiro best-seller da literatura
supervisão de feitores
que sintetiza a total dependência brasileira. Outras importantes influências
do trabalho escravo na economia no meio cultural de Vila Rica eram os ideais
colonial. iluministas e da Revolução Americana, o que
contribuiu para a deflagração da Inconfidência
Mineira em 1789, da qual participaram Cláudio
Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga.
1783
Ciências naturais no Brasil
colônia 1789
Tiradentes, herói nacional
José Mariano da Conceição
Veloso (1742-1811) foi um dos mais Joaquim José da Silva Xavier, o
importantes cientistas brasileiros Tiradentes foi o único participante
do período colonial. Entre 1783 e da Inconfidência Mineira a ser
1790, liderou uma expedição pela condenado à morte. Foi enforcado
província do Rio de Janeiro com o e esquartejado em praça pública.
objetivo de coletar espécies vegetais Não por acaso, era o inconfidente de
da região. A expedição deu origem à posição social mais baixa; os outros
publicação Florae Fluminensis, que conspiradores, membros da elite
descreve mais de 1600 plantas. Além local, receberam penas mais leves,
de realizar suas próprias pesquisas de prisão e degredo. Inspiradas pelas
Veloso foi um grande divulgador ideias iluministas e pela Revolução
das ciências naturais e promotor de Americana, a Inconfidência Mineira
novas técnicas agrícolas. inicialmente se organizou contra a o
excessivo controle português sobre Tiradentes, de Renina Katz.
Quassia Amara, 1801 a região de Minas Gerais e a pesada Gravuras de 1956 para o Romanceiro da
Máquinas de eletricidade, 1800 cobrança de impostos. O plano Inconfidência de Cecília Meireles

dos conspiradores era declarar a


independência de Portugal e fundar
uma república. Embora lutassem
pela liberdade, não era consenso
entre inconfidentes que a escravidão
devesse ser abolida.
Assista à palestra sobre o Romanceiro
da Inconfidência, de Cecília Meireles.
1a edição de Viola de Lereno (1798)
de Domingos Caldas Barbosa

DO PASSADO AO PRESENTE ra e sua circulação na sociedade. popular brasileira. mo com essa despotencialização do esti-
Lereno foi poeta arcádico, glosador, vio­lei­ Outro fato relevante na biografia do au- lo ainda assim vemos na linguagem e na
A Viola de Lereno e a
ro, capelão, criador de modinhas e lundus tor e para a cultura luso-brasileira foi a musicalidade de Lereno sua africanidade,
formação da música popular populares entre as massas e apreciados introdução do lundu na alta sociedade. A como se nota a seguir nos versos de um de
brasileira entre a corte. Durante o século XVIII, ele foi dança e o canto que caracterizam o lundu seus lundus:
um importante personagem colonial. Filho foram muito populares durante o período Lundum de cantigas vagas
A música popular no Brasil sempre se no- de um comerciante português e de uma colonial – embora tenha coexistido a aver­
são racista do Estado, que tentou proibi-­lo – Xarapim eu bem estava
tabilizou por sua multiplicidade, por seu angolana alforriada, sintomaticamente
Alegre nest’aleluia,
caráter híbrido, colorido, original. Soma-­ considerado “nem preto nem branco, no chegan­do mesmo a ser a primeira mani­
Mas para fazer-me triste
se a isso a coragem de seus composi- entanto com virtudes sociais”, Selinuntino fes­tação cultural negra a ser incorporada
Veio Amor dar-me na cuia.
tores – sejam eles individuais ou coletivos transitou da boemia carioca aos salões no- e praticada pelos colonos brancos.Esta for-
(...)
– em relatar os eventos cotidianos de for- bres de Lisboa, num processo que logrou ma ar­tís­­ti­ca é proveniente das regiões hoje
Se visse o meu coração
ma orgânica e ao mesmo tempo revelar a aproximações e conexões entre a música deno­minadas Congo e Angola e é consi­
Por força havia ter dó,
quem quiser ouvir os afetos mais íntimos que sorveu das ruas com a alta cultura derado o ancestral direto do samba, sen- Por que o Amor o tem posto
de grupos ou sujeitos, com graça, singula­­ européia de então. Suas especiais capaci- do também a primeira gravação musical Mais mole que quingombó.
