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Vitória da Conquista
2017
Naiade Seixas Bianchi
Vitória da Conquista
2017
RESUMO: A presente proposta busca entender as maneiras como a construção da identidade
lésbica se relaciona com as significações formuladas por meio da linguagem cinematográfica.
Será feito um estudo de recepção, a partir da perspectiva das mediações, de filmes nacionais
com protagonistas lésbicas por meio de um grupo focal com mulheres lésbicas. Este projeto
procura dar voz a um tema pouco debatido na mídia, arte, militância feminista e LGBT e
produções acadêmicas. Neste sentido, pode trazer contribuições para o desenvolvimento de
estudos sócio-culturais e fortalecer o ativismo a favor de demandas lésbicas.
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 5
2 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................... 6
4 OBJETIVOS............................................................................................................. 8
7 CRONOGRAMA ................................................................................................... 18
REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 19
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1 INTRODUÇÃO
2 JUSTIFICATIVA
feminista, considera o papel político da lesbiandade bem como a adoção desses termos como
uma “crítica em atos e um questionamento teórico ao sistema heterossexual de organização
social” e uma importante ruptura epistemológica (FALQUET, 2004, p. 8).
Os Estudos culturais em comunicação têm demonstrado um importante avanço ao
repensar os meios como um processo sociocultural que constitui as práticas sociais e estrutura
a sociedade a partir da ação de todos os sujeitos envolvidos na construção do sentido, a partir
da teoria das mediações de Martin-Barbero (1997). Discussões sobre a construção da
identidade, hegemonia e ideologia têm constituído o eixo central desta perspectiva que, na
visão de Ecostesguy (2001), desafiou a centralidade da classe-social na interpretação dos
processos hegemônicos e introduziu a categoria gênero. No entanto, a mulher tem sido apenas
um indicador entre tantos outros, como índice socioeconômico e faixa-etária, nos estudos de
recepção latino-americanos. As abordagens não têm considerado o sentido estrutural da
condição feminina na articulação social; o que parece não haver uma inflexão feminista nestas
pesquisas.
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3 PROBLEMA DE PESQUISA
Todas nós somos atravessadas por diversos processos culturais que influenciam na
construção da própria identidade e construção de significação do mundo. Estes processos são
vivenciados nas relações sociais, como família, igreja, escola, trabalho, meios de
comunicação, de acordo com as experiências individuais e coletivas, contexto histórico e
sociocultural em que estamos inseridas. Os meios de comunicação, incluindo o cinema,
contêm a visão de sua realizadora, que também é atravessada por estes processos culturais.
Desta maneira, são criadas influências e significações que não são fixas e se ressignificam
mutuamente, o que contribui, consequentemente, na construção das identidades e práticas
sociais. Portanto, a questão que orienta este projeto é: De que maneira a construção da
identidade lésbica se relaciona com as significações formuladas por meio da linguagem
cinematográfica?
4 OBJETIVOS
4.1 Geral
Analisar as maneiras como a construção da identidade lésbica se relaciona com as
significações formuladas por meio da linguagem cinematográfica.
4.2 Específicos
- Analisar os sentidos apreendidos pelas lésbicas participantes da pesquisa em relação
aos filmes apresentados;
- Analisar em que medida o grupo se identifica com a construção das personagens
apresentadas em seu contexto sócio-cultural;
- Estabelecer relações entre os sentidos formulados pelas participantes em relação aos
filmes assistidos e a criação da própria identidade.
- Apontar e avaliar diferenças e semelhanças apresentadas entre os dois filmes em
analogia com seu contexto histórico;
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5 MARCO TEÓRICO-CONCEITUAL
chamados de socialização. Na visão de Duarte (2008), o cinema como produção cultural não
apenas inventa histórias, mas também produz sentidos, cria e transforma significados e
realidades. As representações fílmicas são produzidas e produtoras de práticas sociais.
