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Unidade II
5 O PERÍODO ENTREGUERRAS (1919-1939)
O Período Entreguerras descreve os vinte anos que se seguiram ao fim da Primeira Guerra Mundial
pelo Tratado de Versalhes, em 1919, até o momento que teve início a Segunda Guerra Mundial, em 1939.
Esse lapso de tempo tem sido descrito na história das relações internacionais como um período sombrio
e instável, pois foram anos em que a humanidade vivenciou a depreciação da política internacional
da Liga das Nações e ainda conviveu com o cataclismo da crise capitalista de 1929, viu a ascensão de
regimes totalitários e, por fim, chegou aos horrores de uma nova guerra mundial.
Por isso, as duas décadas que são objetos de estudo aqui são descritas geralmente de forma negativa:
para Jean-Baptiste Duroselle, foi um período de “paz frustrada” ou “paz ilusória”; para René Girault e
Robert Frank, uma época de “turbulência”; Amado Cervo utiliza a expressão “instabilidade internacional”
e Hobsbawm descreve todo o período de 1914 a 1945 como “era da catástrofe” (apud CERVO, 2007b,
p. 131). E. H. Carr, precursor da área de relações internacionais, escreveu um livro voltado exclusivamente
para esse momento histórico, com o título Vinte anos de crise: 1919-1939. No livro, Carr caracteriza o
Período Entreguerras com as seguintes palavras (2001, p. 287):
O aspecto característico dos vinte anos de crise, entre 1919 e 1939, foi a
queda súbita das esperanças visionárias da primeira década para o sombrio
desespero da segunda, da utopia que não se prendia à realidade para uma
realidade da qual a utopia fora rigorosamente excluída. A miragem da década
de vinte, como agora sabemos, era o reflexo tardio de um século anterior
que não se poderia ressuscitar: a idade de ouro de territórios e mercados em
contínua expansão; de um mundo policiado pela hegemonia britânica auto-
afirmada e não muito onerosa; de uma civilização “ocidental” coerente, cujos
conflitos se poderiam harmonizar por um alargamento progressivo da área
de desenvolvimento e exploração comum; dos pressupostos fáceis de que
o que era bom para um era bom para todos, e o que era economicamente
correto não podia ser moralmente errado. A realidade, que certa vez tinha
dado conteúdo a essa utopia, já estava em decadência antes do final do
século dezenove. A utopia de 1919 era vazia e sem substância. Não exerceu
influência alguma no futuro porque não mais possuía raízes no presente.
Como observa Carr, os vinte anos de crise descrevem um momento histórico no qual o sistema
internacional se encontrava em transição. A primeira década embalou as esperanças daqueles que
esperavam que a Primeira Guerra Mundial fosse apenas uma nuvem escura passageira na história
europeia que ficara para trás, possibilitando o retorno da belle époque (expressão que descreve as
décadas de paz e prosperidade do final do século XIX).
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HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Os Estados europeus, reunidos na Liga das Nações, não obtiveram sucesso em retomar a hegemonia
e o consenso que possibilitaram o equilíbrio de poder no longo século XIX. O mundo mudara
substancialmente na virada do século XX. As relações internacionais, antes centradas na Europa,
tomaram amplitude mundial. O capitalismo expandiu-se para os quatros cantos do mapa. Os interesses
políticos tornaram-se globais. Surgiram novas potências de fora do âmbito europeu. Por todos
esses fatores, a Ordem de Viena não era mais suficiente para lidar com tão grandes transformações.
Algo novo, mais moderno e eficiente, deveria entrar em cena para regulamentar a sociedade
internacional, porém a Liga das Nações ainda não dispunha dos mecanismos necessários para isso.
Nem mesmo o capitalismo conseguiria lidar com os novos desafios da era imperial, desembocando
em uma crise sem precedentes em 1929. À década da esperança seguiu-se a década do desespero.
A desilusão foi enorme e deixou claro que não mais seria possível retomar os anos áureos
da belle époque.
No que diz respeito às relações internacionais, Amado Cervo (2007b, p. 135) explica que a
regulamentação da paz na Conferência de Paris em 1919 destruiu o sistema de equilíbrio anterior e
inaugurou um período de instabilidades, marcado “pela reviravolta nas relações entre as potências
e pelo crescimento dos egoísmos nacionais”. Em resumo, a Tratado de Versalhes pôs fim ao Concerto
Europeu, mas foi falho em desenvolver outro mecanismo capaz de superar as crises que estariam por vir
na década de 1930. Ao tentar retomar os parâmetros da Ordem de Viena, Versalhes não se deu conta de
que a sociedade internacional europeia se tornara global.
Diante da crise do Concerto Europeu na Primeira Guerra Mundial, o Tratado de Versalhes, sob
o patrocínio do presidente norte-americano, criou um novo mecanismo para a administração do
sistema de Estados: a Liga das Nações. O pacto que deu origem à Liga das Nações passou a vigorar
a partir de 10 de janeiro de 1920, sendo que a primeira reunião do Conselho aconteceu no dia
16 do mesmo mês. A Liga das Nações foi a primeira organização internacional universal, composta
inicialmente por 55 membros, abarcando todos os Estados soberanos que decidiram compor seus
quadros. Três potências, contudo, não participaram: os Estados Unidos, a Alemanha e o Japão (HERZ;
HOFFMANN, 2004).
Observação
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Com sede em Genebra, na Suíça, a Liga das Nações tinha como objetivo promover a paz, o
desarmamento e a segurança de seus membros, por meio da segurança coletiva. Conforme Mônica
Herz e Andrea Hoffmann (2004, p. 75), o conceito de segurança coletiva pode ser entendido da
seguinte maneira:
Observe que, para o bom funcionamento do sistema de segurança coletiva, faz-se necessário que
todas as grandes potências, isto é, aqueles Estados capazes de iniciar uma guerra de amplas proporções,
como foi o caso da Primeira Guerra Mundial, devem estar de acordo e participar da organização da
segurança coletiva. Entretanto, na Liga das Nações, como já foi dito, não participaram a Alemanha, os
Estados Unidos e a União Soviética, possibilitando o surgimento de dúvidas quanto à sua eficácia.
Além disso, o sistema de segurança coletiva também se baseia no pressuposto de que é possível
mudar as escolhas e o comportamento dos Estados. Dessa forma, o sistema funciona associado a
arranjos para facilitar o diálogo e possibilitar um espaço para resolução de disputas. O uso da força
fica controlado pela organização, no caso, a Liga das Nações, sendo permitido somente em caso de
legítima defesa. Enfim, o sistema de segurança coletiva tomaria o lugar do equilíbrio de poder, então em
descrédito (HERZ; HOFFMAN, 2004).
A estrutura da Liga das Nações, seguindo a tradição liberal, contemplou a ideia da divisão do poder
entre legislativo, executivo e judiciário, além do secretariado, composto dos funcionários internacionais
responsáveis pelas funções administrativas dos trabalhos na sede do organismo. Dessa forma, a Liga das
Nações compunha-se de um Conselho Executivo, da Assembleia Geral e da Corte Permanente de Justiça,
com sede em Haia, e do Secretariado, conforme figura a seguir.
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HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Quatro membros
Totalidade das nações permanentes e
representadas: quatro eletivos.
55 Estados.
Conselho
Assembleia Executivo
Corte
Secretariado Permanente
de Justiça
O Conselho Executivo da Liga da Nações era um órgão responsável pelo processo de tomada
de decisões, sendo composto por quatro membros permanentes, as grandes potências França,
Grã-Bretanha, Itália e Japão, e quatro membros eletivos. Posteriormente, a Alemanha e a União Soviética
foram incorporadas como membros permanentes, e os membros eletivos passaram de quatro para
nove. Já na Assembleia, todos os Estados estavam representados, sendo que as reuniões aconteciam
anualmente. Em ambos os órgãos, as decisões eram tomadas por consenso (HERZ; HOFFMANN, 2004).
A Corte Permanente de Justiça começou a funcionar somente em 1922, sendo composta por 11 juízes,
selecionados pelo Conselho e pela Assembleia. Suas atribuições previam o julgamento de casos e
disputas entre os Estados e a missão de opiniões. Contudo, cabia aos Estados a decisão de declarar se
aceitavam ou não a jurisdição da Corte em determinadas disputas, respeitando o princípio da soberania
dos Estados (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Saiba mais
De forma geral, a Liga das Nações tinha como atribuição promover a diplomacia aberta, mediar
conflitos, o desarmamento e, sobretudo, evitar o dilema da segurança. Porém, o pacto da Liga era
ambíguo no que dizia respeito à segurança do sistema, uma vez que as sanções ao agressor eram
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obrigatórias somente se fossem econômicas. Caso as sanções fossem militares, eram apenas facultativas.
Os meios de coerção não foram definidos, e o arbitramento obrigatório não deu certo. Por isso, a Liga
das Nações não foi capaz de evitar os conflitos da década de 1920, obtendo algum sucesso apenas em
administrar alguns conflitos territoriais (CERVO, 2007b).
Algumas participações da Liga das Nações em alguns conflitos durante o período em que esteve
ativa demonstram, ao menos, a disposição em dar credibilidade a um sistema inovador, com alta
potencialidade. Entre esses conflitos, destacam-se a imposição de sanções econômicas contra a Itália na
ocasião da invasão da Etiópia (1935); a mediação na disputa territorial entre Grécia e Bulgária (1925); a
mediação na disputa territorial entre Iugoslávia e Albânia e fronteira demarcada; a mediação da disputa
entre Suécia e Finlândia pela ilha Asland (1920); e a mediação em disputa territorial entre Bolívia e
Paraguai (1933) (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Após a criação da Liga, em 1920, os anos iniciais foram pouco frutíferos, predominando os
conflitos e a força nas disputas territoriais europeias, até 1925. Entre 1925 e 1929, a organização
vivenciou seus melhores anos. A economia internacional se recuperava rapidamente, os Estados
europeus mostravam-se mais dispostos ao diálogo, resultando em um momento de euforia que deu
origem a uma série de tratados de desarmamento em âmbito da Liga das Nações. O Tratado de
Locarno de 1925 visava garantir a fronteira da Alemanha, inseri-la no Conselho da Liga, e também
impôs a evacuação militar de seu território. Esse tratado foi visto como uma tentativa de conciliação
da Europa com a Alemanha.
Outro acordo ainda mais ambicioso foi o Pacto de Briand-Kellog, de 1928. Esse pacto teve como
propósito banir o recurso à guerra como instrumento da política internacional. Tal proposta, contudo,
não obteve êxito, uma vez que não foi posta em prática. Esses acordos mostram a boa vontade dos
líderes da época pela negociação para a paz, mas também apontam o idealismo em torno de um possível
retorno aos tempos de paz da belle époque, que já não era mais possível.
A maioria das negociações ocorridas na década de 1920 foi realizada em fóruns multilaterais como o
Conselho Supremo da Conferência de Paris e a Conferência de Embaixadores. A Liga das Nações, porém,
beneficiou-se desses acordos como complementos do Pacto e mecanismos de complementação do
sistema de segurança coletiva (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Antes desses eventos, porém, já era possível observar a dificuldade de administração da política
internacional pela Liga das Nações. Após o início da crise econômica de 1929, o nacionalismo voltou à
tona, só que agora sob a forma do totalitarismo nazifascista, e as dificuldades do momento entravaram
o diálogo internacional, resultando em projetos expansionistas e belicosos. Nessa década, vários Estados,
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especialmente grandes potências, começaram a abandonar a Liga das Nações e a investir no rearmamento.
O principal exemplo foi a Alemanha, que, sob a liderança de Adolf Hitler, retirou-se da Liga em 1933 e
deu início a um agressivo projeto expansionista na Europa Central. O Japão também se retirou em 1933,
e a Itália em 1937, seguida da maioria dos países latino-americanos (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Por isso, a Liga das Nações não conseguiu organizar a segurança coletiva nem desarmar e evitar
a Segunda Guerra Mundial. A crise da Etiópia, em 1935, quando a Itália invadiu o país africano,
foi o estopim para o total descrédito da Liga. Diante da explícita agressão italiana, a França e a
Grã-Bretanha hesitaram em condenar o agressor e em impor sanções, embora a Etiópia fosse um membro
da organização. A única medida tomada pela Liga das Nações foi a imposição de sanções econômicas,
que, devido à ausência dos Estados Unidos, não surtiram efeito. Nenhuma outra atitude mais dura foi
tomada, e a Liga das Nações acabou aceitando a anexação da Etiópia pela Itália (CERVO, 2007b).
