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A PSICANÁLISE E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

A PSICANÁLISE E O
DESENVOLVIMENTO
INFANTIL

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A PSICANÁLISE E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

SUMÁRIO

O CONCEITO DE INFÂNCIA NO DECORRER DA HISTÓRIA .................................. 4

A infância nos dias de hoje.......................................................................................... 7

O desenvolvimento infantil na perspectiva psicanalítica ............................................. 9

A Família e a Escola como contextos de desenvolvimento humano ......................... 20

A Família como contexto de desenvolvimento humano ............................................ 21

Vínculos familiares e redes de apoio ......................................................................... 25

A escola como contexto de desenvolvimento humano .............................................. 26

A escola e sua função social ..................................................................................... 27

Compreendendo as relações família-escola ............................................................. 29

Considerações finais: desafios e perspectivas .......................................................... 33

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 36

Todos os direitos reservados ao Instituto Pedagógico Brasileiro – IPB. Reprodução


Proibida.
Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de Fevereiro de 1998.

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O CONCEITO DE INFÂNCIA NO DECORRER DA HISTÓRIA

Fonte: https://4daddy.com.br/para-que-servem-as-lembrancas-da-infancia/

―A fascinação pelos anos da infância, um fenômeno relativamente recente‖


(HEYWOOD, 2004, p.13), fez com que o conceito de infância sofresse alterações
significativas ao longo da história. Compreender o que foram esses conceitos,
analisando a infância do ponto de vista histórico, pode nos revelar muito sobre a sua
situação nos dias atuais.
Até o século XII, as condições gerais de higiene e saúde eram muito
precárias, o que tornava o índice de mortalidade infantil muito alto.
Pode-se apresentar um argumento contundente para demonstrar que a
suposta indiferença com relação à infância nos períodos medieval e moderno
resultou em uma postura insensível com relação à criação de filhos. Os bebês
abaixo de 2 anos, em particular, sofriam de descaso assustador, com os pais
considerando pouco aconselhável investir muito tempo ou esforço em um ― pobre
animal suspirante‖, que tinha tantas probabilidades de morrer com pouca idade.
(HEYWOOD, 2004, p.87)
E, ainda sim, as crianças que conseguiam atingir uma certa idade não
possuíam identidade própria, só vindo a tê-la quando conseguissem fazer coisas
semelhantes àquelas realizadas pelos adultos, com as quais estavam misturadas.
Sendo assim, dos adultos que lidavam com as crianças não era exigida nenhuma
preparação. Tal atendimento contava com as chamadas criadeiras, amas de leite ou
mães mercenárias.

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Contudo, um sentimento superficial da criança – a que chamei de


―paparicação‖ – era reservado á criancinha em seus primeiros anos de vida,
enquanto ela ainda era uma coisinha engraçadinha. As pessoas se divertiam com a
criança pequena como um animalzinho, um macaquinho impudico. Se ela morresse
então, como muitas vezes acontecia, alguns podiam ficar desolados, mas a regra
geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo a substituiria. A criança não
chegava a sair de uma espécie de anonimato (ÁRIES,1981, p.10).
Vale ressaltar também que o tratamento dado a uma criança do sexo
masculino era, em muitos casos, diferente do tratamento recebido por uma criança
do sexo feminino, pois ―as meninas costumavam ser consideradas como o produto
de relações sexuais corrompidas pela enfermidade, libertinagem ou a desobediência
a uma proibição‖ (HEYWOOD, 2004, p.76). E sendo assim, a celebração do
nascimento de uma criança se diferenciava de acordo com o sexo da mesma. Um
exemplo é a Bretanha do século XIX, em que a chegada de uma criança do sexo
masculino era saudada com três badaladas de um grande sino, enquanto a chegada
de uma criança do sexo feminino era saudada com apenas duas badaladas e de um
sino pequeno.
Até mesmo na arte a infância foi ignorada. ―Até por volta do século XII, a arte
medieval desconhecia a infância ou não tentava representa-la. É difícil crer que essa
ausência se devesse à incompetência ou a falta de habilidade. É mais provável que
não houvesse lugar para a infância nesse mundo‖ (ÁRIES,1981, p.50). Sendo que
até o fim do século XVIII, não existem crianças caracterizadas por sua expressão
particular, sendo retratadas então como homens de tamanho reduzido.
Não se tem notícia de camponeses ou artesãos registrando suas histórias de
vida durante a Idade média, e mesmo os relatos dos nobres de nascimento ou dos
devotos não costumavam demonstrar muito interesse pelos primeiros anos de vida
(...). De forma semelhante, durante o período moderno na Inglaterra, as crianças
estiveram bastante ausentes na literatura, fossem o drama elizabetano ou os
grandes romances do século XVIII. A criança era, no máximo, uma figura marginal
em um mundo adulto. (HEYWOOD, 2004, p.10)
No século XIII, atribuíram-se à criança modos de pensar e sentimentos
anteriores à razão e aos bons costumes. Cabia aos adultos desenvolver nelas o
caráter e a razão. No lugar de procurar entender e aceitar as diferenças e

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semelhanças das crianças, a originalidade de seu pensamento, pensava-se nelas


como páginas em branco a serem preenchidas, preparadas para a vida adulta.
―A ―descoberta‖ da infância teria de esperar pelos séculos XV, XVI e XVII,
quando então se reconheceria que as crianças precisavam de tratamento especial,
―uma espécie de quarentena‖, antes que pudessem integrar o mundo dos adultos‖
(HEYWOOD, 2004, p.23). Fazendo assim com que as crianças deixassem de ser
misturadas aos adultos. Essa quarentena foi a escola, que substituiu a
aprendizagem como meio de comunicação.
Trata-se um sentimento inteiramente novo: os pais se interessavam pelos
estudos dos seus filhos e os acompanhavam com solicitude habitual nos séculos XIX
e XX, mas outrora desconhecida. (...) A família começou a se organizar em torno da
criança e a lhe dar uma tal importância que a criança saiu de saiu de seu antigo
anonimato, que se tornou impossível perde – lá ou substituí – lá sem uma enorme
dor, que ela não pôde mais ser reproduzida muitas vezes, e que se tornou
necessário limitar seu número para melhor cuidar dela (ÁRIES,1981, p.12).
A mudança de paradigma no que se refere ao conceito de infância está
diretamente ligada com o fato de que as crianças eram consideradas adultos
imperfeitos. Sendo assim, essa etapa da vida provavelmente seria de pouco
interesse. ―Somente em épocas comparativamente recentes veio a surgir um
sentimento de que as crianças são especiais e diferentes, e, portanto, dignas de ser
estudadas por si sós‖ ( HEYWOOD, 2004, p.10).
Como pudemos perceber, a maneira como a infância é vista atualmente é
consequência das constantes transformações pelas quais passamos, e que é de
extrema importância nos darmos conta destas transformações para
compreendermos a dimensão que a infância ocupa atualmente. ―Este percurso (esta
história), por outro lado, só foi possível porque também se modificaram na sociedade
as maneiras de se pensar o que é ser criança e a importância que foi dada ao
momento específico da infância‖ (BUJES, 2001, p.13)

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A infância nos dias de hoje

Fonte: http://revistavisaojuridica.com.br/2017/01/30/responsabilidade-dos-pais-sobre-o-
comportamento-dos-filhos-na-internet/crianca-computador/

Uma infância que requer ―especialistas‖ não é, certamente, uma infância


qualquer, mas sim, uma que supostamente necessita de um séquito de
―conhecedores para lhe revelar sua verdade‖. Assim, a noção de infância na
modernidade se articula dentro de uma política de verdades, amparada pela
autoridade do saber de seus porta vozes. (CIRINO apud CASTRO, 1999, p.24)
A maneira como a infância é vista atualmente é mostrado no Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil (Brasília, 1998), que vem afirmar que
―as crianças possuem uma natureza singular, que as caracterizam como seres que
sentem e pensam o mundo de um jeito muito próprio‖. Sendo assim, durante o
processo de construção do conhecimento, ―as crianças se utilizam das mais
diferentes linguagens e exercem a capacidade que possuem de terem ideias e
hipóteses originais sobre aquilo que procuram desvendar‖. Este conhecimento
constituído pelas crianças ―é fruto de um intenso trabalho de criação, significação e
ressignificação‖.
Ainda convém salientar que compreender, conhecer e reconhecer o jeito
particular das crianças serem e estarem no mundo é o grande desafio da educação
infantil e de seus profissionais. Embora os conhecimentos derivados da psicologia,
antropologia, sociologia, medicina, etc. possam ser de grande valia para desvelar o
universo infantil apontando algumas características comuns da ser das crianças,
elas permanecem únicas em suas individualidades e diferenças (Referencial
Curricular Nacional para a Educação Infantil, 1998, p.22).

