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ROBIN BLACKBURN

A construção
do escravismo no
Novo Mundo
Tradução de
MARIA BEATRIZ DE MEDINA

EDITORA RECORD
RIO DE JANEIRO • SÃO PAULO
2003
vlll
A escravidão racial e o crescimento
da plantation

Todosos servos importados e trazidos para este país, por mar ou por terra, que não
eram cristãos em seu país natal (exceto turcos e mouros com amizade por Sua
Majestade,e outros que possam provar devidamente serem livres na Inglaterra
ou em qualquer outro país cristão antes de embarcarem para serem
transportados para cá) devem ser registrados e ser escravos, e como tal
comprados e vendidos mesmo que se convertam depois ao cristianismo.
Ato Relativo a Servos e Escravos, Virgínia, 1705

A fortuna nunca exerceu de modo mais cruel seu império sobre a humanidade do
que ao sujeitar essas nações de heróis ao refugo dos objetivos da Europa, a
miseráveisque não possuem as virtudes nem dos países de onde vêm, nem daqueles
para onde vão, cuja leviandade, brutalidade e depravação os expõem com tanta
justiça ao desprezo dos vencidos.

Adam Smith, Teoria dos sentimentos morais


s sistemas escravistas das Américas incorporaram um novo tipo de escravidão
O e plantação, vindo a constituir, em 1714, a principal fonte dc riqueza colonial.
Os acontecimentos relatados nos Capítulos II a VII mostram que o tráfico de escra-
vos pelo Atlântico, as ideologias e códigos que legalizaram a escravidão racial e a
escravista como empresa estavam agora firmados. Os portugueses haviam-
se estabelecidocom grande tenacidade na costa africana, nas ilhas atlânticas e no
Brasil,traficando escravos e experimentando versões aperfeiçoadas da plantation
açucareira.Os espanhóis tinham emprestado o prestígio dos conquistadores à posse
de escravos. Ambas as potências ibéricas suplementaram leis medievais e clássicas e
justificativasreligiosas tradicionais com novas doutrinas escravagistas, embora es-
tas últimas não englobassem completamente todos os de ascendência escrava.
Asplantationsbrasileiras atingiram tamanha escala e autonomia que consegui-
ram esquivar-se da excessiva regulamentação espanhola. Os holandeses tentaram
tomar o Brasil e fracassaram, mas quebraram o monopólio português do comércio
de escravose enfraqueceram bastante o poderio espanhol no Novo Mundo. Os
mercadores e donos de plantations ingleses e franceses exploraram esta situação.
Instruídos pelos holandeses e aperfeiçoando o exemplo dado pelas ilhas atlânticas e
peloBrasil, elaboraram um tipo novo e potente de agricultura deplantation escravista.
Em 1700,a palavra inglesa "plantation" (plantação) abandonou os significados an-
teriores e passou a designar com mais freqüência colônias agrícolas de ultramar que
cultivavamcomercialmente produtos tropicais com mão-de-obra cativa e, por ex-
tensão,as propriedades que produziam essas colheitas, com a mobilização cada vez
maior de escravos negros. Ao contrário do protótipo brasileiro, o cultivo da cana e a
fabricaçãode açúcar eram integrados nas plantations do Caribe. Onde quer que as
plantationsfloresceram, os cativos africanos e seus descendentes substituíram — ou
logo vieram a substituir — os escravos índios ou os servos europeus contratados
comoprincipal fonte de mão-de-obra.

Neste capítulo, vou analisar as razões do surgimento das plantationsamericanas e


sua dependência do trabalho forçado, examinar a mudança da servidão sob contra-
to para a escravidão com base racial e perguntar se poderiam ter sido elaboradas
alternativasà escravidão racial. Isso vai envolver a análise das forças e fraquezas da
Plantationescravista e a explicação de como uma instituição tão capaz de desperdí-
cio podia ser lucrativa e, embora tão opressora, pudesse ser relativamente segura.
Semlucratividade e segurança, asplantations não teriam sobrevivido no clima com-
Petitivoe perigoso do Atlântico nos séculos XVII e XVIII, nem teriam recebido o
apoiode seus governos.
ROBIN BLACKBURN
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apetite curopcu, poderoso e aparentemente


As plantationsforam criadas pelo
de divulgada toda a crueldade do trabalho
ilimitado,por seus produtos depois
a escravidão racial recrutou gente para ocupar
sem regulamentação nasplantatiogs,
dc empreendedores atentos e
as vagas que surgiram. Devido à prcscnça ganancio-
sos, cujas açôcs eram ditadas cm primciro lugar pelas pressões da competição e pelo
desejo de lucro, cstc desenrolar não poderia ter sido evitado, a menos que a escravi-
dão e a supcrexploração racial tivessem sido proibidas por meio de alguma sanção
muito forte.
Foi assim quc as novasplantationsforneceram aos mercados europeus produtos
que atingiam preços altíssimos,já que a própria Europa não podia cultivá-losou
não podia produzi-los cm condições competitivas nos níveis necessários de volume
e qualidade. As rotas marítimas do Atlântico deixaram a América mais próxima da
Europa do que potenciais fornecedores alternativos na Africa ou na Asia. As condi-
ções políticas do Novo Mundo — a disseminação do controle europeu — também
vieram a favorecê-lo como fornecedor do mercado europeu. E verdade que a guerra
interrompeu algumas vezes o comércio atlântico, mas as rotas para a Africa e a Asia
eram, no mínimo, mais perigosas. Do ponto de vista dos colonos europeus, o Novo
Mundo tinha uma localizaçãomais fértil do que outras áreas capazes de atraí-los.
O açúcar e ouü•osprodutos podiam ser conseguidos com mais rapidez pela mobilização
da mão-de-obra escrava.
Esses itens exóticospoderiam ter sido conseguidos de outra forma (ponto que
exploraremos mais adiante neste capítulo), mas a aquisição de cativos africanose
seu uso como escravos mostrou-se sem dúvida uma solução prática e lucrativa num
contexto em que encontrar trabalhadores voluntários era dificil e caro. Os merca-
dores e donos deplantatiow responsáveis pela compra de africanos faziam isso para
aumentar sua fortuna; outros colonos tinham pouca participação no assunto, mas
ficavam satisfeitos por deixar o trabalho pesado metro-
para os escravos. Os estados
politznos, ao descobrir as vantagens do que pouco
desenvolvimento das Plantations
haviam feito para ajudar,garantiram uma proprietários
autonomia considerável aos
e mercadores envolvidos; enquanto merca-
não se negasse um acesso razoável aos
dos, o comércio de produtos dasplantations gerando
poderia ser taxado e dirigido,
uma receita respeitável.
Os monarcas espanhóis haviam enrique-
descoberto que a escravidão completa
cia seus colonos mas arruinava suas continuasse
novas terras, Ao proibir que
escravizaçãodas populações indígenas a
já bastante red uzidas, eles incentivaram ludí"0S
de-obra c os tributos comunais e
criaram uma camada intermediária de mestiZOS'
e índios isolados. O aparato do
domínio imperial, representado por nobres e
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metais preciosos por mcio dc um sistema dc exploração


tinhao objctivo dc extrair
extensiva mesmo comunidadcs distantes dos centros dc mineração cram obriga-
cm prata, obrigando-as a produzir bens que pudessem ser vendidos
dasa pagar tributos
para as oficinas têxteis. A monarquia espanhola foi tam-
ou a fornecer mão-de-obra
bémforçadaa vender cada vez mais permissõcs dc importação dc escravos — os
--- como outra forma de recolher prata das colônias. O poder imperial espa-
nholfora obrigado a ceder terreno no Caribe e na América do Norte, e o custo da
defesaimperial absorvera muito do cxccdcnte colonial. Ainda assim, conservava seus
principaisdomínios, e quando os Bourbon sucederam os Habsburgo, conseguiu
elevarmais uma vez o nível de produção das minas e da receita colonial. O poder
imperiale seus empreendedores coloniais formavam um mecanismo de exploração
0(tensoe não-capitalista, mas que, como preço da sobrevivência, tinha de produzir
um excedente econôrmco.
As colônias deplantation inglesas e francesas tinham uma fórmula diferente de
ecploração,embora também baseada na coerção extra-econômica. Enquanto Ma-
dri concedia concessões de mineração e direitos de encomienda,os mercadores e donos
deplantationsdas colônias inglesas e francesas montaram sistemas intensivos de ex-
ploraçãoà custa principalmente de seus próprios esforços. Os ingleses e franceses
colonizarampartes do Caribe e da América do Norte habitadas por tribos e confe-
deraçõesque se dedicavam ao cultivo rotativo, à caça e à coleta. Ao contrário dos
impériosasteca e inca, a incorporação colonial desses povos apresentava a perspec-
tivade resistênciapermanente e poucas vantagens. Os ingleses começaram fazendo
trocas e comércio com esses povos nativos, e depois os massacraram, expulsaram ou
marginalizaram;os franceses seguiram o mesmo ciclo de forma mais lenta, desen-
volvendocolónias e povoações no Caribe mas mantendo a ênfase nas redes comer-
ciaisda América do Norte. Para os donos deplantations lucrarem com o crescimento
da colheitade um produto agrícola comercial era preciso encontrar a maior quanti-
dade de trabalhadores o mais depressa possível. Cativos ameríndios eram dificeis
de capturar e de manter, e os homens não estavam acostumados à rotina do campo.
No Início,os donos deplantations conseguiram servos europeus para trabalhar em
suaspropriedades, mas entre 1640 e 1715 eles foram substituídos por comprados, e
nãosubjugados por meio da conquista.
As tentativasde converter os africanos eram ocasionais, e não poderiam ser um
obstáculoa sua utilização como mão-de-obra escrava. Aos escravos não se oferecia
sequera assimilaçãoparcial, não importando se eles se convertiam ou não; a comu-
rudadeescrava tinha sua própria hierarquia mas nenhum representante ou líder público,
Comoos caciques nativos ou a aristocracia indígena da América espanhola. Longe
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de serem expulsos das terras tomadas pelos europeus, os africanos foram


dos para nelas trabalhar c para compensar a expulsão dos índios.
Asplantationsproduziam artigos valorizados num sistema de exploração
siva; as potências colonizadoras não precisavam recolher grandes receitas
dentroda
colônia, já quc podiam cobrar taxas alfandegárias sobre ocomércio resultante
Os
sistemas coloniais tinham uma certa complexidade barroca, com distinçõessociais
e
identidades raciais recém-claboradas. No caso espanhol, a iniciativado estado
papel-chave na coordenação da produção e na definição de uma hierarquia
social. Nas colônias escravistas, os estados imperiais forneceram uma certa codificação
legal e proteção externa, mas o complexo de donos deplantat:bw/mercadores/colo-
nos livres teve de manter coerência e dinâmica próprias. No caso espanhol,a escra-
vidão atuou como elemento da construção de um império ultramarino por umestado
absolutista; nas outras colônias,as plantationseram o projeto de um novotipode
capital agrícola-mercantil em resposta à crescente comercialização das relaçõesso-
ciais na metrópole.

Como vimos, a escravidão africana foi deslanchada pela colonização ibéricae de-
pois, em escala crescente, ampliada e determinada pela demanda de mão-de-obra
para as plantations.A doutrina racial que via os cativos africanos comonascidos
para a escravidão não foi obra de alguma categoria social ou nação européia,e
e
continuou a exibir diferentes padrões e interpretações. O princípio português
espanhol de limitar formalmente a escravidão aos africanos forneceu um prece-
fe-
dente que os holandeses, ingleses e franceses tornaram mais sistemático.Ao
polarizasio
char quase todos os caminhos para a alforria, os ingleses provocaram uma
dos euro-
mais acentuada entre brancos livres e escravos negros. Para a maioria
eram
peus, a falta de cristianismo dos africanos e sua natureza "selvagem"
da maldi-
como explicações da necessidade de mantê-los no cativeiro. A história justifica-
ção de Noé e a teoria de que a pele negra era o símbolo desta maldição
sua crença
vam a escravização permanente dos negros, independentemente de
fossem
conduta. Mas não proporcionava fórmulas legais para que os escravos romana,
lei
tados como propriedade estas foram fornecidas por resíduos da ondeas
lugares
com Coke e Bossuet invocando ojwgentiwm, como já vimos. Nos
à propn
relações capitalistasjá tinham emergido, a aura sagrada que deram
a
privada encobriu a equiparaçãodos escravos a bens móveis, enquanto escravista.
bíblica de tirar os frutos da terra atrelava-se à acumulação e àplantario
eles
Assim, quando os novos sistemas escravistas foram consolidados,
vam o secular e o sagrado, o novo e o velho.
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O aparecimento das colônias escravistas ocorrcu dentro c por mcio da compc-


tiçãoeconômica,militar e social. Um complexo dc cxploraçãoc oprcssão que nin-
guémpôde prever parecia estar fornecendo os bens c até mesmo reproduzindo-se
emcondiçõesperigosas e instáveis. Sc forcm levados cm conta os pcsados custos
militares,é bem possível que nenhuma das potências coloniais tivcssc ainda conse-
guidoum verdadeiro supcrávit. Mas ninguém duvidava que, por si sós, as grandes
do Brasil, do Caribe e da América do Norte pudessem scr administradas
metropolita-
de forma lucrativa para os proprietários, os mercadores e os governos
futuro lu-
nos. A disposição dos governos da Inglaterra e da França de antecipar o
recursos tão grandes
croda hegemonia atlântica explica o motivo da aplicaçãode
conclusão desta
nessatarefa no período de 1650-1713 e também depois. Embora a
dasplantations
competiçãomilitar ainda fosse incerto, o mesmo não se poderia dizer
e eram
escravistas,que já haviam mais do que provado sua viabilidade econômica
os arquitetos deste novo
agorao dínamo do desenvolvimento colonial. Quem foram
africanos em vez
empreendimento?Por que cada vez mais compravam-se escravos
produtivas aplantation
de servoseuropeus para trabalhar nele? Que possibilidades
da segurança nas colô-
tomou realidade? Como ela enfrentou o tremendo problema
niascom grande maioria negra?

capitães
Donos de plantations, mercadores,

donos deplantations dos primeiros anos anteciparam característi-


Os mercadores e
Tinham de ser engenhosos e tenazes, ter sorte e faro
casdo empresário moderno.
e sorte eram necessários para sobreviveraos muitos aci-
paranegócios. Recursos
distância e à vida nas colônias:
dentese desastres inerentes ao comércio de longa
epidemias e outros "atos de Deus". As qualidades co-
guerras, revoltas, furacões, prever, su-
poderiam ajudar o dono de umaplantation a
merciaise administrativas
expansão e da retração do mercado, do roubo por
perarou atenuar os problemas da
da erosão do solo e da redução das colheitas. O conhe-
parceirosou subordinados,
da agricultura européia poderia ser uma vanta-
cimentodos ramos mais comerciais
capitão de navio seria ainda mais importante, como vimos,
gem. A experiência de um carga e os portos
por causadas várias habilidades envolvidas avaliar a melhor
da tripulaçãoe da embarcação,garantir a
maisvantajosos,prever as necessidades e desobediente. De fato,
preguiçosa
disciplina e aplicar punições a uma mão-de-obra
Caribe eram originários de atividadesnáuticas,
os primeiros donos deplantations no uma pitada de gerentes e
quais depois se adicionou
corsárias,nobres e mercantis, às
IjJ.tsC,v.ntJltM
380

livrcg (Itjc emigraram para


contadores. Uma amostragem de t!
qt/Cdeclaravam scr
Maryland no século XVII encontrou 30,6% da
apenas dc marinljcirog
brcza, 27,6% rcgistrados como njcrcadorcsj
A maior parte destes
3,2% que afirmavam tcr alguma ocupaçâ()agrícola,
teria sc trangfornjado
como cmtgrantcs livres cm condiçôcgdc cxigir terra,
Uma minoria podc tcr
nos deplantations, mesmo que pcqucnas no início,
Ingressar na catcgona dos proprictários dc plantations cscravigtag,i
Em colónias bcm cstabclccidas, os adrninistradorcg c proprietários
vinham dc ambicntcs bem difcrcntcs. O trabalho na plantati0't cra urna carrih„e
ouverte aux talent$. O administrador ou procurador daplantation, SCfogsc talentoso,
trabalhador c saudável, cra muito bem pago c tinha a pcrspcctiva dc adquirir
própria plantation. Embora alguns dos primeiros proprietários pudcgscnj gabar.
sc de um bom berço, as gcraçôcspostcriorcsdc donos dc plantations nas novas
grandes colónias da Jamaica c dc São Domingos vinham quase scmprc das cate-
gorias dc contadores e gérants. Nas colónias inglesas, quakcrs c outros não-con-
formistas possuíamplantations, assim comojudcus sefarditas, cm bora todos dcvam
ter começado com recursos do comércio. Tanto nas ilhas inglcsas quanto nas fran-
cesas, os funcionárioscoloniais,dc origem nobre, estavam cm boa posição para
adquirir grandesplanrati0fl$, assim como advogados e cmprcgados dc mcrcadorcs
de origem plebéia ou burguesa. Houve até alguns casos dc cx-scrvos contratados
escocesesou engagá bretões que entraram para a classe dos donos dc plantatiow,
E embora os dc berço nobre tivessem maior probabilidade dc começar como pro-
prictírios, eram tambémos que tinllammaior probabilidadedc voltar para casa.
Fosse qual fosse sua origem, o grande proprietário poderia assumir o estilo e a
dignidade de um gentleman.Esperava-se que ele desempenhasse um papel no
autogoverno colonial, comojuiz dc paz ou coronel da milícia ou, nas colônias fran-
cesas, como membro do conscil.
Em geral, as classes de proprietários cram mais fluidas c abertas nas colónias
do que na metrópole. Du Tertre observa: "Não há diferença entre o nobre e o ple-
beu em meio aos habitantes; o que mais possui é mais valorizado; somente os funcio-
nários reais tém posição social, e só os ricos têm distinção entre eles."2 Em Maryland'
o proprietário da colóniatentou criar uma hierarquiasocial "baseada na terra e
em sua renda, reproduzindo o sistema social familiar aos lordes de Baltimore como
proprietários ingleses de terras e colonizadores da Irlanda". Mas o projeto nau-
fragou. "A tentativa dc desenvolver uma sociedade rigidamentc estratificada des-
moronou quando a nova riqueza provocou o surgimento de uma elite "doméstica"
que desafiou o poder político da aristocracia dc Baltimore."l No Brasil, onde o
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NOVO MUNDO:
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caráterpatrimonial iria durar, os donos de engenho


tentaram sem sucesso
tir títulos de nobreza para "se dissociarem das manchas garan-
da heterodoxia
das origens braçais ou dos vínculos com as 'raças infectas' de religiosa,
mouros,judeus ou
mulatos(enquanto valeu a proibição)". Mas como acrescenta
StuartSchwartz:
"Algumasdas famílias de fazendeiros da Bahia, na verdade, não
estavamlivres
desses vínculos, por terem sido
iniciadas por cristãos-novos,
mercadores ou às vezes
até mesmo por artesãos." 4 Embora alguns engenhos brasileiros
pertencessem a
famíliasnobres, nenhum senhor de engenho plebeu foi alçado à nobreza
antes do
XIX.
século
Os grandes fazendeiros e seus patrocinadores comerciais tiveram de inovar e
adaptar-se. Rearranjaram os códigos institucionais e morais tradicionais para re-
solverseus problemas — para atender à demanda acentuadade seus produtos,
parasuperar a falta de mão-de-obra, para reunir gente adequadamentetreinadaa
um custo aceitável e para governar a sociedade colonial resultante. Precisavam de
umvestígio de oportunismo e tenacidade para superar escrúpulos relativosà compra
e vendade servos e escravos e sua sujeição a um regime destrutivode trabalho
forçado.A noção de que o comércio atlântico de escravos e a escravidãodasplantatiow
erammeios de evangelização cristã mal poderia sobreviver à vista da realidade,
masos primeiros comerciantes e proprietários de escravos não eram considerados
monstros.Afinal de contas, a maioria dos mercadores, proprietários,oficiaismi-
litarese capitães navais europeus não tratava em casa os de origem inferior com
qualquerternura ou consideração. Podiam ser particularmenteseveroscomsu-
bordinadosde outra nacionalidade ou religião. Nas guerras religiosaseuropéias,
ficar de
eram freqüentes as atrocidades cometidas contra aqueles condenados a
oficinas
fora da moral comum. O funcionamento cotidiano das casas de correção,
agressão fisica.
ou unidades militares e navais costumava incluir a degradação e a
flagelados
ser
Os acusados de crimes contra a propriedade ou a ordem podiam
a ferro e sujeitos a outras pu-
PUblicamente, colocados no pelourinho, marcados
emprego rentável eram incentiva-
Iliçõesexemplares. Jovens sem propriedade ou
O trabalho nasplantatiow
dosa vender-se durante vários anos de dependência.
Também provou a eficácia da
do Caribe criou um sistema a partir dessas técnicas.
Os mercadores e propne-
mão-de-obra sob controle direto do dono da plantation. só aos poucos
é
forçado;
tários descobriram primeiro as vantagens do trabalho que
estimularam as identidades
que desenvolveram racial e
a lógica da escravidão
Iriam
sustentá-la.
ROBIN BLACKBURN
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Mão-de-obrana plantation: dos contratos de


servidão à escravidão

passaram a confiar na mão-de-obra


Por que os produtores dc açúcar do Caribc
por quc comprar
tiva e não na mão-de-obra livre?E depois quc o fizcram,
africanos e não prisioneiros ou servos curopcus? Afirmo quc a opção dc com.
prar africanos foi feita com basc cm considcraçõcs cconômicas por mercadorese
donos deplantations que descobriram, por tentativa c erro, quc a construção de uma
economia baseada na exploração racial servia bem a seus propósitos.
Os que investiram cm plantations contavam com o lucro por causa do alto preço
de sua colheita. Escravos, servos contratados e engagéstinham em comum o fatode
que, em princípio, não poderiam legalmente abandonar o dono da plantationnem
pedir pagamento extra quando fosse época de colheita, nem recusar-se a ser recon-
tratado. O produtor de açúcar ou fumo administrava uma empresa cuja demanda
de mão-de-obra era intensa, e o ritmo do trabalho era decisivo; precisava contar com
disponibilidadede mãos em quantidade suficiente quando necessário. Conseguir
toda esta coordenação por meios voluntários teria sido difícil e caro. Seriam neces-
sárias despesas consideráveis em salários ou compras de fornecedores menores, além
de um tipo diferente de empreendedor. Nem os nativos americanos nem os africa-
nos estavam acostumados ao trabalho assalariado; até os franceses e ingleses, seti-
vessem escolha,desejariamtrabalhar a terra de forma independente. A disposição
européia comum de ignorar as exigências de terra dos ameríndios significava queos
colonos brancos em geral podiam consegui-la em condições vantajosas. A faltade
trabalhadores livres significava que os salários eram altos. Os donos deplantatiow
acharam melhor se aproveitar de trabalhadores que não
estavam em posição de exi-
gr terras ou salário. No início fizeram pouca distinção
entre servos e escravos,co-
locando-os para lado a lado. Mas com o crescimento da escala e da intensidade
do trabalho naplantation, preferiram os escravos
africanos aos servos.
Philip Curtin sugeriu que a preferência por
africanos em relação a trabalhad0-
res servis europeus refletia, em grande parte, a
maior probalidade de os primeiros
sobreviverem no ambiente insalubre do Caribe.S
A evidência é inconsistente,
parece que os imigrantes da Europa tinham uma
taxa de mortalidade cerca de duas
vezes mais alta que a dos africanos nos primeiros
anos após sua chegada ao caribe'
e os contemporâneos tinham consciência
desta discrepância. No entantO, estefato

quanto nas Antilhas durante a fase inicial


da produção de fumo, e foram substituí-
dos em grande parte por escravos africanos '
com a transição para o açúcar ou 0 an
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO
NO NOVO MUNDO: 1492-1800
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ou para o cultivo mais intensivo do tabaco. O fator


epidemiológico era reforçado
por outros fatores que recomendavam a mão-de-obra
africana ao proprietário de
uma plantation, se este desejasse a expansão do negócio.
O número de servos contratados ou engagé$
disponíveis para compra era influen-
ciado principalmente por condições sociais e econômicas,
e estas começarama
desestimular a emigração bem na hora em que os donos
deplantatiow tentavam se
expandir.O trabalho de condenados não era uma solução.Alguns
servos invo-
luntáriosforam despachados depois de acontecimentoscomo as campanhas
in-
glesasna Irlanda, a derrota da rebelião de Monmouth, a eliminaçãoda Fronde,
as "dragonnades" em lugares como Poitou e a revogação do Édito de Nantes (1685).
A servidão era às vezes concedida a autores de crimes menores como alternativa à
penade morte. Para os encarregados de recrutar condenados para trabalhar nas
plantationsdas ilhas Leeward britânicas na década de 1680,a descoberta da Cons-
piraçãode Rye House "pareceu um presente de Deus, que forneceu um grande
número de prisioneiros. "6 Mas até neste caso a colheita era de algumas centenas
de cada vez, enquanto os fazendeiros das ilhas Leeward precisavam de milhares
de trabalhadores forçados.
A pena de servidão acabou sendo considerada fonte insatisfatória de mão-de-
obra para asplantations; era imprevisível e perigosa, e os prisioneiros não eram sufi-
cientesem termos de quantidade ou qualidade. Os fazendeiros não queriam recrutar
sua mão-de-obra principalmente entre criminosos, e as autoridades não se dispu-
nham a concentrar um número grande demais de adversários políticos ou religiosos
nascolônias deplantation, onde poderiam ajudar potências hostis: os ingleses preo-
cupavam-se com o auxílio de católicos irlandeses aos ataques franceses; os france-
ses, com huguenotes unindo-se aos corsários holandesesou ingleses.Os cativos
africanos podiam fugir ou revoltar-se, mas se os vários estados coloniais rivais man-
tivessemafricanos em cativeiro, eles não teriam razão para entregá-los a um Inimi-
go. Os fugitivos africanos tinham probabilidade muito menor de encontrar abrigo
ou apoio entre os colonos do que os servos contratados europeus. Para onde fossem,
a cor de sua pele despertaria a suspeita de que eram escravos, enquanto o servo fu-
gido tinha alguma possibilidade de misturar-se à população branca livre.
O número de escravos trazidos através do Atlântico chegaria a níveis que não
Poderiamser igualados por um fluxo de trabalhadores forçados das metrópoles eu-
ropéias,a menos que ocorresse alguma convulsão social improvável e draconiana.
A maioria dos servos contratados e engagésnão havia sido submetida à verdadeira
escravidão,e até estes trabalhadores semi-servis eram escassos no final do século
XVII.
384 ROBIN BLACKBURN

