Você está na página 1de 15

AULA 1

NEUROCIÊNCIA DAS EMOÇÕES

Profª Adiele M. S. Corso


CONVERSA INICIAL

O entendimento de emoções, cérebro e cognição passou por várias


reformulações. Para compreender o processo que deu origem ao estudo, bem
como sua evolução até o momento atual, é fundamental o entendimento da
evolução histórica dos conceitos e concepções.
Durante muito tempo, entendia-se que emoção, cérebro e cognição eram
estruturas separadas ou dicotômicas. O modelo científico tradicional tinha como
foco principal a separação, um olhar para as partes, e essas partes separadas
entre si falariam sobre a totalidade.
Até se chegar ao conceito atual de aprendizagem efetiva, envolvendo a
ligação entre cérebro, aprendizagem e emoções, houve muitos estudos, desde a
antiguidade. Para ter um maior e mais profundo conhecimento sobre os conceitos
atuais, torna-se essencial estudar sua origem e evolução, numa perspectiva
histórico-social e cultural, desde a conceituação mais primitiva até a evolução para
os conceitos aplicados na atualidade.
A neurociência contemporânea é categórica ao afirmar que não existe
memória sem emoção. As emoções são combustível para o aprendizado e para a
criatividade. Trata-se de uma rede complexa, onde uma estrutura depende da
outra, e todas operam em um concerto, interagindo. As ondas cerebrais se
sincronizam com as emoções, e assim o conhecimento se constrói.
Nas diferentes etapas do desenvolvimento, de forma anatômica, o cérebro
pouco difere. Porém, no nível maturacional, ele é capaz de se modificar
consideravelmente. O objetivo de estudar essas transformações é compreender
como se dá o processo maturacional em cada etapa do desenvolvimento. Por
exemplo, uma criança de quatro anos já tem todo o cérebro formado, no entanto
ele não está maduro o suficiente para controlar impulsos ou planejar metas. Nessa
fase inicial de vida, o cérebro é extremamente moldável conforme as experiências
a que o indivíduo é submetido.
Outra proposta será verificar de que forma o impacto das emoções pode
ser capaz de modificar a aprendizagem, dando maior ênfase às emoções positivas
e às negativas, assim como o cérebro pode se moldar conforme as experiências
vividas, mudando de forma estrutural e funcional.
Na visão das neurociências das emoções, o aluno aprende efetivamente a
partir de emoções positivas, bem como "reduz a marcha" se o ambiente ou o
processo de ensino é passado sob ameaças, pressão ou excesso de cobranças

02
ou se ele é pouco valorizado na escola ou em casa. O aluno aprende melhor
quando o conteúdo se encaixa na experiência, em seu cotidiano, enquanto
expansão de seu conhecimento natural, que foge apenas da memorização, para
ter significado em algo que ele consiga utilizar em sua experiência de vida.
Outro tema que será visto no campo das neurociências das emoções é o
entendimento do que é emoção e o que é sentimento, termos muitas vezes
confundidos. A emoção é um estado interior, em que o indivíduo experimenta a
emoção. Já o sentimento é voltado para o exterior, é o efeito da emoção interna
que se exterioriza.
As emoções são expressas das mais variadas formas, bem como possuem
uma classificação específica, que são as emoções primárias, secundárias e
mistas, as quais serão descritas detalhadamente nas aulas a seguir.

