Você está na página 1de 10

Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Habitação Social com Técnicas mais Sustentáveis: proposta


metodológica para trabalhos acadêmicos
Juliana Demartini (1), João Mário de Arruda Adrião (2), Mariana Garcia de Abreu (3)
(1) Programa de Pós-Graduação em Urbanismo PROURB/UFRJ. E-mail:
julianademartini@hotmail.com
(2) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Edificações e Ambiental, UFMT, Brasil. E-mail:
joaomarioarquiteto@gmail.com
(3) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Edificações e Ambiental, UFMT. E-mail:
marianagdeabreu@gmail.com

Resumo: a abordagem deste artigo relaciona-se à situação habitacional de interesse social de


Cuiabá/MT e como ela tem sido tratada como temática para o desenvolvimento de trabalhos acadêmicos.
Assim sendo, serão apresentadas aqui as novas diretrizes metodológicas inseridas na proposta
pedagógica de ensino de Projeto de Arquitetura e Urbanismo, onde, dentre as outras condicionantes
particulares existentes no tema, como a limitação de recursos financeiros e a variedade da estrutura
(composição) familiar – por exemplo, a Sustentabilidade assume o papel de condicionante obrigatória.
Desta forma, têm-se como objetivos afirmar a importância desta temática para a formação de futuros
arquitetos e urbanistas e inserir no meio acadêmico os novos desafios para os antigos e persistentes
problemas relacionados à Habitação de Interesse Social.
Palavras-chave: Habitação de Interesse Social; Sustentabilidade; Proposta pedagógica para o ensino de
Arquitetura e Urbanismo.

Abstract: this article is about the situation of social housing in Cuiabá/MT and about how it has been
treated as a theme to the development of the academics projects. Thus, will be presented here the new
methodological guidelines inserted in the pedagogical proposal of the teaching of Project of Architecture
and Urbanism, where, among other particular constraints of the theme, like the limitation of the financial
resources and the variety of family composition – for example, the Sustainability is a mandatory
constraints. In this way, has as its objectives to affirm the importance of this theme to the education of the
future architects and urban planners and to insert in the academy the new challenges to the old and
persistent troubles of the Social Housing.
Keywords: Social Housing; Sustainability; pedagogical proposal to education of Architecture and
Urbanism.

1. INTRODUÇÃO
A habitação destinada à população de baixa renda é no Brasil uma questão bastante complexa, não só por
abranger aspectos econômicos e políticos, mas também pelos sócio-culturais e climáticos que mudam
consideravelmente de um estado para o outro. Não se pode comparar ou igualar, como se tem visto na
produção habitacional social, as necessidades das famílias de um estado do Norte com as famílias de um
estado do Sul – ou até mesmo do Centro-Oeste, com o qual faz divisa territorial. Cada lugar tem suas
peculiaridades e sua arquitetura deve respeitá-las para que os usuários possam se apropriar com plenitude
e satisfação.
No entanto, o que se observa por todo o território brasileiro é uma padronização dos conjuntos
habitacionais. Enormes quantidades de casas de dois quartos, sala, cozinha, banheiro e tanque (a área de
serviço resume-se a um tanque instalado do lado de fora da casa, protegido apenas por um beiral de no
máximo 60 centímetros), configuram os conjuntos habitacionais de interesse social construídos hoje de
Norte a Sul do país. A baixa qualidade arquitetônica e urbanística é fortemente marcada pela aridez e
monotonia da paisagem causada pela repetição de um único modelo de unidade habitacional e pelo
descaso com os princípios de qualidade do meio urbano, como por exemplo, arborização das vias,
implantação de praças e parques, etc.

