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DESENVOLVIMENTO
HUMANO
AULA 1

Prof. Cassio Gonçalves de Azevedo


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CONVERSA INICIAL
A ciência do Desenvolvimento Humano tem como objeto de investigação os processos
sistemáticos de mudança e estabilidade que ocorrem ao longo de toda a vida humana, desde sua
concepção até a morte. Trata-se de um campo de estudo transdisciplinar que se serve de um
amplo espectro de disciplinas como a Psicologia, Neurociência, Psiquiatria, Sociologia,
Antropologia, Biologia, Genética comportamental, História, Medicina e muitas outras.
Apresentaremos uma breve história da ciência do desenvolvimento humano para, a seguir,
adentrarmos nesse campo de estudo. Para tanto, é necessária a operacionalização de alguns
conceitos para uma melhor apreensão de importantes questões que se formulam no interior dessa
disciplina. Qual a relevância de compreender até que ponto um comportamento, por exemplo, pode
ser influenciado pelas contingências do meio, e até que ponto que a hereditariedade o determina?
Como se dá a interação entre as influências ambientais e genéticas? Dentre os fatores ambientais,
quais e como influenciam determinadas predisposições genéticas?
Veremos ainda alguns conceitos fundamentais que em um primeiro momento podem até
parecer dicotômicos, mas que visam justamente suscitar a compreensão da complexidade inerente
ao processo de desenvolvimento humano. Na realidade, a relação entre todos eles é a de
complementaridade e de múltipla influência, haja vista o dinamismo dos processos de
desenvolvimento humano. Vale lembrar, no entanto, que a definição dos conceitos também
conserva uma certa plasticidade, na medida em que diferentes autores os utilizam de diferentes
maneiras. Adotamos, aqui, as definições mais comuns nos livros de desenvolvimento humano.
Os primeiros estudos sobre questões evolutivas sob um viés especificamente psicológico
“datam apenas da metade do século XIX e das primeiras décadas do século XX” (Dessen; Costa
Junior, 2008, p. 20). Antes, porém, filósofos como John Locke (1632-1704), que pressupunha os
bebês como uma “tábula rasa”, uma folha em branco na qual o ambiente iria imprimir toda sua
influência, e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e Immanuel Kant (1724-1804), que já
enfatizavam características inatas do ser humano, pautaram, portanto, algumas das questões que
iriam permear as teorias sobre a Psicologia do desenvolvimento humano no século XX:
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Essas tendências filosóficas acabaram por influenciar a construção das teorias da psicologia
do desenvolvimento, no século XX. De um lado, os modelos mecanicistas que enfatizavam a
esfera do empirismo, buscando operacionalizar as investigações dentro do que poderia ser
medido e quantificado, sendo o desenvolvimento humano visto como modelado pelo
ambiente. A história do indivíduo não era nada mais do que o acúmulo de experiências de
aprendizagem. A filosofia behaviorista e as teorias de aprendizagem social constituem
exemplos deste modelo. De outro lado, os modelos organicistas valorizavam os processos de
caráter universal presentes no desenvolvimento de qualquer indivíduo (Palácios, 1995). Estes
modelos ressaltavam os processos internos mais que os externos, sugerindo a existência de
uma certa necessidade evolutiva que faria com que o desenvolvimento percorresse
determinados estágios. A psicanálise e, até certo ponto, a teoria piagetiana, são exemplos de
tal modelo. (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 23)
Foi no século XX, porém, inspirada pelos métodos positivista e das ciências naturais como a
observação direta do comportamento, as entrevistas e os questionários que a ciência do
desenvolvimento humano se consolidou, voltada para a infância e a adolescência (Dessen; Costa
Junior, 2008, p. 23).
Predominavam ainda, nesses primórdios da disciplina, como de certa forma ainda hoje
repercutem, discussões binárias do tipo entre inatistas e ambientalistas. Por exemplo, no que diz
respeito ao desenvolvimento da comunicação e da linguagem, o livro do psicólogo norte-
americano B. F. Skinner, Comportamento Verbal, de 1957, defendia a tese de que a aquisição e o
desenvolvimento da linguagem e da comunicação em geral, como os outros comportamentos
humanos explicados pelo behaviorismo radical, era quase que exclusivamente proveniente das
contingências ambientais. Ou seja, uma criança, ao emitir sons em um determinado idioma, seria
positivamente reforçada para repetir os sons que nesse idioma fizessem sentido, abandonando os
sons ininteligíveis.
O linguista também norte-americano Noam Chomsky teceu críticas contundentes que nunca
foram respondidas pelo próprio Skinner, mas apenas dez anos depois e por outros behavioristas:
A concepção de Chomsky é denominada inatismo. Ao contrário da teoria da aprendizagem de
Skinner, o inatismo enfatiza o papel ativo do aprendiz. Uma vez que a linguagem é universal
entre os seres humanos, Chomsky (1957, 1972) propôs que o cérebro humano possui uma
capacidade inata para aquisição da linguagem; os bebês aprendem a falar com a mesma
naturalidade com que aprendem a andar. Ele sugeriu que um dispositivo de aquisição da
linguagem (DAL) inato programa o cérebro das crianças para analisar a língua que ouvem e
entender suas regras. (Papalia et al., 2006, p. 198)
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Com o avanço das pesquisas, os desenvolvimentistas foram progressivamente