CONTEXTUALIZANDO

Muito se discute a respeito do papel das emoções no processo de ensino


e aprendizagem. Alguns modelos educacionais ainda insistem em trabalhar e
entender emoção e razão de formas separadas, resultando em modelos não
eficazes de aprendizagem. As neurociências entendem que ambos formam uma
rede em conjunto. De que forma eles estão entrelaçados e como isso é
transmitido?
Primeiro, o papel de quem transmite o conhecimento é associá-lo com
emoções positivas, no sentido de conseguir propiciar uma relação de empatia com
o conhecimento que está tentando transmitir. Esse sentimento positivo é passado
quando a transmissão do conhecimento é vista mais do que como uma tarefa,
profissão ou orientação específica, mas sim com entusiasmo, energia e como ele
pode ser aplicado no cotidiano do sujeito aprendiz. O canal deve ser aberto, entre
o transmissor do conhecimento e quem está aprendendo, de modo que um possa
aprender com a experiência do outro, um perceba a importância para a vida desse
aprendizado e ambos consigam transpor barreiras para se sentirem a vontade em
expor suas dúvidas e questionamentos, entre vários outros fatores.
No que diz respeito ao aprendiz, deve estar num momento de vida
apropriado para receber, pensar e aplicar as novas informações, sem emoções
negativas, como estresse ou ambiente restritivo em casa, ameaçador ou que não
valorize o aprendizado.

03
Exercer essa missão é algo recheado de desafios, numa sociedade que
cada vez mais valoriza o egocentrismo, na qual as relações sociais são cada vez
mais substituídas pela tecnologia, em que pais e professores vivem num mundo
altamente estressante e desafiador, e a falta de tempo é prerrogativa comum a
quase todas as pessoas, que estão sempre alertas e aceleradas. Refletir sobre os
questionamentos acima e propor alternativas para um aprendizado efetivo
envolvendo as emoções tornam-se essenciais.

TEMA 1 – PAPEL DAS EMOÇÕES NO PROCESSO DE ENSINO E


APRENDIZAGEM

As emoções são foco de estudo das mais variadas ciências. Atualmente,


através da expansão dos estudos envolvendo a relação das emoções e da
cognição, bem como das emoções e do cérebro, o interesse pela área só tem
aumentado.
Como se dá esse processo no âmbito educacional? No processo de ensino
e aprendizagem, as emoções desempenham papel fundamental, pois, juntamente
com o aspecto cognitivo, são capazes de mediar e consolidar a aprendizagem
efetiva. O aluno não é mais visto como um reprodutor do conhecimento, mas
também como um formador de opiniões e conceitos, os quais são aplicados dentro
de sua realidade histórica e social.
Conforme Rotta (1996), as dificuldades de aprendizagem estão ligadas a
problemas psicomotores, perceptivos, gnósicos, práxicos, psicoafetivos e
socioafetivos. Isso não significa que todas as crianças com as características
acima irão desenvolver dificuldades de aprendizagem.
O ato de aprender se dá no SNC (sistema nervoso central), onde ocorrem
modificações funcionais e condutivas, as quais estão ligadas à carga genética de
cada pessoa, em conjunto com o ambiente onde esse ser está inserido. O
ambiente produz sensações no indivíduo, através do sistema sensitivo-sensorial,
que chegam pela substância reticular ativadora ascendente e são modificadas
pelo sistema límbico, relacionado aos aspectos emocionais e afetivos envolvidos
na aprendizagem. Isso quer dizer que o aprendizado se dá no cérebro, a partir da
relação com o outro. Esse outro (professor, pais etc.) deverá ser capaz de deixar
o sujeito aprendiz suficientemente motivado, para assim este ativar seu sistema
límbico (sistema responsável pelas emoções) e introjetar o novo conhecimento.

04
A aprendizagem é um ato que envolve a plasticidade cerebral, definida
como a capacidade do cérebro de modificar ou modular seu funcionamento de
acordo com as experiências com o meio ambiente. Ou seja, o cérebro não é uma
estrutura rígida, mas sim moldável pelas experiências de aprendizado. Quanto
mais novo o indivíduo, em termos de idade cronológica, maior a plasticidade
cerebral; quanto mais idoso, maior a rigidez, daí a importância das experiências
de aprendizado na infância e do investimento em aprendizagem nessa fase.
Dentro dessa conceituação, pode-se dizer que dificuldades para a
aprendizagem resultam de alguma falha intrínseca ou extrínseca desse processo.