1
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Em consequência destas características, estes conjuntos rapidamente assumem uma nova ‘cara’, a de
assentamento informal, devido às modificações aleatórias e sem nenhuma assistência técnica por serem
executadas pelos próprios usuários por meio da autoconstrução desqualificada.
Alguns pesquisadores do campo da arquitetura e urbanismo associam essa padronização tipológica
realizada em escala industrial ao Modernismo, onde as necessidades espaciais seguem o modelo do
‘homem universal’, cuja demanda físico-espacial é a mesma para todos, independentemente da sua
cultura e características locais.
Porém, na história da habitação de interesse social do Brasil, encontram-se importantes exemplos de
conjuntos sociais como o Pedregulho, elaborado pelo arquiteto modernista Affonso Eduardo Reidy. Neste
conjunto, executado em meados da década de 40, na cidade do Rio de Janeiro, o arquiteto adotou a
variedade tipológica dos apartamentos, que possuem de um a quatro quartos. Também a forma de
ocupação do terreno chama a atenção, pois Reidy não se deteve apenas na tipologia habitacional, mas
estendeu sua preocupação ao espaço externo de uso coletivo, segundo ele “habitar não se resume à vida
no interior de uma casa” (NAZARETH, 2008).
O Banco Nacional de Habitação (BNH, criado em 1964 e extinto em 1986 - FOLZ, 2003), é também uma
forte referência da padronização e aridez dos conjuntos habitacionais destinados à baixa renda.
Buscando-se a redução do preço das habitações, as unidades habitacionais tiveram seu
tamanho reduzido e os conjuntos passaram a não ter tanta preocupação com espaços
coletivos, apresentando baixa qualidade de projeto assim como de materiais
empregados. A relação desses conjuntos habitacionais com o espaço urbano deixou de
existir (FOLZ, 2003).
Independente de quem seja a responsabilidade pelo pobre legado arquitetônico-urbanístico dos conjuntos
e unidades habitacionais, hoje em dia ainda se vê a mesma produção industrial baseada em quantidade e
não em qualidade.
Não se quer aqui discutir as responsabilidades sobre a má qualidade dos conjuntos executados na época
do Modernismo ou pelo BNH. Mas sim, a importância e o encargo que o arquiteto e urbanista tem sobre
essa questão tão polêmica e tão complexa que é a habitação de interesse social. Pois, não se pode associar
a falta de qualidade somente a fatores sócio-políticos e legais, uma vez que, mesmo que pontualmente,
existem bons exemplos já implantados a serem seguidos.
Acredita-se que essa discussão deve ter início já na fase acadêmica, ou seja, deve ser inserida na grade
curricular dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, para que os alunos já se familiarizem com os
problemas e a complexidade apresentada pela temática. Sendo assim, tratar-se-á neste artigo sobre a
importância da Habitação de Interesse Social Sustentável como temática para a formação de arquitetos e
urbanistas. Para isso, é necessário que se faça uma breve explanação sobre a questão habitacional social
em Mato Grosso e Cuiabá.

2. QUADRO DA HABITAÇÃO SOCIAL EM MATO GROSSO E CUIABÁ


Apesar de a preocupação com a provisão de habitação social em Cuiabá ter tido início na década de 40,
foi somente duas décadas depois que a questão tomou força, através do programa habitacional da
Companhia de Habitação do Estado de Mato Grosso (COHAB/MT). De acordo com Barcelos (2011) em
1979 foram entregues mais de 7 mil unidades habitacionais, o maior número atingido pela COHAB/MT,
seguido pelos anos 1982 – com quase 5 mil unidades, 1987 – com pouco mais de 6 mil e 1988 e 1991 –
com pouco menos de 4 mil casas. Em 1996, foram entregues as últimas moradias produzidas pelo
programa (Gráfico 01).

2
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Gráfico 01: Unidades habitacionais entregues, por ano, pela COHAB/MT


Fonte: BARCELOS, 2011.
O Gráfico acima está relacionado à produção de unidades habitacionais no Estado de Mato Grosso, não só
em Cuiabá. Os primeiros conjuntos habitacionais executados pela COHAB/MT na capital foram o Cidade
Verde e o Nova Cuiabá, com 365 e 443 unidades, respectivamente (CASTOR, 2007; BARCELOS, 2011).
Castor (2007) descreve as casas destes conjuntos como térreas e isoladas no terreno, 15 a 60 m² de área
construída, com plantas convencionais (modelo Banco Nacional de Habitação - BNH), com programa
arquitetônico composto por um, dois ou três quartos, sala, cozinha, banheiro e área de serviço.
Com a extinção da COHAB/MT, a maior parte das moradias de interesse social em todo o território mato-
grossense, passaram a ser promovidas pelos programas habitacionais disponibilizados pela Caixa
Econômica Federal (CEF). O Gráfico 2, de Barcelos (2011), apresenta a síntese da produção da habitação
popular em MT.

