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LÍNGUA BRASILEIRA

DE SINAIS
Noções de Libras
Gabriel Pigozzo Tanus Cherp Martins

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

> Reconhecer a Libras a partir das competências linguísticas, discursivas e


sociolinguísticas. 
> Identificar os conceitos de recepção, produção, tradução e interpretação
em Libras. 
> Explicar a importância do ensino da Libras na escola.

Introdução
A língua brasileira de sinais (Libras) vem ganhando notoriedade nas discussões
sobre educação inclusiva, principalmente sobre educação de surdos, desde
seu reconhecimento em 2002 com a Lei n° 10.436, de 24 de abril (BRASIL, 2002).
É verdade que entre o reconhecimento legal e o uso e/ou ensino nas escolas
comuns há um enorme abismo que se faz necessário transpor. Há uma disputa
por poderes linguísticos nestes espaços e até o presente momento a Libras está
em desvantagem. Faz-se mister que pesquisadores, docentes e a comunidade
surda se organizem para igualar essas forças dentro das instituições educacionais.
Neste capítulo, você vai conhecer as competências linguísticas, discursivas e
sociolinguísticas da Libras e seus recursos. Vai estudar conceitos de tradução e
interpretação da Libras e as diferenças entre essas duas atividades. Por fim, vai
conferir a importância do ensino da Libras nas escolas inclusivas.
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Competências linguísticas, discursivas


e sociolinguísticas da Libras
A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é reconhecida como meio legal de
comunicação e expressão da comunidade surda do Brasil (BRASIL, 2002). A
Libras está envolvida em um crescente processo de ensino e pesquisa. É por
meio dela que os surdos compreendem, interagem e agem sobre o mundo em
que vivem, a fim de transformá-lo e torná-lo mais acessível, além de expressar
sua cultura e seu modo de viver.
A Libras é uma língua de modalidade visual-espacial: o corpo, as mãos e
as expressões faciais são primordiais para a comunicação. É como as pessoas
surdas se sentem seguras e confortáveis para se comunicar e se informar.
A origem da Libras remonta à segunda metade do século XIX, quando
se criou o Imperial Instituto de Surdos Mudos, atual Instituto Nacional de
Educação de Surdos (INES), na cidade do Rio de Janeiro. Nesse período, os
surdos de todo o país iam estudar nesse instituto e, a partir de então, houve
uma sistematização das diversas linguagens usadas pelos estudantes (PEREIRA
et al., 2011). A partir da década de 1960, Willian Stokoe, um importante linguista
norte-americano, se debruçou sobre a língua de sinais americana (ASL),
identificando que nela há todas as características de uma língua natural
(QUADROS; KARNOPP, 2007).

Assim como as línguas orais, as línguas de sinais são diferentes em


cada país. Por exemplo, em Portugal há a língua gestual portuguesa
(LGP); na Argentina, a Lengua de Señas Argentina; no Chile, a lengua de señas
chilena; nos Estados Unidos, a American sign language; entre outras.

Esse foi o início de um longo processo de estudo e pesquisa sobre línguas


de sinais em todo o mundo. Com essas pesquisas iniciais, identificaram-se
algumas características das línguas de sinais, classificadas como aspectos
fonológicos e morfológicos. Isso significa que há unidades mínimas sem e
com significado. No nível fonológico, por exemplo, foram estabelecidos os
cinco parâmetros a seguir (QUADROS; KARNOPP, 2007).

„ Configuração de mão (CM): forma que as mãos tomam para a realização


do sinal.
„ Ponto de articulação (PA) ou locação (L): locais em que se realiza a
sinalização.
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„ Movimento (M): movimento que as mãos e o corpo fazem no momento


da sinalização.
„ Orientação da palma da mão (O): mostra o direcionamento das palmas
das mãos quando se sinaliza.
„ Expressões não manuais (ENM): expressões faciais e corporais realizadas
no processo comunicativo.

Esses sinais podem ser feitos ancorados no corpo ou à frente do sinalizante


e são criados com a combinação desses parâmetros. Confira na Figura 1 um
exemplo de como os parâmetros se relacionam na elaboração de um sinal
em Libras.

Figura 1. Três dos parâmetros da Libras: locação (L), movimento (M) e configuração de mão (CM).
Fonte: Quadros e Karnopp (2007, p. 51).