colônias inglesas era a


A principal fonte dc servos contratados para as
não implicou nenhuma
Inglaterra. A consolidaçãoneste país do estado burguês
dc súditos inglcscs; na verdade,
privação drástica dc libcrdadc pessoal para a massa
da
a Guerra Civil e a Revolução Gloriosa foram acompanhadas celebraçãodasli_
porquc os novosplanos
berdadcs civis, que não podia scr intciramcntc csvaziada
ser dito da Restauração,
exigiam um mínimo dc cndosso cívico. O mcsmo podc
favorável à liberdade dos
anunciada, como o foi nos discursos parlamentares, como
o
ingleses e contra o destino dos servos em Barbados. "Somos povo mais livredo
1659, falando em defesa
mundo", disse Sir John Lcnthall ao Parlamento inglês em
dos monarquistas que haviam sido vendidos como servos no Caribe.7 Aquelesjo-
vens ingleses que ainda estavamdispostos a partir para as colônias como servos
contratados voluntários viam isso como um passaporte para a possível fortuna e li-
berdade.
Para garantir seu controle sobre a Irlanda, os governantes britânicos organiza-
vam ou incentivavam periodicamente a deportação ou o exílio de dezenas de milha-
res de irlandeses. A celebração da liberdade dos ingleses ocorria junto com sua negação
para os irlandeses católicos. Na década de 1650, cerca de oito mil cativos irlandeses
foram enviados para as colônias americanas, muitos deles sob contratos penaisde
dez anos. A quantidade poderia ter sido maior, mas duas circunstâncias limitaram
seu número. Em algumas ocasiões, como no Tratado de Limerick em 1701, os co-
mandantes das tropas irlandesasnegociaram condições que permitiam o exíliohon-
rado de seus homens; partir para tornar-se trabalhador braçal numa plantationnão
seria uma alternativaaceitávelpara os membros da famosa Brigada Irlandesa do
Exército Real francês. No entanto, com certeza havia cativos irlandeses que tinham
pouca escolha. Na Inglaterra havia personalidades influentes, como Sir William Petty,
que especulavamsobre a deportação forçada de um número maior de irlandeses.
Mas, embora alguns milhares de prisioneiros tenham sido enviados para asplantatiow,
as autoridades relutavam em enviar ainda mais por razões de segurança. Como ca-
tólicos, os irlandeses tenderiam a se aliar aos franceses em caso de guerra, como fi-
zeram em Saint Kitts em 1666-67;além disso, este perigo era quase tão grave no
caso dos servos irlandeses voluntários, e ainda pior no caso daqueles que, depois de
cumprirem seu contrato, recebiam a liberdade na colônia. Os servos irlandeses»
principalmente os condenados a muitos anos de servidão, eram conhecidos por s ua
capacidade de conspirar com os negros, como fizeram nas Bermudas em 1661. Os
-
servos irlandeses de Barbados foram acusados em 1686 de "estarem ligados ou sa
berem do último levante tramado pelos negros para destruir todos os senhores e
senhoras."' Na década de 1690, irlandeses servos e livres foram presos em Barbad 0S
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
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soba acusação de ajudar os franccscs c de cstarcm prontos a apoiar escravos rebel-


dcs;os irlandeses católicos eram gcralmcntc cxcluídos da milícia, embora alguns
negrosrecebessem armas.
As autoridades coloniais francesas tinham necessidade ainda mais premente de
encontrarmão-de-obra para asplantations por causa da reduzida emigração. A França
tinhauma grande população, mas, como ressaltou Le Roy Ladurie, o regime rural
meu-opolitanoabsorvia a mão-de-obra e não gerou a migração voluntária ocorrida na
9 Além disso, a monarquia afirmava proteger a liberdade de seus súditos
Inglaterra.
francesescatólicos, o que limitava sua capacidade de incentivar a emigração involuntária.
Esta garantia real era parte da aliança tácita entre o rei e seu povo contra o poder dos
grandesnobres. Na verdade, a liberdade pessoal do súdito era a mais importante a ser
reconhecida,por ser tão restrita a participação política. O século XVII foi notável pelo
crescimentoda consciência popular etnocêntrica, tanto na França quanto na Inglater-
ra, que sustentava que membros da comunidade nacional e religiosa tinham a garan-
tiade certos direitos civis mínimos. O definhamento de formas de servidão direta na
metrópolefora considerado uma conquista popular, e o fato de estar livre da escravi-
bispo de
dãoera considerado um direito de todo verdadeiro cristão e súdito leal. O
intei-
Grenobledescreveu a França em 1641 como "a monarquia mais livre do mundo
"Vós não
ro", enquanto Massillon afirmava que os monarcas precisavam recordar:
liberdade quanto
governaisescravos, e sim uma nação livre e impetuosa, tão ciosa de sua
sob o reina-
desua lealdade."10A construção de um estado completamente absolutista
acontecimentos como
do de Luís XIV limitava bastante a noção de liberdade pessoal, e
mandados para
a sufocaçãoda Fronda geraram alguns prisioneiros que poderiam ser
nobreza rebelde
as galésou para as colônias. Mas o objetivo era derrotar e integrar a
para a colonização,
e seusseguidores; depois de punidos, poderiam fornecer quadros
do XVIII, a tendência
masnão mão-de-obra braçal. No fim do século XVII e início
sujeição pessoal direta do camponêsou
naárearural na França ainda estava longe da
grandes fomes de 1693 e 1707, por epide-
trabalhador.O campo foi despovoado pelas
camponeses tinham poucas maos disponíveis
miase pela guerra. Tanto nobres quanto
muito poucos emigrantes voluntários.
Paratrabalhar a terra. Nestas condições, havia
recolher supostos vaga-
Quando o Conselho da Regência instruiu os intendentes para
porque esta medida ameaçavapri-
bundosem 1718-20, houve uma onda de oposição contribuiu
necessários. O clamor resultante
donos de terras de frabalhadores muito
de que o soberano confirmara a
Paraa queda de Law harmonizou-se com a noção
e
liberdadesocial do
súdito.ll estavam prontos a matar
Nas brigas religiosas da Cristandade, os adversários forçada e, se
Tentariam a conversio
de fome,queimar
e massacrar uns aos outros,
ROBIN BLACKBURÑ

esta falhasse, a expulsão. Mas devido à paranóia intermitente das autoridades reais
francesas a rcspeito da heterodoxia de seus colonos, elas não sc dispunham a con_
fiar-lhes a custódia de hereges. Depois da eliminação dos huguenotes no sul da Fran
em 1703, um total aproximado de cinco mil rebeldes camisard$ foram mandados para
as galés. Mais ou menos nessa época as autoridades estavam fazendo todos os esfor_
ços para recrutar mão-de-obra para asplantations, mas, compreensivelmente, impe-
ditam a remessa de vigorosos huguenotes que procurariam a primeira oportunidade
para umr-se aos seus correligionários ingleses e holandeses, ou aos piratas, muitos
dos quais eram também huguenotes.
Os donos deplantations eram exigentes em sua necessidade de mão-de-obra. O
comércio atlântico de escravos lhes fornecia jovens adultos vigorosos, geralmente
entre 16 e 25 anos e, ao contrário da maioria de condenados europeus, com conhe-
cimentos agrícolas muito úteis. Embora a servidão voluntária fosse desejável,os
âzendeiros não queriam receber as categorias que a metrópole achava mais fácil
enviar: deficientes e aleijados, velhos mendigos ou criminosos incorrigíveis. De
qualquer forma, era raro que houvesse muitos criminosos comuns disponíveis como
servos involuntários. Os jovens que foram vítimas da nova ordem na Escócia eram
fora do comum, porque os fazendeiros tinham excelente opinião sobre seu poten-
cial; mesmo depois de rebeliões ou devassas, o número disponível raramente passa-
va de mil ou dois mil por ano.
Se os donos de plantations quisessem trabalhadores europeus, teriam de atraí-
10scom contratos voluntários. Pelas razões citadas acima, os donos deplanrations
franceses nunca atraíram um grande fluxo de engagés.A quantidade dos que par-
tiam para as colónias britânicas diminuiu a partir de 1660.No entanto, esta redução
atingiu primeiro o Caribe. Os proprietários de pequenas e médias plantationsdas
colónias inglesas na América do Norte continuaram a contar principalmente com
servos até as primeiras décadas do século XVIII. Enquanto houvesse um fluxoade-
quado de homens e mulheres jovens dispostos a trabalhar como servos contratadOS,
eles eram considerados preferíveis aos inexperientes africanos. O servo ou engagé
conhecia o idioma de seu senhor ou senhora e estava familiarizado com as ferra-
mentas e os hábitos europeus. A quantidade atraída pela perspectiva de vida nas
colónias inglesas durante meio século depois de 1624 significava que o trabalho sem l
era mais barato que o dos escravos africanos. Os produtores de fumo consideraram
o trabalho servil sob contrato adequado a este tipo de cultivo, além de barato e razoa-
velmente abundante. Os próprios servos pareciam estar mais dispostos a ir para a
Virgínia ou para as primeiras colónias do Caribe — em parte porque acreditavam
que receberiam terras ao final de seu contrato,
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 387

Mas mesmo no cultivo do tabaco houve a substituição do trabalho servil pelo


escravonas últimas décadas do século XVII e nas primeiras décadas do XVIII.
Comoa fertilidade da terra era variável e era mais fértil ao ser plantada pela pri-
meiravez, é difícil comparar a produtividade. Mas Lorena Walsh, depois de com-
pensaresses fatores, descobriu que "a produção por trabalhador teve um pico durante
0 anoem que a proporção de escravos chegou a mais da metade A produ-
tividademaior dos escravos vinha tanto do fato de serem mantidos no trabalho de
formamais intensiva quanto de uma rotatividade mais baixa da mão-de-obra e,
recém-chegados. Segundo
emconseqüência, menos tempo gasto no treinamento de
o ano — eram libera-
Walsh,os escravos da Virgínia tinham poucos feriados durante
de Pentecostes—
dosdo trabalho apenas no Natal, na Páscoa e no domingo
Os escravos tam-
trabalhavamà noite e, na época da colheita, até aos domingos.
colher e processar os prin-
bémadquiriam perícia nas tarefas complexas de cuidar,
produtos. Isso aconteceu tanto na cultura de fumo quanto nas de açúcar e
cipais
tão elaborado como a fervura
algodão,embora o processamento do primeiro não fosse
ea purificaçãodo caldo de cana.
voluntariamente, até mes-
A maioria dos servos e engagés europeus submetia-se
condição, como jovens trocando alguns anos de trabalho duro
mo alegremente, à sua
futuro melhor. O sistema de servidão sob contrato foi descri-
pelaesperança de um
de aprendizes; em alguns casos o contrato
tocomoo equivalente colonial do sistema
em determinada tarefa. Como a camada
determinavaque os servos só trabalhariam
punidos fisicamente. Ao contrário
inferiorde aprendizes na Europa, podiam ser notícia de maus-
vendidos sem consentimento. A
daquelesaprendizes, poderiam ser
os mais miseráveis -—
efeito
tratosnasplantations acabou desestimulando todos, exceto
O servo contratado conservava
que,naturalmente, não teve equivalente africano. ambas as razões ti-
liberdade, e por
algunsdireitos e tinha uma perspectiva real de muitos deles ex-servos,
Os vizinhos,
nhauma posição social diferente do escravo.
continente.
agiamprovavelmente como fator restritivo no invaria-
Caribe é descrito em termos
ou engagé no
O destino do servo contratado escreve:
Richard Ligon
velmentesombrios pelos contemporâneos.
são manti-
sempre ao seu senhor,
para
Os escravos e sua posteridade, submetidos que são deles por apenas
os servos,
dos e preservados com mais cuidado do que tempo os servos têm a pior
este
cinco anos, segundo a lei da ilha. Assim, durante acomodações e sua dieta
péssimas
vida, pois são submetidos a trabalho muito duro,
é muito leve. 13
388 ROBIN FLACKRURN

Du Tertre fala de um padrão semelhante nas ilhas francesas:

O tratamento cruel dispcnsado pelos senhores a seus servos franccscs contratados


anc» é a única coisa que a mim parccc prrocupantc: pois elcs são postos
a
trabalhar excessivamente, são muito mal alimentados c são quasc scmprc
obriga-
a trabalhar na companhia dc escravos, o que aflige essa pobrc gcntc mais
do
que todas as excessivasdificuldades que cnfrcntam.

O sentimento racial evidente nesta última observação explica cm partc a percepção


de
que a condição do scrvo era, na vctdadc, pior que a dos cativos africanos, já que
estes
emmconsiderados mais adaptados ao seu papel. Mas os servos europeus podem muito
bem ter sido traídos por sua própria esperança de ter um tratamento razoávelou habi-
tual. Costumavam acreditar que seu empregador era obrigado a alimentá-los, vesti-
e abrigá-los, como era estipulado no contrato. Como não tinham habilidade para
sobreviver em ambiente subtropical, a alternativa de cuidar de si mesmos era árdua.
Os fazendeiros descobriram que era mais barato manter os africanos porque eleseram
mais independentes mais capazes de construir uma cabana adequada ao climae
mais dispostos a cultivar uma roça. O escravo do Caribe não contaria com seu propri-
etário para fornecer-lhe meios adequados de subsistência, mesmo que acreditasseque
seu senhor tinha o deverde garantir que ele não morresse de fome em época de seca.15
Diante da perspectiva indefinida de servidão, o cativo africano tinha mais motivopara
se conformar com a situação, por pior que fosse.
Os servos contratados podiam exigir e exigiram proteção dos tribunais com base
em seus contratos, que indicavam condições gerais do serviço e a data do término.
Com toda probabilidade seu caso seria julgado por outro dono de plantation, que
tenderia a favorecer o colega proprietário ao proferir a sentença. Mas, se a saúde
permiússe, o tempo de serviço chegaria a seu termo. Já se calculou que de cada dez
servos enviados para as colónias inglesas da América do Norte, um se tornaria fa-
zendeiro relativamente próspero, um se tornaria artesão e os oito restantes morreriam
em serviço, voltariam à Inglaterra ou se tornariam "brancos pobres". Cerca de um
terço dos proprietários de terras da Virgínia em 1666 eram ex-servos contratados•
No Caribe, a maioria absoluta dos servos morria ou emigrava; entre os pouquíssimOS
que se tornaram proprietários, estavam os que viraram piratas ou corsários.

Como o regime de trabalho era pesado demais, muitos servos contratados fugiam
Seu cativeiro cra menos durável, em todos os sentidos, do que o dos africanos
o
mais frágil e mais breve, Escravos e servos em fuga às vezes se ajudavatn,
servo tinha mais probabilidade de continuar em liberdade. Comparado ao escravo
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
389

fugido,o servo europeu tinha uma boa possibilidade de permanecer anônimo, ou


mesmode encontrar solidariedade em meio à população de colonos livres. Muitos
destesúltimos eram, naturalmente, também ex-servos contratados. O trabalhador
europeuera o beneficiário de uma "economia moral" colonial que os donos deplantations
acharamprudente aceitar. As punições exemplares que obrigavam os escravos afri-
canosa trabalhar nas condições mais atrozes não poderiam ser normalmente utili-
adas contra os servos brancos e "cristãos" que não tivessem cometido algum crime.
Emtempos de perigo, estes seriam alistados na milícia, mas não os escravos negros
dasplantations.
A redução do número de servos contratados enviados pela Inglaterra depois de
1660refletiu o fato de que a população já não estava crescendo tão depressa. Pode
sertambém que houvesse menos disposição de suportar os rigores da servidão colo-
nial—ou, pelo menos, isso é sugerido pelas observações defensivas dos que alardeavam
a necessidadedo sistema. Ao escrever depois da Restauração, um proponente do
sistemade servidão declarou:

Por que deveria haver um Obstáculo tão exclusivo nas mentes e disposições pouco
razoáveisde tanta gente contra o tempo limitado de servidão convenientee Ne-
cessária,quando é uma coisa tão essencial, que sem ela o melhor dos Reinos se
dissociariade seu Governo tranqüilo e bem estabelecido. Desta doutrina niveladora
con-
nósaqui na Inglaterra nestes últimos tempos (cujo ventre nada gerou senão a
fusa Rebelião)já provamos demais, e foi diariamente tocada nos ouvidos do tu-
multuosoVulgo pelos Líderes Sectários da Época.

vendi-
Esteautor insistia que era uma calúnia dizer que os servos contratados "são
Mas
dosem mercados para escravos" ou obrigados a puxar carroças como cavalos.17
servos in-
estasafirmativas não conseguiram restaurar o fluxo cada vez menor de
aumentou.
gleses;o de engagésfranceses sempre fora bastante modesto, e não
anos tornou-se
O fato de que os servos exigiriam a liberdade depois de alguns
de tempo
umadesvantagem maior para os proprietários à medida que a perspectiva
colheita deste
daplantationse estendia. Enquanto o produtor de fumo pensava na
cinco anos de
anoe do próximo, o de açúcar preferia planejar com três, quatro ou
uma força de trabalho permanente e
antecedência.Os escravos ajudaram a formar
contratados tinha
coletivacuja eficiência cresceria com o tempo. O grupo de servos
contratos expira-
deser constantemente organizado e reorganizado à medida que os
trabalhando nas
Varn•Dificilmente os ex-servos se ofereceriam para continuar
considerações eram
plantations,ou só o fariam em troca de salários muito altos. Estas
trei-
Particularmenteimportantes no caso do trabalho especializado. Os frutos do
390 ROBIN BLACKBURN

namento de um escravo numa determinada tarefa continuariam a amadurece


resto de sua vida produtiva. Embora brancos fossem empregados
artesãos e supervisores, contadores, médicos e engenheiros, eles tinham de
altos salários anuais — quase sempre tanto ou mais que o preço de um escravo.
se economizar com o treinamento de escravos para desempenhar
os fazendeiros incentivaram escravos a tornarem-se carpinteiros,
teiros, além de técnicos especializados na fabricação de açúcar- Tato
coloniais quanto os colonos livres tentaram restringir esta promoção de
trabalhadores especializados,já que provocava a exclusão dos branca de
pregos e gerava temores quanto à segurança. As assembléias coloai2.S
"leis de deficiência", estipulando uma proporção mínima de brancos
ser empregados em cada fazenda; mas, assim como outras tentativas de
tar asplantations, elas não foram muito eficazes quando se chocaram
ses individuais dos fazendeiros. Talvez não surpreenda o Eto de gue 2
permitiu ao fazendeiro colher os frutos da formação de humanam i
sua mão-de-obra. Nos Capítulos X e XI daremos detalhes da crescza:z
de escravos especializadosnas plantationsdo século XVIII. li
Enquanto os servos formaram um grande componente da de
havia um traço potencial de solidariedade entre eles e os escravos Ez
Barbados na década de 1650, e na Virgínia na década de 1670 a
grande número de servos brancos com um número crescente de escravos
se — talvez não só por razões políticas— especialmente instáveL Mesmo
de alianças momentâneas, os servos e escravos tinham às vezes recursos
tes, assim como crioulos e africanos ou negros e índios, já que nestes casas
nor a possibilidade de se verem presos num único meio social. Houve
de servos e escravos ajudando-se mutuamente contra os âzendeiros e as
des na Virgínia e nas Índias Ocidentais. Durante as guerras holandesas
tos de servos e escravos que se uniam na Virgínia para fugir de seus se±cres,
para roubar leitões, ou simplesmente para beberem juntos em vez de se
a seus afazeres. 19Nos últimos dias da Rebelião de Bacon houve um ato
resistência de servos e escravos, enquanto nas Pequenas Antilhas ocorrera.=
de cooperação entre escravos fugidos e caribenhos.
Mas, naturalmente, as condições predominantes não favoreciam um
de aliança" de todos os oprimidos e explorados; os índios eram o alvo
Rebelião de Bacon, e os "caribenhos negros" das Pequenas Antilhas
tinham comportamento favorávelaos arauaques sobreviventes. A consoliE# 3
escravidão cada vez mais se baseou num bloco raciaL Os casos de resistêná2
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 391

na Virgínia depois da década de 1670 e em Barbados depois


juntade servos e escravos
vez mais raros. Nessa época os que possuíam ou comerciavam
de1690ficaram cada
dispunham de muita riqueza e poder, e tinham inclusive a capacidade de
escravos
escravos uns dos outros. Tanto brancos pobres quanto
separarservos de escravos, e os
escravosprivilegiadospodiam conseguir algumas concessões no sistema de escravi-
dãocolonial,mas como o sistema escravista concentrava muita riqueza e poder em
poucasmãos, estas concessões tinham forçosamente um caráter limitado.