Gráfico 02: Evolução Histórica da Habitação em Mato Grosso (1949 a 2010)


Fonte: BARCELOS, 2011.
Como se pode ver nos Gráficos acima foram vários os programas habitacionais criados e substituídos ao
longo da história da habitação popular no Mato Grosso e consequentemente em Cuiabá (que por
apresentar maior déficit habitacional, recebeu desde o início a maior quantidade de moradias). O que não
evoluiu neste tempo foi a qualidade arquitetônica e urbanística dos conjuntos habitacionais. Pode se
observar que a unidade habitacional oferecida hoje ainda segue o modelo do BNH, como descrito por
Castor (2007) em relação às moradias e conjuntos populares “[...] tudo organizado em cômodos mínimos,
casas impessoais e conjuntos periféricos monótonos e desprovidos de identidade”.
Este descaso com a qualidade projetual das moradias pode ser notado quando se compara as Figuras 01 e
02 abaixo. A Figura 01 apresenta um conjunto habitacional executado pela COHAB/MT na década de 60;

3
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

a Figura 02, mostra um conjunto habitacional entregue recentemente pela iniciativa privada através do
programa Minha Casa, Minha Vida da CEF.

Figura 01: Conjunto Habitacional Popular em Cuiabá, década de 60


Fonte: BARCELOS, 2011.

Figura 02: Conjunto Habitacional em Cuiabá, 2011


Fonte: http://www.megadebate.com.br/2011/03/setecs-realiza-nesta-quinta-feira.html
Com base nesta comparação da involução das moradias das imagens acima, se reforça a necessidade de se
inserir o tema da habitação de interesse social na grade curricular das Faculdades de Arquitetura e
Urbanismo. Esta ação contribui para a formação de arquitetos e urbanistas mais conscientes de suas
responsabilidades em relação ao desenvolvimento das cidades. Há pesquisas, inclusive no Brasil, que
comprovam que é possível sim produzir conjuntos com habitações de interesse social com qualidade
arquitetônica e urbanística, ainda mais se seguirem os princípios da Sustentabilidade, que considera não
só o ambiente construído, mas também as questões sócio-culturais envolvidas no meio.
A seguir, apresenta-se um projeto desenvolvido por uma aluna de Arquitetura e Urbanismo – que inspirou
a metodologia da disciplina de Atelier de Projeto Arquitetônico VII deste semestre, onde além de todas as
condicionantes particulares deste tema tão complexo, a Sustentabilidade entra como condicionante
principal e obrigatória para a concepção dos conjuntos habitacionais de interesse social.

3. HABITAÇÃO SOCIAL: TEMÁTICA ACADÊMICA


Segundo Mascaró (et al, 2006), a temática da habitação social começa a ser tratada com maior ênfase em
1960 e 1970. Neste momento as políticas habitacionais no Brasil lançaram grandes investimentos em
programas de redução ao déficit. Com a extinção do BNH, o volume de obras foi reduzindo-se até a
suspensão total da produção em alguns estados, ‘fazendo com que houvesse uma espécie de dormência no
tema, especialmente nas instituições de ensino superior’. Em 1990, retomou-se a produção por meio de
novos programas habitacionais focados nas iniciativas dos governos estadual e municipal e gradualmente
a habitação social volta a ser tema de pesquisas e ensino acadêmicos.
O tema da Habitação Social foi inserido no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Cuiabá

4
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

(FAU/UNIC), desde o seu início, em 1995. Inicialmente, o tema se estendia a dois semestres, oitavo e
nono. No oitavo semestre era desenvolvida a unidade habitacional e no nono eram desenvolvidos os seus
projetos complementares e memoriais, descritivo e quantitativo. Atualmente a habitação de interesse
social é a temática apenas do nono semestre, porém passaram a ser tratadas com maior ênfase as questões
arquitetônicas e urbanísticas. Os alunos não desenvolvem mais os projetos complementares das unidades
habitacionais, porém as questões sócio-econômicas, culturais, climáticas e de legislação do local são
tratadas com maior profundidade.
Assim como em grande parte dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, na FAU/UNIC os conjuntos
habitacionais de interesse social são abordados como temática no último Atelier de Projeto Arquitetônico,
em função da sua capacidade de abrangência e alta complexidade. Pois, para o desenvolvimento do
projeto são necessários os conhecimentos de praticamente todas as disciplinas oferecidas pela grade
curricular básica de um curso de Arquitetura e Urbanismo.

