PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO I RESUMO E ANÁLISE CRÍTICA DO TEXTO “A CIÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO: UMA PERSPECTIVA INTERDISCIPLINAR”
PROFESSORA ANDRÉIA BARBOSA DE LIMA
BAURU – SÃO PAULO
2023 A história da psicologia do desenvolvimento pode ser iniciada com os filósofos dos séculos XVII e XVIII, como J. Locke, D. Hume, J.-J. Rousseau e I. Kant, cujas ideias influenciaram as bases do que viria a ser essa nova área. Muito tempo depois, no século XX, surgiram os dois principais modelos teóricos, o mecanicista e o organicista. O primeiro, via o desenvolvimento como resultado da influência do ambiente, ou seja, o indivíduo se forma unicamente por meio do acúmulo de experiências e aprendizagens. Já o segundo modelo destacava os processos internos mais do que os externos, e sugeriria que, seguindo uma necessidade evolutiva, todo indivíduo passa por determinados estágios de desenvolvimento, gerando um caráter universal. Como exemplos de abordagens mecanicistas, temos a filosofia behaviorista e as teorias de aprendizagem social, enquanto como exemplos de abordagens organicistas, temos a psicanálise e, em certa medida, a teoria piagetiana. Ao longo do século XX, a psicologia do desenvolvimento se formou enquanto disciplina científica, formando diversas teorias, técnicas e conceitos. As suas principais técnicas investigativas foram a observação direta do comportamento, a entrevista e o questionário. Com essas técnicas, os padrões de desenvolvimento do indivíduo eram estudados desde o nascimento até o final da adolescência, desconsiderando qualquer mudança na maturidade como relevante. De forma geral, até meados do século XX, as teorias da psicologia propunham definir padrões normativos que pudessem explicar o que, como e por que as mudanças e desvios ocorriam na infância e na adolescência. A partir da segunda metade do século XX, os paradigmas da psicologia do desenvolvimento foram criticados por sua visão extremamente fragmentada e analítica, de forma que muitas das subdisciplinas não se comunicavam direito e nem a área em si se interligava com outras disciplinas da psicologia ou de outras ciências que tivessem em busca do mesmo fenômeno. As críticas também incluíram a dicotomia entre as noções de metas universais ou aprendizagem social, a falta de estudo do desenvolvimento ao longo de toda a vida e a ideia de estágios universais independentes da cultura. Reconhecendo a complexidade do desenvolvimento, os pesquisadores propuseram uma perspectiva integradora que levasse em consideração os fatores biológicos e culturais em interação, assim como uma ótica interdisciplinar, onde diferentes disciplinas investiguem o fenômeno sob seus pontos de vista. Assim, novos caminhos foram abertos para investigação do desenvolvimento humano nas últimas décadas do século passado. Houve um consenso entre os pesquisadores sobre tópicos importantes na psicologia do desenvolvimento como, abranger todos os estágios da vida, poder enxergar o indivíduo como um organismo ativo e participante de seu próprio desenvolvimento, a consideração tanto da bagagem genética quanto da adquirida, um olhar para o biopsicossocial inserido em um determinado contexto histórico-cultural e as influências geradas entre todos os sistemas envolvidos no processo do desenvolvimento humano. Essas ideias têm sido estendidas e elaboradas pela ecologia social, pelo desenvolvimento social, pelo desenvolvimento cognitivo e pelas análises do curso de vida. Criou-se assim o termo ciência do desenvolvimento, um conjunto de estudos interdisciplinares sobre fenômenos do desenvolvimento humano. Elder (1996) propôs a perspectiva do curso de vida que leva em consideração, a interdependência entre as trajetórias de vida dos indivíduos e as condições e mudanças presentes nas micro e macroestruturas dos sistemas sociais. Como as estruturas sociais e culturais também estão sujeitas às mudanças históricas, as vidas das pessoas refletem as influências de seu tempo histórico. O desenvolvimento humano é o processo de mudança progressiva que ocorre em um contexto e envolve desde os processos biológicos do organismo até as mudanças sociais e históricas ao longo do tempo. A noção de estágio refere-se a padrões comportamentais e habilidades em uma determinada fase do ciclo de vida, enquanto transição se refere a períodos de passagem de um estágio para outro. Kreppner (2003), descreve os períodos de transição como sendo janelas entre um estágio e outro e sugere que estes são períodos nos quais novas competências são estabelecidas para lidar com as mudanças e incertezas que se apresentam no curso de desenvolvimento. Há uma sequência de eventos configurados em estágios desde o nascimento até a morte, que exigem o desempenho de competências para lidar com elas. Esses estágios são representados por mudanças estruturais, como o nascimento do filho ou a morte de um dos cônjuges. Com o passar do tempo, a importância nos períodos de transição se mostra mais evidente e como qualquer experiência negativa estabelecida nessa fase, pode acarretar situações conturbadas nos estágios posteriores. O modo como os elos comportamentais são formados também importa, de forma que podemos traçar as trajetórias intelectuais, sociais e afetivas de cada um. Logo, o