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UNIVERSIDADE PAULISTA

EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

JOÃO PAULO DE CAMPOS SILVA

EDUCAÇÃO BÁSICA COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ESTADO:


UMA ANÁLISE A PARTIR DO PERÍODO DE PÓS-
DEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL: 1995 - 2014

ITUVERAVA – SP
2021
UNIVERSIDADE PAULISTA
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

JOÃO PAULO DE CAMPOS SILVA

EDUCAÇÃO BÁSICA COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ESTADO:


UMA ANÁLISE A PARTIR DO PERÍODO DE PÓS-
DEMOCRATIZAÇÃO NO BRASIL: 1995 – 2014

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito


parcial para a obtenção do título de Licenciatura em
Pedagogia
Universidade Paulista – Polo Ituverava
Orientação: Profa. Dra. Merilyn Escobar de Oliveira

ITUVERAVA – SP
2021
FICHA CATALOGRÁFICA

Silva, João Paulo de Campos.


....Educação básica como política pública de Estado: : uma análise a partir do
período de pós-democratização do Brasil: 1995 - 2014 / João Paulo de
Campos Silva. - 2021.
....31 f.

....Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) apresentado ao curso de


Pedagogia da Universidade Paulista, Ituverava, 2021.

....Orientadora: Prof.ª Dra. Merilyn Escobar de Oliveira.

....1. História da Educação. 2. Políticas públicas. 3. Ensino básico. 4. Década


de 1990. I. Oliveira, Dra. Merilyn Escobar de (orientadora). II. Título.

AGRADECIMENTOS
Escrever agradecimentos por concluir algo que todo o trabalho braçal foi
exclusivamente meu é sempre um sentimento meio estranho, mas como quase toda
monografia tem, eu acho válido escrever algumas palavras, no intuito de deixar registrado o
nome daqueles e daquelas que em meio a esses quatro anos de graduação ficaram em cima de
mim o tempo todo e, em sua maioria, me ajudaram a não dar pra trás quando as coisas
ficavam difíceis ou o desânimo batia.
Primeiramente, valeu mãe. Essa ideia de fazer pedagogia foi toda sua, e se nao tivesse
insistido por seis meses eu acredito que nunca teria tido o ânimo necessário para começar esse
processo longo e demorado – que viria a fazer um monte de gente a me chamar de doido por
estar iniciando uma segunda graduação concomitante à primeira.
Em segundo lugar queria agradecer de maneira mais geral e superficial aquelas pessoas
que durante minha formação me incutiram o amor pela educação como um todo. São diversas
pessoas, mas dentre elas o Pimpão foi quem mais me inspirou, ajudou e continua inspirando e
ajudando nessa carreira ingrata, mal remunerada, sofrida e desrespeitada que o professorado.
Em terceiro lugar eu gostaria de agradecer à Monise, que nesses últimos momentos de
fazedura desta monografia, foi ela quem mais de perto acompanhou esse processo chato,
custoso e cansativo, e que mais me deu força para que eu nao desanimasse escrevesse cada dia
mais parágrafo.
De maneira geral, também queria deixar um abraço especial aos meninos que moraram
comigo na Cativeiro, e que em 2018 e 2019 me ajudavam com diversas coisas do curso,
principalmente a galera que fazia História. Valeu, gente.
Quero também deixar um obrigado registrado para todos os meus familiares que de uma
forma ou de outra ficaram felizes por mim quando iniciei essa nova etapa da minha vida
intelectual, e que apoiaram dizendo que era uma boa ideia.
Por fim, apesar de ter iniciado esses agradecimentos com uma piada e ter dito que o
processo foi longo e cansativo – e foi –, além de reclamar dessa área na qual eu estou dentro,
ninguém consegue chegar muito longe sem ajuda. E cada agradecimento aqui é especial e de
coração, pois foi graças a essas ajudas, palavras de incentivo e até as piadinhas sobre eu ser
doido, que incentivaram a começar, passar por tudo, e, agora finalmente, concluir mais essa
etapa da minha vida – acadêmica, profissional e pessoal.
Muito obrigado, galera. É nois.
RESUMO

Este trabalho pretende analisar as políticas públicas voltadas para o âmbito educacional do
Brasil a partir do primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995 – 1998)
até o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff (2012 – 2014), com vistas a levantar
dados para que se possa observar possíveis permanências, reveses e avanços do campo
educacional neste país. Ao olharmos diretamente para o passado recente do Brasil, antes de
intentar reconstruir a história e pautar discussões ainda jovens, nós pretendemos lançar luz a
uma nova forma de perceber essas possíveis permanências até os dias de hoje e, se possível,
criticar as ações tomadas pelos governos observados, no que diz respeito, principalmente à
desigualdade social que a educação nacional carrega em si desde sua fase primária.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 7

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 10

2. MÉTODO 12

3. ANÁLISE E DISCUSSÃO 14

3.1. AS INFLUÊNCIAS DO NEOLIBERALISMO NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA 14

3.2. AS REFORMAS EDUCACIONAIS BRASILEIRAS (1995 – 2014) 17

CONSIDERAÇÕES FINAIS 24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 29
7

INTRODUÇÃO

A história da educação no Brasil, como sabido, é carregadas de percalços e


complexidades que cada qual se insere dentro de um grande quadro social, relevante à sua
época, e que reflete dentre muitas outras coisas, aquilo que se tem por projeto de nação. Um
projeto de Brasil. Ao nos privilegiarmos do tempo, olhando para trás, podemos observar que a
instrução, no Brasil, se deu de diversas maneiras, sendo, no início, de responsabilidade de
missionários ou dedicada apenas à uma certa elite, cuja condição permitia que a instrução dos
filhos fosse feita no exterior.
No período colonial, observamos que o domínio do âmbito educacional ficara a
cargo dos primeiros missionários que aqui chegaram, em 1549, e que se manteve sob domínio
jesuíta até a expulsão da Ordem, em 1759, pelo Marquês de Pombal. A atuação pedagógica
dos missionárias se dava em diferentes níveis, para os diferentes grupos sociais:

[...] para os índios, os rudimentos da língua e os ofícios; para os brancos


libertos, os rudimentos da escrita, da leitura e os ofícios; para as classes
abastadas, os ensinos superiores que garantiriam a manutenção da estrutura
de poder; já para os escravos africanos e alforriados, os ofícios. 1

Como percebido, a instrução no Brasil, em seus primeiros anos como colônia de


Portugal, não apresentava um caráter sistemático, tampouco público ou igualitário. Muito pelo
contrário, os primeiros missionários que aqui chegaram vinham com a missão de evangelizar
e resgatar a alma dos indígenas, por meio da catequização, e paralelamente a sua missão,
tomaram para si a instrução básica de filhos dos colonos.2
O período subsequente, marcado por um governo que perpassou pelas mãos – e
políticas – de dois monarcas, também pode ser considerado como marcado mais por disputas
ideológicas, do que ações necessariamente efetivas. Vale destacar que neste período houve um
fortalecimento objetivo da instrução pública por parte do governo, consolidado
principalmente por um processo de modernização e urbanização levado à cabo pelo
Imperador, fundando faculdades, o Jardim Botânico, o Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro (IHGB), entre outras instituições.3 Neste sentido, destacamos aqui a Lei de 15 de

