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MARIANA ZAPATA

Disponibilização: Eva

Tradução: Perpétua

Revisão Inicial: Dani

Leitura Final: Miss Marple

Formatação: Eva

Maio/2019

MARIANA ZAPATA
MARIANA ZAPATA
Gaby Barreto, de vinte e seis anos de idade, pode ser um monte de
coisas (leal, sarcástica, quase um dos caras da turma e uma dor na bunda,
dependendo qual membro da família você perguntar), mas burra ela não é.
Quando seu irmão gêmeo a convida para sair em turnê como a garota do
stad de vendas de artigos promocionais, ela não fica exatamente gritando
de alegria a pleno pulmões.

Sem oportunidades de emprego batendo à sua porta, um ex-namorado que


ela ainda gostaria de castrar e sem nenhuma perspectiva de sair da casa de
seus pais em Dallas... seria tolice dizer não à possibilidade única. Duas
bandas, três continentes, uma turnê. Passar os próximos noventa dias com
três homens amados e oito estranhos completos não deve ser nada demais,
certo?

Se apenas o cantor da banda não tivesse tatuagens... uma personalidade


muito legal... um corpo fantástico... E se não fosse tão engraçado...

Vamos falar a verdade: Gaby nunca teve qualquer chance contra Sacha
Malykhin.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 1

A conversa que mudou a minha vida começou com as


palavras, “Gaby, nós precisamos conversar.”

Exatamente quatro minutos e cinquenta e cinco segundos


depois, aparentemente estou: A) não mais em um relacionamento,
B) sem-teto e C) patética. Embora toda a parte de ser “patética”
fosse conhecida apenas por mim... e minha melhor amiga... meus
pais... meus irmãos... minha irmã... e minhas sobrinhas.

Oh inferno. Quem eu estava enganando? Todo mundo soube


que eu era patética quando minha melhor amiga, Laila, contou aos
meus pais que fui despejada. Ela então disse a todas as pessoas
da minha família que eu tinha chorado por uma semana depois da
minha separação e em seguida assistido My Girl todas as noites
durante um mês inteiro. Os sete quilos e rosto cheio de acne que
ganhei ao me encher de Cheetos picantes e donuts não ajudaram
também.

Então, quando Eli, que normalmente só me liga duas vezes


por mês e está sempre bêbado como um gambá, telefona e começa
a nossa conversa com “Gaby-Gaby” em uma voz cantarolada, sei
que algo está acontecendo. Ele nunca me chamou pelo meu nome
a menos que um palavrão o precedesse. Então quando me
pergunta: “Você tem tempo para conversar?” Em um tom
completamente sóbrio, estou praticamente esperando o
apocalipse. Ou, no mínimo, ser convidada a abrir mão de um dos
meus principais órgãos.

Eu não deveria ter escutado a sua oferta. Deveria ter pensado


melhor, mas Eli era minha fraqueza na vida, e o idiota sabia disso.

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Eu não posso contar o número de vezes que me convenceu a
fazer algo para ele que eu nunca, jamais faria por qualquer outra
pessoa. Houve ocasiões em que tive que limpar seu vômito depois
que bebeu demais, porque se nossos pais descobrissem teriam
pirado. Ou quando comi macarrão por um mês inteiro porque tive
que tirá-lo da prisão, e ele não se preocupou em me pagar de volta.
Em seguida, houve aquela vez em que ele me transmitiu bronquite.
Eu fingi que minha bolsa foi roubada enquanto estava usando
antibióticos para poder dar-lhe a dosagem extra, porque ele não
tinha seguro saúde e isso era mais barato que ir ao médico. Em
retrospecto, tenho certeza que posso ter cometido um crime com
essa alegação.

Eu amo o meu irmão gêmeo, mesmo que ele seja um bastardo


inquieto... e a maldição da minha existência.

“Tivemos que deixar Zeke ir”, Eli explica com sua voz
melodiosa que faz tantas mulheres estúpidas e alheias ofegarem
por mais. “Venha em turnê com a gente. Mamãe disse que você
não está fazendo merda nenhuma neste verão, então sei que não
tem nada melhor para fazer...”

Umm... não tenho nada melhor para fazer, mas quando


alguém diz isso desse jeito, me deixa puta.

Estou deitada na minha cama de infância com os joelhos no


peito quando reviro os olhos. O teto ainda tem as estrelas que
brilham no escuro que colei nele há quase dez anos; parece que
elas estão zombando de mim, lembrando-me que não sou mais
uma criança, e preciso me recompor para que não tenha tempo de
olhar para elas. “Tenho me candidatado a alguns empregos, muito
obrigada.”

“Aww, G, você tem o resto de sua vida para trabalhar. Vamos


lá. Vai ser divertido”, ele insiste com a voz no limite de choramingar
que sempre usou para me fazer seguir suas ordens malignas.

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Ele tem razão; eu sei. Também sei quão manipulador Eli é.
Ele é quase tão manipulador quanto está cheio de merda, e ele está
cheio de um monte de merda.

Sair em turnê com eles, no entanto?

Tenho um flashback repentino de todas as coisas


aterrorizantes que já passei quando estive em sua companhia. Se
eu soubesse no jardim de infância o que sei agora sobre estes
meninos, minha vida poderia ter sido completamente diferente.
Ficar na detenção aos cinco anos de idade, junto com Eli, Mason
e Gordo deveria ter me alertado para o que estava por vir
simplesmente ao estar junto com eles. Porque, sério, quem fica na
detenção no jardim de infância? Não surpreendentemente, eles
foram as três pessoas com quem eu estava em cada uma das vezes
em que me envolvi em qualquer tipo de problemas.

O problema é que eu não gostava de fazer coisas para entrar


em apuros, mas isso parecia seguir o trio onde quer que fossem.

Então sim, sorrio, admirando a cor azul-petróleo que usei


para pintar as unhas dos pés no dia anterior. “Diversão? Sair com
você em um ônibus é divertido? Você está brincando comigo?”

Eli faz um barulho exasperado que está carregado por uma


rajada de ar no fundo. Ele mencionou que estavam em um do posto
de gasolina abastecendo. “Nós vamos para a Austrália e Europa...”
Ele lança as palavras e, em seguida, para por um segundo. “Nada?
Você não vai dizer nada?”

Eu não digo uma palavra e isso o faz continuar porque apenas


dizer os nomes dos dois continentes não é o suficiente para apagar
as minhas memórias menos favoritas de sair em turnê com eles
anos atrás.

E ele continua. “Coalas, cangurus... peixe e batatas fritas, a


Torre Eiffel...”

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Quando não grito automaticamente “sim!”, ele continua com
os subornos.

“Bem. Podemos pagar-lhe dez por cento de nossas vendas


mais qualquer gorjeta que conseguir, sua prostituta gananciosa”,
Eli oferece.

Ding, ding, ding.

Dez por cento? Posso lembrar o quanto eles faturavam


quando vendi mercadorias anteriormente por sua banda, Ghost
Orchid. Eles vendiam mil e quinhentos dólares em camisetas e
CDs durante o seu show. Dez por cento do total são cento e
cinquenta dólares. Cento e cinquenta dólares por seis horas de
trabalho. Seis dias por semana? E agora eles estão ganhando
ainda mais dinheiro? O idiota sabe que quero ir para a Europa
desde sempre, também, mas é o dinheiro que me convence.

Minha conta bancária levou um golpe paralisante quando


parei meu trabalho para voltar para casa em Dallas, depois que
me formei.

Dando uma olhada ao redor do meu quarto de infância com


sua parede azul ciano e cartazes de banda colados em todas elas,
suspiro para o receptor. Se ficar, corro o risco de ficar procurando
um emprego por quem sabe quanto tempo. Terei de viver com
meus pais até que encontre um companheiro de quarto que não
me deixe louca, e terei que lidar de frente com a Inquisição
Espanhola cada vez que sair de casa. Por outro lado, se for com
Eli, sei que a vida passará s ser constituída de noites suadas, uma
cama desconfortável e lidar com três imbecis que entregariam em
sacrifício a um grupo de zumbis se isso significar que irão
sobreviver.

Trabalho.

Casa.

Ônibus.

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Viagem.

Suor.

Ainda mais suor.

Porque, realmente, quem gosta de suar? Quem iria


voluntariamente se inscrever para um verão suado? Foi divertido
quando eu era mais jovem, mas agora...

“Vamos, G, você é a única pessoa em quem confio, e sinto sua


falta”, continua ele, a sinceridade amarrando suas palavras.

“Eu não sei...”

“Três meses”, ele continua. “Você provavelmente nunca será


capaz de fazer isso de novo.”

A realidade de suas palavras me atinge. Sou solteira,


praticamente sem teto e sem emprego. Logo haverá contas, o
trabalho e a vida em geral, que irão me amarrar e me manter para
baixo. Serei uma verdadeira adulta com reais obrigações adultas
em algum momento.

Essa percepção só me faz querer vomitar.

“Gaaaaaaby.”

O primeiro e único retrato que ainda tenho do meu ex com


um grupo de amigos está no canto do quarto e parece piscar para
mim, chamando-me de covarde.

“O que você está fazendo com sua vida, Gaby?” Brandon, meu
ex-namorado, perguntou nos trinta segundos de conversa que
mudaram a minha vida meses atrás.

“Esta é a decisão mais difícil que já tive que tomar, mas isso
não está mais dando certo”, ele disse para mim. O maldito inútil.
A decisão mais difícil que ele já teve que tomar antes foi se usaria
muito mousse ou muito gel no cabelo. Idiota.

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Falando nisso, por que diabos não piquei essa foto ainda?
Preciso fazer isso antes que esqueça novamente. Claro, tem um
grupo de pessoas nela, mas não parece ser uma razão suficiente
para mantê-la por mais tempo. Ouvi falar de coisas chamadas
“separações amigáveis”, mas nunca vi uma pessoalmente.

É a coleção de cartazes bem acima da imagem do idiota que


finalmente atrai meus olhos. São cartazes que coletei da Ghost
Orchid em diferentes viagens ao longo dos anos. Além de ter que
agir como uma babá e uma esposa irritante, e de ter testemunhado
coisas que uma irmã nunca deveria ter um assento na primeira
fila para ver, tive um monte de diversão cada vez que saí com eles.
Não conto o último dia da última turnê em que eu estive, mas...

Estou seriamente indo para uma turnê com meu irmão quase
alcoólatra durante três meses, tudo para que possa evitar o
inevitável?

Você provavelmente nunca mais será capaz de fazer isso.

Puxo as pernas para trás em meu peito e as abraço com o


braço que não está ocupado segurando o telefone no meu ouvido.

Então suspiro. “Sim, dane-se. Vou fazer isso.”

Há uma pausa antes de meu irmão gêmeo perguntar


lentamente, “Você vai?” Parece que ele não consegue acreditar na
minha resposta.

“Sim.”

“Eu já te disse recentemente o quanto...”

Eu o interrompo antes que tenha a chance de me adular.


“Com duas condições.”

Seis horas depois, o meu voo de Dallas a Boston finalmente


pousa.

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Aparentemente, a compra de um bilhete de avião exatamente
duas horas antes do voo realmente decolar não lhe garante um
bom lugar. Fiquei sentada num voo de quatro horas, encravada
entre uma mãe com um bebê realmente bonito que sofria de cólicas
e um homem que provavelmente fuma um maço de cigarros por
dia desde os anos oitenta.

Assim que minha bolsa sai do transportador de bagagem,


pego um táxi para chegar ao local onde Idiota, Idiotinha e Idiotão
estão tocando.

O fato de que apenas algumas horas antes eu estava deitada


na minha cama, assistindo televisão e me debatendo se realmente
precisava comer sorvete ou não, não me escapa. No espaço de uma
conversa de vinte minutos com o meu irmão, ele comprou o bilhete
de avião para Boston mais rapidamente disponível e me ordenou
“Comece a fazer as malas, Flabby.” Eu não tenho ideia de quanto
um voo de última hora como esse custou, mas espero que não
tenha sido muito.

É uma prova de minha falta de “me importar” que eu tenha


sido capaz de conseguir juntar todas as minhas coisas em menos
de meia hora. Eu praticamente agi por instinto conforme joguei
roupas na mesma mala que tinha usado alguns meses atrás,
quando fui forçada a sair do meu apartamento. Meu guarda-roupa
consiste em um punhado de shorts curtos, duas calças jeans,
camisetas, uma coleção de tops e regatas. Algumas roupas de
banho, calcinhas, sutiãs, dois vestidos de algodão, passaporte,
sandálias de cores neutras e quantos livros eu pude fazer caber,
equilibrou a minha fiel Samsonite vintage e a mochila. Eu percebi
que poderia comprar qualquer outra coisa que precisasse porque
não era obrigada a ter algo que esqueci, com certeza.

Mamãe e papai estavam por demais animados por me


mandarem para junto de Eli. Eles me largaram no aeroporto com
grandes sorrisos em seus rostos. Eu odiava pensar por que eles
estavam tão felizes em me ter fora da casa, então definitivamente
não fui por esse caminho de potenciais pesadelos e náuseas. Eu

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também acho que eles secretamente esperavam que eu ficasse de
olho em seu amado menino mais jovem, a sua criança selvagem,
mas todo mundo sabia que não há controle sobre Eli Barreto. O
idiota nasceu com o inferno em suas veias.

Na corrida de táxi, mentalmente me preparo para a loucura


que são Eli, Mason e Gordo. Mason e Gordo estão na minha vida
por tanto tempo quanto posso lembrar. Tenho uma memória breve
e borrada de estar no jardim de infância, observando Mason e Eli
enfiar massinha de modelar em suas bocas enquanto Gordo e eu
assistíamos os dois, tanto com horror quanto com fascínio.

Mesmo que não tenha chegado a vê-los muito ao longo dos


últimos dois anos, eu os amo pra caramba. Muito dos primeiros
vinte anos da minha vida incluem os três monstros, de maneira
nenhuma posso ficar sem eles. Uma vez Eli e eu fomos separados
em diferentes salas de aula na escola primária para nos forçar a
fazer novos amigos, um ou outro ficou em uma classe comigo...
normalmente sentado ao meu lado, tentando copiar o meu
trabalho.

Crescendo, eu era Flabby Gaby. Bem, deveria dizer que ainda


fui Flabby Gaby mesmo até na última vez que os vi durante o Natal.
Só que agora eles se formaram depois de puxar meu rabo de cavalo
constantemente e intencionalmente fazer coisas para me irritar.
Nesta fase em nossas vidas, eles geralmente resolveram apenas me
provocar, mas eu não esperaria nada menos.

O ponto é: você pode amar alguém e ainda temer viajar com


eles, especialmente quando será por três meses seguidos.

Vai correr tudo bem. Realmente ótimo. Certo. Com certeza


será.

Sim, nem eu posso acreditar totalmente.

Estou torcendo as mãos sem parar na corrida de táxi para o


local, e espero muito que meu desodorante aguente pelo resto da
noite. Olhando para o relógio, percebo que já passa das sete. Eli

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me disse que eles não entrariam no palco até pelo menos nove
horas.

Quando o taxista me deixa no final do quarteirão, ligo para o


burro do meu irmão.

Ele responde no segundo toque. “Você está aqui?”

“Não, estou na Antártida.” Eu já estou puxando minha mala


pelo quarteirão.

A tenda foi montada no canto oposto, mas não posso deixar


de ver o letreiro.