ridade, força e beleza. Nesse sentido, a vida dades artísticas para interpretar cantigas do Brasil, em 1902. Domingos fez grande
e a obra de Lereno Selinuntino, pseudôni- oriundas de ritmos portugueses e africa- sucesso nos salões da metrópole lisboeta Tem nhanhá certo nhonhó,
mo de Domingos Caldas Barbosa, nos per- nos, num momento em que nas­cia uma ao apresentar a música lundu, não aque­ Não temo que me desbanque,
mite perce­ber um pedaço dessa história, música propriamente brasileira, foram res­ la que se cantava e dançava entre os ne­ Porque eu sou calda de açúcar
que remonta a tempos distantes e que ponsáveis por difundir um tipo de sonori- gros­, mas sim um lundu aguado, polido, E ele apenas mel do tanque.
guarda tanto confluências quanto atritos dade específica, motivo pelo qual Lereno estilizado ao gosto da nobreza ciosa por (...)
no que tange à produção musical brasilei- é interpretado como precursor da música commodities de além-mar. Porém, mes-
1808 Transferência da Corte portuguesa para o Brasil

1822 Independência do Brasil

1824
A primeira constituição do Brasil
No episódio conhecido como “Noite
da Agonia”, Dom Pedro I dissolve a
assembleia encarregada de produzir uma
constituição brasileira em 1823, um ano
após o Brasil declarar a independência de
Portugal. Temendo que seu poder fosse
enfraquecido pelas elites responsáveis pelo
projeto constituinte, Dom Pedro outorga a
Constituição de 1824, a primeira do Brasil,
lhe conferindo amplos poderes, inclusive
o Poder Moderador, que era exercido
exclusivamente pelo imperador e se
sobrepunha aos outros poderes (Executivo,
Legislativo e Judiciário). O exemplar
preservado pela Biblioteca Brasiliana Guita
e José Mindlin é um raro documento da
historiografia brasileira, datado de 1824,
publicado pela Tipografia Nacional. Dentre
Constituição Politica do Imperio do Brasil (1824)
as características dessa constituição está
o voto masculino, indireto e censitário
(isto é permitido apenas a cidadãos que
comprovassem determinada situação
sócio-econômica), centralização política e
administrativa, permanência da religião
católica como religião oficial do império,
sendo todas as outras religiões permitidas
apenas em cultos domésticos.
DO PASSADO AO PRESENTE às margens dos vínculos empregatícios ros; a violência policial e a negligência de
convencionais, numa resposta às pressões recursos em termos de assistência jurídi-
Comércio ambulante ou econômicas cíclicas que os empurram em ca e social se somam a este cenário. A de-
informal e sua persistência no direção ao desemprego. Um ponto impor- pendência urbana deste tipo de comércio,
tante nesta discussão é o fato de que o es- que coexiste com a des­valorização de seu
ambiente urbano atual
paço urbano e sua população são ampla- serviço e com a repressão e racialização
O comércio ambulante ou informal era mente dependentes deste tipo de serviço de seus trabalhadores é um tema que não
um fator fundamental, tanto para a sub- mas, ainda assim, as ações tomadas pelo perdeu sua atualidade.
sistência dos que nele trabalhavam, como poder público contribuem para a precari­
para o acesso a produtos e víveres pelas zação dos trabalhadores informais. Ações
paupérrimas massas. A distinção entre es- estas que se traduzem regularmente na
cravos de lavoura e escravos de ganho - que desconsideração da referida atividade no
trabalhavam prestando serviços a seus se­ planejamento geográfico das cidades, na
nho­res - abria aos últimos possibilidades negligência legislativa ou de seguridade
de uma maior autonomia e mobilidade, social para com seus agentes e, de modo
embora limitadas, das quais se valiam mais evidente, na perseguição constante
para fazer circular informações, conheci- dos trabalhadores pelo poder público.