TEMA 2 – ONDE TUDO COMEÇOU: PRINCIPAIS TEORIAS QUE SEPARAVAM


COGNIÇÃO DE AFETO

A palavra emoção vem do latim emovere, que significa mover para fora ou
migrar/transferir de um lugar para outro, assim como do latim emotus, que é o ato
de deslocar. É um modo de comunicar os mais importantes estados e
necessidades internas.
“Afeto vem do substantivo latino affectus,us, denotando um estado psíquico
ou moral (bom ou mau), afeição, disposição de alma, estado físico, sentimento,
vontade” (Houaiss, 2001).
Na antiguidade, acreditava-se que as emoções estavam voltadas aos
órgãos dos sentidos, em especial o olfato. Esse sentido era essencial para a
sobrevivência das espécies. Filósofos como Platão e Descartes propunham uma
separação entre razão e emoção, atribuindo maior importância à razão. Conforme
essa proposição, durante anos várias ciências, como a psicologia e a pedagogia,
estudaram os processos cognitivos e afetivos de forma separada.
Entre meados do século XIX e início do século XX, as relações entre corpo
e mente, razão e emoção, começaram a ser estudadas em biologia, psicologia e
psicanálise. O interesse era entre os processos cognitivos, incluindo as atividades
mentais ligadas à aquisição de conhecimento e relacionadas ao raciocínio e à
memória. Aqui, a emoção era vista como algo segmentado, um evento à parte e
independente das demais atividades neurais.

TEMA 3 – TEORIAS SOBRE A LIGAÇÃO ENTRE EMOÇÃO E COGNIÇÃO

O primeiro a contrariar a visão de separação entre razão e emoção foi Jean


Piaget, afirmando que emoção e cognição são diferentes por natureza, porém
05
inseparáveis em todas as atividades humanas. Para Piaget, a afetividade é a
energia necessária para a parte cognitiva funcionar de forma adequada.
Vygotsky também estudou as relações entre cognição e afeto. Pesquisou
ainda a formação das funções psicológicas superiores. Essas funções não estão
presentes no momento do nascimento, pois vão existir a partir da relação de
alguém com as outras pessoas – as quais transmitem o conhecimento cultural e
social – e vão sendo construídas de forma gradativa, conforme o momento em
que criança já é capaz de se apropriar da cultura.
Henry Wallon dizia que a evolução da inteligência dependia das
construções afetivas feitas. Para ele, o desenvolvimento psicológico era visto
como algo descontínuo, que ocorre a partir de crises, antagonismos e lutas. Sua
teoria baseia-se em quatro pressupostos:

 dimensão motora, relacionada ao movimento;


 dimensão cognitiva (pensamento marcado por crises, descontinuidades e
conflitos), relacionada à inteligência;
 afetividade, sendo um dos aspectos centrais do desenvolvimento, vem
antes da inteligência;
 formação como pessoa.

No final do século XIX, James e Lange diziam que os sistemas sensoriais


enviam informação sobre o estado do indivíduo ao encéfalo, e este, por
consequência, envia sinais ao organismo, alterando a frequência cardíaca,
mudando o tônus muscular e assim por diante. A emoção seria as alterações
fisiológicas, e se essas alterações fossem removidas, a emoção iria desaparecer.
No entanto, em 1927, Cannon-Bard afirmava que o indivíduo pode sentir a
emoção, mesmo que não sentisse alterações fisiológicas. A pessoa pode sentir
medo, por exemplo, e não apresentar sintomas somáticos, como palpitação, ou
seja, o fato de não sentir palpitação não significa que a pessoa não tenha sentido
medo.
Em 1937, James Papez demonstrou que a emoção não tem uma
localização específica no cérebro, mas sim passa por circuitos interligados. Esses
circuitos se ligam através de estruturas denominadas feixes nervosos. O nome
dado foi circuito de Papez. Ele é formado por quatro estruturas: hipotálamo e seus
corpos mamilares, núcleo anterior do tálamo, giro cingulado e hipocampo. O
objetivo seria elaborar as emoções e a forma como são expressas. Conforme
Azevedo (2004), o circuito começa no hipocampo (estrutura responsável pela