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A partir do momento em que alcançou – se uma consciência sobre a


importância das experiências da primeira infância, foram criadas várias políticas e
programas que visassem promover e ampliar as condições necessárias para o
exercício da cidadania das crianças, que por sua vez, passaram a ocupar lugar de
destaque na sociedade.
No Brasil temos, atualmente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9394, que ressaltou a importância da educação infantil tornando-a
primeira etapa da educação básica, em seu título II, art 2º nos mostra que A
educação dever da família e do estado inspirada nos princípios de liberdade e nos
ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do
educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
Esta citação encontra respaldo no art. 4º, IV que diz: ―o dever do Estado com
educação escolar pública está efetivado mediante a garantia de (...) atendimento
gratuito em creches e pré-escolas as crianças de zero a seis anos de idade‖.
Houve também a criação do Conselho da Criança e do Adolescente, no ano
1990, que explicitou melhor cada um dos direitos da criança e do adolescente bem
como os princípios que devem nortear as políticas de atendimento. Determinou
ainda a criação dos Conselhos da Criança e do adolescente e dos Conselhos
Tutelares. Os primeiros devem traçar as diretrizes políticas e os segundos devem
zelar pelo respeito aos direitos das crianças e dos adolescentes, entre os quais o
direito à educação, que para as crianças pequenas incluirá o direito a creches e pré-
escolas. ( CRAIDY, 2001, p.24)
Na visão de muitos autores a criação do Conselho da Criança e do
Adolescente é vista como um marco no diz respeito ao reconhecimento e
valorização da infância por parte das políticas públicas.
Torna-se relevante citar também o Plano Nacional de Educação(PNE), que
em consonância com os princípios da Educação para Todos, estabelece metas
relevantes de expansão e de melhoria da qualidade da educação infantil. A atuação,
nesse sentido, tem como objetivo concretizar as metas estabelecidas no PNE e
incentivar estados e municípios a elaborem seus planos locais de educação,
contemplando neles a educação infantil ressaltando assim a importância destinada á
infância na sociedade atual.

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O desenvolvimento infantil na perspectiva psicanalítica

Fonte: http://jromeronc.blogspot.com/2016/03/a-analise-do-desenho-infantil-sob.html

No homem, a grande imaturidade do sistema nervoso central à nascença vai


condicionar, por um lado, uma grande dependência do meio, por outro uma extrema
influência deste sobre o processo de crescimento e a aprendizagem. Em nenhuma
espécie biológica a moldagem pelo ambiente é tão intensa e implica um tão amplo
leque de diversidade evolutiva. Para o compreendermos basta relembrar que um
grande número de vias aferentes, eferentes e associativas só tarde atingem a sua
mielinìzação completa, o que equivale a dizer que são percursos e circuitos
possíveis mas só abertos ao trânsito do fluxo nervoso à medida que o
desenvolvimento se desenrola, o que cria a par e passo condições novas e vias
alternativas, permitindo organizações diferentes e opções diversas, marcando
destinos e abrindo caminhos, ancorando em precipitações prematuras ou rasgando
perspectivas insondáveis.
Se esta situação semi-embrionária do sistema nervoso deixa em aberto uma
gama larga de estruturações futuras, só mais tarde maduras e mais ou menos
definitivas — os modernos trabalhos de neurofisiologia e neuropatologia mostram
que a plasticidade morfogenética da arquitetura neuronal não se esgota tão
precocemente como se julgava — para além desta constatação embrionária,
continuando, deparamos ainda com um substratum anatómico que, no homem,

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designadamente pelo enorme desenvolvimento dos lobos frontais, permite uma


computorização dos dados de experiência, uma modulação da sua elaboração e
uma variabilidade de resposta que só recorrendo ao cálculo exponencial podemos
encontrar uma medida para as compararmos com a capacidade instrumental do
cérebro dos outros animais.
Esta riqueza morfológica e complexidade arquitetônica da rede neuronal
traduzem-se no funcionamento operacional pela elevada capacidade de formação
de reflexos condicionados altamente complexos, pela facilidade da sua extinção e
renovação, pela rapidez de formação e substituição de estereótipos
comportamentais, pela finura e precisão da sua adequação, e ainda na variabilidade
do seu dinamismo intrínseco, numa palavra, na possibilidade da formação de
automatismos finamente adaptados e na fácil desautomatização, tão necessária na
conduta sistematicamente a adaptar do homem em sociedade.
Nesta capacidade anatomo-fisiológica destacamos, por maior interesse para o
assunto da nossa exposição: a extensa memória, a intensa repercussão emocional
da experiência vivida, e a possibilidade acrescida de planear a ação e de fantasiar.
As experiências de cingulectomia e de lobotomia frontal, bem como a patologia
parietal e temporal, dão-nos exemplos claros do valor deste suporte neuro-
anatómico. As clássicas observações e experiências de Koller com o macaco
mostram-nos o nascer da importante função do planeamento do agir; as de Harlow,
do crescendo em progressão geométrica da capacidade sensório-afetiva diacrítica.
Memória, afeto e fantasia são três aspectos do funcionamento mental, que,
como veremos, e sabemos, são fundamentais na compreensão analítica da relação
humana.
Este rápido — também incómodo e talvez maçador — sobrevoo pelas bases
neuro-anatómicas e neuro-fisiológicas do comportamento humano tem somente a
intenção de deixar bem claro que a psicanálise não é uma teoria construída no vazio
ou uma pura especulação do espírito, mas um esforço científico para compreender o
funcionamento psíquico, não ignorando a base biológica da vida mental, a dimensão
histórica e cultural do homem, a sua inter-relação dialéctica, mas também, e ainda,
que a atividade mental deriva de uma estrutura funcional com as suas leis
específicas e o seu significado próprio. Se na natureza nada se perde e nada se cria
mas tudo se transforma, como Lavoisier o enunciou na sua lei da conservação da

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matéria, e se não há energia sem suporte material como o ensina a física quântica
de Max Planck, também Einstein, com as leis da relatividade, veio mostrar que a
dimensão temporal vem criar novas formas na expressão e na consequência das
partículas carregadas de energia deslocando-se no espaço e através do tempo.
De igual modo a psicanálise, penetrando no mais recôndito e profundo, mas
também no mais significativo, significante e real da vida de relação do homem, veio
mostrar que o afeto é o traço indelével e o motor autêntico do porquê e para que
pensar. E que da elaboração da vida afetiva nasce uma nova realidade — a
realidade psíquica.
Como aparece, se estrutura e modifica esse movimento de ligação dos seres,
o tem procurado, procura e procurará per omnia secula a psicanálise. Pois os
psicanalistas não ignoram que o conhecimento é — na expressão de um cientista
belga — uma mancha de óleo que, quanto mais cresce, maior é a fronteira com o
que a circunda, ou seja, com o desconhecido; mas também admitem, e por isso não
desalentam, que o que caracteriza o espírito humano é a ânsia de criar no sentido
de ligar cada vez mais o homem à sua essência, como o afirmou, de forma poética e
lúcida, Leonardo Coimbra em O Criacionismo.
O que é o afeto, como o tocamos, como o conhecemos, que uso dele
fazemos? Se a esta pergunta soubermos — ainda que parcelar e incompletamente
— responder, talvez possamos dar uma visão impressiva do desenvolvimento
infantil.
Saído do ambiente protegido do útero materno — no qual vivia em quase
perfeito equilíbrio homeostático o recém-nascido sofre o impacte de um sem número
de estímulos externos — luz, ruídos, diferenças térmicas, deslocações no espaço
(estímulos de que estava semi-abrigado pela barreira hídrica do líquido amniótico) e
os decorrentes do súbito estabelecimento da respiração pulmonar —e outros tantos
internos, dos quais o principal é, inicialmente, a secura da zona lábio-bucal; secura
que despertará o seu primeiro reflexo inato de tipo comportamental — isto é, dirigido
ao mundo que o cerca —, o reflexo de sucção. Será este reflexo um dos primeiros a
receber o condicionamento do meio.
Através da mamada, o recém-nascido realiza as primeiras experiências de
satisfação de uma necessidade biológica e de acalmia de um estado de tensão e
irritabilidade nervosa, que mais tarde vivenciará como sede e fome.

