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Desenvolvimento Humano

ADOLESCÊNCIA
Hall (apud OLIVEIRA, 2017) definia a adolescência como o período evolutivo marcado por
“tempestade e tormenta”, devido ao desabrochar da sexualidade e à expressão de
comportamentos impulsivos de humor oscilante. Esse conceito é ultrapassado, porém, ainda é
importante, pois difundiu uma ideia que ficou fortemente arraigada na nossa cultura,
influenciando estudos posteriores.
Erickson (apud OLIVEIRA, 2017) propõe a evolução da identidade humana em uma sequência de
fases, sendo a adolescência a mais crítica dessas, por representar uma difusão de papéis que
precisam ser elaborados, dando suporte à idade adulta.
Aberastury e Knobel (apud OLIVEIRA, 2017) também enfatizam a crise e os conflitos da
adolescência, atribuindo-os a três perdas fundamentais cujos lutos precisam ser elaborados: o
corpo infantil, a identidade infantil e as relações com os pais de infância. O adolescente passa,
então, por esse período de instabilidades e de desequilíbrio, que são apresentados como normais,
visto que são necessários à formação da maturidade do adulto.
para a Organização Mundial de Saúde (XXXX), a adolescência é “um período
biopsicossocial que compreende a segunda década da vida, ou seja, dos 10 aos 20 anos”.
O Ministério da Saúde do Brasil e o IBGE concordam com esse período; já o Estatuto da
Criança e do Adolescente o identifica dos 12 aos 18 anos. Mas não é somente uma
questão de idade, pois “a adolescência inicia-se com as mudanças corporais da
puberdade e termina com a inserção social, profissional e econômica na sociedade
adulta” (FORMIGLI et al. apud SCHOEN-FERREIRA et al., 2010, p. 227).

Na nossa cultura, entendemos que o desenvolvimento se dá em diversos estágios,


iniciando pela fase pré-natal, a do neonato, a infância, a pré-adolescência, a adolescência,
a adulta e a velhice
Na cultura dos trobriandenses, habitantes de ilhas da Nova Guiné, a puberdade
acontece antes da nossa e nela existe a iniciação sexual e a participação nas atividades
produtivas. Eles têm um rito de passagem ao atingir a puberdade: para que o incesto seja
evitado, os jovens deixam de habitar com suas famílias e vão viver, até se casarem, em
uma espécie de república, coordenada por um homem mais velho, solteiro ou viúvo.
Se compararmos com a nossa cultura, os trobriandenses passam da pré-adolescência
para a fase adulta sem a necessidade de uma fase de preparação. Já na nossa sociedade,
não podemos identificar um único rito de passagem, mas diversos, que acontecem ao
longo de um tempo maior, e durante o qual o indivíduo não possui o status de criança,
nem de adulto, mas de adolescente (BOCK et al., 2009).
Dito isso, podemos justificar nossa afirmação precedente, a internalização
das explicações científicas sobre o fenômeno da adolescência passaram a fazer
parte das representações sociais quanto a esse período, contribuindo para seu
fortalecimento e para a complexidade da sua configuração.
 Mudanças físicas, sociais e comportamentais do adolescente
 inicia com a puberdade. Se procuramos a definição dessa palavra em dicionários
e artigos científicos, é comum encontrarmos que esta também é uma fase do
desenvolvimento que fica entre a infância e a adolescência.
A palavra “puberdade” se refere objetivamente ao período de mudanças
biológicas e fisiológicas que ocorrem no corpo humano dos indivíduos,
aproximadamente na idade de 10 anos para meninas e 12 para os meninos. Na
nossa sociedade, se convencionou que esse é o início da adolescência .
Para Lourenço e Queiroz (2010), a puberdade corresponde ao início da
adolescência, dura de dois a quatro anos e se caracteriza por mudanças
geneticamente determinadas, que se iniciam pela ativação de gonadotrofinas, as
quais estimulam os hormônios que definem o dimorfismo sexual, uma vez que
existem poucas diferenças na forma do corpo das crianças e, com a puberdade,
os corpos feminino e masculino desenvolvem os órgãos sexuais e as
características sexuais secundárias. Em síntese, a puberdade é caracterizada
fundamentalmente pelos eventos enumerados abaixo.
Crescimento esquelético linear.
Alteração da forma e composição corporal.
Desenvolvimento dos órgãos e sistemas.
Desenvolvimento das gônadas e dos caracteres sexuais secundários (LOURENÇO;
QUEIROZ, 2010, p. 71).
Sendo assim, as condições socioeconômicas podem retardar e influenciar a puberdade
das comunidades mais carentes, e essas mesmas condições têm a propriedade de
encurtarem o período da adolescência, antecipando a adultez das comunidades citadas,
em consequência da necessidade que a juventude carente tem de entrar no mercado de
trabalho.
 Na necessidade de construir uma nova identidade a pessoa enfrenta dificuldades
internas, como ansiedade e depressão, ou voltadas para o externo, como condutas
antissociais, oposições e desafios.
O comportamento do adolescente pode variar conforme o meio onde esse se
desenvolve, pois sua subjetividade se constrói enquanto ele atua e interage no seu
ambiente social. Importa observar como o adolescente se desenvolve historicamente,
pois “... só é possível compreender qualquer fato a partir da sua inserção na totalidade,
na qual esse fato foi produzido, totalidade essa que o constitui e lhe dá sentido”
(BOCK apud BORDIGNON, 2015, p. 11).

Para Parsons (apud SANTOS, 2009), a sociedade é um sistema complexo, composto


por quatro subsistemas, os quais descrevemos abaixo.

FAMILIA E CONTEXTO FAMILIAR


Bock et al. (2009) explicam que a família é responsável pela procriação, pela
sobrevivência, pela inserção do indivíduo na sociedade através do ensino da língua, dos
hábitos e dos costumes, enfim, concretizar os direitos da criança e do adolescente: “o
direito aos cuidados essenciais para seu crescimento e desenvolvimento físico, psíquico e
social” (BOCK et al., 2009, p. 249). Tal responsabilidade é tão fundamental que, na falta de
uma família, será necessária uma família substituta, ou uma instituição de acolhimento
que supra essas necessidades de inserimento do indivíduo no mundo concreto.