ESTA NOITE

THE RHYTHM & CHORD TOUR

INGRESSOS ESGOTADOS

De olho no ônibus enorme estacionado na rua, a cerca de 10


metros de distância, não posso deixar de me lembrar de Pepe, a
van velha da Ghost Orchid. Nos passeios que fui com eles antes,
nós nos enfiávamos em sua van Chevy para quinze passageiros e
seu reboque de carga vermelho desbotado. Com pintura
descascada, assentos remendados com fita, e portas de aparência
questionável — você não podia evitar, se apaixonar pela Old Pepe.
Ela acumulou mais de trezentos mil quilômetros antes de ser
aposentada. Algumas das minhas melhores lembranças vieram
graças a sua lealdade. Agora que a banda está ganhando dinheiro,
se modernizaram com coisas mais agradáveis.

Não posso dizer que não estou animada por não ter de dormir
em um banco e rezar todos os dias para que um dos caras não
caísse no sono ao volante durante a noite, no entanto.

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“Flabby!” Uma voz que começou a me assombrar desde o
momento em que nasci, grita.

Gemo, mas não posso deixar de sorrir, animada ao ver meu


irmão gêmeo, pela primeira vez em mais de cinco meses, de longe
o mais longo tempo que já ficamos separados. Sua cabeça
volumosa e gigantesca sai do canto verde, prata e preto do ônibus
de turismo conforme caminha em minha direção em shorts de
natação coloridos, uma camiseta branca e um boné de baseball
com as abas achatadas. Com o cabelo do mesmo tom de castanho
escuro que o meu, exceto que é liso, os mesmos olhos verdes e pele
cor de pêssego, Eli sorri como se tivesse acabado de descobrir que
Sam Adams o está apoiando.

“Eliza”, canto, chamando meu irmão pelo apelido que dei a ele
aos quatro anos de idade.

Ele abre um grande sorriso e estende seus braços com porte


de tronco de árvore para frente, entortando os dedos em minha
direção. “Venha para mim.”

Olho Eli pela primeira vez em quase meio ano. Ele ainda
parece exatamente o mesmo... exceto que parece que tem um
toque de uma barriga de cerveja crescendo. Isso é apenas uma
ligeira surpresa.

Desde que frequentamos a escola, juro que ele usou


esteroides, mas não importa o quanto procurei, nunca encontrei
nenhum com ele. Eli é ligeiramente menor a um metro e oitenta e
três de altura com bíceps do tamanho da minha cabeça e um
pescoço que não posso tentar sufocar pois é muito grosso. Eu
costumava perguntar a ele quando estaria fazendo sua estreia na
luta greco-romana profissional. Ele então me perguntava quando
eu estava pensando em me tornar a mais nova concorrente do
Extreme Makeover. Idiota.

Mas a coisa sobre ele que está mais aparente é como seus
olhos parecem limpos. Ele não começou a beber ainda — como
uma das estipulações que fiz quando concordei em entrar na

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turnê. Eu não quero ver você bêbado, disse a ele, e
surpreendentemente, ele concordou sem discutir.

No instante em que estamos perto o suficiente, nos


abraçamos e depois nos abraçamos mais um pouco.

Ele me segura por mais um minuto antes de finalmente se


afastar, descansando a mão sobre cada um dos meus ombros.
“Quando foi a última vez que te vi?” Ele pergunta, me olhando com
cuidado.

Faço uma careta antes de golpear sua barriguinha com a


palma da mão. “Há cinco meses, otário.” Ele estava vivendo em
Portland há quase um ano, e a última vez que nos vimos foi no Ano
Novo.

Ele faz uma careta. “Senti sua falta mais do que senti a falta
de Rafe”, Eli oferece um sorriso antes de me abraçar de novo, um
pouco mais ou menos, um pouco agressivo demais, assim como é
nosso relacionamento.

Rio em seu ombro. “Vou contar a ela que você disse isso.”

Ele bufa, outro traço que compartilhamos; nossa mãe


pensava que os roncos dele eram bonitos enquanto os meus ela
considerava perturbadores. Era um verdadeiro gesto de confiança.
Obrigada, mãe. “Eu vou negar.” Ele negara. Rafe é diminutivo de
Rafaela, nossa irmã mais velha, que nos aterrorizava quando
éramos crianças. Inferno, acho que ela ainda assusta nós dois.

Revirando os olhos, aperto sua cintura. Enquanto foi fácil


levar a vida no dia-a-dia, quando não tinha um lembrete constante
de que sentia falta dele, agora que o vejo, percebo o quanto estava
com saudades. Estar perto dele me faz sentir em casa. “Você é um
idiota, mas senti sua falta o suficiente para não me importar que
não tenha nenhuma bola.”

Ele me abraça de volta por mais um momento, e depois beija


meu rosto inesperadamente antes de me empurrar para longe. Eu

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não deixo a surpresa de sua afeição se registrar no meu rosto.
“Bem, vamos lá. Vou te mostrar onde está o ônibus. Ainda tenho
que me aquecer.”

Puxando-me na direção da porta do ônibus, Eli explica o que


aconteceu com Zeke. Ele foi o vendedor da Ghost Orchid nos
últimos dois anos, desde minha aposentadoria. Aparentemente
Gordo começou a notar que a banda estava, ocasionalmente, um
pouco sem dinheiro, mas não pensou muito sobre isso até que a
mesma coisa aconteceu no primeiro dia da sua atual turnê. Não
foi um monte de dinheiro que desapareceu, mas o suficiente para
que Gordo, que era obcecado sobre manter o controle das
mercadorias, notasse. Naquela manhã, Mason descobriu que
havia trezentos dólares faltando. De acordo com o vendedor da
outra banda que estava em turnê com eles, ele viu Zeke esconder
algumas notas na mochila do seu laptop.

Que estúpido.

Então eles largaram Zeke em um posto de gasolina com


dinheiro suficiente para um táxi e uma passagem de avião com
uma escala.

Meu irmão para na frente do ônibus e puxa a enorme porta


de metal pesado. Ele faz sinal para eu deixar a minha mala no lado
de fora.

“Eu meio que esqueci de te dizer que estamos compartilhando


um ônibus com a outra banda que está em turnê conosco”, ele
tosse em uma frase rápida, subindo os degraus altos e entrando
primeiro dentro do ônibus. O assento do motorista está vago.

“Ah, é?” Pergunto realmente não me importando se vamos


compartilhar duzentos metros de veículo em movimento. Sobrevivi
com eles no passado em cinco metros. Duzentos não serão um
problema.

Ele puxa uma cortina creme pesada, que separa a área do


motorista do espaço comum. O espaço consiste em uma televisão

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de tela plana atrás do banco do motorista. Há um longo sofá
estreito em cada lado do corredor que vai direto para o meio do
ônibus. Uma pequena mesa para dois foi criada atrás da área de
estar e uma cozinha minúscula está aninhada diante de uma porta
que dá onde os beliches ficam. A disposição é semelhante a todos
os outros ônibus em que já tinha estive antes, quando os visitei
em turnê.

“Sim. Nós estamos dividindo já que o preço da gasolina


começou a fazer minha bunda sangrar”, ele explica.

“Você tem certeza que o sangramento não é por causa das


constantes práticas anais com Mason?” Digo, cutucando o dedo
em suas costas.

Eli me enxota por cima do ombro enquanto caminha um


pouco mais para dentro. “Vou peidar em seu travesseiro e espero
que você fique enjoada”, ele murmura.

Não posso deixar de rir conforme entro no espaço comum, ou


melhor, o que será chamado de “casa” pelas próximas semanas.
“Você é horrível.”

Virando-se para sorrir para mim dessa mesma maneira


sorrateira que fez toda a nossa vida, Eli pisca, o que nunca é uma
coisa boa. Ele piscar é um aviso de problemas futuros. “Oh, minha
pequena, bebê Gaby. Eu vou te mostrar como pode ser horrível.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 2

“Jesus, Maria e José! Essa é a minha futura esposa?”

Estou do lado de fora do ônibus, vendo como meu irmão


esconde minha mala no compartimento inferior do meu lar
temporário pelas próximas cinco semanas, quando as palavras
perfuram o ar de Massachusetts. Gemo, reconhecendo a voz que
contamina a minha vida há mais de vinte anos. Então me viro.

Mason tem seus longos braços tatuados estendidos em minha


direção, sorrindo como o tolo demente que ele é e ainda mais
bonito do que qualquer idiota deveria sempre ser. “Vem cá, minha
noiva.”

Bufo e balanço a cabeça, já indo na direção dele. “Oi.”

Mesmo que sejamos amigos desde antes de eu sequer saber o


que era um sutiã, Mason me diz que vamos casar por tanto tempo
quanto posso lembrar. Eli diz que será um dia frio no inferno antes
que ele deixe isso acontecer, e eu não posso deixar de concordar.
Fingi ser a namorada de Mason, pelo menos uma centena de vezes,
sua irmã, parceira, domadora, a voz da razão e fomos juntos a
várias formaturas.

Isso é apenas a ponta do iceberg na nossa história.

Quando se sabe as piores coisas sobre as pessoas que você


gosta e ainda consegue amá-los de qualquer maneira, por vezes, o
sentimento se transforma em um tipo fraternal de afeto. Pelo
menos esse é o caso com esse cara. Não que isso me impeça de
pensar que Mason é atraente.

Porque ele é. Meu deus, ele é. É inegável.

MARIANA ZAPATA
Sinto seus braços se envolverem em mim e apertarem; tudo
que consigo pensar é que seus bíceps são perfeitamente
esculpidos.

Com olhos azul claros e um corte de cabelo que o deixa


parecendo um modelo da Calvin Klein, Mason é a razão pela qual
a banda tem tantas fãs do sexo feminino. Se você perguntar a
minha mãe, ela insistirá que Eli é o mais atraente, mas, de jeito
nenhum. Mason tem quase a mesma altura que meu irmão,
musculoso o suficiente, mas não tão volumoso, e ele tem um
sorriso que é enganosamente doce. Ele também dormiu com mais
mulheres do que posso contar, fuma maconha pelo menos uma
vez por dia, e só toma banho quando sente o mau cheiro, que não
é vezes o suficiente; mas de alguma forma consegue continuar
sendo um ímã de vaginas, apesar de seus problemas de higiene.

E hoje é o meu dia de sorte, porque pelo cheiro dele, ou eu


acho que não tem cheiro — ele tomou um banho recentemente.
Louvado seja deus.

“Eu apenas sujei minhas calças quando ouvi que você estava
embarcando na turnê com a gente”, ele murmura contra o meu
cabelo. Abraçando-me novamente, puxa meu rabo de cavalo como
nos velhos tempos.

“De acordo com E, não tenho nada melhor para fazer neste
verão.” Rio, mas é um pouco forçado. O lembrete de que não tenho
um emprego, minha própria casa ou mesmo quaisquer
perspectivas de ambos é como um prego direto no olho.

Mason se afasta e sorri para mim. “Eu não via você desde
sempre. Você se escondeu na Fábrica de Chocolate novamente com
o seu Oompa...?”

Acerto sua narina com o dedo indicador. Com um metro e


cinquenta e sete, ouvi inúmeras piadas sobre a minha altura
durante os últimos dez anos. “Você é um idiota.”

Sua única resposta é um encolher de ombros sem remorso.

MARIANA ZAPATA
Eli puxa meu cinto, um segundo depois, me distraindo de
nossa conversa. “Sua mala está no ônibus. Vamos vender algumas
merdas. O telefone de Gordo está morto, e aposto minhas malditas
bolas que ele na última hora ele está dando o troco errado sem o
seu aplicativo de calculadora.”

Balanço a cabeça, lembrando o tempo em que testemunhei


Gordo tentando dar um troco no caixa do posto de gasolina.
Doloroso nem sequer começa a descrever isso. Eu acabei dando
dinheiro a pobre senhora do meu próprio bolso para acabar com o
seu sofrimento.

Mason ri. “Você sabe que ele só se ofereceu para ir lá fora para
que pudesse verificar a possibilidade de colocar a salsicha em ação
na plateia esta noite.”

Meu irmão geme. “Vamos, G.”

“Eu te vejo mais tarde, Flabby. Faça algum dinheiro para o


papai esta noite”, Mason pisca com uma risada, puxando meu rabo
de cavalo uma última vez antes de caminhar em direção à frente
do ônibus.

Seguindo atrás do meu irmão, que me leva pela entrada


traseira do edifício, acabo no palco. Assim que saímos, a loucura
se segue e isso me pega completamente de surpresa. Estou mais
do que familiarizada com o tipo de multidões que a Ghost Orchid
traz, por viajar com eles no passado. Desde então, meus pais,
meus irmãos mais velhos e eu dirigíamos para qualquer um dos
seus shows dentro de um raio de viagem de cinco horas a partir de
Dallas. Pensei que já tinha visto tudo.

Desta vez há muito mais pessoas do que lembro de ter visto


no passado. O lugar já está cheio. Não é que eu não achava que
eles poderiam atrair uma multidão; apenas era raro tanta gente
aparecer horas antes do ato principal.

Eli me dá uma cotovelada. “Loucura, hein?” Ele pode sentir a


minha surpresa com as centenas de pessoas lotando o local tão

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cedo. Mais frequentemente do que não, eu e ele não precisávamos
de palavras para nos comunicar. “Temos muita sorte que eles nos
escolheram para esta turnê.”

“Quem é a banda principal?” Finalmente pergunto, colocando


a mão em seu ombro para segui-lo no meio da multidão. As últimas
horas foram tão agitadas que não tive a chance de perguntar, não
que realmente importe de qualquer maneira. Fui com eles quando
tocaram com todos, de uma banda de rap-metal a um grupo indie-
pop puro.

As pessoas olham conforme meu irmão caminha através da


multidão na minha frente, desculpando-se com cada pessoa que
esbarra. Sempre pareceu estranho para mim que as pessoas
ficavam com estrelas em seus olhos quando o viam pessoalmente.
Porque este é o meu Eliza. Ele não tem nada de especial, ou
melhor, do que qualquer outra pessoa. Sua merda cheira tão mal,
se não pior do que de qualquer outra pessoa, e tenho um milhão
de outras histórias humilhantes sobre ele, se alguém quiser ouvi-
las.

“The Cloud Collision”, ele responde.

Sacudo a cabeça tentando reconhecer o nome e consigo apena


uma leve menção vaga no passado. A banda deve ser bem
conhecida se é a protagonista em cartaz, mas ainda não consigo
ter uma memória sólida deles. Nenhum título de música, nome de
álbum, membro da banda, ou mesmo como é o som deles. O
anonimato não é necessariamente inédito para bandas que não
eram populares. Há facilmente dezenas de milhares de bandas que
não serão conhecidas pelas massas. Os grupos não precisam ser
tocados na rádio ou televisão para serem bem-sucedidos, mesmo
se ainda fossem considerados desconhecidos.

Não ajuda que eu realmente deixei o movimento de busca de


música nova no último par de anos. Estive tão ocupada com a
faculdade e um emprego de tempo integral que realmente não
acompanhei quase nada.

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“Eu não tenho nenhuma ideia de quem você está falando”,
admito.

Ele encolhe os grandes ombros musculosos conforme


continuamos andando. “Você vai gostar deles. Eles são bons;
Sacha também se apresenta toda noite.”

Sacha? Senti-me iluminar um pouco. “Oh, isso é legal. Eu não


sabia que havia uma outra menina em turnê.” Ela pode ser uma
cadela furiosa, mas talvez não.

Eu perco o passo quando Eli lentamente vira a cabeça para


olhar para mim, uma expressão estranha em seu rosto.
Lentamente, ele balança a cabeça, como se fosse acenar para
alguém que fez uma pergunta estúpida.

Isso me faz franzir a testa. “O que?”

