Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
A construção
do escravismo no
Novo Mundo
Tradução de
MARIA BEATRIZ DE MEDINA
EDITORA RECORD
RIO DE JANEIRO • SÃO PAULO
2003
vlll
A escravidão racial e o crescimento
da plantation
Todosos servos importados e trazidos para este país, por mar ou por terra, que não
eram cristãos em seu país natal (exceto turcos e mouros com amizade por Sua
Majestade,e outros que possam provar devidamente serem livres na Inglaterra
ou em qualquer outro país cristão antes de embarcarem para serem
transportados para cá) devem ser registrados e ser escravos, e como tal
comprados e vendidos mesmo que se convertam depois ao cristianismo.
Ato Relativo a Servos e Escravos, Virgínia, 1705
A fortuna nunca exerceu de modo mais cruel seu império sobre a humanidade do
que ao sujeitar essas nações de heróis ao refugo dos objetivos da Europa, a
miseráveisque não possuem as virtudes nem dos países de onde vêm, nem daqueles
para onde vão, cuja leviandade, brutalidade e depravação os expõem com tanta
justiça ao desprezo dos vencidos.
Como vimos, a escravidão africana foi deslanchada pela colonização ibéricae de-
pois, em escala crescente, ampliada e determinada pela demanda de mão-de-obra
para as plantations.A doutrina racial que via os cativos africanos comonascidos
para a escravidão não foi obra de alguma categoria social ou nação européia,e
e
continuou a exibir diferentes padrões e interpretações. O princípio português
espanhol de limitar formalmente a escravidão aos africanos forneceu um prece-
fe-
dente que os holandeses, ingleses e franceses tornaram mais sistemático.Ao
polarizasio
char quase todos os caminhos para a alforria, os ingleses provocaram uma
dos euro-
mais acentuada entre brancos livres e escravos negros. Para a maioria
eram
peus, a falta de cristianismo dos africanos e sua natureza "selvagem"
da maldi-
como explicações da necessidade de mantê-los no cativeiro. A história justifica-
ção de Noé e a teoria de que a pele negra era o símbolo desta maldição
sua crença
vam a escravização permanente dos negros, independentemente de
fossem
conduta. Mas não proporcionava fórmulas legais para que os escravos romana,
lei
tados como propriedade estas foram fornecidas por resíduos da ondeas
lugares
com Coke e Bossuet invocando ojwgentiwm, como já vimos. Nos
à propn
relações capitalistasjá tinham emergido, a aura sagrada que deram
a
privada encobriu a equiparaçãodos escravos a bens móveis, enquanto escravista.
bíblica de tirar os frutos da terra atrelava-se à acumulação e àplantario
eles
Assim, quando os novos sistemas escravistas foram consolidados,
vam o secular e o sagrado, o novo e o velho.
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 379
capitães
Donos de plantations, mercadores,
esta falhasse, a expulsão. Mas devido à paranóia intermitente das autoridades reais
francesas a rcspeito da heterodoxia de seus colonos, elas não sc dispunham a con_
fiar-lhes a custódia de hereges. Depois da eliminação dos huguenotes no sul da Fran
em 1703, um total aproximado de cinco mil rebeldes camisard$ foram mandados para
as galés. Mais ou menos nessa época as autoridades estavam fazendo todos os esfor_
ços para recrutar mão-de-obra para asplantations, mas, compreensivelmente, impe-
ditam a remessa de vigorosos huguenotes que procurariam a primeira oportunidade
para umr-se aos seus correligionários ingleses e holandeses, ou aos piratas, muitos
dos quais eram também huguenotes.
Os donos deplantations eram exigentes em sua necessidade de mão-de-obra. O
comércio atlântico de escravos lhes fornecia jovens adultos vigorosos, geralmente
entre 16 e 25 anos e, ao contrário da maioria de condenados europeus, com conhe-
cimentos agrícolas muito úteis. Embora a servidão voluntária fosse desejável,os
âzendeiros não queriam receber as categorias que a metrópole achava mais fácil
enviar: deficientes e aleijados, velhos mendigos ou criminosos incorrigíveis. De
qualquer forma, era raro que houvesse muitos criminosos comuns disponíveis como
servos involuntários. Os jovens que foram vítimas da nova ordem na Escócia eram
fora do comum, porque os fazendeiros tinham excelente opinião sobre seu poten-
cial; mesmo depois de rebeliões ou devassas, o número disponível raramente passa-
va de mil ou dois mil por ano.
Se os donos de plantations quisessem trabalhadores europeus, teriam de atraí-
10scom contratos voluntários. Pelas razões citadas acima, os donos deplanrations
franceses nunca atraíram um grande fluxo de engagés.A quantidade dos que par-
tiam para as colónias britânicas diminuiu a partir de 1660.No entanto, esta redução
atingiu primeiro o Caribe. Os proprietários de pequenas e médias plantationsdas
colónias inglesas na América do Norte continuaram a contar principalmente com
servos até as primeiras décadas do século XVIII. Enquanto houvesse um fluxoade-
quado de homens e mulheres jovens dispostos a trabalhar como servos contratadOS,
eles eram considerados preferíveis aos inexperientes africanos. O servo ou engagé
conhecia o idioma de seu senhor ou senhora e estava familiarizado com as ferra-
mentas e os hábitos europeus. A quantidade atraída pela perspectiva de vida nas
colónias inglesas durante meio século depois de 1624 significava que o trabalho sem l
era mais barato que o dos escravos africanos. Os produtores de fumo consideraram
o trabalho servil sob contrato adequado a este tipo de cultivo, além de barato e razoa-
velmente abundante. Os próprios servos pareciam estar mais dispostos a ir para a
Virgínia ou para as primeiras colónias do Caribe — em parte porque acreditavam
que receberiam terras ao final de seu contrato,
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 387
Por que deveria haver um Obstáculo tão exclusivo nas mentes e disposições pouco
razoáveisde tanta gente contra o tempo limitado de servidão convenientee Ne-
cessária,quando é uma coisa tão essencial, que sem ela o melhor dos Reinos se
dissociariade seu Governo tranqüilo e bem estabelecido. Desta doutrina niveladora
con-
nósaqui na Inglaterra nestes últimos tempos (cujo ventre nada gerou senão a
fusa Rebelião)já provamos demais, e foi diariamente tocada nos ouvidos do tu-
multuosoVulgo pelos Líderes Sectários da Época.
