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2º BIMESTRE - PSICOLOGIA JURÍDICA

Privação e Delinquência (WINNICOTT)

Agressividade
- Inato
-Afeto (possibilidade de sublimação: brincar)
-Reação à frustração (desejo não atendido – não necessariamente obteve e perdeu objeto de
desejo)
- Sinal de esperança
- Combina-se ao amor: avidez
Tendência Antissocial
- Inato
- Atos esporádicos (furto, enurese, etc. – Não há possibilidade de sublimação)
- Reação à deprivação (perda – obteve objeto e o perde)
- Sinal de esperança
Personalidade Antissocial
- Adquirido
- Padrão de conduta – estabelecido por meio 1) do reforçamento ambiental (ganhos
secundários) da tendência antissocial e 2) da ausência de um ambiente acolhedor (cuidador,
reparador de perdas) e educador (imposição de limites, referências de autoridade).
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Winnicot: ‘Privação e delinquência’:


- Consultor Psiquiátrico do esquema de evacuação inglês.
- Trabalho com crianças que vivenciaram isolamento e/ou perda parental.
Privação e deprivação
- Privação atesta para a ausência de cuidados primários, o que desencadeia patologias
graves, como as psicoses e autismo infantil precoce: induz ao fracasso em prosperar
recursos psíquicos – vale constar que a falha ambiental não é necessariamente real ou
literal, mas ser consequência de fatores genéticos da própria criança em absolver as
vivências de cuidado ou alguma outra questão em particular que a faça fantasiar a ausência
(refutada a hipótese da “mãe geladeira” relacionada ao autismo).
- Deprivação atesta à perda de cuidados (‘reais’ ou fantasiados) que já foram presentes:
após receber o registro de ser boa, o infante experimenta a perda súbita e inesperada do
vínculo (ex: nascimento de outra criança, perda por morte de um dos pais, abandono
parental, etc.). A deprivação leva o infante a protestar, reivindicar o afeto perdido.
Tendência antissocial e (Transtorno de) Personalidade antissocial
A tendência antissocial é um aspecto natural do desenvolvimento humano,
associado à deprivação. Ou seja, a tendência antissocial constitui uma resposta afetiva à
perda (deprivação) de um objeto amado.
O ato antissocial (furtos, enurese noturna, etc.) constitui um imperativo relativo a
falha no período de dependência relativa - depois de experimentar um ambiente
suficientemente bom na época de dependência absoluta, o infante sente uma perda em
relação à ligação.
Sendo assim, o ato antissocial é um sinal de esperança do indivíduo, no sentido de
reviver, resgatar a experiência positiva anterior à perda. Portanto, tal ato não estipula um
diagnóstico, mas uma tendência humana natural, identificada tanto em crianças como em
adultos em momentos de crise.
A tendência antissocial é uma tentativa de reestabelecer um estado anterior de
coisas, um protesto ou reinvindicação em ato. Reivindicar consiste numa negação do
direito perdido de reclamar. Mesmo na conduta antissocial patológica, o que ocorre é que o
jovem está constantemente impelido a pressionar a família ou a sociedade para se redimir,
corrigindo a omissão esquecida.
Vale frisar que uma deprivação, e não uma carência (privação), é subjacente à
tendência antissocial. A carência produz um resultado diferente: sendo deficiente o
suprimento básico de cuidados relativos às necessidades físicas e psicológicas do infante, o
curso do processo de amadurecimento é distorcido, a ponto de resultar em uma disfunção
(grave) de personalidade.
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A tendência antissocial é, portanto, aspecto normal do desenvolvimento de todos os