“Nada.” Ele abre muito os olhos, como se eu não estivesse


familiarizada com cada uma das suas expressões faciais e o que
elas significam.

“Por que você está fazendo essa cara?”

“Por nada, Flabs. Não estou autorizado a sorrir?”

“Não.” Olho para ele um pouco mais, desconfiada.

Mas meu irmão apenas dá de ombros e não diz mais uma


palavra.

Mantenho o olho nele. Sei que está tramando algo.

Num instante, estamos na mesa de vendas, onde Gordo


parece um cervo paralisado por faróis. Um pequeno grupo de
pessoas o cerca, metade delas querendo comprar alguma coisa e a
outra metade querendo nada mais do que falar com o cantor e
guitarrista da Ghost Orchid. Uma pessoa cega poderia dizer o quão
desconfortável Gordo está. O pobre coitado tem suor escorrendo
pelas têmporas e parece inquieto. Assim que vê seu colega de

MARIANA ZAPATA
banda e, em seguida, eu pairando atrás da salsicha humana
gigante, ele visivelmente suspira de alívio.

Eu nunca entendi muito bem como Gordo consegue aguentar


o meu irmão e Mason. Ele é o único são. O pensador. O fala mansa.
Ele é o tipo de cara que não fala muito ou curte se meter em
encrencas. Ele normalmente é a voz da razão, onde os outros dois
idiotas agem primeiro e pensam depois, se pensam. Quando
éramos mais jovens, Gordo e eu normalmente sentávamos e
assistíamos os outros dois entrar em todos os tipos de merda
enquanto balançávamos nossas cabeças e os julgávamos o tempo
todo.

Depois de um abraço, uma explicação de como usar a sua


máquina de passar o cartão de crédito, o quanto cada camisa,
cartaz, porta cerveja, CD e marca-páginas custam, sou deixada
sozinha para enfrentar um pelotão de fuzilamento que quer
comprar algo. Eliza e Gordo desaparecem tão rapidamente quanto
podem, indo se aquecer nos bastidores. Mesmo que eu não venda
artigos promocionais para eles há alguns anos, é como andar de
bicicleta. Você dá aos fãs o que eles querem e eles entregam o
dinheiro. É muito fácil. Sabendo que serei paga dependendo da
quantidade de mercadoria que vender, posso ter escovado as teias
de aranha do meu melhor sorriso coquete e propositadamente
puxado minha blusa mais para baixo em alguns centímetros do
que deveria. Eu geralmente não mostro Lucy e Ethel porque sou
meio envergonhada delas, mas dinheiro é dinheiro.

Uma menina tem que fazer o que é preciso.

Além disso, vender promos me deu as minhas meninas, então


não odiarei o trabalho que me proporcionou tanto.

Assim que a fila diminui, finalmente me viro para olhar na


direção da mesa ao lado. A instalação espelha a que eu estou
cuidando. Uma mesa desmontável grande foi organizada com uma
tela de metal plana encostada à parede por trás dela. Na prateleira
estão camisetas e casacos fechados presos a elas. Na mesa estão

MARIANA ZAPATA
etiquetas, CDs e vinil. No chão, desordenados e escondidos
embaixo da mesa, ficam as caixas e recipientes cheios com os
produtos em exposição. O nome da banda, The Cloud Collision,
está impresso em uma grande faixa que foi montada acima do
rack.

Eu me sento em uma das grandes caixas plásticas onde


algumas das camisetas são armazenadas, e olho o cara que
trabalha atrás da mesa da outra banda. Ele é, possivelmente
alguns anos mais jovem do que os meus vinte e seis. É magro, com
cabelo longo, reto na frente e um cabelo rente de orelha a orelha
na parte de trás; ele está ocupado trabalhando com uma fila
grande que tem umas dez pessoas.

No momento em que termina com a fila, assim que a banda


de abertura local sobe ao palco para começar a colocar os seus
instrumentos e acelerar o ritmo, ele se vira para olhar para mim e
me dá um sorriso — tímido e bonito, com destaque para um
piercing labial no canto de sua boca. Serpenteando através do
labirinto de caixotes e caixas de plástico que nos separam, ele
estende a mão.

“Eu sou Carter”, ele se apresenta. Agora que está perto,


percebo que ele é, possivelmente, uns quinze centímetros mais alto
que eu. Ele também tem outra perfuração na sua sobrancelha,
uma bolinha preta, que não notei inicialmente. “Você é irmã de
Eli?”

Balanço a cabeça, sacudindo sua mão. “Sim, eu sou Gaby.


Prazer em conhecê-lo.”

“Prazer em conhecê-la também.” Ele me dá outro sorriso


tímido, até mesmo cora um pouco, antes de apontar para mim. “Se
você se virar, posso tirar o bilhete das suas costas.”

O bilhete...?

“Ah, Gordo colou isso nas suas costas quando lhe deu um
abraço”, ele explica.

MARIANA ZAPATA
Gemo, de jeito nenhum surpresa, e me viro para deixá-lo
retirá-lo de mim. Gordo é o calado, com certeza, mas ainda é um
brincalhão. De que outra forma ele sobreviveria com os outros dois
se não tivesse nada disso nele? O cara chamado Carter me entrega
o Post-It amarelo fluorescente colado com a mesma fita de
embalagem clara que vi em uma das caixas que vasculhei. Com a
letra cursiva terrível do Gordo, o bilhete diz:

Oi, meu nome é Flabby.

Começo a rir.

“Ele faria isso”, murmuro para mim mesma, pressionando o


adesivo no topo da caixa como uma lembrança. Olhando para o
outro cara de vendas, lanço um sorriso. “Obrigada por tirá-lo, caso
contrário ele teria ficado aí a noite toda.”

Carter balança a cabeça e levanta os ombros magros. “Sempre


que precisar.”

Sorrio para ele. E então, nós apenas olhamos um para o outro


por talvez dez segundos. Eu não sei mais o que dizer e nem ele.

“Então... esta é a sua primeira turnê?” Finalmente pergunto,


erguendo a voz um pouco para que ele possa me ouvir quando os
membros da banda no palco batem seus equipamentos ao redor,
em preparação para a apresentação.

“Não. Esta é minha... décima segunda.”

Décima segunda? Ele parece recém-saído da escola. “Uau.”

“Eu gosto de turnês”, ele explica simplesmente. “Rende um


bom dinheiro, também.”

Ele me prende. Sorrio para ele, assim que a banda no palco


começa a sua passagem de som, tornando falar quase impossível,
a menos que você gritasse. Não, obrigada.

É então que eu me toco. Eu não peguei tampões de ouvido.


Que idiota. Sou uma idiota. Não usar tampões durante um

MARIANA ZAPATA
concerto é um erro de principiante. É pedir por uma perda auditiva
severa noite após noite sem eles; eu nunca esqueci antes.

Fora da minha visão periférica, uma mão acena. Carter


balança um punho fechado na minha direção, uma expressão de
“pegue” em seu rosto bem barbeado. Fico de pé e abro a palma da
mão sob a sua quando ele deixa cair dois tampões de espuma
laranja. Eu faço com a boca um “obrigada” para ele, juntamente
com um sinal de positivo com a mão livre.

Nem mesmo um minuto depois daquelas fofuras entrarem em


meus ouvidos, o guitarrista no palco acidentalmente atinge uma
nota que guincha através dos alto-falantes, fazendo com que todos
na plateia se encolham. O que se segue é alguns dos mais longos
vinte minutos da minha vida. Passo por duas músicas antes de
tirar meu telefone e começar a enviar a Laila, minha melhor amiga,
uma mensagem de texto antes que mais fãs da Ghost Orchid se
aproximem da mesa, e gesticulo para conseguir mais algumas
vendas.

Assim que a banda termina sua apresentação, meus três


idiotas favoritos do planeta continuam. Eli traz peças do seu
conjunto de bateria para o palco enquanto Gordo e Mason pegam
sua guitarra e baixo, juntamente com os seus amplificadores de
potência, prateleiras, pedais e cabos. Gordo ajusta o microfone e a
banda faz uma rápida passagem de som apesar de mais cedo já ter
feito isso.

A Ghost Orchid começa a tocar.

O grupo está junto desde o primeiro ano, irritando todos no


bairro quando praticavam na nossa garagem quase todos os dias
da semana. Eles me enlouqueciam naquela época, especialmente
quando não podia ouvir-me pensar enquanto estava tentando
estudar. Mas eu tinha fielmente fui a cada show e arrastei os meus
amigos comigo. Naquela época teria sido considerado um bom
show se houvesse vinte pessoas na plateia, mesmo que fossem
todos membros da família.

MARIANA ZAPATA
Onze anos depois, lá estão eles. Tocando na frente do que deve
ser facilmente cerca de nove centenas de pessoas aplaudindo e
gritando.

Eu não posso deixar de sorrir através de toda a apresentação


de quarenta minutos.

Quinze minutos depois que eles saem do palco, nada poderia


ter me preparado para o que segue.

Não acredito em amor à primeira vista.

Desejo à primeira vista? Certo. Eu vi Michael Fassbender em


X-Men: First Class. Se liga!

Mas o que acontece quinze minutos depois da Ghost Orchid


sair do palco, depois de eu ter gritado até ficar rouca torcendo por
meu irmão atrás do kit de bateria, Gordo na guitarra, e Mason no
baixo, é inesperado.

Eu me apaixono pela voz no escuro. Não é brincadeira, não é


exagero. É um amor puro, cru.

O palco foi limpo quando cara do som da banda principal


correu pela última vez, verificando as duas guitarras, baixo, um
microfone e um kit de bateria que foi ajustado horas atrás. Quando
as luzes escurecem, a multidão que aumentou até preencher a
capacidade total do local, o que estimo em mais de mil pessoas
nesse momento, enlouquece. Viram animais, e é tão assustador
quanto emocionante. No auditório escuro, uma voz rala começa a
cantar suavemente, fazendo os fãs gritarem ainda mais alto.

Com um flash de elaboradas e coloridas luzes de LED em um


enorme painel de trás da bateria gigante, o palco se ilumina como
fogos de artifício em julho, iluminando dois guitarristas que
aparecem do nada, um baixista e um baterista já no palco.

A letra e a música flutuam pelo ar em um sussurro, as notas


do cantor batem não identificáveis, e isso é excessivo, isto é, em
um sentido emocional.

MARIANA ZAPATA
Enquanto Gordo tem uma boa voz, profunda que é
arredondada e quase rouca, o cantor no palco é completamente o
oposto. Seu tom é um pouco mais alto, ofegante e incrivelmente
forte, perfurando o ar com sua clareza e tom. E o alcance que ele
tem... Santo deus.

Eu só consigo ver um esboço de um homem andando no palco


com uma energia e carisma que cada pessoa na plateia inclusive
eu, não consegue desviar os olhos. Concentro-me em tudo o que
acontece: a explosão de amarelos e vermelhos no painel de LED
por trás de todo o equipamento de música, aquela bela voz
melódica e os instrumentais cativantes que deflagram após o verso
de abertura.

É amor. Simples, fácil, amor descomplicado.

Infelizmente para mim, uma tonelada de fãs decide vir


comprar mercadoria durante a apresentação. Tentando me
apressar e vender o mais rápido possível, mantenho um olho e
uma orelha atentos, na presença dinâmica do cantor. Ele é tão
bom. Bem, toda a banda é. Cativante, uma mistura de pop rock,
indie e progressivo — eles têm um gênero próprio. Durante os
olhares rápidos que posso dar quando não estou ocupada, a figura
alta, musculosa vestido em calças pretas e uma camisa de abotoar
cinza e gravata se move e salta no tempo e com o ritmo
constantemente.

A próxima hora e meia passa em uma mistura de música


incrível e vendas. Observar o velho frasco de picles no canto da
mesa se encher com as gorjetas me mantém disparando sorrisos a
todas as pessoas que compram coisas, mesmo que uma parte de
mim os queira fora das minhas vistas para que possa desfrutar da
banda tocando.

Durante breves intervalos entre suas apresentações, o cantor


fala com a multidão, agradecendo-lhes por sua presença e apoio,
ou introduzindo a próxima música. Em um ponto, um sutiã é
arremessado e bate no seu braço no meio de uma canção. O cantor

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o pega pela alça sem perder uma nota e coloca sobre o pedestal do
microfone, deixando-o ficar lá no resto da apresentação.

É uma bela espécie de insanidade assistir The Cloud Colision


e sua interação com o público. É fácil, então, entre os sorrisos que
partilho com o cara “ao lado” chamado Carter, os gritos e conversas
com tampões que tenho com os fãs da Ghost Orchid, esqueço que
isso vai acontecer pelos próximos meses da minha vida com meus
três melhores amigos do sexo masculino e oito estranhos.

Na loucura que se segue, assim que a banda termina de


cantar o bis, em sua ostentosa voz de tenor, o cantor agradece a
todos por terem vindo. Eu aprecio tudo. A agitação sem parar para
tirar camisas para fora de uma das caixas, me assegurando ao
mesmo tempo de anotar cada venda na folha de registro
corretamente, já velha familiar. Antes que perceba, a segurança no
local está tentando tirar as fãs, enquanto Carter e eu embalamos
as caixas e desmontamos as prateleiras. Normalmente, a banda
estaria tentando carregar o reboque ao mesmo tempo, então não
estou muito certa que alguém virá me ajudar a tirar as caixas. No
passado, um dos idiotas entraria e me ajudaria a carregar tudo.

Carter deve ler minha mente, porque ele acena com a mão,
quando vira sua mesa. “Vou pegar o carrinho”, ele disse.

Bem, isso explica muita coisa. Durante o concerto, vi o


tamanho dos punhos e bíceps de Carter. Sou mais musculosa do
que ele e isso não diz muito; sou uma corredora, não uma
levantadora de peso. Pela quantidade de caixas e caixotes que ele
escondeu ao seu lado, de maneira nenhuma ele será capaz de
transportar essas coisas todo o caminho até o ônibus. Termino de
desmontar o display da Ghost Orchid exatamente quando Carter
volta. Nós ajudamos um ao outro a levar nossas caixas pesadas da
mesa para o carrinho antes que ele o pegue e empurre enquanto
eu empurro as mesas para os lados e dobro as suas pernas para
dentro.

MARIANA ZAPATA
“Flabby!” Eli grita do outro lado do auditório vazio, pulando
em torno dos funcionários ocupados limpando o chão. “Você
precisa de ajuda?”

Reviro os olhos e balanço a cabeça. “Você está uns trinta


minutos atrasado. Carter e eu acabamos agora.”

O imbecil tem a coragem de estalar os dedos como se estivesse


desapontado de ficar de fora. “Eu vou te ajudar a transportar as
mesas para que possamos ir.”

Quando saímos, digo a ele quão bom foi o show e ainda


menciono o quão bem tocou. Após mais de dez anos de aulas de
bateria e uma rotina intensa de treinos, ele realmente é bom. Eli
de alguma forma conseguiu evitar fazer qualquer trabalho escolar
de verdade no ensino fundamental e médio usando suas
habilidades de percussão como uma desculpa com os nossos pais.
Copiar o meu dever de casa quando eu estava dormindo ou copiar
de qualquer garota burra o suficiente para compartilhar com ele,
também ajudou. Felizmente para ele, valeu à pena. Minhas aulas
de dança quando era criança só me proporcionaram a
oportunidade de não bancar uma completa idiota no baile.