A incapacidade da Liga das Nações de impor medidas coercitivas mais efetivas sobre a Itália abriu
precedente para outras ações do tipo que seriam levadas a cabo pela Alemanha. O episódio da Etiópia
apontava para o fato de que as regras do direito internacional não valiam para as grandes potências.
Por conseguinte, Hitler aproveitou a inércia da Liga das Nações para intervir na Guerra Civil Espanhola,
em 1936, e, em seguida, anexar a Áustria, em 1938, violando acordos internacionais. Apesar dos
protestos e sanções, a Liga das Nações não conseguiu impor medidas que pudessem abalar as ambições
italianas e alemãs.
Críticos apontaram as falhas da Liga das Nações, sua “ingenuidade” frente ao desarmamento e
à insistência no desarmamento, enquanto a Itália empregava a força para incorporar a Etiópia, e a
Alemanha perseguia uma política de investimentos no rearmamento.
Várias são os argumentos levantados para explicar o fracasso da Liga das Nações no gerenciamento
da paz e da segurança coletiva no Período Entreguerras. A ausência da grande potência norte-americana,
cujo próprio presidente havia insistido na criação da Liga, e de outras potências como Alemanha e
União Soviética no início dos trabalhos da organização coloca em questão a universalidade do sistema,
característica necessária para o bom funcionamento da segurança coletiva.
Outro fator que contribuiu sobremaneira para a ineficácia da Liga diz respeito ao seu processo
decisório, isto é, à exigência de unanimidade tanto na Assembleia quanto no Conselho Executivo,
entravando as decisões. Ademais, as resoluções desses órgãos não eram obrigatórias, ficando a critério de
cada Estado a decisão de implementação ou não das determinações da Liga (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Quanto aos mecanismos coercitivos militares, não havia referências claras em relação à definição
de situações em que o sistema deveria ser acionado. Conforme explica Mônica Herz e Andrea Hoffman
(2004, p. 87), a fraqueza da Liga consistia na dificuldade de lidar com situações em que se fazia necessária
a ação militar coletiva caso falhassem as sanções:
Dessa forma, a credibilidade da Liga das Nações foi comprometida desde a sua fundação, e a
segurança coletiva não conseguiu substituir o equilíbrio de poder e o dilema da segurança que, nos
vinte anos de crise que se seguiram desde 1919, resultaram na Segunda Guerra Mundial. No entanto,
a Liga das Nações cumpriu um importante papel de aprendizado coletivo que contribuiria para a
fundação da ONU em 1945.
5.2 A Europa
A Europa no Período Entreguerras continuou sendo o centro das relações internacionais, uma
vez que os Estados Unidos haviam se recusado a participar da Liga das Nações. Continuava a Europa
também sendo o foco das maiores instabilidades mundiais na época, marcada por inúmeras disputas
e confrontos territoriais. Contudo, o fato mais marcante no continente europeu nos vinte anos que se
seguiram à Primeira Guerra Mundial foi a rápida mudança política na maioria dos países da Europa,
passando de impérios para democracias e, depois, para regimes totalitários e ditatoriais de extrema
direita ou de esquerda. Como observou Hobsbawm (1995, p. 30), de forma geral, “nenhum dos velhos
governos ficou de pé entre as fronteiras da França e Mar do Japão”.
A Revolução Russa, ocorrida em 1917, teve influência significativa na orientação política dos regimes
europeus do Entreguerras. A ascensão vitoriosa dos revolucionários comunistas contra a fraca tentativa de
instituição da primeira democracia russa causou admiração entre alguns e horrores em outros. Na Hungria,
por exemplo, houve uma tentativa frustrada de seguir o exemplo russo em 1919. Outros movimentos
semelhantes pairavam sobre a Europa; greves em fábricas e mobilizações sociais amedrontavam as elites.
Dessa forma, esses movimentos foram apresentados como justificativas para golpes de todos os tipos pela
direita, colocando fim às democracias (BERMEO, 1998).
Os dados são impressionantes. Em 1920, 28 Estados europeus eram democracias, porém, em 1938,
13 dessas democracias haviam se tornado ditaduras (BERMEO, 1998). O aparecimento do fascismo e do
nazismo foi um acontecimento europeu que levou ao colapso das instituições liberais e democráticas,
não apenas em grande parte da Europa, mas também em outras regiões do mundo. A crise do capitalismo
e recessão econômica que seguiu na década de 1930 fortaleceram ainda mais os regimes totalitários e
levaram ao poder, na Alemanha e no Japão, as forças políticas do militarismo e da extrema direita
(HOBSBAWM, 1995).
No que diz respeito à análise das relações entre os Estados europeus, Amado Cervo (2007b)
observa que o Entreguerras pode ser dividido em três fases: a profusão de problemas e disputas entre
1920 a 1924, atestando que o Tratado de Versalhes não seria suficiente para apaziguar os ânimos; o
entendimento entre França e Alemanha entre 1925 a 1929, que possibilitou a crença de que a Liga das
Nações seria suficiente para orientar a conduta dos Estados no pós-guerra por meio do princípio de
segurança coletiva; e os anos após a crise de 1929, que trouxeram novamente à mesa de discussões os
problemas europeus da primeira fase e ainda a recessão econômica.
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Ainda nessa fase, destaca-se a situação da Alemanha, financeiramente arrasada com as indenizações
de guerra em um momento ruim para a economia europeia. O maior problema foi que o Tratado de
Versalhes não havia fixado o valor exato do total da reparação financeira a ser paga aos vencedores.
Inicialmente, até 1921, a Alemanha pagaria 20 bilhões de marcos-ouro; no entanto, após tensas
negociações, o valor definitivo foi acordado em 132 bilhões a serem pagos em anuidades calculadas
conforme os valores das exportações alemãs (CERVO, 2007b).
Apesar de acompanhar a evolução dos recursos do comércio exterior alemão, o valor total era
extremamente alto para um país que carregava sozinho todo o prejuízo da guerra e ainda tinha que lidar
com uma economia agonizante por conta do esforço de guerra. O contexto da Alemanha era sufocante
diante das reparações de guerra. Não sem razão, a Alemanha mostrou-se indignada com as reparações
e, diante das divergências em relação ao Tratado de Versalhes, iniciou negociações em separado com a
União Soviética (antigo Império Russo) para respaldar a paz entre ambos os países. No acordo assinado
entre soviéticos e alemães, estabeleceram-se relações diplomáticas, dívidas mútuas foram perdoadas e
houve a desistência de reparações de guerra.
Diante disso, a França, alegando atrasos nos pagamentos das reparações, invadiu a região alemã
do Ruhr em 1923, rica em minas de carvão, como garantia de pagamento. Tal ação gerou uma pronta
resposta dos operários alemães do local, que resistiram por meio de greves. O desgaste resultou em
nova abertura para negociações em relação à forma como a Alemanha iria realizar o pagamento das
reparações de guerra exigidas no Tratado de Versalhes. Após a análise por uma comissão de peritos, um
novo plano foi fixado para os próximos cinco anos, que previa o pagamento progressivo das reparações
e, ao mesmo tempo, previa a capacidade de recuperação da economia da Alemanha (CERVO, 2007b).
O novo acordo a respeito das reparações possibilitou a desocupação da região do Ruhr pela
França e inaugurou a possibilidade de reconciliação entre os Estados europeus. A partir de 1925, teve
início uma fase em que predominaram o entendimento e a prosperidade econômica, facilitando a
aproximação entre os antigos inimigos na Europa. Nessa fase, como já vimos, a Liga das Nações foi
prestigiada e vários acordos para a manutenção da paz foram firmados. Todavia, a crise econômica
generalizada a partir da quebra da bolsa de Nova York em 1929 pôs fim às esperanças de paz mundial
e inaugurou uma fase complicada para as relações internacionais. Sobre essa época, Hobsbawm
(1995, p. 35) observa que:
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Talvez a guerra seguinte pudesse ter sido evitada, ou pelo menos adiada,
se houvesse restaurado a economia pré-guerra como um sistema global de
próspero crescimento e expansão econômica. Contudo, após uns poucos
anos, em meados da década de 1920, nos quais pareceu ter se deixado para
trás a guerra e a perturbação pós-guerra, a economia mundial mergulhou
na maior e mais dramática crise que conhecera desde a Revolução Industrial.
E isso levou ao poder, na Alemanha e no Japão, as forças políticas do
militarismo e da extrema direita, empenhadas num rompimento deliberado
com o status quo mais pelo confronto, se necessário militar, do que pela
mudança negociada aos poucos. Daí em diante, uma nova guerra mundial
era não apenas previsível, mas rotineiramente prevista.
A crise econômica e financeira que se instaurou a partir de 1930 levou à total descrença do capitalismo
liberal, ao acirramento das tensões e lutas partidárias e à busca de alternativas para encontrar uma
saída da situação de desespero que se alastrou pelo mundo. Amado Cervo (2007b) explica que afetou
as relações internacionais de duas formas: indiferença e hostilidade pela cooperação e pela prática
generalizada de adotar soluções nacionais para problemas internacionais, como a fortificação de
barreiras alfandegárias a fim de estimular a produção nacional, dificultando o comércio internacional e
apelando ao nacionalismo.
O Tratado de Versalhes criou um grupo de nações insatisfeitas que, com o agravamento da crise
econômica internacional na década de 1930, se afastariam definitivamente da concertação com
as potências vigentes, tais como a Itália e a Alemanha. Por outro lado, por motivos diversos, novas
grandes potências não europeias tiveram dificuldades para se inserirem na política internacional
do Período Entreguerras, conduzindo suas políticas externas de forma paralela, ou até mesmo
concorrente, em relação àquela praticada no cerne da Liga das Nações. São elas: União Soviética,
Japão e Estados Unidos. Analisaremos como a conduta dessas novas grandes potências contribuiu
para aumentar o clima de tensão que precedeu a Segunda Guerra Mundial.
Uma vez vitoriosa a revolução comunista após a Revolução Russa em 1917, a União Soviética tinha
como principal objetivo de política externa garantir a sobrevivência dos princípios revolucionários em
suas fronteiras contra o temor de um cerco capitalista.
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Observação
Porém, a Revolução Russa, na cabeça de seus formuladores, não era apenas uma revolução nacional,
mas sim uma revolução mundial, em que, na Rússia, somente o primeiro passo tinha sido dado. Ademais,
os revolucionários russos conquistaram a simpatia de outros movimentos socialistas na Europa, fato
que amedrontou as elites ocidentais. A mensagem do novo governo soviético que se instalara na Rússia
era direcionada não aos demais governos nacionais, mas aos movimentos socialistas em todo o mundo
(HOBSBAWM, 1995).
A resposta imediata dos governos ocidentais foi uma brusca tentativa de isolar a União Soviética para
conter qualquer possibilidade de revolução mundial. Além disso, muitos países europeus começaram
a apoiar a guerra dos contrarrevolucionários para desestabilizar o governo soviético. A dificuldade e
os obstáculos encontrados para exportação da revolução fizeram com que os líderes da Revolução
Russa, sobretudo, Lenin, deixassem de lado essa política externa e se voltassem para a consolidação da
revolução apenas nas fronteiras russas.
Entre 1921 e 1922, Lenin deu início à nova política econômica, que, em termos de política externa,
significou, na reconstrução pacífica da Rússia, a fixação de fronteiras por meio da negociação e o
fim dos bloqueios econômicos. O novo país, doravante denominado União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS), começou a participar ativamente das conferências e reuniões internacionais, bem
como procurar parcerias comerciais. Como resultado, Alemanha e Grã-Bretanha formalizaram acordos
de cooperação comercial com a União Soviética entre 1921 e 1924. Era de grande interesse da política
externa soviética o reconhecimento internacional no novo país, e, por isso, seus líderes investiram em
acordos comerciais e alianças para obter o reconhecimento estrangeiro. No entanto, a União Soviética
não participava da Liga das Nações, considerando-a um instrumento do capitalismo (CERVO, 2007b).