mentos, preparar conspirações e alimen- Um fator recente que atua complexifi­
tar seus vínculos afetivos. A proeminência cando toda esta discussão é a presença
de mulheres negras - que constituíam a cada vez maior de imigrantes ou refu-
maioria desta classe - como agentes deste giados no comércio informal em grandes
mercado remonta aos papéis econômicos capitais do Brasil. De nacionalidades vari-
e sociais desempenhados por elas em ter- adas, mas notadamente de origem cari-
ritório africano. benha, africana ou sul-americana, estes
Embora a quantidade de trabalhadores sujeitos explicitam a precarização aponta-
informais fosse tão numerosa a ponto de da acima e acrescenta outros elementos
sua atividade ser regulamentada pelas au- ao mosaico das metrópoles. A integração
toridades públicas após 1808, as questões dessas pessoas no comércio ambulan- Le chirurgien nègre. Boutique
que permeiam esse tema se fazem sen- te comporta ambiguidades específicas d’un marchand de viande de porc
(O cirurgiao negro. Loja de
tir ainda hoje. É notória a diversidade de e dialoga com os problemas que há mui- comerciante de carne de porco),
produtos e de serviços prestados por tra- to estão presentes. Um exemplo disso é o Jean Baptiste Debret, 1835
balhadores ambulantes atualmente, que racismo e a xenofobia que assolam esses
ocupam o espaço público de grandes e mé- trabalhadores em particular, mas que in-
dias cidades buscando sua fonte de renda cidem também sobre grupos de brasilei­
1831 - 1840 Período Regencial entre a
Abdicação de D. Pedro I e a Declaração
de Maioridade de D. Pedro II, o Brasil foi
governado por regentes

1831
Debate e legislação sobre o fim
do tráfico de escravos
O debate sobre o fim do tráfico de
escravos no Brasil data do início
do século XIX. Como demonstra
a Memória sobre a abolição do
comércio da escravatura, escrito
em 1810, a principal questão desse
debate era: como conciliar as pressões
externas, sobretudo britânicas, pelo
fim do tráfico negreiro e, ao mesmo
tempo, dar sustentação e viabilidade
para o sistema agroexportador,
então principal fonte de riqueza da
colônia? O debate repercutiu na
legislação e a Lei Feijó, de 1831, foi a
primeira a ser promulgada no Brasil
proibindo o tráfico de escravos. Seu
artigo 1o dizia “Todos os escravos,
que entrarem no território ou portos
do Brasil, vindos de fora, ficam
Planta de um navio negreiro, livres.” A lei, contudo, foi largamente
incluída em Bosquejo sobre o desrespeitada. Pressionado pelo Reino
comércio de escravos, de 1821
Unido, principal promotor do fim do
comércio de escravos no Brasil, o
Império brasileiro elaborou em 1850
a Lei Eusébio de Queirós, que previa
medidas mais enérgicas contra os
traficantes de escravos.
Saiba mais em: Fim da escravidão,
não dos privilégios – Memória sobre a
abolição do comércio da escravatura
DO PASSADO AO PRESENTE de que essas revoltas pudessem inspirar
revoltas de escravizados de outras partes
Violência contra
das Américas. No Brasil, um dos meios de
o corpo negro combater essa ameaça foi a criação, em
Durante o período colonial e imperial bra- 1809, da primeira instituição militar do país,
sileiro, a escravidão foi o principal sistema chamada Divisão Militar da Guarda Real
de obtenção de mão de obra para as ati­vi­ de Polícia. Com ela, a violência assume
dades econômicas no campo e na cidade. um outro nível: não é somente o senhor de
Para manter a ordem, os senhores recor- escra­vos que pune os negros, a polícia mili­
riam frequentemente à violência física tar também assume o papel de repressão,
contra os escravizados. Com o objetivo de com mais uso de força e violência.