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Através desse gesto elementar, mas essencial à vida, da nutrição no seio ou


seu substituto, vai-se repetindo, firmando e elaborando toda a experiência de
gratificação e frustração, de relação com o mundo dos objetos privilegiados, de
organização do que chamamos a relação de objeto. A riqueza, variabilidade,
modulação e timbre destas trocas emocionais, entre o lactente e a mãe lactante,
integradas em conjuntos ou gestalts cada vez mais complexos pela maturação
paralela das capacidades sensório-motoras e de cognição, pelo acumular das
experiências vividas, e ainda pela resposta em eco e muitas vezes antecipada da
mãe — isto é, em apelo do crescimento vislumbrado e no pressentimento da
necessidade nascente (que a mãe, que investe com autenticidade e equilíbrio o seu
filho, descobre para além da percepção consciente e do significado racional da
situação que vive) — dão-nos a dimensão e mostram-nos a importância que, para
todo o sempre, esta fase evolutiva da relação com o seio vai ter no destino
individual.
A criança, quando suficiente e harmonicamente investida pela mãe, perceberá
o seu corpo e a sua vida anímica envoltos num sentimento de plenitude e bem-estar,
que constituirão a principal reserva de libido narcísica ou amor próprio; fonte da
energia erótica que a pouco e pouco será capaz de utilizar no investimento ou amor
do outro, e, quando necessário, no reinvestimento de si próprio. A libido objetal —
assim como o narcisismo secundário — não é qualquer coisa que nasce por geração
espontânea ou decorrente apenas da transformação gratuita de um instinto biológico
propulsor mas, para além da força do instinto que a alimenta, qualquer coisa que se
cria, cresce e modela na relação com o objeto.
Se a função nutritiva serve de modelo para as primeiras aquisições
relacionais, nem tudo se passa através desse comportamento singular. O contato
pele a pele, o movimento, o som, o olhar, etc., são outros tantos meios de
comunicação e intercâmbio que estruturam a relação primária mãe-filho.
A repetição da satisfação alimentar — com todo o seu maior ou menor cortejo
de sensações agradáveis: contato cutâneo, calor do corpo materno, impressões
cinestésicas e labirínticas suaves, vocalizações melódicas, movimentos do olhar e
mímica do rosto materno, etc., bem como a sensação prazenteira de sugar (suporte
sensorial ou sensitivo do reflexo inato, ou estímulo incondicional) — vai criar um
desejo de obtenção de prazer, uma necessidade, por assim dizer, de luxo, para além

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da satisfação alimentar, embora nela se apoiando, e cuja consumação se traduz


numa sensação hedónica, a que chamamos sensual, ou sexual em sentido lato.
Assim se desenha o que Freud chamou prazer e sexualidade pré-genitais.
Este lucro na satisfação da necessidade, este ganho de prazer, ficará ligado,
no seu efetivar, a toda a gestalt da situação prazenteira e, muito particularmente, à
estimulação ritmada de uma zona especificamente enervada e peculiarmente
sensível (a zona oral) pelo contato com uma coisa material que, a pouco e pouco, se
constitui como objeto privilegiado, eleito no mundo das coisas, significativo e
significante — que tem um significado particular e dá significado à existência —
passando-se de um simples sinal ou signo de valor condicional na complexidade
progressiva da conduta reflexa e da comunicação, de uma razão portanto
meramente acidental e logo convencional, para um significante de valor próprio e
pessoal, objeto da opção do desejo, carregado de propriedades reais e
fantasmáticas que lhe darão o cunho peculiar e único que permitirá posteriormente a
construção do símbolo — pessoal e cultural (do coletivo humano) — e a elaboracão
de todo o pensamento abstrato, seja ele aplicado na ciência, na arte, na poesia ou
na religião: a mãe, o seio, a pátria, o universo e o nada, as alturas e o abismo... bem
diferente da linearidade física do som metálico, a tantos ciclos por segundo, da
campainha de bronze do laboratório de Pavlov.
E assim, do desequilíbrio homeostático, condicionando uma irritabilidade
neuronal, Dor sua vez condicionante de uma atividade instintiva inscrita no
comportamento inato, passando pelo reflexo condicionado a estímulos
primariamente anódinos, chegamos à conduta dirigida pelo afeto, ele mesmo forjado
na vicissitude da relação. Satisfação, frustração; presença, ausência; qualidade do
investimento materno; doseamento e ritmo da estimulação; ambivalência, rejeição, e
outros tantos sentimentos da mãe; interferência do estranho, do não familiar — na
relação binária da díade mãe-filho, neste bloco de dois corpos e seus
prolongamentos anímicos, que se confundem num todo fusiona] — são alguns dos
ingredientes de uma serena e quente, por vezes fria e estéril, ou tumultuosa, reação,
que, no cadinho da relação primária, levará paulatinamente à constituição do sujeito
e do seu objeto.
Nesta primeira fase evolutiva não podemos, de fato, falar propriamente de
sujeito e objeto, mas tão só de precursores do Eu e do pré-objeto; na medida em

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que não existe ainda uma consciência de si próprio e uma separação do que virá a
ser o mundo exterior e, particularmente, o outro. Tudo se passa num acontecer
caótico de sensações, seguido de um deslizar caleidoscópico de percepções, das
quais se vai destacando o rosto animado da figura humana e, mais tarde, a imagem
familiar da mãe. Por esta última altura — que corresponde à angústia em face do
estranho de Spitz — podemos dizer que o objeto se constitui, seguindo Nacht e
Racamier, topologicamente (isto é, no campo do sistema percepção-consciência).
A constituição da imagem do próprio é — como se compreende pela
necessidade de integrar estímulos internos e externos — mais tardia; situa-se ao
nível do que Lacan descreveu como fase do espelho.
A formação do objeto no ponto de vista económico (isto é, com desejos
próprios: investido e percepcionado — fabricado — à imagem de si mesmo, num
processo de identificação projetiva) — o objeto portador de desejo é contemporânea
da fase anal. Daqui toda a importância de que se reveste esta fase evolutiva na
contenção do impulso, na elaboração das formações reativas — logo, na
organização do carácter — no isolamento do afeto — e assim no desenvolvimento
do pensamento operacional— e no início, pelo choque e oposição de desejos, da
consideração da diversidade do outro — o que vai ter profunda repercussão no
processo de individuação, e, portanto, na formação ulterior da identidade própria. É
também, como todos sabemos, o período da ambivalência, da luta entre agradar e
dominar o objeto; e, logo, do importante processo maturativo dos primeiros ensaios
de separação e diferenciação pulsionais.
Retomando a descrição do lado do sujeito à parte do registo ou não registo
dos estímulos externos (servindo-se do que Freud chamou a barreira «para-
estímulos», protótipo do futuro mecanismo de recusa ou denegação) ——, temos a
forma particular como, a princípio, o indivíduo vivencia o seu próprio sentir anímico e
as sensações corporais que os estímulos externos e internos provocam.
De início, equilíbrio biológico, tranquilidade e repouso equivalem a bem-estar;
desequilíbrio, a irritabilidade, tensão e mal-estar. Estas sensações elementares,
secundariamente, vão-se diferenciando em expressões de contentamento e apelo
ao contato, quando espera a satisfação, e expressões de medo elou raiva, quando
pressente o não-objeto (ou objeto persecutório) ou percepciona a ausência de

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satisfação (ou frustração) reações a aproximar do medo de aniquilamento e das


crises clásticas do adulto esquizofrénico.
A capacidade de representação (re-apresentar) — que muito precocemente
se estabelece (vejam-se os trabalhos de neurofisiologia sobre o sono rápido ou
paradoxal) começará, muito provavelmente, pela alucinação da experiência
sensível de satisfação: isto é, o lactente em estado de necessidade alucinará a
sensação de satisfação, o que lhe permitirá uma curta e momentânea tranquilização.
Posteriormente vem a realização alucinatória do desejo, que será já então uma
verdadeira representação.
Mais tarde ainda, virá o fantasma ou fantasia: a organização de uma realidade
interna, consciente e/ou inconsciente, que é uma formação do compromisso entre a
pulsão e interdição (ou a defesa, quando aquela está interiorizada). O fantasma
exprime-se por uma representação cénica: tem movimento e é sequencial.
Tocamos, entretanto, no delicado problema do consciente/inconsciente e na
controvérsia da origem e nascimento do Eu, Aqui, contrariamente à opinião de
muitos autores, é-nos mais simpática uma perspectiva teórica próxima da do nosso
mestre e amigo Pierre Luquet: no início é a consciência, é a inundação pelas
sensações; nada mais existe ao nível do que convencionamos chamar fenómeno
psíquico. A partir dessas impressões forma-se, por clivagem (do que poderíamos
chamar o Eu primordial; ou os estádios precursores da estrutura egóica, no sentido
de núcleo organizado e organizativo) e recalcamento (correspondendo ao
recalcamento primário) — melhor seria dizer-se por subtração do Eu e da
consciência forma-se, dizíamos, o traço mnésico primordial — o engrama — e os
primeiros precipitados dos conteúdos do inconsciente dinâmico, que se ligam à
pulsão (ou «representante psíquico do instinto», como Freud a definiu — no sentido
da vaga consciência, do pressentir, de uma tensão interna que impulsiona para; o
que equivale ao termo de «moção pulsional» dos autores franceses).
Evidentemente que o Ego, no sentido clássico — isto é, de instância ou
estrutura do aparelho mental encarregada da mediação entre o Id e o Super-eu e da
organização da adaptação ao real — é uma formação muito mais tardia. Na sua
forma elaborada, com funções de unidade e síntese, e a referida de mediador, é
uma formação contemporânea do período edipiano; e, ainda, sujeita a remodelações
posteriores, designadamente na adolescência.

