Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
grupo de americanos artísticos que buscavam uma forma mais espiritual de correlações entre o mundo visível e as emoções interiores e respostas
beleza. O fato bruto, a inexorável ciência e a competição impiedosa do psicológicas. Samuel Taylor Coleridge observou em Anima Poetae, “Ao
mercado estavam esmagando o espírito e a vida das emoções e a reação era olhar objetos na Natureza eu pareço estar mais procurando uma linguagem
inevitável. simbólica para algo dentro de mim do que observando qualquer
O que deve ser da maior importância para nós não é o fato externo mas novidade” 5. O desenvolvimento do movimento da “arte pela arte” era a
o mundo supra-sensual. “O que conhecemos não é interessante; as coisas conseqüência da busca de Coleridge por uma linguagem simbólica para
realmente interessantes são aquelas que podemos apenas intuir - a vida algo dentro dele; a arte não mais precisava fornecer “uma interpretação de,
encoberta da alma, a região crepuscular do subconsciente, nossos ou comentário sobre o mundo da experiência cotidiana” 6. Só o
sentimentos “fronteiriços” e tudo o que reside na estranha “zona neutra” subjetivismo não bastava; a ideologia antagonística ao “fato” no mundo
entre as fronteiras do consciente e do inconsciente. O mistério da vida é o cotidiano era e ainda é Neoplatônica, Swedenborgiana, espiritualista,
que torna a vida valiosa de se viver 3”. metafórica, alegórica - em outras palavras, simbólica.
Isso foi escrito como introdução a Treasure of the Humble (1895) de Edgar Allan Poe, um Swedenborgiano americano, havia sido adotado
Maurice Maeterlinck mas poderia muito bem ter surgido como parte de um pelos poetas simbolistas franceses como um dos seus. Baudelaire e
manifesto simbolista do terceiro grupo de pintores e poetas que iriam Mallarmé, especialmente, acharam os frissons mórbidos e a imaginária
influenciar os pictorialistas na América. Avidamente absorvido pelos gótica de Poe exatamente adequadas para suas visões dos sentimentos
intelectuais em cidades como Boston onde o fotógrafo F. Holland Day e sobrenaturais presentes em toda nuança da Natureza. Como Poe, eles
sua entourage achou-o uma inspiração, Maeterlinck oferecia também eram Swedenborgianos e seus idéisme foram articulados por
encorajamento para escapar às limitações da fotografia realista. O credo Baudelaire em sua definição das “correspondências” Swedenborgianas:
simbolista estava rejeitando a noção, de Emile Zola, de que a arte é um “[Há] as afinidades que existem entre os estados espirituais e os estados da
canto do universo visto através de um temperamento. Mero subjetivismo natureza; aquelas pessoas que são cientes dessas correspondências tornam-
não era mais suficiente. O que era necessário era uma nova arte que se artistas e sua arte só é de valor apenas se é capaz de expressar esses
pudesse descobrir modos de objetificar os sentimentos interiores. A relacionamentos” 7. O misticismo de Swedenborg foi ainda mais
imaginação tinha de ser liberada. Emoções tinham de ser expressas. As exemplificado por Baudelaire quando declarou, “As coisas naturais
nuanças esposadas pelos poetas simbolistas franceses tinham de descobrir existem apenas precariamente; a realidade reside apenas nos sonhos” 8. Para
forma. Além disso, o mundo fenomenológico fora descartado como um os seguidores do filósofo do século XVIII Emmanuel Swedenborg, o
recipiente da “verdade.” Era o que estava atrás e fundo dentro do eu que mundo visível nada mais era que uma pálida sombra da verdade que existia
revelava Deus. Para fotógrafos como F. Holland Day (que estava também em um mundo exatamente além da enganosas aparências materiais, algo
publicando os poetas metafísicos ingleses), seu protegido Alvin Langdon como uma irmã gêmea fantasmática vista em um espelho, mais perfeita,
Coburn e seu colega e amigo Clarence White, a doutrina simbolista eterna e não obstante completamente desmaterializada.
poderia ter sido declarada em uma única sentença: “Nós tateamos entre
sombras na direção do desconhecido” 4.