vendi-
Esteautor insistia que era uma calúnia dizer que os servos contratados "são
Mas
dosem mercados para escravos" ou obrigados a puxar carroças como cavalos.17
servos in-
estasafirmativas não conseguiram restaurar o fluxo cada vez menor de
aumentou.
gleses;o de engagésfranceses sempre fora bastante modesto, e não
anos tornou-se
O fato de que os servos exigiriam a liberdade depois de alguns
de tempo
umadesvantagem maior para os proprietários à medida que a perspectiva
colheita deste
daplantationse estendia. Enquanto o produtor de fumo pensava na
cinco anos de
anoe do próximo, o de açúcar preferia planejar com três, quatro ou
uma força de trabalho permanente e
antecedência.Os escravos ajudaram a formar
contratados tinha
coletivacuja eficiência cresceria com o tempo. O grupo de servos
contratos expira-
deser constantemente organizado e reorganizado à medida que os
trabalhando nas
Varn•Dificilmente os ex-servos se ofereceriam para continuar
considerações eram
plantations,ou só o fariam em troca de salários muito altos. Estas
trei-
Particularmenteimportantes no caso do trabalho especializado. Os frutos do
390 ROBIN BLACKBURN
Tabela VIII.I Escravos tirados da África pclo comércio atlântico no século XVII
A tendência de queda do preço dos escravos na costa africana, indicada por alto
na Tabela VIII. 1, é particularmente notável tendo em vista a duplicação e triplicação
do volume do tráfico nos dois últimos quartos de século. A queda de preço deve ter
estimulado a opção dos fazendeiros pela escravidão. 26Ela refletiu a eficácia cres-
centeem termos de custos dos métodos de captura, venda e transporte dos escravos,
cativeiro
apesarda elevada mortalidade dos cativos em todas as fases da travessia do
africanoaté a escravidão no Novo Mundo.
de século di-
O conflito entre os holandeses e portugueses no segundo quarto
abastecimen-
minuiua demanda de escravos da América e desorganizou as rotas de
provocou o aumento
to.O surgimento das novas colônias deplantation por volta de 1650
franceses passa-
da demanda e elevou os preços quando os comerciantes ingleses e
de mercadorias
ram a encomendar escravos. Os holandeses ofereceram uma série
inclusive armas de
maisatraentes e variadas aos comerciantes e chefes africanos,
européias
outras potências
fogo,pólvora e artigos de metal e tecidos mais finos. As
montados pelas companhias
Seguiramo exemplo, Os fortes e as feitorias comerciais
muito cara, sem oferecer garantia de
de comércio de escravos tinham manutenção
era agora muito mais acirrada, e em
melhorescondições no negócio. A competição
—- homens como Edward Barter,
anos pontos da costa príncipes mercadores africanos
suas próprias
John Konny,John Kabes e Asomani construíram e fortificaram
com os contrabandistas, Em 1693,
feitoriase mantiveram relações comerciais ativas
Christianborg em Accra, e instalou-se
Asornanicapturou o castelo dinamarquês de
em Christianborg, construiu
aliCornogovernador; embora não tenha permanecido
Os príncipes
canhóes.27
urncastelo para si mais abaixo na costa, defendido por
396 ROBIM BLACKBURÑ
Nãohá razão para supor que os ingleses estivessem ávidos para escravizar negros,
nemmesmo para considerar excêntrico Richard Jobson em sua resposta à oferta
de um chefe de vender-lhe alguns "escravos": "Eu dei a resposta, Somos um povo,
quenão negocia de jeito algum com essas mercadorias, nem compramos ou ven-
demosninguém, ou nada que tenha nossa própria forma."31
ros não reduziu a imensa vantagem cm termos de custo quc isto representava para
os mercadores, O sentimento racial cra parte do funcionamento das plantationsc
fornecia a basc do medo c do privilégio que uniam os colonos brancos. Mas os
mercadores que patrocinaram o tráfico atlântico dc escravos e os estadistas e filó-
sofos que o endossaram não costumavam ter experiência direta da escravidão. Sua
avaliação das vantagens pessoais, nacionais ou de classe, sublinhada por um sen-
timento de superioridade racial e religiosa, bastou para conceder aos donos das
plantationseste elemento decisivo. Não encontrei provas de que os mais preocu-
pados com a construção dos sistemas escravistas fossem estimulados pelo senti-
mento racial. Tomemos o caso de John Locke. Como vimos, ele era um dos investidores
da Real Companhia Africana; como membro atuante do Board of Trade and
Plantations, pode com certeza ser considerado um dos fundadores da escravidão
colonial inglesa. Ainda assim, ele considera'.a qualquer tentativa de excluir os negros
da raça humana como ilusão infantil, e escreve: "uma Criança que conceba uma
Idéia de Homem, é provável que sua idéia seja como aquele Quadro que o Pintor
faz das Aparências visíveis reunidas, e tal Combinação de Idéias em seu entendi-
mento forma a Idéia complexa e única que ela chama de Homem, e portanto, sen-
do ele branco ou cor de carne na Inglaterra, a Criança pode demonstrar-vos que
um Negro não é um Homem, porque a cor branca era uma das idéias simples
constantes da idéia complexa que ela chama de Homem; E portanto ela pode
demonstrar pelo Princípio segundo o qual: "É impossívelque a mesma coisaseja,e
não seja', pe gr, Negronão é am Homem; o fundamento desta Certeza não sendo
aquela Proposição universal, que, talvez ela nunca tenha ouvido nem pensado, mas
a Percepção clara e distinta que teve de suas próprias idéias de Negro e Bran-
co.' x É claro que esta reflexão tem a qualidade abstrata do exemplo de um filóso-
fo, mas sua força vem da aceitaçãode que os negros são homens de fato. Como
sugeri no Capítulo VI, Locke aprovava a escravidão colonial porque a considera-
va uma instituição necessária para a exploraçãoprodutiva das colônias inglesase
porque via nos colonos-fazendeirosum contrapeso para o poder real.