seres humanos, de qualquer diagnóstico psiquiátrico, exceto a esquizofrenia, pois neste
caso não houve ao menos ligação referências de cuidado para posterior reivindicação da
perda.
Enfim, a noção de delinquência deriva da de deprivação familiar. Em suma, o
comportamento antissocial é antes um pedido de socorro, requisitando o controle e
segurança de pessoas fortes, amorosas e confiantes. Exemplifica: quando uma criança
rouba açúcar, está procurando pela mãe suficientemente boa de quem ele tem o direito para
pegar doce a hora que deseja, e, ao mesmo tempo, o pai que protege a mãe de seus ataques
(realizados no exercício do amor primitivo - avidez). Quando a criança rouba fora de casa
ainda procura pela mãe, mas agora com maior sentimento de frustração, por não encontra-
la em seu próprio lar, e, ao mesmo tempo e principalmente, encontrar uma figura forte de
autoridade paternal, que coloque limites seguros para seu comportamento impulsivo, de
modo que a criança não fique entregue aos seus próprios movimentos destrutivos. No caso
da delinquência, haveria a busca por um pai restritivo, que pode ser amoroso, mas antes
enérgico e limitador. Só assim o jovem remonta sua constituição reparadora e amorosa, seu
senso de culpa e desejo por reabilitar-se. Se nada disso acontecer, o adolescente se tornará
cada vez mais inibido no amor, expandindo seus núcleos depressivos, despersonalizado, e,
eventualmente, incapaz de sentir as coisas, a não ser pela violência, último resquício
(esperança) da sua subjetividade. Enquanto a criança saudável cria dentro de si um
ambiente nos primeiros estágios de vida (por meio do qual maneja seus impulsos), a
criança antissocial não tem essa oportunidade, o que impõe a necessidade de um controle
exercido de fora, para posterior internalização.

Diferenciação de agressividade e tendência antissocial


Em se tratando da natureza e origem da tendência antissocial e da agressão,
Winnicott afirma que a agressividade não pode ser entendida apenas como o surgimento de
um instinto primitivo. A agressividade deve ser entendida como algo inato coexistente ao
amor. Do ponto de vista social, a agressão cumpre o papel de trazer a atenção dos outros
para si. Crianças agressivas conseguem mais do que meramente agredir colegas e
familiares, mas também conseguem atenção, cuidados e e algo parecido com amor muitas
vezes. Nota-se que algumas vezes a agressão aparece não quando a criança está frustrada,
mas quando está empolgada (mamando, por exemplo). O objetivo da criança/bebê é a
gratificação e a pacificação da mente e do corpo. A gratificação proporciona paz, mas
gradualmente ele passa a perceber que para obter essa gratificação ele põe em perigo seu
objeto de amor. Quando ele se frustra, ele deve odiar parte de si mesmo, a não ser ele ter
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alguém externo para ser odiado no lugar dele. A agressão é entendida como uma reação
direta ou indireta à frustração e é uma das muitas fontes de energia do sujeito. Ela é
saudável quando sob controle – é útil para dar força ao trabalho de reparação e
restituição.
Um dos objetivos na construção da personalidade é tornar o indivíduo capaz para
drenar continuamente o pulsional. Isso envolve a capacidade crescente para reconhecer a
própria crueldade e avidez, que então, e só então, podem ser dominadas e convertidas em
ação sublimada.
A noção de voracidade é usada por Winnicott para significar a fusão original de
amor e agressão; a de avidez é usada para indicializar um sintoma antissocial comum, não
devendo ser entendido como um retrato da onipotência infantil, mas uma consequência da
deprivação. A avidez é parte da compulsão do bebê para buscar uma cura da mãe para sua
deprivação. Essa avidez é antissocial e precursora do furto, podendo ser compreendida e
curada pela adaptação terapêutica da mãe, através de carinho e da contenção (proibição,
educação).
Diferentemente da agressividade, na tendência antissocial não há espaço para o
brincar: o que ocorre é uma descarga direta pela atuação (acting out) – furto, etc. A criança
antissocial procura, de um modo ou de outro, violenta ou pacificamente, fazer com que o
mundo reconheça seu débito para com ela, ou tenta fazer o mundo reconstruir a moldura
que foi quebrada.
Nesse sentido, Winnicott dá maior ênfase à importância do ambiente humano (mãe)
na identificação e na tendência inata da criança para o envolvimento emocional. Na época
dos 6 meses aos 2 anos a privação ou perda de alguém podem ter consequências
devastadoras para a capacitação da criança em criar vínculos, fazendo com que o
processo de sociabilização se perca ou se obstrua.
Tanto a agressividade como a tendência antissocial são naturais à condição
humana, segundo Winnicott. A agressão é um sintoma da vida, uma reação natural que não
tem, necessariamente, a intenção de matar ou machucar, mas que pode assim se consistir se
o ambiente não for facilitador (o sadismo, a inveja, o ódio não são sentimentos inatos).
A principal conclusão de Winnicott é que o cuidado parental é essencial para o
desenvolvimento humano1.
Quão mais nova for a criança, mais o afastamento dos pais implicará num distúrbio
psicológico grave, considerando que quão mais imatura, menos recursos a criança disporá
para manter a ideia da pessoa viva em si (um núcleo depressivo não subsistirá apenas na