A idéia de que havia algo merecedor de buscar não era nova, nem devia 5
Samuel Taylor COLERIDGE, citado em E. F. Carritt, The Theory of
o “desconhecido” ser encontrado totalmente isolado da teologia. As raízes Beauty, p. 298.
estão na individualização romântica da experiência e a longa procura por 6
Edward Lucie-Smith, Symbolist Art, p. 57.
7
Charles BAUDELAIRE, citado em Philippe Jullian, The Symbolists, p.
3
A.B. WALKLEY, introdução a Maurice Maeterlinck, Treasure of the 15.
Humble, p. xii. 8
Baudelaire, citado em Philippe Jullian, Dreamers of Decadence:
4
Idem. Symbolist Painters of the 1890s, p. 256.
3
A filosofia de Swedenborg havia influenciado diretamente o pintor sol difundida através da atmosfera que “tonaliza” em uma luz uniforme
americano George Inness cujas paisagens, por sua vez, mostraram aos todos os objetos vistos” 10.
fotógrafos pictorialistas vários métodos pelos quais a Natureza podia ser De fato, os fotógrafos ocasionalmente aplicam a gaze diretamente sobre
levada a representar palpitações íntimas da alma. Uma descrição dos suas objetivas para harmonizar e atenuar todos os elementos de suas
trabalhos simbolistas tardios de Inness é facilmente aplicada à Morning imagens dando-lhes uma atmosfera adequada sugerindo temperamento
(lâmina 30), de Clarence White, ou às imagens de Paul Caponigro em sua delicado, vago, indecifrável. Mas pictorialistas como Clarence White,
série sobre Redding, Connecticut (lâmina 32): Coburn e Edward Steichen dependiam também de objetivas sem correção,
A ausência de ênfase dramática na cena e a auto-imersão das figuras incluindo uma objetiva de foco suave para retrato, para difundir e
contribuem para uma atmosfera de quietude; a tonalidade cinza e a desmaterializar a paisagem. O objetivo era criar, por qualquer meio
neblina envolvente de tudo dota a quietude com um alheamento estranho. disponível, “um temperamento de sonho e alheamento” 11. Muitos
Não apenas o que vemos nessas tardias paisagens parece com reflexos, as pictorialistas procuraram fotografar apenas naqueles períodos do dia ou sob
imagens pós-espectrais de outra paisagem mais agudamente gravada ... condições atmosféricas que achavam especialmente “harmonizadoras”:
mas o estranho alheamento é produzido por outra coisa que é um tanto Porque acho a natureza mais bela no crepúsculo e à luz da lua, todos os
mais difícil de ser aproximada quando tentamos colocar nela nosso dedo. meus esforços eram direcionados para encontrar uma forma de interpretar
E esse é o senso da cadência medida; até mesmo mais que isso, é como se esses momentos. Tomando o bonde até o final da linha e caminhando uma
esse mundo pintado operasse através de algum ritmo vagaroso, através de pequena distância posso encontrar alguns agrupamentos de árvores. Esses
algum quadro de referência que é alienado de nós. 9 se tornaram o meu território favorito especialmente no outono, inverno e
Nas dualidades de reflexos, água estranhamente inerte e árvores delicadas princípio da primavera. Eles eram particularmente atrativos em dias
de Paul Caponigro encontramos uma declaração perfeita do que ele chama cinzentos ou de neblina ou bem ao final da tarde ou no crepúsculo. Sob
de “paisagem além da paisagem”. É quase como se essas árvores refletidas essas circunstâncias as árvores tinham temperamento e os temperamentos
na água fossem intimações daquele outro universo paralelo que despertavam reações emocionais que eu tentei representar. 12
Swedenborg disseminou. As reminiscências de Edward Steichen de seus dias de pictorialista
Uma vez que suas imagens empregavam uma tonalidade ubíqua e encarnam muito dos objetivos do tonalismo. Ele era, é claro, um pintor e
esmaecida, Wanda Corn classificou os fotógrafos pictorialistas no continuou a pintar por alguns anos após abraçar a fotografia. Morando em
movimento de arte americano que chama de tonalismo. É um termo de Paris durante o apogeu da influência de Maeterlinck, na virada do século, e
adoção relativamente recente mas que reconhece corretamente a correlação ali exposto aos trabalhos dos pintores e poetas simbolistas, Steichen era
entre as pinturas tardias de Inness ou as paisagens cintilantes de Tryon e mais inventivo em suas técnicas transformando suas paisagens em
suas contrapartes fotográficas. Como observou o crítico da virada do descrições de temperamento (lâmina 33). Entretanto, para o crítico
século, Charles Caffin, essas imagens - na pintura ou na fotografia - eram Sadakichi Hartmann as primeiras paisagens de Steichen pareciam mais
dominadas por uma cor ou tonalidade e relacionavam-se umas às outras esboços que imagens acabadas e ele condenou que demasiado era deixado
naquilo que os franceses chamaram de um envelope de atmosfera, uma à imaginação do espectador. É claro, esse era precisamente o objetivo dos
“luminosidade igual, sutil”, de efeito específico: “vendo objetos através de pictorialistas, tonalistas e simbolistas: estimular a imaginação. Embora lhe
um grande véu de gaze - sendo o véu produzido, na natureza, pela luz do tenha escapado essa característica fundamental Hartmann, entretanto, não
10
Charles CAFFIN, citado em Wanda M. Corn, The Color of Mood:
American Tonalism 1880-1910, p. 3.