06
memória), sai pelo fórnix e chega aos corpos mamilares, dirigindo-se ao núcleo
anterior do tálamo, ao giro cingulado e retorna ao hipocampo, completando o
circuito. A teoria de Papez propunha que a experiência da emoção era inicialmente
determinada pelo giro cingulado e depois por outras áreas corticais.
Paul MacLean criou a denominação de sistema límbico a partir da teoria de
Papez, aceitando a essência da teoria deste, e adicionou novas estruturas ao
sistema, que são: os córtices médio-frontal (área pré-frontal) e órbito-frontal, o giro
parahipocampal, a amígdala, o núcleo mediano do tálamo, a área septal, os
núcleos basais do prosencéfalo e formações do tronco cerebral (Duran, 2004).
Criou a teoria do cérebro trino, ou seja, o cérebro humano é dividido em três
partes: sistema límbico (responsável pelos comportamentos emocionais ou
afetivos), neocórtex (funções mentais superiores aprendidas socialmente) e
reptiliano (funções neurovegetativas, que garantem a sobrevivência do indivíduo
e da espécie). Por exemplo, de acordo com a teoria de MacLean, no amor o
neocórtex seria o amor platônico; no sistema límbico, a paixão; e, no reptiliano, o
sexo. Já o apetite, no neocórtex seria o "comer com os olhos"; no sistema límbico,
"desejo de comer certas coisas"; e, no reptiliano, a fome. O trabalho, no neocórtex,
seria o trabalho produtivo, que faz progresso, que muda a humanidade; no sistema
límbico; o trabalho seria fazer de forma lúdica; e, no reptiliano, o indivíduo não
trabalha, apenas sobrevive no sentido de espécie.
O estudo acerca do sistema límbico vem se ampliando, em especial após
a descoberta dos exames de neuroimagens. Com eles, pode-se constatar uma
maior e mais profunda interação entre a cognição, a emoção e o equilíbrio
homeostático do indivíduo. Isso ocorre graças às diversas conexões formadas
entre os circuitos nervosos através dos neurotransmissores. Estes promovem
respostas autônomas ou viscerais, bem como de ordem somática e voluntária.
De acordo com Andrade (2004):

A formação de grupos interdisciplinares parece ser uma tendência viável


para a ciência do novo milênio. Por exemplo, as neurociências englobam
o estudo da neuroanatomia; neurofisiologia; neuroquímica e as ciências
do comportamento (psicofísica, psicologia cognitiva, antropologia e
linguística). Estas áreas de estudo tiveram um período de isolamento
maior entre si, até por volta de 1970. Atualmente, poucas mudanças
ocorreram em termos de objetos de estudo, contudo, os neurocientistas
têm atuado de forma mais sincronizada e harmoniosa, "monitorando" os
resultados entre as áreas. Esta mudança de atitude tem gerado maior
rapidez e aumento do conhecimento sobre o cérebro e do controle que
ele exerce sobre o comportamento.

07
A partir do texto acima, é possível constatar o quanto as neurociências
puderam avançar ao entender que diversas disciplinas são complementares entre
si, bem como apresentam interligação direta ou indireta. Esse entrelaçamento
permite um conhecimento mais profundo acerca das neurociências, unindo várias
áreas de conhecimento científico.

TEMA 4 – NEUROCIÊNCIAS DAS EMOÇÕES NA ATUALIDADE

Conforme a neurobiologia atual, a emoção pode ser definida como um


impulso neural que move um organismo para a ação.

Com o desenvolvimento das neurociências, postula-se que, como a


percepção e a ação, a emoção é relacionada a circuitos cerebrais
distintos. Ademais, as emoções estão geralmente acompanhadas por
respostas autonômicas, endócrinas e motoras esqueléticas – que
dependem de áreas subcorticais do sistema nervoso –, as quais
preparam o corpo para a ação7-9. Com efeito, acredita-se que a ciência
será capaz de explicar os aspectos biológicos relacionados à emoção.
(Vanderson, 2007)

Já o sentimento seria a emoção filtrada dentro do indivíduo, capaz de


produzir uma resposta ao meio ambiente. Por exemplo, uma pessoa sente medo
ao ver uma cobra. Isso seria a emoção gerada. O sentimento vai produzir uma
resposta frente à emoção, como a pessoa fugir do estímulo temido, neste caso a
cobra.

