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RELATÓRIO
Dominique François Arago
Relatório da Comissão da Câmara dos Deputados designada para a
apreciação de um projeto de lei concedendo: primeiro, ao Senhor
Daguerre, uma pensão anual e para toda a sua vida de 6.000 francos e,
segundo, ao filho do Senhor Niépce, uma pensão anual de 4.000 francos,
pela doação ao Estado de seu processo de fixação de imagens obtidas na
câmara obscura.
Apresentado pelo Senhor Arago, deputado pelos Pireneus do Leste, na
Câmara Francesa de Deputados, em 3 de julho de 1839.
Cavalheiros:
Tem sido ardente, entusiástico e unânime, nesse círculo e em outras
esferas, o interesse despertado por essa invenção recentemente tornada
pública pelo Senhor Daguerre. Muito provavelmente a Câmara espera de
sua Comissão nada mais que a aprovação da lei proposta apresentada pelo
Ministério do Interior. Entretanto, após cuidadosa consideração, a missão
que nos foi designada parece impor-nos outras obrigações.
Nós acreditamos, entretanto, que ao mesmo tempo em que aprovamos de
todo o coração a idéia de conceder um prêmio nacional aos inventores,
cujos interesses não podem ser adequadamente protegidos pelas leis de
patente ordinárias, devemos, inicialmente, fornecer também provas do
cuidado cauteloso e escrupuloso com o qual esta Câmara funciona.
Submeter o trabalho de um gênio, tal como o que devemos lidar hoje, a
um exame crítico será útil para desencorajar a mediocridade ambiciosa
que pode aspirar trazer frente à essa assembléia suas produções comuns e
efêmeras. Isso provará que se coloca em um plano muito elevado as
recompensas que podem ser reivindicadas de nós, em nome da glória
nacional e que não podemos consentir rebaixar nossos padrões, ou
obscurecer seus brilhos, pela aplicação muito perdulária desses princípios.
Essas poucas palavras servem para explicar à Câmara as linhas que
seguimos em nosso exame.
1. É, o processo do Senhor Daguerre, uma invenção inquestionavelmente
original?
2. É essa uma invenção que irá prestar um serviço valioso à arqueologia
e às belas artes?
3. Pode, essa invenção, tornar-se útil em termos práticos? E, finalmente,
4. Pode-se esperar que as ciências possam dela derivar alguma
vantagem?
Arago continuou para delinear tentativas anteriores com a câmera
citando notas históricas sobre o trabalho de Wedgwood e de outros que,
entretanto, não foram nada exaustivos e, de forma breve, esboçou as
primeiras tentativas de Niépce e Daguerre. Arago prossegue:
O acordo de sociedade registrado entre Niépce e Daguerre para a
exploração conjunta de seus métodos fotográficos era datado de 14 de
dezembro de 1829. Os acordos posteriores entre o Senhor Isidore Niépce,
filho, na qualidade de herdeiro, e o Senhor Daguerre mencionam as
primeiras melhoras que o pintor parisiense introduziu no método
inventado pelo físico de Chalon e, em segundo lugar, processos
inteiramente novos descobertos pelo Sr. Daguerre capazes de (na
linguagem do documento original) "reproduzir imagens seis a oito vezes
mais rapidamente que o processo anterior." Isso tornará claro os vários
artigos do contrato entre, por um lado, o Ministério do Interior e, por outro
lado, os senhores Daguerre e Niépce, filho, anexados ao projeto de lei
proposto. Será observado que, ao discutir os trabalhos do Senhor Niépce,
empregamos exatamente as palavras qualificadoras: "para a impressão
fotográfica de gravuras de cobre." De fato, Niépce, após inúmeros
experimentos infrutíferos, tinha quase perdido a esperança de ser capaz de
fixar imagens obtidas diretamente com a câmara obscura. As preparações
químicas que empregou não enegreciam rapidamente sob a ação da luz, já
que necessitavam de dez a doze horas para produzir uma imagem e,
durante o longo tempo de exposição, as sombras do sujeito representado
mudavam de um lado para o outro, de forma que as imagens resultantes
eram desprovidas de contraste e monótonas em tonalidade, desprovidas de
todos os efeitos agradáveis que derivam do contraste de luz e sombra; e,
além disso, mesmo à parte essas dificuldades, nunca se estava certo de um
resultado bem- sucedido porque, mesmo após tomar inúmeras precauções,
ocorrências inexplicáveis e acidentais intervinham e algumas vezes ocorria
um resultado passável ou resultava uma imagem incompleta que mostrava

espaços vazios aqui e ali e, finalmente, quando exposta à luz do dia, a
camada sensibilizadora se não recusava a escurecer se tornaria quebradiça
e descolaria.