9
Abraham A. DAVIDSON, The Eccentrics and Other American 11
Davidson, Eccentrics, p. 88.
Visionary Painters, p. 119. 12
Edward STEICHEN, citado em Corn, The Color of Mood, p.2.
4
era insensível à excelência de Steichen: “Para mim, Steichen é um poeta pelos trabalhos tonalista e simbolista como os de Steichen, The Big White
de rara profundidade e significância que expressou seus sonhos, como o Cloud, Road into the Valley - Moonrise, pelas temperamentais figuras
faz Maeterlinck, por decoração de superfície e com a mais simples da pagãs em locações de paisagem, por George Seeley e pelas paisagens
imagens - por exemplo, uma vista indistinta de alguma paisagem noturna decorativamente japonistas, de Joseph Keiley com seus títulos como A
percebida através de vários ajuntamentos de galhos ... pode acrescentar Garden of Dreams. Em 1909 os leitores de Camera Work foram também
algo à nossa consciência da vida. Suas linhas, borradas e indistintas, como agraciados com eróticos nus alegóricos na paisagem, por Anne W.
geralmente são, são surpreendentemente eloqüentes e rítmicas” 13. Brigman bem como uma imagem de uma criança nua sendo apoiada em
Três idéias brotam dessa declaração: que um fotógrafo, usando uma um enorme tronco de árvore por uma mãe envolta em gaze, intitulada
máquina, pode criar poesia semelhante aos sonhos de Maeterlinck; que os Natureza, da fotógrafa Alice Boughton.
métodos que ambos usaram eram “decoração de superfície”, em outras Os primeiros anos de Camera Work cobriram a extensão do que é
palavras, formas decorativas; e, finalmente, que o conteúdo da poesia - geralmente chamado “simbolismo branco”. O simbolismo branco envolvia
visual ou verbal - era algo vago e indistinto mas que, ao mesmo tempo, era paisagens enevoadas; nus sensuais mas não pornográficos; mães com filhos
apresentado com uma retórica “eloqüente e rítmica”. Essas características representando aspectos da vida, da morte e renascimento; virgens vestidas
colocam abertamente Steichen no reino do simbolismo. rememorando a ornamentação medieval; e animais rurais. O simbolismo
Entre as doutrinas do simbolismo como movimento de arte, estabelecidas negro, redolente de morte e corrupção, empregava imagens violentas de
por Albert Aurier em 1891, estava a exigência básica da “forma sexo, tortura e deleites satânicos todos a serem abundantemente
decorativa” uma vez que se acreditava que a arte decorativa, sendo livre do encontrados nas pinturas de Gustave Moreau, Xavier Mellery, Felicien
ilusionismo naturalístico e representativo era “ao mesmo tempo sintética, Rops e mais conspicuamente naquelas de Fernand Khnopff, Edward
simbolista e ideativa” 14. O impulso decorativo do simbolismo era Munch, James Ensor e Franz von Stuck. Apesar de sua predileção pessoal
secundado pelo estudo da arte japonesa, chinesa e suas filosofias inerentes. pelas envernizadamente sensuais e sadistas Esfinges de Franz von Stuck e
Na América, os maiores pregadores dessas artes foram Ernest Fenellosa e pelas paisagens portentosas de Arnold Böcklin, Stieglitz nunca permitiu a
Arthur Wesley Dow, seu assistente no Boston Museum of Fine Arts. As Camera Work aventurar-se para longe da tradição do simbolismo branco
ferramentas compositivas específicas da arte Oriental, tal como ensinadas de Puvis de Chavannes, intimamente aliado e freqüentemente indistinto da
por Dow, estão evidentes em Winter Landscape, de Clarence White bem alegoria acadêmica.