1
SILVA, Gleidson; AMORIM, Simone Silveira. Apontamentos sobre a educação no Brasil Colonial (1549-
1759). Interações (Campo Grande), v. 18, p. 185-196, 2017.
2
CASRELNAU-L’ESTOILE, C. de. Operários de uma vinha estéril: os jesuítas e a conversão dos índios no
Brasil 1580-1602. Bauru: Edusc, 2006.
3
NASCIMENTO, Jorge Carvalho. A cultura ocultada ou a influência alemã na cultura brasileira durante a
segunda metade do século XIX. Londrina: Ed.UEL, 1999, p. 32.
8

outubro de 1827, que regulamentava pontos importantes para o funcionamento da educação a


nível nacional. Segundo Maria Thetis Nunes, “[...] apesar dos pontos negativos, a Lei de 15 de
outubro de 1827 foi a única tentativa de organização do ensino primário até 1946.4
De maneira geral, houve uma maior atenção por parte do Governo em relação ao
âmbito educacional brasileiro, porém este se limitava apenas à garantia do acesso somente às
primeiras letras, não dando possibilidade para a continuidade dos estudos. Com o fim do
período imperial, em 1889, e o início do período chamado Primeira República, o país mais
uma vez se viu em meio a diversas transformações nos campos econômico, político e social, e
novamente a educação nacional não passou ilesa pelo processo.
Com o advento do Período Republicano, logo na década de 1890, o governo federal
implementou reformas no campo da educação, principalmente no setor que hoje
denominamos como Ensino Médio e Ensino Superior. Neste sentido, podemos destacar
reformas educacionais, levadas à cabo pelo governo e que levaram o nome de seus
idealizadores, sendo elas “[...] a Reforma Benjamin Constant (1890); Código Epitácio Pessoa
(1901); Reforma Rivadávia Correa (1911); Reforma Carlos Maximiliano (1915); Reforma
João Luiz Alves/Rocha Vaz (1925) [...]”.5
Entrando no século XX, podemos observar diversos momentos de tensões e disputas
ideológicas, características do campo político, que ecoavam fortemente dentro do cenário
educacional do país. Marcado por diversas formas de governo, este conturbado período do
Brasil teve início, ainda dentro da “República Oligárquica”, passando por uma revolução
(1930), seguida de um golpe sete anos depois (Estado Novo), e de um breve período
democrático, que viria a ser minado novamente por outro Golpe militar (1964), cujo regime
duraria 21 anos. Segundo Marisa e Mariluce Bittar, é possível relacionar o processo da
construção da escola pública junto do processo político que se desenvolveu ao longo do
século XX, mais precisamente a partir da Revolução de 1930, com a chegada de Vargas ao
poder e à consolidação das políticas educacionais em âmbito nacional.6
Essa consolidação, muito mais relacionada à industrialização rápida, porém tardia,
promovida pelo governo de Vargas gerou diversos debates ideológicos, principalmente no
campo da hegemonia de poder sobre este setor. Divididos entre conservadores – aliados à
Igreja Católica – e liberais – aliados à setores progressistas – o debate levantado neste

4
NUNES, Maria Thetis. História da educação em Sergipe. In. DA SILVA, Adailton Soares; DE SOUZA,
Aneilton Oliveira. Política educacional no Brasil: do império à República. Rios Eletrônica – Revista Científica
da FALSETE. Ano 5, n. 5, p. 71. 2011.
5
PALMA FILHO, João Cardoso. Cidadania e educação. Cadernos de Pesquisa, n. 104, p. 101-121, 1998.
6
BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. História da Educação no Brasil: a escola pública no processo de
democratização da sociedade. Acta Scientiarum. Education, v. 34, n. 2, p. 157-168, 2012.
9

momento fez valer, ao menos na letra, a criação de um Sistema Nacional de Educação, porém
carregado por uma dicotomia excludente entre o ensino técnico-profissional, destinado às
camadas mais humildes, e o ensino complementar (ou secundário), destinado às elites
nacionais.
No período ditatorial compreendido entre os anos de 1964 e 1985, houve um
aumento na capilaridade das escolas públicas brasileiras. Entretanto, esse aumento no alcance
da rede, nem de longe, fora acompanhado por um aumento, nem sequer, por uma
padronização da qualidade do ensino. Muito disso está intimamente ligado à entrada do
pensamento tecnocrático, característico da sociedade militar brasileira, em vistas de uma
educação “preparatória” da mão de obra, em detrimento de uma educação crítica e de
autonomia.
De lá pra cá, muita coisa mudou, não somente no âmbito da educação per se, mas na
própria História e projeto político do Brasil. À luz da década de 1990, pouco tempo após o
processo compreendido como abertura política, o país abandonaria as políticas públicas do
período ditatorial por novas, porém não deixaria de lidar com consequências herdadas desse
período.7
A partir de então, com a consolidação de uma educação orientada pelos moldes
neoliberais este trabalho pretendo tomar como objeto as ações diretas tomadas pelos
presidentes – começando pela segunda metade da década de 1990 – e as políticas públicas
implantadas no âmbito educacional brasileiro. Este trabalho, portanto, será composto por 3
eixos de análises, sendo divididos em uma primeira parte, que pretende-se lançar luz às
políticas econômicas vigentes e compreender o lugar do Brasil dentro dessa perspectiva
globalizada de economia na qual se insere, e o papel da educação no quadro de disputas de
forças; depois, apresentar e discorrer sobre as políticas públicas que compunham o âmbito
educacional do Brasil, a partir de 1995, principalmente aquelas de caráter nacional e
governamental; por fim, antes de propor uma solução, objetivamos levantar uma perspectiva
geral tomando os dados obtidos como base, com o intuito de se olhar a realidade do presente à
luz de dados concretos do passado e, dessa forma, contribuir ao debate educacional.

7
BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. História da Educação no Brasil: a escola pública no processo de
democratização da sociedade. Acta Scientiarum. Education, v. 34, n. 2, p. 164, 2012.
10

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para dar aporte teórico e metodológico a esta pesquisa lançaremos mãos de diversos
autores já consagrados dentro deste campo, amplo, de estudos, que se faz em torno das
políticas públicas educacionais brasileiras. Antes de consultar tais obras, fizemos o
levantamento de um importante corpus documental que auxiliou na orientação da pesquisa
sobre as regulmantações brasileiras.
Para tanto, podemos citar o uso da Base Nacional Curricular Comum, um documento
basilar para as pesquisas nesse campo, pois definem, de fato, a base educacional dos dias de
hoje. Além deste, utilizamos também a Lei N° 4.024, de 29 de dezembro de 1961 8; a Lei N°
5.692, de 11 de agosto de 19719; e a Lei N° 9.394 de 20 de dezembro de 199610 – dando maior
destaque a esta última –, que foram, cada qual, o marco jurídico de sua época para a
regularização da educação em território nacional. Por fim, como documentação oficial,
utilizou-se a Constituição Brasileira de 198811 no intuito de, à luz da constituicionalidade,
pudéssemos observar as incongruências que atravessam o discurso em relação à prática.
No que diz respeito à bibliografia utilizada até então, optou-se pelo trabalho divido em
temáticas para que fosse possível a construção de um melhor campo amostral para o trabalho.
Dessa forma, separamos as obras – e seus respectivos autores/ras – da seguinte forma: para os
aspectos básicos e um breve panorama histórico, usou-se de artigos referentes à consolidação
de um sistema público de educação no país e como este se tornou condição primordial para o
seu desenvolvimento econômico nas décadas passadas. Neste quesito, portanto, utilizamos da
obra 500 anos de educação no Brasil,12 que segundo Saviani13 “[...] apresenta um amplo
painel da produção historiográfica sobre educação cobrindo um largo leque de temas e
contemplando, de um modo ou de outro, os vários períodos atravessados pela educação na
história de nosso país”.