Aescravidãoafricana no Caribe expôs a deformada qualificação racial da adesão ou


européiapopular à liberdade pessoal. A massa de colonos livres podia admitir
aspiração
comfacilidadeque compartilhava interesses e anseios cívicos com os servos contra-
tados.Sentimentos semelhantes em relação aos africanos escravizados eram muito
maisraros, embora não totalmente inexistentes; com o estabelecimento do sistema
estes sentimentos foram eliminados pelo medo e pelas recompensas do
escravista,
social.Antes da construção dos novos sistemas escravistas, os europeus
privilégio
comcertezajá estavam predispostos ao sentimento racista, mas o homem comum
eratambémhostil à idéia de seus superiores possuírem escravos. Os proprietários
deescravostentaram usar a animosidade racial em favor da escravidão, mas este
sentimentotambém poderia emprestar uma outra dimensão à hostilidade em rela-
Sãoà manutenção de escravos. Os colonos brancos da América do Norte, ao desde-
nharemas exigências dos índios selvagens, tendiam a ver o continente como destinado
peloTodo-Poderosoa ser colonizado por eles. Não havia nenhuma boa razão para
quea maioriadeles festejasse a introdução de escravos africanos, que só iria aumen-
taraindamais o poder de alguns poucos colonos ricos. Um dos primeiros panfletos
a atacara escravidão na América do Norte foi The Selling d Joseph (A venda de José),
deSamuelSewall, publicado em Boston em 1700. Esta obra contém alguns argu-
mentosrazoáveiscontra a moralidade pessoal e social da escravidão, mas também
apelaparanoções de aversão à diferença racial: "Há tanta disparidade em suas con-
dições,cor e cabelo que jamais poderão se incorporar a nós e construir famílias or-
delraspara o povoamento da terra, mas sim permanecer em nosso corpo político
comoum tipo
de sangue estranho."20
Nascolôniasda Nova Inglaterra e do Atlântico tropical, como na própria Eu-
ropa,a hostilidadeà escravidão funcionou para limitar a entrada de escravos.
Vezesela era certe-
reforçada pela antipatia racial, embora negros livres fossem com
Zamaisaceitáveis os que não
do que os escravizados. Nas colônias de plantation,
Possuíamescravos e não estavam em
tinham pouco poder político ou econômico
Posiçãode impedir desejassem; se não
que os grandes fazendeiros fizessem o que
ROBIN BLACKBURN

fossem embora. O pcqucno fazendei_


gostavam da escravidão ou dos escravos, que
até certo ponto para partilhar com
ro que comprava alguns escravos c se preparava
dos tipos mais repugnantes de
eles a sua estava pelo menos elevando-se acima
com a solidariedade racial de
preconceito racial, e ao mesmo tempo ainda contava
seus vizinhos.
a
Naturalmente, o sentimento racial serviu para fortalecer escravidão depois
estabelecida. Quando fizerama
que uma população razoável de escravosjá estava
plantatiow tiraram vantagem do
transição de servos para escravos, os donos de
vista como uma ameaça
ato de que a simples presença dos cativos africanos era
do
pr quase todos os colonos brancos, com exceçãoapenas rebelde desesperado
ou do religioso radical. O comerciantee o proprietário de escravos introduziram
nas colôaias uma categoria de gente que — eles mesmos insistiam — era perigo-
sa, capaz de qualquer atrocidade se não fosse vigiada e controlada de perto. De-
pois que atingiu determinado patamar, a introdução de africanos como escravos
estimulou o medo e a solidariedade raciais, que ajudaram a garantir ao dono de
—cravos a posse de sua propriedade. O medo racial era provavelmente tão impor-
tarte quanto o privilégio dos brancos para angariar o apoio dos pequenos fazen-
dá-os brancos independentes. O medo e o privilégio, ambos surgidos em relação
negrtF, a capacidade de "interpelar" espontaneamente os brancos
e fizer com que vissem a si próprios da mesma forma que os escravos deveriam
seja, como membros de uma raça dominante —, fornecendo-lhes assim
elementos básicos de sua identidade racial.21A resistência e a rebelião dos escra-
vos muito raramente provocaram a morte de brancos, enquanto o esmagamento
da revolta era sempre seguido de grandes retaliações. Os brancos às vezes tam-
bém alimentaram fantasias extravagantes a respeito das intenções dos escravos. A
psicologia do medo gerou um tipo de paranóia "racional". Richard Ligon alertou
que, se os escravos de Barbados tivessem alguma vez o "poder ou vantagem", eles
iriam 'cometer algum horrendo massacre de cristãos, para assim se libertarem e
se tomarem senhores da ilha."22

Os que construíramplantations operadas por escravos e os seus patrocinadores'


o fizeram para ganhar ou aumentar sua fortuna; a disposição para infligir gran-
de sofrimento ao escravo negro era paralela a esta estratégia de enriquecimentO•
Os primeiros a propor colónias ultramarinasinglesas, francesas ou holandesas
-
não haviam vislumbrado propriedades cultivadas principalmente por trabalha
dores africanos, nem colónias em que os brancos fossem minoria. Mas mercadoreS
-
e fazendeiros descobriram que a fórmula funcionava. Esses homens dispunha m
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
393

comfrcqüência a submeter também europeus indefesos a degradação e maus-


tratos.O que viam como diferença racial dos africanos e negros removeu qual-
querescrúpuloremanescente. O motivo econômico do uso de escravos como
meiode conseguir a fortuna foi reforçado e generalizado pela competiçãoco-
mercial.Alguns fazendeiros se convenceram de que estavam fazendo um favor
a seusescravos, mas, fosse qual fosse a desculpa, a rivalidade econômica obri-
gou-osa recorrer à mão-de-obra escrava para permitir a sobrevivência, sem falar
no lucro.
Como surgimento do comércio holandês de escravos e das plantationsin-
glesas,apareceram práticas seculares e utilitárias de escravidão racial que eram
codificadaspor leis, e não por injunções religiosas; o CodeNoir francês era um
tipode meio termo desastrado. As leis sobre escravos atualizaram a legislação
romanae medieval e trataram os escravos como propriedade privada, como ameaça
permanenteà ordem civil, como equivalentes ao servo mais preguiçoso e rebel-
deem termos de autoridade e comparáveis a animais de carga na maioria dos
outrosaspectos.Osgentlemen do século XVII tinham fortes preconceitos de classe
e raciais,de tal forma que os dois mais ou menos se fundiam. A condiçãode
escravotambém poderia ser entendida, em termos da ideologia patriarcal, como
a dealguémemasculado e "feminizado": o "scold'sbridle" ("arreio da rabugen-
ta"),usado para calar mulheres impertinentes, iria reaparecer nas plantations,
assimcomocaldos e queimaduras como armas de "correção" ou terror (as pu-
niçõesde escravos são discutidas adiante, na parte sobre segurança nasplantations).
Masenquantoa virtude das mulheres européias era protegida ferozmente, a das
escravasera violada sem muita preocupação, ou atrelada a políticas grosseiras
de natalidade. 23
O costume generalizado de considerar os escravos como bestas de carga é reve-
ladonos inventários, em que escravos e animais são listados lado a lado. Quando
MorganGodwyn defendeu o batismo de escravos, os donos deplantations insistiriam
queos negros "eram animais e não tinham mais alma do que os animais". Os fazen-
deirosdavam aos escravos nomes normalmente usados para cães, cavalos, macacos
ouvacas("Saltador", "Brincalhão", "Pronto", "Juno", "César", "Fido" e outros).
E o escravoadulto e não costuma-
também podia ser conhecido por um diminutivo,
Vater sobrenomede família. No Caribe, uma proporção maior de escravos tinha
nomesafricanos,embora, de modo geral, estes fossem minoria, enquanto nas colô-
masde potências "cristãos". Como
católicas os padres às vezes insistiam em nomes
mencionaIra Berlin,
alguns fazendeiros, como Robert Carter, achavam importante
dar nome aos seus
escravos. 24
394 BLACXBURX

O acesso ao comércio atlântico de escravos em grande escala


escravos podiam ser comprados em quantidade por azendzims que
uma demanda aparentemente inesgotável por seus produtos. Depois
opção pelos escravos, não houve mais, na prática restrições de
impedissem a expansão da produção dasplantation.r.Poranto,
nova dimensão do comércio atlântico de escravos antes de delinear o covo
das própriasplantatiow. Como veremos, os povos da África Oáiental e
dental eram vulneráveis à captura, de uma forma que não se na

O fornecimento de escravos e a mudança


para a escravidão

O momento da transição para a mão-de-obra escrava foi bastante influenciado pelo


preço de compra dos escravos em relaçãoàs alternativas cada vez mas —assas. Assi-z;
a escravidão disseminou-se do Caribe à América do Norte inglesa num período
três ou quatro décadas, refletindo os custos mais altos de transporte envol'.idos,
exigências de mão-de-obra mais modestas da produção de fumo e a maior disposi-
ção dos servos contratados de se submeterem ao trabalho nas fazendas da Améria
do Norte. O momento decisivo ocorreu na década de 1680. Os grandes fazendeirs
de Chesapeake precisavam de mais trabalhadores no campo para expandir a produ-
ção; não havia servos europeus disponíveis em número suficiente, e os existentes
se dispunham a assinar contrato em troca de terras e boas condições de trabalhosO
preço dos escravos estava caindo, enquanto o nível salarial europeu subia. O
ro de escravos levados para Chesapeake aumentou de I .700 em 1670-80 para 7300
em 1680-90, 7.700 em 1690-1700e 10.700em 1700-10.Na década de 1690,
te de servos secou temporariamente, e os escravos cobriram parte dessa falta; quat-
do os servos novamente passaram a chegar em grande número depois de 1700,
muito menos provável que fossem destinados ao trabalho no campos Quanto às ilhas
francesas, o fluxo de engagéssempre fora insuficiente, e seus colonos esta',uut
tos a comprar escravos assim que tivessem recursos e oportunidade de fazê-lo.
Caribe francês, assim como na América do Norte inglesa, a passagem do século
a transição para um novo tipo de comércio de escravos no qual os privilégios
polistas das antigas Companhias da Africa foram abrandados em favor de
ciantes independentes, agindo às vezes com licença das companhias e frequentem ente
desdenhando até mesmo esta formalidade. 2S
A CONSTRUÇÃODO ESCRAVISMO NO NOVOMUNDO:1492-1800
396

fica claro na Tabela VIII. I que o crescimento dasplantations inglesas e france-


sasapoiou-se no fornccrmcnto crcscentc dc escravos.

Tabela VIII.I Escravos tirados da África pclo comércio atlântico no século XVII

Número dc cativos Prego médio (E)

1601-25 225.400 4,27


1625-50 218.800 4,27
1651-75 5,26
1676-1700 723.000 3,67

H. A. Gemery e J. S. Hogendorn, "Elasticity ofSlave Labour Supply and the DevelopmentofSlave


in the British Caribbearf', em Ruben e Tuden, eds., Comparative Perspectiveson Sla•.xryin IVetoWoru
PLnz:ios SEie:ics, Nova York 1977, pp. 72-83.

A tendência de queda do preço dos escravos na costa africana, indicada por alto
na Tabela VIII. 1, é particularmente notável tendo em vista a duplicação e triplicação
do volume do tráfico nos dois últimos quartos de século. A queda de preço deve ter
estimulado a opção dos fazendeiros pela escravidão. 26Ela refletiu a eficácia cres-
centeem termos de custos dos métodos de captura, venda e transporte dos escravos,
cativeiro
apesarda elevada mortalidade dos cativos em todas as fases da travessia do
africanoaté a escravidão no Novo Mundo.
de século di-
O conflito entre os holandeses e portugueses no segundo quarto
abastecimen-
minuiua demanda de escravos da América e desorganizou as rotas de
provocou o aumento
to.O surgimento das novas colônias deplantation por volta de 1650
franceses passa-
da demanda e elevou os preços quando os comerciantes ingleses e
de mercadorias
ram a encomendar escravos. Os holandeses ofereceram uma série
inclusive armas de
maisatraentes e variadas aos comerciantes e chefes africanos,
européias
outras potências
fogo,pólvora e artigos de metal e tecidos mais finos. As
montados pelas companhias
Seguiramo exemplo, Os fortes e as feitorias comerciais
muito cara, sem oferecer garantia de
de comércio de escravos tinham manutenção
era agora muito mais acirrada, e em
melhorescondições no negócio. A competição
—- homens como Edward Barter,
anos pontos da costa príncipes mercadores africanos
suas próprias
John Konny,John Kabes e Asomani construíram e fortificaram
com os contrabandistas, Em 1693,
feitoriase mantiveram relações comerciais ativas
Christianborg em Accra, e instalou-se
Asornanicapturou o castelo dinamarquês de
em Christianborg, construiu
aliCornogovernador; embora não tenha permanecido
Os príncipes
canhóes.27
urncastelo para si mais abaixo na costa, defendido por
396 ROBIM BLACKBURÑ

mercadores geralmente precisavam de boas relações com um dos goVcrnantcs (103


grandes estados, que assim conseguia recursos económicos e armas em melhores
condições.
Os príncipes mercadores também tinham scUs próprios agentes em várias par.
tes da costa e em pontos estratégicos rio acima. Os franceses relataram que esses
homens costumavam construir uma caseà Ia portugaise,que parece ter sido produto
€pico da cultura crioula afro-européia que crescera nos centros dc comércio africa-
nos. Por causa dc sua prioridade no ccnário c da maior tendência a misturar-se com
os africanos, a matriz cultural na maior parte da costa tinha um carátcr luso-africa-
no, sendo comuns os naturais dc origem portuguesa. No entanto, a chamada "casa
portuguesa" era uma estrutura dcsconhccida cm Portugal. Costumava scr compri-
da, com um vestil)ulo ou pórtico aberto na frcntc c uma grande varanda arejada em
toda a volta; as paredes podiam scr construídas dc pedra ou taipa, e agradavelmente
caiadas. Tanto a África como a índia parecem ter fornecido elementos para a caseà
Ia portggaise, estrutura que seria imitada cm todo o mundo colonial e que influen-
ciou a casa-grande brasileira. 28
Nas primeiras décadas do século XVIII, a sede de escravos dos donos de
picrtctioxs americanas foi saciada por um aumento ainda maior do número de
cativos embarcados e o preço na costa africana passou a subir constantemente.
Isto provocou o estranho resultado de fazer com que os mercadores europeus
de escravos se sentissem explorados pelos africanos com os quais negociavam.
Em 1705, a Real Companhia Africana queixou-se, num memorando ao Parla-
mento britânico, que os mercadores locais eram "tão insolentes que não se pode
negoctar com eles em termos razoáveis", acrescentando: "na atual situação [o
comércio] só é vantajoso para os nativos da Guiné e prejudicial para a Compa-
nhia e as Plantations".29
Esta afirmação extraordinária só descreve um aspecto das relações bilate-
rais na costa. Os vários estados africanos envolvidos no comércio de escravos
eram agora menos dependentes das potências européias, embora, em alguns casos,
dependessem cada vez mais, como os outros estados atlânticos, de recursos que
só podiam ser conseguidos através do atendimento da demanda do mercado. A
expansão do comércio de escravos estava agora associada ao crescimento dos es-
tados africanos, cuja raison d'être era cada vez mais permeada pela necessidade
de garantir novos suprimentos de escravos por meio de tributos, guerras, distorção
de processos judiciais ou degradação de povos dependentes, No sudoeste da Africa,
a restauração do controle português incentivou a exportação de escravos quan-
do os governadores coloniais reconstruíram as redes de recolhimento de tribu-
DO ESCRAVISMO NO NOVO
A CONSTRUÇÃO MUNDO: 1492-1800 397

homens; outros comerciantes dc escravos europeus


tospagosem podiam ad-
desta região no porto dc Luango, ao nortc do rio Congo. Na
quirirescravos África
Ocidcntal,a multiplicação de postos comerciais e dc instalações comerciais aper-
feiçoadase a contínua fragmentação política favoreceram o aumento da expor-
de escravos em rcgiõcs como o Golfo do Benim, onde os estados locais já
haviam tentadolimitar o tráfico. A unificação dc Kajoor e Bajo (Scnegâmbia)
em1695,sob o governo de Latsukaabc c scu exército dc escravos mosqueteiros,
consolidou um regime caçador de escravos que vivia das trocas pelo Atlântico,
mesmo sendo duro nas negociações. O monarca do Daomé abandonou o tráfico
deescravospor vários anos no início do século XVIII, mas a combinaçãode
intensa competiçãomilitar e econômica acabou quebrando sua resistência.No
período de 1640 a 1800, a África Ocidental despachou cerca de 4 milhõesde
scravos,dos quais 1,5 milhão vieram do Golfo do Benim. Compare-se este número
como total de cerca de 3,2 milhões de escravos exportados do sudoeste africano
durantetrês séculos, de 1500 a 1800.30Winthrop Jordan, escritor que enfatiza
asanimosidadesraciais dos europeus no período pré-escravidão, escreve, no en-
tanto,sobreos primeiros anos da colonização:

Nãohá razão para supor que os ingleses estivessem ávidos para escravizar negros,
nemmesmo para considerar excêntrico Richard Jobson em sua resposta à oferta
de um chefe de vender-lhe alguns "escravos": "Eu dei a resposta, Somos um povo,
quenão negocia de jeito algum com essas mercadorias, nem compramos ou ven-
demosninguém, ou nada que tenha nossa própria forma."31

Masa bravata de Jobson em 1623 era inócua, e os ingleses tornaram-se os maio-


restransportadoresdo tráfico de escravos do século XVIII, que já era muito
maiordo que nos séculos XVI e XVII, Holandeses, ingleses e franceses demons-
taramalguns escrúpulos iniciais sobre o assunto, mas logo a pressão competitiva
ta lógicado comércio tornaram o tráfico de escravos amplamente acei-
atlântico
realeza, aben-
na verdade, um ramo do comércio a ser patrocinado pela
Soadopeloclero e praticado por nobres e aristocratas, como na Real Companhia
ncana inglesa.
tornou acei-
ânsiade lucro exigiu o comércio de escravos; a exclusão racial
távelqueafricanos jamais permitida para um europeu;
fossem tratados de forma negreiros que
africanoseram nos navios
amontoados de forma tão apinhada
úniconavio podia vezes mais escravos do que servos
carregar três ou quatro
navios negrei-
ou até condenados europeus; a mortalidade maior nos
398 nontN BLACKBURN

ros não reduziu a imensa vantagem cm termos de custo quc isto representava para
os mercadores, O sentimento racial cra parte do funcionamento das plantationsc
fornecia a basc do medo c do privilégio que uniam os colonos brancos. Mas os
mercadores que patrocinaram o tráfico atlântico dc escravos e os estadistas e filó-
sofos que o endossaram não costumavam ter experiência direta da escravidão. Sua
avaliação das vantagens pessoais, nacionais ou de classe, sublinhada por um sen-
timento de superioridade racial e religiosa, bastou para conceder aos donos das
plantationseste elemento decisivo. Não encontrei provas de que os mais preocu-
pados com a construção dos sistemas escravistas fossem estimulados pelo senti-
mento racial. Tomemos o caso de John Locke. Como vimos, ele era um dos investidores
da Real Companhia Africana; como membro atuante do Board of Trade and
Plantations, pode com certeza ser considerado um dos fundadores da escravidão
colonial inglesa. Ainda assim, ele considera'.a qualquer tentativa de excluir os negros
da raça humana como ilusão infantil, e escreve: "uma Criança que conceba uma
Idéia de Homem, é provável que sua idéia seja como aquele Quadro que o Pintor
faz das Aparências visíveis reunidas, e tal Combinação de Idéias em seu entendi-
mento forma a Idéia complexa e única que ela chama de Homem, e portanto, sen-
do ele branco ou cor de carne na Inglaterra, a Criança pode demonstrar-vos que
um Negro não é um Homem, porque a cor branca era uma das idéias simples
constantes da idéia complexa que ela chama de Homem; E portanto ela pode
demonstrar pelo Princípio segundo o qual: "É impossívelque a mesma coisaseja,e
não seja', pe gr, Negronão é am Homem; o fundamento desta Certeza não sendo
aquela Proposição universal, que, talvez ela nunca tenha ouvido nem pensado, mas
a Percepção clara e distinta que teve de suas próprias idéias de Negro e Bran-
co.' x É claro que esta reflexão tem a qualidade abstrata do exemplo de um filóso-
fo, mas sua força vem da aceitaçãode que os negros são homens de fato. Como
sugeri no Capítulo VI, Locke aprovava a escravidão colonial porque a considera-
va uma instituição necessária para a exploraçãoprodutiva das colônias inglesase
porque via nos colonos-fazendeirosum contrapeso para o poder real.
Notavam-se impulsos antiecravid.io, embora tenham sido facilmente refreados.
A crença de alguns protestantes de que de,-eña ser dada alforria aos escravos batizados
ou a seus filhos foi abandonada em tcdas as colónias ; referências à
dição de Noé assim às recomenda*s de São Paulo ajudaram a sufocar o resto
de devotamento à liberdadede todos os '.zrdadeiros crentes. De seu
os pdr8 católicos haxum cczn a validade do ato original de escra\izas-iO'
o que os levou a quest:cnar a legitimidadedo comércio atlânticode escravos e a
ar questões sobr o direito 20 O Santo Oficio em Roma aprowu por pouÑ
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 399

uma condenação genérica do comércio atlântico de escravosem 1686,depois


deapelosdos missionários capuchinhos no Congo e de Lourença da Silva de Men-
donça,representante de uma irmandade africana no Brasil.j30 fato de que havia ten-
Portugal e de que os protestantes agora cresciam no negócio podem
sôesentre Espanha e
terajudadoessas vozes a serem ouvidas em Roma. Mas a condenação foi logo engaveuda
e asváriaspotências católicas foram instadas a tomar suas próprias medidas para re-
conciliara religião com a escravidão; o CodeNoir francês foi provavelmente resultado
disto.No Brasil, o jesuíta Jorge Benci publicou um tratado em 1700sobre o trata-
mentocristão dos escravos, no qual condenava os excessos,a carga de trabalho e a
crueldadedos fazendeiros, insistindo que não se dessem mais de quarenta golpes de
cadavez como punição.34 Os espanhóis sustentavam que sua prática da escravidão era
legítimaporque os africanos haviam sido convertidos à fé católica, mas outras potên-
cias,principalmente os ingleses protestantes, ou não batizavam os cativos ou lhes apre-
sentavamheresias. Em 1693 e em várias ocasiões posteriores, as autoridades espanholas
na Flórida ofereceram um refúgio aos africanos mantidos injustamente como escra-
vospelosingleses; os que fugissem para Santo Agostinho (Flórida) e se dispusessem
a receberinstrução religiosa receberiam a alforria e um lugar na milíciaY As autori-
dadesinglesas acreditavam que os maroonsda Jamaica também recebiam incentivo
dasautoridades espanholas em Cuba ou Porto Rico. A recusa intermitente da Espanha
emaceitara legitimidade da escravidão praticada por outras potências, principalm
tea Inglaterra, só provocou uma fissura mínima na carapaça dos sistemas escravistas,
uma
embora,na última década do século XVIII, esta pequena fissura fosse adquirir
importância.

Asmulherese crianças tiveram participação muito maior no comércio atlàntico


uma
deescravosdo que no tráfico de servos contratados e engagés,e representaram
e engagés
Proporçãomaior no século XVII do que no XVIII. Os servos contratados
os condena-
tinhamgeralmente entre quinze e trinta e três anos de idade, embora
levados para
dospudessem ser mais velhos; pouco mais de três quartos dos servos
90% para os
as colôniasinglesas eram homens, proporção que chega a mais de
represen-
os homens
Dos escravos vendidos no Caribe entre 1663 e 1700,
engagés.
Assim, embora os
tavam50,5%, meninos, 8,4%, mulheres, 37% e meninas,
de 59 para 39,
escravosfossem mais numerosos que as escravas numa proporção
grande,36As escravas na Africa
OCOntingentefeminino ainda era comparativamente o
hornens, já que, além de conhecer
COStumavam ser tão ou mais valiosas que os
tarefas domésticas. Os comer.
no campo, podiam ter filhos e executar
Clanteseuropeus soma extra por mulheres e cos-
rectisavam-se a pagar qualquer
400 ROBIM BLACKBURH

tumavam oferecer menos, com a justificativa dc que estavam comprando escravo,


para o trabalho pesado nos campos c cngcnhos dc açúcar. Mas o capitão trafican-
te de escravos tinha dc prccncher todo o espaço livre com sua carga humana.
escravas podiam ser vendidas aos donos dcplantatiow, geralmente a um preço um
pouco mais baixo quc os escravos.
Os donos de plantations do século XVII viram alguma vantagem em incen-
tivar seus escravos a ter filhos. Também estavam dispostos a pagar preços altos
por escravos crioulos; Debien relata que os proprietários das maiores sucreriz:
preferiam uma grande proporção de escravos crioulos, em alguns casos chegando
a um terço já em 1670.37Embora os donos deplantations estivessem mergulha-
dos num mundo de cálculos comerciais, os que escreveram a respeito do incen-
tivo à formação de escravos não costumavam calcular o retorno do investimento
em crianças, e sim falar dos efeitos morais positivos da permissão para que hou-
vesse elementos de vida familiar entre seus escravos. O investimento numa criança
exagemuito tempo antes que comece a se pagar — talvez quinze ou vinte anos,
quando, como é mencionado no Capítulo VII, o fazendeiro só pensava nos cin-
co ou oito seguintes,devido às taxas de mortalidade do Caribe. As mulheres
eram obrigadas a trabalhar durante a gravidez, quase até o parto; em geral esta,
vam de volta ao campo mais ou menos um mês depois do parto. A despesa extra
de ter crianças na plantation não era grande, já que sua comida e suas roupas
teriam de ser conseguidas dentro da propriedade, principalmente pela mãe ao
trabalhar em seu tempo livre. Crianças pequenas eram cuidadas por escravos
mais velhos ou fracos; quando tivessem seis ou sete anos, elas mesmas já estari-
am executando tarefas leves.
Embora isso não impedisse o regime cruel de trabalho, os fazendeiros gos-
tavam de se considerar pessoas que incentivavam os valores familiares. A ver-
dadeira ameaça ao desenvolvimentoda vida familiar entre os escravos era 0
comportamento sexualmente predatório tão comum entre os homens brancos das
plantationse, em menor escala, negros em cargos de autoridade. Naturalmente,
capatazes e feitores eram também capazesde estabelecer uniões relativamente
estáveis com escravas; eles às vezes eram os responsáveis pelo nascimento de
crianças escravas nas plantations. Embora a taxa de natalidade de crianças vivas
nas plantationsdo Caribe fosse bastante baixa, era provavelmente mais alta do
que entre as escravas na África Claude Meillassoux afirma que a verdadeira
escrava na África era em geral "estéril", sem condições de ter filhos, a menos
que, ao tornar-se esposa, elevasse parcialmente seu status. Como veremos no
Capítulo X, as escravas usavam métodos de controle da natalidade e de abortO'
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 401

ter recorrido ao infanticídio. Mas as


ealgumaspodem escravas também encon-
consolonos filhos — como escravos nascidos na América,
travam seus filhos
teriammelhores oportunidades para conquistar uma posição mais privilegiada.
Ascolôniasmais antigas, como Barbados e Martinica, tinham minoriascriou-
1ascrescentesem sua população escrava que apresentavam uma taxa de natali-
dadenatural em elevação. Isto foi importante para o futuro, embora a manutenção
- — do número total de escravosainda
semfalar em expansao dependesse
da importação
bastante de mais cativos africanos.39

A nova plantation

Aplantationdo final do século XVII e dos séculos seguintes integrou aspectosda


produçãoque anteriormente eram separados: cultivo, processamento, transporte.
Estefoi um aperfeiçoamento anglo-francês do exemplo brasileiro. O senhor de
engenhobrasileiro comprava do lavrador de cana boa parte da cana que moía, e
geralmentevendia seu açúcar a um comerciante no porto mais próximo. Já os donos
deplantationsdas Indias Ocidentais cultivavam toda a cana que usavam, e muitos
produtoresingleses vendiam seu açúcar na Europa. A propriedade no Brasil uti-
lizavaumamão-de-obra mista de empregados portugueses, escravosafricanose
diaristasíndios; os portugueses e índios podiam ser mais numerosos que os escra-
vosafricanos.Nos primeiros dias das colônias inglesas e francesas, as proprieda-
deserampequenas e a mão-de-obra era mista; no fim do século XVII mais de
novedécimosda força de trabalho braçal era de escravos. No Brasil e na América
do Norte os escravos negros nunca foram maioria na população; nas colônias de
três quartos
do Caribe, em 1700 ou pouco depois, eles representavam
Plantation
ou mais do total.
teve um papel
SegundoRichard Sheridan, "o sistema comercial de financiamento
produção".40Muitos
findamentalna transição de pequenas para grandes unidades de
da inicia-
donosdeplantations eram também mercadores, revelando o novo alcance
qual fosse seu
uvamercantil num contexto de comércio colonial e escravista. Fosse
algumas fun-
Passado,o proprietário bem-sucedido ficaria tentado a desempenhar
lucros dasplantations eram quase
mercantis além das produtivas. Os primeiros O pa-
sempreusados para aumentar a propriedade ou adquirir fazendas-satélites.
significava que, por isso, elas fos-
trocíniodeplantations pelo capital mercantil não
Semconservadoras tecnológicos. Os mercadores forneciam
ou estagnadas em termos sua produção. Os
eqUipamentoaos fazendeiros e estavam interessados em aumentar
ROBIN BLACKBURN

cotiiétcio coni plantation cram «novos mercadores", preocupados


envolvidos no
aperfeiçoar o tnmsporte, o cultivo e o processamento e não sim_
em organizar c
na fórtnuln clássica, em comprar barato e vender caro. Pela mes_
plestnentc, como
os donos deplantations bem-sucedidas podiam tornar-se mercadoresde
ma
no Capítulo X.
sucesso; veremos Algunsexcnil)los notáveis
Richatd Dunn escreve:
construíram um sistema de produção
Os colonos do Caribe no século XVII
quando se leva em conta o ca-
dc açúcar realmente itnprcssionante, sobretudo
Os donos de plantati0B$
rótet tradicional da agricultura inglesa da época.
diferentes das que co-
açucareiras utilizaram técnicas agrícolas radicalmente
nhcciamcm casae aprenderama manejarhomens, animais e máquinas numa
escala muito maior que a de seus primos na Virgínia ou em Massachusetts.
No mundo pré-industrial do século XVII, o produtor de açúcar do Caribe
era um empresário em grande escala. Ele era uma combinação de fazendeiro e
industrial."