compreendendo que essas e tantas outras dicotomias se faziam notáveis devido à complexidade
inerente ao processo de desenvolvimento, e que o foco de discussão deveria ser muito menos o de
preponderâncias entre hereditariedade e aquisição pelas experiências, ou de transição em
contraposição a noção de estágios, entre outras; mas o como essas díades que veremos a seguir
com mais detalhes se combinam e se intrincam.

TEMA 1 – CONCEITOS FUNDAMENTAIS


1.1 FILOGÊNESE X ONTOGÊNESE
Denominamos de filogênese o processo evolutivo inerente à espécie, ou seja, mudanças e
padrões experimentados por membros de uma dada espécie, portanto, comuns aos indivíduos que
dela participam. Por exemplo, o desenvolvimento do sistema nervoso humano se processou ao
longo de centenas de milhares de anos, atravessando várias coortes, desde seus ancestrais
primatas, passando pelos vários tipos de hominídeos até o homo sapiens como o conhecemos
hoje. O processo de desenvolvimento desse sistema obedece, portanto, padrões determinados por
meio de gerações anteriores, no processo filogenético.
Já a ontogênese visa delimitar os fenômenos de transformação de um organismo em
particular, em seu contato singular com seu meio, pois, para que esse elaborado e meticuloso
processo filogenético atinja sua plenitude em determinado ser particular, ou seja, para que esse
aparelho funcione adequadamente em dada pessoa, esse organismo em específico precisará
atravessar condições muito variadas como a alimentação apropriada e os estímulos ambientais
necessários, e mais especificamente, deverá ainda experenciar situações absolutamente singulares
que irão lhe conferir uma conformação única, no processo ontogenético. Assim, a principal tarefa
dos pesquisadores do desenvolvimento é investigar como os organismos estabelecem, mantêm e
reorganizam seus comportamentos e relacionamentos dentro de um ambiente, ao longo de sua
ontogenia.
Verificamos, portanto, e desde já, a interdependência entre filogênese e ontogênese e a
distinção que fazemos aqui, meramente didática, visa apenas nos instrumentalizar para as
problemáticas inerentes ao campo, além de nos encadear na esteira de mais alguns conceitos
fundamentais ao estudo do desenvolvimento humano, a saber: a hereditariedade, o crescimento, a
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maturação, os períodos críticos ou sensíveis, a plasticidade do desenvolvimento humano, entre


outros.