8
Esta seria depois revogada pela Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Cf. BRASIL. Lei N° 4.024, de 20 de
dezembro de 1961. Fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1961. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4024.htm>. Acesso em 15 de out. 2021.
9
BRASIL. Lei N° 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá
outras providências. Brasília. 1971. Disponível em: < https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-
5692-11-agosto-1971-357752-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em 16 de out. 2021.
10
BRASIL. Lei N. 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm.> Acesso em: 12 out. 2021.
11
FEDERAL, Senado. Constituição. Brasília (DF), 1988. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 16 de out. 2021.
12
LOPES, Eliana Marta Teixeira, FARIA FILHO, Luciano Mendes VEIGA, Cynthia Greive. (orgs.). 500 anos
de educação no Brasil. 2a ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. 606 p.
13
SAVIANI, Dermeval. 500 anos de educação no Brasil. Revista Brasileira de Educação, n. 14, p. 187-188,
2000.
11

Sob a ótica da educação pública institucionalizada e, portanto, seu papel na


democratização do país ao longo dos anos logo após seu nascimento, utilizamos de um artigo
intitulado História da Educação no Brasil: a escola público no processos de democratização
da sociedade, escrito pelas autoras Marisa Bittar e Mariluce Bittar, e que contém um
panorama muito bem embasado sobre a institucionalização da escola e do sistema público
educacional, em um âmbito nacional, a partir da década de 1930 até os anos iniciais da
redemocratização, cuja sua análise vai de encontro com aquilo que pretendemos, ao discutir as
políticas neoliberais que incidiram sobre o país a partir do final do século XX.14
Para fins de compreender melhor à luz de dados, as questões que abordem o sobre a
estrutura e organização que regem as escola e o sistema educacional do país e, acerca das
políticas que perpassaram os governos em exercício dentro do recorte analisado – Fernando
Henrique Cardoso (1995 – 1998; 1999 – 2002), Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2006; 2007
– 2010) e Dilma Roussef (2011 – 2014) – fez-se uso da obra Educação escolar: política,
estrutura e organização, organizada pelos professores, Libâneo, João Ferreiro de Oliveira e
Mirza Seabra Toschi, cuja amplitude de temas e a profundidade com a qual os aborda, o faz
ser uma das obras fundamentais para o desenvolvimento do presente trabalho. Aqui,
tomaremos como base aquilo que foi discutido, principalmente, no âmbito das legislações que
se deram a partir do período que nos interessa, dando foco nas políticas educacionais, suas
reformas e os Plano de Diretrizes que orbitaram sua construção, além de usar de pressupostos
levantados para construir nossa crítica aos dias atuais.
Ainda neste sentido, fez-se uso do artigo de Frigotto e Chiavata objetivando construir
um olhar mais atento e preciso sob a questão econômica na qual o Brasil se insere, dentro de
uma visão mais global da economia, posto nossa permanência ainda como periféricos no jogo
internacional. Aqui temos, portanto, uma discussão sobre os valores e lógicas utilizadas no
âmbito dos anos 1990 – o período de governo de Fernando Henrique Cardoso – que preparou
os terrenos para as políticas da educação que viria acompanhadas da virada do século.

14
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação
ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, p. 93-130, 2003.
12

2. MÉTODO

Diante do contexto que observa hoje na sociedade brasileira, especialmente na


educação, surge a necessidade de compreender a necessidade de fortalecimento de uma
política educacional no Brasil. A partir dessa premissa buscamos analisar historicamente os
rumos tomados pela política educacional brasileira a partir do período logo após o fim da
Ditadura Civil-Militar brasileira (1964-1985), na tentativa de lançar luz, comparativamente, às
políticas aplicadas no decorrer dos anos 1990 até meados dos anos 2010, e identificar qual o
pensamento educacional implementado pelo Estado no período, qual a concepção de
educação, e para quem se destinava essa formação e seus resultados para a sociedade, tudo em
face às novas políticas econômicas que entravam em voga no mundo.
Para isso, então, fizemos um levantamento documental para a construção desse trabalho.
Em sua maioria, o corpus é composto por documentos elaborados por órgãos governamentais,
recortados para que sejam analisados apenas aqueles escritos que tangem sobre a educação.
Para além, este trabalho contou, também, com a contribuição teórica de diversos nomes já
consagrados deste campo de estudo, tais como Marisa e Mariluce Bittar; José Carlos Libâneo,
João Ferreira de Oliveira, Mirza Seabra Toschi; Gaudêncio Frigotto, Maria Ciavatta; Manoel
Bergström Lourenço Filho; Eliane Marta Teixeira Lopes, Cynthia Greive Veiga; Demerval
Saviani, entre outros.
Dado o panorama do corpus documental a partir do qual pretendemos desenvolver este
trabalho, o procedimento a ser adotado com as fontes selecionadas se delineará dentro daquilo
que Paul Veyne nos apresenta como “história lacunar”.15 Ao trabalhar diretamente com os
documentos, não é possível reconstruir a história tal como ela foi, mas sim, o que podemos
saber,16 a partir daquilo que os documentos apresentam. Além disso, não há pretensão em
reconstituir os fatos passados, mas compreender, de certa forma, os objetivos e interesses em
volta daquilo que fizeram dentro da especificidade da educação. Somando-se à esta análise
pretendida sobre o corpus, faremos o uso da bibliografia sobre o tema de maneira a buscar as
informações necessárias para entender como as hipóteses previamente elencadas, se davam.
Dessa forma, este trabalho será norteado a partir de questionamentos sobre a quais eram
os objetivos dos legisladores ao implantarem certas políticas educacionais, quais os interesses
– internos e externos – vigente dentro dos processos constitutivos e como a nova orientação
econômica vigente influenciou um certo pensamento enviesado dentro do âmbito educacional.
15
Cf. VEYNE, Paul Marie. Como se escreve a história; Foucault revoluciona a história. 4ª ed. Brasília:
Editora Universidade de Brasília. 1998. p. 26.
16
Ibid., p. 26-27.
13

Temos plena consciência de que fatos importantes estão sendo selecionados e apresentados
enquantos alguns, até omitidos. Isso corresponde ao risco que se corre com esse tipo de
empreendimento que nos propomos realizar.
Complementando nossa estratégia metodológica, usaremos também dos estudos de
Educação Comparada, que se propõe, “ [...] partindo das formas institucionalizadas do ensino,
[...] aprofundar a análise desse processo, nas relações que apresente com as circunstâncias da
existência dos vários grupos sociais, e da integração deles na sociedade nacional”. 17 As
origens desse esses estudos a dois movimentos paralelos, que concernem ao recorte
apresentado no presente trabalho:

O primeiro, dentro das universidades, tem buscado estudar a educação como


amplo processo, ligado às investigações sociais da História e da Política.
Obras precursoras desse movimento podem ser apontadas mesmo no
primeiro terço do século 19, em especial devidas a autores alemães, todas
relativas à educação na antigüidade. Outras, desenvolvendo o método
comparativo e buscando apoio na etnografia, foram publicadas na Inglaterra
e na França, especialmente nos fins do século 19. [...] O segundo movimento
vê os estudos comparativos com base em investigações similares, para logo
aplicá-las à ação política. [...] Para isso, desde logo estabelece um complexo
de categorias e critérios, que deverão fundamentar-se não só em dados reais,
descritivos, como em princípios de natureza programática. Admite, assim,
uma pedagogia de fundamentos universais, cujo fim último deve ser o do
bem-estar, segurança e desenvolvimento geral da humanidade [...]. 18

Dessa forma, partindo dos pressupostos estabelecidos na obra organizada por Carlos
Monarcha e Ruy Lourenço Filho, assumimos que através de uma ação educativa intencional,
seja possível, de fato que o processo educacional exerça um retorno sobre sobre condições
básicas de toda a vida social. Lançar mão dos Estudos Comparativos, portanto, nos oferece
um vasto espaço amostral para análise a partir de princípios concretos; ou seja, olhando para o
conjunto de leis e decretos que tangem a política educacional, em contraste com a realidade
de fato da educação no país, dentro do período estabelecido.