reeducá-los e puni-los, tais castigos eram Depois de quase quatrocentos anos, essa
garantidos pelas ordenações herdadas de opressão deixará sua herança na Repúbli-
Portugal, que permitiam sua utilização, ca e chegará aos dias atuais, pois nota-se
descrevendo até o modo de serem realiza- que a violência contra os negros ainda per-
dos. Além das ordenações, o exercício da manece rotineira. Em 2019, o Fórum Bra-
escravidão e dos castigos eram corrobo­ sileiro de Segurança Pública divulgou a 13ª
rados pela Igreja Católica, defendida por edição do Anuário da Violência, mostran-
personagens influentes da história brasi­ do que 75,4% das vítimas da violência poli-
leira, como o Padre Antônio Vieira. No Ser- cial brasileira foram negros. Alguns casos
mão XIV do Rosário, Vieira afirma que a causaram comoção e foram amplamente
escravidão é uma oportunidade dos afri- divulgados na imprensa, como o da menina
canos serem perdoados e libertos de seus Agatha, do menino João Pedro e do músi-
pecados. Logo, tanto nas leis dos homens co Evaldo. Além disso, um levantamen­­to
quanto na Lei Divina, há um esforço para da Defensoria Pública do Estado do Rio de
legitimar as agressões utilizadas contra Janeiro afirma que o órgão prisional do es-
os negros, estimulando a banalização da tado recebeu mais de 1000 denúncias de
violência. maus tratos, sendo 72% contra negros, e
A partir de 1791, teve início na colônia que em média 3 presos são torturados por
francesa de São Domingos rebeliões en- dia no Brasil. Esses casos e dados eviden-
cabeçadas por escravos e negros libertos. ciam que a brutalidade por parte do Esta-
A Revolução Haitiana, como passou a ser do direcionada à população negra está in-
chamada o conjunto dessas rebeliões, dis- timamente ligada à construção do nosso
seminou, em outras colônias que se val- país, onde a violência contra os negros tem
iam do uso de trabalho escravo, o medo sido permitida e naturalizada por séculos.
Execução de castigo para fuga.
Negros no tronco - Jean Baptiste
Debret, 1835
1839 Nascimento de Machado de Assis, no
Morro do Livramento, Rio de Janeiro

1846
1841 Romantismo no Brasil -
construção de uma identidade
Destruição dos biomas brasileiros
nacional
A Mata Atlântica é um dos grandes biomas
O início do Romantismo no Brasil
brasileiros. Estende-se por 17 Estados e
foi marcado pelo esforço de
abrange por volta de 15% do território
construir narrativas e símbolos que
nacional. Para além de um variado
afirmassem a identidade de uma
conjunto de ecossistemas nativos, a Mata
nação que tinha acabado de se
Atlântica concentra também grande parte
tornar independente. A idealização
da população brasileira (72%). Atualmente,
da natureza tropical e do índio foi
ela conta com apenas cerca de apenas
um dos principais recursos utilizados
12,5% de seu território original preservado.
por poetas e romancistas para criar
Problemas relacionados ao desmatamento
uma identidade nacional brasileira.
já são notados em 1841 pelo naturalista
Um dos melhores exemplos desse
britânico Georges Gardner:
programa literário e ideológico é a
“A floresta, que antes cobria considerável
obra de Gonçalves Dias, um dos mais
porção do cimo, fora cortada e convertida
principais autores dessa vertente
em carvão de lenha e os pequenos
nacionalista. Seu livro de estreia,
arbustos e vellozias que cresciam na parte
Primeiros Cantos, de 1846, inicia-
exposta haviam sido devorados pelo fogo.
se com seu poema mais famoso,
O progresso da cultivação se vai fazendo
Canção do exílio, um marco da
tão rapidamente numas vinte milhas
poesia nacionalista brasileira. No
à volta do Rio, que muitas das espécies
romance, esse programa ideológico
ainda existentes estarão, no decurso de
poucos anos, completamente extintas, e
nacionalista encontrou seu ponto
Páginas de Canção do exílio,
os botânicos que no futuro visitarem o país alto nos romances indianistas de José de Gonçalves Dias
em vão procurarão plantas colhidas por de Alencar, como O Guarani (1857) e
Cortina da floresta virgem, de
Victor Frond, Brazil Pittoresco, seus predecessores.” (Georges Gardner, Iracema (1865).
1861
Viagens ao interior do Brasil, 1846).
DO PASSADO AO PRESENTE mação de uma epidemia: muitas pessoas
aglomeradas em espaço pequeno e sem
Epidemias no Brasil: questão ventilação, condições higiênicas precárias,
de saúde, questão social alimentação insuficiente.
As cidades brasileiras também enfren-
Epidemias não são nenhuma novidade tam epidemias desde os tempos coloni-
na história do Brasil e do Mundo. As popu- ais. O Rio de Janeiro era uma das cidades
lações indígenas das Américas, por exem­ mais vulneráveis a doenças: varíola, cólera,
plo, tiveram que enfrentar diversas doenças sarampo, febre amarela atacavam conti­
trazidas pelo colonizador europeu, até en- nuamente a população, sobretudo das
tão inexistentes no Novo Mundo e para as classes mais baixas, e os conhecimentos
quais o seus sistemas imunológicos não médico-científicos não conseguiam expli-
estavam preparados. Uma simples gripe car as causas das doenças nem propor for-
era capaz de aniquilar uma aldeia intei- mas eficientes para seu combate. Se hoje
ra. Em cinco séculos, centenas de milhares os conhecimentos científicos avançaram
de indígenas morreram e ainda morrem muito, permanece uma terrível herança
atacados por doenças do homem branco. das epidemias do passado: ainda é a popu­
Os africanos escravizados também eram lação mais pobre que sofre as piores conse-
vítimas frequentes de surtos epidêmicos. quências, sociais, econômicas e sanitárias
Os porões dos navios negreiros eram um de surtos epidêmicos.