4.2 Adolescente no e após o contexto familiar


O subtítulo “no e após o contexto familiar” foi escolhido a fim de recordarmos que nossos
estudos, em psicologia, são sempre dirigidos a encontrar melhores entendimentos sobre
o comportamento das pessoas, e assim fazer propostas de intervenção que contribuam
para que seu inserimento social seja positivo. Assim, o que for o adolescente no
contexto familiar, vai impactar o após, quando o indivíduo for considerado adulto,
quando deverá lidar com sua vida com independência, autonomia e responsabilidade,
para ter um trabalho, uma função social, uma família e tantos outros papéis que irá jogar
no futuro

TECNICAS DA PESQUISA PSICOLOGICA


1 Histórico da construção das primeiras técnicas de medida e área de aplicação da psicologia
A psicologia, tal qual se concebe hoje, apresenta uma variada gama de técnicas de
pesquisa. Partindo de modelos de natureza estritamente quantitativas, até modelos de
natureza estritamente qualitativa, bem como pela infinidade de métodos presentes no
escopo entre eles, constata-se uma imensa possibilidade de formas de construção de
saberes nesse campo. Essa diversidade tem fruto na multidisciplinaridade responsável
por organizar o que hoje conhecemos por ciência psicológica. Cabe elencar alguns
marcos, nesse sentido, a fim de demonstrar as principais bases da psicologia e como elas
determinaram métodos e técnicas de investigação que têm reflexo até os dias atuais.     
1.1 Psicologia Científica
A Psicologia se estabeleceu como ciência em um cenário no qual o positivismo era o
principal paradigma científico. Havia também forte influência do pragmatismo. Essa
configuração impulsionou pesquisas que, embora voltadas a um caráter prático, tivessem
como característica a possibilidade de:    
Considera-se o surgimento da psicologia como ciência a partir das pesquisas de Wilhelm
Wundt, e a fundação do primeiro laboratório de pesquisa em psicologia experimental, na
cidade de Leipzig (Alemanha), em 1875.
Antes da inauguração do laboratório, o então estudioso da fisiologia e docente no campo,
Wundt, começou a conceber a psicologia como uma ciência independente (SCHULTZ;
SCHULTZ, 2002). Ainda em ambiente doméstico, Wundt mantinha estudos sobre o
processo psicológico da percepção, originando a publicação da obra “Contribuições para
a Teoria da Percepção Sensorial” (1858 – 1862). Nessa obra, o autor utiliza pela primeira
vez o termo psicologia experimental, enquanto descreve seus experimentos originais.
Schultz e Schultz (2012) afirmam que a publicação da obra Princípios de Psicologia
Fisiológica (1873 – 1874) foi um marco para a vindoura ciência psicológica, pois nela
Wundt demarca a psicologia como munida da possibilidade de investigação científica
e laboratorial. Ideias sobre as variáveis tempo e intensidade de reação a estímulos
foram tomando espaço na obra de Wundt, revelando uma potencialidade da execução de
pesquisas no campo psicológico que se assemelhavam àquelas das ciências naturais.
Para Schultz e Schultz (2012, p. 81) “o espírito da época no campo da fisiologia e da
filosofia ajudou a moldar tanto o objeto de estudo da nova psicologia como os seus
métodos de investigação”.

