Você está na página 1de 4

Nessa ausência há uma revolta do exército (24-8-1820) que logo con-

Romantismo
segue novas adesões. Forma-se a "Junta Provisória do Governo Supremo do
Reino" que tinha como objetivo tomar conta da Regência e convocar uma
assembleia para elaborar nova constituição.
Foram organizadas as eleições para as cortes, e a grande maioria elei-
ta — representativa da burguesia ou dos proprietários, comerciantes e buro-
(1825-1865)
"Este é um século democrático; tudo o que se fizer hâ de ser pejojjgyo e j a g L g ^
povo. . . ou não se faz. (...) Dai-lhe a verdade do passado no romanceie no drama
cratas — se dispõe firmemente a trazer de volta do Brasil o rei D. João VI
(que só regressa em 1821).
• No regresso, o monarca jura a nova Constituição, mas a rainha Carlo-
histórico — no drama e na novela da atualidade oferecei lhe o espelho em que se mire ta Joaquina e seu filho mais novo, D. Miguel, opõem-se e passam a liderar
3 SI ê ãó seu tempo, a sociedade que lhe está por cima, abaixo, ao seu nível — e o povo . o Partido Absolutista.
de aplaudir, põ?queènttnde7é~preciso entender para apreciar e gostar."
Mas os liberais também não estavam unidos; uma grande parte de ju-
(Almeida G A R R E T -Ao Conservatório Real) ristas e burocratas (os mais progressistas) defendiam os princípios revolu-
cionários franceses e americanos. E, assim, exigiam cortes eleitas por todas
Panorama histórico
classes sociais, logo defendiam uma nova Constituição e propunham refor-
mas profundas na administração pública.
O início atribulado do século XIX em Portugal é apenas uma amostra A eles se opunha a maior parte de militares que haviam liderado e efe-
do que serão os anos oitocentos. tivado a revolta: mais moderados, propunha a volta do Rei, ofimda domi-
O regente D. João VI - seguidor da política externa da mãe louca, nação inglesa no exército e a convocação das Cortes tradicionais, isto é, com
D. Maria I - teve uma diplomacia dúbia de compromissos com Espanha, representantes do clero, nobreza e povo.
Inglaterra e França. Jesuítas e burocratas controlaram por algum tempo as cortes, instituí-
Nos fins de 1806, quando Napoleão decretou o bloqueio continental ram a liberdade de imprensa, redigiram uma Constituição bem progressista,
(nenhuma nação podia negociar ou ter relações de qualquer tipo com a acabaram com a Inquisição, ao que alguns setores do Exército responderam
Inglaterra), foi enviada a D. João VI uma nota diplomática exigindo o fecha- com tentativas de golpe, rebeliões armadas mas fracassadas.
mento dos portos aos ingleses, a prisão de cidadãos ingleses e o confisco dos Para culminar, o Brasil ficou independente em 1822. E esse era o úni-
navios e bens britânicos. co ponto em que os representantes da burguesia (mais revolucionários) e do
O regente tenta ser apaziguador, mas Portugal é invadido (novembro Exército (maii_çons_ervadores) se identificavam: a colónia precisava voltar à
de 1807) pelo exército francês aliado ao espanhol que, sem ter perdido as sua antiga condição periférica, de sustentação da economia portuguesa.
esperanças, sonhava com a união ibérica. Os liberais não eram tão liberais com a colónia.
^fo A família real e o governo fogem para o Brasil e durante 14 anos a A perda do Brasil, numa época em que a proposta era a reedificação
^ metrópole transformou-se em colónia da colónia. Aqui, a vida da corte, e lá, de Portugal, implicou uma impopularidade muito grande dos novos diri-
os invasores pilhando, roubando, matando. Parte do exército português foi gentes. O partido liberal ficou isolado, sem apoio e desacreditado (clero~e
dissolvido, e o restante partiu para lutar por Napoleão. nobreza há muito resistiam aos liberais).
Quatro anos de guerra (1807-1811) deixaram o país em situação las- Carlota Joaquina, representando uma política mais absolutista, acaba
timável: nação saqueada e politicamente confusa, pois era um protetorado por se tornar popular. Logo, foi simples, nesse contexto, proclamar a res-
inglês e colónia brasileira. A regência em Portugal, apesar de tantas mudan- tauração do Absolutismo (1823).
çast ainda mantinha os antigos métodos de governo, ou seja, a perseguição Os antiliberais pegam as armas (em Vila Franca de Xira). Nesse movi-
feroz aos liberais., mento anticonstitucional (chamado Vilafrancana) o infante D. Miguel era
O descontentamento com o rei e com a regência do Marquês de Mi- o líder, mas, evidentemente, representava um grupo de pessoas do velho
nas que funcionava em Portugal prepara o ambiente para a rebelião. regime e algumas, inclusive, que participaram da Revolução de 20.
Beresford (1768-1854, general inglês que foi nomeado para reorgani- Nessa contra-revolução também houve uma divisão, pois D. Miguel e
zar o exército português) resolve vir ao Brasil para obter de D. João VI am- sua mãe, extremistas à direita, tinham em D. João VI a ala moderada, ao
plos poderes para reprimir e evitar o perigo do liberalismo (que na Espanha centro. Numa nova revolta, em abril de 1824 (Abrilada) os extremistas le-
já triunfara desde o começo de 1820), como também para melhorar a con- vam D. João VI a se refugiar num navio de guerra inglês. E, apoiado pela
dição do exército português. Inglaterra, submete o filho D. Miguel a sair do país. Até à morte do rei
76
77