Gabriel Debien, historiador da escravidão colonial francesa, também enfatiza tanto


a dimensão quanto a novidade da plantation do Caribe:

Quando os grandes engenhos de açúcar apareceram depois de 1690, a coloniza-


são agrícola combinou-sc à colonizaçãoindustrial. A fabricação de açúcar, mesmo
do açúcarbruto mais simples, exige, se realizada em alguma escala, o rodízio de
numerosas turmas de trabalho disciplinadas, num regime muito duro de trabalho,
supervisionadode perto dia e noite. Este era um novo tipo de trabalho, um ele-
mento de revoluçãosocial.u

Na Europa, era o fazendeiro arrendatário ou o camponês quem organizava o grosso


ge
da produção agrícola. Em extensão territorial, a propriedade pessoal ou demes
do senhor seria maior do que umaplantation, mas o número de trabalhadores nela
empregados seria menor. Na Inglaterra, as terras pessoais do senhor não empre-
gariam normalmente mais de duas ou três dúzias de trabalhadores, se tanto. 0 Como
unidade integrada, asplantationsdo Caribe chegaram a ser cinco ou dez vezes maioÑS
do que seus equivalentes metropolitanos, com um total de duzentos ou trezent0S
escravos. Enquanto o senhor europeu contratava um gerente ou administrad0r
para cuidar da propriedade e colctar os arrendamentos, o dono de uma planta: i08
do Caribe exigia os serviços mais específicos do contador e do supervisor, ou
e gérant. A mão-de-obra da plantation era vigiada e coagida de forma constan te e
Intensiva.
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
403

Aplantation,evidentemente, pertencia tanto ao mundo da manufaturaquanto


comercial. Os produtos daplantation, especialmente açúcar
aodaagricultura e anil,
elaborado, e ambos permitiam e exigiam a exploração
exigiamprocessamento in-
tensivada mão-de-obra. A indústria agrícola não era, naturalmente, incomum na
árearuralda Europa. Mas diversamente de muitos fabricantes europeus, o fazen-
deiro,ou seu administrador, organizava o processo de trabalho, e assim tinha parti-
cipaçãodireta na produtividade de sua força de trabalho. Sob o «sistema de facção",
0fabricanteeuropeu não era diretamente responsável pela produção, que ficava nas
mãosde famílias de camponeses ou artesãos. O dono de umaplantation do Caribe
eraresponsávelpela compra de equipamento, implementos, provisões e novos es-
cravosparasubstituir os que morriam ou ficavam extenuados pelo excessode traba-
lho.Ele ou seu supervisor eram também responsáveis pela organização de alguma
produçãode alimentos na propriedade ou em fazendas-satélites e pelo trabalho de
consfruçãoe manutenção. Além do supervisor, os empregados podiam incluir ferve-
doresde açúcar e artesãos; também podiam ser contratados os serviços de médicos,
advogados e contadores.
A complexidadedaplantation do Caribe como unidade integrada significavaque
seudonotinha múltiplas despesas: com escravos ou servos, animaisdomésticos,
roupas, implementos, equipamento para processamentoda produção,
alimentos,
materialde construção, caixotes e pagamento de salários e remunerações a empre-
e merca-
gados,impostos ao estado, comissões e honorários a advogados, corretores
ocasião para fazer
dores.Os lucros da plantation dependiam da escolha da melhor
produtos se-
remessase vendas, e da habilidade de gerar receita com colheitas ou
à renda do
— o rum e o melado deram uma contribuição fundamental
cundários
atividade coordenada
Produtorde açúcar. Do lado da produção, aplantation exigia a
a 300 trabalhadores.
e meticulosamentecalculada no tempo de um grupo de 10
durante longas horas mas recebiam al-
Escravosespecializados, que trabalhavam
responsabilidadedos
gunspequenosprivilégios, vieram a trabalhar nos cargos de
mais barato
isso ficava
engenhosde açúcar quando os fazendeiros descobriram que
caso do trabalho no campo, os escravos
doquecontratar funcionários especializados, No
incorporação involuntária a um regi-
eramorganizados em turmas para facilitar sua
com responsabilidade
mede trabalho altamente controlado e exigente. Os escravos
líderes das turmas de escravos no
acabarampor substituir os servos brancos como
consideravelmentenos
campo.O proprietário ou seu feitor acabaram por confiar
de roupas e provisões suplemen-
cabeças",que também cuidavam da distribuição
entre as moradias e rosas dis-
tarese que podiam escolher para seu uso o melhor
poníveis.
404 ROBIN BLACKBURN

Debicn escreve que no final do século XVII o commandcur, ou capataz, era ge-
ralmcntc um escravo:

Ele era responsável pelo trabalho c pela disciplina dos escravos. Nisso recebia grande
autoridade. Já que conhecia a origem étnica dos membros do grupo, sua idade,
sua saúde, pode-se dizer que a disposição e o empenho deles dependiam do capa-
extremos.
taz. Ele era o centro de distribuição. Só se trocava um capataz em casos
Sua estatura, sua energia, seu senso dc comando eram as qualidades que o reco-
mendavam, e não a preferência por alguma "nação" ou idade. No entanto, era muito
freqüente encontrar um crioulo nesta função, às vezes um novo escravo como se-
gundo capataz, mas quase nunca um mulato."

O capataz ou commandeur era assim o eixo do sistema daplantation e gozava obriga-


toriamente de privilégios. Era o responsável pela divisão de tarefas e provisões en-
tre os membros do grupo de escravos. Sua condição jurídica de escravo impunha-lhe
verdadeiras limitações, mas dentro daplantation ele — os líderes eram homens, em
sua quase totalidade — tinha autoridade sobre bastante gente, mas só era subordi-
nado a uma ou duas. O feitor ou proprietário cauteloso percorria constantemente a
propriedade, chicote na mão, pistola no cinto, durante a estação de colheita ou plan-
tio. Ele calculava a dimensão das tarefas e as indicava aos capatazes, verificava se
animais e equipamentos funcionavam bem e supervisionava as punições. Mas com
apenas um punhado de brancos entre algumas centenas de negros, ele dependia
forçosamente de seus "cabeças".
O coronel Henry Drax, dono de Drax Hall, plantation de Barbados, escreveu
que a organização dos escravos em turmas foi a melhor forma de ('impedir a ociosi-
dade e obrigar os negros a fazerem seu trabalho direito". Em Drax Hall os escravos
eram divididos em cinco ou seis turmas segundo sua força, sexo e idade, indo dos
"mais capazes e melhores", reservados para "cavar e o trabalho mais duro", aos "negros
mais ordinários numa turma para o estrume", e até à turma de crianças, que podia
ser usada na retirada de ervas daninhas. Durante a colheita, uma "turma perma-
nente" era encarregada de manter as fornalhas abastecidas de combustível. Um es-
cravo responsável, o capataz, cuidava de cada turma, e era obrigado a manter "uma
lista da turma sob seu cuidado particular, de forma que ele possa dar conta de cada
um, se está doente ou em que tarefa está empregado". Estas listas eram levadas a
Drax a cada quinzena para que ele pudesse verificar o desempenho de cada escravo
e identificar "negros preguiçosos ausentes de seu trabalho" .45Depois que a cana era
levada para o engenho, a divisão do trabalho passava a ser quase industrial, com
alguns cuidando da moenda enquanto outros ferviam e escumavam o caldo. As própria s
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800

moendas eramcada vez mais eficientes, movidas a vento, água ou animais,e ajuda-
a manter ritmos intensos dc trabalho. Um escravo dc Barbados foi citado como
autorda frase: "O diabo estava no inglês quc faz tudo trabalhar: ele faz o negro
rabalhar,o cavalo trabalhar, o asno trabalhar, a madeira trabalhar, a água trabalhar
46
e o vento trabalhar."
A simplificaçãoe a repetição das tarefas, a coordenação do trabalho entre cate-
goriasdiferentesde trabalhadores, o ritmo imposto às turmas de trabalho parecem
representaruma forma de organização que reflete não só a vida a bordo dos navios
como durante o século XVII, a revolução, talvez a ela relacionada, no trei-
namentoe na tática militares, associada a Maurício de Nassau, príncipe de Orange
etiodopríncipe Maurício que governou o Brasil holandês. O treinamento sistemá-
fico,os métodospadronizados de carregar e disparar armas, a supervisãomais in-
tensapor militares de patente inferior criaram um novo tipo de força de combate e
promoveram um grande avanço do poder de fogo. William McNeill observa uma
concomitância que pode ter causado problemas: "Quando um grupo moveos mús-
culosdo braço e da perna ao mesmo tempo durante um prolongado tempo, uma
ligaçãosocialprimitiva e muito poderosa nasce entre eles."47As turmas de escravos
costumavamcantar durante o trabalho. Infelizmente há poucas descrições de suas
cançõesno período inicial, mas caso se tome como guia os cantos dos trabalhadores
forçadoscoloniaisna Africa, devem ter incluído críticas vigorosas e lamentospun-
gentes."Em circunstâncias especiais, o esprit de corpsda turma de escravos explodia
emrebeliões,mas normalmente ele tinha uma função disciplinadora que, como a
disciplinamilitar, era cuidadosamente direcionada para os objetivos determinados
pelosqueadministravamo sistema.

O empreendimentoadministrado pelo dono da plantation, que negava ao produtor


individualo controle sobre a maior parte do processo de trabalho, antecipou algu-
masdascaracterísticasdo industrialismo capitalista.Mas já se argumentou muitas
vezes-—especialmentepelos que trabalham na tradição da economiapolíticaclás-
sicaou do marxismo — que ainda assim a escravidão era uma forma de trabalho
esbanjadorae inflexível. Deste ponto de vista, o fato de asplantations se basearem na
aquisiçãode escravos e em sua dominação estabeleceu limites estreitos de lucratividade
e produtividadeque normalmente não eram encontrados onde se utilizavao traba-
lhoassalariado.Aplantation escravista foi considerada supercapitalizada e rígida, e
osseusproprietários incapazes de variar à vontade a quantidade de sua mão-de-
Obrae privados deste estímulo à economia. O trabalho dos escravos também foi
faltava motivação
COnsiderado abaixo do ótimo; por serem trabalhadores forçados,
BLACKBURN
406

capazes dc scr descuidados com a propricdadc e o equipamento de


aos escravos,
inibindo assim mais mclhorias. Para compcngar estag desvantagens, 0
senhor,
vantagens da turma dc cgcravos; e 2) h
prietário de escravos tinha acesso: I) às
("cconorn;a natural" Com0
dução de alguns custos por meio da autoprovisão
questões rclcvantcg, Mag nag
veremos, esta crítica clássica suscita muitas
das vantagcng da aquígíçãoe do
específicasno Novo Mundo da época, a balança
dos mercadores c donos
uso de escravos ainda pendia bastante a favor

grandes ínvcgtimcntog
A construção deplantatiow escravistas exigia de fato
capital fixo. Quer o proprietário pagasse à vista ou a prazo para adquirir sua mão.
de-obra, o preço de compra do trabalhadorservil, fosse escravo ou contratado,
representava um peso grande no resultado de seu empreendimento, Até as proví-
sões compradas para os escravos tinham de ser adquiridas muitos rncgcs antes de
serem consumidas. O dono daplantation pagava pela mão-de-obra muito antes de ela
começara produzir; o empregador capitalista do futuro estaria na situação me-
lhor de pagar ao produtor direto só depois de estar de posse do produto embo-
ra talvez tivesse de esperar muitos meses antes de fazer a venda, O dono de uma
plantation que pedisse dinheiro emprestado para comprar escravos ou servos sería
responsávelpelo pagamento de juros a partir do momento da compra, Mão-de-
obra, para o dono daplantation, era um investimento feito com anos de antecipa-
ção; era parte de seu capital fixo, não do circulante. O preço do escravo ou do
servo representava uma redução do excedente futuro que se esperava que o escra-
vo ou servo produzisse. O dono da plantation esperava extrair um grande exce-
dente de seus escravos, que cobriam seus próprios custos de subsistência em um
ou dois dias por semana,mas seu lucro era dividido com antecedência com o
mercador e o traficante de escravos.
Os registros costumam mostrar que o dono da plantation tinha grandes lucros
nos primeiros dias de uma colónia, mas depois de algumas décadas este lucro tendia
a declinar. Novasplantatiow costumavamsurgir quando os preços estavam altos
mas o padrão decrescente de lucratividade também reflete fatores como produção
reduzida da cana, despesas com fertilizantes, custo de reposição de equipamentOS
ou escravos e vários "atos de Deus". O lucro dos fazendeiros era muito afetado
10srumos da guerra. Por um lado, a guerra elevava o preço
do açúcar; por outro'
impedia alguns proprietários de produzir ou de levar seu
açúcar ao mercado? Mas
sob a ação recíproca desses fatores condicionantes, a tendência
da taxa de lucro das
plantations de cair para um nível "normal" reflete apenas do
a natureza competiti%
negócio. Enquanto os lucros permaneciam acima do
normal, havia incentiVOpara
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 407

quemaisplantations fossem postas a produzir. Embora o financiamento da compra


deum contingente de escravos representasse um peso considerável sobre a renda de
umaplantation,esta não deveria, em princípio, ter os lucros reduzidos abaixo de um
nívelnormal."
Uma segunda limitação potencial ao uso de mão-de-obra escrava relaciona-se
àsedgênciassazonais irregulares de mão-de-obra enfrentadas até pelaplantationmais
organizada.Em geral, o tamanho do contingente de escravos era determinado pelo
picode exigência da época da colheita; o trabalho intensivo de processamento coin-
cidiacom o transporte da colheita, aumentando assim o número de mãos necessárias
nesteperíodo. Durante o resto do ano, os escravos estariam subempregados; do ponto
devista do investimento, o tempo de trabalho escravo não utilizado era uma forma
decapitalocioso. As culturas de subsistência e de produtos suplementares,que
poderiamser programadas para complementar o produto principal, às vezes atenuavam
esteproblema, assim como a prática de alugar escravos para obras públicas ou cons-
truçõesdurante a baixa estação. O açúcar, produto mais valioso e que empregava a
maioriados escravos, tinha um período de cinco ou seis meses de colheita no Caribe,
dedezembro a maio; o padrão brasileiro de engenhos separados operados por es-
cravospode ter derivado em parte do fato de que o clima de Pernambuco permitia
0 corteda cana num período de mais de nove meses, mantendo assim os escravos do
engenhoocupados a maior parte do ano.
Os donos deplantations das Indias Ocidentais prolongavam deliberadamente
a colheitapara tirar o máximo de seus escravos, mas como a produção caía acen-
exigia mui-
tuadamente,não era possível fugir do problema. O produto principal
adubação,
to trabalhona estação de plantio, e havia sempre necessidade de limpeza,
não ocupassem
consertosem prédios e daí por diante, mas essas tarefas talvez
do fazendeiro com a
Inteiramenteos escravos. Em conseqüência, a preocupação
a eficiência do
Produtividadedo trabalho era seletiva: métodos para melhorar
muito mais
despertavam
Pr0cessamento,que era o gargalo do fluxo de produção,
principalmente a preparação do solo e o
Interessedo que os métodos de cultivo,
subutilização fora da colheita e por causa da
plantio.Como forma de reduzir a
falta de mão-de-obra durante
m0rtalidadeentre os escravos, havia nasplantations
abandono do cul-
a colheita.Isso provocava tanto o excesso de trabalho quanto o
tivo de
subsistência. 52
organização do trabalho era mais rígida e ha-
Durante o período de colheita, a
— os gastos com equi-
Incentivopara que fossem adotadas medidas de economia
impediu os fazendeiros
Pamentoeram consideráveis. O uso de mão-de-obra escrava não
fazendeirode
demelhorare ampliar a maquinaria do engenho.Já em 1653 um
408 ROBIN BLACKBURN

Barbados encomendou a uma fundição dc Oxford carcaças de ferro para os roletes


de seu moinho. Implementos de metalampliavama capacidadedc trabalho e eram
mais resistentes ao uso intenso. Pode-se ter uma idéia da demanda das plantations
por artigos dc metal pela seguinte encomenda feita à Inglaterra por um administra-
dor de Barbados antes da colheita de 1693:50.000 pregos, IO peças de bronze para
a estrutura do moinho, 12 rcminhóis, 6 escumadeiras, 3 folhas de chumbo, 600 al-
ças para tonéis e barris e um tacho de cobre de 70 galões. Mas as despesascom
equipamento para a época de plantio eram mais modestas. O solo era lavrado de
forma trabalhosa com enxadas de metal; não se usava arado nem cavalo neste traba-
lho, já que havia excesso de mão-de-obra escrava. Semeadores equipados com en-
xadas podiam ser organizadosem turmas; equipes com arados não poderiamser
organizadas e vigiadas da mesma forma.
As ferramentas agrícolas usadas por um camponês da Inglaterra valiam cerca
de 1 libra, enquanto o dono de uma plantation podia equipar cinqüenta escravos
com 5 libras. S3Mas as turmas de escravos gastavam seu equipamento muito mais
depressa; umaplantation grande podia encomendar por ano 20 dúzias de enxa-
das, num total de meia tonelada. S4Todos esses itens podiam ser encomendados
a crédito aos mercadores. Os fazendeiros sugeriram algumas vezes que as enxa-
das eram melhores para os escravos por serem mais parecidas com os implementos
agrícolas que conheciam na Africa; como os escravos africanos aprenderam as
técnicas desconhecidas e complexas da fabricação de açúcar, esta explicação é
questionável. Watts enfatiza que os métodos de cultivo utilizados causavam menos
erosão e perda de umidade do solo que o arado, consideração importante numa
cultura tão propensa a exaurir o solo como a cana-de-açúcar. Os grandes fazen-
deiros do Caribe tinham boas razões para cuidar que a qualidade do solo fosse
protegida com o plantio da cana em fossas adubadas porque a terra era escassa
nas ilhas, ainda que a mão-de-obra fora da estação não o fosse. Depois de Ob-
servar os avanços agrícolasconseguidos pelasplantations do século XVII, Watts
conclui: "houve maior resistência à inovação no setor da revisão dos implementos
de campo do que em todos os outros aspectos da vida nas propriedades das In-
dias Ocidentais", o que pode ter resultado tanto da ausência de pressão para
economizar mão-de-obra quanto da falta de preocupação dos escravos com a
produtividade."
Cada uma das limitações acima pode ter restringido em certa medida a produ-
tividade da plantation, mas ainda assim, no fim das contas, os sistemas deplantation
sobreviveram e prosperaram. As aparentes desvantagens do ponto de vista um tan-
to anacrónico de um sistema capitalista em pleno funcionamento (que não existia na
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 409

época)foram acompanhadas — e, em grande parte, neutralizadas— por caracte-


óticas do trabalho escravo que traziam ganhos compensadores,juntamente com
limitaçõesde outro tipo. Quanto à produção, os proprietários dc escravospodiam
exploraros recursos do trabalho em equipe como forma de aumentar a produção;
podiamtambém recorrer à chamada "economia natural" ou auto-subsistência como
formade reduzir custos. A organização dos escravos em turmas permitiu a manu-
tençãode um ritmo excepcionalmente intenso; era uma forma especial de coorde-
naçãoforçada que, como observou Marx, a escravidão podia facilitar.56Esta forma
de organização do trabalho adaptava-se bem ao corte da cana e a vários outros tipos
de trabalho na plantation, mas exigia supervisão rigorosa e só permitia resultados
excelentesenquanto o cultivo se concentrasse numa área limitada.
Os escravos podiam ser usados em todas as atividades agropecuárias, como os
holandesesmostraram na América do Norte e os brasileiros na América do Sul.
Nestes
Vaqueirose artesãos urbanos escravos eram comuns na América espanhola.
trabalho
casos,os escravos não eram organizados em turmas, e suas condições de
alguma
exigiamfreqüentemente elementos de autonomia. Se lhes fosse oferecida
a trabalhar com
oportunidade de comprar a liberdade, eles poderiam ser induzidos
um regime escravista
muitaintensidade. Mas isso não oferecia uma base sólida para
preferiam encontrar
permanente.Os proprietários de escravos ingleses e franceses
oferecer liberdade —
formasde obrigar seus escravos a trabalhar muito sem lhes
principalmente, a utilização do trabalho em equipe. Quando apli-
isto significava,
por turmas de escravos
cadosde forma apropriada, o ímpeto e o ritmo conseguidos
formidáveis.
cuidadosamenteorganizadas permitiam resultados
de desenvolver um sistema especial para ex-
Os donos deplantations tiveram
depois que o fizeram passaram a dispor de um
trair trabalho dos escravos, mas
adiante, um retorno razoável. Seus verdadei-
recursoque gerava, como veremos
escravos aos rigores do sistema de traba-
ros problemas vieram com a reação dos coloniais, os donos de
os funcionários
lho em equipe. Embora os comerciantes, trabalhar para seu
o escravo devia
Plantationse seus feitores concordassem que Ficava por conta do
não fora consultado.
Proprietárioou proprietária, o escravo extrair trabalho de escra-
de capatazes
donodaplantation, do feitor e de seu grupo feitores
se esforçar. O salário pago aos
vos que sempre estariam pouco dispostos a oferecidos aos
pequenos incentivos
levavaisto em conta, assim como os vários
capatazese "cabeças".
de açúcar eram obrigados a traba-
Os escravos de uma turma numa plantation colheita, 0 moinho tinha
Durante a
lhar durante uma quantidade imensa de horas. os
cana a ser moída. Esperava-se que
de funcionar a noite inteira se ainda houvesse
410 ROBIN

escravos mais fortcs trabalhassem o dia intciro nos campos dc cana do nasccr ao
pôr-do-sol, com uma pausa de duas horas ao mcio-dia c dcpois ainda fizcsscm
turnos no moinho à noite. O turno da noite, às vczcs chatnado dc "vigília" ou «ron_
da", podia durar das seis da tarde à mcia-noitc ou da mcia-noitc às seis da manhã, c
o escravo trabalharia nclc dia sim, dia não. Dcssc modo, os mclhorcs cscravos tra-
balhariam dez horas num dia c dczcsscis no scguintc, scm incluir a parada para al-
moço. Este seria o regime numaplantationbem adtninistrada, c alguns proprietários
tentavam extrair ainda mais de sua mão-de-obra cativa. Durante o pcríodo da co-
lheita, os escravos tinham permissão para bcbcr todo o caldo dc cana quc quises-
sem, aumentando sua ingestão calórica, embora este não fossc um acréscimo muito
nutritivo à sua dieta.