Quando todas essas imperfeições são enumeradas e a natureza e a
maneira de sua eliminação é explicada, é obtido um relato quase completo
do crédito merecido pelo Sr. Daguerre pela descoberta de seu método,
alcançado após infindáveis experimentos laboriosos, delicados e caros.
Mesmo os mais débeis raios de luz alteram a substância sensível da
placa do daguerreótipo. Essa mudança é efetuada antes que as sombras
criadas pelo sol tenham tempo para se mover de forma considerável. Os
resultados são assegurados seguindo-se certas regras simples. Finalmente,
o efeito da luz do dia sobre as imagens acabadas não diminui, mesmo após
anos, seja na sua pureza, brilho ou harmonia.
Essa Comissão cuidou das medidas necessárias de forma que, no dia que
a proposta de lei for discutida, todos aqueles Deputados que desejarem
examinar os exemplos do processo do daguerreótipo possam formar sua
própria opinião sobre a utilidade dessa descoberta. Enquanto essas
imagens são mostradas a vocês, todos imaginarão as vantagens
extraordinárias que poderiam ter sido obtidas, durante a expedição ao
Egito, de um meio de reprodução tão exato e rápido; todos se darão conta
de que, se tivéssemos tido a fotografia em 1798, teríamos hoje registros
pictóricos fiéis daquilo que o mundo educado está para sempre destituído
devido à ganância dos árabes e ao vandalismo de certos viajantes.
Para se copiar os milhões de hieróglifos que cobrem até mesmo o exterior
dos grandes monumentos de Tebas, Mênfis, Carnaque e outros seriam
necessárias décadas e legiões de desenhistas. Com o daguerreótipo, uma
pessoa seria suficiente para completar com sucesso esse imenso trabalho.
Equipe-se o Instituto Egípcio com dois ou três aparatos de Daguerre e, em
breve, em muitas das grandes folhas do celebrado trabalho que teve seu
início na expedição ao Egito, incontáveis hieróglifos, na forma como
realmente existem, substituirão aqueles que hoje são inventados ou
aproximadamente desenhados. Esses desenhos irão superar, na fidelidade
dos detalhes e na reprodução verdadeira da atmosfera local, os trabalhos
dos pintores mais completos . Uma vez que a invenção segue as leis da
geometria, será possível restabelecer, com a ajuda de um pequeno número
de fatores dados, o tamanho exato dos pontos mais altos das estruturas
mais inacessíveis.
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Essas reflexões, que os zelosos e famosos estudiosos e artistas lotados no
exército do Oriente não podem refutar facilmente sem incorrer em auto-
desapontamento, devem sem dúvida direcionar seus pensamentos para o
trabalho que hoje se desenvolve em nosso país sob o controle da Comissão
dos Documentos Históricos. Uma olhadela é suficiente para reconhecer o
papel extraordinário que o processo fotográfico deve desempenhar nesse
grandioso empreendimento nacional; incidentalmente, é evidente, ao
mesmo tempo, que esse novo processo oferece vantagens econômicas que,
nas artes, raramente seguem-se concomitantemente ao aperfeiçoamento da
produção.
Se, finalmente, surge a questão de se a arte, por si própria, pode esperar
outros progressos do estudo dessas imagens desenhadas pelo lápis mais
sutil da natureza, o raio de luz, o Senhor Paul Delaroche irá responder-nos.
Em um relatório preparado a nosso pedido esse celebrado pintor afirma
que os processos de Daguerre "são tão abrangentes na realização de certos
requisitos essenciais da arte que serão matéria de observação e estudo,
mesmo pelos mais hábeis pintores." O que ele mais enfatiza sobre as
imagens fotográficas é sua "precisão inimaginável" de detalhe, que não
perturba o repouso das massas e não subtrai, de forma alguma, do efeito
geral. "A precisão das linhas," continua Delaroche, "a beleza da forma, são
tão perfeitas nas imagens de Daguerre quanto se pode desejar e, ao mesmo
tempo, reconhece-se uma modelagem ampla e vigorosa, tão rica em
tonalidades quanto em efeito. ... O pintor vê nesse processo um modo fácil
de fazer coleções para estudo e uso posterior que, de outra forma, são
obtidas apenas à custa de muito tempo e trabalho e, não obstante, menos
perfeitas em qualidade não importa quão grande possa ser o seu talento."