Aquisição da Libras
A cultura surda é definida como a forma de “o sujeito surdo entender o mundo
e modificá-lo a fim de torná-lo acessível e habitável ajustando-o com suas
percepções visuais, que contribuem para a definição das identidades surdas”
(STROBEL, 2009, p. 27). Prover o acesso à língua desde a mais tenra idade é
essencial para garantir um desenvolvimento pleno e integral do sujeito, além
de proporcionar sua percepção e interação com o mundo que o cerca.
4 Noções de Libras

As crianças ouvintes, logo ao nascerem, entram em contato com a língua


majoritária — no nosso caso, a língua portuguesa —, na modalidade oral, por
meio dos mais diversos canais. A maioria das crianças surdas, por sua vez, não
tem esse contato linguístico desde que nascem. Por isso, é necessário usar a
Libras desde o nascimento, para que essa criança cresça imersa em sua cultura
e crie sua identidade. Ao crescerem e se desenvolverem tomando consciência
de sua condição, alguns surdos passam a frequentar as associações e a se
relacionar com seus pares, adquirindo ou desenvolvendo os demais artefatos
culturais, além da língua e da identidade.
Há três espaços possíveis para aquisição da Libras: o lar, a escola e a
clínica. Cada um deles tem sua importância, dependendo da história de
vida da criança surda. No lar, em geral o primeiro local de contato com a
língua, os bebês têm contato com os pais, surdos ou não, mas que sinalizam.
Algum outro familiar (tio, tia, avó ou avô, etc.) é fundamental nesse espaço.
A escola pode atender às especificidades linguísticas desses indivíduos,
com a presença de adultos surdos ou ouvintes, mas fluentes em Libras, e/
ou a presença de outras crianças surdas para que a língua seja usada nas
relações. Já a clínica é o local onde, de preferência com uma abordagem
oralista, a criança tem contato com a linguagem antes de ingressar à escola
comum (QUADROS; CRUZ, 2011).
O período em que a surdez foi detectada também influencia na aquisição
da Libras. Alguns diagnósticos costumam ser concluídos quando as
crianças estão no terceiro ou quarto ano de vida. Isso, comparado ao
caso das crianças ouvintes, faz as crianças surdas apresentarem atrasos
no desenvolvimento da linguagem, comprometendo seu desenvolvimento
integral e suas relações. O sucesso ou o fracasso desse processo depende,
em grande parte, do acesso às informações que os pais ou responsáveis têm
sobre a língua de sinais e sobre a surdez. Essas informações despertam nos
pais ou responsáveis a consciência sobre a necessidade de a criança surda
adquirir uma língua de modalidade visual-gestual, além de estabelecer
comunicação com os filhos, viabilizando um ambiente linguístico adequado
(QUADROS; CRUZ, 2011).
Confira a seguir os quatro estágios de aquisição de linguagem das crianças
surdas (QUADROS; CRUZ, 2011).

„ Primeiro estágio (pré-linguístico): as crianças surdas começam a


balbuciar, o que também acontece com as crianças ouvintes. O balbucio
apresenta partes do sistema fonológico das línguas de sinais.
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„ Segundo estágio: acontece por volta dos 12 até os 24 meses. A criança


se refere aos objetos apontando, segurando, olhando e tocando-os. As
primeiras produções incluem as formas da produção adulta chamadas
de congeladas, ou seja, a criança usa uma palavra com um significado
mais amplo.
„ Terceiro estágio: após o período de dois anos, as crianças surdas
começam a produzir as primeiras combinações de sinais, com o intuito
de descrever ações e acontecimentos do seu cotidiano. Usam, de
forma inconsistente, o sistema pronominal e a ordem verbo-objeto
em sua sinalização. Esse estágio dura aproximadamente até o 30º
mês de vida.
„ Quarto estágio: é o das múltiplas combinações. Há uma “explosão de
vocabulário”, e as crianças iniciam o processo de produção de frases
curtas e sentenças.

É importante que a criança surda esteja em um ambiente linguístico


adequado para que possa ter condições naturais de aquisição de linguagem
e desenvolvimento integral.

A Libras não é baseada em gestos ou mímicas. A errônea percepção


de que é uma linguagem mímica está associada à iconicidade. É
comum que aprendizes achem que, espacialmente e visualmente, a língua se
torna mais palpável e concreta. No entanto, ela tem uma estrutura gramatical
própria que a legitima como língua e, por isso, também não pode ser confundida
com uma versão sinalizada da língua oral.
Em muitos contextos educacionais, porém, equivocadamente os profissionais
usam o que é conhecido como português sinalizado, uma forma de tentar se
comunicar usando a Libras, mas seguindo a gramática da língua portuguesa.
Esse uso equivocado impossibilita a elaboração de sentenças compreensíveis
visualmente em Libras, além de não respeitar a estrutura gramatical de
nenhuma das línguas envolvidas (nem Libras nem português), criando barreiras
comunicacionais e informacionais nas relações (GESSER, 2009).
Além disso, temos o alfabeto manual (Figura 2), que não é a Libras em si,
mas um conjunto de configurações de mão (CM) que representam, na Libras,
as letras do alfabeto da língua portuguesa. Os sinalizantes usam o alfabeto
manual com um dos recursos para expressar palavras que não têm um sinal
na Libras, além de soletrar nomes de pessoas, lugares e siglas. É um recurso
linguístico (PEREIRA et al., 2011).
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Figura 2. Alfabeto manual da Libras.