3.1 Metodologia de Ensino


Para sistematizar o ensino e orientação dos projetos de Habitação de Interesse Social (HIS), a disciplina
de Atelier de Projeto Arquitetônico VII da FAU/UNIC é dividida em duas partes.
Na primeira etapa os alunos se dividem em grupos para a elaboração de um diagnóstico sobre a área de
estudo, onde serão implantadas as propostas de HIS. Neste diagnóstico os alunos devem apresentar e
debater as questões arquitetônicas e urbanísticas dos locais determinados (história dos bairros, uso e
ocupação do solo, relações com os bairros vizinhos, tipologias arquitetônicas predominantes, sistema
viário, legislação, perfil sócio-econômico da comunidade, entre outros). Também neste momento, os
alunos devem apresentar opções de terrenos para a implantação dos conjuntos habitacionais a serem
desenvolvidos, assim como o número de famílias a serem beneficiadas. Ainda na primeira etapa, durante
a composição do diagnóstico, os alunos fazem pesquisas sobre os precedentes que mais se aproximam de
seus objetivos.
É importante mencionar que os bairros selecionados para o desenvolvimento do diagnóstico e
consequentemente do projeto têm como característica principal apresentar famílias que moram em
condições precárias e em área de risco ou de preservação ambiental. Dessa forma, os alunos passam a ter
contato pessoal com uma clientela real, mesmo que para a concepção de um projeto de cunho apenas
acadêmico, ou seja, hipotético. Para o diagnóstico, os alunos são estimulados a entrevistarem os
moradores das áreas de risco ou preservação ambiental, para reforçar o contato pessoal e a percepção
sobre as necessidades físico-espaciais da clientela, assim como tornar sensível as condições precárias em
que essas pessoas vivem.
Com o intuito de se reforçar ainda mais a percepção dos alunos sobre a difícil condição de vida da
população alvo, junto com a apresentação do diagnóstico, é realizado um concurso de fotos. Cada aluno
participa do concurso com uma foto que registra, do seu ponto de vista, a paisagem ou uma cena do
cotidiano das comunidades em questão.
Nas turmas (diurno e noturno) que cursam o 9° semestre do curso de Arquitetura e
Urbanismo, a fotografia é o meio indicado para que os acadêmicos consigam
compreender a realidade da comunidade, onde é desenvolvido o projeto arquitetônico
proposto na disciplina, pois conhecer as reais condições das famílias a serem
contempladas é o primeiro desafio de um Arquiteto (ABREU et al, 2011).
Na segunda etapa os alunos já têm os dados conceituais do tema e os aspectos físicos e índices
urbanísticos do terreno. Ou seja, todas as limitações já são conhecidas e então se dá início às propostas. A
partir deste momento são feitas as orientações individuais e eventualmente são promovidas discussões
sobre as comuns dificuldades encontradas pelos alunos. Para melhor desempenho e resultados, nas duas
etapas, procura-se sempre estimular as troca de conhecimento entre os alunos.