O regime de trabalho daplantation teve efeitos terríveis sobre a mortalidade c a fer-


tilidade dos escravos. Apesar da resistência um pouco maior dos escravos africanos
às doenças ambientais, as de mortalidade eram muito altas. As plantationsde
açúcar, nas quais trabalhavam mais de três quartos de todos os escravos do Caribe,
consumiam a vida dos escravos quase com a mesma voracidade com que os enge-
nhos moíam os montes de cana cortada. Os fazendeiros calculavam que os jovens
africanos levados para suas propriedades tinham uma expectativa média de vida de
pouco mais de sete anos. Os cálculos dos fazendeiros eram certamente influencia-
dos pelo fato de que os escravos eram mais baratos no século XVII. Em 1695, um
Ezendeirojamaicano teria de pagar cerca de E20 por um escravo que, numaplantation
bem administrada, produziria este mesmo valor de açúcar a cada ano; havia outras
despesas, mas a margem para o lucro era ainda imensa. No entanto, olhando sob
outro ponto de vista, o valor do contingente de escravos era de pelo menos E2.000,
ou mais de vinte vezes a renda anual atribuída por Gregory King em 1688 à família
de um oficial da marinha, a um clérigo, pequeno fazendeiro próspero ou comer-
ciante, que ficava entre E44 e E80.
O alto valor de capital daplantation escravista do Caribe pressionava os proprie-
frios para maximizarem a produção de cada turma; como em geral faziam emprés-
timos a juros altos para completar os preparativos da colheita, a pressão ficava ainda
maior. Os fazendeiros estavam dispostos a proteger a vida de seus escravos de qual-
quer maneira que não fosse abandonar a escravidão ou o cultivo de açúcar, as únicas
medidas capazes de baixar a taxa de mortalidade. Os escravos eram alimentados com
uma dieta rica em proteínas, e médicos eram contratados para cuidar deles, mas mesmO
assim morriam. O "índice de depleção»da populaçãoescrava (isto é, "índice de
-
natalidade" negativo) de 2% a 4% ao ano refletia a baixa fertilidade e também a ele
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO MOVOMUNDO: 1492-1800
411

mortalidadc.Os fazcndciros compravam cscravas, embora cm número menor


dcescravos, e às vczcs até as inccntivavam a ter filhos, mas o regime daplantation
impunhamuita pressão à vida familiar c à criação dc filhos. No entanto, a incapaci-
dc reprodução da população escrava não impcdiu o crescimento dasplantations
enquantoa rcccita gcrada pela vcnda do produto dos escravos foi suficiente para
canprarmaisafricanos. Além disso, os mcrcadorcs gcralmcntc sc dispunham a oferecer
créditoprópriocomo forma dc vcndcr os escravos ou dc obter participação no pro-
dutodaplantation.No sistema deplantation, os comcrciantcs cram parte tão neces-
báriaquanto os fazendeiros.
Aviabilidadedas plantations não sc apoiava apenas na lucratividadc destrutiva
dotrabalhoem equipe. Os fazendeiros podiam também reduzir alguns custos con-
tandocoma mão-de-obra escrava para poupar despesas. O escravo podia produzir
alimentosalém do cultivo comercial principal e trabalhar cm projetos de investi-
mentoassimcomo no produto final. Mais uma vez esse potencial tinha dois gumes,
já quepermitiaum grau excessivo de auto-suficiência. Embora os fazendeiros ou
seusadministradoresnão poupassem nas despesas diretamcnte relacionadas à pro-
duçãoprincipal,eram parcimoniosos quando se tratava de fornecer mais roupas e
alimentosa seus escravos; e a ração que poderia ser considerada apenas suficiente
emtemposnormais se transformava em fome se a cultura de alimentos fosse destruída
pelasecaou pela peste. As plantations do Caribe dependiam mais de suprimentos
importadose estavam mais expostas aos riscos da guerra do que as da América do
Norte,onde havia mais terra e a quantidade dc escravos em cada propriedade era
muitomenor.Quer sua plantation fosse grande ou pequena, o produtor de fumo da
tinha pouca despesa com equipamentos, e tentava reduzir gastos diretos
Virgínia
comalimentaçãoorganizando cle próprio o trabalho nas principais culturas de ali-
mentos.Embora as plantations escravistas tivessem, mais cedo ou mais tarde, de
em termos comerciais, mantiveram sua base na "economia natural" de
JUstificar-se
uto-suficiência.No Brasil e na maior parte do Caribe esperava-se que os escravos
que eles
Produzissem a maior parte de sua própria alimentação em pedaços de terra
recebiampara isso.
As técnicas agrícolas conhecidas pelos africanos foram de grande ajuda nas
vege-
Os escravosafricanos cultivavam milho ou mandioca, batatas ou
Arnéricas.
limites
criavamgalinhas ou porcos, Os fazendeiros e feitores tentavam impor
também
à energia despendida com tudo o que não fi)sse a cultura principal, mas
a Vantagemde os escravos suprirem a maior parte de suas próprias necessida-
desalim escravos cui-
entares. No início, os donos de plantations perrnitiam que os
durante
de suas roças durantc um dia ou um dia e jneio por setnana. Assitn,
412 ROBIM BLACKBURN

Atempolivre" os escravos trabalhavam para sc alimentar, mas na épocada co_


lheita os fazendeiros podcriam ncgar-lhcs até isso.
No Caribe, os donos dc plantation.feram obrigados a comprar carne ou peixe
secos para suplcmcntar a dicta dos escravos, já quc a terra disponível para as roças
dos escravos cra pouca e distante, mas na América do Norte os proprietáriosgeral_
mcntc conscguiam um alto nível dc auto-suficiência. Em 1726, William Byrd,um
dos maiores fazcndciros da Virgínia, descreveu sua situação:

Além da vantagem dc um Ar puro, temosabundância dc todo tipo de Provisão


sem despesas (quero dizer, nós que temos Plantações). Tenho uma grande famí-
lia, e minhas Portas estão abertas a Todos, c ainda assim não tenho Contas a pagar,
e uma meia-coroa ficará tranqüila em meu Bolso por muitas Luas. Como os Patriar-
cas, tenho minhas Criações e meus Rebanhos, meus Servos e Servas, e todo tipo
de Profissão entre meus próprios Servos, e assim vivo num tipo de Independên-
cia de todos, excetoda Providência.No entanto, este tipo de vida é levadosem
despesas, mas com grande quantidade de problemas. Preciso cuidar para que
toda a minha gente cumpra seu Dever, ver todas as Engrenagens em movimento
e fazer todos darem sua Parte para levar a Máquina adiante. Mas isto é uma
diversão nesta terra silenciosa e um exercíciocontínuo para nossa Paciênciae
Economia?

resi-
Esta visão da virtude patriarcal e da abundância retrata o ideal do proprietário
Virgíma
dente. Os donos das numerosas pequenasplantatiow cheias de dificuldades da
só podiam atingir uma versão indigente e subdesenvolvida deste ideal — em
parte
deles.
porque seus vizinhos maiores, se eram auto-suficientes, pouco comprariam
acaba-
Além disso, até mesmo os maiores proprietários da Virgínia e de Maryland
ao
vam acumulando com freqüência dívidas imensas. O próprio Byrd foi arrastad0
de
endividamento pelo custo de tornar lucrativa a aquisição de grandes extensões
e com-
terra. por mais auto-suficientes que fossem, eles contratavam alguma ajuda
Mesmo
pravam equipamento, produtos manufaturados e material de construção.
aconte-
que seus escravos tecessem panos ou fizessem sapatos — como na verdade
famíliastambém
cia —ainda assim precisariam de ferramentas e máquinas. Eles e suas
vida con-
encomendavam, normalmente a crédito, os acessórios necessários a uma
praticar "economia" e "le-
fortável, Essas despesas determmaram a necessidade de
interrompia as
var a máquina adiante". Em épocas de dificuldade, quando a guerra
desu-
cornumcaçóes, muitasplunfations escravistas podiam viver por conta própria'
Gorenderjeles
nando mais terra e mão-de-obra à subsistência, Como explica Jacob 0
mais
podenam beber "da concha da economia natural".$8Mas em épocas
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMONO NOVO MUNDO:
1492-1800 413

comercialdos escravos de um fazendeiro pesava


valor sobre ele até certo
ponto
se conseguisseutilizá-lo dc modo lucrativo, poderia vendê-los.

e francesas fizeram uso mais


Asplantationsinglesas intenso de escravos do
que o
padrãobrasileiro tradicional de propriedade e produção. Stuart Schwartz
cita um
da
relatório década de 1660 que exigia que os administradores de Sergipe do
Con-
de,um engenho dos jesuítas e mal administrado por eles, deveria comprar mais ter-
rasde cultivode cana para garantir a matéria-prima e treinar os escravospara
assumirem o lugar dos caros trabalhadores assalariados. A competição dos novos
produtoresincentivou os fazendeiros brasileiros a copiar o que pudessem, mas os
plantadoresde cana costumavam agarrar-se a sua terra enquanto os trabalhadores
eram gente a quem o senhor de engenho geralmente devia alguma obri-
assalariados
gação.
A organização do "nobre negócio" da produção de açúcar no Brasil foi modifi-
cada,mas não transformada, no final do século XVII. Embora os proprietários in-
glesese franceses produzissem agora mais que os do Brasil, o açúcar brasileiro, apesar
doscustosaltos do frete e dos onerosos impostos coloniais, manteve um nicho im-
prante no mercado europeu. Os engenhos brasileiros produziam um açúcar branco
e fino,enquanto os ingleses e franceses eram dissuadidos de fazê-lo pelas autorida-
descoloniais,que desejavam incentivar o desenvolvimento do refino na metrópole.
O tradicionalsenhor de engenho brasileiro não extraía de seus escravos tanto traba-
lhoquantoos proprietários ingleses e franceses, que podiam alterná-los à vontade
entreo campo e o moinho segundo o ciclo de plantio, manutenção, colheita e pro-
desa-
Cessamento. Por outro lado, a indústria açucareira brasileira de forma alguma
pareceu— o açúcar continuou a ser a exportação mais valiosa da colônia mesmo
durantea rápida expansão da mineração de ouro no século XVIII.' 9

ASPIantations do Norte e do Caribe, apesar das


escravistas do Brasil, da América
só esta-
diferençasreais, tinham em comum a característica de que sua propriedade
Vasemi-inseridano circuito do comércio de produtos agrícolas. Parte significatisa
âmbito da
dovalordaplantation derivava do fluxo de trabalho escravo isolado do
construir
trocade mercadorias. Usava-se o trabalho escravo para melhorar a terra e
esplêndidas
belosprédios.Os
fazendeiros construíram para si residências
maiores esculpida ou ela-
as Casas-grandes— muitas vezes ornamentadas com madeira
botadacantaria, palladiano ou barroco e escadarias
exteriores imponentes em estilo de artesãos
escravos
realçadascom o disponibilidade
talento detalhista africano. A que o custo
Paratrabalhar
nestas meses mais tranquilos significava
casas durante os
414

de sua construção cra considcravcltncnte mais baixo do que na Europa. É espanto-


so que até proprietários auscntcs achavam agradávcl construir uma bela tnansâ() para
abrigá-los em suas visitas propriedade, mesmo que muito raras.
A dimensão cstritamcntc agrícola da plantation tatnbém rcvcla seu carátcr
brido e complica a tarefa dc calcular os lucros do proprietário. Esses lucros
mam ser avaliados conferindo-se, cm primeiro lugar, um valor à propriedade. O
valor das benfeitorias e dos prédios que abrigavam a maquinaria do cngcnho au-
mentava invariavelmente em um quarto ou um terço o valor da propriedade, mas
tudo isso era construído por escravos, cujo valor também era computado como par-
te do valor do empreendimento. Embora o fazendeiro geralmente invcstissc recur-
sos reais na compra de escravos, cle era capaz de ampliar o potencial produtivo c o
valor de mercado de sua propriedade utilizando o trabalho escravo, com poucas
despesas posteriores. O acréscimo dado pelo trabalho escravo ao valor da proprie-
dade tinha o efeito de reduzir a taxa de lucro aparente, caso esta fosse calculada com
base naquele valor e não nas despesas em espécie do proprietário. Schwartz chama
a atenção para uma característica da contabilidade dos fazendeiros do Brasil e da
América do Norte que bem pode estar relacionada a estas peculiaridades, já que
seriam encontradas nos costumes comerciais dos fazendeiros do Caribe:
embora pudessem calcular o valor de suas propriedades e acompanhar a entrada e
saída de dinheiro, não distinguiam entre despesas correntes e de capital, nem
faziam
provisão para a amortização de bens de capital.60Outra forma de
enfatizar este pon-
to seria dizer que faltava aos fazendeiros da época o conceito
moderno de capital,
apesar das muitas características modernas de seus
empreendimentos.
J. R. Ward calculou a taxa de lucro de algumasplantations
de açúcar das índias
Ocidentais britânicas no século XVII e início do século
XVIII de uma forma que
confirma os indícios de que eram um bom investimento,
financeiramente falando.
Ele descobriu que a propriedade Parham, nas ilhas
Leeward, com 150 escravos,
gerou um lucro médio anual de E694 entre 1689 e
1697, o que representou um re-
torno de 10,3% sobre as despesas; no tempo de paz
entre 1698 e 1702, o lucro subiu
para uma média anual de f') 15, ou uma taxa de retorno
de 13,6%; durante a guerra
no período de 1703-13, o lucro anual foi de E561, com
uma taxa de retorno de
A propriedade Bybrook, na Jamaica, teve resultados
mais irregulares, cm parte como
conseqüência do ataque sofrido pela colônia. Entre
1687 e 1691, com 139 escravos'
apresentou lucro médio anual de E520, representando
uma taxa de retorno de
em 1697-98 sofreu um prejuízo de E410, e a quantidade
de escravos caiu para 103'
Entre 1698 e 1702 houve uma ligeira recuperação;
teve um lucro médio anual de
E297, o que representou uma taxa de retorno dc
4,8%. Os lucros dasplantations nas
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO No NOVO
MUNDO: 1492-1800
415

estabiliziram-se depois na faixa de 5 a 12%,


ilhasinglesas que certamente
seria con-
boa taxa de lucro na metrópole.61
deradauma
É claroque esses são lucros dos donos da plantation; o comércio a ela
ligado
gerava um saldo positivo para os mercadores (principalmente
se também
fossemcredores) e receita para os governos coloniais. Havia elementos dc
«arren-
damento" monopolístico no excedente geral relacionado às vantagens naturais
de
quegozavam as colônias deplantation e, em alguns casos, também um elemento de
proteçãocolonial. Mas sem dúvida a capacidade de mobilizar trabalho escravoe
delenuü•ir-seformava a parte do leão do excedente (como veremos no Capítulo XII).
Enquantogerava o acesso a produtos valorizados, também permitia um grau de avanço
técnico.

Odesempenhodaplantation açucareira do início do século XVIII incorporou aper-


técnicos em quase todos os aspectos do cultivo e do processamento,
feiçoamentos
alémde uma feroz mobilização de mão-de-obra. Alguns destes aperfeiçoamentosjá
foramtratados aqui. O plantio da cana em covas em vez de valas reduziu a erosão e
contrabalançoua redução da fertilidade dos campos por meio da aplicação de adu-
bo.Aintegração do uso de animais de criação como fonte de esterco, como meio de
e às vezes como fonte de tração para os moinhos acrescentoumais um
transporte
elementovital ao crescimento da produção, embora exigisse mais área para ser usa-
dacomopastagem. Com sua abundância relativa de terra, os donos deplantationsda
ainda se
Virgínia podiam sempre passar de "seções" exauridas para outras férteis, e
Os pro-
Passaria um bom tempo antes que introduzissem esses aperfeiçoamentos.
aprender
dutoresde açúcar do Caribe, especialmente nas ilhas menores, tiveram de
moinho, o
ummanejocuidadoso que levava em conta a vantagem da economia. No
de metal;
caldoera extraído com mais eficiência através de cilindros com invólucro
tachos de
nacasade fervura economizava-se usando um único duto para aquecer os
Os avanços
cobre.O bagaço da cana era muito usado para alimentar as fornalhas.
técnicosdo cultivo a produção durante as vinte e
e do processamento estimularam
quatrohoras do dia compatíveis com a intensificação
na estação da colheita, e eram os novos métodos
dotrabalho quando
durante todo o ano. Nos primeiros tempos, empregavammui-
foramintroduzidos de açúcar ainda
em Barbados, asplantations funções artesanais
ou
tosservos,e
pelo menos alguns dos escravos desempenhavam eram perfeita-
demaiorresponsabilidade. As propriedades operadas por escravos
substan-
mentecapazes a elas de forma
aderiram de
cial•b de adotar estas inovações, mas não opressora do processo
astaeste último a natureza
trabalh ponto para sugerir que produtividade.
o naplantation em
cobrava um certo preço
416 ROBIN BLACKBURN

As ilhas britânicas e francesas nas quais o cultivo do açúcar sc disseminoutis


nham grandes vantagens naturais. Embora as Pequenas Antilhas estivessem super_
povoadas, por esta mesma razão tinham grande disponibilidade dc transporte marítimo.
O aumento fenomenal da produção que estava apenas começando foi o resultadoda
multiplicação deplantations scmclhantcs às dc Barbados cm todo o Caribe britânico
e francês, com um número sempre crescentc de escravos. Ainda haveria alguns avanços
no desenvolvimento de variedades de cana e na irrigação, mas os elementos essen_
ciais do sistema produtivojá estavam todos em seu lugar no início do século XVIII.
As colônias portuguesas e espanholas que também tinham condições para o cultivo
da cana ainda não dispunham das vias e instalações comerciais necessárias. A des_
coberta de minas de ouro no Brasil em 1687 e de novos veios de prata na América
espanhola provocaram negligência em relação às possibilidades dasplantations atéa
segunda metade do século XVIII. No Suriname, e por algum tempo até na Jamaica,
o desenvolvimento dasplantations foi restringido porque bandos de maroonshaviam
se estabelecido no interior.

O regime das plantations e a questão da segurança

A agricultura deplantation que se desenvolveu no Caribe exigia padrões estri-


tos de segurança. A fundação de colônias onde os escravos representavam qua-
tro quintos da população total não tinha precedentes na história da escravidão.
O tamanho reduzido das ilhas do Caribe facilitava a vigilância dos escravose
dificultava as fugas. Os donos de plantations e seus empregados livres estavam
sempre bem armados e organizados em milícias para manter tanto a segurança
interna quanto a externa. Assim, enquanto os empregados livres fossem trata-
dos com o mínimo de consideração podia-se contar com eles para a defesada
ordem social da colônia, e o medo racial e a posição privilegiada cimentavam
sua lealdade. As potências coloniais só poderiam garantir suas possessões no Caribe
com a presença de esquadras e guarnições navais na região; isso ajudava a eli-
minar os piratas, estimulava a lealdade de seus próprios colonos, protegiaas
plantations e desencorajava rivais coloniais. Os cativos africanos não podiam deixar
de se impressionar com o poder de fogo concentrado com o qual seus senhores
podiam contar numa emergência. Equipes montadas de caçadores de escrav0S'
acompanhadas de cães rastreadores, cuidavam do problema dos fujões. A vida
-
de um escravo fugido era extremamente difícil e arriscada, a menos que pudes
se encontrar uma comunidade maroon.
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
417

canga estavam scmprc prescntcs para lembrar a punição


chicotee a que cai-
trabalhasse com afinco ou não demonstrasse
escravoque não respeito.
aos escravos cram severos e humilhantes, e podiam
dc rotina impostos
dcccpamcntodc orelhas e outras mutilações. A cabeça cortada do rebelde
num poste fora daplantation a que pertencera. Os proprietários de es-
colocada
O
occutados por sedição podiam exigir uma compensaçãode 25 libras em
quarcnta c dois escravos foram executados entre 1685 e 1688 e noventa e
Barbados;
o ano de 1691.6jO escravo suspeito de ato de revolta era sub-
trêsapenasdurante
extrema e elaborada. Hans Sloane escreve:
a umaviolência
metido
dc Escravos são, por Rebelião, queimá-los, pregando-os
AsPuniçõesdos Crimes
curvas em cada Membro, e então aplicando o Fogo gradual-
nochãocom varetas
mentea partir dos Pés e das Mãos, queimando-os aos poucos até a Cabeça, quan-
doentãosuas dores são imensas. Por crimes de natureza menor, a Castração, ou o
decepamentode metade do Pé com um machado. Estes castigos são impostos a
elescomgrande constância. Por causa de fuga, colocam-lhes Anéis de Ferro mui-
topesadosem seus Tornozelos. (...) Por negligência, costumam ser flagelados pe-
10sfeitorescom varas de madeira de lei, até ficarem cobertos de sangue. Depois de
até ficarem em carne viva, alguns jogam sobre sua pele Pimenta e sal
flagelados
paraaumentara dor. (...) Estes castigos às vezes são merecidos pelos escravos, que
sãoumaGente Muito Teimosa, e embora pareçam cruéis, são poucos frente a seus
crimes,e inferiores aos castigos que outras nações européiasaplicam em seus escra-
vos nas Índias Orientais. 64

OpadreLabat achou que os ingleses em Barbados tratavam os escravos com gran-


decrueldade,mas logo acrescentou:

Admitoque as punições são cruéis, mas é preciso considerar, antes de condenar os


habitantesdas ilhas, que eles são muitas vezes forçados a abandonar a moderação
napuniçãode seus escravos para intimidá-los, para inspirar-lhes medo e respeito
eparaimpedi-losde se tornarem vítimas da fúria de um povo que, sendo um con-
tradez,está sempre pronto a revoltar-se, a tomar posse de tudo e a cometer os
cnmesmais horríveis
para libertar-se."

Estasduaspassagens, e humanos,
escritas por indivíduos supostamente civilizados
o medo, a raiva e o ódio racial dirigidos aos escravos que simples-
ttstemunharn
tntnte
resistiam à escravidão.
ajudaram
Emborao aparato
da coerção estivesse sempre visível, outros fatores
aevitarou
quebrar a resistência dos escravos. Algumas vezes foram feitas tentativas
418 ROBIN BLACKBURN

de juntar escravos vindos de povos africanos diferentes, embora fosse limitada


capacidade do mercador para fazer isso e houvesse alguns donos deplantation; que
preferiam comprar escravos de algumas nações consideradas melhores. Não há dú$da
de que a fragmentação cultural c lingüística minava a solidariedade espontâneados
grupos de escravos onde quer que houvesse grande proporção de recém-chegados.
Em 1680, os Nobres Fazendeiros de Barbados redigiram um memorando contraa
educação religiosa de seus escravos, alegando que "não há segurança maior do que
a diversidade de linguagem de nossos negros, que seria destruída pela conversãmjá
66
que seria necessário ensinar-lhes o inglês".

Toda a seqüência de captura, transporte para a costa, travessia marítima e venda nas
Américas era traumática e desmoralizante. A maioria das vítimas do comérciode
escravos conhecia a escravidão como uma condição familiar, o que certamente aju-
dou a forçá-las a se conformar com a situação, embora com grande angústia e sem
renunciar à esperança de fugir. Mas, ainda que a escravidão já fosse conhecida dos
cativos, aplantation açucareira e suas exigências eram outra coisa. O excesso de dis-
ciplina, hierarquia e exigência de produção pesava permanentemente sobre o escra-
vo. Durante a colheita, aplantation tinha um ímpeto feroz de produção, cujo ritmo
era determinado pela necessidade de alimentar de cana a moenda e de combusúvel
as fornalhas, e ao qual o indivíduo dificilmente poderia resistir. Se o escravo sobre-
ñesse aos primeiros anos, já teria conseguido uma roça, alguns amigos, talvezaté
uma esposa; para uma minoria dos homens havia a perspectiva de passar a integrar
à elite de capatazes, artesãos e "cabeças". Estes podiam receber rações extras de rum
ou roupas, uma moradia separada ou uma roça maior; estavam também em melhor
condição para encontrar uma companheira. Estes adicionais ou privilégios ajuda-
vam a garantir a adesão de uma camada fundamental de auxiliares escravos ao regi-
me daplantation. Algumas mulheres tornaram-se governantas e outras adquiriram
os privilégios geralmente dúbios da escravidão doméstica. Era muito menos
vel que as mulheres que tivessem filhos fugissem. Em sua maioria, as plantations
eram um mundo fechado, em que a comunicação entre os vários contingentesde
escravos era proibida ou mantida num nível mínimo bastante controlado.
-
Os cativos africanos tinham algum conhecimento do que significava ser escra
-
vo. Embora esperassem fugir dos rigores da escravização total, viam-se imediata
mente inseridos num sistema escravista em pleno funcionamento, com uma gama
progressiva de sanções e incentivos. Os que chegaram antes geralmente já tinham
aberto algum pequeno espaço para si e para a comunidade escrava. Em quase toda
parte os escravos conseguiram estabelecer práticas comuns que lhes permitialll
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
419

acesso a um pedaço dc terra. Costumavam aprender


tempolivrc c alguma coi-
idiomados brancos, mas na maioria das colónias escravistasdesenvolveram-
sado
--—pídgins, patoás c crioulas. Estas novas línguas eram pouco usadas
scnovaslínguas
e mesmo os feitores tinham pouco domínio delas, No
osdonosdasplantations,
entanto,os marinheiros, estivadores, artesãos, pequenos fazendeiros, brancos po-
falavam o patoá ou crioulo, que se desenvolveu exatamente no
brcse negroslivres
espaçoentre estas várias camadas sociais e a comunidade escrava. Embora os idio-
nativos tenham contribuído bastante para o léxico dos
maseuropeuse americanos
patoáse as línguas crioulas, sua estrutura gramatical e seu ritmo continham impor-
tanteselementos africanos. 67
Haviauma luta contínua entre feitores e escravos a respeito do tempo de traba-
lho.É importanteque na maior parte da América o domingo tenha finalmente sido
estabelecido,embora de forma incerta, como dia livre para os escravos. Este costu-
meseriadefendido zelosamente pelos escravos africanos, fossem ou não cristãos ou
acostumados, como os muçulmanos, à semana de sete dias. A observância religiosa
nazonadeplantation era negligenciada, e foram feitas poucas tentativas para con-
verteros escravos,mas a idéia do domingo como um dia em que não se trabalhava
parao donodaplantation era, com certeza, muito atraente para eles. O comporta-
mentodos servos contratados e empregados livres e a observação dos rituais da so-
colonialdeixavam claro que havia uma sanção cultural-religiosa. Em muitas
ciedade
dasprimeirasp/antationsseria impraticável pôr os escravos para trabalhar mas não
osservos.Os supervisores e feitores em geral também resistiriam à idéia de perder
seudiade descanso. As vezes os donos deplantations queriam trabalhar aos domin-
gosnaépocada colheita — principalmente os pequenos produtores que predomi-
navamna Virgínia e em Maryland. Mas no Caribe os fazendeiros viam vantagem,
comoobservamosacima, em permitir que seus escravos tivessem algum tempo li-
O trabalho e as feiras de domingo davam aos escravos e à sua comunidade uma
Pequenaoportunidade, que preenchiam com avidez. Com o trabalho em suas roças
e Pedaçosde terra, os escravos do Caribe não só se alimentavam como produziam
mercadoriaspara venda. Na verdade, a produção dos escravos logo se transformou
nafonteprincipal
dos mercados locais de várias ilhas.
A capacidadedos escravos de vender os alimentos que cultivavamtornou-se
In
Witavelrnente, e donos deplantatiow
um motivo de tensão. Os funcionários coloniais
tentaramcontrolar de agita-
as feiras dos escravos, temendo que fossem uma fonte
e revolta.Havia fazendeiros
também a perspectiva de choques com pequenos
brancospobres regula-
que sofriam a concorrência dos negros. Foram aprovados
mentosque às
exigiam que as feiras fossem policiadas por brancos, que acabassem
420 ROBIN nr.ACKl)tJRN

dez da manhã c que as mercadorias à venda fossem retiradas pelo responsável


pelos
escravos. Em 1714, a Assctnbléia de Antigua aprovou uma Ici "para melhor rcgu_
lamentar os Negros c reprimir suas Conspiraçócs c Profanação do Dia do Senhor".
Mas esta tentativa de controlar as feiras dc escravos aos domingos foi
considerada
"muito inconveniente", c a Ici foi revogada sctc anos dcpois. 68Sc lhes fosse permi-
tido realizar sua própria feira, os escravos poderiam alimentar a — um ar-
ranjo satisfatório ameaçado por tentativas desastradas dc regulamentação. Os
donos
deplantati0'kf perceberam que permitir a seus escravos o acesso ao mercado lhes garantia
a dieta necessária, mesmo que pudesse também desviar suas energias — c propor-
cionar um ponto de venda de produtos roubados.
Em cada colônia havia uma luta constante entre feitores c escravos a respeito do
tempo livre destes últimos e seu acesso à terra e aos mercados. Os escravos consc-
guiam ter lucros porque, cm parte, o ganho do escravo era, quase scrnprc, um gan-
ho indireto também para o fazendeiro. O reverendo Robert Robcrtson, proprietário
de escravos em Antigua, afirmou cm 1729que, quanto aos escravos, os domingos
eram "peculiarmente seus", e que "esta Liberdade ilimitada dc fazer o que quise-
rem no Dia do Senhor torna sua Escravidão mais fácil cm todo o resto da semana".
Ele também observou: "Os escravos têm (ou, o que é a mesma coisa, pensam que
têm) alguns Direitos e Privilégios, em relação aos quais são tão obstinados como
qualquer Homem Livre sobre a Terra pode ser quanto aos seus, e que nenhum Sc-
nhor de bom Senso tentará violar."69As afirmaçõesdc Robertson cram sem dúvida
exageradas por causa de seus objetivosapologéticos,mas lembram-nos a disputa
interna em que alguns ganhos dos escravos favoreciam os interesses dos fazendeiros.