Fonte: Cristiano (2020, documento on-line).

Nesta seção, conhecemos a constituição linguística da Libras, sua origem e


alguns marcos importantes, como a criação do Instituto Nacional de Educação
de Surdos. Na próxima seção, vamos estudar a diferença entre tradução e
interpretação, bem como o papel do intérprete educacional.

Tradução e interpretação de Libras


O objetivo da interpretação e da tradução é transladar informações de uma
língua-fonte para uma língua-alvo. No caso do par linguístico Libras-língua
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portuguesa, isso ocorre nos contextos em que falantes de um dos idiomas


não tem fluência no outro idioma. A Libras ocorre de maneira oral/sinalizada,
e a língua portuguesa, de forma escrita.
A interpretação é um processo que, geralmente, acontece de forma si-
multânea, em contextos em que a oralidade prevalece, como uma palestra,
uma aula, um encontro entre falantes de duas línguas diferentes. O intér-
prete de língua de sinais “é o profissional que domina a língua de sinais e a
língua falada do país e que é qualificado para desempenhar a função”. Ao
realizar a interpretação, ele deve “observar os seguintes preceitos éticos:
confiabilidade, imparcialidade, discrição, distância profissional e fidelidade”
(QUADROS, 2004, p. 28).
Para a tradução, utilizam-se meios diferentes para chegar ao mesmo fim, de
transladar de uma língua para outra. Comumente, os tradutores trabalham com
textos escritos e/ou gravados (sinalizados) e têm um prazo maior para efetuar
a tradução do material recebido. Esse prazo varia de acordo com a demanda
de quem solicitou à tradução. O tradutor, portanto, costuma ter um tempo
maior para consultar fontes históricas, dicionários e materiais diversos, além
de revisar o conteúdo em que está trabalhando. Já o intérprete, em geral, não
dispõe desse tempo, porque a interpretação é realizada concomitantemente
com a fala e/ou discurso de um dos interlocutores.
Confira no Quadro 1 outras principais diferenças que geralmente se ob-
servam entre tradutores e intérpretes.

Quadro 1. Diferenças entre tradutores e intérpretes

Tradutores Intérpretes

Revisam seu trabalho ou solicitam Tomam decisões muito rápidas em


para um assistente de tradução relação ao significado do texto sem, às
revisá-lo, pois têm o texto permanente vezes, saber a intenção do autor ou o
à sua disposição. significado antecipadamente.

Reportam ao texto-fonte com Têm a opção de perguntar diretamente


frequência, tendo a opção de retornar à fonte, quando imaginam que cometeu
às partes já traduzidas, em qualquer erros ou quer esclarecer uma informação
tempo, pois o texto e a tradução são com antecipação.
escritos.

Podem se adiantar no texto para Não podem voltar atrás em partes do


resolver, antes, problemas de gênero discurso e, raramente, podem incorporar
no pronome de uma das línguas. feedback de outros ou rever o trabalho
antes do conhecimento público.

(Continua)
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(Continuação)

Tradutores Intérpretes

Usam dicionários e outros materiais, Não usam dicionários.


revendo a tradução e fazendo
correções.

Têm tempo para fazer pesquisas São muito limitados pelo tempo,
visando a buscar o sentido linguístico impossibilitando a busca pelo sentido
para a equivalência da mensagem. equivalente da mensagem. Isso os faz
deixar em segundo plano a escolha
linguística em favor do sentido.

Dificilmente encontram-se com o


autor do texto-fonte para dirimir
dúvidas de qualquer tipo.

Fonte: Adaptado de Leite (2005).