17
MONARCHA, Carlos; LOURENÇO FILHO, Ruy. Educação comparada. Brasília: MEC/Inep, 2004, p. 18.
18
Ibid., p. 27.
14

3. ANÁLISE E DISCUSSÃO

3.1. AS INFLUÊNCIAS DO NEOLIBERALISMO NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Antes de começarmos a falar estritamente sobre as políticas educacionais,


precisamos dar luz à acontecimentos importantes que ocorriam em plena década de 1990 e
que vieram a influenciar de forma contundente os rumos da política educacional brasileira.
Um dos primeiros eventos feitos com o objetivo de discutir sobre essas diretrizes foi a
“Conferência Mundial sobre Educação para Todos”, realizada em Jomtien, na Tailândia, de 5
a 9 de março de 1990. Financiada por agências como UNESCO, UNICEF, PNUD e Banco
Mundial, essa conferência é o marco inicial que “[...] inaugurou um grande projeto de
educação em nível mundial, para a década que se iniciava [...]”. 19 Marcava-se, então, o início
de uma nova visão para o decênio de 1990, e em seu preâmbulo, tinha como ideia motriz a
“satisfação das necessidades básicas de aprendizagem”. 20 Além de 155 chefes de estados,
havia diversos tipos de organizações não-governamentais e notáveis profissionais da área
educacional, que ao fim da conferência, comprometeram-se com a garantia do acesso a uma
educação de qualidade para todos.
Perpasso a este evento, no Brasil, iniciava-se o governo de Fernando Collor de Melo,
que pouco mais de um ano depois viria a sofrer um impeachment, dando lugar ao seu vice,
Itamar Franco, que concretizou as diretrizes ordenadas na conferência de 1990 em seu Plano
Decenal da Educação para Todos, lançado em 1993. Pode-se afirmar que este documento
“marca a aceitação formal, pelo governo brasileiro, das teses e estratégias que estavam sendo
formuladas nos foros internacionais mais significativos na área da melhoria da educação
básica”.21 Este documento é construído no momento em que esses movimentos internacionais
por uma reforma educacional ganham mais forças e ainda em 1990 e 1992, respectivamente, a
CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) publica dois documentos:
“Transformación productiva com equidade” e “Educación y conocimiento: eje de la
tranformación productiva com equidade”, cuja ênfase se encontra na urgente necessidade da

19
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação
ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, n. 82, p. 93-130, 2003.
20
UNICEF. Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Conferência de Jomtien – 1990). Disponível
em: <https://www.unicef.org/brazil/declaracao-mundial-sobre-educacao-para-todos-conferencia-de-jomtien-
1990>. Acesso em 12 de out. 2021.
21
MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Verbete Plano Decenal de Educação para
Todos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira - EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2001.
Disponível em <https://www.educabrasil.com.br/plano-decenal-de-educacao-para-todos/>. Acesso em 12 out.
2021.
15

implementação de mudanças educacionais em termos de capacitação profissional por parte


dos egressos do sistema público.
Dentro deste recorte apresentado até agora, é importante esclarecer que o país
passara, na década anterior por intensos debates durante a travessia da ditadura militar (1964-
1985) para a redemocratização. Este também foi o período em que educadores puderam,
através diversas instituições de âmbito científica, 22 cultural e política, resistir ao período
ditatorial e implementar novas experiências na esfera municipal, e posteriormente levada a
alguns estados. Esse processo se concretiza no início da construção da nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDB) e do Plano Nacional de Educação (PNE).
Além das supracitadas entidades internacionais que participaram da conferência de
Jomtien, o Banco Central juntamente com a UNESCO, entre 1993 e 1996, com a Comissão
Internacional sobre Educação para o século XXI, publicam o Relatório Delors trazendo um
diagnóstico global da educação, sob o mote da Globalização. Neste relatório, os autores
evidenciam a pobreza e desigualdade social, presente inclusive nos países desenvolvidos, e
apontam para uma reconciliação e solidariedade para que se pudessem enfrentar as tensões da
mundialização e das inovações científico-tecnológicas, principalmente a respeito das novas
tecnologias de informação.
Ainda em 1995, o Banco Central adotou oficialmente as conclusões tomadas nessa
conferência, elaborando estratégias e diretrizes básicas, que viriam a direcionar as políticas
educacionais das décadas subsequentes, e publica o documento “Prioridad y estratégias para
la educación”, onde recomenda o “a reforma do financiamento e da administração da
educação, começando pela redefinição da função do governo e pela busca de novas fontes de
recursos”.23 No período compreendido de 1995 e 2003, no Brasil, ocorreu o mandado
presidencial de Fernando Henrique Cardoso, um importante sociólogo à época, cujas ações na
esfera educacional são perceptíveis até os dias de hoje.
Em 1996, é aprovada a nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
n° 9.394/96), organizando a educação básica nos níveis Fundamental e Médio e que tem “por
finalidades desenvolver o educando, assegurando-lhe a formação comum indispensável para o
exercício da cidadania, e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores”.24 Essa visão trazida pela LDB significa que a educação traria a condição básica

22
Cf. BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. História da Educação no Brasil: a escola pública no processo de
democratização da sociedade. Acta Scientiarum. Education, v. 34, n. 2, p. 163, 2012.
23
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação
ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, n. 82, p. 93-130, 2003.
24
BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n. 9.394/96, art. 22.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm.> Acesso em: 12 out. 2021.
16

para os indivíduos praticarem o exercício consciente da cidadania política. Entretanto,


historicamente, a cidadania sempre foi uma questão não muito bem resolvida, e os ecos dessa
questão ainda são ouvidos, principalmente ao observarmos os rumos políticos e ideológicos
que o governo Cardoso assumiu em seus oito anos de existência.
Segundo Perry Anderson, o governo de FHC pode ser definido como sido de um
neoliberalismo “light”, de tipo que predominava nos anos 1990. 25 Suas diretrizes políticas se
alinhavam ao Consenso de Washington, um conjunto de grandes medidas econômicas
estabelecidas por organismos internacionais e que, em 1990 viria a se tornar a política oficial
do Fundo Monetário Internacional (FMI). Portanto, para seguir essa nova política
internacional, fazia-se necessário a crença de que o mundo vivia um novo tempo. Esses atos
de giro em direção ao ideal do Mercado se caracterizaram por um processo de deterioração do
sistema público educacional, a partir de várias medidas e ações que obstruíram as reformas
educativas em prol de uma lógica mais “moderna” e que suprisse as vontades do Capital
globalizado.
Para além da análise político-ideológica, é pretendido também abordar as
significativas mudanças que ocorreram – e que precisam ocorrer – no âmbito educacional,
para além do alcance do Estado. Em outras palavras, nos debruçaremos pelos impactos que
essa nova realidade, a da globalização, causou na educação, principalmente com a entrada de
meios multimídias, que explicitam a presença cada vez mais forte de uma revolução
tecnológica em andamento. Neste sentido, ao passo dessa “modernização” econômica, vamos
falar dos impactos dessa mesma “modernização” no campo estrutural educacional.
Segundo Oliveira, Libâneo e Toschi, a televisão, vídeo, computador, e a própria
educação a distância, já são ferramentas multimídias presentes em diversos espaços escolares
e, essa urgência por uma integração eletrônica-educativa

está associada a certa ansiedade e corrida produzidas pela revolução


tecnológica e pelas demandas e finalidades diversas de políticas
educacionais em intenso processo de transformações técnico-científicas,
econômicas, sociais, culturais e políticas pelas qual passam as sociedades
contemporâneas.26