Os Estudos Culturais em Comunicação, por meio da intercessão com diversas
disciplinas, como a sociologia e antropologia, possibilitaram repensar os meios como um
processo sociocultural que constitui as práticas sociais e estrutura a sociedade a partir da ação
de todos os sujeitos envolvidos na construção do sentido. Muda-se o foco da pesquisa das
tecnologias da comunicação para as práticas socioculturais e a constituição das variadas
identidades, cada vez mais mediadas por estas tecnologias. Se trata de um deslocamento do
estudo isolado dos meios de comunicação para sua inclusão na cultura, articulando o contexto
histórico e sócio-cultural de inserção do sujeito; o que permite observar as dimensões do
conflito social de formação de novos sujeitos e modos de resistência, baseado em diferenças,
entre outras, de sexo (ESCOSTEGUY, 2001).
Na perspectiva das Mediações, Martin-Barbero (1997) propõe o uso social dos meios
para entender a relação entre meios de comunicação e receptores a partir das articulações
entre práticas de comunicação e movimentos sociais tendo em vista temporalidade e as
múltiplas matrizes culturais da América Latina. A comunicação assume o papel de sentido e o
receptor, produtor de sentidos, os reelabora e ressignifica, de acordo com sua experiência
cultural. Para o autor é necessário, a partir da recepção, rever o processo inteiro de
comunicação e prestar atenção nos movimentos dessas articulações. O uso social dos meios é,
também, uma forma de romper com a razão dualista das concepções de comunicação
anteriores, que centravam sua atenção no uso técnico dos meios de comunicação, o que
fragmenta e reduz o processo de comunicação ao de transmissão de uma informação.
A identidade constitui, hoje, eixo central nos Estudos Culturais pelas reflexões em
torno de como é constituída; em especial a partir da modernidade, quando passou a ser
encarada como algo construído e suscetível a mudanças, atravessada pela forma como o
sujeito está inserido no mundo, suas relações sociais, o papel da globalização, dos meios de
comunicação na formação e proliferação de novas identidades (ESCOSTEGUY, 2001). O
estudo centrado na particularidade latino-americana, principalmente por meio de Martin-
Barbero (1997, p. 16), propõe o conceito de mestiçagem não somente como fenômeno racial,
mas trama de “modernidade e descontinuidades culturais, deformações sociais e estruturas de
sentimento, de memórias e imaginários” que misturam diversas identidades, o que inclui,
fundamentalmente, pensar as diferenças sociais, exclusão e marginalização.
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colocada a prova como se fosse se mostrar uma fraude a qualquer momento; então é
convidada a ocupar um lugar na escala que inclui a dicotomia feminino/passivo (a bela) e
masculino/ativo (a fera), o que a torna mais compreensível dentro do modelo heteropatriarcal
(PORTINARI, 1989).
Na compreensão de Ferraz (2006, p. 128) “os discursos constituem práticas sociais
determinadas pelo contexto sócio-histórico e que influem, de forma complexa, na constituição
da identidade do sujeito”, que se produz e se modifica por meio da interação no mundo social.
Os meios de comunicação amplificaram a velocidade dessas mudanças, por meio da
introdução da técnica, criando novas formas de interação e novos tipos de relações sociais.
Portanto, não se pode tomar o cinema apenas como conteúdo ou representações, mas também
como discurso, que cria significados e designa o lugar do ser e das práticas sociais que
reproduz. Ao apresentar conteúdos sobre sexualidade, reforça padrões de comportamento e
relações em determinado contexto histórico e social. Nesta dimensão as sexualidades não
normativas usualmente não são atendidas de maneira adequada ou suficiente ou são
ignoradas, o que contribui para reforçar papéis deterministas a elas.
Kaplan (2002, p. 212) observa que a maneira como a mulher é geralmente idealizada
nos dramas convencionais de Hollywood surge do olhar masculino e até mesmo o próprio
olhar das mulheres sobre mulheres está impregnado com a visão patriarcal. Os filmes
comerciais frequentemente possuem o que a autora chama de hierarquia do discurso, que
privilegia o discurso masculino em detrimento do feminino. Na visão da autora, os filmes
estruturaram sua linguagem para satisfazer as necessidades da família nuclear do século XIX
e estão profundamente comprometidos com a diferença sexual demarcada. Este tipo de olhar
tem mudado com o passar do tempo e com a expansão do discurso feminista, possibilitando
uma mudança do discurso sobre as mulheres e a inserção da subjetividade feminina nos
filmes. Porém, mesmo com as evoluções ocorridas nas produções cinematográficas e aumento
da perspectiva feminina, as produções continuam, essencialmente, heterocentradas.