Tradutor-intérprete educacional
Nos contextos em que não há oferta de escolas bilíngues para surdos (quando a
língua de instrução é a Libras, e a língua portuguesa é ofertada na modalidade
de leitura e escrita), os surdos percorrem sua trajetória escolar em instituições
de ensino cuja perspectiva é a inclusão. Os conteúdos, métodos, práticas,
avaliações, currículo, entre outras questões que envolvem a organização
escolar, são pensados por e para ouvintes. Muitas vezes, o aluno surdo é o
único entre todos os discentes de uma determinada instituição.
Para que a acessibilidade linguística, informacional e comunicacional se
realize nesses espaços, a escola comum inclusiva conta com a presença do
tradutor-intérprete de Libras-língua portuguesa (TILSP). Esse profissional é
responsável por interpretar os conteúdos ministrados em cada disciplina,
tornando-os acessíveis, além de incentivar os discentes surdos a participa-
rem das aulas questionando, refletindo e discursando sobre os assuntos
abordados. Cabe também ao TILSP educacional comunicar aos surdos as
regras e normas da instituição, bem como a dinâmica escolar. É uma área da
interpretação muito requisitada (ALBRES, 2015; QUADROS, 2004).
A formação para que o TILSP atue em contextos educacionais não pode
ser somente técnica e de domínio das línguas, mas também uma formação
que abarque conhecimentos pedagógicos sobre a pedagogia surda, sobre
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as necessidades educacionais dos surdos e sobre o campo da educação


como um todo. É necessário que o TILSP educacional tenha conhecimento
sobre o que são os processos de inclusão e exclusão, sobre a cultura surda e
demais elementos que atravessam o fazer interpretativo na área da educação
(ALBRES, 2015).

Recepção e produção da Libras


As práticas de produção e recepção da Libras estão relacionadas ao contato
com seus pares linguísticos, de preferência surdos adultos e sinalizantes.
As crianças surdas precisam desse referencial para se reconhecerem como
surdas e linguisticamente diferentes, a fim de interagir e modificar o mundo
que as cerca. Esses adultos servirão como um modelo a ser seguido linguística
e culturalmente.
Cerca de 95% das crianças surdas são filhas de pais ouvintes e, por isso, a
língua de sinais não circulará em grande parte dos lares com a frequência e a
importância devidas. As crianças surdas terão acesso tardiamente à Libras,
o que torna importante a presença de um adulto surdo. É fundamental que
os pais ouvintes aprendam a Libras para se comunicarem com seus filhos,
minimizando as barreiras comunicativas e informacionais (RODRIGUES, 2014).
Ao atingirem a idade escolar, muitas crianças surdas chegam à escola sem
uma língua adquirida, pronta e internalizada. O paradigma atual é o de uma
escola inclusiva, uma escola para todos, uma escola que viva e promova a
diversidade, uma escola onde a diferença é valorizada, é estimulada, é traba-
lhada nos currículos e nas relações. Contudo, a língua majoritária é a língua
portuguesa; o currículo é pensado por e para ouvintes; as práticas, métodos
e avaliações também são pensados por e para ouvintes. É importante pensar
no papel dos discentes surdos nesse espaço do saber e em que língua ele
adquire os conhecimentos curriculares e mantém as relações estabelecidas.
Além disso, devem ser consideradas as especificidades dos discentes surdos
na escola para todos.
Nesta seção, conhecemos mais sobre as diferenças entre tradução e
interpretação do par linguístico Libras-língua portuguesa e algumas de suas
características. Estudamos as funções e os aspectos que perpassam o fazer
do intérprete educacional durante sua atuação na educação básica. Na pró-
xima seção, vamos abordar a importância do ensino da Libras nas escolas
de educação básica.
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Importância do ensino de Libras na escola


O modelo educacional em que estamos inseridos segue os preceitos da Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de 2008
(BRASIL, 2008). Portanto, grande parte de nossas escolas são inclusivas. As
crianças surdas são matriculadas nessas instituições, que como vimos, são
pensadas por e para ouvintes. Há um abismo entre a expectativa apresentada
por teóricos e nas legislações vigentes e a realidade vivida pelas crianças
surdas brasileiras.
Nas escolas inclusivas, geralmente, o aluno surdo só tem como interlocutor
o TILSP, que faz a tradução dos conteúdos das disciplinas e a mediação entre
os alunos surdos e a mediação destes com os demais atores escolares, como
alunos ouvintes e professores. No entanto, somente a presença do TILSP não
é suficiente para garantir a inclusão dos discentes surdos. Deve-se envolver
toda a comunidade escolar nesse processo (ALBRES, 2015).
Após o reconhecimento da Libras como língua de expressão e comunica-
ção da comunidade surda do país, com a Lei de Libras, houve uma demanda
crescente pela inserção da Libras como disciplina nas escolas de educação
básica. Além de ser a forma de comunicação das crianças surdas, o ensino
de Libras nas escolas comuns inclusivas abre infinitas possibilidades de
relacionamento e formação da comunidade escolar, inclusive contribuindo
para a eliminação do que chamamos de audismo, os preconceitos com as
pessoas que têm alguma restrição de audição (BRASIL, 2002).
O aprendizado da Libras para as crianças surdas extrapola as necessidades
básicas comunicativas. Ele é fator preponderante na relação com a família e
com a sociedade. O uso corrente da língua de sinais na escola é uma maneira
de ampliar as redes de contato e interação entre os agentes educacionais.
Criar um ambiente favorável para o ensino da Libras é essencial para que se
construa uma escola verdadeiramente inclusiva (BERNARDINO, 2014).
O ensino da língua brasileira de sinais nas escolas contribui para o de-
senvolvimento da autonomia social, emocional e intelectual das crianças
surdas, bem como abre as portas para um conhecimento de mundo que, até
o ingresso na educação básica, é restrito. Como cerca de 95% das crianças
surdas são filhas de pais ouvintes, muitas delas chegam à escola sem uma
língua adquirida, sem ter domínio da Libras. Esse é um dos gargalos que a
educação inclusiva precisa urgentemente resolver (RODRIGUES, 2014).
O ensino da Libras pode ser ofertado como ensino de primeira língua (L1)
para os surdos e segunda língua (L2) para os ouvintes. A escola deve ofertar
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às crianças surdas momentos em que elas possam, de preferência com um