Índios mortos numa epidemia
local particularmente propício para a for- Saiba mais em: Epidemias do passado são enterrados numa aldeia
tupinambá, Hans Staden, 1557
1854
1864 - 1870
Romance urbano no Brasil do séxulo XIX
A Guerra do Paraguai
A publicação, em 1854, de Memórias de um
Considerado o maior conflito sul-americano,
sargento de milícias, de Manuel Antônio de
a Guerra do Paraguai contrapôs a “Tríplice
Almeida, é um marco do romance urbano
Aliança” (Argentina, Brasil e Uruguai)
brasileiro. Fugindo do padrão romântico, o livro,
ao Paraguai. O Paraguai, nessa época,
ao narrar a vida malandra do protagonista
adotava medidas expansionistas visando,
Leonardo, faz um retrato das classes média e
principalmente, à conquista do acesso
baixa do Rio de Janeiro. Mais próximo da escola
ao mar. Essas medidas inevitavelmente
romântica, José de Alencar também publicou
atingiram os territórios vizinhos, o que
importantes romances urbanos, como Lucíola
levou os três países a assinarem o
(1862) e Senhora (1874), nos quais aborda temas
Tratado da Tríplice Aliança, no qual se
como a prostituição e a oposição entre amor e
comprometiam na ajuda mútua contra
interesse financeiro. Com Memórias póstumas
a ofensiva de Solano López, presidente
de Brás Cubas (1881), de Machado de Assis, o
do Paraguai durante o conflito. Em 1869,
romance urbano brasileiro entra no realismo:
após mais de cinco anos de confrontos, a
distante de qualquer idealização, o narrador
cidade de Assunção foi tomada, levando
defunto do romance, Brás Cubas, é um típico
à fuga de López para o interior. Apenas
representante da elite escravocrata brasileira,
no ano seguinte, com a morte de López,
hipócrita e arbitrária em seus atos. Nos contos
é que houve a rendição definitiva do
e romances que publicaria em seguida, como
Paraguai e o fim da guerra. Após o fim dos
Quincas Borba (1891), Várias histórias (1896)
confrontos, consequências significativas
e Dom Casmurro (1899), Machado continua
se fizeram presentes no contexto interno
a destrinchar o modo de ser e pensar da
brasileiro. Pode-se citar, por exemplo, o
elite brasileira do período. Alinhado à escola
alto endividamento com a Inglaterra, o
naturalista, O Cortiço (1890), de Aluísio de
enfraquecimento do regime escravocrata
Azevedo, retrata as péssimas condições de vida a
- pois foi necessário recrutar escravos para
que estavam submetidas as classes mais baixas
as frentes de batalha - e o fortalecimento
cariocas. Azevedo já havia publicado outros
do Exército como instituição e força política.
romances urbanos de influência naturalista,
Primeiras edições de Todos esses fatores, de certa maneira,
como O mulato (1881), sobre a questão racial, e
acima
Memórias póstumas de Brás Cubas se mostraram posteriormente ligados
(1881), de Machado de Assis
Casa de Pensão (1884).
ao processo que levou o Brasil ao fim do
meio
Senhora (1874) de José de Alencar Assista à palestra sobre Quincas Borba, de
regime monárquico e à proclamação da
baixo
Memórias de um sargento de milícias Machado de Assis.
(1854) de Manuel Antônio de Almeida República.