25
ANDERSON, 2002, p. 2 apud FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na
década de 1990: subordinação ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, n. 82, p.
103, 2003.
26
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 123.
17

Tendo isso em vista, fica nítido que de certa forma essas políticas educacionais
mencionadas anteriormente estavam pintadas num quadro maior que compunha o campo do
novo jogo político-econômico internacional de finais do século XX. Nessa nova sociedade, a
educação e o conhecimento são vistos como bens econômicos necessários às transformações
da produção e, portanto, “Tornam-se claras, assim, as conexões educação-conhecimento e
desenvolvimento-desempenho econômico. A educação [passa a] constitui[r] um problema
econômico na visão neoliberal, já que é o elemento central desse novo padrão de
desenvolvimento”.27
A educação, portanto, torna-se uma ferramenta de qualificação do futuro profissional.
Uma qualificação que não necessariamente anda a par do pensamento crítico, ou de uma
formação cidadã, mas uma qualificação que responde ao novo mercado de trabalho, que passa
a exigir uma maior flexibilidade funcional do trabalhador. Nessa ótica, a educação está
incumbida da “[..] capacitação da mão de obra e na requalificação os trabalhadores, para
satisfazer as exigências do sistema produtivo”.28

3.2 AS REFORMAS EDUCACIONAIS BRASILEIRAS (1995 – 2014)

O foco organizativo e político-pedagógico deste resgate necessita alargar a


compreensão do educativo para além dos muros da escola e impregnar-se da
realidade dos múltiplos movimentos sociais e culturais da classe trabalhadora e de
suas estratégias de produção da vida pelo trabalho. Este horizonte, sem dúvida,
encontra uma síntese emblemática na pedagogia do Movimento dos Sem-Terra, para
quem os processos educativos da classe trabalhadora não começam na escola nem
acabam nela. Começam e acabam na sociedade, mas a escola pública, universal,
laica, gratuita, democrática e, portanto, unitária (síntese do diverso) é um direito e
uma mediação imprescindível nas suas lutas e na produção de sua humanização e
emancipação.29

São nesses termos que Gaudêncio Frigotto e Maria Ciavatta definem a forma como
uma educação democrática e de direito universal deveria se constituir, mesmo que suas
políticas venham há anos, seguindo em uma direção oposta. É notável as diversas forças
ideológicas que disputam o espaço político da educação brasileira desde a abertura política e,
principalmente, a partir de 1988 com a Constituição. A década seguinte, de 1990, se tornou
27
Ibid., p. 124.
28
Ibid., p. 126.
29
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação
ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, n. 82, p. 122, 2003.
18

um momento-chave para que possamos analisar de uma forma mais ampla as políticas
educacionais impostas aos países periféricos da economia política e, como elas refletiram em
uma certa situação dos espaços escolares à nova realidade dessa sociedade globalizada.
Neste sentido, passemos então a olhar com mais cuidado para os planos educacionais
postos em práticas pelos governos compreendidos entre os anos de 1995 (1° mandato do
governo de Fernando Henrique Cardoso) até 2014 (também o 1° mandato de Dilma Rousseff).
Como aporte a este capítulo, usaremos principalmente da obra “Educação Escolar: políticas,
estrutura e organização” com vistas de construir um diálogo crítico entre os planos e criar
assim, as bases para nossa crítica.
Para falarmos do Plano Educacional posto em voga pelo Governo FHC, é necessário
antes, retornarmos um pouco para o contexto no qual estávamos submetidos, e tomar nota de
que este governo fora aquele que deu o pontapé inicial para a entrada – e submissão – do
Estado brasileiro na lógica internacional do capital financeiro. 30 A partir de sua posse pode-se
constatar o início do processo de concretização das políticas educacionais elencadas
anteriormente, e orientadas sob a ideologia de agentes financeiros multilaterais. Esta reforma
tomou rumo a partir de um amplo plano de ações, mas sem um investimento financeiro
concreto, e no decorrer de sua vigência, até conseguiu elevar um pouco a qualidade de ensino
das regiões mais pobres do Brasil, porém, ao custo do detrimento da qualidade do ensino,
principalmente em grandes centros.31
Segundo Toschi, Libâneo e Oliveira,

No primeiro mandato, o presidente eleito [Fernando Henrique Cardoso]


apresentou um programa denominado Acorda Brasil: Está na Hora da
Escola, no qual se destacaram cinco pontos: a) distribuição de verbas
diretamente para as escolas; b) melhoria da qualidade dos livros didáticos; c)
formação de professores por meio da educação a distância; d) reforma
curricular (estabelecimento de parâmetros curriculares nacionais – PCN – e
diretrizes curriculares nacionais — DCN); e) avaliação das escolas. 32

Tais ações se encontram no bojo dos parâmetros adotados pelas entidades


internacionais e, acima de tudo, observa-se que esta reforma, diferentemente de outras
passadas, não incidem em cima de alguns pontos específicos, mas sim, esta reforma tenta

30
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 186.
31
Ibidem.
32
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 186.
19

abranger diversos setores educacionais em um curto espaço de tempo. Esses fatores


metodológicos que agiram sob a implementação deste novo programa gerou certo descuido
por parte do governo que em muitas ocasiões ignorou declarações de pesquisas universitárias
sobre o assunto.33
Por um breve momento, a velocidade de sua implementação, aliado à favorável
cobertura midiática alcançada, construíram no imaginário brasileiro a sensação de que enfim a
educação começava a entrar nos eixos e seus indicadores de qualidade finalmente iriam
atingir as metas propostas. Porém não foi o que aconteceu. Mesmo tendo sido uma política
continuada após sua reeleição (nas eleições presidenciais de 1998), os resultados não
apresentaram a melhoria esperada. Pelo contrário, os resultados insatisfatórios obtido pelas
escolas no Sistema de Avaliação Nacional do Ensino Fundamental (Saeb), além de diminuir o
otimismo criado em torno do novo Projeto, ficaram evidentes as problemáticas que ainda
atingiam as escolas, dando destaque à falta de vagas e o – já crônico – problema dos baixos
salários dos professores.
Esta escolha, por assim dizer, de caminhos e políticas específicas dentro do campo
educacional colocadas à cabo durante todos os oito anos de mandato presidencial de Cardoso,
como dito anteriormente, se insere dentro de um quadro maior de orientação política, que
pode ser demarcada a partir do documento produzido pelos países do capitalismo central, em
conjunto com instituições financeiras internacional: o Consenso de Washington; e as
subsequentes conferências educacionais internacionais, realizadas dentro de um mesmo
contexto.34 De lá pra cá, podemos entender que esta reforma aplicada pôde ter se configurado
dentro de um sistema maior de favorecimento do âmbito privado do ensino, “[...] pois em
2000, numa de suas últimas reuniões, [a Organização Mundial do Comércio (OMC)] sinalizou
para o capital que um dos espaços mais fecundos para negócios rentáveis era o campo
educacional”.35
Após sua derrota nas eleições de 2002, no ano seguinte, Fernando Henrique Cardoso
passaria a faixa presidencial para o então presidente-eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Era a
primeira vez na história do país que um homem das camadas populares era eleito ao principal
cargo do Poder Executivo. Em sua campanha, dentre diversas outras questões, a educação era