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Este modelo é, inclusive, replicado nos tratamentos psicoterapêuticos.
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criança afastada, mas também na família, conquanto os impactos psíquicos serão muito
maiores na criança do que nos adultos).
Existe um limite para a capacidade infantil em manter viva a ideia de alguém que
ama sem manter contato com a pessoa. Por extensão, o mesmo vale para os adultos. No
caso de pais que perderam a guarda de uma criança, eles tão cedo deixariam de se sentir
responsáveis por ela. Para as crianças, a comparação maior realizada na mudança de lar
não é entre a casa nova e a casa antiga, mas entre a casa antiga e a casa idealizada em sua
mente. Várias crianças vêm de lares ruins, mas tinham imagens maravilhosas dela em suas
memórias. Se a criança regressa para seu antigo lar, com suas fantásticas expectativas, ela
acaba se deparando com a realidade frustrante e com a desilusão concomitante à percepção
de que tem um lar. Tal adaptação leva tempo, e deve ser encarada com naturalidade e
paciência. Não problema com a idealização em si; ela nos traz conforto; mas o quanto essa
idealização pode nos afastar da realidade e a aprender lidar com ela.
O retorno da criança aos seus lares de origem tendem a inaugurar uma nova era de
imaginação, ligada à realidade e encerramento das fantasias negativas que possuía. Assim,
Winnicott lista uma série de atos esperados que notificam a readaptação da criança, que
atestam para sua reintegração: desperdiçar comida, pirraçar, testar os adultos (pequenos
furtos), testar a mãe sobre o quanto ela é a verdadeira mãe, etc. Estes são atos que
testemunham que a criança está se sentindo segura novamente, por isso até ela pode ‘errar’
com seus cuidadores e estará ‘tudo bem’. Enquanto antes ela cumpria em si, precocemente,
a função materna e paterna, agora ela pode voltar a ser criança.
De acordo com Winnicott
Não é apenas de comida e o abrigo que contam, e nem a provisão de ocupações
para momentos livres. Penso que essas coisas são suficientemente importantes.
Podem ser providas em abundância e ainda assim o essencial estará faltando se
os pais de uma criança ou seus pais adotivos/guardiões não assumirem
responsabilidade pelo seu desenvolvimento. Existe um assunto que mencionei
sobre feriados de autocontrole. Devo dizer que, para que a criança se desenvolva
a ponto de descobrir as profundezas de sua natureza, alguém tem de desafiá-la e,
algumas vezes, até odiá-la. E quem melhor para fazer isso que os próprios pais
(que podem odiar sem oferecer perigo de uma ruptura de relação)?

A volta pra casa não é fácil. Além dos problemas normais no convívio com
crianças, é preciso gradualmente reconquistar a criança e a readaptá-la à dinâmica familiar.
É preciso colocar limites, acima de tudo! A família tem de manter uma postura enérgica
desde o início, e não somente quando a criança manifestar comportamentos desafiadores,
pois isto quebraria a confiança dela em relação à força de atenção dos pais sobre ela.
Importa indicar alguns indicadores de adaptabilidade (recursos psíquicos) da
criança: existência ou não de um lar estável, em relação ao original, no imaginário da
criança; habilidade para brincar; perseverar; fazer amigos: quando essas variáveis estão
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bem encaminhadas, há forte indício de saúde por parte da criança, pois crianças ansiosas
mudam frequentemente de amigos e crianças com sérios distúrbios apenas conseguem
integrar grupos na medida em que estes sejam verdadeiras gangues: organizadas para
perseguir algo (a maioria das crianças tiradas a força de seus lares e levadas para os abrigos
eram incapazes de brincar, de persistir em tarefas construtivas ou de estabelecer amizades.