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Falando nas funções defensivas do Eu, abordamos outro importante aspecto


da evolução da personalidade: o da forma como se estrutura o carácter; consoante o
modo, intensidade, variedade, época da história ontogénica, etc., como as defesas
inconscientes do Eu Atuaram ou foram utilizadas na luta contra os impulsos para
evitar a ansiedade. Desde o recalcamento e a formação reativa, à clivagem e
projeção, citando apenas algumas das mais conhecidas e notórias.
É do estudo da evolução da libido e da interferência da atividade defensiva
que se deduz a organização evolutiva da relação de objeto, ela mesmo cinzelando o
cunho peculiar do sentir, pensar e agir de cada um de nós. Como diz iutro dos meus
mestres e amigos — Francisco Alvim conhecer as pessoas é perscrutar a maneira
como se relacionam conosco.
A relação objetal, que é o traço cheio da evolução afetiva e humana do
indivíduo, foi magistralmente estudada por Maurice Bouvet, designadamente nas
suas duas principais linhas de consolidação — histérica e obsessiva ou seja, da
resistência pela transferência (ou a repetição macica e constante do passado
histórico — com toda a sua carga afetiva — no Atual, e com o mínimo de
recordação, que o recalcamento não permite) e da resistência à transferência .com
isolamento do afeto original, contido por contra-posição na formação reativa); ou, de
uma forma mais simples e global, os indivíduos do «muito sentir» e do «muito
pensar», de Fenichel. Modelos que polarizam duas formas, de certo modo
divergentes, de cultura: a do contato muito permissivo com as crianças, como as
civilizações africanas (de que encontramos excelentes relatos em Celeste Malpique
num estudo evolutivo das crianças negras de Angola e no livro de Parin e
Morgenthaler Les européens pensent trop), e as civilizações urbanas ocidentais,
com tendência crescente para a esterilizaçao do afeto e para o contato à distância,
com o intermediário das «luvas» e dos brinquedos; mais recentemente, com a
automatização e codificação rígida da conduta e a contradição sistemática dos
valores, começam a abundar as culturas psicotizantes e as estruturas psicóticas.
Bouvet faz ainda uma descrição viva da estrutura genital e pré-genital. A
primeira, caracterizada pela abertura, a franqueza, a modulação, a expectativa de
eco no outro, a atenção à recepção da comunicação, a capacidade de compreender
o semelhante e o diferente. E a estrutura pré-genital, marcada pela densidade do
impenetrável, pela suspeita, pela projeção, o ataque camuflado ou pela calada do

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A PSICANÁLISE E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL

silêncio, a frase dúbia, a crítica na ausência do criticado, o reparo inesperado e


insólito. As personalidades genitais tocadas pela predominância da libido objetal; as
pré-genitais, pela preponderância do investimento narcísico (no meu tempo de
escola tais personagens eram alcunhados de «sacaninhas»; ou, em português
vernáculo, mas cheio de sentido psicológico, os «punhetas»).
Deixamos para o fim um outro aspecto da evolução psíquica —o do
desenvolvimento das funções autónomas do Eu; aspecto particularmente grato à
escola estruturalista americana, de que foram pioneiros Hartmann, Kris e
Loewenstein.
Nem toda a energia libidinal — oriunda, como vigor, do afeto com que a
criança foi investida (não aceitamos, por formação epistemológica, a geração
espontânea; nem a transformacão — por artes mágicas — do instinto em libido, na
sua acepção plena de desejo carregado de afeto) —, nem toda a libido, vínhamos
dizendo, é investida em amor objetal ou amor narcísico — ou «transvestida», em
face das contingências inevitáveis da relação, em domínio ou agressividade — um
excedente de energia livre, não ligada, e circulando fora do conflito (o que
chamamos energia desconflitualizada), e mais ou menos destacada da relação
interna e histórica e da relação externa e Atual, é investida nas funções de
antecipação do futuro, que são, como se sabe, o principal substractum operacional
da adaptação ao real, e no prazer de funcionamento, no qual o pensar e o agir são
prazenteiros pelo simples fato de o indivíduo sentir e experimentar que pode existir
independentemente desta ou daquela necessidade e da prossecução deste ou
destoutro objetivo —é a famosa «liberdade», que a criança sente e que o adulto
ambiciona.
Ao falarmos do Super-Eu deixamos na reserva da nossa memória a
possibilidade de abordar a importância do mecanismo da identificação em todo o
processo evolutivo.
Gostaríamos, agora, de destacar apenas algumas das suas implicações mais
decisivas na formacão da personalidade.
Os fenómenos da identificação ao objeto verificam-se ao longo de toda a
evolução; uma descrição correta e completa seria fastidiosa.
Deixaremos, assim, de lado as identificações precoces ao bom e mau objetos
introjetados; importantes na génese da idealização e dos sentimentos persecutórios.

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Posteriormente surge a identificação à mãe ativa, que é extremamente


importante na maturação da individualidade e na ontogénese dos sentimentos de
unidade, independência e limites do Eu. Basta referir os defeitos egóicos que
observamos nas personalidades borderline; e que os autores americanos,
Bettelheim entre outros, relacionam frequentemente com a atitude das mães
deprimidas e inseguras, que, ou estão ausentes, ou se adiantam sistematicamente
nas tentativas de realização autónoma da criança.
As dificuldades de identificação sexual por negação («déni») da castração e
fixação à fantasia da mãe fálica, são também bem conhecidas na génese das
perversões e situações afins; com um rigor quase matemático para o feiticismo no
homem e a cleptomania na mulher.
Mais relevante, e representando a cúpula do processo identificativo, temos o
jogo complexo das identificações edipianas, com a assunção da bissexualidade
psíquica, o investimento harmónico do Eu corporal, a definição da identidade sexual,
a escolha definitiva do objeto e a formação do Super-Eu, assim como a consolidação
do narcisismo pela transmutação de parte do investimento objetal incestuoso e
contraditório em amor de identificação.
No período de latência, serão as identificações edipianas e seus sucedâneos
os principais trilhos condutores e o grande caudal de força motora para as
aquisições importantes no plano intelectual e social.
Na adolescência, a revivência do conflito edipiano, a maturação da
genitalidade, o assumir ou não da forma corporal sexuada, a maior ou menor
dificuldade de fazer o luto das imagens parentais, as oscilações investimento objetal
versus investimento narcísico, e os problemas com a consolidação da identidade e a
definição do papel social, vão fazer reviver e recriar velhas dificuldades, e, por
vezes, novas e dramáticas al em que o suporte de identificação que o adulto
pode fornecer vai jogar papel decisivo no destino que marcará o jovem.
No decurso evolutivo da relação de objeto, as encruzilhadas de maior conflito
e de menor autonomia individual constituirão núcleos de cristalização de
determinados padrões relacionais e do funcionamento mental — as fixações — que
deixarão o seu selo no estilo de vida futura. Além do que — pela energia
condensada — são focos de atração, orientando e contendo o movimento regressivo
quando as condições do presente, ultrapassando a capacidade integrativa do Eu,

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fazem recuar a pulsão em curso para a sua finalidade maturativa e madura, e o


pensamento prospectivo é submerso pela energia da reserva natural do passado
vivido da realidade psíquica (do que se foi e desejou ser).
Regressão libidinal e regressão do Eu, regressão temporal ou regressão
tópica, isoladas ou conjugando-se, darão ao movimento regressivo o seu carácter
particular, numa ampla diversidade de possibilidades.
Na regressão vão ser reativados padrões comportamentais do passado,
modelos ultrapassados de relação objetal e as fantasias inconscientes e conscientes
(inconscientes sobretudo) que os sustentam; mas, também, traços mnésicos que
serão injetados por fantasias de épocas ulteriores da vida (o que Jung designou por
«fantasma retroativo») — quer dizer, em que a relação arcaica é traduzida num
código e numa simbólica (numa linguagem, portanto) de uma época mais avançada.
Por exemplo, a cena primitiva, na regressão à relação oral, poderá ser exprimida ou
vivenciada num fantasma de fellatio (frequentemente duplo e simétrico, se intervém
também a fantasia da mãe fálica) e na regressão sádico-anal, por um fantasma de
coito à tergo ou anal.
Feito o périplo da evolução psíquica, que bordeja a maturação biológica,
poderíamos dizer que a evolução da libido, inscrita na relação de objeto, segue um
gradiente de deslocação do narcisismo para o amor objetal — do receber para o dar
—, ao mesmo tempo que o objeto, de meramente funcional ou veículo de satisfação
(objeto oral), se vai transformando em objeto portador de desejo e agente de
proibição (objeto anal), objeto de competição e identificação (objeto fálico) e objeto-
parceiro no destino e colaborador na criação (objeto último ou genital); o objeto,
ainda, vai adquirindo constância e continuidade afetiva, pela evolução concomitante
da univalência para a pós-ambivalência, passando pela necessária e inevitável
ambivalência.
O Eu, pelo processo das identificações sucessivas, vai-se automatizando,
progredindo em coesão, independência e força; e vai utilizando, nas suas funções
adaptativas, a energia que se destaca da libido narcísica e objetal pela redução do
conflito — energia mais ou menos desconflitualizada, e não neutra ou «aconflitual»,
(como o querem certos autores da psicologia analítica do Eu), pois que todo e
qualquer processo psíquico pressupõe sempre uma relação de objeto subjacente, e