33
Ibid., p. 187.
34
O contexto aqui citado pode ser compreendido por aquilo que Frigotto e Ciavatta denominam como
“vendaval” causado a partir da Queda do Muro de Berlim, em 1989. Para mais, Cf. FRIGOTTO, Gaudêncio;
CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação ativa e consentida à lógica do
mercado. Educação & sociedade, v. 24, p. 93-130, 2003.
35
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de 1990: subordinação
ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, p. 96, 2003.
20

tema central, cujo tratamento, segundo seu próprio plano de governo, deveria ser diferente
daquele dado no passado recente do país. Segundo obra analisada, 36 o primeiro governo Lula
propôs uma nova abordagem no que diz respeito à administração, antes municipalizada, agora
propunha um pacto entre as federações, objetivando elevar a qualidade do ensino.
A política educacional posta em prática durante sua gestão fora estabelecida sobre
três eixos principais, sendo eles “a) democratização do acesso e garantia de permanência; b)
qualidade social da educação; c) instauração do regime de colaboração e da democratização
da gestão”.37 Tais diretrizes caminhavam na direção de organizar a educação solucionando
problemas recorrentes de períodos anteriores, dessa forma, podemos entende-las como sendo
uma ação conjunta visando um maior acesso e possibilidade de permanência dos jovens às
educação; adequar a qualidade do ensino para algo além dos muros da escola, trazendo os
interesses da comunidade escolar para as discussões em sala; e, principalmente, a busca por
reverter o processo de municipalização ostensivamente implementado pelo governo anterior.
Com o fim de seu primeiro mandato em 2006, observou-se que algumas de suas
principais metas foram alcançadas enquanto outras estavam em vias de se concretizar. Dentre
elas, podemos destacar como a de maior impacto foi a ampliação do Fundo de
Desenvolvimento e Manutenção do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério
(Fundef), transformando-o no Fundo de Desenvolvimento e Manutenção da Educação Básica
e de Valorização do Magistério (Fundeb), cuja abrangência atingiria todos as etapas do ensino
básico.38
No ano de 2007 tem início o segundo mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da
Silva e, como esperado, ele dá continuidade às políticas aplicadas durante a gestão anterior. É
neste ano, também, que Fernando Haddad, à época Ministro da Educação, apresenta o Plano
de Desenvolvimento da Educação (PDE), indicando que este seria um plano de Estado para a
educação pública. Organizado em quatro eixos de ação,

O PDE reúne um conjunto de iniciativas articuladas sob a abordagem do


sistema educativo nacional, cuja prioridade é a melhoria da qualidade da
educação básica, passando por investimentos na educação profissional e na

36
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 188.
37
Ibidem, p. 189.
38
BITTAR, Marisa; BITTAR, Mariluce. História da Educação no Brasil: a escola pública no processo de
democratização da sociedade. Acta Scientiarum. Education, v. 34, n. 2, p. 166, 2012.
21

educação superior, pois se entende que os diferentes níveis de ensino estão


ligados, direta ou indiretamente.39

Dentre seus eixos norteadores, destaquemos os dois primeiros, que incidem


diretamente sobre o Ensino básico. São eles:

1. Educação básica — tendo como objetivo prioritário a melhoria da


qualidade da educação básica pública medida pelo índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), enfrentando os problemas de
rendimento, frequência e permanência do aluno na escola [...]. 2.
Alfabetização e educação continuada — tendo como objetivo reduzir a taxa
de analfabetismo e o número absoluto de analfabetos, com foco nos jovens e
adultos de 15 anos ou mais [...].40

Apesar de que à primeira vista este plano se mostrasse ambicioso e possível de se


realizar, posteriormente ao seu lançamento estudiosos da área educacional criticaram sua
estruturação, alegando que diversas ações atreladas a ele não eram claras quanto aos
mecanismos de controle – o que poderia gerar um descontrole – impossibilitando uma
aferição correta dos resultados. Além disso, Saviani também criticara o PDE de 2007 ao
compará-lo ao PNE de 2001, afirmando que aquele “[...] não constitui um plano, e sim um
conjunto de ações que, embora presentes no PNE, não se articulam organicamente com ele”.41
Por fim, passemos agora a análise do Plano Educacional levado à cabo no mandado
presidencial de Dilma Rousseff, que teve sua campanha pautada na continuidade das políticas
exitosas dos oito anos anteriores, com foco àquelas do âmbito educacional, e que veio a ser a
primeira mulher eleita presidente do Brasil. Segundo a própria, em declaração em entrevistas,
Dilma teria intenção em dar continuidade ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PNE),
dando foco em ações mais pontuais, como a ampliação de creches e pré-escolas e a elevação
dos recursos para a educação.42
Dentro de suas ações concretizadas, devemos dar destaque à questão do investimento
financeiro destinado à pasta da Educação. Durante sua campanha, em seu programa oficial,
Dilma Rousseff afirmava que a sociedade do momento se constituía, por base, como a
39
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 192.
40
BRASIL. MP. 2007, p. 17-18 apud DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza
Seabra. Educação escolar: políticas, estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 193.
41
SAVIANI, 2009, apud DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza
Seabra. Educação escolar: políticas, estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 194.
42
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 204.
22

sociedade do conhecimento e, para alcançar esse conhecimento, tendo possibilidade de


competir de igual para com outras sociedades, garantir a erradicação do analfabetismo e “[...]
expandir o orçamento da educação, ciência, e tecnologia e melhorar a eficiência do gasto”
eram fundamentais para atingir o objetivo. 43 É sabido por muitos que o aumento de recursos
destinado à educação é peça-chave, indispensável, para que se possa iniciar o enfrentamento
às problemáticas presentes nesse setor, e neste sentido, o governo agiu, apresentando em 2010
o Plano Nacional de Educação (PNE – 2011-2020), cuja

[...] proposta é composta de 12 artigos e um anexo com 20 metas para a


educação. Cada meta traz um conjunto de estratégias para sua consecução. O
foco, segundo o ministro, é a valorização do magistério e a qualidade da
educação. No projeto de lei destaca-se1 a proposição de realização de pelo
menos duas Conferências Nacionais de Educação até o fim da década e,
ainda, a criação do Fórum Nacional de Educação, que articulará e
coordenará as conferências.44

Ao tratarmos de números, podemos reparar em um expressivo aumento do valor


investido no setor educacional por parte do Estado. Odorico Ferreira Cardoso Neto salienta
que até 2010, o orçamento para a educação aumentara no governo anterior e atingira a marca
de 54,2 bilhões de reais, mas que olhando até 2016 – ano em que a presidente Dilma Rousseff
sofre um golpe político – o valor atingira cerca de 100 bilhões de reais. 45 Outro setor que
ganhou notória atenção no primeiro mandato da Presidente Dilma Rousseff foi o do Ensino
Superior.
Mesmo este não sendo o foco deste trabalho, comentaremos brevemente sobre as
ações nesse sentido, pois elas compuseram um importante mecanismo de alcance para as
camadas menos favorecidas, no Brasil, ao Ensino Superior. Esse processo de aumento do
investimento nesta modalidade de ensino, tal qual conceituação geral da política de seu
governo, dá continuidade àquelas estabelecidas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva
(2003 – 2010). Segundo Maria Alice de Freitas Marques, “Entre os pontos principais dessas