contexto social alimenta as competências que formam o indivíduo. A teoria de desenvolvimento psicológico de E. Erickson, por exemplo, descreve os estágios por uma perspectiva da função social. Porém, os ciclos de vida são, atualmente, conhecidos em termos de ciclos familiares (Elder 1996). Tais estágios não são definidos por idades, mas sim pelos papeis que cada um representa no grupo familiar. Ainda assim, as demandas e pressões ambientais são percebidas diferentemente por cada indivíduo, mesmo que estejam no mesmo ambiente familiar. Mesmo havendo pontos de transição e ciclos de vida comuns às famílias, as características particulares de cada indivíduo e de cada contexto estarão, também, influenciando os ciclos e a trajetória de vida dos indivíduos. Dentre as noções básicas da ciência do desenvolvimento, podemos apontar para as interações dentro de um contexto. A forma como um indivíduo constrói a si próprio está relacionada a como ele constrói o outro, e vice-versa. As relações sócias são fundamentais para formação dos seres humanos. Dentre vários autores, Hinde afirma que as pessoas estão continuamente buscando um sentido para as suas ações e as ações dos outros. A relação social, estabelecida por longo período, possui características próprias como intimidade e compromisso e, tem um caráter de consistência e continuidade. Toda a construção da identidade pessoal é formada pela experiência, especialmente pela social. De acordo com Elder (1996), continuidade refere-se aos padrões relacionais e comportamentais transferidos de uma situação anterior para uma nova situação. Esse novo contexto de interação trará uma resposta para esses padrões, podendo validar ou não, assim contribuindo para adaptar as características do novo contexto. Por exemplo, a transição da infância para a adolescência e da adolescência para a fase adulta sugerem várias continuidades e mudanças. As constantes adaptações do indivíduo ao meio (e vice-versa), são o que geram o desenvolvimento humano. Essas mudanças são causadas pelas coações, ou seja, tensões criadas no nível estrutural e funcional do organismo quando se depara com as situações adversas. Segundo Gottlieb (2003), o desenvolvimento ocorre por pelo menos dois componentes de coação, como pessoa-pessoa, organismo-organismo, organismo-ambiente, célula-célula, núcleo-citoplasma, estimulação-sistema sensorial e atividade-comportamento motor. O estudo desse desenvolvimento pode ser entendido através de diferentes níveis de análise, tanto pelo funcionamento genético, neural e comportamental, quanto referente ao ambiente (físico, social e cultural). É a relação bidirecional (um influencia o outro) entre elas que geram o desenvolvimento. Segundo Gottlieb (2003), as contribuições das atividades funcionais (experiências) no desenvolvimento podem ocorrer de três formas: indutiva, facilitadora e de manutenção. A experiência indutiva é essencial para atingir o estágio final do desenvolvimento, como por exemplo, a exposição a uma determinada língua o fará aprendê-la. A experiência facilitadora acelera o processo de desenvolvimento. A experiência de manutenção mantém em funcionamento habilidades e competências já dominadas pelo indivíduo. Em conclusão, é importante ressaltar alguns pontos para uma compreensão mais acurada do desenvolvimento, como por exemplo, a da linha tênue entre o padrão normal e o patológico, a existência de padrões universais e a velha discussão sobre padrões herdados ou adquiridos. Sobre normalidade e patologia, foi preciso haver uma prevenção a fim de evitar identificações prejudiciais que pudessem estigmatizar o indivíduo. Por conta disso, o estudo dos padrões de doenças a partir do tempo e do local de manifestação, como é o caso da epidemiologia, foram uteis ao lidar com as questões de generalização e de formação de perfis de morbidade. Já sobre as características universais humanas, deve-se haver uma ênfase no contexto social e cultural sem perder o foco de análise no indivíduo, como citado por Hinde (1987). Muitas características individuais são encontradas em muitas pessoas em diferentes contextos, porém, há sempre um grau de variação que está relacionado as diferenças culturais e ambientais. E por fim, sobre a velha discussão de padrões herdados e adquiridos, passa a ser entendida não mais como questões antagônicas, mas sim como construções mútuas para a compreensão do desenvolvimento humano. Esse texto refletiu e aprofundou muito bem as discussões que tivemos em sala de aula nessas últimas semanas, mostrando, de forma geral, as crescentes mudanças vindas após a denominada ciência pós-moderna e o quão importante elas foram para elucidar a relevância do contexto social nas discussões de várias áreas do conhecimento, em especial a do desenvolvimento humano. Essa percepção do social ressaltou o quão complexo, dinâmico e multifacetado são as relações que formam o indivíduo e como coube a formulação de uma perspectiva ecológica, sistêmica e interdisciplinar, afim de investigar com uma maior acuracidade, os fenômenos que formam os seres humanos ao longo do curso da vida. As mudanças de paradigmas da psicologia foram importantes ainda mais para a formação dessa nova ciência do desenvolvimento humano e demonstra como as metodologias evoluíram desde suas origens.