estava a terra do ambicionado comunicou-se A nação inteira,
O comércio da África produto, e também, ao que se produzindo aquele estado de ilusão conjeturava, tesouros de pedrarias coletiva a que chamaram fumos de Azevedo, João Lúcio de. Época de e metais preciosos. Nesta época Índia. Designação justa, porque Portugal Econômico: Esboços de tinha acabado de se integrar a seu objeto do fumo tinha a História, Clássica Editora Lisboa, 1929, monarquia nos moldes do moderno inconsistência, e dele veio a ter a pp. 83-87 absolutismo: a nobreza submetida duração efêmera. ao nuto régio; os municípios Entretanto, mudadas as É portanto de evidência que, no domados nas suas ocasionais condições econômicas, alteravam- meio de aparente prosperidade a manifestações de independência; a se os costumes, e modificava-se a nação empobrecia. Podiam os nação, vasta propriedade fisionomia da nação, o que dava empreendimentos da Coroa ser de territorial, que o soberano a seu cuidado aos rabugentos, saudosos vantagem para alguns particulares. capricho explorava. Esta, como diz do estado antigo [... ] Assim os feitos de África rendiam Alberto Sampaio - "uma casa de Assim como Gil Vicente na tenças e graças à fidalguia; com o negócio, cuja prosperidade Exortação da guerra, verberando o tráfico da Guiné enriqueciam certos dependeria tanto de condições luxo e exaltando a índole belicosa mercadores; mas, para esses fortuitas como da habilidade do dos antepassados. Estamos em lograrem proveitos, recaía sobre os patrão". Foi a obra de D. João II, 1518, e o gosto pelo fausto, que povos o fardo dos impostos, e o que teve a dita de ser invadiu a corte, desagrada ao agravo das levas para o serviço conjuntamente hábil e favorecido poeta, porque tudo isso, diz, é militar, que um estado perpétuo de das circunstâncias. gastar sem prestar [...] guerra exigia, ao mesmo tempo O dono da nação era agora Não se pode melhor estabelecer que no país escasseavam os braços comerciante, como tinha sido em o contraste das duas épocas. A laboriosos. Sucedeu, porém, que o outros tempos lavrador. A transição tradição era a do português sóbrio ganho de alguns, poucos, depressa não se pode dizer repentina. Já no e belicoso, homem de armas e não se tornou, como sempre, sedução reinado de D. Fernando se chatim. O que nem sempre para todos. E foi como a empresa exportavam por conta da coroa correspondia à realidade. Mas, sem de África, aventura de ocasião e vinhos e outras mercadorias, dúvida que o sentido genovês da local derivou para o imperialismo, importando-se as de que havia vida, como Gil Vicente o estendia, estendido a quatro partes do necessidade: é provável que se apossara da nação. Os mundo. Primeiro, tentando alargar objetos de luxo, além de genoveses eram os grandes a ocupação, o que a resistência da armamentos. Reprovaram-lhe as usurários da época; em Lisboa mourama, e a exiguidade dos Cortes a pratica, porque os gêneros havia muitos, ocupados no recursos empregados, não exportados não eram dos que o rei comércio. A tragicomédia da consentia. Depois, renunciado o tinha próprios, produtos de rendas Exortação da guerra celebrava a propósito, levando domínio, por e impostos, mas adquiridos por expedição de Azamor, que ia fazer- avanços sucessivos, a terras compra e a crédito, achando-se em se sem ter por movei o intuito distantes para exploração atraso os pagamentos. A exemplo comercial, como as da Índia. Igual comercial. do soberano, os principais fidalgos pensamento ao do épico, mais Os achados do metal precioso e não desdenhavam os lucros do tarde, no discurso do velho do da especiaria, na costa africana, comércio, comprando os gêneros Rastelo. ministraram aos príncipes a norma de consumo para revender, e Nem este nem a Pantasiléia da da política, transformaram a mente provocando a carestia. Os povos, Exortação puderam ser ouvidos. Os do povo, dando às suas aspirações queixosos do açambarcamento, tempos exigiam outra política, de outra meta, e divergiram para vias increpavam-nos de se haverem resultados mais palpáveis. Por ela novas, de considerável efeito no todos tornado mercadores e os reis buscavam aumentar o seu mundo, a corrente da história. regatões. poderio, e contentar as ambições Até aí os portugueses tinham-se A tendência avivou-se com o da classe da nobreza, de antiga e empregado em constituir a impulso dado à navegação pelos. moderna estirpe, que terminada a nacionalidade, usando as armas descobrimentos. No reinado de D. conquista do território, na para adquirir terras, despojos, Afonso V, o Infante D Fernando, o Península, não tinham dentro dele tributos, cativos; agora a emulação Duque de Bragança e vários adequada satisfação. de Veneza, opulenta pelo comércio, fidalgos, são armadores de barcos impelia-os ao remoto Oriente. Já o de comércio, em que mandam a monopólio fora quebrado, e a Flandres vinho e outras cargas [...] pimenta da África concorria com p No reinado de D. Manuel, a especiaria da Índia. Tão estimada transformação tinha-se quanto os metais preciosos, a completado. A corte era pimenta era na Europa objeto das verdadeiramente uma grande casa maiores cobiças. Sirva de exemplo de negócio, e a geral aspiração este fato: em 1378, precisando a consistia em haver parte, maior ou república de Gênova de tomar por menor, nos lucros da índia. A empréstimo uma soma avultada, pimenta que trariam as naus, o propunha o reembolso em ouro ou preço porque havia de vender-se pimenta, à vontade dos credores. em Flandres, com que novas Em Portugal, o êxito da conquistas poderia alargar-se a competência pela malagueta, área das transações, era o em que incitava a continuar nos esforços, e os governantes punham o a buscar a posse total do tráfico. pensamento, e os cortesãos De escala em escala torneou-se sequiosos a esperança. Das altas a ponta de África, além da qual esferas a idéia obsessora
ALMEIDA, Maria Regina Celestino De. "De Araribóia A Martim Afonso - Lideranças Indígenas, Mestiçagens Étnico-Culturais e Hierarquias Sociais Na Colônia"