Deliquencia e tendência antissocial


Winnicott decididamente distingue a delinquência da tendência antissocial, embora
sua raiz seja a mesma: a deprivação. Na delinquência, caracterizada pelo comportamento
criminoso, o indivíduo já se identificou com o estilo antissocial de viver. Além de haver
uma beneficiação secundária pela doença (ou seja, o modo de ser trazer vantagens práticas
ao indivíduo em questão), ocorre uma configuração de defesas psicológicas direcionadas à
conduta antissocial, de modo a ser difícil uma reconciliação e recuperação por parte do
sujeito para com a sociedade.
A personalidade perversa (e outras do estado limítrofe) se constitui a partir da
passagem da tendência antissocial para um padrão de conduta, um caráter, antissocial.
Neste caso, não há atos antissociais esporádicos, agudos, que decorrem automaticamente
de perdas ou representam uma reação instantânea a crises episódicas da vida, mas um
padrão consistente, crônico e sistemático de comportamento antissocial, configurado em
torno de mecanismos defensivos fixos, estereotipados. Enquanto no ato antissocial normal
o sujeito se sente momentaneamente perseguido e reclama por um bem-estar, na
personalidade antissocial, o sujeito se sente constantemente perseguido.
No transtorno de personalidade paranoide pode haver a sobreposição de distúrbios
de personalidade e de caráter (bem como nos outros estados limítrofes – borderline,
narcisista, antissocial), no qual o sujeito se “organiza” (em função também de sucessivas
deprivações não devidamente amparadas pelo ambiente) em torno de (mecanismos de)
defesas primitivas, as quais são resultado de respostas antissociais que de alguma forma
são recompensadas com vantagens sociais (quando, por exemplo, um criminoso é
reforçado com reputação, bens de consumo e etc. que o compensem pelo desfavorecimento
outrora sofrido), de modo a tornar-se parte sistemática de seu funcionamento psíquico e de
seu comportamento geral em relação ao meio.
A personalidade antissocial é a consequência trágica da persistência de deprivações
sucessivas, não cuidadas (curadas) pelo ambiente de modo reparador.
Para se desenvolver um repertório, estilo de conduta antissocial, com aparente
obstrução da capacidade para o sentimento de culpa, o processo que se dá é o seguinte:
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O sentimento de culpa, moral, se forma, mas é perdido quando os ganhos secundários são
alcançados. Assim, a melhor época para tratar a tendência antissocial comportamental é
antes dos ganhos secundários serem adquiridos, pois até esta fase a criança está sendo
compelida a roubar e destruir apesar do sentimento de desconforto em relação aos atos. O
padrão é o seguinte:
1 as coisas vão bem para a criança
2 algo causa distúrbio no ambiente pacífico
3 a criança é exigida além da sua capacidade (as defesas do ego são suplantadas)
4 a psique infantil se reorganiza em torno da base de um novo padrão de defesa egoica,
mais arcaico
5 a criança começa a se tornar mais esperançosa de novo, e mobiliza atos antissociais
esperançosos – para coagir a sociedade no sentido de reconhecer sua fala e de restaurar o
estado promissor anterior
6 se 5 acontecer, ela pode reestabelecer a continuidade do seu desenvolvimento, através do
(re)descobrimento-criação de um bom objeto (se reintegrando, unificando) e um bom
controle e segurança pessoal, para desempenhar sobre o ambiente no momento das
exigências pulsional amorosas e destrutivas.
Mais especificamente, a criança usa o comportamento antissocial, que é natural,
para induzir o ambiente que o cerca a lhe prover as condições adequadas (recuperando o
status quo anterior à deprivação) de capacitação e amadurecimento. Quando isso funciona,
ele aprende a lógica por detrás da conduta e o sedimenta em seu ego como uma defesa.
Vale destacar que Winnicott aponta para a possibilidade de certas crianças
nascerem e se desenvolverem absolutamente amorais, mas isso não ofusca a importância
dos fatores ambientais na constituição da personalidade.
A delinquência (personalidade antissocial) é um complexo de defesas antissociais
sobrecarregada de ganhos secundários e reações sociais que tornam difícil a reconciliação
do jovem comprometido com o meio – o que torna o trabalho do investigador difícil. Por
sua vez, a tendência antissocial pode ser mais facilmente investigada, em crianças
saudáveis ou apenas parcialmente prejudicadas.
Para Winnicott, a delinquência, bem como a tendência antissocial, é “um sinal de
esperança”. Inconscientemente o delinquente busca reencontrar “bons pais”. O grande
problema é que o ambiente social não aceita, não tolera esse tipo de comportamento, e,
mesmo por conta da mentalidade cultural em que estamos inseridos, a primeira iniciativa
da sociedade é punir o delinquente, e não compreendê-lo. Vale lembrar, por outro lado, que
o delinquente não é consciente de seus atos, e um exame mais detido das motivações
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inconscientes do indivíduo irá apontar para a sensação de perda e de deprivação,