3.2 Sustentabilidade como diretriz de projeto para HIS


Em todas as modalidades de ensino percebe-se que as dificuldades são comuns. Logo surge uma
necessidade de modificações nas práticas pedagógicas. Inovações são necessárias, possíveis e viáveis,
desde que o professor e o aluno estejam abertos ao diálogo, afinal, “educar também é ajudar a

5
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

desenvolver todas as formas de comunicação” Moran apud Reis (2003). Com base neste pensamento
foram inseridas novas propostas pedagógicas, descritas a seguir, para um melhor desempenho no
aprendizado proposto na disciplina de Atelier de Projeto de Arquitetura VII, cujo o tema é Habitação de
Interesse Social.
Algumas universidades brasileiras adotam, na Graduação ou na Pós-graduação, a Sustentabilidade como
temática para o desenvolvimento de projetos e pesquisas de Arquitetura e Urbanismo. Muitos destes
projetos e pesquisas associam os princípios da construção sustentável à produção habitacional para
população de baixa renda. Segundo Sattler (2010), o interesse pelas questões ligadas à Sustentabilidade
na produção da HIS está crescendo. Mesmo assim o autor salienta que:
Embora os departamentos específicos da maioria das instituições acadêmicas brasileiras
ainda não estejam preparados para cobrir adequadamente os assuntos relacionados aos
impactos ambientais, iniciativas deveriam ser tomadas para demonstrar a importância
do assunto, assim como, para desenvolver o conhecimento junto aqueles que estão, ou
logo estarão, formando o ambiente construído (SATTLER, 2010).
Dessa maneira, a Sustentabilidade foi recentemente introduzida como diretriz obrigatória (antes era
opcional) em alguns Ateliers de Projeto e também em disciplinas de Urbanismo. Essa obrigatoriedade tem
como finalidade ampliar os conhecimentos dos alunos sobre a Sustentabilidade e também deixá-los mais
conscientes de que os arquitetos têm um papel importantíssimo para o futuro do planeta. Pois, suas
escolhas podem proporcionar maior ou menor impacto ambiental no meio onde será inserida a sua
proposta arquitetônica ou urbanística.
O desafio de conceber um conjunto habitacional de interesse social sustentável levou os alunos a uma
busca intensa sobre materiais e técnicas construtivas alternativas com menores ou nenhum impacto ao
meio. Durante esta busca os alunos percebem também que a escolha dos materiais deve considerar não só
o produto final, mas também todo o seu processo de fabricação e de instalação ou execução. Da mesma
forma, as técnicas construtivas devem ser sustentáveis e até fazer com que a comunidade alvo possa
realizar suas próprias ampliações ou mesmo fazer com que a autoconstrução, muito comum nas
residências das classes C e D, sejam realizadas de forma correta, segura, direcionada.
Duas das referências bibliográficas mais utilizadas pelos alunos como base para pesquisa e
desenvolvimento do projeto foram os livros: Ecohouse - A Casa Ambientalmente Sustentável (Susan
Roaf, Manuel Fuentes e Stephanie Thomas), e o Manual do Arquiteto Descalço (Johan van Lengen).
Estas duas referências reforçam a importância e dão muitos exemplos de materiais e técnicas construtivas
sustentáveis.
O Selo Casa Azul, implantado pela Caixa Econômica Federal para orientar e estimular a produção de
conjuntos habitacionais mais sustentáveis é também adotado como referência a ser seguida na disciplina
de Atelier de Projeto Arquitetônico VII (PA VII). O objetivo deste selo é incentivar o uso racional dos
recursos naturais, assim como melhorar a qualidade da habitação e do seu entorno. Para isso, as categorias
analisadas nos projetos são: qualidade urbana, projeto e conforto, eficiência energética, conservação de
recursos materiais, gestão da água e práticas sociais. O Selo Casa Azul apresenta os níveis Ouro
(máximo), Prata e Bronze, definidos pelo número de critérios atendidos.
A inserção da Sustentabilidade como condicionante obrigatória e consequentemente do Selo Casa Azul na
disciplina de PA VII (FAU/UNIC), que tem como tema Habitação de Interesse Social, aconteceu após o
desenvolvimento de um Trabalho Final de Graduação (TFG), cujo resultado foi bastante satisfatório.