Após a morte de Lenin, em 1924, Yosef Stalin assumiu o controle da União Soviética, dando
continuidade à política externa formulada por seu antecessor. Na prática, a construção e o fortalecimento
do Estado soviético eram seu objetivo principal, deixando de lado a possibilidade de levar a revolução
além das fronteiras soviéticas. A esse respeito, Hobsbawm (1995, p. 62) observa que:
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Desse modo, até a Segunda Guerra Mundial, a política externa da União Soviética seria retraída,
porém ativa no que se refere a manter a segurança externa e a paz interna por meio da manutenção de
relações diplomáticas com as demais potências (CERVO, 2007b).
O esforço para consolidação dos princípios revolucionários e de uma economia planejada e guiada
pelo governo central possibilitou que a crise econômica dos anos de 1930 não afetasse a União Soviética
da mesma forma que o mundo capitalista. Enquanto o mundo todo se debatia na estagnação e no
desemprego, na União Soviética, não só não havia desemprego como também se industrializava e crescia a
taxas impressionantes. A produção industrial triplicou e subiu de 5% a participação soviética dos produtos
manufaturados no mundo em 1929 para 18% em 1938 (HOBSBAWM, 1995).
Dessa forma, no início da Segunda Guerra Mundial, a União Soviética, que antes era um país agrário
e uma potência menor entre os grandes, derrotada pela Alemanha em 1917, havia se transformado em
uma potência industrial de primeira grandeza e polo de poder econômico, porém com uma ideologia de
organização do Estado e da sociedade completamente diversa da dos aliados ocidentais. Causa mesmo
estranheza pensar que durante a Segunda Guerra Mundial os soviéticos seriam aliados dos capitalistas
franceses, britânicos e norte-americanos.
O Japão saiu como um dos vitoriosos na Primeira Guerra Mundial, tornando-se uma potência
hegemônica no extremo oriente. Pelo Tratado de Versalhes, o Japão obteve as colônias alemãs no
oriente e ainda não foi criticado a respeito de seu expansionismo na China. Entretanto, os interesses
japoneses no Pacífico, em pouco tempo, começaram a se chocar com uma nova grande potência que
se movimentava na mesma direção: os Estados Unidos. A rivalidade entre ambos seria um fator de
contribuição para aproximação entre Japão e Alemanha.
Essa aliança com os alemães nada tinha a ver com as ideologias vigentes na época. O Japão da
década de 1930, apesar de ser sustentado por um governo imperial nacionalista de direita, não era
fascista, como os governos da Itália e da Alemanha. Porém, a estratégia expansionista japonesa facilitou
o entendimento com as potências europeias, na medida em que se acirravam os problemas com os
Estados Unidos no Pacífico.
Além disso, o grande número populacional, a insuficiência de recursos naturais e a baixa possibilidade
de dinamizar o comércio exterior devido ao protecionismo generalizado instaurado nos anos de crise
causaram impactos negativos sobre o Japão em sua política externa. Diante dessas condições, Amado
Cervo (2007b) explica que o Japão possuía apenas três alternativas de política externa: conciliar-se
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com os ocidentais, caso não pudesse enfrentá-los; investir na afirmação da hegemonia regional sem,
contudo, confrontar os ocidentais; e confrontar a ordem internacional imposta a partir do Tratado de
Versalhes para superar o isolamento.
Na década de 1930, o Japão gradualmente optou pela terceira opção, dando continuidade à
construção do Império Japonês na Ásia. A Manchúria, desde a guerra russo-japonesa de 1904-1905, já
era economicamente dominada pelo Japão, apesar de integrar o território da China. A partir de 1930,
o Japão investiu definitivamente na região da Manchúria, enfrentando a resistência chinesa, que, no
entanto, só fez empurrar os japoneses em direção à Manchúria do Sul, invadida em 1931.
Uma vez estabelecidos no local, os japoneses instalaram um novo governo, colocando lá o último
imperador da dinastia Manchu. Em seguida, em 1932, forjaram a independência da Manchúria em
relação à China e criaram o Estado fantoche de Manchuko, subordinado ao Japão. Militarmente incapaz
de expulsar os japoneses, a China tentou apelar à Liga das Nações, não somente devido à situação da
Manchúria, mas também por causa da incursão do Japão em outras áreas de seu território (CERVO, 2007b).
Os ocidentais, contudo, pouco fizeram para paralisar o avanço japonês sobre a China e ainda
desmoralizaram a Liga das Nações devido à recusa de impor sanções mais efetivas ou militares ao Japão.
Para britânicos e franceses, a China não suscitava nenhum interesse naquele momento, além de ser
considerada uma potência menor entre o concerto de nações. Dessa forma, Amado Cervo (2007b, p. 150)
observa que “a Manchúria permaneceu como Estado criado à força contra as regras da segurança
coletiva, como primeiro golpe mortal contra a autoridade da Sociedade das Nações”.
Já para os Estados Unidos, a expansão japonesa no continente asiático não representava uma ameaça
aos seus interesses na região, visto que sua política externa limitava-se ao local das ilhas oceânicas no
Pacífico. Além disso, os norte-americanos preferiam empregar exclusivamente a diplomacia nos assuntos
referentes à Ásia. Após esses sucessos, o Japão finalmente retirou-se da Liga das Nações em 1933.
Os Estados Unidos, ao fim da Primeira Guerra Mundial, tornaram-se a maior potência econômica
no sistema internacional. Distantes das instabilidades políticas e dos problemas territoriais europeus, os
norte-americanos se encontravam em uma posição privilegiada de segurança internacional e de
estabilidade interna. Apesar de o presidente norte-americano ter sido um dos entusiastas da Liga das
Nações, o senado, empregando o discurso de tradição não intervencionista dos Estados Unidos em
assuntos europeus, rejeitou o Tratado de Versalhes, que impediu os Estados Unidos de participarem da
recém-criada organização. Dessa forma, foi assinado um acordo em separado com a Alemanha que
possibilitou a retirada das forças militares norte-americanas da Europa (CERVO, 2007b).
81
Unidade II
Havia, portanto, amplas possibilidades para a elaboração da política externa dos Estados Unidos;
porém, sua ação concentrou-se na plataforma regional como estratégia para consolidação da base
continental de segurança. Desse modo, os norte-americanos privilegiaram as relações com a América
Latina, que, durante a guerra, havia substituído a Europa pelos Estados Unidos como destino de suas
exportações e como fonte de importações. As conferências pan-americanas foram o foco nesse período,
parte de uma estratégia para alimentar a solidariedade continental e desfazer a imagem agressiva e
interventora dos Estados Unidos na região do passado recente.
Saiba mais
Em menos de dois anos, todos os dados econômicos, antes em franca ascensão, tornaram-se
negativos. Entre todos os indicadores, o mais assombroso foram os níveis de emprego. Sobre o tema,
Hobsbawm (1995) observa que, no pior período da Depressão (1932-1933), 22% a 23% da força de
trabalho britânica e belga, 24% da sueca, 27% da americana, 29% da austríaca, 31% da norueguesa,
32% da dinamarquesa e nada menos que 44% da alemã não tinham emprego.
Para compreensão dos motivos que levaram a uma crise tão profunda no sistema capitalista após
uma rápida expansão, não basta apenas apontar para os quatro anos da guerra mundial. Os Estados
Unidos haviam participado do conflito somente em seus últimos meses e, mesmo assim, o polo de seu
poder econômico esteve distante dos principais campos de batalha e não foi afetado pela destruição
da guerra. Ao contrário, os Estados Unidos foram o país que mais se beneficiou dos anos de conflito,
pois a guerra não apenas reforçou sua posição como maior produtor industrial do mundo, como os
transformou no maior credor do mundo. Tudo isso, contudo, não foi suficiente para impedir que
os norte-americanos sofressem duramente com os efeitos da depressão capitalista da década de 1930.
82
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A pior crise capitalista do século XX não pode ser explicada sem se analisar a posição central que os
Estados Unidos, enquanto nova grande potência industrial e econômica mundial, ocupavam no cenário
global, bem como as atitudes tomadas pelos norte-americanos a esse respeito. Hobsbawm (1995,
p. 82) cita dois fatores para a explicação da crise, sendo que um deles diz respeito exclusivamente
aos Estados Unidos:
Em suma, não há explicação para a crise econômica mundial sem os EUA. Eles
eram, afinal, tanto o primeiro país exportador do mundo na década de 1920
quanto, depois da Grã-Bretanha, o primeiro país importador. Importavam
quase 40% de todas as exportações de matérias-primas e alimentos dos
quinze países mais comerciais, um fato que ajuda muito a explicar o
desastroso impacto da Depressão nos produtores de trigo, algodão, açúcar,
borracha, seda, cobre, estanho e café. Pelo mesmo motivo, tornaram-se a
principal vítima da Depressão. Se suas importações caíram em 70% entre
1929 e 1932, suas exportações caíram na mesma taxa. O comércio mundial
teve uma queda de quase um terço entre 1929 e 1939, mas as exportações
americanas despencaram para quase a metade.
Nesse sentido, o primeiro fator de suma relevância para compreensão da Grande Depressão era o
crescente desequilíbrio na economia internacional devido à assimetria de desenvolvimento entre os
Estados Unidos e o resto do mundo, isto é, o sistema mundial não funcionou porque, ao contrário
da Grã-Bretanha, que fora o centro antes de 1914, os Estados Unidos não precisavam muito do resto
do mundo e, portanto, diferentemente da Grã-Bretanha, que cuidava para que seu sistema financeiro
permanecesse estável, os Estados Unidos não se preocuparam em agir como estabilizador global.
Os norte-americanos não dependiam tanto do resto do mundo porque sua história foi marcada pela
busca da autossuficiência da produção interna. Porém, o aprendizado dos anos de crise influenciou
os Estados Unidos para assumir a responsabilidade pela estabilidade da economia mundial após 1945
(HOBSBAWM, 1995).
O segundo fator observado por Hobsbawm (1995) para o entendimento da Grande Depressão diz
respeito à incapacidade da economia mundial de gerar demanda suficiente para sustentar uma expansão
em longo prazo. As desigualdades resultantes do capitalismo liberal estagnaram o crescimento dos
salários das classes menos favorecidas, ao passo que os mais ricos desfrutavam dos altos lucros para
investir na produção. Com os salários ficando para trás, a demanda não cresceu o bastante para expandir
o consumo, gerando uma crise de superprodução.
Um desafogo para a economia norte-americana viria apenas com a eleição de Franklin D. Roosevelt,
em 1933, que elaborou um conjunto de medidas com o objetivo de superar ou ao menos amenizar os
efeitos da crise. Esse programa político-econômico ficou conhecido como New Deal, em português, Novo
Acordo, cujas principais ações previstas eram: desvalorização do dólar para dinamizar as exportações;
criação de um sistema de seguridade social para amparar os trabalhadores; controle estatal sobre os preços
e a produção; empréstimos a bancos para evitar a falência do sistema financeiro; investimento maciço
em uma grande quantidade obras públicas para gerar empregos e renda. Este último item era de suma
importância, dado o grande número de desempregados, e, por isso, foi o principal objetivo do New Deal.
83
Unidade II
As medidas do New Deal, de forma geral, foram bem-sucedidas, uma vez que, dez anos após sua
implementação, a economia norte-americana já conseguia recuperar-se razoavelmente da Grande
Depressão. Porém, os efeitos da crise econômica somente seriam completamente superados com o
esforço dos investimentos governamentais na Segunda Guerra Mundial.
Uma característica de extrema importância que marcou o período entre as duas grandes guerras
mundiais foi a constante pluralização da sociedade internacional. Até a Primeira Guerra Mundial, a
Europa, a partir do moderno sistema de Estados soberanos, havia sido o centro das relações internacionais,
e foi a partir do continente europeu que esse sistema, com suas regras e padrões, expandiu-se para o
mundo durante o século XIX.
Entretanto, no Período Entreguerras, era evidente a decadência europeia por dois motivos
substanciais: primeiro, os quatro anos de guerra haviam não apenas enfraquecido as potências europeias,
como também destruído o Concerto Europeu, mecanismo de equilíbrio de poder pelo qual as relações
internacionais eram regulamentadas até então; e, segundo, o número de novos membros integrantes
dessa sociedade ampliou consideravelmente, ampliando também os interesses em pauta.
Foi visto que novas potências não europeias tornaram-se atores importantes e com peso considerável
na dinâmica internacional. Porém, outros Estados, ainda que com menor capacidade que as grandes
potências, também contribuíram para a universalização da sociedade internacional no período analisado,
impondo novas necessidades de organização sistêmica.