A agricultura de subsistência dos escravos era limitada em Barbados e outras ilhas


menores pela escassez de terra, o que motivava a importação de quantidade de ali-
mentos; mesmo assim, os escravos ainda supriam pelo menos metade de suas pró-
prias necessidades de comida, enquanto os senhores forneciam peixe ou carne secos
como suplemento. Os escravos da Jamaica c de São Domingos respondiam por uma
parte maior de suas necessidadespessoais. O costume do Caribe dc entregar roupas
e provisões à elite dos escravos, que iria então distribuí-los como achasse justo, aju-
dou a fortalecer a estrutura de autoridade na plantation. Na Virgínia, os donos de
plantations e os pequenos fazendeiros garantiram um controle ainda maior ao orga-
nizarem eles mesmos boa parte da produção básica de alimentos, nos intervalos do
trabalho necessário para o cultivo do furno.
À noite, mesmo depois de um dia estafante nos campos, os escravos tocavamc
dançavam. Quando trabalhou como secretário do governador da Jamaica na déca-
DO ESCRAVISMO No
A CONSTRUÇÃO NOVO MUNDO:
1492-1800
421

Sloane visitou umaplantation cm


dade1680,Hans companhia de um
músico fran-
a ajuda deste, ele anotou várias canções de escravos que
cxibiam uma forte
africana "Angola", «papa" e "Koromanti"
oracterística embora também
sasseque "suas canções são todas obscenas e tendendo para este
lado". Ele des-
os escravos tocando instrumentos dc sua própria fabricação,
violões. Cabaças
semelhantesa
harpas
alaúdes, e eram usadas como tambores, embora tambores
dequalquertamanho fossem proibidos pelos fazendeiros, já que, como os
escravos
usodeles nas Guerras em sua pátria na Africa, pensava-se que os
incitariam
.
à Rebehao
Nãoé que os africanos fossem menos propensos a resistir ou fugir à es-
do que os trabalhadores europeus. Simplesmente, já que estavam
cravização na
sua oportunidade de fazê-lo era muito mais limitada. As feitorias de
América,
na costa africana testemunharam repetidas revoltas e tentativas de fuga.
escravos
Osescravosficavam acorrentados a bordo dos navios e eram freqüentemente
mantidosalgemados ou com ferros nas pernas depois do desembarque. O mo-
dos donos deplantations sobre as armas de fogo e as tropas organizadas
nopólio
garantiama total submissão ao regime da plantation, mas muitos pontos ainda
ficavampara ser negociados entre feitor e capataz, entre capataz e turma de
escravos.
O regime aceito sob a ameaça do chicote seria contestado pela falta de
cooperaçãoou a fuga, ridicularizado ou negado nas canções, danças e contos.
Osdonosde escravos raramente ou nunca sentiam-se seguros em sua própria
fazendae podiam facilmente entrar em pânico por causa de conspiraçõesde
escravos,
reaisou inventadas. A maioria dos brancos carregava consigo uma espada
Oupistolanos distritos do interior. As sanções controladas pelo regime escravista
eramtão extensas que nem a realidade da negociação impedia que seus resulta-
dosfossembastante desiguais e opressivos para os escravos. Mas o binômio
acomodação/resistência não exauriu a escala da experiência dos escravos, já que
sempreo meio-termo da simples sobrevivência, tanto para o escravo como
quanto para a comunidade de escravos que aos poucos organizava suas
Indivíduo
novas condições de vida, suas regras quanto às roças e locais de sepul-
Próprias
o apoio mútuo de "colegas de bordo» (que haviam chegado juntos) e
tamento,
suasmemórias vanta-
e histórias reconstruídas, muitas das quais enfatizavam a
gemda orgu-
Paciência,da persistência e da esperteza sobre a força bruta ou o
arrogante.Até as
heróicas da resistência dos escravos costumavam
apresentar dimensões mais
algumarelação com estratégias de sobrevivência.
ugitivosou maroons da rejeição ao regime da
eram a prova constante os que
mas eles COStumavamse envolver em trocas irregulares com
Plantation,
ROBIN BLACKBURN
424

sendo levados a formar um bloco racial dc brancos livres contra negros escra_
ram
a afirmar a presença e, sob alguns pon_
vizados. Assim, embora devamos continuar
forças e das razões econômicas, é necessário também
tos de vista, a primazia das
de identidades dadas e a nova ênfase à "raça".
registrar a reelaboração
para a proliferação de provas de sentimento
Alden Vaughan chamou a atenção
primeiros dias das colônias inglesas. Mas
racial hostil aos africanos e negros nos
eram úteis para donos de escravos ou importa_
nem todos esses sentimentos raciais
argumentei, e o próprio Vaughan não contesta o fato de
dores de africanos, como
racial foi transformado e parcialmente redirecionado pelo surgimento
que o sentimento
elo entre racismo e escravidão, ele cita
dos sistemas escravistas. Numa revisão do
não era "tão profundo no início quanto se
J. R. Pole quanto ao fato de que o racismo
apenas necessário que o racismo fosse
tornou depois", mas que, mesmo assim, "era
uma causa da repugnância racial
suficiente, e que a identificação visível — já
Mas, embora os historiadores devessem
tornasse tão fácil a prática da escravidão". 73
isso não significa que seus cúmpli-
com certeza declarar o racismo culpado no caso,
além de sua acomodação à es-
ces, o capitalismo incontrolável e o livre mercado,
poder é muito desigual,e
cravidão, não sejam também responsáveis.Quando o
possibilidade de trans-
praticamente inimputável, o sentimento racial terá grande
pelas oportunida-
formar-se em exploração racial, e pode até mesmo ser ampliado
des favoráveis.
David Eltis argumenta que a maioria dos textos modernos sobre a escravidão
opinião,
nas Américas concentra-seerradamente em motivos econômicos. Em sua
po-
os sistemas escravistas contradizem esses motivos, já que as potências coloniais
deriam ter obtido mais lucro enviando escravos europeus para as plantations;tanto
os custos de transporte como de aquisição seriam mais baixos. Recusaram esta opor-
tunidade porque os outros europeus eram membros de sua própria comunidade
e
moral.74Este sentido de comunidade moral, por sua vez, remonta à Cristandade
ao surgimento de relações de mercado generalizadas no início da Europa moderna.
Com o tempo, um mercado atlântico mais amplo também geraria um novo sentido
de comunidade moral, e os africanos seriam emancipados segundo formas que fo-
ram descritas por Thomas Haskell.75Curiosamente, esta suposta crítica à causa
econômica realmente sugere que o mercado capitalista foi, em última instância,a
e-
força moral e política decisiva. Sendo assim, seus proponentes se mostram perpl
al
xos com o fato de que as relações de mercado teriam conduzido à escravidão raci
no século XVII mas não, aparentemente, no século XIX.
ia
Tentei mostrar que a formação da escravidão colonial envolveu uma ideolog
racial reelaborada, além de novas forças econômicas. Mas ao fazê-lo encontrei mais
CONSTRUÇÃODO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1402-1800 426

anterioresda da escravidãocolonial,feitospor
Edmund
K, G. Davics, do que cm Eltis, e sou levadoa
RichardDunn c propor,
Morgan' fatos,uma possibilidadc difercntc para destacar o papel da ideologia
bascnos
com

racial. rcsumc a formação da cscravid;io na plantation: "Os brancos


RichardDunn
os negros porquc descobriram quc cstc sistema dc trabalho funciona-
ecravizaram
bem.
muito A exploraçãoeconômica mc parccc scr o motivo principal: o racismo
o convcnicntc o uso do trabalho forçado." Elc acres-
c amparoudc forma
ccnta:

era inevitavclmcntc fácil: da exploração do trabalhador in-


O avançoda violação
dos servos coloniais, ao envio dc sequestrados c condenados c
glêspobreao abuso
dc africanos negros. (...) Depois que os barbadianos deram o pri-
à escravização
meiropassoc começaram a importar carregamentos dc negros da África, nunca
maisolharampara trás. Nem pararam para pensar se csscs trabalhadores negros
tinhamde ser escravizados, sc não poderiam ser organizados como servos contra-
tados ou empregados assalariados. 76

Oscomerciantes e fazendeirosingleses mantiveram escravos para produzir merca-


paravenda.Diferentemente dos proprietários africanos dc escravos, eles não
dorias
oscompravam por razões militares ou com a intenção dc se casar com eles, nem
Semdúvida, alguns donos deplantationsdo Caribe tinham prazer em
paraexibi-los.
comandar os escravosde suaplantation, mas muitos voltaram para a Inglaterra, sem
escravos,
assimque amealharam uma fortuna considerável. Os donos deplantations
daVirgínia
acabaramvalorizando seu papel patriarcal, mas também tiveram de adaptar-
sepermanentemente
às forças do mercado sob pena de acabarem afogados em dívi-
das.Osempreendimentosescravistas eram lucrativos — na verdade, teriam de ser
lucntivos
ou deixariam aos poucos de edstir,já que o lucro cra necessário para comprar
novaslevasde escravos. Como veremos no Capítulo XI, até os fazendeiros que, em
primeirolugar,se consideravam gentlemen acabaram descobrindo que o excesso de
dívidasdestruíasuas aspirações.
Osbeneficioseconômicos da nova escravidão colonial para fazendeiros, mer-
cadoreseo estado colonial seriam enormes. Mas vale a pena levar cm conta a pos-
sibilidadede que, a longo prazo, a escravidão racial cra cara e inflexível, inclusive
deformas
que podiamser medidas pelo mercado, sem falar cm termos humanos
maisgerais.Caso esta
opinião se sustente, então os motivos econômicos que leva-
ramà utilizaçãoda
eficazes.
escravidão racial também eram míopes, embora não menos
426 ROBIN BLACKBURN

na opção pela
Havia um componente ideológico e extra-econômico
de forma mais humana, corno
africana, já que a colonização poderia ter ocorrido
generoso das sociedades escravista
membros mais imaginativos e de espírito mais
escravidão estava implícita na
discutiram algumas vezes. A decisão a favor da
deplantatiow; os servos,
trutura comercial competitiva de mercadores e donos
não foram consultados. Como
pequenos fazendeiros e o governo metropolitano
levar ao mercado seus produtos
mercadores e donos deplantations competiam para
para importar escravos e explorá_
da maneira mais rápida possível, com liberdade
era inevitável. A opçãodo
10s,a transição para aplantation operada por escravos
governos, que se curvavam aos desejos
comércio atlânfco de escravos era apoiada pelos
seriamente interessado em maximizar
dos principais atores no caso. Para o proprietário
a decisão de comprares-
a produção, e na fortuna que essa intenção lhe prometia,
houve gente que resis-
cravos africanos era natural. Em todas as colônias européias
com a família e alguma ajuda
tiu a esta tentação, contentando-se em trabalhar a terra
para o mercado, e até mes-
de pessoas contratadas. Embora produzissem provisões
mo alguns produtos comerciais, não eram suficientemente numerosos para enfren-
tar o aumento fantástico da produção daplantation.
Como Dunn corretamente ressalta, não há indício de que os donos deplantatiow
tenham pensado seriamente em alguma alternativa à escravidão, como recrutar mais
trabalhadores africanos oferecendo-lhes contratos de servidão ou salários. Se o ti-
vessem feito seria uma inovação, mas a prática do comércio de escravos tambémo
foi. Os proprietários individuais teriam dificuldade de imaginar uma alternativa
eceqüível por conta própria, já que seria necessária uma estrutura institucionale
reguladora monada pela autoridade pública. Mas os mercadores e donos deplantatiow
eram homens influentes; e como estes eram sistemas de escravidão colonial, os go-
vernos coloniais também poderiam ter entrado em cena para mudar o contextoem
que mercadores, donos de plantationse trabalhadores em potencial tomavamsuas
lo
decisões. Na verdade, foi isso o que o funcionalismo colonial espanhol fez no sécu
li-
XVI, criando, como já vimos, condições em que havia mão-de-obra assalariada
vre e semilivre disponível para os que possuíam concessões de minas. De forma
semelhante, após a emancipação o governo colonial criou uma série de alternativas
er-
à escravidão que, embora fossem freqüentemente alvo de várias objeções, ainda p
do
mitiram mais autonomia e melhores perspectivas aos trabalhadores daplantation
que o sistema escravista.77
cnar
Pode-se pensar que o rigor do trabalho na plantation ou a dificuldade de
alternativas tornaram mais ou menos inevitável a escravidão completa nas
ções do século XVII. Esta opção correspondia à perspectiva daqueles que haviam
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO
No NOVO
MUNDO: 1492-1800
427

o poder no mundo atlântico. Mas a crítica de


conquistado
da CIOc holandesa, apontavam Mercado ou de Vieira,
ouasreservas iniciais
para outra direção.
coloniais, quando Afinalde
contas,os sistemas acharam necessário, também
responder ao desafio de demonstraram
quepodiam encontrar gente para executar
tarefasmuito
pesadassem recorrer à escravidão. O trabalho do marinheiro podia ser
quase tão
árduoquanto o de um escravo numa plantation de açúcar, e suas condições
ainda de vida
eramde certa forma piores. As autoridades governamentais usaram alguns
escravose condenados nos navios, mas estes nunca se tornaram a principal mão-de-
obranos navios de linha ou mesmo na marinha mercante. Embora as galés do
Mediterrâneofossem tripuladas principalmente por condenados e escravos,estetipo
demão-de-obra não parecia adequado para os navios oceânicos, por causa das exi-
gênciasfeitas aos marinheiros dessas embarcações e as oportunidades que eram ofe-
recidasa eles.As marinhas inglesa e francesa recorreram ao engajamento compulsório
paratripular seus navios, mas esta prática ficava bem distante da escravização.O
marinheiroforçado ou alistado recebia um salário, tinha garantidos alguns direitos
edignidadee tinha a perspectiva, embora incerta, de recuperar sua liberdade. Quando
serecrutavamescravos como marinheiros, era normal que fossem oferecidasa eles
condiçõessemelhantes. Embora o chicote fosse presença constante, houve uma ten-
tativaconcreta de incentivar a dedicação positiva da tripulação— dedicaçãoque
seriamuitonecessária quando as provisões fossem poucas, quando crescessea pers-
pectivade combates, quando um navio se perdesse ou ficasse preso numa calmaria
ouhouvesseboas condições para a deserção. Os mercadores e capitães do século
XVIItambém tiveram de superar esses problemas de motivação e controle de mão-
de-obraem condições muito dificeis.
guerresem
O fato de que era possível tripular a Marinha Real ou a marinede
diferen-
recorrerà escravidão total sugere que seria possível encontrar uma solução
aqueles mes-
te da escravidão para o trabalho na produção das plantations. Por que
sem recorrer
mosmercadorese capitães que realizaram o árduo comércio atlântico
marinhas foram
Paraisso à escravidão usaram-na para as plantations de açúcar? As
COnstruídas do poder público. Era necessá-
por meio de um esforço extraordinário
apenas para garantir que os fornece-
rioum sistema de inspeção de notável eficácia
mantivessem padrões aceitáveisde
doresde provisões para os navios de guerra
tentou regulamentar as plantations,
qUalidade e durabilidade.78Quando Luís XIV organizaçãodas
deixoude estabelecer inspeção e coação. A
um sistema eficaz de direitos elementarescon-
marinhasenvolveu alguns
a concessão aos marinheiros de ricos e poderosos do
tramaus-tratos aceita pelos
— e nenhuma concessão era bem
séculoXVII.
428 ROBIN BLACKBURÑ

mesmo assim, os marinhei


Os capitães mercantes acumulavam grande poder; _
protegiam seus interesses, Talvez
ros conservaram direitos formais e informais que
o pagamento devido aos
o direito mais significati'.n fosse que, num navio inglês,
Embora os marinheiros
marinheiros tinha primazia sobre o valor da embarcação.
devessem obediência a seus capitães, negociavam antecipadamente um contrato de
adiantamento que rece_
engajamento, que estipulava seu salário mensal, o salor do
cláusulas sobre várias
beriam e sua parte (caso existisse) nos ganhos da viagem,
«necessidades da vida", embo_
contingências e taKrz algumas estipulações sobre as
ra algumas dessas já fossem habituais.Ñ Mercadores e capitães precisavam oferecer
algumas garantias para conseguir tripulações para seus navios; como se sabia que a
vida a bordo era dificil e pengosa, os salários eram quase sempre um pouco mais
altos que os de frabalhadores não especializados em terra.
Pode-se imaginar que os fazendeiros veriam pouca vantagem em oferecer ga-
rantias e contratos semelhantes à sua mão-de-obra. Mas se tivessem mostrado dis-
posição de fazê-lo, poderiam ter enconü-ado com muito mais facilidade ü-abalhadores
assalariados ou sob contrato de servidão para suasplagtatiogs. Naturalmente, os grandes
fazendeiros da Virgínia e de Maryland cultivaram suas propriedades usando prin-
cipalmente trabalhadores livres ou sob contrato durante mais de meio século, ofere-
cendo pagamento pela liberdade ou a perspectiva de direito a terras. O trabalho nas
plantations açucareiras era mais duro, mas em vez de, digamos, dobrar o pagamento
ou a eaensão de terra oferecidos, os proprietários ofereciam o mesmo ou até menos.
Tiveram êxito na contratação de artesãos e trabalhadores especializados por ofere-
cerem altos salários, mas aos poucos descobriram que era mais barato substituir os
trabalhadores livres por escravos em todas as tarefas que exigiam treinamento. Do
ponto de vista do fazendeiro individual, esta decisão fazia sentido em termos econô-
micos, mas a escravizaçãofoi cara ou fatal para um número muito maior de africa-
nos, e embora alguns destes tenham melhorado sua situação material, isto poderia
ter sido conseguido sem a degradação da escravatura; da mesma forma, um grande
número de consumidores teve ganhos imediatos, mas pequenos, embora um pouco
de paciência pudesse ter criado um padrão econômico mais aperfeiçoado e huma-
namente sustentável, como veremos.
Permanece o fato de que a Grã-Bretanha e a França provavelmente não poderiam
abrir mão da enorme quantidade de trabalhadores em boas condições fisicas neces-
Sários ao cultivo de açúcar, fumo e outros produtos deplantation com base em con-
tratos de trabalho; esta foi uma das razões pelas quais se reduziu o número de servos*
contratados. Mas os empreendedores britânicos e franceses poderiam contratar tra-
balhadores na Africa e na Ásia, oferecendo-lhes liberdade ou a passagem de volta
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
429

anos. Supondo-se que os fornecedores


de cercade cinco da costa africana
depis comissão consideravelmente mais baixa do que o preço dos
«cebiamuma escravos,
de captura de escravos teriam
e o sistema
0comércio
sido pelo menos desestimulados.
que a sofisticação das relações sociais na Africa Ocidental pudesse
Ébempossível
disposiçõespara a exportação de trabalhadores migrantes, alguns dos
Ñrincluído
eriamenviar dinheiro de volta, como acontece hoje em dia, no fim do sé-
quais
doxx.
Emboraalguns dos escravos levados para a costa africana tivessem sido captu-
diretaou indiretamente por causa da grande demanda criada pelo comércio
2üntico,comodiscuti acima, John Thornton afirmou que, de qualquer forma, ha-
umagrandefonte potencial de escravos na África, independente da demanda
por causa de fatores como guerras dinásticas ou territoriais, que geravam
atlàntica,
dosquais era conveniente se livrar, e da fome, que podia forçar as vítimas a
sornderemou a vender seus filhos.80Esses escravos poderiam ser comprados dos
mercadores da costa, e depois receber contratos de servidão. O poder de
príncipes
Frsuasão de um contrato de servidão de três ou cinco anos continuaria a ser muito
já que o africano cativo ou "penhorado" não seria bem recebido de volta na
grande,
suaregiãode origem, e sua única alternativa seria alguma variante africana da es-