como na sua famosa Morning. A paisagem incomparavelmente decorativa Historicamente, pintores simbolistas como Paul Gauguin, Maurice Denis,
de Alfred Stieglitz com o Flat-Iron Building mostrava também a influência Jean Delville e Fernand Khnopff rejeitaram a paisagem pura - divorciando-
do japonismo enquanto The Dragon, de Coburn, comprimiu o rio Ipswich se completamente da escola de Barbizon e do impressionismo - em favor
em misteriosas formas flutuantes como aquelas encontradas nas pinturas da imaginária de Puvis de Chavannes, imagens que lidavam com a
chinesas. psicologia da natureza humana, a mitologia e estados da mente. Eles
Todas essas quatro fotografias apareceram nos primeiros dois anos de tendiam a incluir figuras em suas paisagens quase sempre em contextos
publicação de Camera Work, a celebração do pictorialismo de Alfred alegóricos. Especificamente dotado de símbolos universalmente
Stieglitz, ao lado de reproduções de pinturas de paisagem pelo tonalista D. reconhecidos (por exemplo, uma virgem seria denotada por uma jovem
W. Tryon e do alegórico e decorativo Puvis de Chavannes. Nos dois anos segurando um prístino lírio branco), o simbolismo alegórico era mais
seguintes - 1906 e 1907 - foram reproduzidas um tanto de fotografias específico que as mulheres mais misteriosas nas fotografias de Clarence
européias no estilo Barbizon mas essas foram esteticamente ultrapassadas White. Um teórico tentou definir as diferenças entre alegoria e
simbolismo: “Alegoria, como o símbolo, expressa o abstrato através do
13
Sadakichi HARTMANN, The Valiant Knights of Daguerre, p. 204. concreto. Ambos artifícios são baseados na analogia e ambos contêm uma
14
Albert AURIER, citado em Lucie-Smith, Symbolist Art, p. 59
5
imagem. ... O simbolismo envolve uma procura intuitiva das idéias latentes volta o passado ou responder à realidade futura de coisa alguma porque a
em uma forma particular” 15. tridimensionalidade é a função dos sentidos. Assim, para os sentidos
As buscas intuitivas do simbolismo iriam levar diretamente à abstração e físicos, a realidade permanece, sempre, apenas uma pequena fração da
à “forma pura” mas durante as décadas quando os fotógrafos estavam realidade de uma árvore. 17
procurando meios para se libertar da obediência à Natureza a alegoria, Os semânticos também encorajam uma rejeição semelhante da aparência
especificamente a inclusão de figuras melancólicas em uma paisagem da superfície no agora.. Alfred Korzybski falou de qualquer objeto, como
pálida ou difusa, parecia o caminho mais correto para a descrição de uma árvore, desafiando a permanência uma vez que é, na realidade, Árvore
temperamentos não-factuais. Não apenas a alegoria pura, uma vez que a 1, Árvore 2, Árvore 3, Árvore 4, denotando a passagem do tempo e os
humanidade havia se distanciado da confiança nos usos acadêmicos do estados mutantes do mundo material. Bullock relaciona sua idéia ao
panteão helenístico e das divindades romanas para significar Amor, Honra, problema de expressar qualquer coisa na fotografia além do imediato
Beleza, Fortitude; essa alegoria usava a figura humana para evocar um agora. Mas ele também acredita que uma vez que o artista se torna
temperamento de contemplação, por parte do observador, através de uma consciente da diferença entre ver apenas o tridimensional agora e os
identificação cinestésica com pose e comportamento, repouso e gesto. eventos existentes no tempo e espaço, “apenas então a mente procura e
Como um filósofo descreveu esse processo, nós tendemos “a dividir e encontra símbolos para expressar essa dimensão adicionada” 18. As
arranjar o tempo de acordo com algum tipo de ritmo, o espaço por algum paisagens misteriosas de Linda Connor (lâmina 34) parecem, também,
tipo de contorno simétrico. ... O mundo torna-se análogo a nós através procurar uma dimensão além do agora partindo simbolicamente para outra
desse poder de ver na forma a alegria e a tristeza da existência que corporalidade.