43
PT, 2010, apud DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação
escolar: políticas, estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 205.
44
DE OLIVEIRA, João Ferreira; LIBÂNEO, José Carlos; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas,
estrutura e organização. Cortez Editora, 2017, p. 208.
45
NETO, Odorico Ferreira Cardoso; DE NEZ, Egeslaine. Governos Lula, Dilma e Bolsonaro: as políticas
públicas educacionais seus avanços, reveses e perspectivas. Interação, v. 21, n. 3, p. 128, 2021.
23

políticas educacionais nos governos Lula e Dilma são possíveis destacar: a expansão do
ensino superior seja ele presencial ou à distância, privado, público e do ensino profissional”.46
Apesar desse crescimento da oferta do número de vagas estar estritamente
relacionado com o crescimento do setor privado na etapa do Ensino Superior, é notável que
durante os governos do PT, principalmente nos anos governados por Dilma Roussef, as
universidades federais

[tiveram] a maior expansão de sua história. [Antes] era composta, em 2002,


por 45 universidades, com 148 campi, e, atingiu em 2015, 65 universidades
com 327 campi. [Ao todo] foram criadas nos mandatos de Lula e Dilma um
total de 18 universidades, 173 campi e centenas de unidades dos Institutos
Federais (IFES).47

Para além das novas unidades das IES existentes, o governo Dilma também investiu
uma grande quantidade de verbas com a criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino
Técnico e Emprego (PRONATEC), em 2011. Este, representou um dos maiores programas de
educação técnica e profissionalizante da história do país, ofertando cerca de 9,4 milhões de
vagas, com o intuito de estimular a inclusão produtiva. 48 Apesar de ser alvo de diversas
críticas por estudiosos do ramo educacional, o programa de ensino profissionalizante serviu
como promoção da inclusão nessa modalidade de ensino; e somando isso a iniciativas como a
lei de Cotas,49 fica nítido que as ações foram pensadas em prol de assegurar políticas de
acesso e fortalecer a democratização do ensino.

46
DE FREITAS MARQUES, Maria Alice. Políticas educacionais nos governos Lula e Dilma: impactos na
expansão do ensino superior e profissional. ID on line REVISTA DE PSICOLOGIA, v. 12, n. 41, p. 662-676,
2018.
47
NETO, Odorico Ferreira Cardoso; DE NEZ, Egeslaine. Governos Lula, Dilma e Bolsonaro: as políticas
públicas educacionais seus avanços, reveses e perspectivas. Interação, v. 21, n. 3, p. 135, 2021.
48
MERCADANTE e ZERO, 2018, apud NETO, Odorico Ferreira Cardoso; DE NEZ, Egeslaine. Governos Lula,
Dilma e Bolsonaro: as políticas públicas educacionais seus avanços, reveses e perspectivas. Interação, v. 21, n.
3, p. 135, 2021.
49
BRASIL. LEI Nº 12.711, de 29 de agosto 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas
instituições federais de ensino técnico de nível médio e dá outras providências. Brasília. 2012. Disponível em <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm>. Acesso em 14 out. 2021.
24

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao iniciarmos o presente trabalho, levando em conta sua ambição e perspectivas, era


sabido que para uma análise coerente e lógica, dentro da proposta planejada, fosse levada a
cabo, infelizmente algumas informações ou olhares para os tópicos aqui pretendidos
acabassem por sumariamente serem deixados de lado em prol de outras perspectivas aqui
empregadas.
O setor educacional brasileiro como, antes comentado, desde sua fase embrionária, no
período ainda Colonial, até o presente momento, sempre fora um campo muito fértil para as
disputas entre as diversas correntes ideológicas que coabitavam o imaginário nacional. Muito
mesmo antes de se tornar uma nação independente, a educação em solo brasileiro levou muito
tempo para ganhar características, que hoje, vemos como fundamentais – nao somente no que
diz respeito à “o que é educação”, mas também em relação à própria ideia de projeto de
Nação que se queria construir neste lado do Atlântico.
Ao optarmos por observar os quadros que compõem as políticas públicas voltadas para
a Educação Básica, não somente a legislação mas a própria construção de uma estrutura
nacional de educação, padronizada e “universal”, somos obrigados a olhar para trás e
compreender a consolidação desta a partir da década de 1930, com a ascenção de Getúlio
Vargas ao poder. Entre os anos de 1930 e 1960 podemos observar mudanças estruturais que
agiram sobre o âmbito da educação nacional, objetivando a construção de um sistema
nacional de educação pública.
Perpasso a esta situação, faz-se importante dizer também, que neste momento, o Brasil,
através das políticas de incentivo à industrialização nacional promovidas pelo então chefe de
Estado, passava por um processo de extrema aceleração do modelo capitalista, em uma
transição de um sistema agrário-exportador para o industrial-urbano. Evidentemente, neste
momento já percebe-se fortes influências e disputas entre aqueles que queriam a
industrialização do país, mas mantendo sua soberania; e àqueles que, sob a dominância
econômica dos EUA, promoviam um desenvolvimento nacional, mas subordinado a este.
Neste cenário – que podemos alongá-lo tranquilamente até 1964 – a educação foi um
campo cercado de manifestações ideológicas, das mais variadas correntes, como a Igreja
Católica, junto dos setores conservadores, que pretendiam manter a hegemonia histórica
daquela sobre a educação; ou como os setores mais liberais e progressistas, que se
aglutinaram em torno dos ideias propostos pelo movimento da Escola Nova. Diversas
reformas eduacionais foram feitas ao longo desses mais de trinta anos, entretanto, nenhuma,
25

de fato, conseguiu atingir o cerne do histórico problema do analfabetismo no Brasil, tampouco


assegurar um mínimo de quatro anos de escolaridade para as crianças.
É durante os anos de governo de Vargas, também, que conseguimos notar o início de
uma exclusão social na educação baseada na classe, que definiria o futuro da criança,
dividindo-as entre o ensino profissionalizante e o ensino secundário. Essa diferenciação, vale
ressaltar, fora constituida a partir da Reforma Francisco Campos, que, como dito
anteriormente, apesar de em lei, ter criado um Sistema Nacional de Educação, e organizado o
ensino secundário em dois ciclos (fundamental de cinco anos e complementar de dois), não
evitou que este se tornasse um núcleo elitizado, principalmente dentro deste segundo ciclo.
Como consequênica, a atenção voltada para o ensino secundário, destinado os filhos e filhas
das elites econômicas, custou a marginalização de outros setores, entre eles, do ensino
primário.
Mesmo depois de seu golpe de Estado, que ficaria conhecido como o Estado Novo
(1937-1945), e com a instauração de uma nova Constituição (1937), a situação da educação
no Brasil continuaria a piorar, dessa vez em num sentido institucional, em que o Estado
passaria a suprir as necessidades educacionais, nao mais como protagonista. As Leis
Orgânicas de Ensino, conhecidas como “Reforma Capanema”, apesar de apresentarem
significativas mudanças no campo estrutural da legislão educacional, na prática, apenas
intensificou o processo de elitização do ensino secundário, principalmente após estabelecer o
que seria conhecido como ensino técnico-profissional – abrangendo áreas agrárias, industrial
e comercial.
Com o fim do período ditatorial, e consequentemente a promulgação de uma nova
Constituição (1946), novamente a educação era reafirmada como um direito à todos, com
caráter gratuito e obrigatório para o ensino primário. Mesmo apresentando um teor mais
“atencioso” para o nível primário de ensino, de nada mudou, de fato, a questão do alcance
universal das crianças a esse primeiro nível de ensino. É observável, então, que
independentemente do que se colocava no papel, na palavra da Lei, o campo educacional
nunca conseguiu assegurar um acesso democrático de todos os brasileiros.
Durante os anos da Ditadura Civil-Militar (1964 – 1985), além de outra Constituição
(1967) ter sido promulgada, novas reformas foram levadas à cabo, principalmente no sentido
de expandir a capilaridade do ensino público – mas isso pouco teve a ver com a busca pelo
acesso universal à educação. Esse aumento no alcance da escola pública, de caráter
quantitativo, teve muito pouco do fator qualitativo o acompanhando. Pelo contrário, essa
expansão estava relacionada com o aprofundamento da nova realidade que o Brasil estava
26