Após ter contraposto, com excelentes argumentos, as opiniões daqueles
que imaginaram que a fotografia seria prejudicial aos nossos artistas e,
especialmente, aos nossos habilidosos gravadores, o Senhor Delaroche
conclui seu relatório com a observação: "Em resumo a notável invenção
do Sr. Daguerre é um grande serviço prestado às Artes."
Não arrogamo-nos a adicionar nada a tal testemunho.
Será lembrado que, entre as questões que nos ocuparam no início desse
relatório, estava a de se essa invenção pode ter uso prático? Sem revelar
nada do que deve permanecer em segredo, até a passagem e promulgação
da lei, podemos afirmar que as placas nas quais a luz produz as admiráveis
imagens do Sr. Daguerre são tabletes recobertos, isso é, placas de cobre

que foram cobertas com uma fina camada de prata. Sem dúvida, teria sido
mais vantajoso, não apenas para o conforto dos viajantes mas também de
um ponto de vista econômico, se se pudesse empregar papel. Papel
impregnado com cloreto de prata ou nitrato de prata foi, na verdade, a
primeira substância empregada pelo Sr. Daguerre, mas a ausência de
sensibilidade, a imagem confusa, a incerteza quanto aos resultados e os
acidentes que freqüentemente aconteceram durante a operação de reversão
das luzes e sombras, não podiam senão desencorajar um artista tão
habilidoso. Se tivesse seguido nessa direção suas imagens, provavelmente,
seriam mostradas em coleções, entre curiosidades da física, como
resultados experimentais mas certamente jamais teriam se tornado matéria
para a consideração dessa câmara. Finalmente, se se deve dizer que três ou
quatro francos, o custo de uma placa tal como as que o Sr. Daguerre
emprega, parece muito caro, é justo afirmar que a mesma placa pode
servir sucessivamente para a tomada de cem imagens diferentes.
O sucesso extraordinário do processo atual do Sr. Daguerre pode ser, em
parte, atribuído ao fato de que ele emprega uma cobertura extremamente
fina, um filme confiável. Não precisamos, aqui, nos preocupar com o
custo do material empregado; de fato o preço é muito baixo para ser
considerado. Apenas um dos membros da comissão viu o artista
trabalhando e operou também o processo. É, dessa forma, devido à
responsabilidade pessoal desse Deputado, que podemos apresentar aos
membros da Câmara o daguerreótipo do ponto de vista da praticidade. O
daguerreótipo não requer nenhuma manipulação que não possa ser feita
por qualquer pessoa. Não pressupõe nenhum conhecimento da arte do
desenho e não demanda nenhuma destreza especial. Quando, passo a
passo, umas simples regras prescritas são seguidas, não há ninguém que
não possa ter êxito e tão bem quanto o próprio Sr. Daguerre.
Provavelmente, mais do que qualquer coisa, a rapidez do método
surpreendeu o público. De fato, dificilmente dez ou doze minutos são
necessários para fotografar um monumento, uma seção da cidade, ou uma
cena, mesmo no tempo nublado do inverno.
Na luz do dia do verão o tempo de exposição pode ser reduzido à
metade. No clima do sul dois ou três minutos serão, certamente,
suficientes. Devemos observar, entretanto, que a exposição de dez ou doze
minutos no inverno, os cinco ou seis minutos no verão, e os dois ou três
minutos no sul, expressam apenas o tempo real durante o qual a placa
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sensível recebe a imagem projetada pela objetiva. A esse deve ser
acrescentado o tempo gasto para aprontar e montar a câmara obscura,
preparar a placa e o curto tempo necessário para proteger a placa da ação
da luz após a exposição. Para todas estas manipulações serão necessários,
talvez, metade ou três quartos de uma hora. Aqueles que entusiasticamente
imaginam, às vésperas de iniciar viagem, que irão empregar cada
momento, quando a carruagem sobe vagarosamente a encosta, para tomar
as cenas serão, portanto, desapontados em suas expectativas. Não menor
será o desapontamento daqueles que, surpreendidos pelo sucesso obtido na
cópia de páginas e de ilustrações dos trabalhos mais antigos, sonhem com
as imagens fotográficas para a reprodução e multiplicação do
daguerreótipo por meio da imagem litográfica. Não apenas no mundo da
moral, toda virtude possui seus defeitos; esse princípio se aplica também
às Artes. A perfeição, delicadeza e harmonia das imagens são o resultado
do polimento perfeito e da incalculável fineza da cobertura sobre a qual o
Sr. Daguerre opera. Se tal imagem é esfregada ou mesmo levemente
tocada, ou sujeita à pressão de um cilindro, ela é irremediavelmente
destruída; mas quem poderia imaginar alguém arrebentar uma fina peça de
renda ou escovar as asas de uma borboleta? O membro da Academia, que
por vários meses teve conhecimento das preparações sob as quais os belos
designs submetidos a nosso exame foram produzidos, considera
desaconselhável utilizar seu conhecimento do segredo que lhe foi confiado
pelo Sr. Daguerre, que honrou-o com sua confiança. Ele sentiu que, antes
de iniciar novas pesquisas abertas aos físicos pelo processo fotográfico,
seria mais delicado esperar até que um prêmio nacional tenha colocado
nas mãos de todos os observadores o mesmo recurso para estudo posterior.
