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Um fato notável, porém, ocorreu nos Estados Unidos com Helen Keller (1880-1968),
nascida cega e surda e que portanto não aprendera a falar. Desse modo, permaneceu
praticamente excluída do processo de humanização até a idade de 7 anos, quando seus
pais contrataram a professora Anne Sullivan. Essa mulher admirável conduziu Helen ao
mundo humano das significações, de início pelo sentido do tato. Começou por dedilhar
sinais nas mãos da menina, relacionando-os com os objetos, sem saber de início se a
criança percebia a relação entre sinal e coisas.
Até um dia, ao bombearem a água de um poço, que Helen deu o passo definitivo na
direção da linguagem. Em sua autobiografia, ela relata:
... minha professora colocou minha mão sob o jorro.
À medida que o fluxo gelado escorria em minha mão, ela soletrou na outra a palavra
água, primeiro devagarzinho e depois mais depressa. Fiquei quieta; toda a minha
atenção concentrava-se no movimento de seus dedos. De repente senti uma nebulosa
consciência de algo como que esquecido — uma impressão de retorno do pensamento; e
de alguma forma o mistério da linguagem me foi revelado. Soube então que á-g-u-a
significava a maravilhosa coisa fria que deslizava pela minha mão. [...] Saí do poço
ansiosa por aprender. Tudo tinha um nome, e cada nome dava origem a um novo
pensamento. Ao voltarmos para casa, todo objeto que eu tocava parecia vibrar, cheio de
vida. Isso se dava porque eu via tudo com a nova e estranha visão que se me
apresentara.
No mesmo dia Helen
associou inúmeras outras
“palavras” com objetos.
Depois, com o tempo,
aprendeu a falar, a ler e a
escrever. Tornou-se uma
escritora e conferencista
conhecida mundialmente.
Esses relatos nos propõem uma pergunta inicial: seria a
Ninguém pode negar que o cachorro expressa emoção por sons que
nos permitem identificar medo, dor, prazer. Quando abana o rabo ou
rosna, entendemos o que isso significa; e quando lhe dizemos
“vamos passear”, ele nos aguarda alegremente junto à porta.
1.4 O cachorro fala Português?
Nós também
conseguimos
entender
rapidamente a
linguagem dos
cachorros, mesmo
que não falemos
“cachorrês”!
Mesmo que identifiquemos nas respostas dadas pelos animais
associações semelhantes às realizadas por humanos, trata-se
de uma linguagem rudimentar, que não alcança o nível de
elaboração simbólica de que somos capazes.
Linguagem simbólica: quando a significação é regida por
convenção. Os textos escritos são o maior exemplo de
símbolos, mas há outros, por ex.:
Como só o ser humano é capaz de estabelecer
signos arbitrários, regidos por convenções sociais,
dizemos que o mundo humano é simbólico.
Durante a leitura de um
bom livro, quem nunca
experimentou um
sentimento que foi
brilhantemente
representado, pelo autor,
simplesmente pelo bom
uso das palavras?
A linguagem humana intervém como forma abstrata que nos
distancia da experiência vivida e nos permite reorganizá-la em
outro contexto, dando-lhe novo sentido. É pela palavra que
nos situamos no tempo, para lembrar o que ocorreu no
passado e antecipar o futuro pelo pensamento.
O agir humano: a cultura
O mundo que resulta do pensar e do agir humanos não pode
ser chamado de natural, pois se encontra modificado e
ampliado por nós. Portanto, as diferenças entre ser humano e
animal não são apenas de grau, porque, enquanto o animal
permanece mergulhado na natureza, nós somos capazes
de transformá-la em cultura. Geralmente, esta transformação
ocorre por meio do trabalho.
Em antropologia, cultura significa tudo o que o ser humano produz
ao construir sua existência: as práticas, as teorias, as instituições, os
valores materiais e espirituais. Se o contato com o mundo é
intermediado pelo símbolo, a cultura é o conjunto de símbolos
elaborados por um povo.
Dada a infinita possibilidade humana de simbolizar, as
culturas são múltiplas. Variam as formas de pensar, de agir,
de valorar; são diferentes as expressões artísticas e os modos
de interpretação do mundo, tais como o mito, o senso
comum, a filosofia ou a ciência.
Tradição e ruptura
O mundo cultural é um sistema de significados já
estabelecidos por outros, de modo que, ao nascer,
a criança encontra-se diante de valores já dados.
A língua que aprendemos, a maneira de se alimentar, o
jeito de se sentar, andar, correr, brincar, o tom da voz nas
conversas, as relações familiares; tudo, enfim, se acha
codificado.
BARUFFA, Giovanni. Nas fronteiras da prática médica e da antropologia. Pelotas: Educat, 2013.
Bibliografia Complementar
GALANTINO, N. Dizer homem hoje: novos caminhos da antropologia filosófica. São Paulo: Paulus, 2003.