Entre esses novos atores, a América Latina, desde o início do século XIX, cumpria um papel fundamental,
uma vez que representava a extensão da sociedade internacional europeia tanto no compartilhamento
de ideais e valores quanto na formação de uma rede de contatos e fluxos entre o continente europeu
e a sub-região americana. Até a Primeira Guerra Mundial, o comércio exterior da América Latina era
realizado quase em sua totalidade com a Europa, além de receber grande parte dos migrantes europeus
que vinham em massa para a América.
84
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
aos poucos, possibilitando a realização da política de boa vizinhança pelos Estados Unidos nos anos que
se seguiram (CERVO, 2007b).
Na Liga das Nações, a presença latino-americana era forte; no entanto, uma vez que o organismo
era monopolizado pelos problemas europeus, os países da América Latina se retiraram e focavam seus
esforços diplomáticos nas conferências pan-americanas, em que os princípios de não intervenção e
autodeterminação eram amplamente debatidos. Além disso, as comissões de arbitragem organizadas a
partir da solidariedade continental tiveram papel importante na resolução de disputas fronteiriças que
surgiram nesse período, envolvendo Peru e Colômbia, Peru e Chile e Paraguai e Bolívia (CERVO, 2007b).
Assim, durante as duas guerras mundiais, a América Latina, região distante dos focos de tensão
internacional, preocupava-se com suas próprias demandas em âmbito apenas continental, devido à falta
de abertura para discussão da pauta latino-americana nos organismos multilaterais mundiais. A relativa
tranquilidade latina na década de 1930, porém, foi fortemente afetada pela crise econômica internacional.
A Grande Depressão, em um primeiro momento, teve impactos diretos sobre o sistema financeiro e a
política econômica dos países latino-americanos. Em um segundo momento, houve aprofundamento da
crise, afetando também a própria estrutura política e social das sociedades em questão.
No que diz respeito à orientação econômica, o impacto negativo ocorreu tanto sobre as exportações
de alimentos e outros produtos primários quanto sobre a importação de bens manufaturados. Devido
à dificuldade de equilibrar a balança de pagamentos, a solução encontrada pelos latino-americanos foi
investir na industrialização como forma de substituir as importações, de modo a produzir internamente
aquilo que já não havia recursos para comprar de fora (CERVO, 2007b).
Já no que diz respeito à estrutura política, os governos locais, geralmente oligarquias sustentadas
pela agroexportação, caíram com o impacto da crise. No entanto, como observa Hobsbawm
(1995), não caíram todos na mesma direção. Na Colômbia, no Chile e no Peru, chegaram ao poder
governos de orientação social, ao passo que na Argentina e no Brasil ascenderam políticos de cunho
populista-nacionalista, com orientação mais conservadora, porém de amplo apelo popular. Em resumo,
apesar das diferenças ideológicas, o fato é que novas elites, ligadas aos setores urbanos e industriais,
chegaram ao poder nos governos de vários países latino-americanos, fortalecendo a centralidade do
Estado como condutor das políticas econômicas.
A formação da Commonwealth teve início nas conferências imperiais realizadas pela Grã-Bretanha
com suas colônias a partir de 1887 com o objetivo de viabilizar um canal de diálogo que possibilitasse
mais autonomia aos domínios. Durante a Primeira Guerra Mundial, as colônias destacaram soldados para
lutar pela causa britânica e, por conseguinte, exigiram participar da Conferência de Paris com delegados
próprios. Ao fim, assinaram o Tratado de Paz e ingressaram na Liga das Nações (CERVO, 2007b).
Na Conferência Imperial de 1926, foi finalmente decidido que a Grã-Bretanha e seus domínios
reconheciam-se como iguais e soberanos em termos de autodeterminação e política externa, sendo
que permaneciam unidos ao reconhecer a família real britânica como representante da unidade e se
associavam livremente em uma Comunidade Britânica de Nações. Assim, em 1931, pelo Estatuto de
Westminster, foi formalizada a independência de Austrália, Canadá, Nova Zelândia e África do Sul.
Saiba mais
https://thecommonwealth.org/
A estrutura política desses novos países segue as características do parlamentarismo britânico. Cada
nação tem seu próprio parlamento, que elege o primeiro-ministro, o chefe de governo, responsável pela
execução de um plano de governo internamente. No plano externo, o chefe de Estado é representante
da monarquia britânica, atualmente, a rainha Elizabeth II. Na prática, os interesses de cada Estado são
representados pelo seu parlamento, sendo a monarquia apenas representação simbólica de valores e da
solidariedade entre as nações de herança cultural e colonial britânica.
A partir de 1949, a estrutura da Commonwealth foi ampliada para possibilitar o ingresso de novos
Estados originários do antigo Império Britânico, que, todavia, optaram pela forma de governo republicana
e, por isso, não reconheciam a família real britânica como chefe de Estado, mas tinham a intenção de
compartilhar os valores e participar da cooperação com as demais antigas colônias britânicas. Atualmente,
a Commonwealth conta com 53 membros, sendo a maioria antigas colônias britânicas, porém já não é
mais necessário ter sido parte do Império Colonial Britânico para ingressar na Comunidade.
Observa-se, portanto, que a Primeira Guerra Mundial foi o primeiro conjunto de acontecimentos que
abalou seriamente a estrutura do colonialismo mundial. Além de destruir o Império Alemão, o Império
Austro-húngaro e o Império Otomano, gerou tensões nas regiões dependentes do Império Britânico
devido aos recursos que a Grã-Bretanha precisou mobilizar (HOBSBAWM, 1995).
86
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A Primeira Guerra Mundial abalou principalmente o Império Britânico, porém, a Grande Depressão
atingiu todo o mundo colonial. No final da década de 1930, a crise do colonialismo espalhava-se por
outros impérios, e apenas permaneciam em expansão os Impérios Italiano e Japonês. No Império Francês,
vários movimentos políticos pela independência surgiram no norte da África, especialmente na Argélia e
na Tunísia. Na Indonésia, colônia holandesa, Achmed Sukarno dava início a um movimento pacífico pela
autonomia, da mesma forma que Mahatma Gandhi na Índia, ainda uma colônia britânica (CERVO, 2007b).
Contudo, esses movimentos ainda eram frágeis, o perigo do anticolonialismo ainda parecia remoto
aos olhos dos colonizadores europeus. A maior parte da região central da África continuava calma,
pois os nacionalismos locais eram raros e pouco articulados, visto que a economia e sociedade colonial
consistiam basicamente no universo rural.
Foi somente após a Segunda Guerra Mundial que houve uma transformação significativa nos
movimentos pela independência nos Impérios Coloniais. De acordo com Hobsbawm (1995), o fato de
que a França e a Grã-Bretanha eram facilmente acuadas pelas potências do eixo, isto é, a Alemanha
nazista, Japão e Itália, na maior parte da Segunda Guerra Mundial, mostrou aos povos colonizados que
as metrópoles colonizadoras não eram invencíveis. Além disso, as potências coloniais já se encontravam
fracas demais, mesmo após a vitória com auxílio dos Estados Unidos e da União Soviética, para manterem
suas possessões imperiais.
Diferentemente da Primeira Guerra Mundial, que gerou vários debates sobre sua causa, a Segunda
Guerra Mundial, segundo Eric Hobsbawm (1995), pode ser resumida em duas palavras: Adolf Hitler. Não
houve dúvidas de que as agressões resultantes na nova guerra mundial foram causadas pela Alemanha
nazista e seus aliados. Os Estados arrastados para a guerra contra os três (Alemanha, Itália e Japão) não
queriam a guerra e fizeram de tudo para evitá-la. A ascensão de Hitler ao poder na Alemanha em 1933,
portanto, foi o ponto de partida para a retomada das hostilidades na Europa.
Claro que a complexidade e instabilidade do sistema internacional durante os vinte anos entre as
duas guerras mundiais não permitem que a resposta à pergunta sobre a causa da Segunda Guerra
Mundial seja assim tão simples. Tanto que o mesmo Hobsbawm observa que, na “era da catástrofe”, a
Segunda Guerra nada mais é do que a continuação da Primeira. De fato, a paz imposta pelo Tratado de
Versalhes não poderia ser duradoura, pois os termos do tratado não possibilitaram a reintegração dos
vencidos. Pelo contrário, tentaram esmagar a Alemanha de tal forma que tornasse impossível um novo
conflito, mas falharam:
87
Unidade II
A situação imposta por Versalhes na Europa, seguida do fracasso da Liga das Nações em regulamentar
a ordem do pós-guerra, era muito instável. Esse contexto foi ainda agravado pelos efeitos da Grande
Depressão gerada pela crise econômica de 1929. A insatisfação alemã quanto às cláusulas da paz,
principalmente no que se refere às reparações de guerra, tornou-se insustentável com a instauração
da crise econômica dos anos 1930. Por isso, todos os partidos na Alemanha, independentemente de
ideologias, combinavam no que diz respeito à condenação do Tratado de Versalhes.
Porém, não apenas a Alemanha saiu insatisfeita com o acordo de paz do pós-guerra; a Itália e o
Japão, mesmo do lado dos vencedores, também não ficaram satisfeitos. Os italianos obtiveram algumas
possessões territoriais pretendidas em troca da participação na Primeira Guerra ao lado da Tríplice
Entente, contudo, somente uma parcela foi atendida, ficando distante daquilo que havia sido prometido
previamente. O Japão, por sua vez, ansiava tornar-se uma potência colonial nos moldes do colonialismo
ocidental, visto que suas metas de crescimento econômico e a pressão demográfica faziam com que a
necessidade de recursos naturais fosse cada vez maior. Essa pretensão, porém, foi ignorada em Versalhes
(HOBSBAWM, 1995).
Na Alemanha, além das reparações, várias questões deixavam a análise mais complexa. A ascensão
de Hitler no momento que o fascismo se expandia na Itália de Mussolini representava o declínio
da sociedade liberal e início de uma política de reformulação tanto da sociedade alemã e europeia
quanto de toda a ordem internacional. Para tanto, o plano formulado por Hitler previa a reformulação
das relações internacionais a partir da formação do III Império Alemão sob sua liderança. Essa nova
Alemanha incluía o rearmamento, a anexação de todos os territórios onde houvesse alemães, o
extermínio de povos considerados inferiores e a expansão do Império Alemão na Europa oriental.
Uma vez alcançados esses objetivos, o próximo passo seria o domínio de toda a Europa e mundial da
Alemanha (CERVO, 2007b).
Observação
O movimento fascista do qual derivou o nazismo alemão através do partido nacional-socialista era
de extrema direita, inconformado com os valores iluministas do século XVIII propagados pela Revolução
Francesa, quais sejam, democracia, liberalismo e, especialmente, comunismo. Autoritário e hostil às
instituições liberais, favorecia os militares e o poder da polícia como instrumentos de coerção contra
a subversão, além de promover o nacionalismo, em parte, por causa do ressentimento contra Estados
88
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
estrangeiros e as guerras perdidas, e, em parte, porque o lema da bandeira nacional era um caminho
para agradar as massas e conseguir apoio e legitimidade (HOBSBAWM, 1995).
Nesse processo, a promoção de uma suposta “raça superior” resultou na perseguição e extermínio
em massa de todos os outros povos considerados inferiores, especialmente os judeus, mas não somente,
pois ciganos, negros, homossexuais e dissidentes políticos também foram perseguidos e mortos pelo
regime nazista. Somente nos campos de concentração, foram mortos cerca de seis milhões de judeus,
episódio que entrou para a história como Holocausto.
Saiba mais
O sentimento de ódio aos judeus teve início no final do século XIX em vários países, porém era
mais forte na Europa central e oriental, onde a quantidade de judeus era maior. Esse sentimento tinha
origem no ressentimento da sociedade em ampla crise social e econômica, que pressionava as pessoas
comuns nos movimentos trabalhistas ou no trabalho de grandes empresas capitalistas. Tinha origem
também no ressentimento pela perda de posição social que havia ocupado no passado, ou no status
que era almejado, mas não possível na atual estrutura social.