Se nós, dessa forma, discutimos as vantagens científicas da invenção de
nosso compatriota, podemos apenas arriscar uma conjectura. Os fatos,
entretanto, são claros e óbvios e não precisamos temer que o futuro negue
nossas afirmações. A preparação empregada pelo Sr. Daguerre é um
reagente muito mais sensível à ação da luz que qualquer outro até agora
conhecido. Jamais os raios do luar, não queremos dizer em sua condição
natural mas focados pela maior objetiva ou pelo mais amplo refletor,
produziram qualquer efeito físico perceptível. Entretanto, pela ação dos
mesmos raios, as placas preparadas pelo Sr. Daguerre, seguida por
tratamento subseqüente, embranquecem a tal ponto que podemos esperar
estarmos aptos a fazer mapas fotográficos do nosso satélite. Em outras

palavras, será possível realizar, com uns poucos minutos, uma das mais
postergadas, difíceis, e delicadas tarefas da astronomia.
Um ramo importante da ciência da observação e cálculo, aquele que lida
com a intensidade da luz, a fotometria, progrediu pouco até o momento. O
físico não tem nenhum problema para determinar as intensidades
comparativas de duas luzes, uma próxima da outra e ambas
simultaneamente visíveis; mas há apenas meios imperfeitos para fazer tal
comparação quando inexiste a condição de simultaneidade, como quando
uma luz que é agora visível deve ser comparada com outra luz, que não
será visível antes que a primeira luz tenha se extinguido.
As luzes artificiais disponíveis ao observador para o propósito de
comparação, no caso acima mencionado, raramente são permanentes ou de
estabilidade desejável; e, especialmente quando lidamos com estrelas,
nossas luzes artificiais raramente possuem a brancura suficiente. Essa é a
razão das grandes discrepâncias entre a determinação das intensidades
comparadas da luz do sol e da lua, e do sol e das estrelas, como dadas por
cientistas igualmente capazes; pela mesma razão, as conclusões mais
importantes são cercadas por certas reservas quando se referem às
comparações mencionadas por último, referentes à humilde posição que
nosso sol ocupa entre os milhares de sóis com os quais o firmamento é
provido; isso, mesmo nos trabalhos dos autores menos tímidos.
Nós não hesitamos afirmar que os reagentes descobertos pelo Sr.
Daguerre irão acelerar o progresso de uma das ciências que muito honra o
espírito humano. Com sua ajuda o físico será capaz, de hoje em diante, de
prosseguir na determinação das intensidades absolutas; ele irá comparar as
várias luzes por seus efeitos relativos. Se for necessário, a mesma placa
fotográfica lhe dará as impressões dos ofuscantes raios do sol, dos raios da
lua que são trezentas mil vezes mais fracos, ou dos raios das estrelas. Ele
pode comparar estas impressões, seja ao reduzir as luzes mais intensas
com o auxílio do excelente meio que apenas recentemente foi descoberto,
uma descrição da qual seria inadequada aqui ou, como pode ser
necessário, ao permitir aos raios mais intensos agir por apenas um segundo
enquanto prossegue a ação dos demais raios por meia hora.
Além disso, quando o observador aplica um novo instrumento no estudo
da natureza, suas expectativas são relativamente pequenas em comparação
à sucessão de descobertas resultantes de seu uso. Num caso assim é
certamente o inesperado com que especialmente se deve contar.