É claroque o transporte desses trabalhadores seria mais caro, já que ninguém


sedisporiaa aceitar voluntariamente a superlotação dos navios negreiros. Da mes-
maforma,as condições de vida e de trabalho nas plantations teriam de ser melhora-
dasComa redução da mortalidade, essas medidas também reduziriam a necessidade
deumfluxotão grande de mão-de-obra como o do comércio atlântico de escravos.
Osfazendeirose mercadores teriam de adiantar uma boa quantia para adquirir es-
testrabalhadorescontratados. Mas teriam recursos para isso, porque a produtivi-
dadedamão-de-obra no Novo Mundo era com certeza mais alta do que na Africa
—empartepor causa dos recursos naturais, em parte por causa dos novos produ-
e em parte por causa das novas técnicas agrícolas. Um sistema assim
t0Scultivados
que o
não resultaria na plantation integrada, mas num sistema em
cultivoda cana fosse separado de seu processamento como foi o caso no Brasil e
comoaconteceuem escravatura. O sucesso
partes do Caribe logo depois da abolição da
docultivode por escravos em quase todo o
subsistência feito predominantemente
Caribe o res-
mostra o potencial de um modelo mais descentralizado. Finalmente,
bas-
Peitoaosdireitos territoriais dos povos nativos americanos poderia ter limitado
tante0 acesso cumprido seu tempo,
à terra de servos contratados que já tivessem que
mais dispostos a aceitar trabalho assalariado. Las Casas ressaltou
BLACKBURN
430

as nações indígenas e poderia ter lido


o comércio cra bastante desenvolvido entre
uso da terra.
ampliado para promover acordos pacíficos sobre o
improváveis. Mas o que te.
As possibilidades aqui esboçadas podem parecer
escravos disponíveis na Africa?
ria acontecido se, por alguma razão, nio houvesse
da costa africana, talvez houvesse
Se o Isla tivesse estabelecido um controle eficaz
a Cristandade, além dos es_
uma proibição motivada pelo dcscjo dc enfraquecer
crúpulos religiosos. Ou se uma grande potência curopéia também encontrasse
alguma mistura de motivos religiosos e geopolíticos para interromper o tráfico
sido difícil para outros
atlântico c atacar alguma colônia escravista, podcria ter
embarcar na construção dc sistemas bascados na escravidão. A breve proibição
pelo papado do tráfico atlântico dc escravos em 1686 e as restrições de alguns
puritanos e qwakersdemonstram que o século XVII gerou impulsos desse tipo.
Neste caso, acredito que os mcrcadorcs, colonos e donos deplantatiow tenam tentado
encontrar fontes alternativas de mão-de-obra bem diferentes da escravidão total,
e seriam obrigados a melhorar, em vez de degradar, a situação dos servos contra-
udos. A proibição eficaz do tráfico atlântico de escravos poderia, provavelmente,
exigir um acordo entre as grandes potências e a redefinição da identidade euro-
péia, do tipo esboçado por William Penn em The PeaceofEurope (1693) e pelo
abade Saint-Pierre depois do Tratado de Utrecht." Se um acordo desse tipo ti-
vesse sido posto em prática, uma parte dos recursos e da mão-de-obra dirigidos
ao setor militar poderia ter sido destinada a organizar formas alternativas de ga-
rantir o fornecimento de produtos exóticos. Se os pesados impostos cobrados so-
bre o açúcar tivessem sido reduzidos, o custo mais alto de produção não chegaria
a elevar o preço do açúcar para o consumidor.
Se é válida esta linha de pensamento — e razões para isso serão dadas a segur
—então surge uma conclusão interessante. Pode-se deduzir de relatos tradicionais
que o papel das forças económicas era criar um grande número de funções produti-
vas árduas, aceitáveis apenas por escravos; e o papel da ideologia racial era reservar
estas funções para os africanos. Mas se a proibição da compra de escravos acabasse
exigindo o surgimento de um sistema produtivo diferente, então a ideologia res-
peito à propriedade privada, preocupação em aumentar a riqueza nacional, noções
patnarcais e estereótipos dos africanos como animais de carga teria dado, no contexto
do capitalismo emergente, uma contribuição para a escolha do sistema escravista de
planiarion e também para a distribuição de funções dentro dele, A afirmação de M ax
-
Weber sobre o papel das idéias como "guarda-chaves" capazes de selecionar dife
rentes caminhos de desenvolvimento histórico, ou o argumento de Antonio Gramsci
de que as idéias têm a capacidade de se transformar numa força material, poderiam
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800
431

como a accitação da escravatura permitiu


ajudara cxplicar que o desenvolvimento
fosse conduzido pclaplantation cscravista,82 Supus, no entanto, que
colonial a escra-
europeus não ocorreria caso não houvcssc
o'zaçãode escravos disponíveis na costa
africana.
EdwardMorgan apresenta um relato da formação da escravidão anglo-ameri-
canaqueestá bem de acordo com o quadro pintado por Dunn, mas que também
o papel da ideologia dc classe no desenvolvimento dos sistemas escravistas,
enfatiza
Eledestacaque a classe dominante inglesa da época pronunciou-se com frcqüência
deformafavorável aos sistemas mais rigorosos de subordinação, inspirada no des-
prezopelascamadas inferiores. Acreditavam que os ingleses pobres eram "perver-
sos,preguiçosos, dissolutos", e viciados em "Preguiça, Bebedeira, Sedução e quase
todotipo de Vício", incluindo "Discursos revoltosos e indecentes". Portanto, era
melhorencontrar maneiras de obrigá-los a trabalhar, fosse através do aprisionamento
numa"oficina" doméstica, da transferência para as plantations ou do engajamento
forçado.O bispo Berkeley recomendaria transformar "mendigos fortes (...) em es-
83
cavospelo prazo de alguns anos , reproduzindo a proposta feita pelo Protector
Somerset e por John Locke em 1696-97 e mencionada no Capítulo VI.
Aristocratase burgueses franceses tinham os mesmos sentimentos dosgentlemen
colo-
inglesesquanto ao tema. Como vimos, o período da Regência e dos projetos
asplantations.
niaisdeLaw assistiu a tentativas frustradas de enviar mendigos para
por proprie-
Emboraos escravos africanos fossem caros demais para serem usados
constituíam
táriosna metrópole, os enclaves ainda existentes de servidão medieval
francesa. As autoridades metropolitanase
0setormais estagnado da agricultura
ou a emigra-
asclassesdominantes às vezes estavam prontas a sugerir o trabalho
de revanchismo
çã0forçadospara os indesejáveis; mas este era mais um reflexo
desenvolvimento colonial. Os do-
socialdo que uma contribuição ponderada ao
problemas nem aleijados, deficien-
nosdeplantationsnão desejavam criadores de
Queriam homens e mulheresjovens
tes,criminososou gente mentalmente instável.
próprias necessidades bási-
efortescapazes de obedecer a ordens e cuidar de suas
gente seria como indicado
cC.Leisque realmente destacassem aquele tipo dc tirana
metropolitanos. Ou lhes
Q aos interesses dos empregadores ou elevaria seus
salários
camponeses
diretamentealguns de seus próprios aprendizes e
de certo ponto, o recrutamen-
aocriarescassez de mão-de-obra. E também, além popular, ou acu-
resistência
tode mão-de-obra forçada provocaria um excesso de provavelmente não se
os que
mulariamuito combustível social nas colônias. Até de escravização na
sistema
tornariamvítimas do sistema evitavam montar um
metrópole.
432 ROBIN BLACKBURN

Talvez alguns fazendeiros inglcscs ou franccscs rccusasscm trabalho escravo


europeu caso lhes fosse oferecido, cmbora o tratamento cruel que dispensavam
muitos servos c engagé$não fossc motivo dc otimismo a este respeito. Os verdadei_ a
ros obstáculos à evolução ncssc sentido, como discuti, estão mais ligados à
relação
das forças sociais na Europa Ocidental c à falta dc vantagens constantes e de
longo
prazo que um sistema dc escravidão assim poderia ofcrcccr. Juntas, é verdade,estas
considerações ajudaram a formar uma podcrosa idcologia da liberdade civilà qual
quase todos pagavam tributo cm ocasiõesapropriadas.
A escravizaçãode cativos africanos também implicava custos e riscos, masna
época estes pareciam mais aceitáveis. A dilaceração causada pela escravaturaera
mantida bem longe da Europa. Barbara Fields afirma que culturas de solidariedade
e resistência têm um caráter acumulativo formado historicamente:

quando os servos ingleses entraram em cena na Virgínia, não entraram sozinhos.


Em vez disso, entraram na companhia das gerações que os precederam na luta; e
o resultado dessas lutas anteriores estabeleceu os termos e as condições da mais
recente. Mas os indígenas africanos e afro-ocidentais entraram sozinhos no pica-
deiro. Seus ancestrais haviam lutado em outra arena, que não se comparava a esta.
As concessões que pudessem obter teriam de ser conquistadas a partir do nada,
em combate desigual, a um oceano de distância das pessoas a quem poderiam pe-
dir reforço.S4

Quando os migrantes ingleses sentiram e exigiram os direitos de homens e mulhe-


res ingleses "cristãos" e "nascidos livres", tinham uma alavanca que poderiamusar
contra seus exploradores ou prováveis exploradores. O escravo africano poderia exigir
— e sentir não menos intensamente — o respeito devido aos Akan, ou aos Mandingos
ou ao povo do Congo. Embora isso pudesse inspirar — e tivesse inspirado— al-
guns casos épicos de resistência, não impediu a consolidação da escravidão colonial
inglesa.
Mesmo em termos do horizonte restrito da defesa das "liberdades inglesas",
o surgimento do sistema escravista colonial foi uma derrota das tradiçõespopu-
lares. Por um tempo considerável, o povo da Inglaterra resistiu não só a tenta-
tivas de escravização como a ten tativas dos ricos e poderosos de possuir qualquer
escravo, não importa de que nacionalidade. Suspeitavam com freqüênciaque
sua própria liberdade e condição de vida se degradaria se tivessem de viversob
a sombra de magnatas proprietários de escravos. Hilary Beckles deixa claroque
a grande maioria dos servos ou pequenos proprietários brancos de Barbadospouco
ou nada ganhou com o aparecimento da escravidão. É por isso que eles parti-
DO ESCRAVISMO
A CONSTRUÇÃO NO NOVO MUNDO:
1492-1800
433
e só podiam ser convencidos
em rebanhos, a ficar por um
ano ou dois com
promessa de altos salários. Ainda em 1695, o
a governador queixava-se
dos donos de plantations para com os servos de que
a atitude brancos e os brancos po-
seu hábito de "dominá-los e tratá-los como cães"85
bres minava o moral
da milícia.
Na Virgínia, a vida do branco pobre certamente era melhor, mas
os donos
deplantatiow mantinham um poder mais completo sobre a colôniado que os
líderesdas colônias mais ao norte, onde havia poucos escravos e nenhum gran-
deproprietário de escravos. Assim, na Nova Inglaterra e na Pensilvânia a posse
deescravospermaneceu marginal, e os poucos escravos encontradoscostuma-
vamser tratados como servos. Havia com certeza gradações significativasde
níveisde riqueza nessas colônias, que, no entanto, eram muito menosacentua-
dasdo que na Virgínia, sem falar na Carolina do Sul ou nas índias Ocidentais.
NaVirgínia,por volta de 1700, os 5 por cento de adultos livres mais ricos pos-
suíamdois terços de toda a terra e, como observa Jack Greene, .com a transi-
sãopara a escravidão, os grandes proprietários de terras adquiriram ainda mais
vantagenssobre seus vizinhos mais pobres" .86
Os europeus estavam protegidos contra a escravização em casa não só por sua
imediata de resistência — embora isto fosse importante— mas tam-
capacidade
bémporque seus próprios governantes consideravam os proprietários de escravos
súditosincômodos: seu poder sobre os escravos tendia a tirá-los do alcancedas
leiscomuns.Os soberanos da Inglaterra e da França estavamassimdispostosa
aceitare apoiar a doutrina do "ar livre" que se insinuara em muitas municipalidades
em
nofimda Idade Média e no início da era moderna. Proprietários de escravos
precisassemde
colôniasdistantes eram uma ameaça menor, principalmente se
tratados comosúdi-
proteçãocontra inimigos reais ou potenciais, mas ainda eram
dos vários estados europeus respei-
tospotencialmente rebeldes. Os governantes
guerra costumavam
tavamnormas de conflito entre si, de modo que prisioneiros de
de um resgate em vez de serem
sertrocados ou devolvidos mediante pagamento
da Cristandade forneceu algumas regras
submetidosà escravidão. A herança comum
só os europeus eram verda-
sobreestes temas, com a suposição implícita de que
cativos também refletia o poder
deiroscristãos. Mas o costume de não escravizar
ele que o prisioneiro não era escravi-
e 0 prestígio do monarca: era por respeito a
trocados ou resgatados por causa
zad0.Prisioneiros turcos também podiam ser
Os reis cristãos do Congo, como
dopoder impressionante do Império Otomano. da
incapazes de proteger seus súditos
Vimosno Capítulo vezes Quando a
II, eram muitas da Turquia.
escravização,diferentemente dos governantes islâmicos
434 ROBIN BLACKBURN

Virgínia revisou mais uma vcz sua legislação sobre os escravos em 1705, estipu_
lou que os scrvos da Turquia quc chegassemà colónia, mesmo que não fossem
cristãos, não podcriam scr considerados escravos a menos que tivessem sido
cravos na lilrquia, já que o príncipe desse país era reconhecido pela Inglaterra.
Por outro lado, nenhum infiel — "Judeus, Mouros, Maometanos" eninguém
dc ascendência africana poderia possuir "um servo cristão", embora PUdessem
possuir um servo "dc sua própria cor". Assim, a lei confundiu completamente
raça c religião, de tal forma que pessoas de pele mais escura eram excluídasda
categoria de "cristãos"Y
A solidariedade racial funcionou como uma força que protegia os que tinham a
pele branca, mas a disseminação da escravidão nas colônias deplantation trouxe pouco
beneficio para os brancos que não possuíam escravos, já que estavam condenados à
subordinação aos grandes proprietários de escravos. A tendência dos emigrantes livres
sem escravos de partirem do Caribe para a América do Norte foi uma respostaa
isso. Os que não possuíam escravos nas colônias deplantation, muitos deles "bran-
cos pobres", gozavam de significativos privilégios de cor para consolá-los, mas não
eram muito invejados por outros colonos. No Caribe, tanto os pequenos fazendei-
ros quanto os artesãos viram sua condição ser solapada, porque os escravos supriam
o mercado com sua própria produção e eram promovidos a funções que exigiam
talento artesanal. Nas colônias deplantation da América do Norte, os brancos sem
escravos agarraram-se a funções mais respeitáveis como supervisores e feitores de es-
cravos, ou como pequenos fazendeiros na produção de alguns alimentos. Mas sua
existência ainda estava limitada pelo poder dos proprietários das plantatiow, e, no
que diz respeito aos pequenos fazendeiros, pela preferência daqueles pela produção
própria de alimentos.
O fato de que os donos deplantations começaram a aproveitar-se do trabalho de
dezenas, e depois de centenas e milhares de escravos africanos levou K. G. Davies a
concluir: "À medida que os negros iam chegando, evoluiu uma versão do capitalis-
mo praticamente fora do controle público e livre de restrições tradicionais ou sociais,
que engolfou todas as outras influências e deixou o poder político firmemente nas
mãos de alguns grandes proprietários de escravos."88 Esta conclusão, como muitos
dos argumentos apresentados acima, são contestados por David Eltis. O fato de que
os donos das plantations recorreram a escravos africanos mas não a escravos
parece a ele demonstrar uma restrição auto-imposta que está em desacordo com 0
capitalismo irrestrito. Ele argumenta que
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
435

século XVII, mercantil ou não, dificilmente era tão


0 capitalismo do irrestrito e
muitos dos que estudaram os primórdios da Europa
vorazcomo retrataram mo-
comportamento de maximização dos lucros ocorreu dentro de limites
derna,O
aceitose definidos tanto por valores comuns quanto pela resistênciadas classes
menosfavorecidas."

acreditar que a utilização de escravos europeus seria


Elechegaa esta opinião por
umaopçãomais lucrativa para os donos deplantations por ter custo menor. Ele es-
creveque«europeus, principalmente ingleses", deixaram passar uma oportunidade
econômicapor causa da recusa de escravizar seu próprio povo:

se tivessem imitado a aristocracia russa do século XVI criando uma distância ideo-
lógicaentre eles e o povo, e escravizado alguns membros de sua própria socieda-
de, teriam se aproveitado do custo mais baixo da mão-de-obra, do desenvolvimento
mais rápido das Américas e de níveis maiores de exportação e renda nos dois lados
do Atlântico. 90

Consideroesta conclusão incorreta e despropositada. Por razões já explicadas,seria


quaseimpossível fazer ressurgir a escravidão na Inglaterra e na França no século
XVII,mesmoque os defensores deste projeto pudessem identificar claramente um
grupoadequado de vítimas. E mesmo que fosse possível, isto não beneficiaria, como
sugereEltis, o desenvolvimento europeu ou americano, como demonstra o próprio
exemploda Rússia. É verdade que uma categoria de ricos e poderosos sonhou com
asvantagensde submeter camadas da população européia a uma servidão humi-
lhante.Na Irlanda, os ingleses tentaram coisa semelhante e, depois de uma seqüên-
ciadelutas sangrentas, expropriaram muitos donos de terras irlandeses e impuseram
0pagamentode arrendamentos sufocantes aos camponeses católicos, Embora pro-
êxito
Prietáriosprotestantes de terras tenham enriquecido individualmente, seu
restringiuo poder de compra dos camponeses da Irlanda e, ao negar aos rendeiros
Irlandeses desestitnulou aumentos
católicosos beneficios do aperfeiçoamento agrícola,
su-
deProdutividade.A escravização cotnpleta dos irlandeses católicos --—mesmo
Pondoque isso fosse poderia ter gerado algumas fortunas individuais,
possível
mascriariaum padrão ainda tnenos probabilidade de levar
de relações sociais com
a umProcesso quanto mais algutna evolução
adequado de acumulação capitalista,
equilibradae igualitária. de escravos catuponeses irlande-
sesou Além disso, o etnbarque senhotRs de temivs
franceses em boa privaria os
fortna para o Novo Mundo Ingla-
europeusde sua econôtnico na Holanda, na
mão-de-obra. Houve progresso por esta-
terrae em precisatnente
algutnas outras regiões da Europa Ocidental
436 ROMN BLACKBURN

rem atoladas num lamaçaldc servidão camponesa como na Europa Oriental.por


outro lado, como vcrcmos, é inegável que eles extraíram bencficios económicosde
trocas com as novas colônias nas Américas e dos investimentos ali realizados, Mas
isso ocorreu porque as colônias tinham um panorama social muito difercntc da ser_
vidão "barata" da Europa Oriental.
É paradoxal que a "despesa" de comprar e equipar a mão-de-obra africanate-
nha ajudado a estimular a economia inglesa; embora possa soar estranho, a despesa
ainda maior de ser obrigado a recorrer ao trabalho livre teria sido ainda mais esti-
mulante. E esta é não só uma especulação imaginosa mais otimista do que a propos-
ta por Eltis, mas que também se realizou até certo ponto, já que parte considerável
da formação social colonial da América do Norte, onde a escravidão era marginal,
contribuiu vigorosamente para o avanço atlântico. As colônias da Nova Inglaterra e
do Atlânticocentral desempenharam papel importante na ampliação do mercado
colonial para as manufaturas inglesas e forneceram suprimentos, alimentos e servi-
ços navais para as colônias deplantation. 91
Em muitas partes da Europa Ocidental e em boa parte da América do Norte
havia um sentimento crescente de que — como descreveu John Cary, o filosófico
mercador de Bristol, em 1697 — "a Liberdade do indivíduo" era vital para a rique-
za e a prosperidade da nação, e que em última instância, "todos vivem uns para os
outros". 92Proprietários ricos e senhores de terras ainda sonhavam bastante com um
contingente de mão-de-obra completamente servil, mas foi a frustração deste dese-
jo que permitiu o avanço econômico numa base mais ampla, compreendendo tanto
um mercado interno maior quanto um conjunto mais flexível de produtores. Os
escritores da escola escocesa de filosofia moral e economia política iriam extrair dis-
so suas conclusões. De forma semelhante, no primeiro volume do Capital,Marx
chama a atenção para o paradoxo de que a regulamentação da duração da jornada
de trabalho — combatida por muitos capitalistas individuais com a justificativa de
que o lucro era gerado nas últimas horas — acabou estimulando o aumento de pro-
dutividade e a apuração de uma taxa de acumulação mais alta.
Embora o desenvolvimento das plantations inglesas e francesas no Novo Mun-
do tenha representado um elemento dinâmico da economia atlântica baseada em
de-obra escrava, vale notar que as ilhas atlânticas portuguesas e espanholas também
-
tornaram-se muito produtivas utilizando tipos de mão-de-obra livre e independen
te. A ilha da Madeira e as Ilhas Canáriasproduziamvinho, enquanto os Açores
forneciam trigo a Portugal e seus territórios. A agricultura intensiva dessas ilhas
baseava-se em mão-de-obra artesanal independente e mão-de-obra assalariada, e niO
em escravos. As ilhas eram escalas e postos de abastecimento convenientes para 0
DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
A CONSTRUÇÃO 1492-1800

dando oportunidade para entrepostos e


comércioatlântico, contrabandistas. Tam-
animais domésticos para o Caribe. A população da Madeira
bémeq,ortavam e dos
de 109.000 pessoas em 1650 e chegou a 149.000 em
Açoresera de cerca 1720. As
nas ilhas atlânticas representavam 14% do total das
tarifasarrecadadas tarifárias
sem incluir a soma considerável cobrada do comércio entre as ilhas e
dePortugal,
Em grau menor, o Caribe espanhol, partes do Brasil, a Louisiana francesa
Lisboa.93
escaparam aos maiores rigores da escravaturacomerciale
e mesmoo Suriname
desenvolvimento da escravidão totalmente racial foi
mobilizadapelo racismo. O
regulamentações coloniais e coletivas. As conseqüentes
retardadanestas colônias por
formasbarrocas de escravidão deram mais oportunidade para que identidades su-
balternasemergissem e tivessem algum reconhecimento, na forma de irmandades
cristãsafricanas e direitos sociais para pessoas livres de cor. As tendências crioglizantu
daescravidãodo Novo Mundo eram mais evidentes nessas colónias— em parte
porseremculturalmente menos intolerantes, e em parte porque sua taxa mais lenta
dedesenvolvimentosignificava que a população se renovava mais pela reprodução
naturaldo que pela chegada de imigrantes forçados recém-desenraizados. Mas embora
o desenvolvimentodessas colônias fosse mais lento, não era desprezível. Em Cuba,
comoveremosa seguir, o fumo ainda era cultivado por mão-de-obra livre e tinha
umaprodução considerável, enquanto a criação era outra atividade económica im-
portantebaseadaem parte no trabalho livre.94
Os puritanosda Nova Inglaterra e das colôniasdo Atlânticocentraltinham,
comovimos, aversão ao uso de escravos. O exclusivismo étnico-religioso teve seu
papelnisso, assim como a condenação da ociosidade e do luxo. Os colonos mais bem-
sucedidostinham alguns servos ou escravos, enquanto os que eram comerciantes
participaramdo tráfico atlântico de escravos. Mas a opinião pública nessas colônias
eracontráriaà criação de uma camada grande e permanente de escravos ou servos
alguns escravos,
Os holandeses de Nova York e Nova Jersey possuíam
SUbalternos.
"melhor
masestecostume não se espalhou. A Pensilvânia adquiriu a reputação de
colô-
terrapara homens pobres", precisamente por existirem poucos escravos nessa
principais
nia.Mas o fato de que a escravidão continuou sendo legal ali e que os
gerar
colonosparticipavam ativamente do comércio de escravos era suficiente para
intermédio
Inquietação.Em 1688, a oposição à escravidão ganhou eloqüência por
qgaker
dogrupo quacre em Germantown, e foi posteriormente manifestada pelo
escocêsGeorge Keith and Cat'tion (Exortaçãoe cautela) (1693).
em sua Exhortation 1712, o futuro da
Depoisda irrupção de resistência escrava em Nova York em
pública na
e do tráfico de escravos passou a ser tema de controvérsia
escravidão
Pensilvânia.Uma foi rejeitada pela
escravos da colônia
petição para libertar todos os
438 ROBIN BLACKBURN

Assembléia, mas a proposta dc cobrar uma tarifa proibitiva de E20 pela entradade
cada escravo foi aceita. As autoridades coloniais vetaram esta medida, aceitando
uma tarifa mais baixa. Esses acontecimentos foram importantes por terem sido as
primeiras ocasiões em que a escravidão e o tráfico de escravos foram desafiados como
questões de política pública por uma assembléia representativa. Como os principais
colonos estavam bem representados na Assembléia e muito provavelmente tinham
interesse na escravidão, não surpreende que estas primeiras iniciativas tenham fra-
cassado. Mas muito antes dos primeiros sucessos abolicionistas já havia um pre-
conceito difuso contra a escravidão que pôde — e em setores do mundo atlântico
realmenteconseguiu— restringir seu desenvolvimento."
Stanley Engerman e Kenneth Sokoloffchamaram a atenção recentemente para
o fato de que as elites americanas que recorreram à mão-de-obra cativa e sem liber-
dade ganharam a capacidade imediata de explorar os recursos naturais e as vanta-
gens de seu continente. Mas, argumentam, o padrão bastante desigual de sociedade
assim produzido iria prejudicar o desenvolvimento econômico posterior, porque suas
formas de controle da mão-de-obra — fosse a escravidão ou o tributo em trabalho,
a servidão por dívidas ou a condição de meeiro — não geravam participação mais
ampla na "economia comercial, nos mercados e na mudança tecnológica".96Esta
conclusão está de acordo com a argumentação mais extensa apresentada anterior-
mente, mas vou sugerir que as plantations escravistas, embora não estivessemtão
integradas aos circuitos comerciais e às mudanças tecnológicas como estariam as
empresas que contratavam trabalhadores assalariados formalmente livres, encontra-
vam-se, no entanto, nas condições dos séculos XVII e XVIII, relativamente adap-
tadas a circuitos ampliados de acumulação de capital, e eram capazes de absorver
pelo menos algumas mudanças tecnológicas. Assim, depois de enfatizar as desvan-
tagens econômicas e humanas da opção pelaplantation escravista, será necessário, a
seguir, lembrar a imensa contribuição que, apesar de tudo, ela deu à acumulação
atlântica. Os próprios Engerman e Sokoloff comparam a herança negativa da es-
cravidão e da encomiendacom a florescente economia de pequenos fazendeiros, pe-
quenos produtores e comerciantes que se desenvolveu nas colônias do norte dos Estados
Unidos. Embora este contraste seja mesmo espantoso, permanece o fato — como
veremos no Capítulo XI — de que as colônias da Nova Inglaterra e do Atlântico
central romperam sozinhas um padrão inicial bastante autárquico de atividade eco-
nômica ao encontrar mercados e fontes de matéria-prima nas regiões deplantatiog•
A contribuição real, e não especulativa, da escravidão para a acumulação atlântica
será o tema seguinte.
CONSTRUGÅO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 439

gotas

qtr James Horn, "(To Parts Beyond the Seas': Free Emigration to the
j, Chesapeakein
Seventeenth Ccntury'i, cm Altman e Horn, eds., "7bMake
the America":European
Emigration i" the Early Modern Period, Bcrkclcy, CA 1991,pp. 85-131(p.
92).
Ilistoipv générale des Antilles habitéespar lesfrancais,
Du 'frrttti vol. Ill, p.445. Sobre
proprictåriosdc plantations cm tcrtnos mais gerais, ver Sheridan, Sugar and Slavery, p.
Les Esclaves aux Antillcsfrancaises, XVII' et
267;GabrielDcbien, XVIII' $i&le,Basse
(Guadalupe)/ Fort-dc-l•hncc (Martinica) 1974,pp. 105-17.
Beyond the Scas'", cm Altman c Horn, eds.,
3. Horn,"8ToParts Make America",p.
93.Horn aqui resume as conclusöcs de Russell Menard, "Economy and Society
in
EarlyColonialMaryland", dissertaqäo dc Ph.D., Universidade de Iowa, 1975,pp.32-
6.
4. Schwartz,Sugar Plantations in the Fonnation of Brazilian Society, p. 274.
S, Curtin,"The Atlantic Slave Trade", em Ajayi e Crowder, A History of WestAfrica, I,
pp.252-3;Philip Curtin, "Epidemiology and the Slave Trade", PoliticalScienceQuarterly
S3,junh0de 1968, pp. 190-216.
6. C. S. S. Higham, The Development ofthe Leeward Islands underthe Restoration,Londres
1921,p. 172. Se, como sugere obra recente de Richard Ashcraft, John Locke partici-
pouda Conspiragäo de Rye House, é possfvel que este patrocinador da Real Compa-
nhiaAfricanaacabasse sendo embarcado para St Kitts para trabalhar numaplantation
—embora osgentlemen costumassem ser punidos de outra forma, de acordo com a ideo-
logiada classe dominante.
7. O debatede 1659 é citado num artigo sobre a nosäo do "inglés nascido livre" ("freeborn
Englishman")em Keith Thomas, National and Local Feeling in England: c. 1550-1750,
Departamento
de Hist6ria, Universidade de Oxford, 1985. Para uma justificativa
admiråveldos direitos dos "ingleses nascidos livres", ver o relato de William Penn de
seusucessonumjulgamento de 1670: William Penn, "The People's Ancient and Just
Liberties Asserted", em The Peace of Europe, The Fruits of Solitude and other Writings,
Londres 1993, pp.135-52.
8. Beckles,White
Servitude and Black Slavery in Barbados, p. I I l.
9, Le RoyLadurie
explica a falta de emigrantes principalmente pela 16gica das pequenas
propriedades:"no século XVIII, apesar dos ataques constantes de compradores de terns
o arquipélago mültiplo de terras
familiares conseguiu defender-se bastante bem.
Esta é uma das
razöes pelas quais a Fransa, diferentemente da Grä-Bretanha ou
da Espanha, näo
era uma terra de emigrasäo: a pequena propriedade do tipo francés,
quaseinfinitamente
divisfvel, fornecia ao nåmero crescente de camponeses uma safda
relativamenteaberta e
disponfvel." Le Roy Ladurie, The Fench Peasants, 1450-1660
Londres1987,
p. 410.
Blandine
Barret-Kriegel, L'État et les Esclaves, Paris 1979, pp. 51, 75-6.
uOOlN
440