Conforme explica Hobsbawm (1995, p. 99), os judeus representavam não apenas as funções sociais
almejadas que por eles eram ocupadas em sua maioria, mas também as liberdades possibilitadas pelas
revoluções sociais do século XVIII:
89
Unidade II
cunho fascista dominaram a maior parte da Europa após 1933 e organizavam sua política externa, as
negociações de paz ou guerra, em termos de suas aspirações internas que perseguiam como necessidade
de vida ou morte. Dessa forma, a Europa foi empurrada para a guerra quando Hitler começou a pôr em
prática sua política de expansão territorial alemã para leste à custa de outros Estados enquanto uma
questão de necessidade, o espaço vital, para a Alemanha.
A formação do III Império Alemão ocorreu em etapas com pouca resistência por parte das democracias
europeias que ainda existiam. O primeiro passo foi a anexação da Áustria no início de 1938 por meio
de uma intervenção seguida da realização de um referendo para aprovar as leis que possibilitariam a
união entre as duas nações. Nesse referendo, 99% dos votos foram favoráveis à junção. Após a anexação
da Áustria, Hitler avançou sobre a Tchecoslováquia, onde viviam cerca de três milhões de alemães na
região de Sudetos.
A charge de Belmonte, de 1939, a seguir satiriza o pacto de não agressão firmado entre os líderes
alemão, Hitler, e soviético, Stalin, deixando entender que esse pacto era secreto não apenas para o
restante do mundo, mas também havia intenções ocultas de cada um dos líderes em relação ao outro.
90
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Em fins de agosto de 1939, Hitler já se preparava para atacar a Polônia, ignorando as ameaças de
França e Grã-Bretanha. O líder alemão achava as democracias ocidentais fracas e dependentes da opinião
pública, que, no Período Entreguerras, estava toda mobilizada em favor da paz devido aos horrores
vivenciados durante a Primeira Guerra Mundial. A invasão da Polônia ocorreu em 1º de setembro de
1939, seguida dias depois pela mobilização da União Soviética, e colocou em prática o plano de divisão
do território polonês (CERVO, 2007b).
Entretanto, para a surpresa de Hitler, no dia 3 de setembro, Grã-Bretanha e França declararam guerra
à Alemanha. Na opinião de Amado Cervo (2007b), não era intenção da Alemanha iniciar uma
guerra geral, porém as garantias dadas ao governo polonês por franceses e britânicos diante das
ambições de Hitler tornaram o conflito inevitável quando o líder alemão procedeu com a invasão da
Polônia. Por outro lado, a economia alemã estava em franca expansão e recuperação após as crises e
reparações exigidas no Tratado de Versalhes e dependia de volumes consideráveis de matérias-primas
insuficientes no território alemão.
Eric Hobsbawm (1995, p. 36) observa que não houve um esforço significativo por parte das
democracias ocidentais, notadamente, França e Grã-Bretanha, para evitar a guerra quando ainda era
91
Unidade II
possível, especialmente por meio da Liga das Nações, muito embora nenhuma das duas potências
desejasse um novo conflito bélico e as potências do Eixo sinalizassem claramente que buscavam a guerra:
A dificuldade de evitar a Segunda Guerra Mundial só pode ser compreendida a partir da perspectiva
da instabilidade geral que se instaurou abertamente no sistema internacional ao longo de todos os
vinte anos do Entreguerras. As mudanças decorrentes da expansão do sistema europeu para todo o
globo no final do século XIX resultaram na insuficiência dos mecanismos de administração da política
internacional para dar conta da complexidade do mundo que surgiu no despertar do século XX.
Apesar da tentativa de reorganizar a ordem mundial pelo Tratado de Versalhes, que resultou em total
fracasso, e pela proposta de Segurança Coletiva na Liga das Nações, esse novo mecanismo, contudo,
ainda não havia sido amadurecido coletivamente o suficiente para dispor da força necessária para
o bom funcionamento. O Período do Entreguerras, portanto, pode ser descrito como um período de
transição, ou seja, um momento de gestação de uma nova ordem mundial que surgiria somente após a
Segunda Guerra Mundial.
Na figura a seguir é possível acompanhar a evolução do sistema internacional, bem como algumas de
suas principais características desde a formação do sistema de Estados e da sociedade europeia no século
XVII até o período estudado. Observe que, no decorrer da evolução do sistema de Estados, o mecanismo
da razão de Estado, do sistema de Vestfália, foi substituído pelo equilíbrio de poder no sistema europeu,
que, por sua vez, foi substituído pela Segurança Coletiva na Liga das Nações no processo de transição
para um sistema mundial.
92
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Sistema europeu
A Segunda Guerra Mundial foi uma guerra total, sem precedentes na história mundial. Isso significa
que, em termos econômicos, todos os recursos disponíveis foram empregados no esforço de guerra,
seja a mão de obra, sejam os recursos materiais. Mulheres operárias, escravos judeus em campos de
trabalhos forçados, produção industrial em massa, tudo foi mobilizado em razão da guerra (TOTA, 2011).
Além disso, diferentemente da Primeira Guerra, que na maior parte do tempo foi travada na Europa, a
Segunda Guerra, efetivamente, alcançou todos os povos do globo, consolidando a mundialização das
relações internacionais (SARAIVA, 2007a).
Foi total também pela proporção de crueldade e destruição. Estima-se que o número de mortos tenha
chegado a 85 milhões de pessoas, sendo que, desse total, 50 milhões eram civis. Os nazistas procederam
a maior perseguição e aniquilação em massa de judeus, outras minorias e dissidentes políticos. Nos
meses finais do conflito, os Estados Unidos utilizaram duas bombas atômicas para derrotar o Japão, uma
na cidade de Hiroshima e outra em Nagasaki, fazendo milhares de vítimas civis e ameaçando o mundo
com uma nova arma de destruição em massa. A guerra já não fazia distinção entre civis e militares.
Os objetivos militares, de igual forma, também eram ilimitados, isto é, previam a submissão absoluta
do inimigo, diferentemente de outras guerras em que o objetivo era impor a condição de paz. Por um
lado, Hitler planejava subverter a sociedade liberal e impor uma nova ordem social baseada no nazismo
em todo o ocidente. Por outro, aos Aliados, isto é, União Soviética, Grã-Bretanha e Estados Unidos,
só interessava a rendição incondicional da Alemanha e extirpação total do nazismo; não tinham a
pretensão de negociar qualquer outra condição de paz (TOTA, 2011).
Mais ainda que a Grande Guerra, a Segunda Guerra Mundial foi portanto
travada até o fim, sem ideias sérias de acordo em nenhum dos lados, com
exceção da Itália, que trocou de lado e regime político em 1943 e não foi
inteiramente tratada como território ocupado, mas como um país derrotado
com um governo reconhecido. [...] Ao contrário da Primeira Guerra Mundial,
essa mútua intransigência não exige explicação especial. Era, de ambos os
93
Unidade II
As causas pelas quais se matava e morria na Segunda Guerra Mundial eram muito mais amplas
que os interesses reconhecidamente nacionais, tanto que promoveram a união temporária entre duas
ideologias iluministas que seriam rivais nos anos da Guerra Fria: o capitalismo liberal, representado pelos
Estados Unidos, e o socialismo real, representado pela União Soviética. Tal aliança só foi possível porque
ambos viam em Hitler um perigo maior do que cada um ao outro.
Conforme explica Hobsbawm (1995), o que acabou possibilitando a união contra a Alemanha foi
o fato de que não se tratava apenas de um Estado-nação descontente com a situação, mas de uma
ideologia que dominava as ambições de uma nação. Em suma, a Segunda Guerra Mundial foi total
porque foi uma guerra civil ideológica internacional: de um lado, comunistas e capitalistas descendentes
do Iluminismo e das grandes revoluções, incluindo a Revolução Russa; e, do outro, seus adversários,
forças reacionárias.
A Segunda Guerra Mundial desenrolou-se entre 1939, com a invasão da Polônia pelos alemães em
1º setembro, e encerrou-se com a total rendição do Japão em 2 de setembro de 1945. Durante os seis
anos de conflitos, é possível observar duas fases, que caracterizam a mudança das forças da política
internacional. A primeira fase se desdobra entre o início das hostilidades e vai até junho de 1941,
quando a Alemanha ataca a União Soviética. Essa fase se caracteriza pela centralidade da Europa nas
operações de guerra, apontando para um período de continuidade do conflito de 1914. O Japão seguia
isolado em suas ações militares no leste da Ásia.
No ano de 1941, dois fatos mudaram os rumos da guerra: a já mencionada invasão da União
Soviética pelas forças do Eixo e o ataque japonês à base norte-americana de Pearl Harbor em 7 de
dezembro de 1941. Nessas ações, foram unidas as duas guerras, na Europa e na Ásia, que antes ocorriam
paralelamente, resultando na mundialização geográfica do conflito bélico. Ambas as ações também
provocaram as hostilidades contra o Eixo das duas maiores potências mundiais fora do círculo europeu,
os Estados Unidos e a União Soviética, que imporiam as novas regras do jogo geopolítico no cenário
internacional diante da agonia europeia. Entre 1941 e 1945, portanto, desenvolveu-se a segunda fase
da guerra, período em que se tornou efetivamente mundial.
Ao fim da Segunda Guerra Mundial, surgiu uma nova ordem internacional que não só colocou fim
à supremacia da Europa dos séculos anteriores, mas também elevou dois Estados de fora das fronteiras
europeias à condição de superpotências. Esse curto período, que se estende de 1945 a 1947, também
integra os estudos aqui mencionados, uma vez que um novo ordenamento internacional nasceu das
negociações para a regulamentação da paz ao final do conflito. Porém, antes mesmo de encerrar as
94
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
hostilidades definitivamente, ainda nas conferências prévias, já existiam divergências entre os três
grandes vitoriosos (Grã-Bretanha, Estados Unidos e União Soviética), marcadamente, entre russos
soviéticos e norte-americanos, que convergiriam para a Guerra Fria em 1947.
A guerra europeia teve início em 1º de setembro de 1939 com a invasão da Polônia pela Alemanha,
seguida da invasão da União Soviética. Até então, França e Grã-Bretanha haviam sido condescendentes
com os planos de Hitler de unir em uma só pátria todos os povos de origem alemã, porém a invasão da
Polônia, aliada das potências ocidentais, resultou na imediata declaração de guerra à Alemanha nazista
por parte da França e Grã-Bretanha.
Entretanto, apesar da declaração formal de guerra, os líderes franceses e britânicos nada fizeram
para ir em socorro da Polônia, dando plena liberdade para Hitler agir como queria no Leste Europeu.
Isso porque britânicos e franceses não estavam preparados para uma guerra contra a Alemanha, uma
verdadeira máquina de combate sob o comando de Hitler. Por isso, França e Grã-Bretanha retardaram
o máximo possível o enfrentamento, de forma a conseguir tempo para se equipar (SARAIVA, 2007a).
Também a Itália, aliada da Alemanha no Eixo, retardou sua entrada na guerra devido a sua baixa
capacidade bélica.
Para atingir tais objetivos, a estratégia militar de Hitler consistia em realizar uma rápida guerra
ofensiva, conhecida por Blitzkrieg ou guerra-relâmpago. Com movimentos velozes do Exército Alemão,
Hitler planeja dominar rapidamente a frente ocidental para então voltar-se contra a União Soviética
e concluir a formação do Império Alemão no centro da Europa, tarefa que já havia começado com a
ocupação da Polônia.
Após a união dos alemães sob um único governo, a Polônia passava a ser central na estratégia de
Hitler, porque, à época, esse país dividia o território da Alemanha. A Prússia oriental estava a leste
da Polônia, e, diante disso, Hitler reivindicava o direito de livre passagem ao restante do território
alemão. A invasão da Polônia procedeu-se de forma rápida, conforme a tática da guerra-relâmpago.
Os poloneses foram pegos de surpresa e estavam despreparados, ao passo que as forças alemãs eram
95
Unidade II
muito superiores. Em apenas vinte dias após a invasão, a Polônia foi derrotada e anexada ao território
alemão (TOTA, 2011).
Despreparadas, França e Grã-Bretanha declararam guerra à Alemanha, mas não foram em socorro
da Polônia. Franceses tomaram posição na fronteira franco-germânica, porém praticamente não havia
atividades militares. Enquanto isso, o alto escalão militar de ambos os Estados traçava uma estratégia
para bloquear ou ao menos retardar o avanço de Hitler na Europa. Como os britânicos tinham indiscutível
supremacia nos mares, conseguiram bloquear o acesso alemão ao Mar do Norte, por onde vinha o
minério de ferro comprado pela Alemanha da Suécia, que alimentava as indústrias de guerra alemãs.