Assim que saímos, Eli nos orienta em direção a um enorme


reboque atrelado a parte de trás do ônibus. Meus ombros começam
a queimar de levar as duas mesas em uma posição desconfortável.
Quatro outros homens estão dentro do trailer enorme, tentando
organizar as caixas dos protetores de viagem do equipamento
musical de uma forma ordenada. Reconheço dois deles da
performance do The Cloud Colision e o terceiro homem é o cara do
som, que veio verificar seus equipamentos antes deles tocarem. A
presença de Gordo vem completar os quatro homens embalando
no reboque.

“Nós vamos parar em um centro de viagens no caminho, então


se quiser tomar banho, pegue suas merda da sua mala”, Eli diz.
Ele se inclina para mim antes de dar uma rápida fungada e se

MARIANA ZAPATA
afastar com uma careta. “Tome a porra de um banho. Estou
implorando.”

“Cale a boca”, rio, dando um passo para longe dele.

Não vou mentir. Dei uma cheirada nas minhas axilas quando
estava desmontando as mesas e não foi agradável. De jeito
nenhum. Tive um sentimento que acabaria comprando algum
desodorante masculino logo ou roubaria de Eli. O que for mais
fácil.

Caminhando em direção à frente do ônibus, vejo alguém se


inclinar, olhando através do compartimento onde as malas estão
escondidas. Com a parte superior do corpo nua, a sombra do
cabelo escuro e uma tatuagem de manga completa chamam a
minha atenção enquanto paro atrás dele. “Mason.”

Ele para de se mover por um segundo antes de continuar a


empurrar as coisas na sua busca incessante pela sua bagagem.

“Mason.”

Nada.

“Mason, seu imbecil”, eu digo novamente.

Quando ele ri do lado de dentro, ao mesmo tempo em que dou


um passo para frente, faço uma careta. Eu juro pela minha vida
que acontece em câmera lenta. Meu pé sobe por conta própria, de
olho no alvo — a sua bunda — ao mesmo tempo vejo alguém sair
do ônibus. É outro peito nu com uma tatuagem de manga completa
e uma cabeça de cabelos escuros. E quando a ponta do meu pé se
conecta ao traseiro coberto por calças pretas, percebo que não é
meu suposto futuro marido, Mason, que chutei na bunda.

Mase é o que sai do ônibus.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 3

Mason — o bastardo, cretino, imbecil, idiota — que ele é, se


dobra de tanto rir quando vê meu rosto ficar vermelho brilhante,
ao mesmo tempo em que grito: “Eu sinto muito!”

Não!

Não!

Quando meu Mason — o clone impostor se vira, com os olhos


arregalados e boca aberta, quero cair no chão e morrer. Ou culpar
Eli. Mas não posso... por que ele não está perto de mim.

“Você acabou de chutá-lo na bunda?” Mason dá uma


gargalhada, segurando a barriga com as palmas das mãos.

Estou mortificada, além de mortificada, até agora no reino de


mortificação eu não posso ver a fila de início; por isso não é muito
estranho quando o meu rosto fica tão quente que rivalizava com a
temperatura máxima de aquecimento que minha chapinha atinge.
Sou uma daquelas pessoas que agem como uma completa idiota
quando fica nervosa. De acordo com Eli e Laila, ajo como uma
completa idiota o tempo todo, mas quando estou nervosa, as
proporções são épicas.

“Foi um acidente!” Digo ao cara na minha frente. Eu não


posso olhar para ele diretamente, nem mesmo perto. De alguma
forma, em algum momento, juntei meus dedos e cobri minha testa
com as palmas das mãos, mesmo sem perceber. Meus olhos se
arregalam quando arrasto as mãos para baixo até que estou
segurando meu rosto. “Eu pensei que você fosse Mason”, sai da
minha boca.

MARIANA ZAPATA
O verdadeiro Mason apenas ri mais forte de seu lugar a três
metros de distância.

Do nada, o cara na minha frente, cuja bunda acabou de se


tornar amigável com o meu pé, ri. É um som doce, claro.

E isso me faz lembrar o cara que acabou de cantar.

Não. Por favor, não. Não deixe que seja ele.

“Está tudo bem”, a voz calorosa fala.

Resmungando, para mim mesma mais do que tudo, um


sorriso estranho cobre meu rosto quando finalmente começo a
voltar meu olhar, porque o que diabos mais poderia fazer? “Estou
realmente...”

Tatuagens.

Tudo o que capturo primeiro é o redemoinho grosso pintado


em seu peitoral, seguido pelas faixas pretas listradas tatuadas no
comprimento do braço. Em seguida, há as tatuagens em metade
do seu pescoço, localizadas no mesmo lado que a sua tatuagem de
manga completa. Olá. Sim, após o primeiro olhar rápido percebo
que seu impostor só tem uma tatuagem completa de manga contra
duas. É isso aí, idiota. O meu amigo não tem tatuagens no peito,
mas não é como se eu tivesse visto a parte da frente antes, de
qualquer maneira.

Meus olhos se desviam de volta para os músculos duros, lisos


que lotam o peito e o abdômen bem definido, e em seguida, os
quadris estreitos que fluem perfeitamente na calça preta slim que
desfilou no palco menos de uma hora antes.

Foda. É ele. O cantor da banda.

Porqueeeee.

“Sinto muito”, expiro, forçando-me a arrastar os olhos para


longe dele. Se eu continuar olhando para seu peito nu por mais

MARIANA ZAPATA
tempo, ganharei oficialmente minha medalha de Vagabunda do
Ano.

O cara está sorrindo para mim, dobrando aqueles longos


braços musculosos sobre o peito. É então que me pergunto se
morri. Ele é... Eu não acho que exista uma palavra adequada para
descrever o rosto em cima do corpo que estive cobiçando um
pouco. Mason é um espécime digno de toda a atenção que recebe,
mas esse cara é.… apenas... UAU. Assim: com uma boa aparência
de uma maneira completamente diferente, principalmente porque
ele não é meu amigo de longa data, por cuja aparência me tornei
quase insensível.

Porém, o mais importante: acabei de chutar um cara gostoso,


um estranho, um homem com quem vou passar os próximos três
meses, bem no seu traseiro.

Mais uma vez eu me pergunto o porquê. Por quê. Por que eu


não continuei com meu pé parado? Tudo que quero agora é invocar
uma tartaruga e me esconder em minha concha.

Por mais que ele pareça Mason do pescoço para baixo, seus
rostos são muito diferentes. Enquanto Mase parece um modelo de
uma linha de perfumes, com suas feições quase andróginas que o
fez ser chamado de menino bonito centenas de vezes no passado,
esse outro cara não é tão clássico. Sua estrutura óssea é um pouco
mais dura e o conjunto dos olhos mais profundo. Ambos têm
cabelos pretos, mas são cortados de forma diferente. O deste
homem é raspado dos lados, a parte superior com apenas alguns
centímetros de comprimento, enquanto o cabelo do meu amigo de
infância tem um bom tamanho em cima. Mas ainda assim, a ligeira
semelhança está lá.

“E! Flabby chutou Sacha na bunda!” Mason grita,


basicamente, cacarejando enquanto se inclina de tanto que está
rindo.

Sinto a mão pesada de Eliza no meu ombro antes de ouvir seu


ronco. “Porra Flabby”, meu irmão ri, deslizando um braço pesado

MARIANA ZAPATA
e suado sobre mim. “Isso significa que não tenho que apresentá-la
afinal de contas?”

O homem que posso assumir seguramente ser Sacha — um


cara, apenas para constar, não a menina que o idiota que dividiu
um útero comigo me levou a acreditar que ele era — balança a
cabeça antes de estender a mão em minha direção. “Sacha”, diz
ele depois de eu deixar minhas mãos caírem da testa e pegar a
minha mão estendida na sua. “É bom conhecê-la, Flabby.”

O cotovelo que levanto para golpear Eli na costela é um


segundo pensamento. “É Gaby, na verdade”, tento corrigir Sacha
também conhecido como Olá-como-você-é-sexy, agitando a mão
quente um pouco mais do que eu precisava. “Também é um prazer
te conhecer.”

Eli bufa novamente. “Não dê ouvidos a ela, o nome dela é


Flabby, cara.”

Sacha sorri de novo, um puxão de lábios sensuais e dentes


brancos e retos — antes que deixe sua mão cair, olhando para Eli
e eu. “Você dois são...?” Ele desenha uma fila reta, horizontal no
ar entre nós.

“Eca...” Eli e eu gememos, ao mesmo tempo, balançando a


cabeça rapidamente. Isso não nos separa, no entanto.

“Eu só vou vomitar”, Eli engasga. “Esta é a minha irmãzinha.


O aceno lento que Sacha nos dá em troca, faz parecer que ele
não está totalmente certo se Eli está mentindo ou não. Cara
esperto. Você nunca pode confiar em Eli Anthony Barreto. Nunca.

“Nós somos gêmeos”, explico. “Estou substituindo Zeke pelo


resto da turnê.” Quando Sacha levanta uma sobrancelha — uma
muito escura em sua pele suave, quase pálida — eu lembro que
esta noite seria apenas a quarta na turnê das bandas juntas. Ele

MARIANA ZAPATA
pode não saber quem exatamente é Zeke. “Ele era antigo cara do
balcão de vendas.”

Pela forma como ele balança a cabeça e estala os dedos, é


óbvio que não sabia o nome de Zeke. “Certo.”

Alguém grita de dentro do ônibus, dizendo para nos


apressarmos. Eli aperta meu ombro. “Pegue suas coisas, fedida, e
eu vou te apresentar ao pessoal que está do lado de dentro.”

Minhas coisas. A bunda do estranho. Ugh. Meu rosto fica todo


quente novamente, e eu me vejo sorrindo nervosamente.

Balanço a cabeça e vejo meu irmão e Mason recuarem para


dentro do ônibus, deixando-me com o homem cuja bunda chutei.
Ele sorri e faz um gesto em direção ao compartimento aberto. “Eu
vou pegar sua mala se prometer que não vai me chutar
novamente.”

Levantando minhas mãos em sinal de rendição, balanço a


cabeça. “Nada de chutar a sua bunda novamente, eu juro.” Eu não
posso deixar de engasgar um pouco antes de acrescentar: “E não
vou chamá-lo de idiota de novo também.” O que há de errado
comigo? O que fiz já é ruim o suficiente, e, em seguida, chamá-lo
— bem, a Mason — de idiota foi a cereja no topo de um sundae de
merda.

Ele inclina a cabeça para trás e ri aquele som desinibido e


maravilhoso. “Fechado.” Um momento depois, ele está me
perguntando que mala é a minha antes de puxá-la para fora. Eu
começo arrancando a roupa limpa, uma camisa e calça de
moletom, enquanto ele finalmente consegue recuperar a mala
preta grande que esteve vasculhando quando o incidente “ser
chutado na bunda” aconteceu.

Pavor ataca meu estômago quando me lembro do que fiz.


Humilhada, fecho minha mala e a empurro de volta para dentro
do compartimento. “Seu show foi incrível”, digo, mantendo os

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olhos no reboque atrelado no ônibus. “Eu não tinha certeza do que
esperar, mas foi ótimo.”

“Obrigado”, ele murmura baixinho. É impossível não


absorver o tom de sua voz quando me agradece. Não há um indício
de superioridade ou vaidade nele. Ele parece bastante genuíno.
“Primeira vez?” Pergunta.

“Sim.” Eu me encontro cutucando o chão, sentindo-se


desconfortável. “Eu nunca ouvi falar de vocês antes de hoje à
noite.” Por um segundo, penso em contar a ele que achei sua voz
muito bonita, mas não quero soar como uma bajuladora.

“Estou feliz que gostou.” Sacha fecha o zíper de sua mala,


segurando uma trouxa de roupas no peito. Ele se vira para olhar
para mim, um sorriso amável em seu rosto sombreado pelo
restolho de cinco horas. “Você conseguiu o que precisava?”
Balanço a cabeça e o sigo em silêncio antes dele acenar com a
toalha na mão para que eu entre primeiro no ônibus. Ele pisca.
“Não quero que você esqueça o nosso acordo tão cedo.”

Ugh. Eu nunca esquecerei isso.

“Eu realmente, realmente sinto muito”, insisto ainda me


sentindo horrível quando subo os degraus do ônibus. Meu rosto
está ficando vermelho de novo.

Por que diabos fiz isso? Meu subconsciente responde: porque


você realmente acreditou que ele era Mason, e se fosse, ninguém
teria pensado duas vezes.

“Senhoras e senhores!” Meu gêmeo grita no momento em que


piso um pé além da cortina e dentro do espaço comum.

Paro como uma idiota, ou melhor, como um cervo ofuscado


por faróis. Eli bate palmas altas até que o baixo zumbido de
conversa para. Eu não posso deixar de notar que realmente não
há qualquer outra mulher no ônibus, além de mim — a menos que
você conte Mason e Gordo — e eu conheço o meu irmão gêmeo bem

MARIANA ZAPATA
o suficiente para aceitar que ele não iria se referir a mim como uma
mulher. “Todo mundo, agora que o idiota que expulsamos do
ônibus hoje cedo se foi, quero apresentar a vocês a nossa mais
recente adição.”

Ele estende a sua mão para pegar a minha, levantando ambos


os braços como se eu tivesse vencido uma luta de boxe. “Esta é
minha irmãzinha, Gaby. Ela vai ficar com a gente nos próximos
meses.” Ele aperta minha mão, ainda no ar. “Flabby, diga oi”, ele
me instrui como se eu fosse uma criança. Porra Eli.

Eu sorrio nervosamente para os cinco novos rostos me


olhando atentamente, e deixo meu irmão acenar minha mão para
mim. “Oi pessoal.”

Um murmúrio de vários “Olá!” São ditos enquanto puxo a mão


da mão de Eli. Naquele mesmo instante uma mão pousa na parte
inferior das minhas costas. Mal virando a cabeça sobre o meu
ombro, vejo que é a única pessoa que poderia ser — Sacha. De
perto e sob a iluminação decente do ônibus, sua pele parece clara
e um pouco brilhante de como suado ele ficou durante o concerto.
Ele realmente é bonito, e um pouco mais alto do que Mase também.

“Não se curvem na frente dela. Ela gosta de chutar as pessoas


na bunda”, ele ri, dando-me um sorriso malicioso antes de nos
contornar para caminhar até a parte de trás do ônibus.

Gemo para mim mesma enquanto Eli e Mason riem como se


fosse a coisa mais engraçada que já ouviram. Minutos mais tarde,
encontro-me esmagada entre Mase e Gordo enquanto o motorista
conduz o ônibus e reboque para onde fui informada que poderei
tomar o banho naquela noite. Os sofás em ambos os lados do
ônibus são longos, mas parece que todos estão amontoados na
área frontal mais próxima da porta, incluindo a cozinha estreita e
banheiro. Depois do mini tour que Eliza me deu horas antes, eu
sabia que após a porta do banheiro ficam os doze beliches em que
dormiríamos, e no final mais distante do ônibus estava uma
pequena sala com um sofá em forma de U ao longo as paredes.

MARIANA ZAPATA
Mason me apresentou a dois dos caras do The Cloud
Collision, um cara grande e musculoso chamado Julian e um
desengonçado chamado Isaiah, que reconheci como sendo os
guitarristas da banda. Eu peguei Sacha de pé na cozinha ainda
seminu, bebendo algo fumegante de uma caneca de cerâmica.
Ainda incrivelmente sexy, se não mais sexy do que antes. A
iluminação amarelada do ônibus fez maravilhas para o contorno
magro de seu peito e aos seus quadris estreitos com seus músculos
oblíquos aparecendo, os quais, em seguida, causaram maravilhas
para minha calcinha, quero dizer, meus hormônios.