(1826) o país foi governado por um absolutismo moderado. A esperança As primeiras manifestações literárias do Romantismo ou de um pré-
de uma nova Constituição não saiu disso. -romantismó ocorreram nos países europeus mais desenvolvidos, em especial
A morte do rei leva D. Miguel ao poder (D. Pedro, ojilho mais velho, na Alemanha e na Inglaterra, destacando-se Goethe (1749-18321 e Schfller
era imperador do Brasil e já não se aceitava, nem aqui e nem em Portugal, (1759-1805). Foi, entretanto, na França, que o novo movimento literário
a união das duas coroas). ganhou proporções revolucionárias.
Com o miguelismo, em 1828 as Cortes foram dissolvidas e quando re- Dp^ndõ^se a cultura aristocrática da vida da corte, essa nova literatura
convocadas a ordem era a mesma do velho regime absolutista. Apesar de ter vem carregada de valores antiabsolutistas e anticlássicos.
tido apoio estrangeiro (Inglaterra, Áustria, França) o rei acabou por ficar Há, a partir de então, uma nova relação entre escritor e público; nessa
sozinho: o país sob seu comando conheceu uma repressão violenta: milha- maior proximidade, novo estilo, novo significado estético e novos géneros
res dè liberais fugiram, outros tantos presos, e a administração foi de abso- literários são criados. Padrões clássicos são ignorados. Aqueles valores mito-
luta incompetência. lógicos, retóricos e regras literárias, que indicavam uma concepção do mun-
Foi pior que o despotismo pombalino, entretanto a população aplau- do estático, são deixados de lado em nome da tradição de origem nacional
de - à princípio - J Q rei: os liberais passaram a ser vistos como ateus, inimi- e da liberdade de criação, uma concepção dinâmica que recusava modelos
gos do_país e responsáveis pela instabilidade do regime. absolutos.
Mas isso não impede a guerra civil que foi favorecida pelo liberalismo Há, evidentemente, um inconformismo em relação a temas, a intelec-
europeu e que na Inglaterra foi representado pela subida de um gabinete libe- tualismos e absolutismos literários. O ossianismo iniciado na Escócia por
ral e na França pela Revolução de 30. Macpherson (1760-1763), a redescoberta de Shakespeare, o "Sturmund
Exilados, liberais moderados e radicais, liderados por D. Pedro (que Drang" (década de 1770) na Alemanha, a redescoberta de contos medievais
abdicara da coroa brasileira para seu filho), depõem D. Miguel. Mas esse e lendas de origens germânicas vêm mostrar uma nova direção literária de
contexto entre liberais e absolutistas, mesmo com a vitória dos liberais, caráter histórico, que tão bem reflete os novos tempos da revolução da
não terminou. burguesia.
De 1834 a 1850 presencia-se revolução e contra-revolução, motins e Em termos sociais, a nobreza perde o poder político e económico, e a
contramotins, choques entre liberais à esquerda e liberais mais conserva- burguesia dita os novos valores. Os papéis sociais têm nova correlação: no-
dores. breza decadente, grande e pequena burguesia, camponeses e operários -
Em 1851, encontra-se a solução: com o governo da Regeneração, Sal- esses em número crescente pela incontrolável industrialização.
danha (1790-1876) assume o poder, apoiado por uma burguesia unificada. A euforia provocada pela Revolução Francesa, associada à liberdade
É esse contexto político e social que propicia o desenvolvimento dp de ascensão económica e individual, é o suporte e inspiração de uma litera-
Romantismo português. tura de emoções individuais.
A ideia de que o indivíduo, com sua vida material e intelectual, é
transitório, enfatiza o caráter relativo do que há no universo: nada é abso-
Romantismo luto.
As origens do movimento romântico remontam-nos à evolução econQ- Essa nova visão nada mais é que um novo modo de r.nnrphpr o mundo
mica-social e política da burguesia. Seu encerramento está relacionado com é a ideologia da nova sociedade que vê limitações e relatividades do homem
as consequências econômico-sociais da Segunda Revolução Industrial. A si- é da História. " " ~~
tuação europeia era de crise social e não mais se justificava a defesa dos. As emoções individuais, a visão relativa do universo, o apego às tradi-
ideais do liberalismo burguês. ções nacionais,_a mitologização da história vêm se opor aos séculos de racio-
0 Romantismo está relacionado com o surgimento de um novo públi- nalismo^absolutlsmo e impessoalismo._
co-leitor. Este, de origem burguesa, formou o seu gosto literário através da "CXânsia de glorificarapátria e de fazer confissões pessoals\são as du
leitura de jornais vendidos a preços acessíveis. Além disso, a elevação*do po- faces ao mesmo individualismo que se manifesta em favor do espírito e con-
der aquisitivoda classe média e um sistema de impressão em escala comer- tra as coisas materiais. Mas a_euforia do romântico se mistura ao desencanto
cial propiciaram o alargamento do mercado consumidor. Se no classicismo da época pós-revoluciónária: a consciência de que os ideais de Igualdade,
tínhamos um público aristocrático, palaciano, agora este é mais amplo e Libje^d^d^^Fraternid^de se limitavam à economia, permitindo a livre inicia-
precisava ser motivado para adquirir a obra de arte. Há, nesse setor, como no tiva^ O pessimismo que é, frontalmente, a negação e rejeição da realidade,
conjunto da sociedade, uma democratização da cultura. vem da nãõííXieiisãu detses4deMS^0"cãmpõ social.
78 79