1.2 HEREDITARIEDADE X AMBIENTE


A discussão sobre o papel da hereditariedade, ou seja, sobre o raio de influência que a
determinação genética exerce sobre os fenômenos do desenvolvimento, em contraposição com as
influências provenientes da experiência do organismo em determinado meio, está no próprio início
dos debates da ciência do desenvolvimento humano e ainda repercute significativamente.
Correntes teóricas inatistas e ambientalistas foram progressivamente se desenvolvendo em
modelos interacionistas em que “a herança genética não se constitui em algo imutável e já
acabado, mas em traços e tendências que se integram e interagem com os fatores ambientais e
que resultam em fatores imprescindíveis aos processos evolutivos” (Dessen; Costa Junior, 2008, p.
74).
Com a evolução da ciência do desenvolvimento humano, hoje “Os desenvolvimentistas
compreendem que mesmo que um traço ou qualidade específico seja 100% genético, sua
expressão é 100% dependente do mundo externo” (Belsky, 2010, p. 48). Isso porque uma
característica, seja ela qual for, manifesta-se em determinado contexto que pode potencializá-la ou
até mesmo suprimi-la. No modelo bioecológico de Urie Bronfenbrenner, por exemplo, “a herança
genética não se constitui em algo imutável e já acabado, mas em traços e tendências que se
integram e interagem com os fatores ambientais e que resultam em fatores imprescindíveis aos
processos evolutivos” (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 74).
Os estudos com gêmeos no campo da genética comportamental visam mensurar justamente a
influência da hereditariedade genética nos comportamentos e características fenotípicas em
contraposição às ambientais.
Os estudos de gêmeos podem comparar gêmeos monozigóticos, ou idênticos, com gêmeos
dizigóticos em relação à determinada capacidade cognitiva ou traço de personalidade, por
exemplo. Traços e características mais predominantes em gêmeos monozigóticos sugerem uma
influência mais significativa do genoma, já que gêmeos idênticos ou monozigóticos (quando um
único óvulo é fecundado); compartilham 100% de seu código genético, enquanto os dizigóticos
50%.
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Os geneticistas comportamentais também desenvolvem estudos de adoção, em que crianças


adotadas são comparadas com seus pais biológicos. Traços e características que, mesmo na
ausência da convivência, são comuns, sugerem uma influência genética preponderante.
Contudo, as evidências mais significativas da influência que a genética exerce sobre as
expressões dos fenótipos são encontradas em estudos mais raros de gêmeos monozigóticos
adotados, nos quais gêmeos idênticos são separados na infância e rastreados na vida adulta. Da
mesma forma, as características que perseveram depois de adultos em ambos os gêmeos, mesmo
estes tendo sido separados em tenra idade, sugerem forte conotação do genoma na equação final
das expressões do fenótipo (Beslky, 2010, p. 46).

TEMA 2 – CRESCIMENTO E MATURAÇÃO


Podemos definir brevemente o conceito de crescimento como a transformação quantitativa
que se processa no corpo, no que tange ao aspecto biológico, como a idade cronológica, além de
caracteres antropométricos como altura, massa muscular e peso, por exemplo. Dado que o
crescimento é o aumento na estrutura física do corpo, proveniente da multiplicação celular
(hiperplasia), do aumento do tamanho das células (hipertrofia) e do aumento das substâncias
intercelulares, e que implica mudanças anatômicas, bem como na diferenciação das estruturas, ele
pode ser, portanto, mensurado.
Já o conceito de maturação nos remete às transformações morfológicas e fisiológicas
qualitativas que se operam no organismo, com uma ordem de ascensão fixa que pode variar no
quesito ritmo, mas não em relação à sequência no aparecimento das características fenotípicas.
Essa progressão qualitativa é direcionada para o estado e as atividades normais do adulto,
possibilitando assim ao organismo a capacidade de executar atividades cada vez mais complexas.
A maturação sexual, por exemplo, que verificamos emergir durante o período de puberdade,
desencadeia estímulos hormonais diferenciados nas meninas e meninos no sentido de preparar o
organismo para um comportamento bastante complexo, o da reprodução.
Não obstante, a maturação conserva também uma certa plasticidade em relação ao
crescimento. Dois indivíduos de mesma idade exata podem apresentar maturação sexual ou