Figura 1 – Relação entre emoção, impulso neural e ação

Impulso Ação
Emoção
neural

Quadro 1 – Emoção e sentimento

EMOÇÃO SENTIMENTO
Orientada para o interior. Orientado para o exterior.
Indivíduo experimenta a emoção. Efeito interno da emoção vai se exteriorizar.

A afetividade e a cognição estão interligadas dialeticamente. Dentro desse


pressuposto, alguns autores da atualidade colocam as questões a seguir.
De acordo com Joseph LeDoux (2011), o sistema do hipocampo é o que
proporciona a memória consciente de uma experiência envolvendo a emoção;

08
enquanto a amígdala direciona a memória emocional inconsciente. Conforme o
autor, os pensamentos e sentimentos são originados por processos inconscientes,
e ambos são parecidos no nível consciente. Para ele, a emoção sofre maior
influência sobre a razão.
Conforme LeDoux (2011),

Se podemos estudar de que modo o cérebro processa informações


conscientemente, durante a percepção de estímulos visuais, e faz uso
de informações visuais com a finalidade de orientar o comportamento,
podemos igualmente verificar como o cérebro processa
inconscientemente o significado emocional dos estímulos e faz uso
dessa informação para controlar atitudes adequadas ao significado
emocional dos estímulos. Se esperamos que a análise da forma como o
cérebro processa estímulos visuais nos ajude a entender como ele
produz as experiências perceptuais subjetivas resultantes, esperamos
também que, verificando como o cérebro processa informações
emocionais, poderemos compreender de que maneira ele cria
experiências emocionais. Isto não significa que iremos programar
computadores para que tenham essas experiências, mas sim que
poderemos lançar mão da ideia de processamento de informações como
mecanismo conceptual para a compreensão de experiências
conscientes, inclusive de emoções subjetivas, ainda que essas
experiências não sejam em si mesmas estados computacionais dos
computadores... Assim, a emoção pode ajustar-se à estrutura cognitiva.

Para Antônio R. Damásio (1996), razão e emoção apresentam importante


interação. Os sentimentos e emoções funcionam como um elo entre a consciência
e o corpo. Ele desenvolveu um estudo com pacientes com lesões nos lobos pré-
frontais, em que foi observada uma importante diminuição das atividades
emocionais. Também estudou a relação entre emoções, raciocínio, tomada de
decisões e áreas cerebrais ligadas. Segundo ele, pessoas que possuem alguma
disfunção ou lesão em regiões do cérebro ligadas às emoções apresentam
dificuldades de aprendizado.

São as emoções que nos fazem únicos, é o nosso comportamento


emocional que nos diferencia uns dos outros. A natureza e a extensão
do nosso repertório de respostas emocionais não depende
exclusivamente do nosso cérebro, mas da sua interação com o corpo, e
das nossas próprias percepções do corpo. Como diz Damásio, o corpo
representado no cérebro constitui-se num quadro de referência
indispensável para os processos neurais que nós experienciamos como
sendo a mente. (Tomaz; Giugliano, 2007)

Greenberg, citado por Fuentes (2008), traz que a emoção funciona como
um sinalizador sobre o que nos afeta, bem como estabelece a meta para alcançá-
la. A cognição é o que dá sentido a nossa experiência. O papel da razão é auxiliar
a imaginar a melhor maneira de alcançar a meta.
Outro estudioso na área, Howard Gardner, refere que, através de diferentes
funções intelectuais, o ser humano desenvolve inteligências múltiplas. Conforme

09
Gardner, a inteligência não é apenas aquela que é ligada à área acadêmica, mas
sim é expressa de variadas formas e competências.

