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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

UFRRJ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

IH986 - FILOSOFIA POLÍTICA II – 2023-1

Prof. Walter Valdevino Oliveira Silva


waltervaldevino@gmail.com
02/06/23

“Prefácio do organizador”, “Introdução” e Conferências I e II (sobre Hobbes) de Rawls,


John. Conferências sobre a história da filosofia política, pp. 25-59.
Rawls, John. Conferências sobre a história da filosofia política
“Prefácio do organizador” [Samuel Freeman]
→ Cursos de Filosofia 171 - Filosofia Política Moderna, ministrado por John Rawls
em Harvard entre 1960 a 1995

→ Situar a tradição contratualista historicamente e em relação à própria obra de Rawls

→ Hobbes → "autor a ser refutado" (p. XII)


"Ao falar desses autores, sempre tentei fazer duas coisas em especial. Uma delas era
expor os problemas filosóficos desses autores da maneira como eles próprios os viam,
com base na compreensão que tinham da filosofia moral e política de sua época. Desse
modo, tentava distinguir quais eram seus principais problemas na sua própria opinião.
Muitas vezes citava Collingwood, que em sua autobiografia afirmava que a história
da filosofia política não é a história de uma série de respostas para a mesma pergunta,
mas de uma série de respostas a diferentes perguntas: em suas próprias palavras, a
filosofia 'é a história de um problema em mutação mais ou menos constante e cuja
solução o acompanhou também em mutação'. Essa observação não é exatamente
correta, mas nos diz que devemos atentar para o ponto de vista de um autor sobre o
mundo político em que ele viveu para podermos enxergar o modo como e por que a
filosofia política se desenvolve no decorrer do tempo. Em minha opinião, cada um
desses autores contribui para o desenvolvimento de doutrinas favoráveis ao
pensamento democrático, e aí se inclui Marx, que sempre discuti no curso de filosofia
política moderna." (p. XIV)
"... sempre parti do pressuposto de que os autores que estávamos estudando eram
mais espertos que eu. Se não fossem, por que então estaria perdendo meu tempo e o
tempo de meus alunos estudando-os? Se encontrasse um erro em seus argumentos,
pressupunha que eles [os filósofos] também viram esse erro e devem ter lidado com
ele em algum lugar - mas onde? Assim, buscava a saída que os próprios filósofos
haviam encontrado, e não eu mesmo. Às vezes, essa saída fora histórica: no tempo
em que viveram esses pensadores, a pergunta não precisava ser respondida, ou não
havia surgido ou sido discutida de modo produtivo. Ou então havia uma parte do texto
que eu havia omitido ou não havia lido." (p. XIV)
Rawls, John. Conferências sobre a história da filosofia política
“Introdução”
4 perguntas sobre a filosofia política:

1) Qual é o público da filosofia política?

Todos os cidadãos em geral. Não é saber específico.

2) Qual a pretensão de autoridade da filosofia política?

Nenhuma. Trata somente da tradição da filosofia política.

3) Em que momento a filosofia política ingressa na vida política?

Não é concepção platônica, mas democrática (parte da cultura política de fundo).

4) Quais são as concepções de pessoa, sociedade, liberdade, igualdade e justiça


dos cidadãos?

Em regime democrático, cidadãos têm ideias firmes sobre esses valores políticos.
1ª) Função prática → buscar ordem em relação a conflitos políticos irreconciliáveis

Ex.: Guerras religiosas (séculos XVI e XVII), depois da Reforma Protestante

É possível algum acordo de base para garantir a cooperação?

2ª) Função de orientação → modelo para se pensar nossas instituições políticas e


sociais

3ª) Função de reconciliação → acalmar raiva e frustração social, mostrando


racionalidade das instituições

Sociedade não é uma comunidade devido ao fato do pluralismo

4ª) Função realística-utópica: teste do que é praticável


→ Origens do liberalismo:

→ Reforma e guerras religiosas dos séculos XVI e XVII → forçou aceitação


do princípio da tolerância e da liberdade de consciência

→ Processo contínuo; "todas as democracias existentes que se dizem liberais são


altamente imperfeitas e estão muito aquém daquilo que a justiça democrática parece
exigir". (p. 13)

→ 5 reformas necessárias nos EUA:

1) Reforma do sistema de financiamento eleitoral


2) Igualdade justa de oportunidades de educação
3) Assistência de saúde universal
4) Trabalho garantido e socialmente útil
5) Justiça igual para as mulheres e igualdade entre os sexos (p. 13)
→ Modernidade → instauração das liberdades básicas

"... as liberdades políticas para todos - isto é, o direito de votar e se candidatar a cargo
público e o direito à livre expressão política de qualquer espécie. Também fazem parte
delas as liberdades civis - isto é, o direito à livre expressão não política, o direito à
livre associação e, claro, a liberdade de consciência. Acrescente a essas liberdades a
igualdade de oportunidade, a liberdade de ir e vir, o direito ao gozo da própria mente e
corpo (integridade da pessoa), o direito à propriedade pessoal e, finalmente, as
liberdades cobertas pelo estado de direito e o direito a um julgamento justo.”