Graines employées pour les colliers (1). Végétaux
pour le tatouage (2). Plantes nutritives (3),
Jean Baptiste Debret, 1834 1871 1879-1912
Ciência aplicada à agricultura O boom da borracha
Theodore Peckolt foi um farmacêutico A Segunda Revolução Industrial
alemão que chegou no Brasil em tornou a borracha (obtida a partir
1847. Seu trabalho é notável pela do látex da seringueira e há séculos
análise de mais de seis mil plantas, usada pelos índios da América do
a maior parte delas pertencentes Sul) um produto muito valorizado
ao domínio da Mata Atlântica. Em na Europa e Estados Unidos. Nesse
História das plantas alimentares e período, exploração da borracha na
de gozo do Brasil, Peckolt ambiciona região amazônica fez cidades como
alcançar o público agricultor e lança Belém e Manaus se desenvolverem
mão de um recurso inovador para rapidamente: foram construídos
a época: usa nomes vulgares das suntuosos teatros, cinemas, sistemas
plantas ao invés dos científicos. Para de iluminação elétrica e de bondes.
reproduzir parte do pensamento do Contudo, a maior parte da população
autor, em um trecho sobre o solo local e os imigrantes que buscavam
massapê, Peckolt diz que esse é um uma vida melhor permaneceu na
“terreno argiloso gordo, fino, de cor miséria. Como nota um observador
parda, às vezes denegrida, amolecido da época: “julga-se natural e
pelas chuvas e aderente aos pés com logicamente que tal exploração
certa viscosidade, de onde lhe vem deve enriquecer ou, pelo menos,
o nome. Impróprio para a cultura do dar o bem estar a quantos a ela se
café, mas excelente para a cana e entregam. Não é infelizmente assim,
milho”. O solo massapê é encontrado, e os seringais, sob uma falaciosa
por exemplo, na região do Recôncavo aparência de vida larga e fácil, são
baiano e, como assinala o autor, é regiões de miséria, de privações
excelente para o plantio de cana de e de penúria.” (José Veríssimo - A
açúcar. Tanto que nesta região foram Amazônia, aspectos económicos, Método tradicional indígena de
implantados os primeiros engenhos obtenção do látex, Franz Keller, 1875
1892, p. 36.)
de açúcar do Brasil colonial.
DO PASSADO AO PRESENTE ward Colston em Bristol, na Inglaterra, em 7 meio pedagógico dos mais importantes no
de junho de 2020, recolocou o debate sobre vastíssimo campo da educação integral,
Patrimônio histórico cultural
o patrimônio público e a memória cole­tiva. gravando-se na memória dos seus infan-
e memória coletiva No Brasil, monumentos homenageando o tis alunos, para não mais se extinguirem,
Imagens, símbolos e narrativas fazem bandeirantismo em São Paulo e a Princ- os fatos comemorativos da Áurea Lei, que
parte das políticas ideológicas subsistentes esa Isabel no Rio de Janeiro, problema­ presenciassem e cuja reminiscência lhes
em todos os grupos que ocupam o poder. tizam para manifestantes do movimento fosse agradavelmente desperta, narrando
O passado histórico serve de suporte da Vidas Negras Importam o ocultamento da a futuras gerações as cenas alegres e edifi­
memória coletiva, obedecendo a determi- história e a escassez de políticas públicas a cantes em que foram principais atores”.
nados fins, que refletem os interesses dos fim de reparação. Essas narrativas, que sustentaram uma
atores políticos. No entanto, quando o ocul- A Imprensa Nacional, órgão do governo do memória coletiva sobre uma suposta
tamento do passado histórico na memória Império Brasileiro, publicou em 1888, ano demo­cracia racial, contribuíram para mas-
coletiva realiza-se por meio de uma política da assinatura da lei nº 3.353, sancionada no carar o passado escravagista e ocultar a
institucionalizada de memória manipula- dia 13 de maio pela Princesa Dona Isabel, herança negra e indígena na construção
da ou direcionada é possível falar de uma a obra A festa das crianças. Comemoração da sociedade, da cultura e da economia no
política do esquecimento. Em “Podemos da lei 13 de maio que aboliu a escravidão Brasil. A antropóloga canadense Francine
falar de uma política do esquecimento?”, no Brasil. O exemplar traz o registro do Saillant faz um importante comentário so-
sobre os movimentos afro-brasileiros con- início das celebrações anuais realizadas bre essa dissimulação:
temporâneos, o cientista político francês pela comissão de professores primários “O Estado brasileiro erigiu pouquíssimos
Johann Michel pontua que a seleção de da Corte, com efeito para todas as escolas monumentos e museus públicos relativos
narrativas permite amordaçar reivindi- públicas, que visam a rememoração da lei à escravidão. À exceção do busto erigido
cações materiais e buscas por reconheci- que recebeu o nome em alusão ao caráter no Rio de Janeiro em memória de
mento dos descendentes de populações glorioso sob o qual foi forjada. A ‘Lei Áurea’, Zumbi, símbolo da resistência expressa
historicamente oprimidas, além de oficial- expressa o intuito de ressignificar a história no Quilombo de Palmares, e de alguns
mente ocultar o racismo do qual ainda são através do projeto de mascarar o passado museus especificamente dedicados a
vítimas os negros no Brasil. escravagista brasileiro e os protagonistas realidade afro-brasileira, é preciso cons­
de sua contestação, tornando-se notáveis tatar, infelizmente, o silêncio institucional Frontispício do livro A festa das crianças.