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esta nunca é completamente isenta de conflito (sem conflito não há vida mental —é
a linha isoeléctrica).
Toda esta vicissitude e vida do afeto — afeto que é o oiro da relação e a
nobreza da vida humana — tem uma tradução plástica, numa cena, na realidade
interior do indivíduo: o fantasma consciente; e uma verdade, mais profunda e
dificilmente sondável — o drama ou romance íntimo e autêntico, que a cena parodia
e disfarça: o fantasma inconsciente. E transporta uma mensagem em duplo registo,
que procura eco no circunstante.
É nosso mister — o de analistas — decifrar essa «banda» secreta. Quando
para tanto sabemos estar em ressonância afetiva com o outro — «se a tanto nos
ajudar engenho e arte», disse Camões,
É com o amor do objeto que o sujeito se constrol— aprende a amar-se.
Sendo com o amor de si próprio que vai, por sua vez, amar o outro.
E assim nasce o narcisismo e o amor objetal. Na relação.

A Família e a Escola como contextos de desenvolvimento humano

A escola e a família compartilham funções sociais, políticas e educacionais,


na medida em que contribuem e influenciam a formação do cidadão (Rego, 2003).
Ambas são responsáveis pela transmissão e construção do conhecimento
culturalmente organizado, modificando as formas de funcionamento psicológico, de
acordo com as expectativas de cada ambiente. Portanto, a família e a escola
emergem como duas instituições fundamentais para desencadear os processos
evolutivos das pessoas, atuando como propulsoras ou inibidoras do seu crescimento
físico, intelectual, emocional e social. Na escola, os conteúdos curriculares
asseguram a instrução e apreensão de conhecimentos, havendo uma preocupação
central com o processo ensino-aprendizagem. Já, na família, os objetivos, conteúdos
e métodos se diferenciam, fomentando o processo de socialização, a proteção, as
condições básicas de sobrevivência e o desenvolvimento de seus membros no plano
social, cognitivo e afetivo.
A integração entre escola e família tem despertado, recentemente, o interesse
dos pesquisadores (Davies, Marques & Silva, 1997; Marques, 2002; Oliveira & cols.,

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2002), principalmente no que se refere às implicações deste envolvimento para o


desenvolvimento social e cognitivo e o sucesso escolar do aluno.

A Família como contexto de desenvolvimento humano

A família, presente em todas as sociedades, é um dos primeiros ambientes de


socialização do indivíduo, atuando como mediadora principal dos padrões, modelos
e influências culturais (Amazonas, Damasceno, Terto & Silva, 2003; Kreppner, 1992,
2000). É também considerada a primeira instituição social que, em conjunto com
outras, busca assegurar a continuidade e o bem-estar dos seus membros e da
coletividade, incluindo a proteção e o bem-estar da criança. A família é vista como
um sistema social responsável pela transmissão de valores, crenças, ideias e
significados que estão presentes nas sociedades (Kreppner, 2000). Ela tem,
portanto, um impacto significativo e uma forte influência no comportamento dos
indivíduos, especialmente das crianças, que aprendem as diferentes formas de
existir, de ver o mundo e construir as suas relações sociais.
Como primeira mediadora entre o homem e a cultura, a família constitui a
unidade dinâmica das relações de cunho afetivo, social e cognitivo que estão
imersas nas condições materiais, históricas e culturais de um dado grupo social. Ela
é a matriz da aprendizagem humana, com significados e práticas culturais próprias
que geram modelos de relação interpessoal e de construção individual e coletiva. Os
acontecimentos e as experiências familiares propiciam a formação de repertórios
comportamentais, de ações e resoluções de problemas com significados universais
(cuidados com a infância) e particulares (percepção da escola para uma
determinada família). Essas vivências integram a experiência coletiva e individual
que organiza, interfere e a torna uma unidade dinâmica, estruturando as formas de
subjetivação e interação social. E é por meio das interações familiares que se
concretizam as transformações nas sociedades que, por sua vez, influenciarão as
relações familiares futuras, caracterizando-se por um processo de influências
bidirecionais, entre os membros familiares e os diferentes ambientes que compõem
os sistemas sociais, dentre eles a escola, constituem fator preponderante para o
desenvolvimento da pessoa.

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Portanto, as transformações tecnológicas, sociais e econômicas favorecem as


mudanças na estrutura, organização e padrões familiares e, também, nas
expectativas e papéis de seus membros. E a constituição e a estrutura familiar, por
sua vez, afetam diretamente a elaboração do conhecimento e as formas de
interação no cotidiano das famílias (Amazonas & cols., 2003; Campos &
Francischini, 2003). Portanto, ela é a principal responsável por incorporar as
transformações sociais e intergeracionais ocorridas ao longo do tempo, com os pais
exercendo um papel preponderante na construção da pessoa, de sua personalidade
e de sua inserção no mundo social e do trabalho (Távora, 2003; Volling & Elins,
1998).
No ambiente familiar, a criança aprende a administrar e resolver os conflitos,
a controlar as emoções, a expressar os diferentes sentimentos que constituem as
relações interpessoais, a lidar com as diversidades e adversidades da vida (Wagner,
Ribeiro, Arteche & Bornholdt, 1999). Essas habilidades sociais e sua forma de
expressão, inicialmente desenvolvidas no âmbito familiar, têm repercussões em
outros ambientes com os quais a criança, o adolescente ou mesmo o adulto
interagem, acionando aspectos salutares ou provocando problemas e alterando a
saúde mental e física dos indivíduos (Del Prette & Del Prette, 2001).

A Família e suas configurações

Os membros de famílias contemporâneas têm se deparado e adaptado às


novas formas de coexistência oriundas das mudanças nas sociedades, isto é, do
conflito entre os valores antigos e o estabelecimento de novas relações (Chaves,
Cabral, Ramos, Lordelo & Mascarenhas, 2002). Como parte de um sistema social,
englobando vários subsistemas, os papéis dos seus membros são estabelecidos em
função dos estágios de desenvolvimento do indivíduo e da família vista enquanto
grupo (Dessen, 1997; Kreppner, 1992, 2000). Por exemplo, ser adolescente
crescendo em uma família ‗nuclear tradicional‘, com irmãos biológicos, é diferente de
sê-lo em uma família recasada, coabitando com padrasto e irmãos não biológicos.
Sendo composta por uma complexa e dinâmica rede de interações que
envolve aspectos cognitivos, sociais, afetivos e culturais, a família não pode ser
definida apenas pelos laços de consanguinidade, mas sim por um conjunto de

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variáveis incluindo o significado das interações e relações entre as pessoas (Petzold,


1996). A própria concepção científica dela evidencia o entrelaçamento das variáveis
biológicas, sociais, culturais e históricas que exercem grande influência nas relações
familiares, constituindo a base para as formas contemporâneas dela. Os laços de
consanguinidade, as formas legais de união, o grau de intimidade nas relações, as
formas de moradia, o compartilhamento de renda são algumas dessas variáveis que,
combinadas, permitem a identificação de 196 tipos de famílias, produto de cinco
subsistemas resultantes da concepção ecológica de micro, meso, exo, macro e
cronossistema (Petzold, 1996).
De acordo com a concepção proposta por Petzold (1996), a combinação
derivada do microssistema tem como base as relações diádicas, isto é, como os
genitores interagem, com destaque para o grau de intimidade: se o estilo de vida é
compartilhado ou separado, se esta relação é considerada heterossexual ou
homossexual, se há alteridade no poder ou não. Já aquelas influências provenientes
do mesossistema compreendem as relações com os filhos, ou seja, a sua presença
ou ausência, se eles são biológicos ou adotivos e se moram com os pais ou não.
No tocante ao exossistema do grupo familiar, esse engloba os contextos e as
redes sociais que asseguram o sentimento de pertencer a um grupo especial, social
ou cultural, tais como as relações mantidas por laços de consanguinidade ou
casamento, vínculos de dependência ou autonomia financeira ou emocional. E o
macrossistema reflete os valores e as crenças compartilhadas por um conjunto de
pessoas, por exemplo, relacionadas ao fato de a união ser civil ou não, de a relação
ser estável ou temporária, de os cônjuges habitarem ou não o mesmo espaço físico.
E, por fim, o cronossistema diz respeito às transformações da família na sociedade,
incluindo as suas diferentes configurações ao longo do tempo, dentre as quais a
família extensa e a monoparental.
O próprio conceito de família e a configuração dela têm evoluído para retratar
as relações que se estabelecem na sociedade atual. Não existe uma configuração
familiar ideal, porque são inúmeras as combinações e formas de interação entre os
indivíduos que constituem os diferentes tipos de famílias contemporâneas (Stratton,
2003): nuclear tradicional, recasadas, monoparentais, homossexuais, dentre outras
combinações. Os padrões familiares vão se transformando e reabsorvendo as
mudanças psicológicas, sociais, políticas, econômicas e culturais, o que requer