desconhecidas pelos agentes punitivos.
Winnicott assevera que para lidar com crianças com tendências antissociais, é inútil
recomendar apenas psicoterapia. O melhor tratamento é operar desenvolvimentos através
dos próprios grupos de convívio (instituições, família, comunidade...). Isso se justifica pelo
fato de a mudança implicar em perda de algo vital na relação, e quando é o próprio grupo
que envereda a trilha da mudança, a criança é capaz de fazer trocas adequadamente.
Apoiando-se em Bowlby, Winnicott classifica níveis de perturbação infantil, a
partir do modo de reação da criança frente à deprivação:
A – Crianças ansiosas, podendo ser deprimidas ou não.
B – Crianças fechadas em si mesmas, tendendo a se afastar de relacionamentos.
C – Crianças ciumentas e briguentas.
D – Crianças hiperativas e agressivas.
E – Crianças com estados alternantes de exaltação incontida (mania) e depressão.
F – Crianças delinquentes.

Os graus de perturbação seriam esses:


I – Leve – pequenas dificuldades no relacionamento social e escolar; breves terapias levam
à adaptação.
II – Razoavelmente sério (corrigindo-se com tratamento e compreensão) – sério desajuste,
necessita de tratamento clínico fundamentado em cuidado e atenção.
III – Distúrbio emocional profundo – indica um severo distúrbio emocional que, a menos
que seja devidamente tratado nos estágios precoces, leva a sérios problemas futuros.

Segundo Winnicott, o tratamento para a tendência antissocial não é a psicanálise,


mas o gerenciamento da esperança através de uma assistência social apropriada e
especializada. O tratamento efetivo deve fazer com que a criança experimente seus
impulsos de modo que eles sejam devidamente testados e atualizados na estabilidade de um
novo ambiente social propício para ação: o próprio ambiente deve propiciar novas
oportunidades para que o ego se reconstrua.
Funções ambientais para crianças desajustadas socialmente:
1 Lar adotivo (depois de seguras, as crianças sentem ódio pela deprivação sentida – é
importante os pais adotivos compreenderem isso).
2 instituições de acolhimento (provisão de roupas, comida, abrigo)
3 instituições psiquiátricas (casos mais graves)
4 prisão (quando se falha a tentativa de correção terapêutica)
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Outras variáveis que influenciaram no desenvolvimento da criança:


1 idade
2 genética e nível de inteligência
3 diagnóstico psiquiátrico
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FREUD – MAL ESTAL NA CIVILIZAÇÃO

Funções humanas: 1) Preservação de si; 2) Preservação da espécie humana


/
Agressividade sobre si/agressividade ao outro---------Amor sobre si/amor ao outro
/
Exige regulação:
Regulação individual: Instâncias (Id, Ego, Supergo); Mecanismos de defesa (Repressão,
internalização, projeção, evacuação, deslocamento, ..., sublimação).
Regulação social: Instituições (Jurídica, educacional, hospitalar, religiosa, familiar...);
Dispositivos institucionais (operadores do Direito, etc.).
/
Exige a renúncia de parcela da vida anímica:
O que inevitavelmente acarreta em mal-estar (infelicidade) ao ser humano (Freud
pessimista):
Se o ser humano cede irrefreavelmente aos seus impulsos, isso desembocaria na
destruição da civilização, e, por conseguinte, na derrocada dos seres humanos enquanto
indivíduos. Se, por outro lado, o ser humano abdica de parte de seus impulsos, apesar de
isso lhe produzir mal-estar enquanto indivíduo, favorece-se a conservação da vida em
sociedade e, portanto, a conservação do indivíduo nela imerso.