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psicológicas bastante variadas, isso porque os processos de maturação não se reduzem aos
processos de crescimento, eles envolvem também fatores socioculturais:
Um evento normativo é experimentado de modo semelhante pela maioria das pessoas em um
grupo. Influências normativas etárias são muito semelhantes para pessoas de uma
determinada faixa etária. Elas incluem eventos biológicos (como puberdade e menopausa) e
eventos sociais (como ingresso na educação formal, casamento, paternidade-maternidade e
aposentadoria.) O tempo de ocorrência dos eventos biológicos é fixo, dentro de uma faixa
normal. (As pessoas não experimentam a puberdade aos 35 anos ou a menopausa aos 12). O
tempo de ocorrência dos eventos sociais é mais flexível e varia em diferentes tempos e
lugares, embora dentro de limites de maturação. Uma mulher normalmente pode engravidar e
ter um filho em qualquer tempo entre a puberdade e a menopausa. Nas sociedades industriais
do ocidente, as crianças geralmente iniciam a educação formal em torno dos 5 ou 6 anos, mas
em alguns países em desenvolvimento, a educação escolar, quando ocorre, começa muito
mais tarde. (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 58)

TEMA 3 – PERÍODOS CRÍTICOS OU SENSÍVEIS X PLASTICIDADE


Os períodos críticos ou sensíveis no processo de maturação nos remetem à noção de um
período ou espaço temporal em que o organismo está particularmente sensível a determinados
estímulos mais que por outros ou em outros momentos do desenvolvimento. A reação de sorriso
do bebê ao rosto humano, descrita por Spitz, que veremos com mais detalhes nas próximas aulas,
exemplifica com clareza a captura de atenção que o rosto humano, ou melhor, a gestalt boca, nariz
e olhos, exerce sobre a atenção do bebê aos dois meses e meio de idade.
A ausência de determinado estímulo imprescindível, na fase sensível, poderá contribuir para o
atrofiamento de uma função correspondente ou, no caminho contrário, um estímulo inapropriado
em um período sensível poderia também desencadear padrões atípicos e disfuncionais de
comportamento.
Essa perspectiva, contudo, requer seu contraponto diante da característica plástica que o
desenvolvimento humano apresenta, pois o desenvolvimento não é um fenômeno rígido nem linear,
mas flexível e dinâmico.
Papalia et al. (2006) relatam a descoberta de crianças romenas internadas em um orfanato
superlotado por um longo período, e privadas de contato social minimamente satisfatório com
cuidadores e entre si, além de estimulações de toda ordem já que permaneciam a maior parte do
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tempo deitadas em seus berços ou camas: “A maioria das crianças com 2 e 3 anos não andava nem
falava, e as crianças maiores brincavam a esmo. Tomografias de seus cérebros mostraram extrema
inatividade nos lobos temporais, que regulam as emoções e recebem dados sensórios” (Papalia et
al., 2006, p. 174).
Muitas dessas crianças foram adotadas por famílias estrangeiras. Os pesquisadores da
Universidade de Simon Fraser de British Columbia estudaram 46 crianças, de 8 meses a 5
anos e 6 meses, que foram adotadas por casais canadenses (Ames, 1997; Morison, Ames e
Chisholm, 1995). Na época de adoção, todas as crianças apresentavam atrasos no
desenvolvimento motor, linguístico e psicossocial, e quase 80% delas estavam atrasadas em
todas essas áreas. Três anos depois, quando comparadas com crianças que ficaram nos
orfanatos romenos, elas apresentavam um progresso notável. Mesmo quando comparadas
com crianças canadenses criadas em seus próprios lares desde o nascimento,
aproximadamente um terço não tinha nenhum problema sério e estava bem - em alguns casos
até melhor do que uma criança mediana criada em casa. Outro terço delas - geralmente
aquelas que permaneceram internadas por mais tempo - ainda tinha sérios problemas de
desenvolvimento. O restante estava encaminhando-se para comportamento e desempenho
normais. (Papalia et al., 2006, p. 174)
Entretanto, os autores ainda citam outras pesquisas que sugerem “que a estimulação
ambiental precisa ocorrer muito cedo para que os efeitos da privação extrema sejam plenamente
superados” (Papalia et al., 2006, p. 174), pois, um dado importante sobre a plasticidade do
desenvolvimento humano é justamente o fato de que ela é tanto maior em idades mais precoces,
haja vista que as trilhas neuronais ainda estão se consolidando.
O fato é que o desenvolvimento humano pressupõe períodos críticos ou sensíveis que
comportam alguma plasticidade, como a plasticidade neural, que possibilita inclusive ao cérebro
contrabalancear deficiências com remanejamentos funcionais de neurônios. Sabe-se, por exemplo,
que neurônios do lobo occipital envolvidos com o processamento visual de pessoas que nascem
com deficiência no aparelho visual, com o passar do tempo são cooptados para outras finalidades
que não as que inicialmente lhe eram atribuídas. Ou seja, quando a deficiência é congênita ou
acontece em período muito precoce, o cérebro possui a capacidade de remanejamento desses
neurônios que não permanecem ociosos, mas cooperam para o desenvolvimento de outra
capacidade.
Essa capacidade, contudo, não se verifica em pessoas que adquirem a deficiência visual em
idade posterior, pois os neurônios já estão envolvidos com o processamento dos estímulos
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provenientes do aparelho sensorial visual. Segundo Spitz (2004, p. 109),