Notavam-se impulsos antiecravid.io, embora tenham sido facilmente refreados.
A crença de alguns protestantes de que de,-eña ser dada alforria aos escravos batizados
ou a seus filhos foi abandonada em tcdas as colónias ; referências à
dição de Noé assim às recomenda*s de São Paulo ajudaram a sufocar o resto
de devotamento à liberdadede todos os '.zrdadeiros crentes. De seu
os pdr8 católicos haxum cczn a validade do ato original de escra\izas-iO'
o que os levou a quest:cnar a legitimidadedo comércio atlânticode escravos e a
ar questões sobr o direito 20 O Santo Oficio em Roma aprowu por pouÑ
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800 399
A nova plantation
Debicn escreve que no final do século XVII o commandcur, ou capataz, era ge-
ralmcntc um escravo:
Ele era responsável pelo trabalho c pela disciplina dos escravos. Nisso recebia grande
autoridade. Já que conhecia a origem étnica dos membros do grupo, sua idade,
sua saúde, pode-se dizer que a disposição e o empenho deles dependiam do capa-
extremos.
taz. Ele era o centro de distribuição. Só se trocava um capataz em casos
Sua estatura, sua energia, seu senso dc comando eram as qualidades que o reco-
mendavam, e não a preferência por alguma "nação" ou idade. No entanto, era muito
freqüente encontrar um crioulo nesta função, às vezes um novo escravo como se-
gundo capataz, mas quase nunca um mulato."
moendas eramcada vez mais eficientes, movidas a vento, água ou animais,e ajuda-
a manter ritmos intensos dc trabalho. Um escravo dc Barbados foi citado como
autorda frase: "O diabo estava no inglês quc faz tudo trabalhar: ele faz o negro
rabalhar,o cavalo trabalhar, o asno trabalhar, a madeira trabalhar, a água trabalhar
46
e o vento trabalhar."
A simplificaçãoe a repetição das tarefas, a coordenação do trabalho entre cate-
goriasdiferentesde trabalhadores, o ritmo imposto às turmas de trabalho parecem
representaruma forma de organização que reflete não só a vida a bordo dos navios
como durante o século XVII, a revolução, talvez a ela relacionada, no trei-
namentoe na tática militares, associada a Maurício de Nassau, príncipe de Orange
etiodopríncipe Maurício que governou o Brasil holandês. O treinamento sistemá-
fico,os métodospadronizados de carregar e disparar armas, a supervisãomais in-
tensapor militares de patente inferior criaram um novo tipo de força de combate e
promoveram um grande avanço do poder de fogo. William McNeill observa uma
concomitância que pode ter causado problemas: "Quando um grupo moveos mús-
culosdo braço e da perna ao mesmo tempo durante um prolongado tempo, uma
ligaçãosocialprimitiva e muito poderosa nasce entre eles."47As turmas de escravos
costumavamcantar durante o trabalho. Infelizmente há poucas descrições de suas
cançõesno período inicial, mas caso se tome como guia os cantos dos trabalhadores
forçadoscoloniaisna Africa, devem ter incluído críticas vigorosas e lamentospun-
gentes."Em circunstâncias especiais, o esprit de corpsda turma de escravos explodia
emrebeliões,mas normalmente ele tinha uma função disciplinadora que, como a
disciplinamilitar, era cuidadosamente direcionada para os objetivos determinados
pelosqueadministravamo sistema.
grandes ínvcgtimcntog
A construção deplantatiow escravistas exigia de fato
capital fixo. Quer o proprietário pagasse à vista ou a prazo para adquirir sua mão.
de-obra, o preço de compra do trabalhadorservil, fosse escravo ou contratado,
representava um peso grande no resultado de seu empreendimento, Até as proví-
sões compradas para os escravos tinham de ser adquiridas muitos rncgcs antes de
serem consumidas. O dono daplantation pagava pela mão-de-obra muito antes de ela
começara produzir; o empregador capitalista do futuro estaria na situação me-
lhor de pagar ao produtor direto só depois de estar de posse do produto embo-
ra talvez tivesse de esperar muitos meses antes de fazer a venda, O dono de uma
plantation que pedisse dinheiro emprestado para comprar escravos ou servos sería
responsávelpelo pagamento de juros a partir do momento da compra, Mão-de-
obra, para o dono daplantation, era um investimento feito com anos de antecipa-
ção; era parte de seu capital fixo, não do circulante. O preço do escravo ou do
servo representava uma redução do excedente futuro que se esperava que o escra-
vo ou servo produzisse. O dono da plantation esperava extrair um grande exce-
dente de seus escravos, que cobriam seus próprios custos de subsistência em um
ou dois dias por semana,mas seu lucro era dividido com antecedência com o
mercador e o traficante de escravos.