escondem” 16. A hipótese é a de que nós relembramos as atividades de Enquanto os pictorialistas simbolistas criaram essa dimensão adicional
nossos próprios corpos quando nos movemos através do tempo e do espaço como um mundo de sonho pela desmaterialização dos objetos, difundindo
e somos impelidos a rememorá-las já que nós, inconscientemente, suas particularidades com gazes, objetivas sem correção ou neblinas
imitamos as ações físicas dos outros ou as posturas e gestos imaginados de atmosféricas os simbolistas associados ao surrealismo apresentaram
árvores e outros fenômenos da paisagem. Então, as lânguidas figuras tão imagens que eram freqüentemente duras como pregos, concretas e
predominantes, digamos, nas semi-paisagens do pictorialista George detalhadas, fotografadas em alto-contraste. Um movimento profundamente
Seeley realmente não nos convidam a relembrar a mitologia grega antiga político em suas origens, o surrealismo estava determinado a alcançar o
tanto quanto insinuam languidez em nossos próprios sentimentos. ideal do poeta Rimbaud da “subversão sistemática dos sentidos” 19. A
Tanto quanto procuram métodos de expressar emoções ou “idéias” liberdade humana seria vitalizada através dessa subversão e a imaginação
vagamente experimentadas, os simbolistas sempre ansiaram por algo que liberada do impacto desumanizador da tecnologia racionalista da sociedade
tem sido caracterizado como a quarta dimensão, além do tempo e do conformista. Como Baudelaire havia sugerido que a realidade estava
espaço. O fotógrafo contemporâneo Wynn Bullock, por exemplo, rejeita o apenas nos sonhos, então o surrealismo era “nada menos que a
agora do tempo: objetificação do próprio ato de sonhar, sua transformação em realidade” 20.
Visto dessa forma, o significado de uma árvore particular é confinado a
uma atitude da mente que tende a limitar sua realidade às suas aparências
de superfície. Em um plano físico, os cinco sentidos podem apenas reagir a 17
Wynn BULLOCK, citado em Nathan Lyons, editor, Photographers on
estímulo externo no sempre recorrente agora. Eles não podem trazer de Photography, p. 37.
18
Idem.
15
Albert MOCKEL, citado em Jullian, The Symbolists, p. 228. 19
Franklin ROSEMONT, editor, Andre Bréton: What Is Surrealism;
16
Carritt, Theory of Beauty, p. 271. Selected Writings, livro 1, p. 131.
20
Idem, p. 60.
6
André Breton, o fundador do movimento surrealista e autor de seu Uelsmann, como o pintor Magritte, quase sempre apresenta fenômenos
manifesto publicado em 1924, rejeitou categoricamente a noção concretos justapostos sem metáfora. Em uma famosa imagem de Magritte
Swedenborgiana das “correspondências” de acordo com a qual o mundo uma enorme maçã verde enche um cômodo; não obstante continua sendo
material é meramente uma pálido traço de um mundo verdadeiro, ideal. A uma maçã. Essa essência é ao mesmo tempo seu humor e sua ameaça. Em
poesia, agindo como uma sintetizadora de sonhos e do inconsciente Uelsmann (lâmina 35), uma casa colocada entre terra encarquilhada,
começou, agora, a desempenhar o papel central na solução dos problemas árvores tombadas e um céu que consiste da superfície invertida de uma
humanos. A imaginação resgataria seus direitos, não na enevoada piscina ainda é uma casa, mas é uma casa sonhando com água. Em outras
melancolia do simbolismo fin-de-siécle mas em combinações artísticas imagens, uma catedral brota de um tronco de árvore, um sólida esfera
totalmente liberadas: “Valores oníricos sucederam de uma vez por todas ou flutua - à la Magritte - sobre uma praia perfeitamente ordinária e em outro
outros e eu demando que aquele que ainda recusa, por exemplo, a ver um local um tapete decorado se torna um chão de floresta. Para pelo menos
cavalo galopando em um tomate deva ser considerado como um cretino. um escritor, a catedral e o tapete sugerem “a ligação intuitiva entre
Um tomate é, também, um balão infantil - tendo o surrealismo, eu repito, natureza e religião, visão e criação que permeia a arte medieval” 24.