O primeiro ano de vida é o mais plástico do desenvolvimento humano. O homem nasce com
um mínimo de padrões de comportamento pré-formados e deve adquirir incontáveis
habilidades no decorrer do seu primeiro ano de vida. Nunca mais na vida tanto será aprendido
em tão pouco tempo.

TEMA 4 – ESTÁGIO E TRANSIÇÃO: O CICLO DE VIDA


O conceito de ciclo de vida ou ciclo vital, dividido em períodos ou estágios “é uma construção
social: um ideal acerca da natureza da realidade aceito pelos integrantes de uma determinada
sociedade em uma determinada época com base em percepções ou suposições subjetivas
compartilhadas” (Papalia et al., 2006, p. 51). Um de seus principais propositores foi o psicanalista
alemão Erik Erikson, que estudaremos com mais detalhes em aulas posteriores.
A ideia que o ciclo vital pressupõe de que o desenvolvimento não se limita à infância e à
adolescência, mas se estende pela vida toda, é relativamente nova, “Hoje, a maioria dos cientistas
do desenvolvimento reconhecem que o desenvolvimento ocorre durante toda a vida. Esse conceito
de um processo vitalício de desenvolvimento que pode ser estudado cientificamente é conhecido
como desenvolvimento no ciclo vital” (Papalia, 2006, p. 48).
Os períodos ou estágios do ciclo vital são atravessados pelas influências culturais em grande
medida, pois “As sociedades do mundo inteiro reconhecem diferenças no modo como pessoas de
diferentes idades pensam, sentem e agem, mas elas dividem o ciclo de vida de modos diferentes”
(Papalia, 2006, p. 51).
Outra característica dialética que o desenvolvimento humano pressupõe são as noções de
estágio e transição, que se processam durante as mudanças qualitativas e estão diretamente
interligadas: “Enquanto estágio refere-se a um conjunto de padrões comportamentais e
habilidades características de uma determinada idade ou fase do ciclo de vida do indivíduo, a
transição refere-se aos períodos de passagem de um estágio para outro no ciclo de vida ou na
aquisição de habilidades, sejam motoras, cognitivas, sociais, afetivas, dentre outras” (Dessen;
Costa Junior, 2008, p. 23).
Mudança e estabilidade são duas constantes no processo de desenvolvimento humano e,
como se pode intuir, intercalam-se e interpenetram-se, sucessivamente, conforme o organismo em
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seu contexto vai adquirindo novas habilidades e as acomodando, no processo de maturação