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adaptações e acomodações às realidades enfrentadas (Wagner, Halpern &


Bornholdt, 1999). E, os arranjos familiares distintos que vão surgindo, por sua vez,
provocam transformações nas relações familiares, nos papéis desempenhados pelos
seus membros, nos valores, nas funções intergeracionais, nas expectativas e nos
processos de desenvolvimento do indivíduo.
Portanto, a família, hoje, não é mais vista como um sistema privado de
relações; ao contrário, as atividades individuais e coletivas estão intimamente
ligadas e se influenciam mutuamente. O que ocorre na família e na sociedade é
sintetizado, elaborado e modificado provocando a evolução e atualização dela e de
sua história na sociedade (Kreppner, 1992). A família também é a responsável pela
transmissão de valores culturais de uma geração para outra. Essa transmissão de
conhecimentos e significados possibilita o compartilhar de regras, valores, sonhos,
perspectivas e padrões de relacionamentos, bem como a valorização do potencial
dos seus membros e de suas habilidades em acumular, ampliar e diversificar as
experiências. De acordo com Kreppner (2000), a família e suas redes de interações
asseguram a continuidade biológica, as tradições, os modelos de vida, além dos
significados culturais que são atualizados e resgatados, cronologicamente.
Ao desempenhar suas funções, dentre as quais a socialização da criança, a
família estabelece uma estrutura mínima de atividades e relações em que os papéis
de mãe, pai, filho, irmão, esposa, marido, e outros são evidenciados. Todavia, a
formação dos vínculos afetivos não é imutável, pelo contrário, ela vai se
diferenciando e progredindo mediante as modificações do próprio desenvolvimento
da pessoa, as demandas sociais e as transformações sofridas pelo grupo sócio-
cultural (Kreppner, 2000). De acordo com este autor, além de se adaptar às
mudanças decorrentes do crescimento dos seus membros, a família ainda tem a
tarefa de manter o bem-estar psicológico de cada um, buscando sempre nova
estabilidade nas relações familiares.
Neste processo contínuo de busca por estabilidade, as famílias contam ou
não com o suporte de uma rede social de apoio, que permite a elas superarem (ou
não) as dificuldades decorrentes de transições do desenvolvimento (Dessen & Braz,
2000). Independente das que ocorrem no âmbito familiar, elas são produtoras de
mudanças que podem funcionar como aspectos propulsores ou inibidores do
desenvolvimento, influenciando, direta ou indiretamente, os modos de criação dos

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filhos. No entanto, a principal rede de apoio da família é oriunda das próprias


interações entre seus membros. Contatos negativos, conflitos, rompimentos e
insatisfações podem gerar problemas futuros, particularmente nas crianças. Por
outro lado, relações satisfatórias e felizes entre marido e esposa constituem fonte de
apoio para ambos os cônjuges, sobretudo para a mulher (Dessen & Braz, 2005).

Vínculos familiares e redes de apoio

Os laços afetivos formados dentro da família, particularmente entre pais e


filhos, podem ser aspectos desencadeadores de um desenvolvimento saudável e de
padrões de interação positivos que possibilitam o ajustamento do indivíduo aos
diferentes ambientes de que participa. Por exemplo, o apoio parental, em nível
cognitivo, emocional e social, permite à criança desenvolver repertórios saudáveis
para enfrentar as situações cotidianas (Eisenberg & cols., 1999). Por outro lado,
esses laços afetivos podem dificultar o desenvolvimento, provocando problemas de
ajustamento social (Booth, Rubin & Rose-Krasnor, 1998). Volling e Elins (1998)
mostraram que o estresse parental, a insatisfação familiar e a incongruência nas
atitudes dos pais em relação à criança geram problemas de ajustamento e
dificuldades de interação social.
As figuras parentais exercem grande influência na construção dos vínculos
afetivos, da auto-estima, autoconceito e, também, constroem modelos de relações
que são transferidos para outros contextos e momentos de interação social (Volling
& Elins, 1998). Por exemplo, pais punitivos e coercitivos podem provocar em seus
filhos comportamentos de insegurança, dificuldades de estabelecer e manter
vínculos com outras crianças, além de problemas de risco social na escola e na vida
adulta. Booth e cols (1998) investigaram o apoio social e emocional de mães e de
outras pessoas envolvidas com a criança e suas repercussões na adolescência e
vida adulta. Eles observaram que a qualidade da relação mãe-criança é transferida,
posteriormente, para outras relações interpessoais, na escola e no grupo de amigos.
Paralelamente, identificaram que a qualidade da relação com os pares e amigos
pode compensar a baixa qualidade de interação com as mães.
Os laços afetivos asseguram o apoio psicológico e social entre os membros
familiares, ajudando no enfrentamento do estresse provocado por dificuldades do

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cotidiano (Oliveira & Bastos, 2000). E os padrões de relações familiares relacionam-


se intrinsecamente a uma rede de apoio que possa ser ativada, em momentos
críticos, fomentando o sentimento de pertença, a busca de soluções e atividades
compartilhadas.
No entanto, nem sempre as famílias constituem uma rede de apoio funcional
e satisfatória ou, mesmo, melhor que outras. Dell‘Aglio e Hutz (2002) compararam
estratégias de enfrentamento entre crianças institucionalizadas e as que viviam com
suas famílias e não encontraram diferenças nas de busca de apoio social e ação
agressiva. Segundo os autores, muitas vezes, as instituições têm condições físicas,
materiais e organizacionais e contam com profissionais e rotinas que estabelecem
uma rede social de apoio forte e adequada. Portanto, o desenvolvimento de
estratégias de enfrentamento apropriadas é influenciado pela qualidade das relações
afetivas, coesão, segurança, ausência de discórdia e organização, quer na família
ou na instituição. Tais aspectos constituem importantes fatores de proteção para o
indivíduo, favorecendo o desenvolvimento de habilidades e competências sociais e,
consequentemente, sua capacidade de adaptação às situações cotidianas (Chaves,
Guirra, Borrione & Simões, 2003).
Diante dos problemas e desafios enfrentados pela família, e sem uma rede de
apoio social que promova a superação do estresse, a resolução de conflitos e o
restabelecimento de uma dinâmica familiar saudável, as famílias podem desenvolver
padrões de relacionamento disfuncionais, tais como: maus tratos à criança, violência
intrafamiliar, abuso de substâncias, conflitos. Nesses casos, as instituições públicas
ou privadas, incluindo a escola, têm um papel importante oferecendo apoio, direta ou
indiretamente, por meio de programas de educação familiar (Dessen & Pereira-Silva,
2004) ou de elaboração de políticas públicas para a promoção da saúde. Estas
devem considerar os fatores de estresse e estimular a formação de redes de apoio
social, seja na própria comunidade ou nos centros de atendimento à população, seja
na escola, já que esta ocupa um lugar de destaque nas sociedades
contemporâneas.

A escola como contexto de desenvolvimento humano

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A escola constitui um contexto diversificado de desenvolvimento e


aprendizagem, isto é, um local que reúne diversidade de conhecimentos, atividades,
regras e valores e que é permeado por conflitos, problemas e diferenças (Mahoney,
2002). É nesse espaço físico, psicológico, social e cultural que os indivíduos
processam o seu desenvolvimento global, mediante as atividades programadas e
realizadas em sala de aula e fora dela (Rego, 2003). O sistema escolar, além de
envolver uma gama de pessoas, com características diferenciadas, inclui um número
significativo de interações contínuas e complexas, em função dos estágios de
desenvolvimento do aluno. Trata-se de um ambiente multicultural que abrange
também a construção de laços afetivos e preparo para inserção na sociedade
(Oliveira, 2000).