O método dominante nas pesquisas de Wundt era a introspecção. Esse método refere-
se ao questionamento do indivíduo pesquisado sobre a experiência que ele vivencia. Para
o teórico, só a pessoa que passa pela experiência tem condições de explicá-la – mesmo
aquelas experiências mais básicas. O método introspectivo funciona da seguinte
maneira:    
indivíduo vivencia a experiência;
indivíduo descreve a experiência;
pesquisador registra a experiência descrita.
Wundt tinha como foco o estudo de processos da consciência e a introspecção servia
como acesso a esses processos. Certamente, esse método recebeu inúmeras críticas, em
especial devido ao questionamento acerca da imparcialidade daquele que fornece os
dados. Estaria o indivíduo trazendo relatos acurados sobre o que vivenciou? Essa
experiência vivenciada estaria ofuscada por variáveis não previstas pelo pesquisador? O
pesquisador estaria compreendendo com clareza a descrição do indivíduo?
Embora os questionamentos sejam relevantes, o fato é que o método introspectivo
proporcionou à psicologia – mesmo aquela experimental, adotada primariamente por
Wundt – o acesso a fenômenos psicológicos antes não estudados sob critério científico.
Ademais, o método introspectivo passou a ser adotado principalmente nas pesquisas
qualitativas e até os dias atuais possui inserção nas pesquisas, estando na base de
delineamentos dessa natureza. 
Essa busca foi fundamental para a definição dos estudos no campo da psicologia que se
sucederam. Seu impacto extrapolou o âmbito experimental e os estudos sobre processos
psicológicos básicos. As pesquisas no laboratório de Leipzig formaram uma leva de
psicólogos que difundiram e aprimoraram a psicologia experimental, com cunho
notadamente quantitativo. Grande parte desses psicólogos migrou para os Estados
Unidos, terra onde até hoje as pesquisas quantitativas no campo da psicologia são
dominantes.
A abordagem experimental foi bastante presente na psicologia, principalmente no início
do Século XX. Sua utilização ganhou notoriedade em pesquisas clássicas da psicologia da
Gestalt e nas pesquisas da abordagem behaviorista. Nessa última, em especial na
figura de Skinner, foram adotados modelos quase-experimentais, que serão melhor
descritos adiante.
.    
1.2 Psicometria e a criação dos primeiros testes
psicológicos
No cenário da psicologia científica, ganharam destaques os processos de testagem
psicológica com objetivos mais funcionais. Mais do que conhecer o funcionamento
mental, alguns teóricos focaram na aplicabilidade das mensurações em contextos como o
trabalho, a clínica e a educação. Surgem, então, os primeiros testes psicométricos,
tendo como objetivo mensurar processos psicológicos e realizar inferências sobre o
indivíduo a partir deles.
Anastasi (1990) define os testes psicológicos como medidas objetivas e padronizadas de
amostras do comportamento humano. Atualmente, há diversos recursos tecnológicos
para aplicação e análise dos testes, principalmente os psicométricos. A origem da
psicometria remonta os primeiros passos da formulação científica da psicologia. Havia
forte tendência a compreender a psicologia e seus fenômenos à luz da lógica aplicada nas
ciências naturais. Paralelamente às experimentações e medições ocorridas no cenário
alemão, com forte influência do laboratório de Leipzig, na Inglaterra, ganha destaque os
trabalhos de Galton.
Galton foi um dos pioneiros no estudo da inteligência. O teórico acreditava que
características mentais poderiam ser transmitidas entre gerações. Nas duas últimas
décadas do século XIX, realizou estudos com pessoas eminentes, de sucesso, e buscou
traçar padrões hereditários que justificassem as altas habilidades. Tinha, como
proposta, realizar massivamente exames na população inglesa, no intuito de selecionar
os melhores representantes, com base nos resultados encontrados. A proposta de Galton
foi bastante criticada, pois associa-se a ele o conceito de eugenia, uma vez que o critério
racial era uma variável considerada em seus estudos que, muitas vezes, provavam a
superioridade dos ditos ingleses puros (DEL CONT, 2008).
No mesmo período, na França, Alfred Binet elaborava suas primeiras pesquisas sobre
inteligência. Binet foi um profissional preocupado com o desenvolvimento cognitivo.
Observando suas filhas, e posteriormente expandindo suas experimentações, formulou
hipóteses sobre inteligência (SILVA, 2011). Teve como vislumbre a possível contribuição
da psicometria com o aprimoramento de funções acadêmicas.
Em 1890, em conjunto com o pesquisador Henri Beaunis, Binet reforça pesquisas sobre a
mensuração de processos psicológicos. Os autores propõem uma bateria preliminar com
foco na mensuração de dez diferenças individuais:    
memória,
imagens mentais,
imaginação,
atenção,
compreensão,
sugestionabilidade,
apreciação estética,
sentimentos morais,
força muscular,
e coordenação motora (SILVA, 2010).
Silva (2010, p. 48-49) aponta que, embora o interesse de Binet fosse direcionado a
estratégias quantitativas, o pesquisador desenvolveu pesquisas que, atualmente, seriam
consideradas precursores de testes projetivos:
Algumas das tarefas que propunha eram: escrever as 10 primeiras palavras, sentenças ou
recordações que lhes ocorresse (sem lhes dar qualquer outra instrução); completar
frases incompletas; escrever sobre objetos concretos, usados como estímulo (uma
moeda antiga, a folha de uma árvore) ou sobre situações imaginárias (a morte de um
cachorro) e responder a manchas de tinta – uma década antes de Hermann Rorschach
desenvolver o seu Psicodiagnóstico.    
Posteriormente, em associação com Simon, lançou a Escala Binet-Simon de
Inteligência, que posteriormente daria origem aos testes de Quociente de Inteligência
(QI). Os pesquisadores buscaram medir habilidades supostamente padrão para cada
idade. Levando essa média como consideração, desenvolveram e publicaram em 1905 a
primeira versão da Escala Binet-Simon de Inteligência, que foi refinada e atualizada nos
anos subsequentes.

1.3 Testes projetivos: medindo o abstrato


No início do século XX, com o avançar da ciência psicológica e, essencialmente, das
abordagens clínicas da psicologia e áreas afins – notadamente, a psicanálise – novos
desafios são impostos aos profissionais. A medida de funções psicológicas
inferiores passa a não dar conta de questões mais complexas, encaradas no contexto
clínico de atuação.
Surgem, então, técnicas consideradas expressivas. Busca-se, em especial, avaliar
conteúdos da personalidade humana que teóricos europeus – centro dessa discussão –
não consideravam possíveis de serem acessados nas técnicas psicométricas. Silva (2010,
p. 70) relata que alguns dos métodos expressivos buscavam acessar os significados de
“expressões faciais, gestos, postura física e movimento, qualidade da voz e constituição
corporal”. Nessa abordagem, a posição de passividade do aplicador não é demandada.
Afinal, principalmente ao atuar na condição de terapeuta, a relação interpessoal entre
aplicador e sujeito testado está em evidência.
Carl Jung foi um dos primeiros a desenvolver métodos que, posteriormente, foram
considerados projetivos. Silva (2010, p. 72) os define como: “métodos de investigação da
personalidade que fazem uso de material ambíguo e consideram as respostas produzidas
como singulares e determinadas pela história individual”.
Em 1921, Hermann Rorschach apresenta um dos instrumentos que até hoje segue como
referência na análise da personalidade humana: o Psicodiagnóstico de Rorschach.
Apesar de também apresentar uma base estatística, o conhecido teste de
Rorschach ganha notoriedade pela capacidade de extrair componentes da
personalidade humana – inclusive inconsciente – através da descrição de formas vistas
em manchas abstratas.
Para além dos testes gráficos, surgem também testes baseados em histórias, como o
Teste de Apercepção Temática (TAT), em 1935, e o teste das Fábulas de Düss, em 1950.
Ambos com a pretensão de acessar processos inconscientes da personalidade humana a
partir da narração de histórias despertadas por estímulos pré-definidos.
Juntos, os testes projetivos e psicométricos representam uma forma de acesso a
conteúdos de natureza psicológica cuja aplicação em contextos de trabalho tem sido
mais adotada do que nos contextos de pesquisa. Entretanto, apresentam potencial em
ambas as áreas e revelam muito sobre a evolução histórica da psicologia como ciência.    