durante o ciclo de vida.
Mesmos os estudos sobre as mudanças nos padrões adaptativos, segundo Dessen e Costa
Junior (2008), começam
com uma análise sistemática das acomodações cognitivas e comportamentais do indivíduo
observadas em períodos específicos de tempo, considerando também as mudanças
concomitantes ocorridas em outros sistemas orgânicos e ambientais. Isso significa que as
mudanças sistêmicas que apoiam ou consolidam uma nova direção adaptativa são examinadas
considerando o entrelaçamento dinâmico entre os diferentes níveis do sistema e o respectivo
tempo da reorganização adaptativa. Por exemplo, os processos de transição da infância para a
adolescência e da adolescência para a fase adulta sugerem várias continuidades e mudanças
que são comumente descritas nos livros clássicos de psicologia do desenvolvimento. (Dessen;
Costa Junior, 2008, p. 26)
De acordo com esses autores, apoiados em Elder (1996), a continuidade compreende
padrões relacionais e comportamentais transferidos de uma situação anterior para uma nova
situação. Esses padrões quase sempre eliciam respostas nos outros organismos ou indivíduos
que fazem parte do novo contexto de interação, que, por sua vez, apoiarão ou validarão os
padrões iniciais, contribuindo para adaptá-los às características do novo contexto. (Dessen;
Costa Junior, 2008, p. 25-26)

TEMA 5 – DESENVOLVIMENTO PSICOSSOCIAL


Uma das características mais singulares e idiossincráticas do ser humano é a capacidade de
criar e desenvolver cultura. Ela antecede os que nela nascem e os ultrapassa, e é por eles
transformada ao transformá-los.
Não obstante as muitas pesquisas e esforços teóricos, a influência que a cultura exerce no
desenvolvimento humano seria praticamente incomensurável não fossem também alguns casos em
que crianças foram privadas do convívio social humano, como no lendário caso de Amala e Kamala,
as meninas lobo, ou do menino Victor, dramatizada no filme O garoto Selvagem, de François
Truffault, entre outros.
Crianças que, no processo de desenvolvimento infantil, são privadas do convívio com outros
seres humanos, uma vez reintegradas, podem se desenvolver normal, ou satisfatoriamente? Quais
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as melhores estratégias para desenvolvê-las?


Conforme o campo do desenvolvimento humano foi se consolidando como uma disciplina
científica, “seus objetivos evoluíram para incluir a descrição, explicação, predição e modificação do
comportamento” (Papalia, 2006, p. 50).
Para tanto, os desenvolvimentistas precisaram incorporar cada vez mais no seio das suas
pesquisas e teorias as influências que o contexto sociocultural exercia sobre o desenvolvimento,
bem como o papel ativo do sujeito frente a ele.
A epistemologia genética de Jean Piaget, que se vale das premissas construtivistas, e a
perspectiva histórico-cultural de Lev Vygotsky são exemplos de desenvolvimentos teóricos e
metodológicos que enfatizam o papel ativo da criança, porém, com ênfases díspares. Já as
concepções sociogenéticas, como a sociocultural construtivista,
Considerando o papel ativo do sujeito no seu desenvolvimento (enfatizado pelo
construtivismo) e a importância dos contextos simbólico-sociais (enfatizada pela perspectiva
histórico- cultural), [...] é uma tentativa de superação da unidirecionalidade dos estudos
psicológicos, que ora ressaltam a importância do indivíduo e esquecem o contexto ora
valorizam o contexto e colocam em segundo plano o papel ativo e intencional do sujeito
psicológico. (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 91)
Trata-se, nas abordagens que visam sintetizar as influências socioculturais e a atividade do
sujeito quanto ao seu desenvolvimento, de ressaltar o vetor social como a gênese das funções
psicológicas superiores
Fora dos contextos socioculturais estruturados, não é possível a emergência das funções
psicológicas tipicamente humanas, tais como: o pensamento abstrato, a atenção voluntária e a
consciência autoreferente. A cultura, portanto, não influencia apenas o desenvolvimento
humano: a cultura constitui o sujeito psicológico, marcando de forma profunda o seu
desenvolvimento e conferindo-lhe o seu caráter humano. (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 91-
92)

NA PRÁTICA
A sabedoria popular preconiza que, “filho de peixe, peixinho é”, bem como compreende que as
influências do meio exercem suas determinações, afinal, “diga-me com quem andas, e direi que
és”.
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Por que será que João é assim e Joaquim assado? Ora, dentre as questões que devem ser
respondidas depois desta aula estão: o desenvolvimento humano é um fenômeno ou processo
rígido e linear, geneticamente determinado, que não ocorre por exemplo na velhice?
A resposta deve considerar que o desenvolvimento humano é um processo flexível e
complexo, dinâmico e biopsicossocial, ou seja, com determinações genéticas e biológicas, sociais,
comunitárias e culturais, e psicológicas, que interagem entre si potencializando-se ou anulando-se
no ciclo vital completo, desde o nascimento até a morte.