Para amenizar o Mal-estar, tanto a civilização, por meio de seus instrumentos


culturais, como o indivíduo, podem se disponibilizar de mecanismos de defesas mais ou
menos aprimorados. O mais sofisticado no plano intra-subjetivo é a sublimação: impulsos
inaceitáveis são transformados em ações socialmente bem aceitas e vantajosas -
agressividade se torna animosidade para estudo ou competições esportivas, por exemplo.
Assim produz-se Arte, Cultura, Religião, Ciência.
A sociedade também desenvolve institucionalmente formas diretas (primitivas) de
descarga pulsional e alívio do sofrimento mental através de canais de evacuação de tensão,
dispositivos sociais evacuatórios: tempo de lazer; esporte; eventos festivos...
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De forma mais descrita, podemos entender o texto freudiano resumidamente da


seguinte maneira:
A princípio, importa ressaltar que o ser humano é uma espécie intrinsecamente
coletiva. Somos relativamente dependentes uns dos outros para manter a nossa vida
individual, tanto em relação à proteção que o grupo oferece, quanto ao nosso modo
particular de trabalhar, que é necessariamente cooperativo. A vida do indivíduo corre risco
em caso de isolamento social. Portanto, a sociedade garante a preservação da vida humana.
Nesse sentido, uma vez de não podermos abstrair o sentido da vida a um nível
metafísico de forma terminante, tudo o que sabemos até então é, de acordo com Freud, que
podemos indicializar duas grandes funções (finalidades) do ser humano: 1) preservação
(conservação) e manutenção da própria vida (sobrevivência de si); 2) preservação
(conservação) e manutenção da humananidade (sobrevivência da espécie humana).
Servindo a tais funções existenciais, existem dois motores afetivos (pulsões)
primitivos: 1) Pulsão (de morte - agressividade) – desligamento; 2) Pulsão de vida (sexual -
amor) – ligação.
Cada pulsão tem uma dupla direção; ou seja, sexualidade voltada pra si (narcisismo
– amor-próprio) e sexualidade voltada para “fora”, para o outro (amor objetal); e,
agressividade voltada para si (masoquismo, sentimento de culpa...) e agressividade voltada
para o outro (sadismo, autoimposição e diferenciação do outro...).
Nota-se que, enquanto o amor-próprio tende a garantir a sobrevivência do indivíduo
e o amor ao outro tende a garantir a sobrevivência da espécie, inversamente, a
agressividade (na forma de pudor, vergonha, senso de responsabilidade, sentimento de
culpa...) voltada a si favorece, por outro lado, a sobrevivência da espécie e a agressividade
ao outro favorece a sobrevivência individual.
Em alguma medida, todas as pulsões servem à finalidade de manutenção da vida
humana, tanto a nível individual como coletivo. Evidentemente, isso acontece com o amor.
O amor-próprio sustenta o instinto de sobrevivência; o amor solidário sustenta a
sobrevivência da humanidade. Mesmo a agressividade é necessária para a vida do
indivíduo e da civilização: graças à autoagressividade, em uma forma sofisticada, temos o
sentimento de culpa, que possibilita contermos nosso impulsos (agressivos ou sexualmente
inadequados) diante ao outro, ou, em outras palavras, possibilita sermos morais, proibitivos
– censura é necessária. Também a agressividade direcionada ao outro é indispensável, pois
é mister nos impormos perante ao outro, isto é, não nos deixarmos submeter
inapelavelmente ao desejo do outro, uma vez que este possa estar para nós em função de
nos oprimir: preservar a comunidade e a si mesmo requer uma delimitação ativa, portanto,
agressiva, muitas vezes.
Sendo assim, a mente humana nada mais é do que um aparelho de regulação e
organização das pulsões, isto é, do mundo interno do sujeito em relação constante ao
externo, visando conservar/preservar, concomitantemente, a vida do indivíduo e a da
espécie humana. Trata-se, assim, de uma tarefa especialmente árdua, pois, não raro, tais
formas de preservação entram em conflito uma com a outra, bem como as diferentes
pulsões.
Na função de regular as tensões instâncias (Id, Ego, Superego) e mecanismos de
defesa (Repressão, Identificação, Projeção..., Sublimação) formam-se a nível intra-
subjetivo; a nível de escala social, inter e trans-subjetivo, formam-se as instituições e os
dispositivos institucionais para controle (disciplinação) dos afetos humanos – ou seja, em
algum nível, de acordo com Freud, contenção, repressão e controle são indispensáveis para
o funcionamento sustentável da humanidade, enquanto civilização e aparelho psíquico
solipsista.
Em outras palavras, sinteticamente, somos obrigados a renunciar, abdicar de parcela
da nossa vida anímica em função da vida social, da auto-proteção e conservação da vida
humana em geral. Satisfazer nossos impulsos de maneira direta acarretaria em mal-estar;
abdicar de satisfazer nossos desejos também acarreta em mal-estar. Sendo assim, não ha
como escapar: a infelicidade humana é certa.
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Caso sejamos particularmente narcisistas, egoístas, egocêntricos (tenhamos amor-