suprimindo a palavra ‘como’” 21. Ambos o freudismo do qual dependia - Se aceitamos o fato de que a arte medieval contava estórias usando
uma fé completa no inconsciente - e a desejada transcendência dialética símbolos para transmitir significados convencionados, devemos ser
das polaridades de bem e mal, vida e morte ou corpo e mente provaram ser capazes de “ler” as imagens de Uelsmann de forma literal, tal como ler as
uma difícil ideologia para potenciais fotógrafos de paisagem surrealistas. linhas sucessivas de um poema. Há alguma indicação de que isso seja
Dada a propensão da câmera de capturar pelo menos alguns aspectos do possível. Paul Caponigro sugeriu que o potencial da fotografia, como
mundo fenomenológico no filme, como poderia ser criado o sonho? Até produtora de imagens e comunicadora, “realmente não...(é)...diferente do
mesmo Breton reconheceu que “Uma paisagem na qual não entra nada mesmo potencial na melhor poesia onde palavras familiares, cotidianas,
terrestre está além do alcance da nossa imaginação” 22. Poderia ser apenas colocadas dentro de um contexto especial, podem ascender acima do
através da justaposição de objetos reais da paisagem e da natureza, através intelecto e tocar a realidade sutil de uma forma única” 25. Desconsiderando
do princípio da colagem, que a paisagem surrealista podia ser encenada. o fato de que a poesia de uma ordem superior como os Pisan Cantos de
Jerry Uelsmann, o mais conhecido dos simbolistas fotográficos Ezra Pound, muito admirada pelos críticos literários, não pode ser
americanos, tem dependido da justaposição de imagens que tem sido imaginada de empregar “palavras familiares, cotidianas”, permanece ainda
freqüentemente caracterizada como “surrealista”. Suas imagens múltiplas, a persistente dificuldade inerente à interpretação da imaginária simbolista.
algumas vezes criadas pela previsão total da imagem final e algumas vezes A arte medieval era religiosamente comunitária, dependendo de um
por descoberta intuitiva na câmara escura, consistem de objetos thesaurus socialmente aceito de significados didáticos coletados da
“terrestres” em combinações oníricas (isto é, de sonhos). Ao mesmo tempo teologia cristã e da Bíblia. Eram notações aceitas na retórica geral da
em que concorda que suas imagens lidam com o mundo real, Uelsmann vê igreja os símbolos do cordeiro para Jesus, a pomba para o Espírito Santo,
suas imagens sobrenaturais como estando envolvidas “com um tipo de uma figura alada para anjo, o leão para São Marcos e a rosa para a Virgem
realidade que transcende a realidade da superfície. Mais do que realidade Maria. Mas o crítico e historiador Peter Bunnell nega a possibilidade de
física, é emocional, irracional, intelectual e psicológica” 23. atribuir tal conjunto de significados aos símbolos de Uelsmann. Como
sonhos, “eles não possuem nem significados e nem mesmo vários
21
Idem.
22
Idem, p. 7. 24
Susan Dodge PETERS, “The Inclusion of Medieval and Victorian Art in
23
Jerry UELSMANN, citado em James L. Enyeart, Jerry N. Uelsmann: Jerry Uelsmann’s Photographs: A Reading of Association,” p. 8.
Twenty-Five Years: A Retrospective, p. 37. 25
Caponigro, Paul Caponigro (Millerton, N.J.: Aperture, 1972), p. 42.
7
significados” 26. Bunnell vai ainda mais longe ao sugerir que fotografias pistas necessitamos para compartilhar a experiência que o poeta/fotógrafo
podem ter “significados duplos, significados implicados, significados não colocou à nossa frente? Ou não seria o objetivo o compartilhamento?