2 Considerações sobre o método científico de pesquisa


Antes de nos aprofundarmos no método científico e suas características, é fundamental
nos voltarmos a debates primários acerca do conhecimento. A ciência nunca foi e não é o
único meio de explicar o mundo. De fato, no ocidente a sua configuração – tal qual
conhecemos hoje – se firmou apenas recentemente, com a queda da Idade Média e início
da modernidade, embora suas bases remontem o período grego.
Como dito, o saber científico não é o único que trouxe respostas à humanidade.
Tradicionalmente, ao debatermos acerca do tipo de conhecimento, destacam-se quatro
categoria
Senso comum: Segundo Cotrim (2002, p. 46), o “vasto conjunto de concepções
geralmente aceitas como verdadeiras em determinado meio social recebe o nome de
senso comum”.
Tomemos como exemplo uma crença comum no interior do Nordeste brasileiro. O mês
de março corresponde ao período que ocorre o plantio de milho. Tradicionalmente,
espera-se que chova nos meses seguintes e a colheita estará pronta para os tradicionais
pratos juninos. Esse conhecimento de origem popular não foi originado a partir de uma
base científica, apenas da experiência dos sertanejos ao longo dos anos com plantio de
milho em terras secas.
O saber do senso comum tem como característica a especulação. Apesar de poder ser
confrontado, não precisa ser testado para estar estabelecido entre uma população.
Deriva exclusivamente da experiência e da transmissão, geralmente oral. É aprendido
com o hábito e com o contato com a comunidade que o mantém. Geralmente é
superficial e não tem nenhuma organização sistemática.

Saber religioso: Os acontecimentos têm como fonte de explicação alguma doutrina, a


qual estabelece um ou mais seres ou fenômenos com status de divindade. O saber
religioso tem como característica o fato de ser infalível, pois suas afirmações não carecem
de testagem e comprovação. Assim, não cabe contestação lógica fora da própria
doutrina. O conhecimento religioso frequentemente flerta com questões morais,
explicando até mesmo fenômenos naturais a partir dessa perspectiva. Por exemplo: ao
chover bastante e inundar uma cidade, alguém pode dizer que foi a ira de Deus por estar
entristecido com ações humanas.
Retomando o exemplo do plantio de milho, a tradição se aprofunda um pouco na
explicação do sucesso da colheita plantada em março. No dia 19 de março, comemora-se
o dia de São José, no calendário católico, religião dominante no interior nordestino. Os
sertanejos costumam realizar o plantio de milho exatamente nesse dia, acreditando que
São José auxiliará na boa colheita.
.
Saber filosófico: O saber filosófico tem forte relação com o saber científico. A partir da
chamada filosofia natural, muitos teóricos gregos traçaram ideias sobre o mundo natural,
servindo de base para as atualmente conhecidas ciências naturais. Os métodos filosóficos
também têm forte relação com a forma que as ciências caminham. A epistemologia,
campo da filosofia, busca traçar a história das ciências, apresentando as bases filosóficas
para a construção do conhecimento científico conforme temos contato atualmente.
Ademais, o conhecimento filosófico se sustenta na racionalização e pode alcançar
conteúdos que ultrapassam o limite da experimentação. Fenômenos abstratos ou
intangíveis como as emoções e a morte foram de interesse filosófico muito antes de
existirem métodos para seu estudo sistemático.

Saber científico: Voltemos, uma última vez, ao exemplo da plantação de milho. A agronomia,
como ciência, explicaria o mesmo fenômeno a partir de outra lógica. Seria possível trazer
informações sobre o solo, a temperatura, o volume e a intermitência das chuvas no período
assinalado para o plantio. Para chegar nesse ponto, entretanto, várias pesquisas foram feitas,
utilizando métodos, técnicas e instrumentos próprios dessa ciência. Tudo para explicar um
fenômeno que, no senso comum, não carece de explicação: apenas é assim.
O conhecimento científico é aquele que busca descrever as relações entre certos fatores
ou variáveis partindo de uma análise sistemática, metodológica: o método científico.
Cozby (2003) descreve o método científico como: conjunto objetivo de regras para
coletar, avaliar e relatar informações – hipóteses refutadas ou replicadas. Nas ciências
psicológicas, espera-se que através desse método seja possível predizer acontecimentos
em circunstâncias semelhantes; determinar as causas; e, com isso, compreender ou
explicar o comportamento. Esse saber busca ser generalizável, com aplicações iguais em
indivíduos semelhantes.
O conhecimento científico tem como características: ser testável e,
portanto, refutável. Nenhuma verdade científica é absoluta. Elas podem deixar de
explicar fenômenos se variarmos o paradigma em que se encontram, ou em um mesmo
paradigma, caso haja alguma comprovação que as refutem.
O conhecimento científico é observável. Pode e deve ser demonstrado. O critério
da objetividade também é relevante. Nesse critério, defendeu-se a necessidade de não
haver interferência entre o pesquisador e o fenômeno estudado. Nas ciências humanas e
sociais, diversos debates inflamam essa característica, pois muitos pesquisadores julgam
impossível estabelecer imparcialidade em relação ao fenômeno estudado.
Por fim, reitera-se que o conhecimento científico é sistematizado e obedece a critérios
metodológicos que irão variar de acordo com a afinidade do pesquisador, a natureza do
fenômeno e os objetivos da pesquisa.     
2.1 A Noção de Paradigma
Toda ciência se estabelece e ganha força em uma comunidade científica e em um contexto
histórico e político. Aquilo que é aceito como ciência nesse contexto deve obedecer a
determinações muitas vezes não muito explícitas, mas contundentes. Entende-se como paradigma
Camargo e Santos (2010) afirmam que paradigma significa padrão, modelo. Uma boa
representação do paradigma é a metáfora da lente. O homem vê o mundo através dessa lente,
que o permite distinguir o certo e o errado, o que é cientificamente aceito ou não pela
comunidade.

O paradigma orienta o olhar do pesquisador e da comunidade científica.