próprio em demasia)... nós, de fato, elevamos nossa condição de existência individual;
contudo, isso se daria às custas da preservação da espécie humana (da sociedade), pois
estaríamos suprimindo, reduzindo o poder de solidariedade indispensável para a vida em
civilização - o que em última instancia também coloca o indivíduo em risco, pois é tão
verdadeiro afirmar que o ser humano dificilmente (sobre)vive de modo absolutamente
independente. Conforme Freud (1914), “um egoísmo forte constitui uma proteção contra o
adoecer, mas, num último recurso, devemos começar a amar a fim de não adoecermos, e
estamos destinados a cair doentes se, em conseqüência da frustração, formos incapazes de
amar.” A recíproca é verdadeira: se formos generosos a um nível exacerbado, sem orgulho,
dignidade e/ou amor-próprio, elevamos a condição de conservação da humanidade, mas
diminuímos os recursos da vida individual, o que acarretaria em prejuízo social, uma vez
de o indivíduo ser fundamental para o funcionamento social.
A mesma lógica cabe à agressividade: se formos especialmente auto-condenatórios,
auto-punitivos, autoflagelantes..., moral ou fisicamente, sacrificamos nossa existência
individual em função do outro e da civilização; ou seja, reduz-se condição da vida
individual em prol da vida social - o que, em última instância, é verdade dizer, também
prejudica e põe em risco o funcionamento cooperativo da civilização, uma vez de esta não
se fazer sem o indivíduo diferenciado um do outro. Por outro lado, se formos
especialmente agressivos e/ou sádicos uns com os outros, aumenta-se alguma condição da
vida individual de um lado, contudo, reduzimos a condição da vida social por outro.
Para Freud, um perfeito equilíbrio da vida mental jamais se dá, pois, para
sobreviver enquanto indivíduo ao mesmo tempo conservando a civilização, o sujeito se vê
obrigado a renunciar (reprimir) parcela significativa da sua vida mental, o que gera a
sensação de mal-estar (angústia). Por outro lado, a vida ascética (isolada) é tanto limitante
quanto a outra, pois necessitamos uns dos outros para que nossa vida individual seja
satisfatória, não adiantando, não sendo suficiente, abster-se da vida pública pensando no
usufruto individualista das nossas necessidades pulsionais.
Portanto, faz necessário reverter, redirecionar nossos afetos básicos para finalidades
socialmente vantajosas, como forma de combinar a necessidade de atendermos, saciarmos
nossos anseios com a necessidade de cuidar pela preservação da sociedade. Tanto esta
desenvolve recursos, canais, para escoar de maneira não prejudicial ou transformar tais
afetos, como o indivíduo desenvolve recursos psíquicos próprios para assim o fazer. Uma
sociedade bem equilibrada possui instituições refinadas para esse propósito, sobretudo na
área das ciências e cultura. Uma pessoa bem organizada possui recursos adequados para
atingir tais propósitos. Um sujeito desajustado, disfuncional (doente, perturbado...), é
aquele que não recebeu devidamente amparo institucional (familiar, educacional...)
apropriado da sociedade, obstruindo-o ou impedindo-o de desenvolver recursos
particulares para o bem-viver.
Para tentar definir um sujeito saudável, Freud se apoia em suas noções de neurose e
psicose. Enquanto nos distúrbios neuróticos o sujeito se priva, restringe, limita, abdica... de
parcela da vida mental em função da boa convivência ou, em outras palavras, renuncia ao
princípio do prazer em função do princípio da realidade (resignação – religiões...), nos
distúrbios psicóticos o sujeito se priva do mundo externo para obter satisfação por meio do
seu mundo interno, isto é, barra o princípio da realidade em prol do princípio do prazer: o
sujeito saudável é aquele vive em função do princípio da realidade como um sujeito
neurótico, mas busca transformá-la, e não limitá-la ou reprimi-la, em função do princípio
do prazer, como um sujeito psicótico. O sujeito saudável e enérgico absorve para si
recursos saudáveis da neurose e da psicose2