“Você deveria usar camisas assim mais vezes. “

Deslizo meu olhar sobre Mason, cujo lado inteiro está


pressionado contra o meu. Eu não fico tão surpresa ao ver seus
olhos na minha “camisa”, e por minha camisa, realmente quero
dizer os meus seios. A parte superior da blusa desceu o suficiente
para que a borda do meu sutiã lavanda seja visível. Em vez de
responder, faço uma careta e puxo a blusa para cima o suficiente,
pelo menos, para que as meninas não estejam tão penduradas
para fora... já que um centímetro de peito aparentemente é muito
para começar.

Quando vejo o olhar de Mason novamente, ele está sorrindo,


parecendo inteiramente satisfeito consigo mesmo. “Ainda posso vê-
los.”

“De jeito nenhum.” Reviro os olhos, tentando não ficar muito


embaraçada. Não é como se não tivesse tido a mesma reação dele
cada vez que nos vimos nos últimos três anos. Bem, é a mesma
reação de quase todos os caras que não são meus irmãos ou pai.
Eu passei dez anos da minha vida tentando manter as atenções
das pessoas para longe do meu peito e agora, depois de tudo, ainda
não quero as pessoas olhando lá por mais de um olhar rápido.

Gordo me cutuca de seu lugar no meu outro lado. Com o


cabelo tão escuro que é quase azul, uma barba que é tão grossa e
rija que poderia passar como pelos pubianos e seu tom de pele

MARIANA ZAPATA
naturalmente escuro menos bronzeado do que o normal, seu rosto
é uma das coisas mais familiares na minha vida. “Será que
estaremos juntos na mesma equipe?”

“Mesma equipe...?” E então me lembro de que equipe ele está


falando. “Claro que não. “ Não, não, não, não.”

“Oh, vamos lá, Flabs”, Gordo insiste, seus olhos escuros e as


pupilas quase se estreitando.

Mason, que ainda está inclinado para frente, descansa seu


antebraço no meu joelho. “Você já está tentando escolher equipes,
imbecil?”

“Eu não vou jogar, então ele não pode tentar escolher as
equipes.” Faço questão de olhar ambos no olho para que saibam
que não estou brincando. Não vou jogar nunca mais.

“Você tem que jogar”, o homem cujo nome verdadeiro é Luis


Alberto reivindica. “É nossa tradição.”

O que isso realmente é, é uma tradição anual de humilhação


e dor física. Balanço a cabeça para Gordo. “Isso não vai rolar,
Gordis.”

“Você está brincando”, Mason reitera, olhando meus seios


novamente em um gesto que é intencionalmente para me irritar
muito. Realmente, não acho que ele goste muito dos meus seios,
não é como se eu tivesse um bojo tamanho D, muito menos o
tamanho Duplo-D, sobre os quais ele geralmente saliva, mas me
irritar está definitivamente no topo da lista de coisas que ele gosta.
“Preciso dessas belezinhas em minha equipe.”

Sorrio docemente para ele.

Houve um tempo, imediatamente após a minha cirurgia, que


eu tinha realmente tentado levá-lo a parar de fazer comentários
sobre os meus peitos. Por cerca de seis meses seguidos eles
revezavam entre me chamar de Peitola e Mamas. De uma maneira
típica de Mason, me queixar só o fez fazer isso mais vezes. Então

MARIANA ZAPATA
parei de dizer qualquer coisa, porque sabia que ele realmente só
fazia isso para tentar conseguir uma reação minha. Então só
comecei a lidar com tudo de forma diferente.

Chego debaixo do seu braço a torço o seu mamilo, uma coisa


fácil de fazer, porque ele está sem camisa. “Não vou jogar e se fosse,
definitivamente não jogaria na sua equipe, imbecil”, digo, girando
o mamilo rosado drasticamente à medida que ele se afasta com
uma careta e um desagradável “Nããão!”

As palavras mal deixam minha boca quando o ônibus para


em um posto de serviços iluminado, que tem um posto de gasolina,
restaurante vinte e quatro horas e instalações sanitárias. Eli me
joga uma toalha antes que todos, exceto Mason que tem os braços
cruzados sobre o peito nu como se isso fosse protegê-lo de mim,
nos empurramos para sair do ônibus com os nossos pertences e
nos dirigimos para dentro. É então que percebo que me esqueci de
trazer xampu e sabonete comigo de casa. Gemo e espio dentro,
percebendo que se for para o chuveiro depois que pagar, não
poderei voltar de graça.

Espero do lado de fora do banheiro dos homens por alguns


minutos, esperando que Eliza ou Gordo se apressem e saiam para
que eu possa pedir emprestado seu sabonete e xampu. Menos de
dez minutos depois, o bater de chinelos no chão fica mais e mais
alto.

Mas não é nem Eli nem Gordo quem está saindo.

É Mason 2.0 de shorts de basquete, camiseta e chinelos,


caminhando para fora com uma mochila sobre seu ombro e
sapatos pretos pendurados nos dedos. Ele sorri genuinamente no
instante em que me vê de pé lá parecendo uma mendiga pedindo
uma esmola.

“Tudo bem?” Ele pergunta, me fazendo sentir como uma


bagunça total.

MARIANA ZAPATA
Balanço a cabeça, meu rosto imediatamente ruborizado com
a lembrança que chutei esse pobre rapaz na bunda poucos
minutos atrás. Limpo a garganta quando meus ouvidos começam
a ficar quentes também. “Sim, estou apenas esperando por Eli.”

Sacha levanta uma sobrancelha escura, dando-me a


oportunidade de ver o cinza esfumaçado, quase transparente de
seus olhos. Ele olha para as roupas em minhas mãos antes de
franzir os lábios. “Você se esqueceu do sabonete?”

Estou um pouco hesitante em admitir isso, mas faço, lutando


contra o desejo de esfregar meus ouvidos. “Sim.”

Ele sorri.

“Eu quero pedir emprestado o dele”, explico.

Sacha não hesita um segundo. “Aqui”, ele diz, logo que


termino de falar. Empurrando uma garrafa de um xampu 3-em-1,
condicionador e sabonete líquido para mim, ele dá de ombros. “Não
é feminino...”

Este homem está muito enganado se acha que me importo em


usar seus artigos de higiene. Eu até mesmo estaria disposta a
compartilhar com Mason — o imbecil nojento do ano — se eu não
soubesse que ele pede emprestado de outra pessoa nas raras
ocasiões em que decide tomar banho. Pego o frasco dele e sorrio, o
embaraço que estava nadando pela minha espinha mais cedo, pelo
que eu fiz, desaparece com a sua bondade. “Eu tenho bolas
invisíveis, está tudo certo”, digo a ele como teria dito a Eli... e
imediatamente me arrependo. Não é como se pensasse que
estamos flertando ou qualquer coisa, e o fato de que
definitivamente não estou na minha melhor aparência não me
escapa, mas isso não significa que quero que ele pense em mim
como... bem, eu não sei como o que. Desinteressante, acho? Viril?
Não ajuda que ainda estou mortificada com o incidente anterior.

Sacha Ri aquele riso bonito, brilhante que me faz sorrir apesar


de tudo. “Tudo bem, bolas invisíveis. Use isso.”

MARIANA ZAPATA
“Obrigada. Fico te devendo”, digo um pouco mais
timidamente do que normalmente teria dito. Andando de costas
em direção à entrada do banheiro em seu domínio, dou-lhe outro
aceno estranho e imediatamente me arrependo. Meu Deus, estou
enrolada e preciso parar enquanto estou na frente.

Ele simplesmente assente para mim antes que corro para a


área onde os chuveiros estão. Vou o mais rápido que posso não me
importando nem um pouco se vou cheirar como um cara limpo.
Assim que termino de me secar e me vestir, saio me sentindo muito
melhor do que antes. Felizmente, meu irmão está esperando por
mim em frente aos banheiros.

“Eu ia lhe dar mais cinco minutos antes de ir lá”, alerta.


“Pensei que alguém tivesse sequestrado você.” Aqueles olhos
verdes tão parecidos com os meus, olham para os meus pés,
fazendo uma careta para mim. “Onde estão seus chinelos, e por
que está segurando shampoo de homem?” Um sorriso cobre a sua
boca um segundo depois. “Você finalmente decidiu ir em frente
com a cirurgia, hein?”

Eu bufo e acerto direto no seu estômago enquanto passo por


ele. “Aquele cara, Sacha, me emprestou seu shampoo porque eu
não trouxe um e você estava demorando uma eternidade lá
dentro.” Levanto meu polegar em direção ao banheiro quando Eli
esfrega onde o soquei. “E eu não trouxe chinelos. Por quê?”

Ele faz uma careta, olhando para os meus pés novamente.


“Você pisou naquele piso descalça?” Quando balanço a cabeça em
resposta, ele estremece. Olho para seus pés para ver que ele está
usando um par de chinelos de borracha. “É melhor você rezar esta
noite. “

Quando Eli lhe dá uma razão para rezar, é melhor rezar. Eu


só não sei pelo o que devo orar. Lembro-me que quando viajávamos
na Old Pepe, sempre tomávamos banho em quartos de hotel. Este
banho em um centro de serviços foi uma experiência nova para
mim.

MARIANA ZAPATA
Nós caminhamos para o ônibus, onde entrego de volta a
Sacha o seu shampoo com um “obrigada” enquanto meu irmão nos
faz três pacotes de macarrão ramen para compartilhar, estilo retro
com pedaços de frango grelhado jogados dentro. Ele promete me
levar para comprar mantimentos, sandálias baratas e xampu no
dia seguinte. Assim que termino de comer, passo por outro
membro da The Cloud Collision, que tem alguma ascendência do
Oriente Médio. Ele está ao telefone, então levanto a mão em um
aceno e ele faz o mesmo de volta antes de eu seguir Eli para a área
de beliches.

“O meu é aquele”, meu irmão diz, apontando para um beliche


superior com a sua cortina toda puxada. São doze beliches ao todo
com cortinas carmesim, três empilhados em cima um do outro,
seis de um lado do corredor, seis no outro. Ele então aponta para
o de baixo, embaixo de onde Gordo está dormindo no topo. “Zeke
dormia nesse. É seu agora. Agora a pouco coloquei meus lençóis
sobressalentes lá para você.”

Pensei imediatamente em Zeke babando em cima da cama, ou


pior. Que nojo.

“Obrigada.”

É então que a cortina no beliche acima do meu se abre, e bato


com o punho na minha cabeça, porque as pessoas sãs não fazem
isso na vida real. Sacha me olha de seu lugar na cama acima da
que estarei tomando. “Olá, vizinha.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 4

As próximas duas semanas se passam antes que eu possa me


perguntar no que diabos eu me meti.

Num dia estamos em Boston e a próxima coisa que sei, é que


passamos pela Flórida, Alabama, Indiana, Ohio, Michigan, Illinois
e Missouri. O itinerário não tem absolutamente nenhum sentido,
mas nunca tem. Empresários geralmente não se importam com
quanto tempo os motoristas tem entre as datas agendadas
contanto que consigam a maior garantia possível de bandas.

Um punhado de fãs me perguntou até agora, “Quão


impressionante é estar em turnê com eles?”

Com eles. Eles. Eli, Mason, Gordo, Sacha, Isaiah, Julian,


Miles, Mateo, Carter, Freddy e Bryce. Ghost Orchid, os membros
da The Cloud Collision, o cara do stand de vendas deles, o
engenheiro de som/gerente da turnê e o cara da iluminação.

Tomo banho em postos de gasolina. Peguei algum tipo de


fungo na parte inferior dos meus pés daquele chuveiro maldito que
usei descalça. Comi mais pizza ao longo dessas duas semanas do
que em toda a minha vida.

Acima de tudo isso, o verão é uma cadela vingativa, rude, que


não se preocupa com o seu conforto.

Suo o tempo todo. Estou fedida no final de todas as noites.


Passo horas incontáveis rolando dentro de um ônibus de cidade
em cidade, e entre locais nove horas por dia, no mínimo. Vivo em
um ônibus com dez homens que são como todos os outros caras
de vinte e poucos anos de idade do mundo. Eles peidam, arrotam,
alguns deles tem mau cheiro nos pés, alguns deles não escovam

MARIANA ZAPATA
os dentes o suficiente, ou a única coisa que realmente me deixa
louca: alguns não cobrem sua comida no micro-ondas.

Esta vida não é glamorosa. De. Jeito. Nenhum.

Por outro lado, para ser justa, nenhum grupo de pessoas me


faz rir como eles. Passou um longo tempo desde que meu estômago
teve cãibras de tanto que eu ri deles ou com eles.

Eli e eu estamos agindo mais como gêmeos siameses do que


gêmeos fraternos, como se estivéssemos tentando compensar o
tempo que passamos separados ao longo dos últimos anos. Eu
conheci um monte de gêmeos na minha vida; alguns próximos e
outros não suportam ficar perto uns dos outros. Nós não éramos
assim, no entanto.

Antes do ensino médio, fomos inseparáveis. Duas ervilhas em


uma vagem. Um era a fortaleza do outro. Minha mãe gostava de
dizer às pessoas que quando éramos crianças, às vezes ela entraria
em uma sala e nos encontraria em lados opostos, totalmente
silenciosos, como se estivéssemos tendo algum tipo de conversa
telepática. O que ela não dizia a todos era que, se estivesse lá o
tempo suficiente, nós começaríamos aleatoriamente a rir sem
nenhum motivo aparente, já que isso, por sua vez, a assustava
muito. Sim, eu não a culpo.

Mesmo durante o ensino médio, nunca houve qualquer


dúvida de que ainda éramos mais do que melhores amigos. Nós
não gastávamos tanto tempo juntos a essa altura, mas isso não
importava. No ensino médio, acordei muitas vezes com Eli na
minha cama, com os pés muito perto de meu rosto enquanto
dormia em cima do edredom com o seu próprio cobertor sobre ele.
Podemos não ter vindo do mesmo óvulo, mas ninguém me
conhecia, me entendia ou me deixava tão confortável como meu
irmão.

Eu acho que não percebi o quanto senti falta de tê-lo por perto
ao longo dos anos quando seguimos nossos próprios caminhos.

MARIANA ZAPATA
Quando estávamos no ônibus, eu estava constantemente com
Mason, Gordo ou Carter. Quando estávamos fora dele, Eliza ia a
todos os lugares comigo. Eu falei com os caras da The Cloud
Collision algumas vezes, mas não tinha sido nada além de uma
amigável passagem. Todos estavam sempre em seus telefones ou
seus computadores, então não levei isso pessoalmente. Tínhamos
três meses pela frente para conhecer uns aos outros; o que não era
nada demais.

Eu estava curtindo o meu tempo, e isso era tudo o que


realmente importava.

E além do par de vezes que tocaram uma das músicas de


Brandon entre as apresentações, eu não pensei em matar aquele
pedaço de merda nem uma vez.

“Você não vai comer alguma coisa em breve? “

Termino de colocar o último prato na posição e o aperto para


baixo, olhando para meu irmão por cima do seu kit de bateria. Ele
está fechando os estojos de viagem uma vez que terminamos de
instalar seu material. Nós geralmente etiquetamos seu kit de
bateria, identificando o que encaixa aonde, para economizar
tempo; fiz isso tantas vezes que posso fazê-lo com os olhos
fechados. Na maioria das vezes ele me ajuda a trazer a maior parte
do material promocional para o local, logo após chegarmos a onde
quer que o pacote de excursão esteja agendado, e então vou ajudar
os caras a montar o equipamento para fazer a passagem de som,
já que não se tem nada melhor para fazer. Há geralmente muito
tempo antes das portas se abrirem e prefiro me manter ocupada a
ficar sentada observando.