Quadro 2 – Teoria das múltiplas inteligências

Gardner desenvolveu a teoria das múltiplas inteligências, que são:

1. Inteligência linguística: envolve a capacidade para pensar com palavras, de usar a


linguagem para expressar e avaliar significados complexos.
2. Inteligência lógico-matemática: inclui a sensibilidade a padrões de relacionamentos
lógicos, funções, afirmações e proposições (causa e efeito; resolver problemas lógicos,
calcular).
3. Inteligência espacial: pensar de maneira tridimensional, recriar imagens sem depender
do estímulo visual.
4. Inteligência corporal-cinestésica: envolve o uso de todo o corpo ou partes do corpo para
resolver problemas, criar produtos, expressar ideias e sentimentos.
5. Inteligência musical: permite às pessoas criar, comunicar e compreender significados
compostos por sons.
6. Inteligência intrapessoal: construir uma percepção apurada de si mesmo e usar esse
conhecimento no planejamento e direcionamento de sua vida e para tomar boas
decisões.
7. Inteligência interpessoal: é a capacidade de compreender as outras pessoas e interagir
efetivamente com elas.
8. Inteligência naturalista: capacidade de reconhecer e classificar os sistemas naturais,
como a flora e fauna, assim como os sistemas criados pelo homem, reconhecendo
padrões em um estímulo.

Fonte: Adaptado de Brasil, 2006.

A partir do quadro acima, percebe-se que existem oito tipos de inteligências


diferentes que o indivíduo pode possuir. Elas se desenvolvem a partir da relação
da pessoa com o meio e podem mudar ou evoluir conforme as experiências a que
o indivíduo é submetido. Ou seja, em um determinado momento de vida, pode se
destacar na inteligência musical, por exemplo, e, em outro, na espacial, assim
como também pode ter mais de um tipo de inteligência ao mesmo tempo.

TEMA 5 – COMO EXPRESSAMOS AS NOSSAS EMOÇÕES

As emoções não são expressas de uma única maneira. Elas podem ser
classificadas em: emoções primárias, emoções secundárias e emoções mistas.
As emoções primárias servem principalmente para adaptar o indivíduo ao
meio, no sentido evolutivo e cultural. Estão ligadas a estados fisiológicos

010
específicos, relacionados com disposições inatas (ligados a estímulos e
respostas). Quem realiza o controle destas alterações é o sistema límbico.

Quadro 3 – Emoções primárias

EMOÇÕES PRIMÁRIAS QUAIS SÃO


Ligadas ao instinto e sobrevivência. Alegria, raiva, medo, tristeza, confiança,
desprezo, nojo, surpresa.

No medo e na ansiedade, o hipotálamo coordena respostas do sistema


nervoso vegetativo, como aumento das frequências cardíaca e respiratória e da
sudorese, preparando o indivíduo para o perigo e a ação. A amígdala produz
respostas fisiológicas e comportamentais relacionadas ao medo e à ansiedade.
As emoções secundárias são estados afetivos mais complexos, dividindo-
se em estados afetivos sensoriais e estados afetivos vitais. Estas emoções não
são mais puramente inatas, como as primárias, mas sim aprendidas a partir da
relação com o meio ambiente. A partir das emoções primárias, o indivíduo avalia
se o padrão de resposta anterior é bom ou não, permitindo ampliar novas
respostas, bem como manter respostas antigas consideradas eficazes.

Quadro 4 – Emoções secundárias

EMOÇÕES SECUNDÁRIAS QUAIS SÃO


Estados afetivos mais complexos que os das Culpa, remorso, antecipação, submissão,
primárias. inveja, vergonha, ciúme.

As emoções mistas se caracterizam por uma mistura de estados afetivos.


Seria quando o indivíduo sente duas ou mais emoções antagônicas ao mesmo
tempo ou após determinado tempo. Muitas vezes elas geram conflitos à pessoa,
pois não fica claro qual é a emoção predominante, podendo levar a respostas
muitas vezes confusas.