Os registros costumam mostrar que o dono da plantation tinha grandes lucros
nos primeiros dias de uma colónia, mas depois de algumas décadas este lucro tendia
a declinar. Novasplantatiow costumavamsurgir quando os preços estavam altos
mas o padrão decrescente de lucratividade também reflete fatores como produção
reduzida da cana, despesas com fertilizantes, custo de reposição de equipamentOS
ou escravos e vários "atos de Deus". O lucro dos fazendeiros era muito afetado
10srumos da guerra. Por um lado, a guerra elevava o preço
do açúcar; por outro'
impedia alguns proprietários de produzir ou de levar seu
açúcar ao mercado? Mas
sob a ação recíproca desses fatores condicionantes, a tendência
da taxa de lucro das
plantations de cair para um nível "normal" reflete apenas do
a natureza competiti%
negócio. Enquanto os lucros permaneciam acima do
normal, havia incentiVOpara
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 407
escravos mais fortcs trabalhassem o dia intciro nos campos dc cana do nasccr ao
pôr-do-sol, com uma pausa de duas horas ao mcio-dia c dcpois ainda fizcsscm
turnos no moinho à noite. O turno da noite, às vczcs chatnado dc "vigília" ou «ron_
da", podia durar das seis da tarde à mcia-noitc ou da mcia-noitc às seis da manhã, c
o escravo trabalharia nclc dia sim, dia não. Dcssc modo, os mclhorcs cscravos tra-
balhariam dez horas num dia c dczcsscis no scguintc, scm incluir a parada para al-
moço. Este seria o regime numaplantationbem adtninistrada, c alguns proprietários
tentavam extrair ainda mais de sua mão-de-obra cativa. Durante o pcríodo da co-
lheita, os escravos tinham permissão para bcbcr todo o caldo dc cana quc quises-
sem, aumentando sua ingestão calórica, embora este não fossc um acréscimo muito
nutritivo à sua dieta.
resi-
Esta visão da virtude patriarcal e da abundância retrata o ideal do proprietário
Virgíma
dente. Os donos das numerosas pequenasplantatiow cheias de dificuldades da
só podiam atingir uma versão indigente e subdesenvolvida deste ideal — em
parte
deles.
porque seus vizinhos maiores, se eram auto-suficientes, pouco comprariam
acaba-
Além disso, até mesmo os maiores proprietários da Virgínia e de Maryland
ao
vam acumulando com freqüência dívidas imensas. O próprio Byrd foi arrastad0
de
endividamento pelo custo de tornar lucrativa a aquisição de grandes extensões
e com-
terra. por mais auto-suficientes que fossem, eles contratavam alguma ajuda
Mesmo
pravam equipamento, produtos manufaturados e material de construção.
aconte-
que seus escravos tecessem panos ou fizessem sapatos — como na verdade
famíliastambém
cia —ainda assim precisariam de ferramentas e máquinas. Eles e suas
vida con-
encomendavam, normalmente a crédito, os acessórios necessários a uma
praticar "economia" e "le-
fortável, Essas despesas determmaram a necessidade de
interrompia as
var a máquina adiante". Em épocas de dificuldade, quando a guerra
desu-
cornumcaçóes, muitasplunfations escravistas podiam viver por conta própria'
Gorenderjeles
nando mais terra e mão-de-obra à subsistência, Como explica Jacob 0
mais
podenam beber "da concha da economia natural".$8Mas em épocas
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMONO NOVO MUNDO:
1492-1800 413
Estasduaspassagens, e humanos,
escritas por indivíduos supostamente civilizados
o medo, a raiva e o ódio racial dirigidos aos escravos que simples-
ttstemunharn
tntnte
resistiam à escravidão.
ajudaram
Emborao aparato
da coerção estivesse sempre visível, outros fatores
aevitarou
quebrar a resistência dos escravos. Algumas vezes foram feitas tentativas
418 ROBIN BLACKBURN
Toda a seqüência de captura, transporte para a costa, travessia marítima e venda nas
Américas era traumática e desmoralizante. A maioria das vítimas do comérciode
escravos conhecia a escravidão como uma condição familiar, o que certamente aju-
dou a forçá-las a se conformar com a situação, embora com grande angústia e sem
renunciar à esperança de fugir. Mas, ainda que a escravidão já fosse conhecida dos
cativos, aplantation açucareira e suas exigências eram outra coisa. O excesso de dis-
ciplina, hierarquia e exigência de produção pesava permanentemente sobre o escra-
vo. Durante a colheita, aplantation tinha um ímpeto feroz de produção, cujo ritmo
era determinado pela necessidade de alimentar de cana a moenda e de combusúvel
as fornalhas, e ao qual o indivíduo dificilmente poderia resistir. Se o escravo sobre-
ñesse aos primeiros anos, já teria conseguido uma roça, alguns amigos, talvezaté
uma esposa; para uma minoria dos homens havia a perspectiva de passar a integrar
à elite de capatazes, artesãos e "cabeças". Estes podiam receber rações extras de rum
ou roupas, uma moradia separada ou uma roça maior; estavam também em melhor
condição para encontrar uma companheira. Estes adicionais ou privilégios ajuda-
vam a garantir a adesão de uma camada fundamental de auxiliares escravos ao regi-
me daplantation. Algumas mulheres tornaram-se governantas e outras adquiriram
os privilégios geralmente dúbios da escravidão doméstica. Era muito menos
vel que as mulheres que tivessem filhos fugissem. Em sua maioria, as plantations
eram um mundo fechado, em que a comunicação entre os vários contingentesde
escravos era proibida ou mantida num nível mínimo bastante controlado.
-
Os cativos africanos tinham algum conhecimento do que significava ser escra
-
vo. Embora esperassem fugir dos rigores da escravização total, viam-se imediata
mente inseridos num sistema escravista em pleno funcionamento, com uma gama
progressiva de sanções e incentivos. Os que chegaram antes geralmente já tinham
aberto algum pequeno espaço para si e para a comunidade escrava. Em quase toda
parte os escravos conseguiram estabelecer práticas comuns que lhes permitialll
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
419
sendo levados a formar um bloco racial dc brancos livres contra negros escra_
ram
a afirmar a presença e, sob alguns pon_
vizados. Assim, embora devamos continuar
forças e das razões econômicas, é necessário também
tos de vista, a primazia das
de identidades dadas e a nova ênfase à "raça".