Na compreensão de Louro (2008, p. 82) os filmes exercem “pedagogias da
sexualidade” sobre sua plateia. A sexualidade é um dado histórico, uma construção social; os
significados atribuídos às identidades e práticas sociais são disputados historicamente e
representados nos filmes como legítimos. Mesmo que estas construções não sejam fixas seus
vestígios persistem e, repetidas por outros processos culturais, “podem assumir significativos
efeitos de verdade”.
A predominância de valores patriarcais pode ser observado em filmes de temática
lésbica produzidos no Brasil em especial na década de 80, em que as pornochanchadas
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elemento chave nos estudos de recepção ainda é provisório e fragmentado; o que persiste
ainda hoje, visto que não foram encontradas pesquisas bibliográficas recentes com esta
mesma abordagem.
Incorporar a categoria gênero nos estudos de recepção não significa, para Escosteguy
(2002), que tenham uma perspectiva feminista; algumas das pesquisas levantadas adotaram
esta categoria apenas para diferenciar sexo como variação sócio-demográfica. Diferente de
outras trajetórias dos estudos culturais em comunicação, os estudos de recepção latino-
americanos não possuem um desenvolvimento profícuo focado no feminismo. Em um
levantamento de teses e dissertações publicadas no período de 1992 a 2002 foram encontradas
apenas 17 pesquisas que buscassem compreender a mulher, relacionando à mídia audiovisual
(ESCOSTEGUY, 2008).
O levantamento realizado por Rodrigues (2014) constatou que a produção acadêmica
sobre homossexualidade também ainda é tímida, foram encontrados apenas 34 trabalhos que
abordassem o tema de maneira direta e 17 tangencialmente. De acordo com a análise do autor,
até 1996 não existiam pesquisas sobre o tema; o período em que foram encontradas em maior
número foi entre 2006 e 2008, com o total de 15 pesquisas.
No levantamento realizado a fim de compor este projeto foi verificado:
Em uma análise mais rigorosa verifica-se que mesmo na busca das palavras-chave
diretamente relacionadas ao tema “lésbicas” e “cinema”, embora haja algum retorno, muitos
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dos estudos adotam a temática homossexual genericamente, sem um viés específico para
lésbicas.
A dissertação de mestrado intitulada ‘A personagem homossexual no cinema
brasileiro’ (MORENO, 2001) faz um levantamento das produções cinematográficas realizadas
desde meados da década de 1960 até 1994/1995. Somente foram encontrados poucos artigos
sobre lesbiandade e cinema, como a análise de alguns filmes, a exemplo ‘Azul É A Cor Mais
Quente: discursos sobre o corpo, gêneros e sexualidades em fronteiras’ (DIAS, 2015) e
‘Ameaça lavanda: uma análise dos relacionamentos homoafetivos femininos em ‘Tomates
verdes fritos’, ‘Assunto de meninas’ e ‘Elena Undone’ (BRAGA, 2012). Não foram
encontradas pesquisas sobre filmes realizados no Brasil. No audiovisual existe um número
maior de pesquisas sobre lésbicas em novelas e seriados, a exemplo ‘Direito è comunicação e
cidadania das e para as mulheres lésbicas: uma primeira mirada de gênero sobre L Word’
(AUAD, 2010); ‘Repertórios sobre lesbianidade na novela Senhora do Destino: possibilidades
de legitimação e de transgressão’ (BORGES, 2008).
Entende-se, assim, que as pesquisas sobre cinema que falam sobre mulher geralmente
possuem abordagens heterocentradas. As focadas na população LGBT se centram em homens
gays. Os estudos sobre a sexualidade lésbica, em sua maioria, possuem outros enfoques e
abordagens teóricas.