entrando. Sua sociedade, agora urbano-industrial, ancorada no pensamento tecnocrático fez do


ensino público um entrave: era necessário uma escolaridade “mínima” para que houvessem
novos trabalhadores que conseguissem acompanhar o ritmo de industrialização que o país
passava e, para isso, era necessário um ensino básico e padronizado, entretanto, essa
padronização agiu em detrimento da qualidade do ensino, pois, este período fora marcado,
entre outras coisas, pelo aprofundamento das desigualdades do país.
O elemento tecnocrata, fator característico do pensamento militar brasileiro, é de
extrema importância para que possamos olhar o hoje, a partir dos efeitos do ontem, numa
compreensão de que os ecos da Ditadura ainda são escutados, principalmente no campo
educacional do Governo Bolsonaro.
Com o fim deste período e, início da transição política, podemos perceber que os ecos
das ideologias que permeavam as políticas públicas do período ditatorial ainda eram bem
presentes. Com a aproximação do fim do século XX, o mundo todo passara por uma revisão
dentro dos quadros político-economicos, e a América Latina estava no centro das análises
políticas e educacionais fomentadas por entidades financeiras do mundo todo. O Brasil em
específico, se encaixa nesse panorama, principalmente a partir da eleição de Fernando
Henrique Cardoso (1995 – 1998 e 1999 – 2022) que sob uma forte influência do
neoliberalismo, incia um novo processo de mudança educacional.
Suas ações, que iam de encontro com os pressupostos elencados por Congressos
internacionais, tais como a “Conferência Mundial sobre Educação para Todos”, em Jomtien,
na Tailândia, entre outros, puderam ser observadas como um momento de agravação de
antigas dualidades, sempre presentes na educação brasileira: os aspectos qualitativos e
quantitativos. Diversos fatores funcionaram a favor da gestão presidencial do psdebista, mas
ao observamos a longo prazo, os resultados, como comentado, nao foram, nem de perto,
satisfatórios. Ivan Valente,50 em sua análise ao projeto educacional do governo afirmara que
suas decisões foram orientadas por um caráter “centralista” na tomada das decisões, e que ao
longo dos oito anos de mandato FHC, cada vez mais, a educação deixava de dar espaço para
os pedagogos em favor de tecnocratas, economistas e engenheiros – uma clara orientação a
favor do Mercado Financeiro e ao neoliberalismo vigente.
Com o advento dos governos do Partido dos Trabalhadores, é notável, sim, que diversas
foram as mudanças que aconteceram dentro deste nosso campo de análise, mas como fora
discutido anteriormente, elas nao foram suficientes para garantir um acesso democrático à

50
VALENTE, 2001, apud FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Educação básica no Brasil na década de
1990: subordinação ativa e consentida à lógica do mercado. Educação & sociedade, v. 24, p. 93-130, 2003.
27

educação básica, muito menos, para assegurar um nível padronizado, tanto no que diz respeito
à estrutura quanto à qualidade do ensino nas mais diversas (e diferentes) regiões do Brasil.
É evidente que nesses quase quatro mandatos presidenciáveis do Partido dos
Trabalhadores a educação brasileira atravessou um momento de crescimento qualitativo,
principalmente, por que nesses governos a educação passa a ser uma parte central dentro do
plano de desenvolvimento nacional. Neste momento também, o Brasil volta-se para um viés
bem mais social em comparação aos momentos anteriores do governo FHC. O crescimento
econômico, o aumento do PIB e diversos outros fatores foram decisivos para que nestes treze
anos aqui analisados, o investimento bruto neste setor crescesse vigorosamente.
Entretanto, como dito, os ecos das estruturas políticas ditatoriais, mesmo que
combatidos veementemente por estes dois governos, ainda marcavam forte presença. Um bom
exemplo que podemos explicitar, é o aumento do número de escolas e universidades
particulares em território nacional, concomitante ao aumento dos cursos técnicos e
profissionalizantes. A estrutura tecnocrática do pensamento dominante desde fins do XX
ainda está fortemente presente; e apesar do número de oportunidades para as classes mais
vulneráveis que este tipo de ensino possa promover, ainda é questionável os motivos e razões
da forte divisão de classe presente entre aqueles que acessaram o ensino superior público
advindo do sistema público nacional, e aqueles que ascenderam a partir do sistema privado.
A partir desse balanço histórico e documental levantados, nao pretendíamos por criar
um novo setor de discussão dentro do âmbito educacional no país. Muito pelo contrário, este
setor já é muito bem explorado e debatido por inúmeros intelectuais de peso que atuam em
prol de uma educação mais democrática. Mas ao olharmos para essas permanências
estruturais, herdadas de um passado nao tao distante, e excessivamente elitista, o acesso de
Jair Bolsonaro à presidência em 2019 coloca em xeque, que o país consiga manter o mínimo
dessas políticas públicas, de caráter social, nos anos subsequentes.
A Reforma do Ensino Médio, aprovada para o ano letivo de 2022, por mais que ainda
nao tenha começado, já pode nos apresentar fortes indícios desse retrocesso que tentamos
lançar luz neste trabalho. Não pretendemos tomar conclusões precipitadas, mas dado o nosso
quadro social, e a crise econômica que vem assolando o Brasil, este novo modelo de ensino
médio já se propõe a funcionar com um alto nível de desigualdade. De acordo com o site G1,
“[as] escolas públicas e privadas deverão implementar mudanças no 1º ano dessa etapa do
ensino. A começar pela carga horária, que sobe de 4 para 5 horas diárias. Mas essa revolução
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será sentida de maneira desigual a depender de onde o estudante vive.” 51 Essa desigualdade,
antes uma causa intencional que um mero descuido, pode sim estar fazendo parte de um
objetivo econômico maior que em vez de diminuir, salientará a desigualdade entre as classes
sociais, pois essa mudança, antes de representar uma valorização e melhor aproveito do tempo
de sala de aula, servirá como um filtro, que num futuro próximo poderemos observar seu
reflexo dentro da composição, não apenas nas universidades do país, mas como também nas
próprias característica da composição da mão-de-obra nacional.
Como dito, não pretendíamos por inovar esse estudo. Nosso objetivo aqui foi o de
amliar o debate para um caráter histórico, na tentativa de alertar um possível retrocesso social
na composição das nossas políticas educacionais a partir da discrepância que observamos nos
quadros que compuseram o público alvo dos diversos níveis educacionais e reformas
subsequentes aos governos. O atual governo brasileiro, junto desta nova reforma,
aparentemente não se mostra preocupado com o abismo que a educação pode ser responsável
por criar – ou diminuir –, muito pelo contrário, ao observamos as hipóteses levantadas no
decorrer deste trabalho, observa-se um certo tipo de projeto. Um projeto aliado às elites, que
em algum momento dessa nossa história, se mostrou muito incomodada que o(a) filho(a) da
empregada doméstica viria a ocupar a mesma sala que o(a) filho(a) da patroa.

51
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