registrar a reelaboração
para a proliferação de provas de sentimento
Alden Vaughan chamou a atenção
primeiros dias das colônias inglesas. Mas
racial hostil aos africanos e negros nos
eram úteis para donos de escravos ou importa_
nem todos esses sentimentos raciais
argumentei, e o próprio Vaughan não contesta o fato de
dores de africanos, como
racial foi transformado e parcialmente redirecionado pelo surgimento
que o sentimento
elo entre racismo e escravidão, ele cita
dos sistemas escravistas. Numa revisão do
não era "tão profundo no início quanto se
J. R. Pole quanto ao fato de que o racismo
apenas necessário que o racismo fosse
tornou depois", mas que, mesmo assim, "era
uma causa da repugnância racial
suficiente, e que a identificação visível — já
Mas, embora os historiadores devessem
tornasse tão fácil a prática da escravidão". 73
isso não significa que seus cúmpli-
com certeza declarar o racismo culpado no caso,
além de sua acomodação à es-
ces, o capitalismo incontrolável e o livre mercado,
poder é muito desigual,e
cravidão, não sejam também responsáveis.Quando o
possibilidade de trans-
praticamente inimputável, o sentimento racial terá grande
pelas oportunida-
formar-se em exploração racial, e pode até mesmo ser ampliado
des favoráveis.
David Eltis argumenta que a maioria dos textos modernos sobre a escravidão
opinião,
nas Américas concentra-seerradamente em motivos econômicos. Em sua
po-
os sistemas escravistas contradizem esses motivos, já que as potências coloniais
deriam ter obtido mais lucro enviando escravos europeus para as plantations;tanto
os custos de transporte como de aquisição seriam mais baixos. Recusaram esta opor-
tunidade porque os outros europeus eram membros de sua própria comunidade
e
moral.74Este sentido de comunidade moral, por sua vez, remonta à Cristandade
ao surgimento de relações de mercado generalizadas no início da Europa moderna.
Com o tempo, um mercado atlântico mais amplo também geraria um novo sentido
de comunidade moral, e os africanos seriam emancipados segundo formas que fo-
ram descritas por Thomas Haskell.75Curiosamente, esta suposta crítica à causa
econômica realmente sugere que o mercado capitalista foi, em última instância,a
e-
força moral e política decisiva. Sendo assim, seus proponentes se mostram perpl
al
xos com o fato de que as relações de mercado teriam conduzido à escravidão raci
no século XVII mas não, aparentemente, no século XIX.
ia
Tentei mostrar que a formação da escravidão colonial envolveu uma ideolog
racial reelaborada, além de novas forças econômicas. Mas ao fazê-lo encontrei mais
CONSTRUÇÃODO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1402-1800 426
anterioresda da escravidãocolonial,feitospor
Edmund
K, G. Davics, do que cm Eltis, e sou levadoa
RichardDunn c propor,
Morgan' fatos,uma possibilidadc difercntc para destacar o papel da ideologia
bascnos
com
na opção pela
Havia um componente ideológico e extra-econômico
de forma mais humana, corno
africana, já que a colonização poderia ter ocorrido
generoso das sociedades escravista
membros mais imaginativos e de espírito mais
escravidão estava implícita na
discutiram algumas vezes. A decisão a favor da
deplantatiow; os servos,
trutura comercial competitiva de mercadores e donos
não foram consultados. Como
pequenos fazendeiros e o governo metropolitano
levar ao mercado seus produtos
mercadores e donos deplantations competiam para
para importar escravos e explorá_
da maneira mais rápida possível, com liberdade
era inevitável. A opçãodo
10s,a transição para aplantation operada por escravos
governos, que se curvavam aos desejos
comércio atlânfco de escravos era apoiada pelos
seriamente interessado em maximizar
dos principais atores no caso. Para o proprietário
a decisão de comprares-
a produção, e na fortuna que essa intenção lhe prometia,
houve gente que resis-
cravos africanos era natural. Em todas as colônias européias
com a família e alguma ajuda
tiu a esta tentação, contentando-se em trabalhar a terra
para o mercado, e até mes-
de pessoas contratadas. Embora produzissem provisões
mo alguns produtos comerciais, não eram suficientemente numerosos para enfren-
tar o aumento fantástico da produção daplantation.
Como Dunn corretamente ressalta, não há indício de que os donos deplantatiow
tenham pensado seriamente em alguma alternativa à escravidão, como recrutar mais
trabalhadores africanos oferecendo-lhes contratos de servidão ou salários. Se o ti-
vessem feito seria uma inovação, mas a prática do comércio de escravos tambémo
foi. Os proprietários individuais teriam dificuldade de imaginar uma alternativa
eceqüível por conta própria, já que seria necessária uma estrutura institucionale
reguladora monada pela autoridade pública. Mas os mercadores e donos deplantatiow
eram homens influentes; e como estes eram sistemas de escravidão colonial, os go-
vernos coloniais também poderiam ter entrado em cena para mudar o contextoem
que mercadores, donos de plantationse trabalhadores em potencial tomavamsuas
lo
decisões. Na verdade, foi isso o que o funcionalismo colonial espanhol fez no sécu
li-
XVI, criando, como já vimos, condições em que havia mão-de-obra assalariada
vre e semilivre disponível para os que possuíam concessões de minas. De forma
semelhante, após a emancipação o governo colonial criou uma série de alternativas
er-
à escravidão que, embora fossem freqüentemente alvo de várias objeções, ainda p
do
mitiram mais autonomia e melhores perspectivas aos trabalhadores daplantation
que o sistema escravista.77
cnar
Pode-se pensar que o rigor do trabalho na plantation ou a dificuldade de
alternativas tornaram mais ou menos inevitável a escravidão completa nas
ções do século XVII. Esta opção correspondia à perspectiva daqueles que haviam
A CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO
No NOVO
MUNDO: 1492-1800
427
Virgínia revisou mais uma vcz sua legislação sobre os escravos em 1705, estipu_
lou que os scrvos da Turquia quc chegassemà colónia, mesmo que não fossem
cristãos, não podcriam scr considerados escravos a menos que tivessem sido
cravos na lilrquia, já que o príncipe desse país era reconhecido pela Inglaterra.