adulto surdo, vivenciar momentos de interação e aprendizado de sua L1. O
ensino de Libras para ouvintes (L2) deve capacitar as crianças ouvintes para
que elas possam se comunicar com as crianças surdas dentro e fora dos
muros da escola (QUADROS; CRUZ, 2011).

O adulto surdo faz toda a diferença no trato com a criança surda filha
de pais ouvintes. Ele será o referencial linguístico e cultural para
essas crianças. É uma maneira de elas projetarem uma perspectiva de futuro e
terem acesso à Libras e à cultura surda por meio de um nativo (BERNARDINO, 2014).

Como vimos, o ensino de Libras nas escolas de educação básica apresenta


a perspectiva de uma inclusão dos surdos na comunidade escolar. Com a
implementação dessa disciplina no currículo da escola, mostra-se para os
membros dessa comunidade que a instituição está preocupada e envolvida
com as causas do movimento surdo, que respeita seus direitos linguísticos e
compreende a importância do ensino e da divulgação da Libras para docentes,
discentes, demais profissionais da escola, além da comunidade externa.
Neste capítulo, estudamos a Libras, uma língua de modalidade gestual-
-visual capaz de oportunizar aos surdos a autonomia necessária para viver,
relacionar-se e informar-se. Vimos também que, com a presença dos TILSP,
as barreiras de acessibilidade são rompidas em contextos escolares e não
escolares e que esses profissionais são fundamentais para um processo
educacional mais equitativo. Por fim, observamos que a inclusão da Libras
como disciplina obrigatória na educação básica e a presença de surdos adultos
nesses espaços é fundamental para que a sociedade modifique seu olhar
sobre os surdos.

Referências
ALBRES, N. A. Intérprete educacional: políticas e práticas em sala de aula inclusiva.
São Paulo: Harmonia, 2015.
BERNARDINO, E. L. A. Aquisição de línguas de sinais por crianças surdas e sua relação
com o bilinguismo. Educação em Foco, v. 19, n. 2, p. 71-100, 2014.
BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Si-
nais - Libras e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 2002.
Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm. Acesso
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GESSER, A. Libras? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno da língua de
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LEITE, E. M. C. Os papéis do intérprete de libras na sala de aula inclusiva. Petrópolis:
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PEREIRA, M. C. C. et al. Libras: conhecimento além dos sinais. São Paulo: Pearson
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QUADROS, R. M. O tradutor e intérprete de língua brasileira de sinais e língua portuguesa.
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QUADROS, R. M.; CRUZ, C. R. Língua de sinais: instrumentos de avaliação. Porto Alegre:
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QUADROS, R. M.; KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto
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STROBEL, K. As imagens do outro sobre a cultura surda. 2. ed. Florianópolis: UFSC, 2009.

Leituras recomendadas
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BRASIL. Lei nº 14.191, de 3 de agosto de 2021. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), para dispor sobre a moda-
lidade de educação bilíngue de surdos. Brasília, DF: Presidência da República, 2021.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/Lei/L14191.
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SILVA, V. A política da diferença: educadores intelectuais surdos em perspectiva. Tese
(Doutorado em Educação) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009.
SKLIAR, C. (org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. 8. ed. Porto Alegre: Mediação,
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M. C. R. (org.). Surdez: processos educativos e subjetividade. São Paulo: Lovise, 2000.
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