Segundo Kuhn (1991), o paradigma se constitui como um conjunto de adesões
conceituais, teóricas e metodológicas dentro de uma comunidade científica. A
educação profissional permite que o cientista internalize esses pressupostos e aja dentro
do modelo vigente muitas vezes sem ter consciência disso. Torna-se, então, mais um
agente reforçador do paradigma em que se encontra.
Um paradigma é substituído por um subsequente a partir de um processo de crise.
Grandes períodos históricos geralmente apresentam séries de fatores que rompem com
paradigmas preexistentes. Após a queda da idade média, o paradigma
científico dominado pela escolástica dá lugar à racionalidade moderna. Outra
possibilidade de quebra de paradigma é expressa quando um anterior não dá conta de
conter uma verdade científica notadamente comprovada. Na física, podemos observar a
quebra do paradigma newtoniano após as descobertas da física quântica.
A noção de paradigma revela que, mesmo na ciência, a verdade não é absoluta, embora
os paradigmas evoluam no sentido de buscar melhores respostas aos fenômenos
estudados. Em um cenário no qual o princípio da verificabilidade dominava, Santos (1988)
retoma o princípio da falseabilidade teorizado por Popper: uma proposição deve ser
considerada verdadeira ou falsa não após o cientista chegar à conclusão de que ela foi
verificada. Ao contrário, a refutação apresenta maior peso de resposta, pois ela é
inegável. Aquilo que é tomado como verdade na ciência hoje pode ser refutado amanhã.
Entretanto, se houver alguma refutação plausível a uma explicação científica até então
aceita, ela deixará de ocupar seu estado de verdade.
2.2 Métodos Indutivo, Dedutivo e Abdutivo: a Possibilidade de Inferência
A palavra método vem do grego methodos, e significa caminho. O método é o caminho
através do qual o pesquisador chega nos resultados. Vimos, anteriormente, que o
método científico visa à generalização. A garantia da generalização torna possível que o
conhecimento científico seja aplicado e replicado.
Por exemplo, em seus estudos, Piaget descobriu que até os 11 anos de idade a criança
não tem o raciocínio lógico abstrato desenvolvido completamente. Assim, o modelo
educacional pode planejar estratégias de ensino para crianças de 6 anos voltadas ao
desenvolvimento de estratégias de raciocínio mais objetivas, baseadas em objetos
concretos. Não é preciso, entretanto, que se realize nova testagem na população de
crianças da escola para poder aplicar o conhecimento descrito por Piaget, pois sua
trajetória de pesquisas demonstra a possibilidade de tal generalização.
Quais seriam as relações entre a generalização e a tomada de conclusões? Há
basicamente duas formas de raciocínio lógico que podem orientar o pesquisador nesse
sentido: indução e dedução.
Raciocínio dedutivo:
A partir de premissas validadas cientificamente, o pesquisador parte de verdades
gerais para tirar conclusões sobre casos particulares.
Por exemplo:
as crianças de 6 anos não desenvolveram ainda o raciocínio lógico abstrato (constatação
geral);
Maria é uma criança de 6 anos (caso particular);
logo, Maria não desenvolveu ainda o raciocínio lógico abstrato (constatação específica
baseada em caso particular).
Raciocínio indutivo:
A partir da observação de casos particulares, busca-se estabelecer uma verdade geral.
Por exemplo:
foram estudadas 500 crianças brasileiras de 6 anos e elas não haviam desenvolvido o
raciocínio lógico abstrato (observação de casos particulares);
logo, crianças de 6 anos não possuem raciocínio lógico abstrato. (tomada de conclusão
geral a partir da observação de casos particulares).
Ambos os raciocínios são complementares. As conclusões tomadas por indução podem
servir para embasar novas deduções, por exemplo. Retomando o princípio da
falseabilidade, notamos que ambos os raciocínios são passíveis de falha, pois basta um
caso distinto do esperado para abalar as conclusões tomadas através desses métodos.
Raciocínio abdutivo:
Atualmente, pensa-se na aplicação do raciocínio abdutivo na psicologia. A abdução
refere-se a uma forma de raciocínio que busca tomar de empréstimo as vantagens dos
demais métodos, mas sem desconsiderar a complexidade dos fenômenos. O seu foco é,
para além da realização da inferência, narrar explicações sobre os elementos estudados.
Para além da mecânica científica, a abdução permite a emergência do insight e da
formulação de novas compreensões e hipóteses.
Nos exemplos acima, em um método abdutivo caberiam questões como:
por que Maria não tem desenvolvido o raciocínio lógico abstrato?
caso ela tenha desenvolvido, o que a torna diferente das crianças previamente
estudadas?
das 500 crianças estudadas, 1 apresentou resultados conflitantes. Quais processos estão
envolvidos nisso?
Nesse sentido, Gonzales e Haselager (2002, p. 22) afirmam que:
3 Os métodos de pesquisa em psicologia 
  
Há diversas formas de classificar as pesquisas quanto ao seu método. As pesquisas no
campo da psicologia atualmente adotam uma grande variedade metodológica, o que
permite múltiplas formas de enxergar os fenômenos de interesse. A seguir, serão
apresentadas as principais classificações de pesquisa reconhecidas no cenário
acadêmico. Desde já se faz a ressalva de que, embora as classificações sejam
importantes, principalmente para fins didáticos, é possível que elas não sejam estanques
e muitas pesquisas não se encaixem precisamente nas descrições apresentadas. Ao
longo da leitura, busque relembrar alguns estudos com que você já teve contato e tente
associá-los às classificações descritas.
3.1 Classificação Quanto à Natureza da Pesquisa
Pesquisa básica
Também conhecidas por pesquisas puras, ou pesquisas fundamentais, elas têm como
objetivo a geração de novos conhecimentos universais para o campo, sem explorar suas
aplicações práticas. Na psicologia, elas são fundamentais para o reconhecimento e a
ampliação do conhecimento sobre fenômenos psicológicos.
Exemplo de pesquisa básica: em um estudo descrito por Myers (2014), mede-se a força
de participantes ao puxar um cabo de guerra. A medição ocorre individualmente e, após
essa etapa, coletivamente.
3.2 Classificação Quanto aos Objetivos
Gil (2008) apresenta três categorias que definem a pesquisa conforme seus objetivos.
Quanto a esse critério, a pesquisa pode ser classificada como: exploratória, descritiva ou
explicativa.
Pesquisa exploratória: “Estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior
familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir
hipóteses” (GIL, 2008, p. 41). Desse modo, a pesquisa exploratória permite ao
pesquisador uma maior compreensão sobre um fenômeno em geral desconhecido ou
pouco estudado pela ciência (ou pela linha teórica adotada pelo pesquisador). Essa
pesquisa costuma ter um delineamento metodológico mais flexível, para permitir ao
máximo a visualização dos aspectos que influenciam o fenômeno estudado.
Gil (2008, p. 41) afirma que, em geral, pesquisas exploratórias apresentam as seguintes
etapas:

Constata-se que, ao puxar o cabo de guerra com colegas, as pessoas não aplicam a
mesma quantidade de força do que quando avaliados individualmente. Esse fenômeno
ficou conhecido como vadiagem social.
No estudo apresentado, o pesquisador buscou provar a existência de um fenômeno
através de uma pesquisa básica, sem pensar sua aplicabilidade prática. Posteriormente,
novos estudos podem ser formulados no intuito de aplicar esse conceito em situações
reais.
Pesquisa aplicada
A pesquisa aplicada visa à solução de problemas específicos. Tem como foco a realização
de pesquisas com finalidade aplicada, não se limitando ao estudo de fenômenos
isolados.
Como exemplo, segue o resumo do estudo de Lacerda e Costa (2013)
(a) levantamento bibliográfico;
(b) entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema
pesquisado;
(c) análise de exemplos que estimulem a compreensão.
3.3 Classificação Quanto à Estratégia de Observação
A variável tempo é fundamental na definição de estudos na área da psicologia,
principalmente quando se busca compreender a evolução temporal de processos
psicológicos: o desenvolvimento humano. Pesquisas com a mesma metodologia podem
trazer resultados completamente distintos a depender de como a dimensão temporal é
considerada. Por exemplo, um estudo que mapeia as habilidades motoras trará
resultados distintos se realizado com crianças de 2 anos e com adolescentes de 15 anos.
Resultados distintos também ocorrerão caso uma criança de passe por esse estudo aos
dois anos e, posteriormente, aos 15. A depender do objetivo do pesquisador e do
fenômeno que ele deseja investigar, deve-se optar entre duas principais propostas
metodológicas: transversal e longitudinal.
Estudos transversais: são estudos que buscam investigar uma ou mais parcelas etárias
sem realizar acompanhamento e retestagem dos casos pesquisados.
Exemplo de estudo:
Buscando compreender o impacto do bullying na aprendizagem, um pesquisador pode
entrevistar estudantes de 12 anos com histórico de bullying.
Caso queira enriquecer o trabalho, pode também entrevistar estudantes de outras idades
e, com os dados em mãos, buscar traçar padrões e comparações entre as faixas
analisadas.
Estudos longitudinais: os mesmos indivíduos ou grupos estudados são testados mais de
uma vez ao longo de uma faixa temporal.
Exemplo de estudo:
A mesma pesquisa pode ser realizada com um ou mais estudantes. Ao longo de dois
anos, os estudantes participantes serão avaliados semestralmente em busca de
respostas sobre o impacto do bullying no aprendizado.
Estudos transversais têm como vantagem a redução do tempo de busca, por considerar a
existência de participantes simultaneamente em faixas etárias distintas. Os estudos
longitudinais, por outro lado, têm como vantagem a possibilidade de observar os
mesmos casos e momentos distintos, trazendo análises possivelmente mais precisas
sobre o fenômeno estudado.
Cabe destacar que uma terceira metodologia tem sido adotada no campo da psicologia,
inspirada em estudos de pesquisadores como Vygotsky: estudos microgenéticos. Esses
estudos buscam compreender a evolução de processos ao longo do tempo, realizando
análises mais precisas sobre as mudanças ocorridas nesse período. Digamos que o
pesquisador que adota essa abordagem constrói, ao longo da análise, um filme com os
dados coletados, podendo investigar cada faceta do fenômeno observado.
Exemplo de estudo:
Ao longo de um mês, pesquisadores acompanharão a trajetória escolar de um estudante
que sofre bullying, buscando analisar suas relações interpessoais, desenvolvimento
cognitivo e saúde mental através de observações e testagens constantes.
Tais estudos permitem análises mais aprofundadas sobre como ocorrem os processos
psicológicos investigados, já que permitem ao pesquisador identificar o momento em que
pequenas mudanças ocorrem e tentar correlacioná-las a eventos supostos ou
observados.
Todas as metodologias apresentadas possuem vantagens e desvantagens na sua
utilização.
A natureza do fenômeno a ser estudado, o tempo e recursos disponíveis ao pesquisador,
ou as demais decisões propostas no projeto de pesquisa vão ser cruciais para a escolha
de qual tipo de estudo conduzir. A seguir, serão apresentados alguns dos métodos de
pesquisa mais utilizados nas ciências do comportamento. Como exercício livre, ao longo
da leitura busque imaginar estudos encaixados em cada método que adotem
delineamentos    

3.4 Classificação Quanto aos Procedimentos


Para desenvolver uma pesquisa, os procedimentos metodológicos são fundamentais.
Eles alinham precisamente qual caminho será seguido pelo pesquisador e são a estrutura
de qualquer investigação. Entende-se como delineamento todo o desenho metodológico
a ser adotado por um estudo científico. De acordo com Gil (2008, p. 43), “como o
delineamento expressa em linhas gerais o desenvolvimento da pesquisa, com ênfase nos
procedimentos técnicos de coleta e análise de dados, torna-se possível, na prática,
classificar as pesquisas segundo o seu delineamento”. Os procedimentos são centrais
para definir o delineamento de uma pesquisa.