Por outro lado, nenhum infiel — "Judeus, Mouros, Maometanos" eninguém
dc ascendência africana poderia possuir "um servo cristão", embora PUdessem
possuir um servo "dc sua própria cor". Assim, a lei confundiu completamente
raça c religião, de tal forma que pessoas de pele mais escura eram excluídasda
categoria de "cristãos"Y
A solidariedade racial funcionou como uma força que protegia os que tinham a
pele branca, mas a disseminação da escravidão nas colônias deplantation trouxe pouco
beneficio para os brancos que não possuíam escravos, já que estavam condenados à
subordinação aos grandes proprietários de escravos. A tendência dos emigrantes livres
sem escravos de partirem do Caribe para a América do Norte foi uma respostaa
isso. Os que não possuíam escravos nas colônias deplantation, muitos deles "bran-
cos pobres", gozavam de significativos privilégios de cor para consolá-los, mas não
eram muito invejados por outros colonos. No Caribe, tanto os pequenos fazendei-
ros quanto os artesãos viram sua condição ser solapada, porque os escravos supriam
o mercado com sua própria produção e eram promovidos a funções que exigiam
talento artesanal. Nas colônias deplantation da América do Norte, os brancos sem
escravos agarraram-se a funções mais respeitáveis como supervisores e feitores de es-
cravos, ou como pequenos fazendeiros na produção de alguns alimentos. Mas sua
existência ainda estava limitada pelo poder dos proprietários das plantatiow, e, no
que diz respeito aos pequenos fazendeiros, pela preferência daqueles pela produção
própria de alimentos.
O fato de que os donos deplantations começaram a aproveitar-se do trabalho de
dezenas, e depois de centenas e milhares de escravos africanos levou K. G. Davies a
concluir: "À medida que os negros iam chegando, evoluiu uma versão do capitalis-
mo praticamente fora do controle público e livre de restrições tradicionais ou sociais,
que engolfou todas as outras influências e deixou o poder político firmemente nas
mãos de alguns grandes proprietários de escravos."88 Esta conclusão, como muitos
dos argumentos apresentados acima, são contestados por David Eltis. O fato de que
os donos das plantations recorreram a escravos africanos mas não a escravos
parece a ele demonstrar uma restrição auto-imposta que está em desacordo com 0
capitalismo irrestrito. Ele argumenta que
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO: 1492-1800
435
se tivessem imitado a aristocracia russa do século XVI criando uma distância ideo-
lógicaentre eles e o povo, e escravizado alguns membros de sua própria socieda-
de, teriam se aproveitado do custo mais baixo da mão-de-obra, do desenvolvimento
mais rápido das Américas e de níveis maiores de exportação e renda nos dois lados
do Atlântico. 90
Assembléia, mas a proposta dc cobrar uma tarifa proibitiva de E20 pela entradade
cada escravo foi aceita. As autoridades coloniais vetaram esta medida, aceitando
uma tarifa mais baixa. Esses acontecimentos foram importantes por terem sido as
primeiras ocasiões em que a escravidão e o tráfico de escravos foram desafiados como
questões de política pública por uma assembléia representativa. Como os principais
colonos estavam bem representados na Assembléia e muito provavelmente tinham
interesse na escravidão, não surpreende que estas primeiras iniciativas tenham fra-
cassado. Mas muito antes dos primeiros sucessos abolicionistas já havia um pre-
conceito difuso contra a escravidão que pôde — e em setores do mundo atlântico
realmenteconseguiu— restringir seu desenvolvimento."
Stanley Engerman e Kenneth Sokoloffchamaram a atenção recentemente para
o fato de que as elites americanas que recorreram à mão-de-obra cativa e sem liber-
dade ganharam a capacidade imediata de explorar os recursos naturais e as vanta-
gens de seu continente. Mas, argumentam, o padrão bastante desigual de sociedade
assim produzido iria prejudicar o desenvolvimento econômico posterior, porque suas
formas de controle da mão-de-obra — fosse a escravidão ou o tributo em trabalho,
a servidão por dívidas ou a condição de meeiro — não geravam participação mais
ampla na "economia comercial, nos mercados e na mudança tecnológica".96Esta
conclusão está de acordo com a argumentação mais extensa apresentada anterior-
mente, mas vou sugerir que as plantations escravistas, embora não estivessemtão
integradas aos circuitos comerciais e às mudanças tecnológicas como estariam as
empresas que contratavam trabalhadores assalariados formalmente livres, encontra-
vam-se, no entanto, nas condições dos séculos XVII e XVIII, relativamente adap-
tadas a circuitos ampliados de acumulação de capital, e eram capazes de absorver
pelo menos algumas mudanças tecnológicas. Assim, depois de enfatizar as desvan-
tagens econômicas e humanas da opção pelaplantation escravista, será necessário, a
seguir, lembrar a imensa contribuição que, apesar de tudo, ela deu à acumulação
atlântica. Os próprios Engerman e Sokoloff comparam a herança negativa da es-
cravidão e da encomiendacom a florescente economia de pequenos fazendeiros, pe-
quenos produtores e comerciantes que se desenvolveu nas colônias do norte dos Estados
Unidos. Embora este contraste seja mesmo espantoso, permanece o fato — como
veremos no Capítulo XI — de que as colônias da Nova Inglaterra e do Atlântico
central romperam sozinhas um padrão inicial bastante autárquico de atividade eco-
nômica ao encontrar mercados e fontes de matéria-prima nas regiões deplantatiog•
A contribuição real, e não especulativa, da escravidão para a acumulação atlântica
será o tema seguinte.
CONSTRUGÅO DO ESCRAVISMO NO NOVO MUNDO:
1492-1800 439
gotas
qtr James Horn, "(To Parts Beyond the Seas': Free Emigration to the
j, Chesapeakein
Seventeenth Ccntury'i, cm Altman e Horn, eds., "7bMake
the America":European
Emigration i" the Early Modern Period, Bcrkclcy, CA 1991,pp. 85-131(p.