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Sujeito enérgico e saudável: aquele que sustém em si o ímpeto, próprio ao psicótico, para transformar a
realidade sem rechaçá-la, mas conservando intacto seu juízo de realidade, como o neurótico.
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Psicologia de grupo e análise do Eu (FREUD)

O ser humano é inerentemente social. Nascemos em grupo. Nossa subjetividade


individual se forma a partir das relações sociais. E o primeiro grupo no qual nos inserimos
é a família.
Um grupo se baseia da relação entre duas ou mais pessoas. Inevitavelmente, cria-se
uma forma de relação vertical: Os pais exercem papel de preponderância de desejos,
valores, imposições... sobre os filhos, que torna-se então um conjunto, um complexo, de
registros imagéticos e simbólicos interiorizado, incorporado, no indivíduo, formando o
núcleo de seu Superego. Chama-se a relação vertical interiorizada de identificação
primária.
Secundariamente, dá-se um tipo de relação horizontal entre os filhos, uma vez de
identificarem uns nos outros (entre os irmãos) registros semelhantes aos que foram
interiorizados em si mesmos, reforçando, estreitando, o grau de ligação (irmandade) na
família, e consolidando-a como um grupo unido: compartilha-se dos “mesmos” registros, o
que os torna comuns, “comungados”, próximos, entre si. Chama-se a relação horizontal de
identificação secundária.
As identificações primárias e secundárias são os mecanismos de defesa que
constituem-nos, configurando nossas respectivas identidades e personalidades. Somos o
que somos em função dos outros, da sociedade, da cultura, do meio social no qual estamos
inseridos, imersos. As redes de identificação não apenas definem nossos papéis nas
relações grupais, mas dão sentido pra nossa existência enquanto sujeito.
Sendo assim, falhas constitutivas nas primeiras identificações tornam-nos mais
suscetíveis, vulneráveis, a uma imposição de figuras de autoridade, de liderança, na vida
adulta. Um líder de um grupo qualquer pode assumir mais facilmente o papel de
identificação primária quando na família original de um certo indivíduo não foram
desenvolvidas vínculos sustentáveis, bem como os participantes do grupo podem assumir a
figura de irmãos, substituindo o superego pelos ideais do grupo em questão.
Sabe-se que o grupo tem o potencial de privar-nos de nosso senso crítico próprio,
distribuindo, diluindo, a responsabilidade individual ao grupo. Estruturas familiares sólidas
possibilitam indivíduos mais autoconfiantes, invulneráveis, resilientes, de juízo crítico
preservado... Enquanto que desestruturações familiares ensejam indivíduos mais
propensos, influenciáveis, sugestionáveis, expostos... a figuras sedutoras e convictas das
próprias ideias.

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