São duas etapas bem distintas: a eufórica fase de idealização da reali- dievalismo de um grupo de poetas de Coimbra e o ultra-romantismo desen-
dade^Jm que tudo é motivo para que o autor decante a vida, e a"negativista volvido também nessa cidade e mais acentuadamente no Porto (décadas~de
fase jde fuga do real. ~ 1840e 1850). ~~ "
QJRomantismo é um modo de produção artística e também um modo Destaca-se, nessa segunda etapa, a obra de Camilo Castelo Branco,
de pensar a vida,"e, por essa razão, o jiiilismojiterário está não raras vezes basicamente ultra-romântica, mas que já apresenta a observação da realidade
ligadoà_ Mognifiado autor. de um realista. Sua obra situa-se entre as mais significativas da literatura
* Mas aes^è~p^ssmTÍ5mo sucede a necessidade de crítica da realidade: portuguesa. A poesia desse período tem valor menor. Apenas para referên-
constitui-se uma 3? fase romântica ou mais propriamente, pré-realista. cia histórica, podemos citar o nome de Soares de Passos.
A essa nova forma de pensar a vida vem, de forma correlata, a neces- Dois escritores da estética romântica das décadas de 1850 a 1860
sidade de uma nova maneira de a expressar: desenvolve-se o romance e foram particularmente significativos durante o período da monarquia cons-
simultaneamente o drama, formas literárias mais populares e democráticas. titucional da Regeneração. Na prosa, Júlio Dinis, escritor fundamental para
a consçÍêncía~coietiva dã~ classe média dessa época; na poesia,,João de Deus,
onde. em alguns poemas já aparece a crítica à venalidade do regime político
5.3 Romantismo em Portugal A^aje_social_do Romantismo português foi muito fraca; mais fraca
ainda a ideológica. Os escritores mais combativos, como Garrett, ainda estão
O Romantismo português, como ocorreu nos demais países europeus, sob influência do Iluminismo neoclássico. Como consequência apresentam
esteve associado ao desenvolvimento da imprensa e à afirmação social de um publicações com inovações ainda tímidas, se as compararmos "com as dos
novo piihlico-leitor; o burguês. Não temos mais uma produção que seguia países mais desenvolvidos.
os padrões clássicos, de ideologia aristocrática, para quem não existia a his- O movimento, entretanto, foi bastante importante para a evolução
tória. Para o novo público, tudo é relativo e está em contínua transforma- estética da literatura portuguesa. A__n><;pp.itn H a s iafluéaaa&_d£_&scriíores
ção. Não lhe interessam "os padrões clássicos mas a novidade .que vai ser trans- europeus (sobretudo de Chateaubriand, Walter Scott e Victor Hugo), atua-
mitida, normalmente, pelos jornais. lizõu^ré,"^ê1ntrõ de um contexto popular e democrático, a tradição literária
Os escritores mais ativos do Romantismo em Portugal desenvolveram mãTs significativa do país.
atividade jornalística. E contribuíram, uns mais, outros menos, para afir- Se as produções não foram tão originais ou contundentes como as da
mação do liberalismo no país. Três escritores se destacaram na implantação Europa desenvolvida, isso se deve às contradições da burguesia portuguesa,
desse movimento nesse país: Garrett, Herculano e Castilho. Constituem o ainda muito ligada ao campo. Os setores mais atrevidos eram os do comér-
primeiro movimento do Romantismo, com produções ainda ligadas ao cio. Faltou ao país uma autêntica revolução industrial.
neoclassicismo. A situação "de"dependência do imperialismo, em especial da Inglaterra,
Garrett foi inicialmente o escritor mais ativo do grupo, inclusive poli- trouxe o atraso económico e não tornou possível a constituição de um pú-
ticamente era o mais radical. Herculano, mais moderado, secundou-o: sua blico leitor mais significativo. Mais de 80% da população continuava anal-
importância vai fazer-se sentir gradativamente e marcará os últimos anos fabeta e concentrada sobretudo no campo.
de sua vida, quando afirmou-se o movimento realista. Castilho, personalida-
de contraditória, colocou-se como romântico, embora ideologicamente
fosse um neoclássico. Sua influência vai exercer-se mais no campo pedagógico
e jornalístico, do que propriamente no desenvolvimento da arte romântica. .4 Almeida Garrett
Camões (18251 de Almeida Garrett foi o marco inicial do Romantis-
mo português. O novo gosto literário, entretanto, só veio a solidifiçar-se com Há uma simetria entre a vida e a obra de Almeida Garrett (João
õ"decorrerdã~decada de 1830. É dessa época A voz do profeta (1836), de Baptista da SH^Leitão de Almeida Garrett - 1799-1854): suas produções
ÀJexandreJjjgjrçulano^ jerfodo onde_aparecem as primeiras traduções de literárias revelam — tanto na forma como no conteúdo - as contradições
t Walter Scott., ideológicas em que se debateu. E a s contradições de sua personalidade, no
A democratização da arte não fica restrita à poesia e à prosa de ficção: que~eTa possuía de conservadora e de revolucionária,
atinge também o teatro. Garrett é designado pelo governo para reformar o Garrett Tormou-se dentro do Arcadismo, identificando-se ideologica-
tejrtrojjortujnj^ do autor nacional. mente com a corrente iluminista de esquerda. É dessa época o poema "O
O segundo momento do Romantismo coexiste com o primeiro e com Retrato de Vénus" (1822), que escandalizou setores reacionários ligados
o terceiro, de transição para o Realismo. É uma arte que oscila entre o me- à Igreja. O poeta foi acusado de materialista e de obsceno; julgado, foi