Imagens de manifestantes derrubando a
Comemoração da lei 13 de maio que aboliu
estátua do traficante de escravizados Ed- estes elementos na obra em questão: “um sobre a escravidão no espaço público.”
a escravidão no Brasil, de 1888
1896 - 1897
Guerra de Canudos
No final do século XIX, o líder religioso
Antônio Conselheiro reuniu no arraial de
Canudos, no interior da Bahia, milhares
de seguidores, que eram movidos pela
crença de que seu líder poderia livrá-los
da situação de miséria e exploração em
que viviam. Canudos chegou a reunir
25.000 pessoas, que seguiam regras
próprias de seu líder. Antônio Conselheiro
via na República, proclamada anos
antes, a materialização do Anticristo e
dizia ser capaz de garantir a salvação
àqueles que o seguissem. Receosas da
popularidade crescente de Canudos,
as autoridades da República enviaram
tropas para desmantelar a comunidade
Os Sertões, de Euclides da Cunha sócio-religiosa. Os habitantes resistiram
bravamente e apenas na quarta tentativa Arraial de Canudos
o exército pôs fim ao arraial. Brutalmente
atacados, praticamente todos os habitantes
de Canudos morreram no conflito. A
Guerra de Canudos foi o tema de uma
das mais importantes obras da literatura
brasileira: Os Sertões, publicada em 1902.
Correspondente do jornal o Estado de São
Paulo, Euclides da Cunha acompanhou
os conflito de perto, que interpretou como
um crime contra a população do arraial:
“Aquela campanha lembra um refluxo para
o passado. E foi, na significação integral da
palavra, um crime. Denunciemo-lo”.
DO PASSADO AO PRESENTE poder entre homens e mulheres. Foi neste lher e direito de votar, publicado em 1868,
período que se deu a consolidação do no período do Brasil Imperial escravocrata,
Igualdade de gênero e sistema capitalista e dos ideais burgueses veio a questionar o sistema desigual então
direitos das mulheres que, em grande parte, definiram os papéis vigente imposto às mulheres e também a
sociais dentro da estrutura familiar como expor as fragilidades das justificativas uti-
A temática da igualdade de gênero cer- conhecemos hoje e, portanto, determina- lizadas para sustentar tal sistema. O tex-
tamente é uma das mais recorrentes na ram também o papel atribuído à mulher. to é de autoria de Anna Rosa Termaesis do
atualidade, tendo em vista o panorama Este papel não considerava a autonomia Santo, uma professora carioca, e foi pub-
de significativa subjugação do papel femi­ feminina, inibindo assim seu direito à edu­ licado apenas com iniciais de seu nome
nino no meio social. Sub-representação cação crítica, à inserção no mercado de (A.R.T.S), deixando a autora no anonimato
política, desigualdade salarial, sobrecarga trabalho, à escolha e representação políti- até recentemente. A autora trouxe à tona,
de trabalho e violência – nem sempre ex- ca, entre outros. Não tardou então a surgir para além da questão do direito político,
plícita – em diversas situações e ambien- reivindicações contrárias a tal conjuntura. a temática da educação direcionada às
tes são exemplos de como tal disparidade Neste contexto, há de também se conside­ mulheres e de sua atuação no mercado
se dá. Estes exemplos também eviden- rar a relevância do fator racial, em especial de trabalho, descrevendo um sistema fala-
ciam que, ainda que importantes direi­ quando abordada a situação brasileira. O cioso sustentado pela suposta natureza
tos te­nham sido conquistados, pode-se movimento sufragista se deu, em geral, inferior da função feminina. Temática não
constatar problemáticas em variadas di- lide­rado por mulheres brancas e de eleva- muito diferente foi abordada pela revista A
mensões, apontando para uma luta per- da classe social, negligenciando pautas es- Mensageira, que circulou posteriormente
manente visando à igual­dade. Nesse sen- pecíficas das mulheres negras, que, alhei­ em São Paulo, entre 1897 e 1900, visando
tido, em março de 2020, o secretário-geral as a tais moldes burgueses, ainda eram a disseminar esses mesmos ideais, defen- Edição fac-similar da coletânea de
das Nações Unidas classificou a desigual- submetidas oficialmente à escravidão até dendo a emancipação feminina e reivin- exemplares de A Mensageira
dade de gênero como “a grande injustiça 1888. dicando educação de boa qualidade para
de nossa época e o maior desafio de direit- O direito feminino ao voto no Brasil foi ofi- as mulheres.