A escola e sua função social

A escola emerge, portanto, como uma instituição fundamental para o


indivíduo e sua constituição, assim como para a evolução da sociedade e da
humanidade (Davies & cols., 1997; Rego, 2003). Como um microssistema da
sociedade, ela não apenas reflete as transformações atuais como também tem que
lidar com as diferentes demandas do mundo globalizado. Uma de suas tarefas mais
importantes, embora difícil de ser implementada, é preparar tanto alunos como
professores e pais para viverem e superarem as dificuldades em um mundo de
mudanças rápidas e de conflitos interpessoais, contribuindo para o processo de
desenvolvimento do indivíduo.
Coerente com essa concepção, à escola compete propiciar recursos
psicológicos para a evolução intelectual, social e cultural do homem (Hedeggard,
2002; Rego, 2003). Ao desenvolver, por meio de atividades sistemáticas, a
articulação dos conhecimentos culturalmente organizados, ela possibilita a
apropriação da experiência acumulada e as formas de pensar, agir e interagir no
mundo, oriundas dessas experiências. Concomitantemente, ela proporciona o
emprego da linguagem simbólica, a apreensão dos conteúdos acadêmicos e
compreensão dos mecanismos envolvidos no funcionamento mental, fundamentais
ao processo de aprendizagem. Assim, a atualização do conhecimento cultural e sua

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organização constante são premissas importantes para entender o papel dela e sua
relação com a pessoa em desenvolvimento.
A escola é uma instituição social com objetivos e metas determinadas, que
emprega e reelabora os conhecimentos socialmente produzidos, com o intuito de
promover a aprendizagem e efetivar o desenvolvimento das funções psicológicas
superiores: memória seletiva, criatividade, associação de ideias, organização e
sequência de conhecimentos, dentre outras (Oliveira, 2000). Ela é um espaço em
que o indivíduo tende a funcionar de maneira preditiva, pois, em sala de aula, há
momentos e atividades que são estruturados com objetivos programados e outros
mais informais que se estabelecem na interação da pessoa com seu ambiente
social. Por exemplo, na escola, o aluno tem rotinas como hora do intervalo e do
lanche, em que os objetivos educacionais se dirigem à convivência em grupo e à
inserção na coletividade. No tocante às atividades acadêmicas, espera-se, por
exemplo, que os alunos dominem a interpretação, as regras fundamentais para
expressão oral e escrita e realizem cálculos de forma independente.
O currículo escolar estabelece objetivos e atividades, conforme a série dos
alunos, facilitando o acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem nas
diferentes faixas etárias. Desde o maternal até a educação de adultos, a escola tem
peculiaridades em relação à sua estrutura física, à organização dos conteúdos e
metodologias de ensino, respeitando e considerando a evolução do aprendiz, bem
como articulando os conhecimentos científicos às experiências dos alunos. Por
exemplo, no ensino médio, espera-se que o aluno apresente um raciocínio
hipotético-dedutivo, demonstre autonomia nos estudos e pesquisas, enquanto que,
no fundamental, os objetivos se dirigem ao domínio das operações complexas,
empregando materiais concretos e experiências advindas do contexto familiar do
aluno (Ministério da Educação, Secretaria de Educação Fundamental, 2001).
Marques (2001) destaca que a função da escola no século XXI tem o objetivo
precípuo de estimular o potencial do aluno, levando em consideração as diferenças
socioculturais em prol da aquisição do seu conhecimento e desenvolvimento global.
Sob este prisma, ele aponta três objetivos que são comuns e devem ser buscados
pelas escolas modernas: (a) estimular e fomentar o desenvolvimento em níveis
físico, afetivo, moral, cognitivo, de personalidade; (b) desenvolver a consciência
cidadã e a capacidade de intervenção no âmbito social; (c) promover uma

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aprendizagem de forma contínua, propiciando, ao aluno, formas diversificadas de


aprender e condições de inserção no mercado de trabalho. Isto implica,
necessariamente, em promover atividades ligadas aos domínios afetivo, motor,
social e cognitivo, de forma integrada à trajetória de vida da pessoa.
Marques (2001) enfatiza também a importância das tarefas desempenhadas
em sala de aula que favorecem as formas superiores de pensar e aprender, tais
como memória seletiva, criatividade, raciocínio abstrato, pensamento lógico, tendo o
professor uma função preponderante nesta mediação. Para Wallon, a ideia da
mediação do conhecimento realizada pelo professor, por meio de materiais
concretos, padrões e modelos de aprendizagem e comportamento, permitem que, na
sala de aula, se incorpore uma ação coletiva que se estrutura e funciona graças ao
uso de estratégias específicas, como o trabalho em grupo e aos pares e a realização
de atividades recreativas, competitivas e jogos (Almeida, 2000).
No entanto, o uso de estratégias deve ser adaptado às realidades distintas
dos alunos e professores, às demandas da comunidade e aos recursos disponíveis,
levando em conta as condições e peculiaridades de cada época ou momento
histórico. Neste sentido, é importante identificar as condições evolutivas dos
segmentos: professores, alunos, pais e comunidade, em geral, para o planejamento
de atividades no âmbito da escola.
Em síntese, a escola é uma instituição em que se priorizam as atividades
educativas formais, sendo identificada como um espaço de desenvolvimento e
aprendizagem e o currículo, no seu sentido mais amplo, deve envolver todas as
experiências realizadas nesse contexto. Isto significa considerar os padrões
relacionais, aspectos culturais, cognitivos, afetivos, sociais e históricos que estão
presentes nas interações e relações entre os diferentes segmentos. Dessa forma, os
conhecimentos oriundos da vivência familiar podem ser empregados como
mediadores para a construção dos conhecimentos científicos trabalhados na escola.

Compreendendo as relações família-escola

Para compreender os processos de desenvolvimento e seus impactos na


pessoa, é preciso focalizar tanto o contexto familiar quanto o escolar e suas inter-
relações (Polonia & Dessen, 2005). Por exemplo, o planejamento de pesquisa sobre

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violência na adolescência deve incluir tanto as variáveis familiares, que podem


contribuir significativamente para a manutenção de comportamentos anti-sociais na
escola, quanto as relacionadas diretamente com a escola, como o baixo
desempenho acadêmico, que, aliadas aos fatores interpessoais, acentuam este
problema (Ferreira & Marturano, 2002; Oliveira & cols., 2002).
Outros exemplos bastante conhecidos são a evasão e repetência escolar.
Sabe-se que a estrutura familiar tem um forte impacto na permanência do aluno na
escola, podendo evitar ou intensificar a evasão e a repetência escolar. Dentre os
aspectos que contribuem para isto estão as características individuais, a ausência de
hábitos de estudo, a falta às aulas e os problemas de comportamento (Fitzpatrick &
Yoles, 1992). Em todos estes fatores, a família exerce uma poderosa influência.
Embora um sistema escolar transformador possa reverter esses aspectos negativos,
faz-se necessário que a escola conte com a colaboração de outros contextos que
influenciam significativamente a aprendizagem formal do aluno, incluindo a família
(Fantuzzo, Tighe & Childs, 2000).
É importante ressaltar que a família e a escola são ambientes de
desenvolvimento e aprendizagem humana que podem funcionar como propulsores
ou inibidores dele. Estudar as relações em cada contexto e entre eles constitui fonte
importante de informação, na medida em que permite identificar aspectos ou
condições que geram conflitos e ruídos nas comunicações e, consequentemente,
nos padrões de colaboração entre eles. Nesta direção, é importante observar como
a escola e, especificamente, os professores empregam as experiências que os
alunos têm em casa. Face à leitura, é muito importante que a escola conheça e
saiba como utilizar as experiências de casa para gerir as competências
imprescindíveis ao letramento. A interpretação de textos ou a escrita podem ser
estimuladas pelos conhecimentos oriundos de outros contextos, servindo de auxílio
à aprendizagem formal.
As pesquisas têm demonstrado que os pais estão constantemente
preocupados e envolvidos com as atividades escolares dos filhos e que dirigem a
sua atenção à avaliação do aproveitamento escolar, sendo isto independente do
nível socioeconômico ou escolaridade (Polonia & Dessen, 2005). Os pais
supervisionam e acompanham não somente a realização das atividades escolares,
mas também adotam, em suas residências, estratégias voltadas à disciplina e ao