intencionados, podem apontar e insinuar e podem até mesmo significar o Provavelmente nenhum fotógrafo trabalhou tão valorosamente como
oposto do que aparentemente significam” 27. Enquanto pode ser mais Minor White para liberar o ato de fotografar e a experiência de ver
preciso dizer que significado é atribuído pelo intelecto do observador, a fotografia. Místico e poeta, Minor White procurou no Swedenborgianismo,
declaração de Bunnell oportunamente libera Uelsmann da obrigação de no Zen budismo, na psicologia da visão, na semântica Korzybskiana, na
“significar” algo específico. pintura Sumiye, na metafísica de Gurdjieff e nos ensinamentos encarnados
Muitas dessas questões relativas à natureza do significado e o significado no Tao, por pistas para significado e símbolo. Ele achou muito útil a
da natureza podem ser exploradas em quatro fotografias de Paul Vanderbilt sugestão de Jacques Maritain de que “Idéias, com ‘I’ maiúsculo, vêm tanto
(veja as lâminas 36-39). Elas foram selecionadas arbitrariamente de sua de dentro como do exterior. ... Parece haver uma fonte independente de
extensiva obra em paisagem. Idéias originando da mente profunda. Essa fonte, simultaneamente interna
Cada uma dessas imagens pode ser olhada como representando locais e e externa, [é] intuição poética” 28. Para Minor White, a luta para dar forma
tempos específicos bem como tipos de eventos freqüentemente vistos nas a idéias poeticamente intuídas era heróica e do mesmo nível que a
fazendas americanas. A nuvem suspensa sobre a lavoura de milho. A cerca experiência religiosa profunda. Ao mesmo tempo em que lutava com a
de madeira ondulando à distância sobre um campo de inverno, sua forma como um tardio Jacó lutando com o Anjo ele freqüentemente se
diagonal puxando-nos para a imagem. Um estrada clara serpenteia expressou com frases aceitáveis aos simbolistas de qualquer período,
rapidamente através da paisagem até acolá, as casas de fazenda. Uma linha pictorialista ou surrealista: “Juntos, Câmera e Olho são uma máquina do
de árvores é silhuetada contra o céu acima de um rio que transbordou. tempo com a qual a mente e o ser humano podem praticar o mesmo tipo de
Seria a nuvem um símbolo de chuva, de ameaça ou da presença celestial violência ao Tempo e ao Espaço como os sonhos” 29. Enquanto que as
ou é uma declaração complexa sobre o relacionamento das nuvens à vida qualidades oníricas se manifestavam mais fortemente em seus close-ups
agrícola? Devemos lamentar a terra improdutiva contida pela cerca de surrealistas de espuma do oceano ou no orvalho congelado nos vidros de
madeira ou simplesmente marchar para dentro da imagem e tomar posse? janelas, as distantes paisagem de céu, água e nuvem de White
Significaria a estrada, de acordo com um clichê Whitmanesco, amplidão e freqüentemente provêm o mesmo senso de uma iniciação aos mistérios
liberdade ou, ao contrário, árduo caminhar para destinos distantes? Estão cósmicos (lâmina 40).
as árvores meramente transmitindo um temperamento ou dando-nos uma Embora as paisagens de Minor White sejam simbólicas, elas nunca
mensagem específica sobre os evanescentes aspectos da vida? Ou seriam empregam o modo alegórico. Ele não personifica idéias mas cria símbolos
possíveis todos esses significados? Qual o temperamento que cada imagem para sentimentos interiores homenageando as filosofias da pintura chinesa
engendra? Obviamente,Vanderbilt é um poeta visual, selecionando suas que reverenciava profundamente. Em The Way through Camera Work -
formas com atenção escrupulosa. Sua base de operação era o meio-oeste o título não se refere diretamente à Stieglitz mas, ao contrário, ao Tao
superior - especificamente o Wisconsin. Devemos demandar legendas para alcançável através da fotografia - White cita muitos poetas e místicos
cada local que fotografou e para que uso seriam empregadas essas orientais e também a observação de Laurence Binyon de que “a paisagem
legendas? Há apenas uma forma pela qual essas imagens podem ser na longa tradição chinesa ... funde o local no cósmico e reflete,
experimentadas? Há apenas uma mensagem simbólica? Se todas as
fotografias são símbolos, porque não são a Natureza mas artefatos, que
26
Peter BUNNELL, citado em James Huginin, “Tarnished Meditations: 28
Jacques Maritain, citado em Minor White, The Way through Camera
Some Thoughts on Jerry Uelsmann’s Photographs,”p. 8. Work, p. 68.
27
Idem. 29
Minor WHITE, Mirrors Messages Manifestations, p. 67.
8
30
White, The Way through Camera Work, p. 66.
31
Davidson, Eccentrics, p. 88.
32
Rosemont, What is Surrealism, bk. 1. p. 131.