De acordo com a natureza do fenômeno e as escolhas do pesquisador (considerando


disponibilidade, recursos e aproximação teórica), esses delineamentos podem seguir
uma modalidade qualitativa, quantitativa ou mista. Novos procedimentos são
formulados a todo momento no cenário científico, porém alguns ganharam notoriedade
pela longa trajetória de utilização e pela qualidade dos resultados possíveis de serem
alcançados. São exemplos de procedimentos metodológicos:
experimentos;
quase experimentos
levantamentos
pesquisa bibliográfica
revisão de literatura
pesquisa etnográfica
método fenomenológico
estudo clínico
método materialista histórico-dialético
Esses e outros procedimentos metodológicos serão melhor aprofundados em unidades
futuras.

4 Etapas para o planejamento da pesquisa científica


Neste tópico, debateremos algumas perspectivas sobre a construção de um projeto de
pesquisa. Adiante, nesta disciplina, você aprenderá a elaborar um projeto de pesquisa
completo e poderá pôr em prática os conteúdos aprendidos aqui.
Afinal, diplomados em psicologia são também representantes da ciência psicológica e
é fundamental saber as etapas de construção do conhecimento que reproduzem.
Outra razão que subjaz à prática de atuação. A investigação faz parte do trabalho da
psicologia. A busca por razões, por conexões entre fenômenos e formas de solucionar
problemas é inerente à profissão do psicólogo em todos os campos de atuação.
Com isso, fica clara a resposta de por que fazer pesquisa? A pesquisa se inicia do
interesse do pesquisador diante de curiosidades particulares ou de fenômenos
vivenciados na academia, espaços de trabalho, dentre outros. Não há pesquisa sem
motivação, já que o desejo de conhecer melhor um fenômeno impulsiona o pesquisador
na sua tarefa. Pode-se compreender a construção sistemática de uma pesquisa em
psicologia a partir das seguintes etapas:

Etapa 1: Conhecimento prévio sobre o tema


Mesmo nas pesquisas exploratórias, o pesquisador parte de algum conhecimento sobre
a temática de interesse. O pesquisador parte de uma ideia inicial sobre o tema
pesquisado (QUIVY; CAMPENHOUDT, 1995). Essa ideia inicial tende a ser aprimorada na
construção do projeto de pesquisa. A primeira etapa de qualquer pesquisa é a
realização de uma aproximação teórica e literária sobre o tema a ser estudado.
Nessa etapa, o pesquisador busca referenciais teóricos e, se possível,
realiza coletas de dados exploratórias para refinar o tema preliminar.

Essa etapa permite a determinação da justificativa da pesquisa. Ela é realmente


necessária? Trará contribuições ao campo teórico? Tem relevância social? O pesquisador
deverá ter essas questões em mente e, se necessário, reformular a ideia de pesquisa.
Exemplo: Um pesquisador que trabalha como psicólogo em uma escola percebe um
aumento nos casos de automutilação no ambiente escolar. Para compreender melhor o
tema, delineia uma pesquisa sobre automutilação e suicídio. (Interesse).
Releu, então, os relatórios produzidos sobre os estudantes que praticaram automutilação
e buscou livros sobre o tema para compreender melhor esse fenômeno (Aproximação
teórica).

Com a exploração, o pesquisador nota que há poucos estudos relacionando a adoção de


estratégias de ludicidade nas aulas com a redução de episódios de automutilação,
embora haja trabalhos sobre ludicidade e saúde mental em geral. Busca, então, se
aprofundar neste tema (Aprimoramento do tema de estudo).
Esse aprofundamento inicial é fundamental para delinear melhor o objeto de estudo.
Perceba que o pesquisador do caso apresentado parte de um interesse difuso sobre um
tema até definir qual a especificidade que deseja compreender melhor. Esse movimento
está concatenado à definição precisa de um problema de pesquisa.

Etapa 2: Definição do problema de pesquisa


Gil (2008, p. 23) define problema como: “questão não solvida e que é objeto de discussão,
em qualquer domínio do conhecimento”. Ciente do objeto a ser pesquisado, o
pesquisador deve elaborar um questionamento claro que ele buscará responder com o
processo de investigação. Gil (2008) propõe que o problema tenha um caráter científico,
ou seja, permita que através dele desemboque um método científico.
Perguntas muito genéricas não são bons problemas de pesquisa, pois são pouco
instrumentalizadoras para o projeto.
Exemplos:
A saúde mental é importante?
O trabalho do professor ajuda na aprendizagem?
Acidentes de trânsito são influenciados por estados psicológicos? 

Dentro do cenário científico mais amplo, é possível que essas perguntas genéricas sejam
respondidas diante do acúmulo de pesquisas em cada campo. Entretanto, cada pesquisa
deve partir de uma delimitação que a torne exequível. É importante que o problema de
pesquisa reflita o objeto de estudo do pesquisador, e apresente os fenômenos que
poderão ser testados ou investigados, através do método que será adotado, traçando
assim um melhor caminho para as etapas seguintes. Reescrevendo os problemas
anteriores, algumas possibilidades seriam:
Exemplo:
Qual o impacto da participação de indivíduos em grupos terapêuticos da Unidade Básica
de Saúde X na sua qualidade de vida?
Como professores do primeiro ano do ensino fundamental I de escolas públicas de
Salvador avaliam a importância da mediação no ensino de ciências?
Qual a relação entre os índices de atenção concentrada e acidentes de trânsito entre
motoristas de ônibus da cidade de São Paulo em 2019?

Ademais, para Gil (2008), ao formular um problema, o pesquisador deve se atentar


aos seguintes critérios:
(a) o problema deve ser formulado como pergunta;
(b) o problema deve ser claro e preciso;
(c) o problema deve ser empírico;
(d) o problema deve ser passível de solução;
(e) o problema deve ser delimitado a uma dimensão viável.

Etapa 3: Definição da hipótese e pressupostos


Especialmente em pesquisas quantitativas, atota-se o uso de hipóteses. A hipótese é
uma resposta preliminar ao problema de pesquisa. Obviamente, essa resposta não
parte de presunções rasas, mas emergem do processo de aprofundamento preliminar do
pesquisador.