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controle de atividades lúdicas. Estas ações permitem a eles analisarem,


identificarem e realizarem intervenções nos processos de desenvolvimento e
aprendizagem dos filhos (Sanders & Epstein, 1998). Ainda, neste aspecto, Epstein
(citado por Marques, 2002) destaca o envolvimento dos pais em atividades, em
casa, que afetam a aprendizagem e o aproveitamento escolar. Este envolvimento
ocorre sob diferentes formas de acompanhamento das tarefas (monitorar a sua
realização), ou, ainda, em orientações sistemáticas do comportamento social e
engajamento dos filhos nas atividades da escola, realizadas por iniciativa própria ou
por sugestão da escola.
Os laços afetivos, estruturados e consolidados tanto na escola como na
família permitem que os indivíduos lidem com conflitos, aproximações e situações
oriundas destes vínculos, aprendendo a resolver os problemas de maneira conjunta
ou separada. Nesse processo, os estágios diferenciados de desenvolvimento,
característicos dos membros da família e também dos segmentos distintos da
escola, constituem fatores essenciais na direção de provocar mudanças nos papéis
da pessoa em desenvolvimento, com repercussões diretas na sua experiência
acadêmica e psicológica; dependendo do nível de desenvolvimento e demandas do
contexto, é possibilitado à criança, quando entra na escola, um maior grau de
autonomia e independência comparado ao que tinha em casa, o que amplia seu
repertório social e círculo de relacionamento. Neste caso, a escola oferece uma
oportunidade de exercitar um novo papel que propiciará mecanismos importantes
para o seu desenvolvimento cognitivo, social, físico e afetivo, distintos do ambiente
familiar.
Um outro aspecto a ser destacado nas pesquisas e programas é a formação
das redes sociais de apoio. Deve-se, então, caracterizar as dimensões distintas de
envolvimento, seja na família ou na escola, e descrever como e quando essa rede
de relações e apoio à pessoa em desenvolvimento pode ser utilizada. Na família, há
o reconhecimento do papel dos pais, irmãos e outras pessoas que convivem com a
criança ou adolescente e sua contribuição para o desenvolvimento geral e
acadêmico. Na escola, destacam-se os professores e os pares, uma vez que estes
se envolvem cotidianamente em atividades programadas e realizam intervenções
importantes que afetam o processo de ensino e aprendizagem. Considerando que
as redes de apoio são constituídas pela diversidade de interações entre as pessoas,

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são estas que permitem a construção de repertórios para lidar com as adversidades
e problemas surgidos, possibilitando sua superação com sucesso (Ferreira &
Marturano, 2002).
No tocante à colaboração escola-família, é importante enfatizar a necessidade
de estruturar atividades apropriadas à série do aluno, particularmente em se tratando
da participação dos pais no seu acompanhamento. Segundo Desland e Bertrand
(2005), a necessidade ou não de supervisão aos filhos depende das demandas
implícitas ou explícitas deles que, por sua vez, estão relacionadas a fatores como
idade, independência, autonomia e desempenho como aluno. Esses autores vão
além, afirmando que, ao participarem, os pais se predispõem e sentem referendados
pelos filhos, acionando recursos que envolvem a ajuda e o acompanhamento;
quando os filhos mostram necessidade de trabalharem sozinhos, os pais se afastam,
reduzindo seu nível de supervisão e auxílio às tarefas escolares. Esta é uma
questão polêmica que requer investigações mais detalhadas, considerando a série
do aluno, as competências exigidas pela escola e a necessidade de autonomia e
independência do aluno.
Apesar dos esforços, tanto da escola quanto da família, em promoverem
ações de continuidade, há barreiras que geram descontinuidade e conflitos na
integração entre estes dois microssistemas. Uma das dificuldades na integração
família-escola é que esta ainda não comporta, em seus espaços acadêmicos, sociais
e de interação, os diferentes segmentos da comunidade e, por isso, não possibilita
uma distribuição equitativa das competências e o compartilhar das
responsabilidades. Carneiro (2003) afirma que a mudança deste paradigma depende
de uma transformação na cultura vigente da escola e que o projeto político-
pedagógico poderia ser um dos meios para promover esta inserção. Ainda, as
formas de avaliação adotadas, bem como as estratégias para superar as
dificuldades presentes no processo ensino-aprendizagem, de maneira a incluir a
família, exigem que as escolas insiram essa discussão no projeto pedagógico, como
forma de assegurar a sua compreensão e efetivar a participação dos pais que é
ainda um ponto crítico na esfera educacional. Com isso, pode-se romper o
estereótipo presente da preocupação centrada apenas nos resultados acadêmicos
(Kratochwill, McDonald, Levin, Bear-Tibbetts & Demaray, 2004).

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Além disso, o conhecimento dos valores e práticas educativas que são


adotadas em casa, e que se refletem no âmbito escolar e vice-versa, são
imprescindíveis para manter a continuidade das ações entre a família e a escola
(Keller-Laine, 1998). Sendo assim, as escolas devem procurar inserir no seu projeto
pedagógico um espaço para valorizar, reconhecer e trabalhar as práticas educativas
familiares e utilizá-las como recurso importante nos processos de aprendizagem dos
alunos. Mas, a colaboração entre esses contextos deve levar em consideração as
diferenças culturais, a formação para cidadania e a valorização de ações e de
decisões coletivas (Kratochwill & cols., 2004; Marques, 2002). As educativas
verificadas no âmbito das relações interpessoais e nos resultados acadêmicos dos
alunos, têm reflexos na participação efetiva e na integração escola-família,
assegurando uma continuidade entre os dois segmentos.
Portanto, as escolas deveriam investir no fortalecimento das associações de
pais e mestres, no conselho escolar, dentre outros espaços de participação, de
modo a propiciar a articulação da família com a comunidade, estabelecendo
relações mais próximas. A adoção de estratégias que permitam aos pais
acompanharem as atividades curriculares da escola, beneficiam tanto a escola
quanto a família. As investigações de Keller-Laine (1998) e de Sanders e Epstein
(1998) enfatizam que é necessário planejar e implementar ações que assegurem as
parcerias entre estes dois ambientes, visando a busca de objetivos comuns e de
soluções para os desafios enfrentados pela sociedade e pela comunidade escolar.

Considerações finais: desafios e perspectivas

A família não é o único contexto em que a criança tem oportunidade de


experienciar e ampliar seu repertório como sujeito de aprendizagem e
desenvolvimento. A escola também tem sua parcela de contribuição no
desenvolvimento do indivíduo, mais especificamente na aquisição do saber
culturalmente organizado em suas distintas áreas de conhecimento. Como destaca
Szymanski (2001), a ação educativa da escola e da família apresenta nuances
distintas quanto aos objetivos, conteúdos, métodos e questões interligadas à
afetividade, bem como quanto às interações e contextos diversificados.

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Na escola, as crianças investem seu tempo e se envolvem em atividades


diferenciadas ligadas às tarefas formais (pesquisa, leitura dirigida) e aos informais de
aprendizagem (hora do recreio, excursões, atividades de lazer). Contudo, neste
ambiente, o atendimento às necessidades cognitivas, psicológicas, sociais e
culturais é realizado de maneira mais estruturada e pedagógica do que no de casa.
As práticas educativas escolares têm também um cunho eminentemente social, uma
vez que permitem a ampliação e inserção dos indivíduos como cidadãos e
protagonistas da história e da sociedade. A educação em seu sentido amplo torna-
se um instrumento importantíssimo para enfrentar os desafios do mundo globalizado
e tecnológico.
Apesar da complexidade e dos desafios que a escola enfrenta, não se pode
deixar de reconhecer que os seus recursos são indispensáveis para a formação
global do indivíduo. Conhecendo a escola e suas funções, devem-se acionar fontes
promotoras de saúde tais como as redes sociais com a comunidade escolar, os
profissionais da escola - psicólogos, pedagogos e orientadores educacionais, que
são gabaritados (ou deveriam ser) para realizar intervenções coletivas. É nesse
espaço que as reflexões sobre os processos de ensino-aprendizagem e as
dificuldades que surgem em sala ou em casa são realizadas (Rocha, Marcelo &
Pereira, 2002; Soares, Ávila & Salvetti, 2000).
Entretanto, como sublinham Soares e cols (2000), apesar de a escola
desenvolver aspectos inerentes à socialização das pessoas e ser responsável pela
construção, elaboração e difusão do conhecimento, ela vem passando por crises
vindas do cotidiano, que geram conflitos e descontinuidades como a violência, o
insucesso escolar, a exclusão, a evasão e a falta de apoio da comunidade e da
família, entre outros. Neste caso, o cenário político passa a exercer uma influência
preponderante para a solução das crises, que extrapolam o cotidiano das escolas.
Para superar os desafios que enfrentam, hoje, uma das alternativas é promover a
colaboração entre escola e família (Polonia & Dessen, 2005), tarefa complexa que
tem despertado o interesse de vários pesquisadores.
A família e a escola constituem os dois principais ambientes de
desenvolvimento humano nas sociedades ocidentais contemporâneas. Assim, é
fundamental que sejam implementadas políticas que assegurem a aproximação
entre os dois contextos, de maneira a reconhecer suas peculiaridades e também

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similaridades, sobretudo no tocante aos processos de desenvolvimento e


aprendizagem, não só em relação ao aluno, mas também a todas as pessoas
envolvidas.

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