3.3 Resultado da aplicação do Selo Casa Azul em trabalho acadêmico


Apresenta-se neste momento, a síntese do projeto de um conjunto habitacional desenvolvido com critérios
do Selo Casa Azul, no segundo semestre de 2011, por uma aluna da graduação do curso de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de Cuiabá.
Cuiabá é umas das capitais selecionadas para sediar a Copa Mundial de Futebol de 2014 no Brasil. Em
função deste megaevento muitos projetos urbanísticos vão sair do papel para tornarem-se realidade e
melhorar a qualidade dos espaços públicos urbanos da cidade.
Uma dessas melhorias é a Avenida Parque Marginal Barbado a ser implantada em uma Área de

6
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Preservação Permanente (APP) no trecho compreendido entre os bairros Dom Bosco e Canjica – região
Leste de Cuiabá. A área a ser beneficiada está, há muitos anos, ocupada por famílias de baixa renda que
se apropriaram inadequadamente das margens do Córrego do Barbado. O trecho compreendido entre os
dois bairros citados possui até um nome específico, Castelo Branco, determinado pela comunidade que ali
reside.
A proposta de realocação das 177 famílias, que serão de fato desapropriadas de suas residências
irregulares (e precárias), foi desenvolvida com base nos critérios do Selo Casa Azul, principalmente em
‘qualidade urbana’ e ‘projeto e conforto’.
Durante o desenvolvimento do diagnóstico a aluna observou que as áreas limítrofes às margens do
Córrego do Barbado, a partir das faixas ‘non aedificandi’ exigidas pela legislação, são pouco adensadas e
por isso são adequadas à implantação do conjunto habitacional proposto (Figura 03). Essa solução atende
não só ao Selo Casa Azul, no critério qualidade urbana, mas também ao Plano Nacional de Habitação,
que defende que as comunidades desapropriadas não devem ser realocadas para bairros distantes de onde
moravam.
A implantação seguiu as características existentes no bairro, ou seja, com casa térrea isolada no lote (este
um pouco menor do que os existentes/ocupados - 180 m²).

Figura 03: Proposta de Implantação de Conjunto Habitacional para 177 famílias


Fonte: Arquivo Pessoal
Para as unidades habitacionais foram utilizados como conceitos principais a flexibilidade espacial
(relacionada à qualidade do espaço físico de se ajustar aos anseios dos que nele habitam) e a
ampliabilidade (adição de ambientes programada funcional, técnica e esteticamente), a partir das
definições de Brandão (2006). A Figura 04 a seguir apresenta as cinco possibilidades de ampliação de um
único embrião. O embrião apresenta 48 m² e a ampliação máxima atinge 115 m². Houve a preocupação de
se respeitar o mínimo de área permeável no terreno, exigido pela legislação, mesmo com a maior
ampliação da proposta.

7
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Figura 04: Planta Baixa do Embrião da Unidade Habitacional e de suas ampliações


Fonte: Arquivo Pessoal
Também a acessibilidade ganhou maior relevância neste projeto, uma vez que nele 100% das unidades
habitacionais são adaptadas para portadores de necessidades especiais (Figura 05), enquanto que a NBR
9050/04 (que trata da Acessibilidade) exige apenas 3% do total das unidades. Além de a acessibilidade ser
um dos conceitos que está contido nos critérios obrigatórios para a obtenção do Selo, no diagnóstico
foram identificados alguns portadores de necessidades especiais – mobilidade reduzida, mais
especificamente.

Figura 05: Planta Baixa da Unidade Habitacional – Acessibilidade


Fonte: Arquivo Pessoal
A solução da cobertura foi concebida com base na simplicidade, pois ela é um elemento de destaque nas
fachadas, porém não deve dificultar a execução das possíveis ampliações, assim como não deve
descaracterizar o partido arquitetônico proposto (Figura 06 a). Sendo assim, a cobertura, de telha
cerâmica, foi desenvolvida em duas águas em níveis diferentes não só para melhorar a composição dos
volumes das fachadas, mas também para gerar a exaustão do ar quente – por meio de grelhas localizadas
entre os dois níveis das coberturas (Figura 06 b).