Quadro 5 – Emoções mistas

EMOÇÕES MISTAS QUAIS SÃO


Mistura de estados afetivos que se Amor-raiva, tristeza-piedade, compaixão-
contrastam. surpresa etc.

011
FINALIZANDO

Em todas as esferas do conhecimento, em especial para quem trabalha no


âmbito educacional, é primordial entender a relação entre razão e emoção, assim
como incorporar o estudo da relação entre ambas para um ensino e aprendizado
efetivo. Sem as emoções, não é possível lidar de forma adaptada ao meio
ambiente.
As emoções representam uma forma de lidar com os estímulos vindos do
ambiente. Elas permitem que o indivíduo adquira um padrão de reações mediante
esses estímulos e também, ao serem sentidas, possibilitam não apenas uma
resposta instintiva, mas a capacidade de pensar e analisar, estando ambas
entrelaçadas e indissolúveis. Estas capacidades são a base essencial para o
aprendizado. Além disso, são uma forma de comunicar informações sociais
importantes, fundamentais enquanto formação do ser social, garantindo a
sobrevivência mediante as relações sociais que se constroem no decorrer de seu
processo de desenvolvimento.
Levando em conta o ser social, entende-se que em cada momento de vida
as emoções podem ter determinado significado e trazer impacto ou
consequências distintas. O significado das emoções tende a ser variável num
determinado contexto histórico. Por exemplo, para quem viveu durante o período
das guerras, o significado do medo e o sentimento de apreensão poderiam ser
devastadores, provavelmente diferentes do que vivencia um aluno nos dias atuais
quando está estudando no currículo acadêmico a respeito das guerras. A partir
daí e mediante vários outros exemplos, entende-se o quanto é fundamental
entender a evolução histórica dos conceitos acerca das emoções, pois os
estudiosos e cientistas de cada época os elaboraram a partir do momento
histórico/realidade em que estavam inseridos. Talvez esse seja um dos motivos
de filósofos da antiguidade, como Platão e Descartes, proporem a separação
entre razão e emoção, pois naquele momento era essa a realidade vivida, muito
diferente da dos dias atuais, mas naquele contexto histórico fazia sentido. Ao
estudar a evolução dos conceitos, estuda-se também um pouco mais a respeito
da história, da forma como foram construídos, e isso inclusive pode auxiliar no
entendimento de valores e costumes de cada momento histórico.
Neurocientistas atuais são categóricos ao afirmarem que as emoções não
estão separadas da cognição, pelo contrário, uma depende da outra, são
entrelaçadas dentro de uma rede de alta complexidade. É um ramo de estudo que

012
ainda tem muito a ser explorado, e num futuro breve provavelmente serão
descobertas ainda mais conexões, relações, tornando essa ciência cada vez mais
rica, intensa e fascinante. Ou seja, as descobertas e a construção de novos
conceitos são um processo que não para nunca, pois o ser humano também está
em movimento, em um processo inacabável de
construção/desconstrução/reconstrução, seja de conceitos a respeito do mundo
ou de conceitos acerca de si mesmo.
No contexto de ensino e aprendizagem, entender este modelo é primordial
para o aprendizado efetivo. Estudar e compreender as emoções não são mais
apenas foco de categorias profissionais específicas, como a psicologia, psiquiatria
ou neurologia, mas também de todos que trabalham com o ser humano, como
profissionais que lidam com a educação, com a transmissão do conhecimento,
visto que as competências emocionais trabalham em conjunto com as
competências cognitivas. O desafio do educador é conhecer tais competências,
acessá-las e, assim, promover o aprendizado, num processo constante e que não
termina nunca.

013
REFERÊNCIAS

ANDRADE, V. M.; SANTOS, F. H. dos; BUENO, O. F. Neuropsicologia hoje. São


Paulo: Artes Médicas, 2004.

AZEVEDO, D. R.; BARROS, M. C. M. de; MULLER, M. C. Psico-oncologia e


interdisciplinaridade: uma experiência na educação à distância. Porto Alegre:
EdiPUCRS, 2004.