O caráter essencial da hipótese é a possibilidade de sua testagem. Espera-se que o


resultado da pesquisa determine se a hipótese é verdadeira ou falsa. Eis a
divergência entre sua utilização em algumas pesquisas, especialmente nas qualitativas.
Digamos que o problema de pesquisa seja: quais as implicações do isolamento social nas
relações familiares brasileiras? Seria impossível adotar uma hipótese passível de
testagem a um problema como esse, pois – embora a literatura possa auxiliar o
pesquisador na formulação de algumas suposições – as possibilidades de resposta para
tal questionamento são infindáveis e os resultados válidos são múltiplos.
Digamos, entretanto, que o pesquisador formule o seguinte problema: qual o impacto da
aglomeração com a capacidade de concentração? Nesse caso, um delineamento
quantitativo seria ideal, pois há possibilidade de controle das duas variáveis em
questão: aglomeração e capacidade de concentração. Uma hipótese possível e
testável seria: quanto maior a aglomeração presente, mais baixa a capacidade de
concentração do indivíduo.
Apoiando-se no princípio da falseabilidade, todo o trabalho de pesquisa volta-se a
provar que a hipótese é falsa. Se os resultados, por outro lado, não concluírem que a
hipótese é falsa, considera-se a hipótese plausível.
Na impossibilidade de formulação de hipóteses, no sentido estrito do termo, considera-
se que todo pesquisador parte de pressupostos sobre os possíveis resultados da sua
pesquisa. Embora os pressupostos não possam ser considerados antes da realização da
pesquisa, sob o risco de enviesar os resultados, eles estão presentes e devem ser
explicitados para maior clareza sobre a situação de pesquisa.
Etapa 4: Definição dos objetivos de pesquisa
O problema de pesquisa origina um ou mais objetivos a serem alcançados pelo
pesquisador. São os objetivos que deverão ser alcançados através do método adotado.
Observa-se, portanto, uma estrita relação entre objetivo e métodos.
Por exemplo, se o objetivo de um estudo for determinar a incidência de transtornos
fóbicos na população do bairro da Ribeira, o método deve apresentar uma abordagem
quantitativa que revele em números tal incidência. Caso o pesquisador adote como
método a realização de entrevistas semiestruturadas com gestores da assistência social
no bairro da ribeira, não será possível atingir o objetivo proposto.
Nesse sentido, Creswell (2007) afirma que a declaração do objetivo “é a declaração mais
importante de todo o estudo, e precisa ser apresentada de maneira clara e específica”.
Em artigos acadêmicos, os objetivos são parte fundamental a serem apresentados nos
resumos, pois orientam toda a leitura que se seguirá.
A declaração do objetivo costuma iniciar com verbos de ação. Há inúmeras listas de
verbos disponíveis para tanto, porém cabe ao pesquisador estar atento sobre cada
palavra usada, pois há o risco de o objetivo não coincidir com o método adotado. Alguns
exemplos de verbo são: elucidar, comparar, investigar, estabelecer, constatar, identificar,
inferir, descrever, etc.
Comumente, o objetivo geral se assemelha ao problema da pesquisa. Retomando o
exemplo apresentado anteriormente, uma boa declaração de objetivo seria: relacionar
contextos de aglomeração com a capacidade de concentração em estudantes
universitários.
Objetivos específicos são desdobramentos do objetivo geral e devem ser descritos
propondo parcelas de aquisições necessárias para atingi-lo.

Etapa 5: Definição do método


Nesta etapa, o pesquisador irá definir com precisão todo o procedimento metodológico
que será adotado. Como vimos, as etapas anteriores servem de base e trazem
informações relevantes que contribuem para essa elaboração. O pesquisador deve
explicitar:
Delineamento: inicialmente deverá ficar claro qual o delineamento metodológico a ser
adotado. Essa parte corresponde ao núcleo de definição do método e orienta o
pesquisador na condução da pesquisa. Será um estudo explicativo, descritivo ou
longitudinal? Qualitativo ou quantitativo? Qual procedimento metodológico a pesquisa
adotará?
Participantes: determinar exatamente quais serão os participantes e qual o critério de
seleção. Será uma seleção por conveniência? Será uma amostra aleatória? Será uma
coorte?
Local/cenário de pesquisa: informar qual o cenário físico onde a pesquisa ocorrerá. Em
psicologia, essa questão é fundamental, pois um mesmo procedimento metodológico
aplicado em espaços distintos pode gerar resultados também distintos. Exemplo: imagine
uma pesquisa sobre violência familiar. O pesquisador pode entrevistar uma pessoa em
ambiente doméstico, na escola ou em algum serviço público de atenção à violência. Os
resultados possivelmente serão distintos, em especial pela disponibilidade dos
participantes em dialogarem sobre o tema em cada um desses locais.
Instrumentos: descreve-se quais recursos auxiliarão o pesquisador na busca pelos
resultados: observação, diário de campo, testes e escalas, entrevistas, questionários, etc.
Observe que todas essas parcelas são conectadas. Se o pesquisador realizará uma
pesquisa narrativa, não cabe centrar a coleta em um instrumento puramente
quantitativo.
Procedimento de coleta: além da descrição dos instrumentos, o pesquisador deve
explicitar como a coleta de dados ocorrerá. Será um único encontro? Há uma sequência
na aplicação dos instrumentos? Quantos pesquisadores participarão?
Procedimento de análise: quais ferramentas o pesquisador utilizará para interpretar os
dados? Esses procedimentos variam bastante conforme o delineamento adotado. Em
pesquisas quantitativas, certamente serão utilizados métodos de análise estatística. Em
pesquisas qualitativas, o pesquisador pode recorrer a outros métodos, frequentemente
centrados na compreensão dos discursos ou na descrição de fenômenos observados.
No processo inicial de delimitação de um projeto de pesquisa, todas as etapas
apresentadas são interdependentes. O pesquisador deve revisá-las após cada avanço, de
modo a garantir um projeto com coerência interna entre métodos, objetivos e problemas,
tornando a pesquisa possível e viável. Salienta-se que há autores que apresentam outras
divisões didáticas, porém a construção de uma lógica e sistematização de um
processo de pesquisa sempre seguirá no sentido de obter resposta a um problema
formulado pelo pesquisador.     

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