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Soa isto como um paradoxo? Umas poucas citações provará sua
precisão.
Algumas crianças colocaram acidentalmente duas lentes, cada uma no
extremo oposto de um tubo. Dessa forma elas produziram um instrumento
que ampliou os objetos distantes e representou-os como se fossem
aproximados. Os astrônomos aceitaram esse instrumento com a esperança
de serem mais capazes de observar estrelas, que eram conhecidas por
milênios mas que, até então, podiam ser estudadas apenas
imperfeitamente. Apontando esse novo instrumento na direção do
firmamento, eles revelaram miríades de novos mundos. Penetrando nas
formações íntimas dos seis planetas dos antigos, descobre-se que são
semelhantes ao nosso mundo, com montanhas cuja altitude pode ser
calculada, perturbações atmosféricas que podem ser observadas, com os
fenômenos da formação e da fusão do gelo polar análogos aos pólos
terrestres e ao movimento de rotação que corresponde àquele que cria a
sucessão de nossos dias e noites. Apontado para Saturno, o tubo dos filhos
do fabricante de óculos de Middelburg, revela um fenômeno mais
maravilhoso que qualquer sonho da imaginação mais caprichosa.
Poderia alguém ter previsto que, quando apontado de forma a observar
as quatro luas de Júpiter, revelaria raios luminosos viajando a uma
velocidade de oitenta mil milhas (trezentos mil quilômetros) por segundo;
que, incorporado a instrumentos graduados de mensuração, demonstraria
que não existe nenhuma estrela cuja luz nos alcança em menos de três
anos; e, finalmente, que se o instrumento for usado em certas observações
pode ser concluído com razoável certeza que os raios através dos quais
discernimos, em qualquer momento, foram emitidos por certas nebulosas a
milhões de anos atrás; em outras palavras, que essas nebulosas, devido à
contínua propagação da luz, seriam visíveis a nós milhões de anos após
sua destruição completa?
O aparelho para objetos próximos, o microscópio, propicia ocasião para
observações semelhantes, porque a natureza não é menos admirável, nem
menos diversificada em sua pequenez do que em sua imensidão. Quando o
microscópio foi empregado pela primeira vez para a observação de certos
insetos, cujas formas os cientistas desejavam ver em um tamanho
ampliado para delineá-las mais precisamente, isso revelou subseqüente e
inesperadamente no ar, na água, em resumo em todos os líquidos, esses
animálculos, esses infusórios através dos quais se espera encontrar, mais

cedo ou mais tarde, uma explicação razoável para o início da vida.
Recentemente aplicado aos minúsculos fragmentos de diferentes rochas da
variedade mais dura e sólida, da qual a crosta da terra é composta, o
microscópio revelou, à contemplação perplexa do observador, que essas
rochas uma vez viveram, que são na realidade um conglomerado de
milhares e milhares de microscópicos animálculos compactamente unidos.
Deve ser lembrado que essa digressão era necessária para dissipar as
opiniões errôneas daqueles que poderiam, enganosamente, limitar a
aplicação científica dos processos do Sr. Daguerre ao esboço que
apresentamos; realmente, os fatos já justificam nossas expectativas.
Poderíamos, por exemplo, citar certas idéias do processo fotográfico, pelo
rápido método investigativo, que o topógrafo pode adotar, mas devemos
alcançar nosso objetivo mais rapidamente pela menção aqui de uma
observação singular, da qual o Sr. Daguerre nos falou ontem. De acordo
com ele, as horas da manhã e da tarde, que estão igualmente distantes do
meio-dia e a cujos horários o sol está à mesma altitude não são, entretanto,
igualmente favoráveis para a tomada de fotografias.
Dessa forma, uma imagem é produzida às sete horas da manhã algo mais
rapidamente que às cinco horas da tarde, independentemente da estação do
ano e sob as mesmas condições atmosféricas; às oito horas mais rápida que
às quatro horas, às nove mais rápida que às três. Supondo que esse
resultado deva ser verificado, o meteorologista terá um novo elemento
para registrar em suas tabelas e, às antigas observações relativas ao estado
do termômetro, barômetro, e higrômetro e a visibilidade do ar, terá de
acrescentar outro elemento que esses antigos instrumentos não indicavam.
Será necessário considerar a absorção de um caráter peculiar que não pode
ser inerte em muitos outros fenômenos, talvez até mesmo naqueles
pertencentes aos campos da fisiologia e da medicina.