Mas hoje chegamos a Little Rock com quase três horas de


atraso, graças a um grave acidente. Agora, tudo e todos estão
correndo atrás do cronograma, incluindo a passagem de som.

MARIANA ZAPATA
Puxo o telefone do meu bolso e dou uma olhada no relógio
com um estremecimento. As portas serão abertas em duas horas.
“Droga, não sabia que já era tão tarde. “

Eli vira para me olhar por cima do ombro, de onde está


ajoelhado. Ele ergue as sobrancelhas. “Quero dizer, você pode ficar
sem uma refeição ou duas...”

Ele deveria pensado melhor antes de falar merda quando está


de joelhos. Eu o empurro.

“Prostituta!” Ele grita quando tomba para baixo como uma


árvore cortada.

“Sua mãe”, murmuro enquanto continuo caminhando direto


passando por ele para me sentar na beira do palco antes de pular
para baixo. Quando estou de volta nos meus pés, Eli está
novamente de joelhos, olhando na minha direção. “Eu vou pegar
algo para comer.”

Ele ainda está me dando um olhar bravo quando diz: “Eu não
posso ir com você. Temos que fazer a passagem de som.”

Dou de ombros; não é como se já não soubesse disso. “OK.


Eu voltarei.”

Ele pisca. E então simplesmente ergue um punho com o dedo


médio totalmente estendido.

Coloco minha língua para fora e vou procurar a única pessoa


que pode ser capaz de sair para comer comigo.

O local não nos forneceu alimentos e em vez disso optaram


por dar aos membros da turnê dinheiro para que cada um se
virasse. O gerente de turnê da TCC, que também está fazendo som
para eles e a Ghost Orchid, passou por aqui alguns minutos antes
e entregou o dinheiro de todos. Pela primeira vez na vida, Eli tem
razão. Se eu esperar mais para ir buscar comida, não estarei de
volta a tempo para o início do show. De acordo com Mason, tenho

MARIANA ZAPATA
uma coisa chamada trabalho. Como se eu não soubesse o que
diabos é isso.

Num instante, encontro o meu novo amigo Carter, o cara do


stand de vendas da TCC, sentado fora do trailer cercado por uma
enorme pilha de caixas. Apertando uma prancheta, ele me dá um
sorriso tenso, coçando o joelho de uma das pernas da calça jeans
skinny que colocou naquele dia.

“Ainda ocupado?” Perguntei, olhando para as caixas de


papelão que estavam esperando do lado de fora quando o ônibus
estacionou uma hora atrás.

Carter deixa escapar este longo suspiro diretamente de sua


barriga. Seu rosto normalmente passivo está claramente
exasperado. Mesmo seu rabo de cavalo está mole. Nós nos
conhecemos um pouco no tempo livre que compartilhamos nos
stands de venda. Ele não é muito falador a menos que você o
cutucasse, mas ele é trabalhador e gentil. Principalmente, porém,
enquanto as pessoas com quem eu costumava passar tempo são
mais barulhentas do que macacos bugios, eu realmente gosto da
sua companhia. “Fiz apenas a metade do inventário, e preciso
terminar antes do show.” Ele me lança um olhar vazio que deixa
seu lábio perfurado bem apertado. “Sozinho.”

Faço uma careta, sabendo muito bem quão frustrado ele está
com os caras da The Cloud Colision. Todos eles basicamente o
deixam sozinho para fazer tudo. De acordo com Carter, é muito
normal para bandas do seu nível se sentir no direito de fazer isso,
mas eu ainda aponto para ele e digo: “ha” quando ele me diz isso
pela primeira vez. São ocasiões como aquelas que me fazem
apreciar usar a carta de irmã em Eli.

“Eu estava indo comprar comida, mas posso ajudá-lo, se


quiser”, eu quase digo a ele como se quisesse que ele fosse comigo,
mas qual é o ponto em esfregar a situação na sua cara? O pobre
rapaz está preso trabalhando em um trailer com a circulação de ar
próxima de zero, contando camisetas. Isso é um saco.

MARIANA ZAPATA
Os cantos de sua boca se inclinam apenas o suficiente no que
pode ser considerado um sorriso triste e resignado. “Não se
preocupe com isso. Eu vou dar conta; vá buscar algo para comer”,
ele diz.

Eu não acho que ele está tentando fazer psicologia reversa em


mim, mas eu passo muito tempo com pessoas que já fizeram isso.
“Você tem certeza?”

Ele assente.

“Você está realmente, realmente certo disso?”

O sorriso de Carter se abre um pouco mais. “Positivo.”

Eu me sinto mal, mas... “Quer que eu lhe traga alguma


coisa?” Ofereço.

Seus olhos castanhos se iluminam e ele finalmente sorri, de


repente esquecendo quão irritado ele estava um minuto antes. “Por
favor.” Ele começa a pesca através do seu bolso de trás pela
carteira. Entregando-me uma nota de vinte dólares, então para e
faz uma cara pensativa. “Quem vai com você?”

Mesmo que tenhamos nos conhecido há apenas duas


semanas, aparentemente ele se preocupa comigo. Eu gosto.
“Ninguém. Meu irmão está ocupado, e não posso esperar mais
tempo se quiser estar de volta aqui antes das portas abrirem. Eu
só vou caminhar até algum lugar por perto, não é grande coisa.”

“Gaby.” O rosto longo de Carter já está me dizendo que ele


acha que minha ideia é terrível. Ele tem apenas vinte e um anos,
mas é um cara muito maduro, parece mais velho.

“Sim?”

Ele balança sua cabeça. “Este não é o melhor lado da cidade.


Encontre alguém para ir com você”, ele insiste.

“Não tem ninguém.” Não há. Os caras estão mais do que


provavelmente começando a passagem de som.

MARIANA ZAPATA
Carter coça o queixo, ele não se barbeia há alguns dias e,
embora não seja capaz de crescer uma barba — suas palavras, não
minhas — ele tem aí algum restolho acontecendo. “TCC não está
fazendo nada. Eles estão por aqui em algum lugar.”

Eu quase fico vesga. “Eu não quero incomodá-los. Sério.


Posso ir sozinha.”

Assim que ele abre a boca para argumentar, alguém


interrompe.

“Aonde você quer ir?” A voz que reconheço como sendo de


Sacha, pelo nosso punhado de conversas e de ouvi-lo falar para o
público todas as noites durante os últimos quatorze dias, flutua
pelo ar.

Eu me viro para encontrá-lo em seu short de basquete preto,


tênis ASICS e uma camiseta. Ele nem sequer parece com o mesmo
homem que sobe ao palco todas as noites de camisa de botão e
calça, com seu cabelo cheio de gel ou mousse, perfeitamente no
lugar. Penso que ele parece ainda melhor quando não está naquele
personagem, mas provavelmente sou apenas eu que acho isso.

Nós só conversamos algumas vezes sobre como foi o show


mais recente, e ele ainda parece um cara muito bom, que
mencionou quase todos os dias como eu o chutei na bunda. Já por
duas vezes ele passou por mim com as mãos espalmadas para fora
atrás dele como se estivesse protegendo suas nádegas de um
ataque. Eu também tenho a tendência a ir para a cama antes que
ele, então não é como se fofocássemos em nossas camas ou
qualquer coisa assim.

“Eu quero ir comer alguma coisa”, explico um pouco sem


jeito, olhando para as teclas do piano que reconheço e estão
tatuadas em seu pescoço.

Ele sorri com facilidade, fazendo com que aquelas teclas


pretas e a cor da pele apertem. “Eu irei com você.”

MARIANA ZAPATA
O que? “Você vai?” Nós conversamos algumas vezes, mas
realmente, não foi mais do que dez ou quinze minutos no total. Há
também o fato de que cada vez que falei com ele, pensei sobre como
nos conhecemos e isso fez meu interior estremecer. Nós fomos
simpáticos, mas não somos exatamente amigos. Pelo menos, não
como Carter e eu somos. Estamos no ponto onde eu sei que ele
gosta de Dr. Pepper e doces de leite, não gosta das mesmas
músicas que eu, e que tem uma namorada que odeia que ele saia
em turnê. Você sabe que é amigo de alguém quando esta pessoa
fica bastante confortável para que você leia mensagens de texto
psicóticas da pessoa que estão namorando.

“Sim”, o homem alto concorda com um abaixar de queixo.

Eu não perco o olhar satisfeito que Carter estampa no rosto.

Assim, Sacha e eu estamos andando pelo estacionamento


enquanto embolso os vinte dólares do meu companheiro mais
jovem.

O homem de cabelos negros caminhando ao lado me olha por


cima do ombro, os olhos são uma sombra imaculada de cinzas,
quase um azul claro. “Você deseja alguma coisa específica?”

Eu franzo o rosto. “Desde que não seja pizza novamente, estou


dentro.”

Sacha Ri, seu olhar ainda em mim. “É o pior, não é?”

Há uma razão para que quase todos na turnê cruzem os dedos


das mãos e pés para que pizza não fosse a refeição escolhida onde
quer que aconteça de estarmos naquele dia. Os contratantes são
responsáveis por fornecer o pacote com comida a cada noite. Cada
banda tem um adendo, ou uma lista de pedidos, de itens que
querem. Não é nada maluco como: apenas Skittles vermelhos,
Oreos sem recheio ou qualquer coisa assim. O adendo da Ghost
Orchid consistia em uma caixa de Dr. Pepper, algum tipo de vodca,
um grande saco de batatas fritas sabor churrasco, uma bandeja
de sanduíches e Oreos. Eles são uma visão de saúde.

MARIANA ZAPATA
Além de seus adendos, as duas bandas devem ter o jantar
fornecido ou se isso não estiver disponível, é dada certa quantia de
dinheiro a cada pessoa da turnê para comprar sua própria comida.
O problema é que, quando o contratante tem o jantar disponível,
mais frequentemente do que não, ele consiste em pizza. Não o bom
tipo de pizza, pelo menos até agora, mas o tipo que tem queijo com
gosto de uma marca ruim embalado individualmente, pepperoni
de aparência suspeita, e nenhum molho. Isso me faz querer
vomitar.

Se você acha que existe algum alimento que você pode comer
todos os dias sem se cansar dele, você está mentindo para si
mesmo. Tudo fica cansativo.

“Eu não comi pizza em turnê por quase dez anos”, Sacha
continua. “Há um lugar tailandês a cerca de cinco quarteirões de
distância...” Ele para e não perco o olhar esperançoso que lança
para mim.

Ele me dá o tipo de sorriso inocente conforme passa a mão


pelo cabelo no topo da sua cabeça que alcança sua alma como só
o lamber de um filhote de cachorro pode fazer. “Eu juro que é.…”

“Ok.” Dou de ombros para ele, encontrando seu olhar. “Estou


dentro.”

Sacha para por um segundo. Seus quase um metro e oitenta


e seis de altura se elevam sobre meus um metro e cinquenta e sete.
“Você não se importa?” Ele pergunta isso tão esperançoso, que
mesmo que eu não quisesse comer comida tailandesa, ainda teria
topado só para manter o sorriso no seu rosto.

A pergunta rende-lhe um bufo. “Comida é comida.”

Ele levanta um ombro, a manga de sua camiseta de corrida


se levanta para revelar mais das espessas e pretas faixas de sua
tatuagem que vai do pulso ao ombro. “Essa foi fácil.”

MARIANA ZAPATA
Eu nem sequer perco espero um instante antes de deixar
escapar: “Eu sou fácil.”

Bato minha boca fechada. E pisco. Então paro de piscar de


uma vez e apenas o olho.

Se não fosse por Sacha parar novamente e se virar para olhar


para mim, sua boca bem apertada nos cantos, eu não teria sabido
que ele ouviu o que eu disse. Suas sobrancelhas escuras estão a
meio caminho da raiz dos seus cabelos. Seus olhos estão enormes
conforme ele se vira para o lado.

Estreito os olhos para ele, o calor subindo pelo meu pescoço.


“Não... diga... nada.”

Ele expele a tosse mais falsa, a mais forçada na história da


tosse. “Diga nada sobre o quê?” Pergunta lentamente, hesitante.
Ele ainda acrescenta um levantar de ombros no final.

É muito mais difícil não rir do que parece. “Exatamente.” Dou


de ombros para ele, querendo me chutar na bunda por ter uma
boca tão grande.

Sacha me dá um olhar por baixo de suas pálpebras antes de


visivelmente franzir os lábios e tossir mais uma vez. Eu não deixo
de ver a forma como sua boca se levanta em um pequeno e curto
sorriso antes dele conseguir limpá-lo fora de suas feições
completamente. Sacha coça a ponte de seu nariz e olha para mim
com o canto dos seus olhos novamente antes de finalmente
grunhir, “Então, você tem certeza que está bem em comer isso?”

Nesse momento, não é como se eu pudesse dizer não, mesmo


se quisesse. Eu balanço a cabeça, o que me rende outro sorriso
dele.

Nós caminhamos uma quadra em silêncio, cada um dando ao


outro alguns olhares curiosos, se não um pouco de olhares
constrangedores, conforme nenhum de nós consegue pensar no
que dizer até que Sacha quebra o silêncio. “Você está se divertindo

MARIANA ZAPATA
nessa turnê?” Ele pergunta quando chegamos a primeira faixa de
pedestres.

“Sim, além de ter de lidar com o calor.” Fez muito calor em


cada local que estivemos ao longo das últimas duas semanas, e eu
me queixar sobre isso diz algo; vivi no Texas a minha vida toda.

Ele geme. “Isso nunca fica mais fácil de lidar, confie em mim.
Estive em turnê por seis meses do ano, nos últimos dez anos e não
ficou nem um pouco melhor do que no primeiro verão que a banda
passou em uma van sem ar condicionado.” Sacha estremece com
a lembrança, e acho que poderia explodir em sua fofura.

“Dez anos?” Pergunto a ele, olhando para cima. Ele não parece
ter vinte e um anos ou mesmo vinte e cinco, mas não parece ter
mais que trinta. Seu rosto ainda é relativamente sem rugas, exceto
por essas linhas de riso profundas nas laterais de sua boca.
Quantos anos ele tem?

“Dez anos em agosto”, ele reitera. Sacha se vira para olhar


para mim com aqueles olhos cinza claros. “É a sua primeira
turnê?”

Eu bufo conforme uma dúzia de memórias dos cinco anos que


passei dentro e fora das turnês com a Ghost Orchid cruzam meu
cérebro no espaço de um segundo. “Não. Eu costumava viajar com
Eli, mas cerca de dois anos atrás, decidi ir para a faculdade em
tempo integral e parei. Essa coisa de ônibus é nova para mim. Nós
tínhamos uma van para nos locomover”, resumo, deixando de fora
alguns detalhes que não parecem importantes.

Sacha sorri para mim maliciosamente. “Imaginei isso, quando


você não trouxe chinelos para o chuveiro.” Ele olha para os meus
tênis e balança as sobrancelhas. “Ouvi que você conseguiu um
fungo por causa disso.”

Eu não vou me incomodar tentando adivinhar qual idiota


fofocou sobre o meu problema no pé. Pode ter sido qualquer um
deles. Otários. Eu não tenho certeza de onde a ação veio, mas

MARIANA ZAPATA
cruzo o braço dele com o meu. Ele é muito mais alto que eu, bato
mais perto de seu cotovelo do que do ombro. “Eu não quero falar
sobre isso.”

E assim, ele me empurra para trás com um grande sorriso no


rosto. Os cantos dos olhos profundos, enrugados. “Aposto que sua
pele está ferida, Hein?”