Desse modo, a ideia era vencer a Alemanha pela ruína econômica criada pelo isolamento imposto de
fora para dentro (SARAIVA, 2007a).
Hitler, contudo, não se intimidou diante da estratégia econômica e defensiva dos franceses e
britânicos, que juntos formaram o Conselho Aliado, e, em abril de 1940, iniciou a invasão da Dinamarca
e da Noruega de forma a manter os suprimentos oriundos da Suécia. Após alguma resistência dos
noruegueses, em maio, as operações bélicas já estavam concluídas e ambos os países submetidos à
Alemanha. O próximo passo de Hitler era a invasão da França, cuja estratégia era repetir os movimentos
da Primeira Guerra Mundial e chegar ao território francês por meio da Holanda e da Bélgica.
Lembrete
Com o auxílio dos britânicos, a França realizou um enorme esforço para resistir à invasão, porém,
o despreparo francês diante da determinação alemã resultou em uma desorganização generalizada.
As forças francesas e britânicas foram encurraladas nas praias de Dunquerque nas proximidades com a
Bélgica. A Marinha Britânica teve de realizar um esforço enorme para retirar cerca de 350 mil soldados
franceses e britânicos do local em direção à Grã-Bretanha. A operação contou também com o auxílio de
navios e barcos de voluntários (TOTA, 2011).
96
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
No princípio de junho, os alemães já estavam nas proximidades de Paris. Diante da derrota das
forças aliadas em Dunquerque, os civis franceses partiram em fuga desesperada. Em 4 de junho de
1940, as tropas alemãs marcharam sobre a capital francesa, e a bandeira nazista foi hasteada na Torre
Eiffel, simbolizando a derrota da França. Diante disso, o governo francês assinou um armistício com a
Alemanha em 22 de junho e com a Itália no dia 24 do mesmo mês. A França tornou-se assim o primeiro
país derrotado a concluir um armistício com os nazistas (SARAIVA, 2007a).
Saiba mais
Sobre o dia D:
O MAIS longo dos dias. Direção: Ken Annakin. Estados Unidos: Darryl F.
Zanuck Productions, 1962. 178 min.
97
Unidade II
Pelo acordo firmado no armistício, a França foi dividida: o norte da França e toda a costa atlântica
ficaram sob ocupação da Alemanha; uma pequena região a leste, sob a ocupação italiana; o sul
constituía-se em uma república livre, porém que deveria colaborar com o Eixo. A cidade de Vichy
tornou-se a capital da França livre, para onde foi transferido o parlamento, e o governo foi entregue ao
marechal Philippe Pétain e Pierre de Laval, que instauraram um regime semifascista (SARAIVA, 2007a;
TOTA, 2011). O mapa da figura a seguir ilustra a ocupação da França e a divisão do território francês após
a invasão dos alemães em meados de 1940.
98
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
refugiou-se na Grã-Bretanha, de onde passaram a organizar operações militares que, mais tarde,
resultariam na libertação da França das mãos dos nazistas alemães (HOBSBAWM, 1995).
Com a derrota da França, o primeiro-ministro britânico sabia que o próximo alvo da máquina de
guerra alemã era a Grã-Bretanha. Hitler, no entanto, aguardava, na esperança de que Churchill capitulasse
e solicitasse condições de paz. Diante da recusa dos britânicos em assumir qualquer tipo de aliança com
a Alemanha nazista, a força aérea alemã iniciou os preparativos para bombardear o sul da ilha britânica
em setembro de 1940. Chamada de operação Leão-Marinho, Hitler comandou pessoalmente o ataque
aéreo à Grã-Bretanha a partir das bases instaladas no norte da França e na Holanda. O bombardeio
alemão iniciou-se nas regiões portuárias britânicas e seguiu até a capital (TOTA, 2011).
No dia 13 de outubro, teve início a chamada Batalha da Inglaterra, com um intenso bombardeio sobre
Londres. O objetivo de Hitler era acabar com a capacidade militar da Força Aérea britânica e espalhar o
terror entre os civis para, em seguida, invadir a ilha, obrigando o governo britânico à cooperação. Isso,
contudo, não aconteceu. Sob liderança de Churchill, que todos os dias saía em público para levantar os
ânimos dos londrinos e incitá-los à resistência, os britânicos, sob maciço ataque aéreo, não se renderam.
Diante da teimosia dos britânicos e da perda constante de aeronaves nas batalhas aéreas, Hitler adiou
seus planos de invasão à ilha a fim de poupar forças para conquistar a União Soviética. De qualquer
forma, a resistência britânica não mudava a situação do continente europeu, completamente dominado
pelos nazistas, seja por meio da ocupação territorial, seja por meio dos governos aliados ou simpatizantes
de Hitler. Isso significa que, à exceção da Suíça, cuja neutralidade foi respeitada, e da Grã-Bretanha, a
expansão nazista sobre a Europa era completa. Conforme aponta Hobsbawm (1995, p. 37):
99
Unidade II
Desse modo, observa-se que os Aliados, ainda que estivessem militarmente despreparados quando
se procedeu à invasão dos nazistas, podiam se apoiar em forças econômicas e demais recursos além
das fronteiras europeias, que não se limitavam às colônias imperiais. Os Estados Unidos eram já
uma potência global, com grande capacidade humana, industrial, militar e econômica, ou seja, os
Aliados tinham a vantagem de poder contar com forças globais, enquanto Hitler estava limitado
exclusivamente às próprias potencialidades alemãs e, no máximo, continentais. Disto resultou a
estratégia nazista de invadir a União Soviética, rica em recursos minerais e alimentícios que poderiam
alimentar a estrutura de guerra alemã. O ataque alemão à União Soviética, seguido do ataque japonês
aos Estados Unidos, colocaria no centro do conflito duas grandes potências, cujos resultados foram a
mundialização da guerra civil europeia e a derrota incondicional da Alemanha nazista e seus aliados
do Eixo (SARAIVA, 2007a).
Em 1941, as guerras paralelas que ocorriam na Europa e no leste da Ásia tornaram-se uma única
guerra de proporção mundial. Ademais, a derrota da França e a imobilização temporária da Grã-Bretanha
pela Alemanha nazista destruíram completamente qualquer possibilidade de reformulação do equilíbrio
de poder europeu, que desde o século XIX governara as relações internacionais. Conforme explica
José Flávio de Sombra Saraiva (2007a), em 1941, terminou o longo período de transição no sistema
internacional europeu iniciado na Primeira Guerra Mundial. O vazio de poder mundial finalmente seria
preenchido por duas novas grandes potências.
Na Europa, Hitler dava início à operação militar para invasão da Rússia soviética, nomeada de
Operação Barbarossa em homenagem ao imperador germânico Frederico I, conhecido como Barbarossa,
que havia reinado no antigo Sacro Império Romano-Germânico no século XII. Direcionando novamente
o grosso das forças alemãs a leste em 1941, Hitler invadiu e tomou a Iugoslávia, completando o
controle alemão sobre todo o Leste Europeu. Em seguida, em junho, ordenou a concentração de forças
ao longo da fronteira com a União Soviética, e, na madrugada de 22 de junho, teve início a Operação
Barbarossa em três linhas de frente: uma em direção a Moscou; outra em direção a Leningrado, ao
norte; e outra em direção ao Cáucaso, ao sul, região rica em campos de petróleo (TOTA, 2011).
Stalin já tinha ciência de que mais cedo ou mais tarde a guerra com os alemães seria inevitável
devido aos conflitos de interesse na busca por espaços vitais na mesma região, porém, não tinha ideia
de que seria tão iminente. Diante das evidências de um choque bélico com a Alemanha nazista, Stalin
tentou adiar ao máximo o embate, de forma a ganhar tempo para se preparar para o conflito. Além
disso, a estratégia soviética contemplava também diminuir as chances de uma guerra em duas frentes
simultâneas, isto é, com a Alemanha no Ocidente e com o Japão no Oriente. Por isso, Stalin aproveitou
a visita do ministro das relações exteriores japonês, em abril de 1941, para assinar um pacto de não
agressão (SARAIVA, 2007a).
O ataque alemão, ainda assim, pegou os russos soviéticos despreparados, e, em menos de um mês, as
tropas nazistas já estavam cerca de 800 km adentro do território soviético. Apressadamente, os britânicos
se solidarizaram e firmaram com Stalin, em 13 de julho. Da mesma forma, os norte-americanos endossaram
100
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
a aliança e apoiaram a resistência russa diante da agressão alemã. A União Soviética, portanto, foi incluída
na aliança ocidental contra o nazifascismo representado pelos países integrantes do Eixo.
A fronteira oriental da guerra no continente europeu foi a mais sangrenta e extremamente violenta.
Muitos soldados soviéticos morreram ou caíram prisioneiros logo nos primeiros dias. Os aviões da Força
Área da União Soviética, em grande parte, foram destruídos antes mesmo de saírem de suas bases.
Em novembro, um vasto território que concentrava cerca de 40% da população e a maior parte das
riquezas naturais soviéticas já haviam sido conquistadas pelos alemães e seus aliados, e a capital Moscou
encontrava-se ameaçada (TOTA, 2011).
Na frente ocidental, os Estados Unidos preparavam-se para o engajamento na guerra. Ainda que não
houvesse uma declaração de guerra formal contra a Alemanha nazista, o apoio que os norte-americanos
demonstravam aos Aliados, bem como a mobilização industrial para rearmamento, davam claros sinais de
que os Estados Unidos já viviam uma economia de guerra. A princípio, o esforço norte-americano tinha
como objetivo o auxílio à exaurida Grã-Bretanha, porém, à medida que a situação britânica se deteriorava,
os Estados Unidos ficavam mais apreensivos. Afinal, em 1941, a Grã-Bretanha era a última resistência
democrática europeia frente às ambições nazistas de Hitler (SARAIVA, 2007a).
A boa vontade de Roosevelt para com os britânicos, contudo, não era o bastante para mover a
opinião pública, assim como o congresso norte-americano, aferrados no discurso do isolacionismo,
a uma declaração de guerra contra o Eixo. Para tanto, fazia-se necessário um pretexto mais claro, de
forma a justificar a entrada dos Estados Unidos diretamente no turbilhão da guerra. A justificativa
perfeita surgiu quando os japoneses realizaram o ataque à base naval norte-americana de Pearl Harbor,
localizada no Havaí, em represália à suspensão de exportações de petróleo para o Japão em protesto à
ocupação japonesa da Península da Indochina.
101
Unidade II
o epicentro do conflito. Com a entrada dos Estados Unidos na guerra, formou-se a Grande Aliança, que
unia norte-americanos, britânicos e soviéticos contra o inimigo comum: os países do Eixo (TOTA, 2011).
Hobsbawm (1995, p. 39) defende que “o ataque japonês a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941
tornou a guerra mundial”. Da mesma forma, Saraiva (2007a, p. 182) concorda que, em dezembro
de 1941, “os Estados Unidos uniram as duas guerras paralelas”, “transformavam-se, assim, no centro do
mundo”. Diante da derrocada das potências europeias na era da catástrofe, os Estados Unidos pairavam
como única potência ocidental com capacidade econômica, militar e política para ocupar o vácuo
deixado pelo Concerto Europeu e gerir a ordem internacional. Não só isso, mas a superioridade
norte‑americana tornava qualquer outra força irrelevante, sendo possível, a partir de então, falar do
conceito de “superpotência”. Conforme explica Saraiva (2007a, p. 181):
Algum tempo depois, já no final da Segunda Guerra Mundial, veríamos que os Estados Unidos
não seriam os únicos a se apropriarem do conceito de superpotência. A resistência e vitória soviética
sobre as forças alemãs e, mais ainda, o esforço para contrapor-se em igualdade de capacidades aos
norte-americanos fariam da União Soviética uma grande superpotência que competiria por espaço e
influência no cenário internacional.
No curso da guerra, a completa derrota do Eixo após a entrada dos Estados Unidos e da União
Soviética seria apenas uma questão de tempo. Ainda assim, Alemanha, Japão e Itália resistiriam por seus
interesses e ideais com todos os recursos de que dispunham. Como afirma Hobsbawm (1995), prevalecer
no maior conflito bélico da história da humanidade era uma questão de “vida ou morte para a maioria
dos países envolvidos” (1995, p. 40). Além disso, a possibilidade da derrota frente ao regime nazista,
como foi observado na Polônia e pelo extermínio aos judeus, significava a escravização e a morte. Disto
resultou no fato de a Segunda Guerra Mundial ser, sem dúvidas, uma guerra total, travada até o limite.