80 81
Edição SUMARIO

José Adolfo de Granville Ponce


Normalização e revisão
Katumi Ussami Nakamoto
Capa e diagramação
Ary Almeida Normanha
1. IDADE M É D I A 9
Arte obra houve a
Na execução desta
colaboração da Faculdade Ibero-Americana 1.1 Primeiro período: Trovadorismo (1189 ou 1198-1434) 9
de Á baco Produções
Letras e Ciências Gráficas
Humanas. 1.1.1 Portugal: estrutura social 10
1.1.2 Jograis. Trovadores. Cancioneiros 13
1.1.3 Cantigas de amigo e suas relações sociais 13
1.1.4 Cantigas de amor e suas relações sociais 16
1.1.5 Cantigas satíricas 19
1.1.6 Prosa medieval 20
1.1.7 Outras produções 21
1.2 Segundo período: Humanismo (1434-1527) 21
CIP-Brasil. Catalogação-na-Publicação 1.2.1 Fernão Lopes 22
Câmara Brasileira do Livro, SP 1.2.2 O humanismo de Fernão Lopes 23
1.2.3 Poesia humanista 24
Abdala Júnior, Benjamim, 1943- 1.2.4 As origens do teatro português 25
A116h História social da literatura portuguesa / Ben- 1.2.5 Gil Vicente e o teatro português 25
2.ed. jamin Abdala Júnior, Maria Aparecida Paschoalin. 1.2.6 Características da obra vicentina 27
— 2. ed. — São Paulo : Ática, 1985.
Bibliografia. S U G E S T Õ E S PARA LEITURA 30
1. Literatura portuguesa — História e crítica SÍNTESE 31
I. Paschoalin, Maria Aparecida. II. Título.
85-0216 CDD—869.09

índice para catálogo sistemático: 2 R E N A S C I M E N T O (1527-1580) 33


1 . Literatura portuguesa : História e crítica 869.09 2.1 O Renascimento 34
2.2 A poesia renascentista 36
2.3 Luís Vaz de Camões 37
2.3.1 Camões lírico 38
2.3.2 Camões épico 41
2.3.3 Características do poema épico "Os Lusíadas" 44
2.3.4 Camões e o teatro 45
2.4 Novelas de cavalaria 47

lodos os direitos reservados peia Editora Ática S.A. S U G E S T Õ E S PARA L E I T U R A 47


R. Barão de Iguapé, 110 — TeL: PABX 278-9322 SÍNTESE 48
('. Postal H656 — End. Telegráfico "Bomlivro" — S. Paulo

Você também pode gostar