Docente: Syndley Jorrany Conceição de Oliveira (7° Período da Manhã)
No primeiro capítulo da obra “Fábulas da modernidade no Acre: a utopia de Hugo
Carneiro’, escrita por Sérgio Roberto Gomes de Souza, é retratado o governo de Hugo Carneiro – no período de 1927 a 1930 – e a constituição do espaço urbano de Rio Branco, capital do Estado acreano. Primordialmente, há uma introdução ao cenário acreano do período, são 80 casas de madeira, com cobertura de barro ou palha e uma pequena área comercial formada por portugueses e libaneses. O autor evidencia que o território acreano foi deveras diversificado, com povos de diversas etnias – libaneses, portugueses, indígenas e nordestinos – e o plano de Hugo Carneiro era justamente visando a união desse povo e de suas características em uma reinvenção do Acre, anulando os diferentes territórios sociais existentes e constituindo uma concepção homogênea de espaço e comportamento. Apesar do autor dividir os conceitos de “território social” e “fator natural”, divagando sobre suas diferenças e aplicando no conceito do território acreano, o autor também se contradiz alegando que “seria precipitado, no entanto, pensarmos a representação coletiva do território como uma soma das representações individuais, como resultante da unidade de uma diversidade de territórios culturais”, ou seja, a “reinvenção” do Acre seria o fator fundamental para as pretensões dos que dele desejam apropriar-se. Outrossim, esse “reordenamento” dos espaços urbanos ocorre na Europa no século XIX – após o reaparecimento da Peste – esse método foi efetuado com a intenção de afastar o “sujo” dos centros e da convivência com o povo mais rico, ou seja, o afastamento dos desprovidos de riqueza dos centros das cidades com o intuito de “limpar o ambiente”, e essa visão foi tratada pelo autor como um exemplo do que o plano de Hugo previa para a capital do Acre. Por outro lado, o autor revela o pensamento dos médicos e engenheiros da época, a favor do reordenamento, pois resolveria os problemas do espaço urbano transformando o comportamento e o corpo social do território. Tal visão elitista é esperada, afinal, veio de uma classe que esbanja privilégios e que não entende o ponto de vista das pessoas menos privilegiadas, logo, é inviável que eles possam responder por essa parte da população. Uma das cidades “exemplo” do Brasil sempre foi o Rio de Janeiro, que no século XX foi um dos locais com maior infraestrutura e mais próximo dos padrões europeus, com isso, era a principal referência de “cidade moderna”. Neste lugar, visando romper com a visão de minorias vivendo em centros comerciais ou no “meio do povo”, foram criadas formas de expulsar os pobres para uma área menos vista, pensando em não “sujar” a “cidade maravilhosa”. Deste modo, a destruição dos antigos cortiços originou as atuais favelas, lugares com pouca infraestrutura, higiene e condições de moradia. De forma resumida, eram exemplos as cidades que seguiam o modelo europeu e não as que pensavam no bem-estar de toda a população, um período em que se valorizava apenas a estética, por isso, o Brasil se envolveu e “mergulhou de cabeça” na estética da belle époque. Ao analisar a vida do advogado Hugo Ribeiro Carneiro, morador de elite do Rio de Janeiro que se mudou para o Acre em busca de “mudanças”, percebe-se que a ideia Utópica de fazer uma cidade modelo europeia no meio da Amazônia era de alguém que desconhecia o ambiente. Ao chegar em Rio Branco, foi nomeado governador pelo presidente da república, mas com muito desagrado enviou uma carta a ele falando que Rio Branco era apenas “espaço formado por toscas construções em madeira, órgãos públicos abandonados e ruas mal preservadas”. Afinal, vindo da cidade modelo Rio de Janeiro, o Acre era um lugar que havia “parado no tempo” e completamente abandonado pelo resto do país. Desde o dia de sua posse, 15 de junho de 1927, o governador mostrou um discurso que prometia mudanças na capital, como a modernização, higiene e tecnologia, criando assim a ideia perfeita do ambiente. Ademais, Utopia é uma ideia perfeita, um lugar criado por Thomas More em seu livro, nesse lugar não haviam adversidades e tudo era feito com extrema perfeição e harmonia. Ou seja, um lugar inalcançável, uma expectativa impossível despejada pelo governador em um Estado “atrasado”. As mudanças propostas eram primeiramente visuais, as quais o governador ordenou que padronizassem um modelo de casa mais moderno no centro, também fez um sistema de fiscalização e coerção da higiene dos moradores, impedindo-os de despejar os excrementos nas ruas e outros lugares públicos. E, depois de todas essas mudanças, os proprietários poderiam ocupar ou alugar os imóveis, apenas depois da fiscalização do médico da municipalidade. “Em algumas visitas, as autoridades sanitárias poderiam concluir que a casa era insaneável. Nesse caso, o imóvel deveria ser imediatamente demolido e se o proprietário oferecesse qualquer tipo de resistência, seria retirado pela polícia e punido conforme a lei” (página 42 último parágrafo), ou seja, os moradores não possuíam opções a não ser obedecer às ordens difíceis feitas pelo governador. Os prédios construídos no governo de Hugo Carneiro também possuíam a intenção de mostrar a população um exemplo de modernidade e higiene, o primeiro deles foi o Mercado Municipal, que foi o maior exemplo de assepsia em venda de alimentos, após a construção dele, foi construído o Quartel da Força Policial, o qual foi feito no intuito de estabelecer uma relação entre os moradores e os policiais baseada em respeito e temor, e por último foi feito o Palácio do Governo, que se constituiu em uma importante representação do centralismo que caracterizou a administração de Hugo Carneiro. Por fim, muitas expectativas em um “Acre do futuro” foram depositadas pelo antigo governador, apesar de serem medidas radicais e não pensadas na verdadeira parcela da população, ele agiu e começou a pôr seus planos de modernidade em prática. O que não foi observado nesse princípio foi a incessante busca por um lugar próximo a Europa que distanciou cada vez mais a capital de suas verdadeiras origens.