Apenas com a menção de pele ferida, o vinco entre as pontas


de meus pés e os dedos começam a ter essa sensação de coceira
estranha com que me tornei familiarizada. Estou sufocando os pés
com creme por duas semanas e trocando minhas meias duas vezes
por dia conforme as instruções de Mason. O que ninguém diz nos
comerciais de frieiras é quanto tempo esses cremes levam para
fazer o trabalho.

“Coça”, isso apenas mal começa a descrever a experiência.

“Acontece com todo mundo”, Sacha adiciona quando não


respondo imediatamente.

Eu rio, lembrando-me da última vez que ouvi essas mesmas


palavras. “Eu tenho certeza que Mason disse a mesma coisa sobre
Gonorreia.”

A risada que explode dele em resposta é tão inesperada que


pulo um pouco no início.

É tão contagiante que me faz bufar.

“Isso é.… isso não é absolutamente verdade”, Sacha ri entre


crises de sons claros e altos de prazer.

“Esse é Mase para você.”

Ele bate com a mão de dedos longos sobre sua boca enquanto
ri. “Eu acho que na semana passada o ouvi dizer algo como ‘é tudo
diversão e jogos até que alguém pegue chato’. Mas pensei ter
imaginado.”

MARIANA ZAPATA
Oh Deus. Começo a rir tão alto quanto ele há poucos
momentos atrás. “Sim, isso soa como algo que ele diria.”

Sua cabeça se inclina para baixo o suficiente para que os


nossos olhos se encontrem. Muito atentamente, ele pergunta: “Ele
está falando sério ou...”

“Oh, ele está falando sério a maior parte do tempo. Fui com
ele para uma clínica gratuita quando no último ano do ensino
médio porque ele pegou chatos de uma líder de torcida.” Foi o
nosso segredo até que ele ficou bêbado uma noite e disse a todos
dispostos a ouvir sobre suas partes íntimas coçando. Eu tenho
certeza que a equipe assumiu que eu passei aquilo a ele, mas quem
sabe.

Sacha fica boquiaberto com diversão por um segundo, antes


que ele pare de repente na frente de uma loja. “O restaurante é
aqui.” Ele faz um gesto em direção a uma porta de vidro a nossa
direita, abrindo-a e me indicando para entrar.

O pequeno restaurante é acolhedor com paredes borgonha,


mesas pretas redondas cobertas com vinil e um balcão diretamente
em frente à porta, com um menu montado acima dele escrito em
giz. Não há ninguém na fila e demoro um pouco olhando para os
vários itens listados para esse dia. Sacha fica ao meu lado, também
decidindo o que comer. Depois de alguns minutos, uma senhora
em um avental e uma touca caminha para fora da cozinha e anota
nossos pedidos.

Com nossas bebidas em mãos — alguma bebida à base de chá


para Sacha e água para mim — sentamos em uma das mesas de
piquenique vazias.

Meu amigo de refeição inesperado toma um gole da bebida


amarela em um copo vermelho claro e ergue as sobrancelhas.
“Então você conhece Mason há muito tempo?”

MARIANA ZAPATA
“Eu conheço Mason e Gordo desde meus cinco anos. Nós
todos crescemos juntos”, explico. “Eles são como os irmãos que
nunca quis.”

Ele sorri. “Mas você e Eli realmente são irmão e irmã?”

“Oh sim. Ele gosta de dizer que me empurrou para fora do


caminho para sair em primeiro lugar.”

Sacha pisca. “Não brinca? Vocês dois são mesmo gêmeos? “

Eu sabia que ele não acreditou em mim! Então, novamente, a


maioria das pessoas não acredita. Meu irmão tem mais traços
físicos em comum com o Pé Grande do que comigo. “Sim.”

Ele ainda faz uma cara que dizia que não está totalmente
convencido. “Mas ele é duas vezes o seu tamanho.”

Duas vezes o meu tamanho. Eu posso dar-lhe um abraço por


ser um mentiroso fantástico. “Sim. Tenho certeza de que ele tentou
me comer no útero.”

Sacha começa a rir novamente, fazendo a pele levemente


bronzeada em seu rosto brilhar. Sua pele é tão clara que quase
brilha; isso o faz ainda mais atraente. “Jesus. Disseram que você
era engraçada, mas não acreditei neles.”

Gaby engraçada. Eu sorrio e contenho o suspiro rastejando


ao redor no meu peito. Quantas vezes me mantive na zona de
amizade por brincar? Uma dúzia? Não é nem mesmo que eu tente
ser engraçada; só cresci em torno de espertinhos. Ou você aprende
a se adaptar ou morre. Bem, você realmente não morreria, mas
você seria comido vivo verbalmente pelas pessoas que deveriam
amá-lo; aparentemente eles simplesmente amam tirar sarro de
você na mesma proporção. Meus irmãos e os dois idiotas podem
encontrar as menores coisas para me provocar.

Empurro todos os cinco para fora da minha cabeça e sorrio


para o homem sentado em frente a mim. Aquele longo cabelo no

MARIANA ZAPATA
topo da cabeça e menor dos lados o favorece muito, mesmo quando
não os tem perfeitamente no lugar.

“E quanto a você e sua banda? Vocês estão juntos há muito


tempo?” Pergunto.

“Isaiah — você conhece Isaiah?” Ele pergunta, e eu assinto.


“Isaiah e eu nos conhecemos desde o ensino médio. Começamos a
tocar juntos na escola, fazendo algumas coisas de banda cover, e
depois encontramos Julian. Ele é o cara grande”, Sacha explica,
como se eu não soubesse os nomes das pessoas com quem estou
em turnê nas duas últimas semanas, mas não o corrijo. “Nós três
começamos a TCC quando tínhamos dezesseis anos, e então
lentamente adicionamos membros ao longo dos anos.”

Perguntar sua idade é considerado paquera? Eu não tenho


certeza, mas decido que não me importo. “Então vocês estão juntos
há.…?”

“Onze anos.”

Ele tem vinte e sete. Há. Isso soa certo. Eu assobio. “Isso é
um longo tempo.”

“É.” Ele dá de ombros. “Mas eu não gostaria de fazer qualquer


outra coisa... a maior parte do tempo.”

Eu sorrio para ele, suas palavras me acertando em cheio. Não


tenho ideia do que quero fazer com minha vida agora que terminei
a faculdade. A única coisa que sei é o que não quero. Isso não
ajuda muito, mas acho que é para isso que vai servir essa turnê.
Para me dar algum tempo para descobrir as coisas.

Qual é a pressa, certo?

A mesma mulher que nos atendeu no balcão traz nosso


pedido. A tigela de Sacha tem tons de verde e marrom, enquanto a
minha é um prato de curry vermelho. Deve ser um sinal de como
ambos estamos com fome o fato que nenhum de nós diz uma

MARIANA ZAPATA
palavra conforme detonamos a nossa comida. Quando termino
antes dele, levanto-me e peço para Carter a mesma coisa que comi.

Ele sorri para mim por trás da borda do copo quando termina
o último gole de seu chá quando me sento. “Obrigado por ser legal
e comer aqui. Eu geralmente tenho que pagar um dos caras para
vir comigo.”

“Por quê? Eles não gostam de Thai?” Pergunto. Não sou uma
comedora exigente. Você poderia colocar um prato vegano na
minha frente, ou frango frito, e isso seria devorado.

“De modo nenhum. Nenhum deles gosta de comida picante”,


ele diz, colocando o copo sobre a mesa.

“Mas nem toda a comida é picante...”

Ele pisca. “Eu sei.”

“Bebês”, eu murmuro, um pouco insegura de como ele lidará


comigo chamando seus amigos assim.

Ele sorri para mim. “Bebês enormes.”

“Eles não sabem o que é boa comida.”

“Certo? Se fosse por eles, teríamos fast food todos os dias.


Tudo o que estou pedindo é um pouco de pimenta mexicana
Chipotle, pelo menos.”

“Chipotle de alto nível.” Eu sorrio.

Ele ergue um ombro. “Eu sou um cara de alto nível.”

Sim, eu não consigo segurar a piada, apesar de quão


inapropriada pode ser considerando que não nos conhecemos
bem. Mas dane-se. Chutá-lo na bunda é como dar um saldo de
três meses em uma amizade. “Você sabe quem está no mais alto
nível? Prostitutas. Prostitutas são de alto nível.”

MARIANA ZAPATA
Sacha não perde um segundo. Ele pisca aqueles olhos
cinzentos claros para mim e pergunta muito a sério, “Você sabe
por experiência?”

Ele está seriamente me chamando de prostituta em nossa


primeira saída?

Pelo sorriso em seu rosto, diria que sim. Sim ele está.

Acho que eu encontrei um amigo.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 5

Onde você está hoje?

Tenho que consultar a lista de datas que temos na parede.


Todos os dias parecem como uma repetição do anterior e depois
da primeira semana da The Rhythm & Chord Tour, eu perdi a
noção de que cidade é próxima. Uma vez que geralmente não há
tempo suficiente para ir passear, um lugar se parece com o outro;
talvez uma instalação seja melhor do que a outra, mas como isso
é realmente tudo o que temos que ver, não faz diferença.

Mando uma mensagem de volta para Laila:

Nova Orleans.

Um minuto depois, recebo uma resposta dela:

Não mostre seus peitos a ninguém. Não é Mardi Gras não


importa o que lhe digam.

Isso é mais a sua cara, vadia.

Ela sabe exatamente ao que estou me referindo: seu vigésimo


segundo aniversário, Mardi Gras em Galveston, duas da manhã.
Se eu me esforçar um pouco, ainda posso ouvir meus gritos por
ela se exibir para um público desavisado após beber muitos Long
Island Iced Tea.

Ó meu deus. Pare com isso. Se não me lembro, não


aconteceu.

Eu a ajudei a trocar o seu cateter mais de uma vez no


passado, por isso não é como se estivesse horrorizada ou qualquer
coisa por seus peitos nus estarem remotamente perto. Mas ainda
assim. Eu me sinto obrigada a dar-lhe uma bronca sobre isso.

MARIANA ZAPATA
Preferiria não ter feito isso :P

Rindo muito. Estou prestes a dar uma aula. Te amo.

Divirta-se. Amo você também.

Abaixo o celular e suspiro.

É apenas cerca de três horas da tarde, e já estamos


estacionados no local por cerca de duas horas. Meu irmão, Mason
e alguns caras da The Cloud Collision decidiram, “ir com alguns
amigos para a cidade.” Na realidade, o que isso significa é que eles
estão fazendo algo que não podem fazer no ônibus.

Tanto quanto amo Eli e Mason, odeio vê-los chapados ou


bêbados, por isso optei por não ir junto com eles. Em vez disso me
acomodei na sala dos fundos do ônibus com um dos livros que
carreguei na minha mala antes de sair de casa. Estou lendo O
Menino do Pijama Listrado esta semana. Mesmo que estivesse me
divertindo em passar tempo com meus três idiotas, conhecendo
Carter também, e perdendo no Mario Kart quando jogava contra
Mason na parte da manhã, essa coisa de viver-com-dez-outras-
pessoas é difícil.

Mesmo que sinta saudades dos meus pais, Rafe, Gil, seus
filhos e Laila, sinto saudade da cama irregular na casa do meu pai
ainda mais. É uma das coisas que tomei com certas, assim como
tomar banho sem sapatos e sair no meu quarto seminua, que sinto
mais saudade.

Mas sei que não é nenhuma dessas coisas que estão


realmente me incomodando nesse momento. Estou um pouco
magoada com Eli por ainda fazer o tipo de merda que já o meteu
em apuros no passado. Nós concordamos antes de me juntar a
turnê que ele pegaria leve na bebida. Isso foi uma das minhas

MARIANA ZAPATA
condições. Ele cumpriu sua parte do acordo até agora, mas eu não
estou apostando na continuidade hoje.

Há também a possibilidade que eu não esteja lhe dando


crédito suficiente, mas não vou apostar muito nisso.

“Posso entrar?” Uma voz suave pergunta quando a porta para


a sala se abre.

“Claro”, respondo, reconhecendo o timbre baixo de Sacha no


outro lado.

Sua cabeça com cabelos escuros espia antes que ele abra a
porta. “Eu não tinha certeza se você estava fazendo alguma coisa.”
Seus olhos circulam ao redor da sala com cautela antes que ele se
sente sobre o sofá em frente ao que estou sentada.

“Só estou lendo. O que você está fazendo?” Pergunto, olhando


para os músculos magros embaixo da camiseta que ele usa. Sacha
tem um short que está grudado as suas coxas, mostrando o que
parecem ser metros de pele quase pálida sob o cabelo da perna
escura. Ele também está usando um par de tênis de corrida, não
o seu par normal de tênis pretos.

Ele coça o cabelo curto no lado de sua cabeça. “Estou


esperando Julian voltar”, explica, referindo-se ao guitarrista da
sua banda.

“Ele não saiu com o meu irmão?” Juro que o vi entrar no táxi
com os outros idiotas. Se for esse o caso, de nenhuma maneira o
grupo voltará em breve. Muito menos, voltarão sóbrios. Eu não
apostaria qualquer dinheiro nas chances de eles serem capazes de
ficar em seus dois pés quando voltassem.

Agora que pensei sobre isso, provavelmente deveria me


preparar e já manter aberto o aplicativo da câmera no meu celular
apenas em caso de algo ridículo acontecer durante o show.

“Ele disse que estaria fora por apenas umas duas horas.”

MARIANA ZAPATA
Eu odeio quando as pessoas me dizem que vão fazer alguma
coisa e depois não cumprem. A decepção é amarga. Não é como se
fosse minha culpa que Julian saiu, mas eu me sinto mal que ele
deixou Sacha esperando. Eu prefiro muito mais alguém sendo
rude e ferindo meus sentimentos no processo, do que me deixar
mal.

Suspiro antes de dizer a ele. “Eles não vão voltar logo.”

Aqueles olhos cinzentos translúcidos que beiram ao azul


celeste, piscam em minha direção.

“Você está pensando em fazer alguma coisa?” Pergunto.

“Nós íamos para uma corrida”, explica com um encolher de


ombros. “Não é o fim do mundo. “

Escorregando as pernas para fora do sofá para plantar os pés


no chão, levanto minhas sobrancelhas para ele conforme coloco
meu livro sobre o assento ao meu lado. “Eu vou com você, se
quiser.”

“Sério?”

“Sim.” Assinto. “Eu fiz atletismo.”

“Você fez?” Ele faz soar como se a ideia fosse absurda. Rude.
Pode ou não pode ser porque reclamei do ônibus estar muito longe
do local do show em Birmingham quando estava carregando caixas
de mercadorias, mas em minha defesa, estava chovendo.

De qualquer maneira, não posso deixar de arranhar minha


testa antes de alterar a minha resposta. “No ensino médio.”

Sacha coloca os dentes brancos e perfeitos em exibição. “O


que você está querendo dizer é que você é praticamente uma
estrela do atletismo profissional?”

Faço questão de manter a minha fisionomia impassível


quando assinto. “Exatamente.”

MARIANA ZAPATA
Seus olhos se arregalam de brincadeira. “Eu sou muito
rápida”, alerto.

“Vamos ver quão rápida você é”, eu digo e imediatamente me


sinto um pouco estranha por me convidar. “Mas só se você quiser
companhia. Se não quiser, entendo perfeitamente.” E choraria um
pouco, mas mantenho essa parte para mim.

Correr foi uma das únicas coisas que mantive na minha vida,
especialmente desde o término do meu namoro; eu achei tempo
para isso alguns dias por semana na esteira ou quando não estava
me misturando com o carpete Stairmaster. Imaginei que minha
bunda e coxas poderiam me agradecer quando chegar aos
quarenta. Mas passou mais de duas semanas desde a última vez
que fiz um esforço para colocar as pernas em uso.