Nós tentamos, cavalheiros, classificar tudo o que a descoberta do Sr.
Daguerre oferece de interesse sob quatro aspectos: sua originalidade, sua
utilidade nas artes, a rapidez de execução e a valiosa ajuda que a ciência
irá nela encontrar. Labutamos para fazê-los compartilhar nossas
convicções, que são vívidas e sinceras, porque examinamos e estudamos
tudo com o escrupuloso cuidado de custodiar à altura do dever imposto por
nosso sufrágio porque, se fosse possível errar na avaliação da importância
do daguerreótipo e do lugar que irá ocupar na estima do mundo, toda
dúvida teria desaparecido na visão da avidez com a qual as nações
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estrangeiras apontaram para um data errônea, para um fato duvidoso e
buscaram o mais leve pretexto para levantar questões de prioridade e para
tentar ganhar crédito pelo brilhante ornamento que a fotografia sempre
terá na coroa das descobertas. Não nos deixe esquecer de proclamar que
toda discussão sobre esse assunto cessou, não tanto no que toca à
autoridade incontestável e autêntica do título no qual os Srs. Niépce e
Daguerre baseiam suas reivindicações, mas principalmente devido à
incrível perfeição que o Sr. Daguerre conseguiu. Se fosse necessário, nós
não ficaríamos perplexos em apresentar aqui os testemunhos dos mais
eminentes homens da Inglaterra e da Alemanha, à luz dos quais tudo o que
dissemos, não importa quão elogioso, à respeito da descoberta de nosso
compatriota, esmaeceria completamente. A França adotou essa descoberta
e, desde o primeiro momento, tem sido orgulhosa de poder generosamente
presenteá-la ao mundo.
Nós não fomos de forma alguma surpreendidos pelo sentimento público
despertado pelo relato, devido à uma incompreensão dos motivos, que
parecia indicar que o governo negociou com os inventores e que as
condições pecuniárias do contrato proposto para sua sanção representaram
uma barganha. Torna-se necessário, cavalheiros, restabelecer os fatos.
O membro da Câmara que tinha amplos poderes delegados pelo Ministro
do Interior não barganhou com o Sr. Daguerre. Suas negociações estavam
preocupadas apenas com a questão de se a recompensa, que o hábil artista
tão bem mereceu, deva ser uma pensão fixa ou um pagamento único. O Sr.
Daguerre imediatamente observou que a estipulação de um montante pode
dar ao contrato o caráter de uma venda. É com uma pensão que se
recompensa o soldado, mutilado no campo de honra, o oficial, envelhecido
em seu posto; e dessa forma vocês honraram as famílias de Cuvier, Jussieu
e De Champollion.
Tais memórias devem ter afetado o nobre caráter do Sr. Daguerre; ele
decidiu solicitar uma pensão. A pedido do Ministro do Interior, o próprio
Sr. Daguerre estabeleceu o total da pensão em 8.000 francos, que deveria
ser igualmente dividida entre ele e seu sócio, o filho do Sr. Niépce. A
parte do Sr. Daguerre foi posteriormente aumentada para 6.000 francos,
em parte devido às condições especiais impostas sobre esse artista, a saber,
revelar o processo de pintura e iluminação das telas do diorama, hoje
reduzido à cinzas, e especialmente porque ele garantiu tornar públicas
todas as melhorias com as quais pode enriquecer seus métodos
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fotográficos. A importância dessa garantia não irá certamente parecer

duvidosa a ninguém quando ele afirma que apenas um pequeno progresso
é necessário para habilitar o Sr. Daguerre a fazer retratos de pessoas vivas
através de seu processo. No que nos compete, ao invés de recear que o Sr.
Daguerre possa delegar a outros o trabalho de acrescentar ao seu sucesso
atual, nós, ao contrário, procuramos moderar seu ardor. Isso, nós
francamente admitimos, foi o motivo que nos induziu a desejar que vocês
declarem a pensão livre das leis de restrição e de vinculação, mas
descobrimos que essa emenda será supérflua de acordo com a lei do 22o.
Floreal do ano VII e de acordo com o decreto do 7o. Termidor do ano X.
Dessa forma, a comissão unanimemente propõe que vocês adotem o
projeto do governo sem alterações.

Extraído de Classic Essays on Photography, Alan Trachtenberg, editor.

Traduzido por RUI CEZAR DOS SANTOS