92).
Ilistoipv générale des Antilles habitéespar lesfrancais,
Du 'frrttti vol. Ill, p.445. Sobre
proprictåriosdc plantations cm tcrtnos mais gerais, ver Sheridan, Sugar and Slavery, p.
Les Esclaves aux Antillcsfrancaises, XVII' et
267;GabrielDcbien, XVIII' $i&le,Basse
(Guadalupe)/ Fort-dc-l•hncc (Martinica) 1974,pp. 105-17.
Beyond the Scas'", cm Altman c Horn, eds.,
3. Horn,"8ToParts Make America",p.
93.Horn aqui resume as conclusöcs de Russell Menard, "Economy and Society
in
EarlyColonialMaryland", dissertaqäo dc Ph.D., Universidade de Iowa, 1975,pp.32-
6.
4. Schwartz,Sugar Plantations in the Fonnation of Brazilian Society, p. 274.
S, Curtin,"The Atlantic Slave Trade", em Ajayi e Crowder, A History of WestAfrica, I,
pp.252-3;Philip Curtin, "Epidemiology and the Slave Trade", PoliticalScienceQuarterly
S3,junh0de 1968, pp. 190-216.
6. C. S. S. Higham, The Development ofthe Leeward Islands underthe Restoration,Londres
1921,p. 172. Se, como sugere obra recente de Richard Ashcraft, John Locke partici-
pouda Conspiragäo de Rye House, é possfvel que este patrocinador da Real Compa-
nhiaAfricanaacabasse sendo embarcado para St Kitts para trabalhar numaplantation
—embora osgentlemen costumassem ser punidos de outra forma, de acordo com a ideo-
logiada classe dominante.
7. O debatede 1659 é citado num artigo sobre a nosäo do "inglés nascido livre" ("freeborn
Englishman")em Keith Thomas, National and Local Feeling in England: c. 1550-1750,
Departamento
de Hist6ria, Universidade de Oxford, 1985. Para uma justificativa
admiråveldos direitos dos "ingleses nascidos livres", ver o relato de William Penn de
seusucessonumjulgamento de 1670: William Penn, "The People's Ancient and Just
Liberties Asserted", em The Peace of Europe, The Fruits of Solitude and other Writings,
Londres 1993, pp.135-52.
8. Beckles,White
Servitude and Black Slavery in Barbados, p. I I l.
9, Le RoyLadurie
explica a falta de emigrantes principalmente pela 16gica das pequenas
propriedades:"no século XVIII, apesar dos ataques constantes de compradores de terns
o arquipélago mültiplo de terras
familiares conseguiu defender-se bastante bem.
Esta é uma das
razöes pelas quais a Fransa, diferentemente da Grä-Bretanha ou
da Espanha, näo
era uma terra de emigrasäo: a pequena propriedade do tipo francés,
quaseinfinitamente
divisfvel, fornecia ao nåmero crescente de camponeses uma safda
relativamenteaberta e
disponfvel." Le Roy Ladurie, The Fench Peasants, 1450-1660
Londres1987,
p. 410.
Blandine
Barret-Kriegel, L'État et les Esclaves, Paris 1979, pp. 51, 75-6.
uOOlN
440
49. Para uma anålise ncst2 linha dentro da tradigäo mandsta, ver Eugene Genovese, The
Polstizal Economyof Slavery, Nova York 1968; Jacob Gorender, O escravismo colonial,
Sao Paulo 1988; GA. Cohen, Karl Marx's TheoryofHistory: A Defence, Londres 1978.
A critica da economia da escravidäo feita pelo economista liberal clåssico John Cairnes
cm The Slave Power, Londres 1862, coincidiu em vårios pontos com a anålise que Marx
fez na mesma época nos Grundrize e no Capital. Para um estudo deste ültimo, ver tam-
bém Robert Miles, Capitalism and Unfree Labour: Anomalyor Necessity?, Londres 1987.
SO, J. R- Ward, "The ProfitabilityofSugarPlantingin the British West Indies: 1650-1834"'
EconomicHiuor•y Rcview, ? , série, XXI, no. 2, maiO de 1978, pp. 197-213.
$1. Os gue escreverarn sobre o custo do trabalho escravo tinham
este aspecto em mente•
Na discussåo da genese da renda capitalistada terra no volume 3 do Capital,Marx
argumenta que o preso pago pelo escravo, baseado na previsäo do valor do excedente
a ser produzido pelo escravo, é efetivamente subtrafdo da produsäo, ou seja, dos re-
cursos disponiveis para o proprietårio de escravos construir aplantation. Cf Karl Marx'
Capital, JIJ, Londrcs 1981, capitulo 47, sesäo V, p. 945.
52. Este problema é mencionado por Eugene Genovese, The
Political Economyof Slave"'
p. 49; para urna extensa discussäo, ver Gorender, O estravi$tno
colonial, pp. 192-240•
DO ESCRAVISMO NO
A CONSTRUGÄO NOVO MUNDO:
1492-1800
443
repousa
aplicasäoesporådica da cooperaqäo em grandc escala na Antigüidade e em colönias modernas
(N. do T.)
• relagÖes diretas de dominaqäo e servidäo, na maioria dos casos, na escravidäo". escravoss6é compensador
"O cultivodosartigos de exportaqäo do Sul, algodäo, tabaco, asåcar etc., executadopor
extensöesde solo natural-
enquanto é realizado por grandes grupos de escravos, em escala maciqa e em grandes
menosda fertilidade do solo
Gil, que exige apenas trabalho simples. O cultivo intensivo, que depende natureza da escravidäo". (M
doquede investimento é contrårio å
de capital, inteligéncia e energia de trabalho,
M.ACKBURN
70. HansSloanesA vol. l, pp. xlvii, lii. Ver Richard Cullen Rath, "African
Music in Sornteenth CenturyJamaica», IVi//iamandMary Quatrerly, Outubrode 1993,
pp, 700-26, em especial pp. 710-12.