Saraiva (2007a, p. 183) assim descreve os anos finais da guerra:
E mesmo após o engajamento total de soviéticos e norte-americanos ainda levou cerca de três
anos e meio para a completa derrota do Eixo. Portanto, no início de 1942, ainda não estava claro para
todos os envolvidos que a vitória penderia para o lado da Grande Aliança. Embora tivessem perdido
102
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
a Batalha de Moscou, os nazistas e seus aliados haviam conseguido importantes vitórias no norte da
África, que incentivaram Hitler a retomar os planos de invasão à União Soviética por meio da região
do Cáucaso no verão de 1942.
Observação
Animado com esse novo plano, com uma grande força, o Exército Alemão dominou o Mar Negro e
seguiu para Stalingrado, cidade ao sul da Rússia e alvo de Hitler. Entre setembro e outubro, as tropas
nazistas já se acercavam da cidade com pouca ou nenhuma resistência, quando forças soviéticas
fecharam o cerco sobre os alemães ao norte e ao sul, impedindo o envio de recursos e reforços. A batalha
se prolongou ao longo do rigoroso inverno da região e se converteu em uma das piores derrotas sofridas
pela Alemanha desde o início das hostilidades (TOTA, 2011).
Na fronteira oriental, a luta continuava acirrada entre soviéticos e alemães, tanto que, em conferência
entre os líderes Aliados em Teerã, em 1943, Stalin solicitou a Churchill e Roosevelt a formação de uma
nova frente de batalha na Europa ocidental o mais rápido possível, de forma a aliviar a pressão nazista
sobre as forças soviéticas. O líder soviético entendia que somente a frente italiana era insuficiente para
combater os nazistas, e, além disso, Stalin acusou abertamente o primeiro-ministro britânico de postergar
a ação na frente ocidental propositalmente para que a União Soviética se exaurisse completamente
numa ferrenha luta sozinha com a Alemanha (TOTA, 2011).
Em 16 de abril de 1945, as forças soviéticas iniciaram a tomada de Berlim, a capital da Alemanha, porém,
enfrentaram dura resistência por parte dos alemães que, instigados por Hitler, ainda acreditavam poder
reverter a situação. Contudo, os Aliados deram início ao bombardeio da cidade, com vistas a matar o ditador
alemão, gerando pânico total. Sem recursos, armamentos e combustíveis, qualquer resistência alemã seria
inútil. Em 30 de abril, Hitler matou-se com um tiro. A luta com os soviéticos ainda se estendeu até 2 de maio,
quando o general alemão Weidling aceitou os termos soviéticos e se rendeu incondicionalmente, encerrando
definitivamente a guerra na Europa (TOTA, 2011).
Na Ásia, o Japão, desde a ocupação alemã da França no ano de 1940, realizava um processo de
ocupação indireta dos antigos espaços coloniais europeus. Entre dezembro de 1941 e os primeiros meses
de 1942, os japoneses obtiveram várias vitórias no leste da Ásia, assumindo a responsabilidade de controle
e desenvolvimento da região em substituição dos europeus. O Japão praticava administração indireta,
sem realização de colonização, mantendo os governos locais, mas subordinando-os ao controle de
Tóquio. Assim, o objetivo do Japão era controlar todo o leste asiático, expulsando as potências europeias.
Dessa forma, Saraiva (2007a, p. 184-185) explica as motivações japonesas para o ataque a Pearl Harbor:
O ataque a Pearl Harbor, portanto, deve ser visto não só como a porta de
entrada do Japão na guerra europeia e o capítulo decisivo na mundialização
do conflito, mas um ato articulado da estratégia japonesa de ampliação
dos espaços na Ásia. Na perspectiva japonesa, a grande Ásia se completaria
depois do ataque japonês à base americana, em 7 de dezembro de 1941, pela
anexação de outras partes da região, como as Filipinas, a Malásia e Hong Kong.
Com a anuência de Stalin e Churchill, os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas sobre o
Japão: uma na cidade de Hiroshima, no dia 6 de agosto de 1945; e outra sobre a cidade de Nagasaki, no
104
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
dia 9 de agosto, causando destruição geral de ambas as cidades e espalhando horror em todo o mundo.
Por fim, em 14 de agosto de 1945, o Japão rendeu-se incondicionalmente, encerrando um dos capítulos
mais sangrentos da humanidade.
Saiba mais
Ao final da guerra, algumas questões foram levantadas a respeito da real necessidade de empregar
duas bombas atômicas para derrotar o Japão. Acredita-se que o propósito dos Estados Unidos não era
apenas render o Japão, mas também impressionar a União Soviética, de forma que Stalin compreendesse
a nova posição geopolítica da superpotência norte-americana no cenário global, bem como seu poder
de destruição. Nesse episódio, ficou claro que as duas novas superpotências globais iriam rivalizar no
controle da política internacional das próximas décadas (TOTA, 2011).
O estabelecimento das diretrizes da paz e da nova ordem internacional diante do colapso completo
da sociedade internacional europeia foi a grande questão na pauta da agenda dos Aliados após a guerra.
Antes mesmo de terminar o conflito, o tema já era tratado nas conferências para encaminhamento das
ações de guerra, gerando acaloradas discussões e explicitando diversos pontos divergentes entre os
Aliados. Uma coisa, contudo, era certa: o gerenciamento da paz e da ordem internacional não cabia mais
exclusivamente às antigas potências europeias. A realidade dos novos tempos exigia a participação de
duas novas superpotências: Estados Unidos e União Soviética.
Conforme aponta Hobsbawm (1995), não houve qualquer negociação de condições de paz entre as
forças aliadas e os países derrotados, pois nenhuma autoridade formal era reconhecida, especialmente
na Alemanha. Só interessava aos vencedores, como já visto, a derrota incondicional. Nesse sentido,
as condições de paz e da nova ordem internacional seriam determinadas pelos vencedores e apenas
entre eles, sendo que algumas diretrizes já estavam sendo traçadas nas conferências realizadas
ainda durante a Segunda Guerra Mundial. O principal resultado dessas negociações, sem dúvida,
foi a ONU, em 1945:
Não se fez qualquer paz formal, pois não se reconhecia nenhuma autoridade
independente das forças de ocupação, pelo menos na Alemanha e no
Japão. O mais próximo de negociações de paz foi a série de conferências
entre 1943 e 1945, em que as principais potências aliadas — EUA, URSS e
Grã-Bretanha — decidiram a divisão dos despojes da vitória e (sem muito
105
Unidade II
A ideia de retomar o antigo projeto de Wilson para formação de um sistema de segurança coletiva
gerenciado por uma instituição multilateral global demandou um esforço para sobrepor-se à agenda
do pós-guerra, sendo amadurecida ao longo das diversas conferências ocorridas entre 1943 e 1945,
entre outras possibilidades acerca do futuro das relações internacionais. Não foi fruto de consenso entre
os Aliados, porém as divergências apontavam que esse mecanismo era a única maneira de manter os
diálogos para as negociações dos interesses individuais e coletivos.
Lembrete
Várias questões geravam dificuldades de alinhamento entre as três grandes potências aliadas.
A União Soviética, desde que ingressara na Aliança formada pela Carta do Atlântico, tinha suas ressalvas
quanto a algumas linhas gerais desse documento, pois havia percebido o vazio de poder na Europa
Central e planejava lançar sua influência na região. Por conseguinte, a principal demanda dos soviéticos
nas conferências de paz era o reconhecimento do território ocupado pelo pacto anteriormente firmado
com a Alemanha nazista. Para Stalin, importava também evitar a formação de governos antissoviéticos
na Europa oriental, de forma a isolar a potência oriental (SARAIVA, 2007a).
Dessa forma, os interesses soviéticos recaíam sobre a fixação das fronteiras da Alemanha e dos
países da Europa central, bem como a formação de governos subordinados a Moscou nos territórios
ocupados pelas tropas soviéticas: Polônia, Bulgária, Romênia e Finlândia. Stalin também pressionava
pela participação nas imposições das fronteiras da Itália devido à proximidade com os países da região
dos Bálcãs, aos quais o líder soviético já projetava sua influência. Havia ainda a questão das indenizações;
a União Soviética estimava-as em 20 bilhões de dólares, dos quais lhe caberiam metade desse valor.
Os Estados Unidos, inicialmente representados por Roosevelt e, após a morte deste, por Truman,
colocaram diversas objeções aos planos soviéticos. Se para Stalin a questão das fronteiras na Europa
Central era fundamental, para os norte-americanos a questão mais importante era o gerenciamento
da ordem internacional no pós-guerra a partir da visão de mundo imposta pelos Estados Unidos:
liberal e democrática.
106
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A formação desse diretório, contudo, seria parte integrante de uma organização internacional de
segurança coletiva, tal como a Liga das Nações. Tal como sua antecessora, a nova organização contaria
com um conselho executivo, a assembleia geral e o secretariado, porém, existiria ainda o diretório com
as quatro grandes potências, que agiriam como agentes estabilizadores da paz e da ordem internacional,
atuando como interventores em crises sistêmicas sempre que necessário.
A Grã-Bretanha, por sua vez, tinha sua própria tese quanto à reestruturação das relações internacionais,
assim como da remodelação das fronteiras europeias no pós-guerra. Primeiramente, importava a Churchill
afastar o máximo possível a União Soviética da dinâmica política da Europa. Por isso, o líder britânico
defendia que a única forma de evitar novas conflagrações entre os europeus seria por meio da formação
de uma federação de Estados na Europa central, ideia rechaçada pelos soviéticos, que viam nessa iniciativa
uma tentativa de isolamento da União Soviética por meio do confinamento no centro da Eurásia.
Observação
Contudo, as ideias britânicas se viram esmagadas entre os interesses das duas grandes superpotências,
que tendiam a prevalecer sobre as decisões de como seria o mundo após a Segunda Guerra Mundial. Não
restava dúvida de que a era da hegemonia europeia havia passado, restando à Grã-Bretanha unicamente
o alinhamento com os Estados Unidos para manter-se enquanto uma potência global.
Também a França se via nessa mesma situação. Pior ainda, nem sequer era convidada a participar das
conferências entre os Aliados, gerando protestos por parte do general de Gaulle. O líder da resistência
francesa também criticou o fato de a França não ter sido mencionada como membro integrante do
diretório proposto pelos Estados Unidos. Além disso, Stalin era contra a participação dos franceses no
processo de reformulação da ordem internacional do pós-guerra, uma vez que considerava a França
uma nação fraca e que deveria ser tratada como aliada da Alemanha nazista, pois havia se rendido e
assinado um acordo com Hitler (SARAIVA, 2007a).
Havia ainda as demandas da China, cujos interesses eram defendidos pelos Estados Unidos, excluindo
o Japão. Nas conferências de Moscou, e depois no encontro do Cairo, ocorridas no segundo semestre de
1943, os Aliados acertaram alguns detalhes prévios que seriam abordados e ratificados na Conferência
de Teerã. Entre esses acordos, a declaração contemplava a devolução de todas as conquistas japonesas
no leste da Ásia, especialmente os territórios chineses, como a Manchúria e Taiwan (SARAIVA, 2007a).
Somente a questão das fronteiras europeias não ficou bem definida em Teerã. Todos concordavam
que a Alemanha deveria ser dividida e controlada pelos Aliados, porém Stalin insistia que as
demarcações das fronteiras polonesas deveriam ser aquelas estabelecidas pela conquista soviética,
108
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
com compensações à Polônia por meio de concessões de territórios alemães. Churchill contestava,
temendo a sovietização da Europa, enquanto Roosevelt adotava uma postura cautelosa e conciliadora.
Em 1944, o Exército Soviético avançava sobre o Leste Europeu, consolidando a influência da União
Soviética sobre a região. Preocupado, o primeiro-ministro britânico tratou de encontrar uma maneira
de promover conversações bilaterais com Stalin. Dessa forma, em outubro de 1944, Churchill dirigiu-se
a Moscou com o objetivo de chegar a um entendimento com Stalin a respeito das áreas ocupadas pelos
Aliados no continente europeu. Após discutir o percentual da presença soviética e ocidental no Leste
Europeu, ficou acertado que a Grécia seria resguardada na esfera de influência ocidental, ao passo que
Bulgária e Romênia ficariam sobre a influência soviética. Também foi aceita a solução soviética para a
Iugoslávia, sob o governo de Tito (SARAIVA, 2007a).