8
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

Figura 06 a e b: Resultado formal da Unidade Habitacional


Fonte: Arquivo Pessoal
A tecnologia construtiva adotada é o tijolo de solo-cimento, também conhecido como tijolo ecológico.
Esta escolha atende ao princípio da Sustentabilidade, por não haver queima na produção dos tijolos e
também apresenta desempenho térmico adequado ao local. Este material possibilita ainda que a própria
comunidade a ser beneficiada possa trabalhar em mutirão para a construção das casas.
Há muitas outras explanações sobre os resultados da adoção do Selo Casa Azul neste projeto de conjunto
habitacional de interesse social. Porém, como já foi dito anteriormente o objetivo deste artigo é
demonstrar a importância da inserção da habitação social sustentável no meio acadêmico. Este projeto é
apenas um dos resultados dessa iniciativa metodológica.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através da proposta metodológica descrita neste artigo está sendo possível perceber no corpo discente
não só um aprofundamento das pesquisas sobre os princípios da Sustentabilidade, mas também um
estreitamento das suas relações com as questões sociais da cidade – não só em relação à habitação, mas
também à mobilidade, equipamentos urbanos, entre outras necessidades externas à moradia social.
Outro aspecto interessante tem sido observado no comportamento dos alunos através do conhecimento
apurado sobre a Sustentabilidade: a busca por ações mais sustentáveis na vida pessoal. Os trabalhos
impressos passaram a ser entregues em papel reciclado com impressão nos dois lados da folha, por
iniciativa própria dos alunos. Também tem se notado a troca de informações sobre descarte correto do
lixo – pontos de recolhimento de materiais descartáveis, como garrafas PET, pilhas e baterias, latinhas de
alumínio, etc.
Além disso, vê-se um maior entusiasmo na busca por informações sobre técnicas e materiais mais
sustentáveis disponíveis na cidade e regiões de entorno, assim como o resgate de técnicas vernaculares. A
pesquisa sobre precedentes projetuais e o desenvolvimento do diagnóstico nos bairros também teve
grande aceitação dos alunos, que em relação aos semestres anteriores, quando a Sustentabilidade ainda
não era condicionante principal de projeto, mostraram-se muito mais conscientes de suas futuras
responsabilidades como arquitetos e urbanistas.
Assim, acredita-se que a Habitação de Interesse Social com técnicas mais sustentáveis como temática
acadêmica atinge o objetivo proposto para o aprendizado de alunos das Faculdades de Arquitetura e
Urbanismo, e ainda contribui para ações mais sustentáveis em suas vidas pessoais.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil. 4. Ed. São Paulo: Editora Liberdade, 2004.
BRANDÃO, Douglas Queiroz. Habitação social evolutiva: aspectos construtivos, diretrizes para
projetos e proposições de arranjos espaciais flexíveis. Cuiabá: CEFETMT, 2006.
FOLZ, Rosana Rita. Mobiliário na Habitação Popular: discussões de alternativas para melhoria da
habitabilidade. São Carlos - Rima, 2003.

9
Porto Alegre, de 28 a 31 de maio de 2012

LENGEN, J. V. Manual do Arquiteto Descalço. Rio de Janeiro: Casa do Sonho, 2002.


MASCARÓ, Juan José; KALIL, Rosa Maria L.; GELPI, Adriana; SAÚGO, Andréia; COMIN,
Rosangela. Habitação Social no Meio Acadêmico: Retomando a Temática. Revista INVI, Universidad
de Chile, maio/2006 Vol. 21, número 056. Santiago, Chile, pp. 43-54.
NAZARETH, Oswaldo. Conjunto Pedregulho, de Afonso Eduardo Reidy. Campanha do IAB-RJ para
restauração imediata. 2008. Acesso em: 12/03/2012; Disponível em:
<http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/09.099/1871>
REIS, Waleska Dacal. A fotografia como suporte didático para professores do ensino fundamental. VI
Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil” Aracaju - SE,
novembro de 2003. Acesso em: 01/06/2010. Disponível em:
<http://www.histedbr.fae.unicamp.br/acer_histedbr/seminario/seminario6/Ensino%20Fundamental/Fotogr
afia.doc>
ROAF, S.; FUENTES, M.; THOMAS, S. Ecohouse: A casa Ambientalmente Sustentável. 2ª Ed. – Porto
Alegre: Bookman, 2006, 408 p.
SATTLER, M. A. Habitação de interesse social: Sustentabilidade e Ética. In: D’ÁVILA, M. R. (org.).
Sustentabilidade e Habitação de Interesse Social: CHIS 2010. Livro Pós-congresso. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2010.

10

Você também pode gostar