BALDWIN, A. L. Teorias do desenvolvimento da criança. 2. ed. São Paulo:


Pioneira, 1967.

BARRIOS-CERREJÓN, M.; GUÁRDIA-OLMOS, J. Relación del cerebelo com las


funciones cognitivas: evidencias neuroantómicas, clínicas Y neuroimagen.
Revista de Neurologia, Barcelona, v. 33, n. 6, p. 582-591, 2001.

BIAGGIO, Â. M. B. Psicologia do Desenvolvimento. 19. ed. Petrópolis: Vozes,


1976.

BLAYE, A. Psicologia do desenvolvimento cognitivo da criança. São Paulo:


Instituto Piaget, 2011.

BOGOYAVLENSKY, D. N.; MENCHINSKAYA, N. A. A psicologia da


aprendizagem de 1900 a 1960. In: LURIA, A. R. et al. Psicologia e pedagogia I.
Lisboa: Estampa, 1991.

BRANSFORD, J.; BROWN, A.; COCKING, R. R. Como as pessoas aprendem:


cérebro, mente, experiência e escola. São Paulo: Senac, 2007.

BRASIL. Saberes e práticas da inclusão. Ministério da Educação, Brasília, 2006.


Disponível em: <portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/altashabilidades.pdf>.
Acesso em: 6 abr. 2018.

CAMARGO, D. As emoções e a escola. Curitiba: Travessa dos Editores, 2004.

COLL, C.; PALACIOS, J.; MARCHESI, A. Desenvolvimento psicológico e


educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. v. I, II e III.

CYPEL, S. O estudo das funções corticais na criança. In: DIAMENT, A.; CYPEL,
S. Neurologia infantile. São Paulo: Atheneu, 1996.

DAMÁSIO, A. O erro de Descartes: emoção, razão e cérebro humano. São


Paulo: Companhia das Letras, 1996.

014
DANIELS, H. (org.). Vygotsky em foco: pressupostos e desdobramentos.
Campinas: Papirus, 1995.

DURAN, K. M. et al. A influência das emoções na cognição. São Paulo: 2004.

FLAVELL, J. H. Psicologia do desenvolvimento de Jean Piaget. São Paulo:


Thomson Pioneira, 1996.

FUENTES, D. et al. Neuropsicologia: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed,


2008.

GALVÃO, I.; WALLON, H. Uma concepção dialética do desenvolvimento


infantil. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

GAZZANIGA, M. S., HEATHERTON, T. F. Ciência psicológica: mente, cérebro


e comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005.

GOLSE, B. O desenvolvimento afetivo e intelectual da criança. Lisboa:


Climepsi Editores, 2005.

GOMES, A. M. A criança em desenvolvimento: cérebro, cognição e


comportamento. São Paulo: Revinter, 2005.

HOUAISS, A. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

KOLB, B.; WHISHAW, I. Neurociência do comportamento. São Paulo: Manole, 2001.

LEDOUX, J. O cérebro emocional: os misteriosos alicerces da vida emocional.


Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.

ROTTA, N. T.; OHLWEILER, L.; RIESGO, R. dos S. Transtornos da


aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre:
Artmed, 2006.

SPRINTHALL, N. A.; SPRINTHALL, R. C. Psicologia Educacional: uma


abordagem desenvolvimentista. Lisboa: McGraw, 1993.

TOMAZ, C.; GIUGLIANO, L. G. A razão das emoções: um ensaio sobre "O erro
de Descartes". Estudos de Psicologia, Natal, v. 2, n. 2, p. 407-411, 1997.

VANDERSON, E.-A. et al. Neurobiologia das emoções. Revista de Psiquiatria


Clínica, São Paulo, v. 35, n. 2, p. 55-65, 2008. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rpc/v35n2/a03v35n2.pdf>. Acesso em: 10 abr. 2018.

VYGOTSKY, L. S., LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem,


desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1988.

015

Você também pode gostar