Na Conferência de Yalta, cidade litorânea da Crimeia, os três líderes das grandes potências se
reencontrariam novamente, porém, diferentemente de Teerã, o clima de tensão tomaria conta do encontro,
ocorrido em fevereiro de 1945. Stalin mostrou-se intransigente quanto à situação do governo provisório
polonês sob auspício soviético, bem como os demais países do Leste Europeu. A solução unilateral da
União Soviética nas regiões ocupadas pelo Exército Soviético causou dissensão e ruptura entre Churchill
e Stalin. Roosevelt, contudo, estava empenhado em conseguir o apoio soviético para a formação das
Nações Unidas e, portanto, mostrou-se condescendente em relação aos interesses soviéticos.
Conforme coloca o professor Vizentini (1997), em Yalta, observa-se, ainda que implicitamente, certa
parceria entre Estados Unidos e União Soviética no ordenamento do mundo pós-guerra, colaborando
com a tese de declínio do poderio da influência da Europa, representada pela Grã-Bretanha, na política
internacional. Além disso, foi ainda consolidada em Yalta a ideia de divisão de esferas de influência entre
ocidentais e soviéticos:
109
Unidade II
Com sede em Nova York, a ONU é composta por seis órgãos principais: o Conselho de Segurança,
ao qual têm assento permanente e poder de veto as potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial,
União Soviética (atualmente Rússia), Estados Unidos, Grã-Bretanha, China e França, que, por fim,
conseguiu ser incluída; a Assembleia Geral, em que todos os Estados-membros estão representados com
igualdade de participação; o Conselho Econômico e Social; o Conselho de Tutela; a Corte Internacional
de Justiça e o Secretariado (HERZ; HOFFMANN, 2004).
Além disso, Saraiva (2007a) afirma que a grande presença das nações do continente americano, bem como
a proeminência dos Estados Unidos na formulação da nova organização, apontava que a ordem internacional
do pós-guerra seria tributária do ideário pan-americano de pacifismo e cooperação entre os Estados, sem
ignorar, contudo, a desigualdade de capacidade das grandes potências. Nesse sentido, o sistema de veto do
Conselho de Segurança garantia o controle da segurança internacional, ao mesmo tempo que congelava o
poder mundial, privilegiando a concertação entre as grandes potências.
Uma vez definida a arquitetura da ordem mundial após a Segunda Guerra, ficavam ainda algumas
pendências sobre o futuro da Europa, que deveriam ser solucionadas na última conferência entre os
líderes das três grandes potências. Foi sob os escombros de uma Alemanha destruída, na cidade de
Potsdam, próxima a Berlim, que seria traçado definitivamente o destino daquela que havia sido a grande
potência da Europa central.
O encontro ocorreu em clima de alta tensão entra as superpotências, uma vez que os Estados Unidos,
agora sob a presidência de Truman após a morte de Roosevelt, haviam testado com sucesso a bomba nuclear.
Assim, a Conferência de Potsdam sinalizou o início de divergências explícitas entre os Estados Unidos e a
União Soviética e a afirmação de ambos como as novas superpotências mundiais, ainda que os soviéticos
só viessem a conseguir o controle de armamentos nucleares alguns anos depois (VIZENTINI, 1997).
A Conferência de Potsdam teve início em 17 de julho e contou finalmente com a participação dos
franceses. Diante das divergências em relação às reparações de guerra cobradas pelos soviéticos e às fronteiras
polonesas, entre outras questões, os representantes das três grandes potências resolveram que negociariam
em bloco, de forma a chegar a uma solução mais rápida. Assim, os norte-americanos cederam no concernente
às fronteiras da Polônia e da Alemanha em troca do reconhecimento por parte dos soviéticos das fronteiras
italianas. Quanto às reparações exigidas pela União Soviética, os ocidentais adotaram uma postura inflexível,
fazendo com que Stalin desistisse do assunto.
Quanto à Alemanha, os acordos de Potsdam dividiram o território alemão e também a capital, Berlim,
em quatro zonas de influência, cada uma controlada por uma das potências vencedoras da Segunda
Guerra Mundial, conforme pode ser observado na figura a seguir. O propósito de tal política para um
110
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
país já bastante castigado pela guerra era a subjugação total da Alemanha, de forma a impedir qualquer
possibilidade, em curto ou médio prazo, do ressurgimento da potência alemã que viesse novamente a
ameaçar a estabilidade europeia.
Entretanto, a motivação para a divisão do território alemão em um momento que a Europa estava
em decadência na política mundial tinha a ver mais com a lógica de afirmação das esferas de influência
das duas superpotências e a tomada de posições do continente europeu do que necessariamente com
o futuro da Alemanha. Tanto que a construção do Muro de Berlim pouco tempo depois se tornaria o
símbolo da Guerra Fria no decorrer das próximas décadas.
Um acordo que colocava fim às hostilidades de anos de conflito foi, por fim, elaborado em fevereiro
de 1947. O Tratado de Paz de Paris foi assinado por 21 países, vencedores da Segunda Guerra Mundial.
A partir de então, a paz e a ordem internacional seriam gerenciadas pelas superpotências (SARAIVA,
2007a). O mais importante resultado da “era da catástrofe”, como Hobsbawm descreveu o período entre
a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, foi a emergência de um novo sistema de gerenciamento da
sociedade, que, desde a virada do século XX, era mundial e não mais limitada às diretrizes europeias.
111
Unidade II
O Sistema Internacional de Estados, que surgira dos escombros da Europa feudal, tornava-se mundial
e, portanto, demandava mecanismos de gerenciamento mais amplos do que aqueles manejados somente
pelos europeus. E foi dos flancos da Europa que se levantaram as duas superpotências com capacidade e
vontade para impor as linhas gerais da sociedade internacional na segunda metade do século XX.
Exemplo de aplicação
Exemplo 1
Sobre as causas para o fracasso da Liga das Nações, todas as afirmativas a seguir estão corretas, exceto:
A) O veto do Senado norte-americano para a participação dos Estados Unidos na Liga das Nações
prejudicou sua funcionalidade, assim como levantou questionamentos sobre a legitimidade e
importância de sua eficácia.
B) A incapacidade da Liga das Nações de impor medidas coercitivas mais efetivas sobre a Itália abriu
precedente para outras ações do tipo, que seriam levadas a cabo pela Alemanha.
C) O processo decisório da Liga das Nações exigia unanimidade tanto na Assembleia quanto no
Conselho Executivo, entravando as decisões.
D) Na formação da Liga das Nações, não havia referências claras quanto à definição de situações em
que os mecanismos coercitivos militares deveriam ser empregados, apontando a dificuldade para
lidar com situações em que falhassem as sanções.
E) A inclusão da Alemanha no Conselho Executivo da Liga das Nações em 1926 causou desavenças
entre as potências europeias e mostrou-se um erro, pois possibilitou a formação do Eixo entre
Alemanha, Itália e Japão.
A) Alternativa correta.
Justificativa: a ausência dos Estados Unidos, assim como de outras potências, como a Alemanha e a
União Soviética, foi um fator negativo sobre a legitimidade das resoluções do organismo, enfraquecendo
a Liga das Nações.
B) Alternativa correta.
Justificativa: a Liga das Nações de fato não conseguiu implementar uma medida coercitiva que
condenasse a ação militar da Itália sobre a Etiópia, encorajando Hitler a não apenas retirar a Alemanha
do organismo, mas também usar a força para realizar seus objetivos de política externa.
112
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
C) Alternativa correta.
Justificativa: de fato, o processo decisório no Conselho da Liga das Nações exigia a concordância
de todos os seus membros, 15 no total. A discordância de um membro paralisava qualquer negociação.
D) Alternativa correta.
Justificativa: quando falhavam as sanções econômicas, a Liga das Nações não possuía mecanismos
claros para empregar meios coercitivos sobre um possível agressor.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: a entrada da Alemanha na Liga em 1926 foi possibilitada pelo consenso entre as
potências europeias, França e Grã-Bretanha, e, além disso, o Eixo foi formado pelo Acordo Tripartite
entre Alemanha, Itália e Japão em 1940 na cidade de Berlim.
Exemplo 2
Considerando a nova ordem internacional que surgiu ao fim da Segunda Guerra Mundial, assinale
a alternativa correta:
A) A paz e a ordem internacional no pós-guerra foram impostas de forma unilateral pelos Estados Unidos.
B) A União Soviética mostrou-se contrária à formação da Organização das Nações Unidas e, por isso,
não aderiu ao novo organismo que implementaria a nova ordem mundial no pós-guerra.
C) A nova ordem mundial foi estabelecida por meio de acordos entre as duas superpotências sobre
as respectivas áreas de influência, bem como pela criação das Nações Unidas para gerenciamento
da segurança coletiva.
D) A França foi impedida de participar como país vencedor das conferências de paz e tampouco foi
incluída na versão final da lista de países que seriam membros permanentes do Conselho de Segurança
das Nações Unidas devido ao fato de ter se rendido à Alemanha durante a invasão nazista.
E) Nas conferências que deram origem à nova ordem mundial, foi permitida a participação de
representantes dos países derrotados.
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: a paz e a ordem do pós-guerra foram estabelecidas por meio de negociações entre
todos os países vencedores, incluindo os Estados Unidos, e não apenas pelos norte-americanos.
113
Unidade II
B) Alternativa incorreta.
Justificativa: a União Soviética, desde o início das negociações para construção da nova ordem
internacional, mostrou-se favorável à criação das Nações Unidas, como forma de angariar o
reconhecimento dos Estados Unidos sobre a área de influência soviética na Europa oriental.
C) Alternativa correta.
D) Alternativa incorreta.
Justificativa: a França participou da conferência de Potsdam e foi inclusa como membro permanente
e com poder de veto no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: nas conferências de paz, participaram apenas os países vencedores, pois a autoridade
instituída nos países derrotadas ou eram forças de ocupação dos aliados ou não era reconhecida por ser
de cunho nazista.
Resumo
114
HISTÓRIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
Nações não foi suficiente para lidar com dificuldades impostas pela
depressão econômica, cuja principal resultante foi a ascensão dos regimes
nazifascistas na Europa.
Exercícios
Figura 21
115
Unidade II
I – A charge faz referência, no primeiro quadrinho, ao pacto de não agressão, firmado entre Alemanha
e União Soviética em 1939.
II – Nos dois quadrinhos, ambos os líderes seguram, em uma mão, um símbolo da paz e, na outra, um
símbolo de guerra, sugerindo que a escolha por um ou por outro dependia do jogo de forças políticas
em dado momento.
III – O segundo quadrinho faz referência ao conflito entre Stalin e Hitler após o final da Segunda
Guerra Mundial, quando o mundo se tornou bipolar.
A) I, II e III.
B) I e II, apenas.
C) I e III, apenas.
D) II e III, apenas.
E) II, apenas.
Análise da questão
Justificativa: os quadrinhos mostram Hitler e Stalin com flores e facas. A escolha pelo símbolo da
paz ou pelo da guerra dependeu do momento. No primeiro quadrinho, há a referência ao acordo de não
agressão entre os dois países no início do conflito. No segundo quadrinho, mostra-se outro momento
da guerra, em que a União Soviética atuou ao lado dos Aliados contra o Eixo.
A rosa de Hiroshima
Figura 22
I – Os versos de Vinicius de Moraes fazem referência aos efeitos radioativos da bomba atômica
na população da cidade de Hiroshima, e a metáfora da rosa remete à imagem formada pela explosão
da arma nuclear.
117
Unidade II
II – O lançamento da bomba atômica nas cidades japonesas ocorreu no final da Segunda Guerra e
é visto, por estudiosos, como uma forma de os Estados Unidos ostentarem seu poder na ordem bipolar
que estava se formando.
III – Após o lançamento da bomba atômica, o Japão revidou com o ataque à base norte-americana
de Pearl Harbor, o que alterou o rumo do conflito.
A) I, II e III.
B) I e II, apenas.
C) II e III, apenas.
D) I e III, apenas.
E) I, apenas.
Análise da questão
118