→ Liberdades não podem ser sacrificadas em troca de bem-estar de um maior


número
→ Contrato social → permite "consentimento por unanimidade" entre pessoas
razoáveis e racionais

→ "O contrato original (...) é uma mera ideia da razão" (p. 15; Immanuel Kant)

→ Contrato hipotético

→ Quantos mais os contratantes hipotéticos souberem, pior para a decisão contratual


Rawls, John. Conferências sobre a história da filosofia política
Hobbes I
O moralismo secular hobbesiano e o papel do contrato social em Hobbes
O moralismo secular hobbesiano e o papel do contrato social em Hobbes

→ Hobbes não foi o criador da doutrina do contrato social (já presente nos gregos e
escolásticos tardios como Suarez, de Vittoria, Molina etc.)

→ Leviatã → "maior obra do pensamento político em idioma inglês" (p. 25)

→ Estilo, linguagem, abrangência, argúcia, vivacidade, estrutura, universalidade (p.


25)

→ Leviatã apresenta uma "visão terrível sobre a sociedade que bem poderia
ser verdadeira e que é uma possibilidade bastante aterradora" (p. 25)

→ Início da filosofia moral e política da Modernidade

→ Escrito em meio à Guerra Civil Inglesa (1642-48) e à restauração da monarquia


(1600)
→ Hobbes visto pelos ortodoxos como ateu, sem fé no cristianismo (p. 26):
O moralismo secular hobbesiano e o papel do contrato social em Hobbes

→ "Hobbista" → acusação grave na época

→ Críticas de filósofos morais cristãos (Cudworth, Clarke e Butler):

→ egoísmo
→ relativismo e subjetivismo
→ poder superior como legitimador da autoridade

→ Críticas do utilitarismo (Hume, Bentham, Hutcheson, Adam Smith):

→ egoísmo
→ subjetivismo e relativismo (utilidade seria objetiva)
→ O moralismo secular hobbesiano

→ Leviatã → sistema político e moral secular

→ Deus não é a base do sistema e, se for retirado, não faz diferença

→ "acredito que todas as ideias usadas por Hobbes - por exemplo, as ideias de direito
natural, lei natural, estado de natureza e assim por diante - podem ser definidas e
explicadas independentemente de qualquer doutrina teológica" (p. 29)

→ Lei da natureza → "preceito ou regras geral encontrado pela razão, que proíbe ao
homem fazer tudo o que possa destruir sua vida ou privá-lo dos meios necessários
para preservá-la" (p. 29, Leviatã, 1651, p. 64)

→ Objetivo → paz, harmonia, conservação e defesa da sociedade humana


→ Justiça e capacidade de pactuar → virtude natural

→ Materialismo de Hobbes não afeta, segundo Rawls, sua concepção da natureza humana
e das paixões

→ Estado de natureza e contrato social → não existiram realmente

→ "'conhecimento filosófico' sobre Leviatã, para que possamos compreender melhor nossas
obrigações políticas e as razões pelas quais devemos apoiar um Soberano efetivo" (p. 33)

→ Contrato social → "modo de pensar sobre como o estado de natureza poderia ser
transformado em sociedade civil" (p. 34)

→ Estado de natureza → estado hipotético que existiria caso não houvesse autoridade

→ Estado de natureza → retorno a ele é uma possibilidade sempre presente


→ Todos os seres racionais entenderão a necessidade do Soberano para a manutenção
da sociedade

→ Contrato social → "pacto que visa assegurar e efetivamente assegura um governo


estável já existente" (p. 36)

→ Soberano efetivo e poderoso → única solução contra a guerra civil (contra o


interesse fundamental de cada um)

→ Lei Fundamental da Natureza → "buscar a paz e segui-la" (p. 37, Leviatã, p. 64)
Rawls, John. Conferências sobre a história da filosofia política
Hobbes II
A natureza humana e o estado de natureza
→ Estado de natureza (sem Soberano) → estado de guerra

→ Não precisa ser guerra efetiva, mas a mera disposição a fazer guerra

→ Prova? Observação do mundo real, sob um Soberano:

→ Nos armamos quando vamos viajar


→ Trancamos a porta quando vamos dormir
→ Trancamos cofres dentro de nossa própria casa
→ Não deixamos os celulares desbloqueados

→ Paixões e traços humanos → determinados e imutáveis

→ Instituições é que irão moldar/controlar paixões humanas, alterando as condições


objetivas
→ Aspectos da natureza humana ("a Tese de Hobbes"):

→ Igualdade humana em termos de dons naturais (força, inteligência)

Desejo de poder → estado de guerra

→ Competição devido à escassez de recursos

Sob o Soberano, necessidades são menos prementes

→ Seres humanos são egocêntricos (não egoístas) →


preservação/autopreservação e segurança própria e da família)

Seres humanos são capazes de benevolência e afeição (incapazes de fundamentar


a sociedade
→ Difidência [diffidere] → estado de desconfiança mútua

→ Todos no estado de natureza se comportam racionalmente

→ Ex.: ataque preventivo é totalmente racional

→ Não é preciso que todos sejam movidos por desejo de dominar; basta que
alguns sejam para haver estado de guerra

→ estado de guerra → amor ao domínio e à vaidade somente como possibilidade


Rawls, John. Conferências sobre a história da filosofia política
Hobbes II (p. 56)

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