Ia pp. IOS,Sobre o teor Ideológico


i I, Pluchon,
monamuia absolutista, Gotdon, CitiU"I Wilhout
in 'lhoqghl.
Ia Ia
formasdc
ag Si&le 1984,
12, Lorena Walshi nod in the t)
MotRan, and andthe i" the
Charlottcsvillc, VA 1993, pp, (p, t?6), acrescenta: "Escravos
parte (Ias colheitas individuais
servos nào-brancos, produziram
e a maioria eficientes trabalhadotvs de atiicanos, e de crioulos,"
como ela a melhor produtividade dos africanos em dos crioulçxs
"ia renctir simplesmente a fertilidade maior do solo Virgem embota este ponto
invalide a com os servos que tanibélli tiveram o mestuo beneficio,
13, Richard Ligon,a Exact {listory qfthe Island Londres 1673,
pp, 43-4,
14. Du Itrtrc, Ilistoôvxé"étvdedes vol. citado em Ilue\'te e Lemps,
i
Servants Bound for the Antilles' , em Altman e I loro, eds.,
p.17S,
Os donos de da Carolina do Sul aptvciavam particularmente a capacidade
dos africanos de se sustentatx•m por conta própria, Ver l\'tet' Wood,
Negmesin Colonial South t ó 70 thtvu«h the Stone Nova 1974,
pp. 95-130,
16. Smith, Colonist$in Bonda«e,pp, 243-4, 257•9, 279, 291-306, Sobtv a entre o
número de enxagégfranceses e a repressao política na metrópole, ver Gabriel lôebien,
Enxagéspgr Antilles, 1952, pp, 247-61,
17, George Alsop, "A Character ofthe lh•ovinccof Maryland", em Clayton Colman Hall,
ed., Narrativo ofEarly Maryland,' ló$3-ló$4, Nova 19 pp, 33S-406 (pp, 3S4,
359).
18, Mas veja também Galenson, White Sereitude in pp, 134-41s
19, Morgan, american Slavety, American p, 327,
20. Samuel Sewall, The Sellin« Boston, MA 1700,
21, Sobre a dinamica da interpelação, ver Louis Althusser, «Ideology and ISAC, em
Zizek, ed., Mapping Londres 1994,
22. Richard Ligon, Barbados,p, 54.
23. Sobre o "scold's bridle», ver Anthony Fletcher, Gendet;
1500-1800, New I laven, CTe Londtrs 1995,pp, 273-4, Sobxrseu uso
ver Olaudah Equiano, cd, Vincent Carretta, 'lhe
Londres 1995, pp. 62-3; Ortiz, Esclavost,p, 261,
24. Godwyn, lhe Nevo Indiatutldtvcate, p, I I I , Sobre nomes de escravos,
Craton, Searchin«fer lhe Invi$iUe Slaves and
A CONSTRUGÅO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:1492-1800
441

"From Creole to African", Williamand


1978,p. 157; Berlin, Mary Quarterly,abril de
286.
1996,pp. 251-2,
transiqäo para a cscravatura na América do Norte, ver Richard Beane
25. Sobrea Robert
"The Adoption of Slave Labour in British North America",em Gemerye
p. Thomas,
Hogendorn, The UncommonMarket, pp. 377-98. Para um exame mais extensoda com-
parasäoentre o custo econömico da escravidäo e da scrvidäo sob contrato,ver David
Galenson, White Servitude in Colonial America, Nova York 1981 , com dados numéricos
154, 217. No que diz respeito ao Caribe francés, fica evidentea
e um sumårio nas pp.
crescente disponibilidade de escravos no perfodo da virada do século e depois nas Memoirs
do padre Labat.
26. Posisäoexplorada por William A. Green, "Race and Slavery: Considerationson the
WilliamsThesis", em Barbara Solow e Stanley Engerman, eds., BritishCapitalismand
CaribbeanSlavery, Cambridge 1987, pp. 25-50.
27. Kwame Yeboa Daaku, Trade and Politics on the Gold Coast, 1600-1720: A Study ofAfrican
Reactionto European Trade, Oxford 1970, pp. 96-143.
28. PeterMark, "Constructing Identity: Sixteenth and Seventeenth Century Architecture
in the Gambia-Gebu Region and the Articulation ofLuso-African Ethnicity",History
Freyre,
in4frica, vol. 22, 1995, pp. 307-27. Sobre a casa-grande brasileira, ver Gilberto
TheMastersand the Slaves, Nova York 1956, pp. xxxii-xxxv.
29. Citadoem Davies, The Royal African Company,p. 140.
1993,pp. 18-
30.James Searing, WestAfrican Slavery and Atlantic Commerce,Cambridge
Africa, Cambridge
25; Paul E. Lovejoy, Transformations in Slavery: A History ofSlavery in
1983,pp. 66-87.
Jordan, White
31. Richard Jobson, The Golden Trade, Londres 1623, citado em Winthrop
over Black, p. 63.

Understanding, Oxford 1975, pp. 606-7; cita-


32. John Locke, An Essay Concerning Human
do em Hannaford, Race, p. 195.
Slave Trade", Past and Present,115,maio
33. RichardGray, "The Papacy and the Atlantic
insurreiqäo de escravos encon-
de 1987, pp. 52-68. Exemplos da incitaqäo espanhola
Overthrow ofC010nia1Slavery, capi-
tram-se na Segunda Parte, Capftulo Xl e em The
tulos V e IX. 1977
Governo dos Escravos, Säo Paulo
34•Jorge Benci, Economia Christi dos Senhores no
a licensa de Roma em 1705).
(edisäooriginal Bahia 1700; esta obra teve negada Policy,
Rivalry and Spanish Slave
35.John TePaske, "The Fugitive Slave: Intercolonial its Bo,derlands,
Century Florida and
1687-1764",em Samuel Proctor, ed.,
Gainesville,FL 1975, pp. 1-12. Dominated by Men?", The
36. David Trade
Eltis e Stanley Engerman, "Was the Slave de 1992, pp. 237-258 (pp.
outono
Journaloflnterdisciplinary Histoty, vol. xX111, no. 2,
241, 243).
142.
37' Debien, "Les Histoire desAntilles,p.
Esclaves", em Pluchon,
91.ACKBURN

38. Meitlxnoux, Anthrop'. ofSlavery,Parte Üm, capftulo3.


39. Myriam Cottigs, Martinique:nabylone fertileou terre de
raphr Higr&ut, 1992, p. 204; Gautier, Segrrdt solitude,pp. 62-78; Richard Limn,
A Exact ofrhe IslandofBarbad0$, London 1657, p. 1 1j. Barbara Bush.
Slimani. Ollard Labour: Women, Childbirth and Resistance in British Caribbean Slave
Societies", Bistory Workshop,outono dc j 993, pp. 83-99.
40. Richard Sheridan, SugarandSiaver.• An EconomicHistory ofthe British WestIndies, 1623_
1773, Baltimore,MD 1974,p. 23.
41. Dunn, Sugar and Slaves, pp. ISS-9.
42. Gabriel Debien, Engagåpgr 10 Antilles, p. 257.
43. CD Ttmmcr, Turnip, the New Husbandry, and thc English Agricultural Revolu-
dons , QuarterlyJogmdofEcosomiC$,vol. 83 (969), pp. 375-95 (p. 394).
44. Gabriel Dcbien, •Les Esclaves", em Pluchon, cd., Histoire des Antilles, pp. 141-62
(P, 146).
45, Henry Drax, •Instructions for the Management of Drax-Hall and the Irish-Hope
Plantations", citado em Puckrein, Little England, pp. 82-3.
46. Citado em Puckrein, Lit:Je England, p. 77.
47. 38%lIiamMcNeill, The Pgrsgit of Power: Techn010ü,Armed Force and SocietysinceAD
1000, Chicago 1982, p. 129. Ver nas pp. 126-33 uma descrigäo geral das novas técni-
cas militares.
48. Evocado e citado com vivacidade em Leroy Vale e Landeg White, "Forme of Resistance:
Songs and Perceptions of Power in Colonial Mozambique" , American Historical Review,
vol. 88, n o.4,outubro de 1983, pp. 883-919.

49. Para uma anålise ncst2 linha dentro da tradigäo mandsta, ver Eugene Genovese, The
Polstizal Economyof Slavery, Nova York 1968; Jacob Gorender, O escravismo colonial,
Sao Paulo 1988; GA. Cohen, Karl Marx's TheoryofHistory: A Defence, Londres 1978.
A critica da economia da escravidäo feita pelo economista liberal clåssico John Cairnes
cm The Slave Power, Londres 1862, coincidiu em vårios pontos com a anålise que Marx
fez na mesma época nos Grundrize e no Capital. Para um estudo deste ültimo, ver tam-
bém Robert Miles, Capitalism and Unfree Labour: Anomalyor Necessity?, Londres 1987.
SO, J. R- Ward, "The ProfitabilityofSugarPlantingin the British West Indies: 1650-1834"'
EconomicHiuor•y Rcview, ? , série, XXI, no. 2, maiO de 1978, pp. 197-213.
$1. Os gue escreverarn sobre o custo do trabalho escravo tinham
este aspecto em mente•
Na discussåo da genese da renda capitalistada terra no volume 3 do Capital,Marx
argumenta que o preso pago pelo escravo, baseado na previsäo do valor do excedente
a ser produzido pelo escravo, é efetivamente subtrafdo da produsäo, ou seja, dos re-
cursos disponiveis para o proprietårio de escravos construir aplantation. Cf Karl Marx'
Capital, JIJ, Londrcs 1981, capitulo 47, sesäo V, p. 945.
52. Este problema é mencionado por Eugene Genovese, The
Political Economyof Slave"'
p. 49; para urna extensa discussäo, ver Gorender, O estravi$tno
colonial, pp. 192-240•
DO ESCRAVISMO NO
A CONSTRUGÄO NOVO MUNDO:
1492-1800
443

sugar and Slaves, pp. 197-200.


53.Dunn, Sugar and p. 267.
Sheridan,
Watts,TheVVotIndies, pp. 403-4, 429.
55. argumentou que: "The sporadic application
56.KarlMarx ofcoopcration on a large
(...) and in modern colonies, rests on direct scale
inAncienttimes relations
of domination
andservitude,in most cases on slavery"* , Karl Marx, Capital, vol. 1,
p. 452. Ele es-
o seguinte sobre o sul dos Estados Unidos: "The cultivation
cr.cveu
of the Southern
cotton, tobacco,
exportarticles, sugar etc, carried on by slaves
is only remunerativeas
longas it is conducted by large gangs of slaves, on a mass scale and
on wide expanses
ofa naturally fertile soil, that requires only simple labour. Intensive cultivation,
fertility Of the which
dependsless on the soil than investment of capital,
intelligence and energy
oflabouris contrary to the nature of slavery."** Karl Marx e Frederick Engels,
The
CivilWarinthe US, Nova York 1937, p. 67.
57.Cartapara o conde de Orrery, citada em Pierre Marambaud, WilliamByrdof Westover,
1674-1744, Charlotteville,VA 1971, pp. 146-7.
colonial, p. 142.
58.Gorender,O escravismo
59.Schwartz,Sugar Plantations in the Formation of Brazilian Society,pp. 193, 231-2. Segun-
do registros ainda existentes, as propriedades dos jesuftas näo eram lucrativas nem bem
administradas;no entanto, Schwartz cita informagöes que mostram que as proprieda-
desdos beneditinos geravam um retorno razoåvel e também forneciam a seus escravos
acima da média (pp. 222-3, 236).
provisöes
60. Ibid., p. 218.
61.J.R.Ward,"The Profitability of Sugar Planting in the British West Indies, 1650-1834",
emHilary Beckles e Verene Shepherd, Caribbean Slave Societyand Economy,Londres
1991,pp. 81-94 (pp. 85, 91-2). Este valioso estudo foi publicado pela primeiravez
emEconomic History Review, vol. 31, no. 2, 1978.
62. Watts, The West Indies, pp. 391-447.
63.HilaryBeckles,BlackRebellion,Bridgetown 1984, p. 51; Beckles, HistoryofBarbados,
P. 40.

64.HansSloane,A Voyageto the Islands, Londres 1706, vol. I, p. Ivii.


65.Jean-BaptisteLabat, Voyagesaux iles de l'Amérique, Paris 1979 (originalmente 1722),
p. 248.

66. Calendarof State Papers, Colonial, 10: 611, 8 de outubro de 1680.

repousa
aplicasäoesporådica da cooperaqäo em grandc escala na Antigüidade e em colönias modernas
(N. do T.)
• relagÖes diretas de dominaqäo e servidäo, na maioria dos casos, na escravidäo". escravoss6é compensador
"O cultivodosartigos de exportaqäo do Sul, algodäo, tabaco, asåcar etc., executadopor
extensöesde solo natural-
enquanto é realizado por grandes grupos de escravos, em escala maciqa e em grandes
menosda fertilidade do solo
Gil, que exige apenas trabalho simples. O cultivo intensivo, que depende natureza da escravidäo". (M
doquede investimento é contrårio å
de capital, inteligéncia e energia de trabalho,
M.ACKBURN

Lambert-Félix h•udent, Des à Ia Langue Antillaisc, Paris 1980.


6Ss David Bart•yGaspar, «sugar Cultivation and Slave Life in Antigua bcfore 18009
Berlin e Morgan, eds., Cultutv, pp. 101-23.
69. Robert Robertson,A Letterto the Búhopf London,Londres 1730, citado cm Gaspar,
and Slavr Life in Antigua», em Berlin e Morgan, eds., Cultivation and Culture,

70. HansSloanesA vol. l, pp. xlvii, lii. Ver Richard Cullen Rath, "African
Music in Sornteenth CenturyJamaica», IVi//iamandMary Quatrerly, Outubrode 1993,
pp, 700-26, em especial pp. 710-12.
Por razoes óbvias é dificil documentar o ponto de vista dos escravos c rebeldes africa-
nos no período mais antigo. A história das rebeliões e das comunidades mamonsconti-
nua sendo a melhor prova de que os africanos trjeitavam o pesadelo utilitário da escravidão
americana, Ver Orlando Patterson, úSlax,rry and Slave Revolts: A Socio-historical Ana15is
Ofthe first Mamon NVar",em Richard lh•ice, ed., Mamon Societies:Rebel Slave Communities
Nova \brk• 1973, pp. 246-92; R. K. Kent, "Palmares: An African State
in Brazil", em frice, Mamog Societies,pp,179-90; Debien, Les Esclaves aux Antilles,
pp. 411-69; José Luciano franco, Las minas de Santiago y Ia nbelión de 10scobrms, Havana
1975.
72. David Eltis, "Europeans and the Rise and Fall of African Slavery in the Americas: An
Hist0'àcalReviete, dezembto de 1993, pp. 1399-1423 (p. 1423).
73. J. R. Pat.hstolhe Prsegt, Nova York 1979, p. 71, citado em Vaughan,
Ross Racistn,p. 173.
74. David Eltis, "Europeans and the Rise and l•àlllofAfrican Slavery in the Americas: An
Interpretation",
75. Eltis cita Thomas Haskcll, «Capitalism and the Origins ofHumanitarian Sensibility",
partes um e dois, em Thomas Bender, ed., The An:islavery Debate: Capitalismand
in Historical Perspective,Berkeley,CA 1992, publicado originalmente em
Historical Revieto, abril e junho de 1985.
76. Dunn, Sugar and Naves, pp. 225-6.
77. No final do século XVIII e início do XIX, o governo inglês comprou milhares dc es-
cravos na África, alistou-os em regimentos especiais nas Índias Ocidentais e lhesofe-
receu salários e a perspectiva de emancipação em troca da lealdade cm serviço; no fim
do período, alguns ficaram no Caribe, outros voltaram para a África. Henry Christophe,
rei do Haiti (1807-21), também recrutou soldados desta forma. Tanto os ingleses quanto
os franceses recrutaram servos contratados logo depois da emancipação, os ingleses na
Índia e os franceses na África — no último caso, os recrutados eram, quase certamen-
te, escravos na África, e só conseguiram alguma perspectiva de possível liberdadeno
Novo Mundo depois de manifestações abolicionistas. Nas décadas de ISSOe 1860'
antes da abolição da escravatura, as autoridades espanholas em Cuba permitiram a entrada
de servos contratados chineses, que serviam durante três anos cm troca de salários
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO
MUNDO: 1492-1800
445

esses casos cra grande a


nominais.Em todos pressão sobre os servos
situação no Novo para venderem
seufuturo,c sua Mundo cra opressiva c
vulncrávcl. Mas ficava
trca condição do servo contratado europeu e a do en-
condenado europeu, e
mais próxima
destasque da situação do escravo, Os que sobrevivcram tornaram-se
livres mas, como
europeusque haviam sido condenados, scrn a promessa de terras nem
de indenizasão
por ocasiãoda libertação.
VerN. A. M. Rodger, The WoodcnWorld: An Anatomy ofthc Georgian
Nato, Lon-
dres1988. Embora esta obra se dedique a aprcscntar uma visão rósea
da vida a
bordodos navios da Marinha Real, cita provas sólidas mais que suficientes
para
mostrarque omundo da marinha de guerra e o do escravo cram na
verdade muito
diferentes.
79.Marcus Rediker, Bctween the Devil and the Deep Blue Sea: Merchant Seamen, Pirates and
Matitime World, 1700-1750, Cambridge 1988, pp. 116-52.
theAnglo-AmeHcz2% Vertambém
Arthur L. Stinchcombe, Sugar Island Slavery in the Age ofEnlightenment: The Political
Economy ofthe Caribbean World, Princeton, NJ 1995, pp. 57-88. Stinchcombe enfatiza
a complexidadefuncional e a mobilidade de embarcações que, segundo acredita,de-
terminarama oferta de condições razoáveis para garantir a necessária boa vontade dos
frabalhadores.Sobre a experiência arriscada mas às vezes compensadora de um mari-
nheironegro, ver Equiano, The Interesting Narrative.
80. andAfricans in the Making ofthe Atlantic World,pp. 98-128. Thornton
duvidaque a demanda atlântica tenha tido grande impacto sobre a oferta de escravos.
Emboraeu considere persuasivo o argumento de Thornton para o período anterior a
1680,o nível prodigioso do comércio no final do século XVIII, fora do período de
Thomton,é um caso diferente (comparar Manning, Slavery anddfrican Life,e Lovejoy,
in Slavery). No entanto, Thornton é útil ao explicar por que havia à
Transformations
vendagrande número de escravos na África.
81.WilliamPenn, "An Essay towards the Present and Future Peace ofEurope", em William
Penn,ThePeaceofEurope, pp. 5-22. O abade Saint Pierre exigiu que as potências
concluíssemum acordo para que "Nenhum soberano deva pegar em Armasou co-
so-
meterqualquer Hostilidade exceto contra aquele que será declarado Inimigo da
soberanos
cidade européia(...) A União deverá fazer, se possível, com seus vizinhos, os
cada um deles
maometanos,Tratados de Aliança ofensivos e defensivos, para manter
TheIdea
emPaz dentro das Fronteiras de seu Território." Ver Denis de Rougement,
a participação
OfEurope,Londres 1964, pp. 112-20. William Penn também previu
destinado a evitar no-
Otomana.O pacto internacional proposto por esses escritores,
possibilidade
vasguerras, era uma proposta ligeiramente menos radical do que a
esboçadaacima.
Assimescreve interests, directly govern men's
ideal
Weber: "Not ideal" but material and created by 'ideas'
have,
conduct. Yet very have been
frequently the 'world images' that pushed by the
dynamic
has been
switchmen, determined the tracks along which action
446 ROBIN BLACKBURN

ofinterest. n • H. H. Gerth e C. Wright Mills, eds., From Max Weber: Essays in Sociol
Londres 1948, p. 280. A função de "colocação de trilhos" atribuída a idéias e normas
religiosas é elaborada por Michael Mann, The Sogrcesf Social Power, I, pp. 341-72,
376-9. E sobre a proposta específica de que a "antiescravatura" pudesse funcionar como
ponto crucial, ver Runciman, Treatiseon Swial Theory, II, Ssbstantive Social Theo,y
pp. 133-4. Sobre Gramsci e as idéias como força material, ver David Forgacs, ed., The
Gramsci Reader, Londres 1978, p. 200.
83. Morgan, American Slavery, AmericanFredom, pp. 319-24.
84. Barbara Jeanne Felds, "Slavery, Race and Ideology in the United States of America",
New Left Review, no. 181, maio,5unhode 1990, pp. 95-118 (p. 104).
85. Beckles, WhiteServitgde and BlackSlavery in Barbadas,p. 113.
86. Greene, Pgrsgits ofHappiness, p. 92.
87. Jordan, White over Black, pp. 94-5.
88. Davies, The North Atlantic World in the Smenternth Ces:wy, pp. 211-15.
89. David Eltis, "Europeans and the Risc and Fall ofAfrican Slavery in the Americas: An
1993,pp. 1399-1423(p. 1423)
90. Ibid., p, 1422.
91. VerAllan Kulikoff, TheAgrarún Origins Charlottesville, VA 1992,
pp. 34-43. Provas destes pontos também Ao fornecidas nos Capítulos XI e XII a se-
guir.
92. Citado em Sacks, The WideningGate, p. 341.
93. T. Bentley Duncan,AtIantic IslandJ.•Maleira, Verdesin Sevtn'cen.th
CenturyCommerceand Navigation, Chicago e Londres 1972, pp. 243, 256.
94. Hall, Africansin ColonialLouisiana, pp. 119-201; Berlin, "From Creole to African",
Williamand Mary Quarterly,abril de 1996; Davis, on CheMargino pp. 166-98.
Algumas das obras inspiradas pela tese de Frank Tannenbaum de que a escravidão la-
tina e católica tinha caráter fundamentalmente diferente da escravidão protestante e
anglo-saxônica ajudam a indicar a diferença entre o que prefiro chamar de escravidão
barroca e escravidão comercial. Ver,em particular, Klein, Slaver•y in CheAmericas,
Chicago 1967, e Herbert Klein, "The Coloured Freemen in Brazilian Slave Society",
Jogmal ofSociaI History, vol. 3, 1969, mas note-se que onde e quando a escravidão de
plantation realmente se desenvolveu — ou seja, em Cuba e no Brasil no século XIX
houve um endurecimento do sistema racial. Os textos do antropólogo cubano Fernando
Ortiz e do historiador brasileiro Gilberto Freyre também chamam a atenção para ca-
racterísticas importantes dos regimes escravistas, embora deixem de perceber aquela
dinâmica peculiar da escravidão comercial daplantation que é analisada com esta visão

• "Não são interesses ideais, mas sim materiais e ideais,que governam


diretamente a conduta do homem. Ainda
assim, com muita freqüência as 'imagens do mundo' que foram criadas por 'idéias' determinaram, como
chaves, os trilhos pelos quais a açio foi levada pela dinamica do interesse." (N. do T.)
A CONSTRUGÄO DO ESCRAVISMO NO
NOVO MUNDO: 1492-1800
447

por Manuel Moreno Fraginals cm El Ingenio e Jacob Gorender em O estravismocolo-

e Jean R. Soderland, Fmcdom by Degrees: Emancipation in


95. Gary B. Nash Pennsylvania
andits Utertnath, Nova York 1991, pp. 41-6.
e Kenneth Sokoloff, Factor Endowments, Institutions, and Differential
96. Stanley Engerman
New World Economics: A Vicwfrotn Economic Historians ofthe United
pathsofGmwth among
States,National Bureau of Economic Research Inc., Historical Paper no. 66, 1994.

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