os humanos que enfrentamos”. cializado apenas em 1932, contudo, ante-
Com origens vindas do século XIX, o movi­ riormente já existiam reivindicações sobre Saiba mais em: Tratado sobre a emanci-
mento sufragista é um dos exemplos de os direitos políticos das mulheres. O Trata­ pação da mulher – uma feminista no Brasil
reação a uma distribuição desigual de do sobre a emancipação política da mu­ de 1868
1930
1922 O romance de 30
Semana de arte moderna A década de 1930 foi um dos momentos
Realizada entre 11 e 18 de fevereiro mais férteis da literatura brasileira, pois
de 1922, em São Paulo, a Semana de nesse período se projetaram alguns
Arte Moderna simbolizou o esforço dos mais importantes escritores do
de renovação das literatura, música século XX no Brasil. Para citar apenas
e artes plásticas brasileiras. Dela alguns exemplos, em 1930, Rachel de
participaram dela nomes como Mário Queiroz publica O quinze, romance que
de Andrade, Oswald de Andrade, narra a vida dos retirantes, obrigados
Anita Malfatti, Di Cavalcanti e Heitor a abandonar suas terras para não
Villa-Lobos. Publicada nesse mesmo sucumbir à fome e sede causadas pela
ano, Pauliceia desvairada, de Mario seca. Em 1937, sai Os capitães da areia,
de Andrade, é um dos marcos da de Jorge Amado, que conta a história de
literatura modernista brasileira. Um meninos de rua de Salvador entregues à
meio muito utilizado pelos artistas própria sorte. Em 1938, Graciliano Ramos
modernistas para pôr em circulação publica Vidas Secas, que retrata a vida
suas ideias e produções foram as miserável de uma família de retirantes
chamadas revistas modernistas. Em sertanejos obrigada a se deslocar de
São paulo foram editadas as revista tempos em tempos para áreas menos
Klaxon (1922-1923) e a Revista de castigadas pela seca. As principais
Antropofagia (1928-1929). No Rio de características compartilhadas por obras
Janeiro apareceu a revista Estética e autores que se enquadram no Romance
(1924-1925) e em Belo Horizonte de 30 são o compromisso com questões
circulou A revista (1925-1926). Mas o regionais (como a seca e a decadência
Modernismo não ficou restrito apenas econômica no Nordeste), o esforço por
aos centros urbanos mais importantes: retratar as parcelas marginalizadas
até uma cidade do interior de Minas da população (rural e urbana) e estilo
Gerais teve uma importante revista neorealista (que moderniza os princípios
modernista, a Verde (1927-1929), que foi da escola realista do século XIX,
publicada por escritores e intelectuais ainda excessivamente preso a visões Prova tipográfica de Vidas Secas (1938)
da cidade de Cataguases. deterministas da vida social). de Graciliano Ramos
[nesse momento o livro ainda se
Revista de Antropofagia (1928-1929) Assista à palestra sobre Claro Enigma, Assista às palestras sobre Angústia, chamaria O mundo coberto de penas]
de Carlos Drummond de Andrade. de Graciliano Ramos e Campo Geral, de
João Guimarães Rosa.
Elaboração dos textos Contato

Adriana Miranda bbm@usp.br


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Luis Augusto Santos Silva
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Coordenação e edição
João Cardoso

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