FINALIZANDO
Vimos que a ciência do desenvolvimento humano tem como objeto de investigação os
processos sistemáticos de mudança e estabilidade que ocorrem ao longo de todo o clico vital,
desde sua concepção até a morte, e que se trata de um campo amplo de estudo transdisciplinar
que se serve de uma gama enorme de outras disciplinas, dada a complexidade e o dinamismo
inerentes ao desenvolvimento humano.
Vimos, ainda que brevemente, que o desenvolvimento humano sob o enfoque mais específico
da Psicologia se iniciou em meados do século XIX e que, durante o século XX, as concepções
dicotômicas e voltadas quase que exclusivamente para a infância e a adolescência predominavam;
que filogênese é o processo de desenvolvimento das espécies, e que a ontogênese é o
desenvolvimento de um determinado organismo particular na relação com seu meio, e que por
hereditariedade entendemos como o código genético herdado das gerações anteriores influencia
nas expressões fenotípicas, em uma relação de mútua influência com os traços adquiridos no
ambiente, dentre eles, na cultura, que, por sua vez, as potencializa ou inibe, ou seja, influencia
exponencialmente na expressão dos fenômenos intrapsíquicos e do comportamento. Vimos
também que o crescimento nos remete às transformações biológicas quantitativas do corpo, e que
a maturação já denota uma alteração qualitativa em que o organismo adquire a capacidade de
realizar atividades mais complexas e maduras.
Sobre os períodos críticos ou sensíveis, em relação à plasticidade, discutimos sobre esses
espaços temporais em que o organismo está particularmente sensível a determinados estímulos
que os influenciam, e a flexibilidade que nosso desenvolvimento tem diante deles. Essa discussão
nos levou à díade estágio e transição, que são duas constantes do desenvolvimento, na medida em
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que, no ciclo vital, o organismo se transforma por estágios. Todos esses conceitos e outros tantos
mais visam delinear aspectos ou dimensões do processo de desenvolvimento e, quando
conjugados, explicitam a complexidade desse campo do saber.
As questões que nortearam o debate no interior da disciplina em seus primórdios como entre
inatistas, ambientalistas, cognitivistas e interacionistas, pavimentaram as concepções modernas da
ciência do desenvolvimento humano no sentido das concepções sociogenéticas, em que os seres
humanos são concebidos como “co-construtores do seu desenvolvimento enquanto sujeitos
singulares e, simultaneamente, são co-construtores dos contextos socioculturais nos quais se
inserem” (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 95).
É, portanto,
com a emergência da cultura e da possibilidade de um aprendizado coletivo (histórico) parece
ser um dos fatores essenciais para o surgimento da consciência humana, seja no plano
filogenético seja no ontogenético. Afinal, fora de um contexto sociocultural estruturado não é
possível pensarmos em consciência humana, a menos que acreditemos em uma versão
essencialista da consciência, como se a mesma já estivesse “pronta”, pré-programada em
nossos genes. (Dessen; Costa Junior, 2008, p. 97)

REFERÊNCIAS
BELSKY, J. Desenvolvimento humano: experenciando o ciclo da vida. Porto Alegre: Artmed,
2010.
DESSEN, M. A.; COSTA JUNIOR, Á. L. (Orgs.). A ciência do desenvolvimento humano:
tendências atuais e perspectivas futuras. Porto Alegre: Artmed, 2008.
PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. Porto Alegre:
Artmed, 2006.
SPITZ, R. A. O primeiro ano de vida. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

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