Por razoes óbvias é dificil documentar o ponto de vista dos escravos c rebeldes africa-
nos no período mais antigo. A história das rebeliões e das comunidades mamonsconti-
nua sendo a melhor prova de que os africanos trjeitavam o pesadelo utilitário da escravidão
americana, Ver Orlando Patterson, úSlax,rry and Slave Revolts: A Socio-historical Ana15is
Ofthe first Mamon NVar",em Richard lh•ice, ed., Mamon Societies:Rebel Slave Communities
Nova \brk• 1973, pp. 246-92; R. K. Kent, "Palmares: An African State
in Brazil", em frice, Mamog Societies,pp,179-90; Debien, Les Esclaves aux Antilles,
pp. 411-69; José Luciano franco, Las minas de Santiago y Ia nbelión de 10scobrms, Havana
1975.
72. David Eltis, "Europeans and the Rise and Fall of African Slavery in the Americas: An
Hist0'àcalReviete, dezembto de 1993, pp. 1399-1423 (p. 1423).
73. J. R. Pat.hstolhe Prsegt, Nova York 1979, p. 71, citado em Vaughan,
Ross Racistn,p. 173.
74. David Eltis, "Europeans and the Rise and l•àlllofAfrican Slavery in the Americas: An
Interpretation",
75. Eltis cita Thomas Haskcll, «Capitalism and the Origins ofHumanitarian Sensibility",
partes um e dois, em Thomas Bender, ed., The An:islavery Debate: Capitalismand
in Historical Perspective,Berkeley,CA 1992, publicado originalmente em
Historical Revieto, abril e junho de 1985.
76. Dunn, Sugar and Naves, pp. 225-6.
77. No final do século XVIII e início do XIX, o governo inglês comprou milhares dc es-
cravos na África, alistou-os em regimentos especiais nas Índias Ocidentais e lhesofe-
receu salários e a perspectiva de emancipação em troca da lealdade cm serviço; no fim
do período, alguns ficaram no Caribe, outros voltaram para a África. Henry Christophe,
rei do Haiti (1807-21), também recrutou soldados desta forma. Tanto os ingleses quanto
os franceses recrutaram servos contratados logo depois da emancipação, os ingleses na
Índia e os franceses na África — no último caso, os recrutados eram, quase certamen-
te, escravos na África, e só conseguiram alguma perspectiva de possível liberdadeno
Novo Mundo depois de manifestações abolicionistas. Nas décadas de ISSOe 1860'
antes da abolição da escravatura, as autoridades espanholas em Cuba permitiram a entrada
de servos contratados chineses, que serviam durante três anos cm troca de salários
CONSTRUÇÃO DO ESCRAVISMO NO NOVO
MUNDO: 1492-1800
445
ofinterest. n • H. H. Gerth e C. Wright Mills, eds., From Max Weber: Essays in Sociol
Londres 1948, p. 280. A função de "colocação de trilhos" atribuída a idéias e normas
religiosas é elaborada por Michael Mann, The Sogrcesf Social Power, I, pp. 341-72,
376-9. E sobre a proposta específica de que a "antiescravatura" pudesse funcionar como
ponto crucial, ver Runciman, Treatiseon Swial Theory, II, Ssbstantive Social Theo,y
pp. 133-4. Sobre Gramsci e as idéias como força material, ver David Forgacs, ed., The
Gramsci Reader, Londres 1978, p. 200.
83. Morgan, American Slavery, AmericanFredom, pp. 319-24.
84. Barbara Jeanne Felds, "Slavery, Race and Ideology in the United States of America",
New Left Review, no. 181, maio,5unhode 1990, pp. 95-118 (p. 104).
85. Beckles, WhiteServitgde and BlackSlavery in Barbadas,p. 113.
86. Greene, Pgrsgits ofHappiness, p. 92.
87. Jordan, White over Black, pp. 94-5.
88. Davies, The North Atlantic World in the Smenternth Ces:wy, pp. 211-15.
89. David Eltis, "Europeans and the Risc and Fall ofAfrican Slavery in the Americas: An
1993,pp. 1399-1423(p. 1423)
90. Ibid., p, 1422.
91. VerAllan Kulikoff, TheAgrarún Origins Charlottesville, VA 1992,
pp. 34-43. Provas destes pontos também Ao fornecidas nos Capítulos XI e XII a se-
guir.
92. Citado em Sacks, The WideningGate, p. 341.
93. T. Bentley Duncan,AtIantic IslandJ.•Maleira, Verdesin Sevtn'cen.th
CenturyCommerceand Navigation, Chicago e Londres 1972, pp. 243, 256.
94. Hall, Africansin ColonialLouisiana, pp. 119-201; Berlin, "From Creole to African",
Williamand Mary Quarterly,abril de 1996; Davis, on CheMargino pp. 166-98.
Algumas das obras inspiradas pela tese de Frank Tannenbaum de que a escravidão la-
tina e católica tinha caráter fundamentalmente diferente da escravidão protestante e
anglo-saxônica ajudam a indicar a diferença entre o que prefiro chamar de escravidão
barroca e escravidão comercial. Ver,em particular, Klein, Slaver•y in CheAmericas,
Chicago 1967, e Herbert Klein, "The Coloured Freemen in Brazilian Slave Society",
Jogmal ofSociaI History, vol. 3, 1969, mas note-se que onde e quando a escravidão de
plantation realmente se desenvolveu — ou seja, em Cuba e no Brasil no século XIX
houve um endurecimento do sistema racial. Os textos do antropólogo cubano Fernando
Ortiz e do historiador brasileiro Gilberto Freyre também chamam a atenção para ca-
racterísticas importantes dos regimes escravistas, embora deixem de perceber aquela
dinâmica peculiar da escravidão comercial daplantation que é analisada com esta visão