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6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Uma sugestão é o uso de grupos naturais, em que as pessoas interagem conjuntamente, por
terem um passado, projetos ou interesses em comum, e formam um meio social. O autor
também aconselha a considerar a relevância de características como idade, gênero, educação,
mas principalmente o ambiente social em que as pessoas estão inseridas. O moderador é o
catalisador da interação entre os participantes, seu objetivo é estimulá-los a falar e reagir
frente às opiniões dos membros do grupo.
Os recortes para a escolha dos filmes se deram pelo período de exibição, direção de
mulheres e a existência de personagens protagonistas lésbicas na produção. ‘Amor Maldito’
(1984) foi escolhido por ser entendido como o primeiro de temática inteiramente lésbica num
período marcado por filmes pornográficos no Brasil, de acordo com Silva (2014). Este filme
discute a lesbofobia sofrida por uma mulher acusada de matar a mulher com quem era casada.
Baseado em uma história que circulava em um jornal de grande circulação de maneira
sensacionalista, a cineasta decidiu gravar depois de assistir a um dos julgamentos e ficar
sensibilizada pela maneira violenta em que a ré era tratada no tribunal. Boa parte das cenas
são do julgamento, intercalado com outras que ajudam os espectadores a entender os fatos que
precedem a morte de uma das personagens. O julgamento mostra ser não pela morte, mas pelo
fato da protagonista ser uma lésbica assumida. A escolha de ‘Como Esquecer’ (2010) se deu
por abordar um período contemporâneo, que pode servir de contraponto ao primeiro filme
proposto. O filme retrata o sofrimento de uma mulher que foi abandonada por sua namorada
depois de dez anos de relacionamento. Neste filme o relacionamento entre duas mulheres é
considerado algo normal pelos personagens, não é questionado.
7 CRONOGRAMA
Revisão bibliográfica x x x x
Cumprimento de créditos x x
Revisão do projeto x
Coleta de dados x
Análise de dados x
Exame de qualificação x
Defesa de dissertação x
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REFERÊNCIAS
Amor Maldito. Direção: Adélia Sampaio. Roteiro: José Louzeiro e Adélia Sampaio. Gaivota
Filmes, 1984. (76 min.) , color.
AUAD, Daniela, WERNECK, Lílian; LAHNI, Cláudia. Direito è comunicação e cidadania
das e para as mulheres lésbicas: uma primeira mirada de gênero sobre L Word. Juiz de
Fora, 2010.
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um manual prático. Vozes, 2000.
BERNARDET, Jean-Claude. O que é Cinema. Círculo do Livro, p. 123-188, 1993.
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BORGES, Lenise. Repertórios sobre lesbianidade na novela Senhora do Destino:
possibilidades de legitimação e de transgressão. São Paulo, 2008, 182 p.
BRAGA, Larissa. Ameaça lavanda: uma análise dos relacionamentos homoafetivos
femininos em "Tomates verdes fritos", "Assunto de meninas" e "Elena undone".
Brasília, 2012.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues et al. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1981.
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diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, p. 73-102, 2000.
Como Esquecer. Direção: Malu de Martino. Roteiro: Sabina Anzuategui e José Carvalho. E.
H. Filmes, 2010. (100 min.), color.
DIAS, Alfrancio; OLIVEIRA, Anselmo. Azul É A Cor Mais Quente: discursos sobre o
corpo, gêneros e sexualidades em fronteiras. Revista Saberes, 2015 Ano 2, nº 2, vol. 1.
DUARTE, Rosalia; ALEGRIA, João. Formação Estética Audiovisual: um outro olhar
para o cinema a partir da educação. 2008.
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______________. Comunicação e gênero: a aventura da pesquisa. Edipucrs, 2008.
FACCO, Lúcia. As heroínas saem do armário: Literatura lésbica contemporânea. 1. ed.
São Paulo: GLS, 2004. 189 p.
FALQUET, Jules. Breve resenha de algumas teorias lésbicas. Fem-e-libros, 2004.
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