Mas Sacha é a mesma pessoa que me levou acidentalmente a


chutá-lo na bunda como uma campeã, e saiu para comer comigo
para que eu não fosse sozinha. Ele não me deu a menor impressão
de ser nada além de um cara legal. “Venha comigo”, diz ele, já
acenando para frente.

“Tem certeza?” Pergunto.

O cantor revira os olhos. “Vou esperar por você lá fora.”

“Vou me trocar”, olho para os moletons finos em que estou


desde a noite anterior, “e encontre protetor solar. Eu vou ser
rápida.”

Sacha inclina a cabeça para o lado. “Eu tenho um pouco...”

Claro que ele tem com essa pele clara que de alguma forma
consegue não ser pálida.

“Vista-se e vou pegá-lo.”

Agarrando meu short quase limpo e um sutiã esportivo da


mala, eu me troco o mais rápido que posso e jogo minha camiseta
de volta. Também pego algum dinheiro que acaba ficando sob uma

MARIANA ZAPATA
alça do sutiã. Se formos sofrer de exaustão pelo calor, posso parar
para comer alguma coisa, em algum momento depois; ele só não
sabe ainda. Depois de avisar Gordo que estou saindo, já que ele é
o único que não saiu, encontro Sacha do lado de fora do ônibus
me esperando com um pequeno tubo de protetor solar à base de
aloe vera na mão, que ele atira para cima.

Eu gostaria de dizer que me foquei em colocar o protetor solar


no meu próprio corpo, mas não o fiz. Correção: eu não consegui.

Quando Sacha tira a camisa e começa a espalhar o creme


sobre seus ombros manchados de sardas, braços, peito, pescoço e
até mesmo a concha de suas orelhas... estou em transe. É como
observar uma chuva de meteoros. Ou comer doces pela primeira
vez depois que você tenta fazer uma dieta.

Exceto que de forma mais magnífica.

Sacha ainda tem esses pequenos sinais castanho-claros que


pontilham seu abdômen e costas. Ele tem um tanquinho,
quadrado e musculoso que admiro pelo canto do olho cada vez que
ele está sem camisa. Ele tem o corpo desses nadadores por quem
Laila e eu gememos a cada quatro anos, e ele está passando loção
em cima dele. É melhor do que assistir pornografia. Inferno,
melhor do que assistir pornô com Robby Lingus. Santo deus. Eu
termino de me besuntar sem nenhum cuidado enquanto ele coloca
a camisa de volta.

“Você sabe onde quer ir correr ou vamos descobrindo


conforme seguimos?” Pergunto enquanto me inclino para esticar
os tendões.

“Leste. Normalmente há menos pessoas nessa direção”, diz


Sacha.

Eu concordo como se soubesse onde é o Leste sem pesquisar


o sol e digo um “tudo bem.”

MARIANA ZAPATA
Cinco minutos depois, estamos alongados e prontos para ir.
Ele inclina a cabeça para a esquerda com um sorriso brincalhão e
pergunta: “Você está pronta, atleta Jesse Owens?”

Eu bufo. “Eu nasci pronta.”

Sacha ri antes de cutucar meu braço com a palma da sua


mão.

Nós começamos com um trote lento para aquecer pelo que


parece cerca de um quilômetro. Ele modera o seu passo de modo
que fica a menos de seis metros na minha frente, considerando
que suas pernas são quase trinta centímetros mais longas. Ele me
lança um olhar por cima do ombro uma vez e eu concordo. Então
nós decolamos.

Ele não estava brincando quando disse que era rápido. Ele
realmente é. Ele tem o ritmo de um corredor de longa distância,
mas o potencial e a velocidade contida de alguém que,
possivelmente, corre para se divertir. Felizmente para mim, fui
uma velocista na escola, por isso não me mata muito alcançá-lo.

No início.

Um quilômetro.

Dois quilômetros.

Três, quatro e cinco quilômetros.

Meus pulmões começam a ficar apertados.

Seis quilômetros.

Sete quilômetros.

Minhas pernas começam a ter cãibras.

No décimo segundo quilômetro, estou lutando para respirar e


minhas cãibras passaram de “doloridas” direto para “dilacerantes”.

MARIANA ZAPATA
Honestamente, não tenho ideia de onde estamos muito menos
onde é o local do show. O que faz isso tudo pior é que Sacha parece
suado, mas quase não está sem fôlego. O que diabos ele é? Um
cyborg?

Passa-se provavelmente outro quilômetro antes que eu


decida... que já chega. Eu não posso continuar sem morrer.

“Ei, Ei”, ofego enquanto paro.

Demora um segundo para ele abrandar e se virar. Seu rosto


está rosado, suor pontilhado ao longo de suas têmporas. “Você está
bem?” Ele pergunta soando um pouco sem fôlego.

Estou inspirando o ar pelo nariz de forma irregular quando


concordo, pressionando a mão na parte plana do estômago que é
a mais destituída de ar. “Eu não posso... preciso parar. “

Aqueles olhos azuis acinzentados tomam conta de mim por


um segundo enquanto estou ali, uma mão no quadril, a outra
sobre o umbigo. Meus shorts soltos estão agarrados às minhas
pernas e minha camiseta está definitivamente grudada em mim.
Em seguida, há as manchas do sovaco. Eu nem sequer quero
pensar sobre as manchas do sovaco e as manchas úmidas na
minha bermuda. Tanto faz. Quem se importa. Sacha me viu após
o show acabar, todas as noites quando meu rímel estava
escorrendo e eu cheirava a meias de uma semana atrás. Além
disso, não é como eu estivesse tentando conseguir um namorado
ou qualquer coisa assim.

“Eu não... corro... longas distâncias”, ofego.

Ele inala visivelmente através de seu nariz e assente. “Tudo


bem.”

“Você... pode continuar...” Eu não achei que estava fora de


forma, mas, aparentemente, estou. “Você pode continuar”, digo.
“Eu posso voltar sozinha.”

MARIANA ZAPATA
Sacha me lança um olhar quando se aproxima do edifício para
sair do tráfego de pedestres. “Não. Vou andar de volta com você.”

“Andar de volta?” Isso soa tão em pânico quanto é para ser.


“O caminho inteiro?”

“Sim.”

Tudo que posso fazer é olhar para ele. Ele não sabe que estou
à beira da morte?

O puro terror no meu rosto me rende uma risada do homem


alto. “Estou zoando você. Vamos caminhar um pouco, e depois
vamos pegar uma carona de volta.”

“Se.… eu... não estivesse assim... “

Ele sorri, cortando minha ameaça. “Vamos. Está com fome?”

Balanço a cabeça.

“Quer comer alguma coisa?”

Consigo balançar novamente.

Andamos por quase vinte minutos em silêncio, sem pressa.


Eu ainda estou muito sem ar para falar, então foco em me acalmar.
Eventualmente Sacha chama um táxi e nós entramos.

É a risada sufocada do outro lado do banco traseiro que me


faz voltar minha atenção para ele. Ele estava sentado de costas
para o canto, um sorriso de satisfação no rosto. “Você vai
sobreviver?”

“Dificilmente.”

Suas sobrancelhas sobem quando sorri ainda mais. “Você foi


muito mais longe do que eu pensava que iria.”

Espere um segundo.

“Julian e eu normalmente só fazemos oito quilômetros”, ele


explica.

MARIANA ZAPATA
Olho para ele; não pode haver outra maneira de descrever o
que faço além, talvez se referindo a isso como um reflexo. Eu sento
lá com meu peito expandindo e retraindo enquanto ainda tento me
recuperar, processar o que diabos acabou de sair de sua boca.
“Você está brincando?”

Ele balança sua cabeça.

Mantenho o olhar sobre ele por um breve segundo a mais,


estendendo meu dedo médio contra a minha coxa visível e me viro
para fora da janela.

Sacha ri.

Ok, eu sorrio. Um pouco, mas não muito.

Nenhum de nós diz uma palavra até que ele instrui o


motorista para nos deixar no final de um quarteirão que não
parece particularmente familiar. “Este lugar é muito bom”,
observa ele apontando para uma porta de vidro decorado conforme
saímos do táxi depois de discutir sobre como pagar a corrida.

Eu ainda não estou em condições de falar com ele, embora


tenha normalizado a minha respiração e o sigo para dentro do
restaurante, que não é tão legal quanto eu gostaria que fosse. O
cheiro de frango assado faz meu estômago roncar.

Ele ergue as sobrancelhas para mim do outro lado da mesa


depois que uma garçonete traz dois copos de água. “Ainda com
raiva de mim?” Pergunta.

Estreito os olhos para ele enquanto tomo um gole, observando


como ele ainda parece relativamente composto e de como, de jeito
nenhum, ele parece como se tivesse acabado de correr oito
quilômetros meia hora atrás. “Você corre maratona, não é?”

“Não.” Ele coloca o copo nos lábios, mas eu ainda posso ter
um vislumbre dos cantos da sua boca. “Meias-maratonas.”

Meias-maratonas. “Obrigada por me dizer isso agora”, bufo.

MARIANA ZAPATA
“Você não parecia sem fôlego, e eu achei que você ia me dizer
quando não pudesse ir mais longe.”

Resmungo e balanço a cabeça, no momento em que a


garçonete vem para pegar nosso pedido.

Ela mal sai quando o homem de cabelos escuros sentado em


minha frente me pergunta: “Então, você está em férias de verão?”

“Não, eu terminei a faculdade cerca de um mês atrás. Eu só...


não fui capaz de encontrar um trabalho ainda.”

Dizer isso em voz alta é estranho. Eu sei que não é raro não
encontrar um emprego logo depois de se formar. Metade das
pessoas que terminaram a faculdade ao mesmo tempo em que eu
está lutando para conseguir um. Não ajuda que o diploma que
consegui não é exatamente repleto de oportunidades de emprego,
mas ainda me faz sentir um pouco inexperiente. Quando eu disse
a minha família que queria estudar história, a primeira coisa que
saiu da boca do meu pai foi, “O que você vai fazer com que
diploma? Por que você não faz contabilidade? Ou enfermagem?”

É um assunto delicado, para dizer o mínimo.

Sacha pergunta o que eu estudei e eu digo a ele.

“Você está pensando em dar aulas?” Pergunta.

“Não...” Por um segundo, penso em contar a ele que queria


fazer pesquisa ou trabalho em um museu, ou algo assim. Mas não
posso. Fiz essa faculdade porque queria aprender sobre a história;
só isso. “Eu realmente não sei, para ser honesta. Prefiro não
ensinar, no entanto. Eu acho que seria muito terrível nisso. As
crianças provavelmente ririam de mim se tentasse ser firme com
alguma coisa.”

Sacha assente solenemente. “Você vai encontrar alguma


coisa, apenas se dê algum tempo. Eu costumava ter um monte de
merda jogada em mim no palco, quando era mais jovem; se tivesse

MARIANA ZAPATA
desistido a cada vez que ouvi ‘Você é ruim demais’ sendo gritado
para mim, quem sabe onde estaria agora.”

Esse cara costumava ouvir merda? Ele tem uma das melhores
afinações e alcance que eu já ouvi e arrasa em seu desempenho
todas as noites. “Você realmente tinha gente dizendo merda para
você?”

Ele ri. “Sim. A primeira vez foi em um show de talentos no


ensino médio. Um idiota jogou uma garrafa de Coca-Cola em mim
e no fim da canção, eu praticamente tinha sido vaiado a música
toda. Eu só fiquei, porque sou teimoso.”

Tive que bater minha mão sobre a boca para não rir. “Se isso
faz você se sentir melhor, uma vez eu fui a um recital de dança
quando tinha provavelmente sete anos, e vomitei por todo o palco.
Estava tão nervosa. Lembro-me de dizer a minha mãe que não
queria fazer isso, mas ela me fez ir de qualquer maneira.” Houve
filmagem disso também e alguém na família resgatava o vídeo a
cada dois anos, quando precisavam dar umas risadas.

Sacha cobre a metade inferior do rosto com a parte inferior de


sua camiseta, e fecha os olhos simultaneamente. Seus ombros
tremem com moderação. “O que você fez?”

“Chorei muito”, sorrio.

“Eu caí do palco uma vez”, ele acrescenta, dando um sorriso


enorme.

“Você não fez isso!”

“Eu fiz. Eu só caminhei para fora dele...”

Sim, começo a rir, imaginando.

“...foi o momento mais embaraçoso da minha vida no palco”,


diz ele antes de jogar a cabeça para trás e se acabar de rir. “Isso é
o que recebo por não prestar atenção.”

MARIANA ZAPATA
É o “palco” que me pega. Assim que me sinto sob controle,
levanto minhas sobrancelhas para ele. “E fora do palco?”

Ele passa a mão pelo cabelo solto no topo da cabeça e fecha


um único olho cinza. “Eu tive que fazer coco em um saco plástico
uma vez. O banheiro do ônibus estava entupido, e nós estávamos
no meio do nada durante uma tempestade.”

Apenas para constar, de jeito nenhum você consegue segurar


uma risada quando alguém lhe diz que fez coco em um saco
plástico. Especialmente quando a história é contada em voz
casual. Não é possível. Por outro lado, não ajuda que o rosto de
Sacha leva ‘impressionante’ e ‘bonito’ a um nível diferente. Eu
sempre imaginei que as pessoas do escalão superior da beleza —
a não ser Mason — fossem incapazes de fazer as coisas ridículas
que as pessoas semi atraentes como nós fazemos; como peidar ou
arrotar na frente dos outros, cheirar mal ou fazer cocô fedido. Mas,
aparentemente, Sacha, cujo sobrenome ainda não sei, é uma
anomalia.

Ele fez coco em um saco plástico.

Quando tenho que me debruçar e pressionar a testa contra a


mesa com cheiro de vinagre e limão, Sacha me cutuca no ombro.
“Quando você tem que ir, você tem que ir”, diz ele com outra risada
que não possui um pingo de vergonha nela.

Olho para cima para ver que seu sorriso está me contando
uma história sobre um homem incrivelmente bonito que não se
leva muito a sério.

É como encontrar um trevo de quatro folhas.

“Você está com nojo de mim?” Ele pergunta quando eu não


respondo imediatamente.

Faço uma careta e balanço a cabeça. “Você está brincando


comigo? Você já conversou com Eli?” Ele acena com a cabeça, mas
de maneira nenhuma ele interagiu com ele o suficiente para não

MARIANA ZAPATA
estar plenamente conscientes da deficiência mental do meu irmão.
Eu não posso ver Eli falando com alguém por mais de vinte
minutos sem fazer algum comentário rude e/ou inadequado.

“Somos quatro filhos em nossa família, e Eli e eu


costumávamos ter que ir de ônibus para a escola juntos na parte
da manhã, então tínhamos que acordar mais cedo do que todos os
outros. Ele se assegurava de se levantar antes de mim todos os
dias durante anos para que pudesse propositadamente me deixar
‘presentes’ no banheiro”, eu rio. “Você pode falar comigo sobre
pickles marrons a qualquer hora.”

Sacha Ri, seu indicador e o dedo médio pressionando contra


sua têmpora. “O que você está tentando dizer é que Eli é o culpado
por você ser desta maneira?”

“Ei! “ Choramingo. Eu não tenho certeza se é um insulto ou


não.

“Quero dizer de um jeito bom. Você é linda”, eu não sei como


consigo não cair da cadeira. “...E você não tem um problema de
falar comigo sobre gonorreia, diarreia e vômitos. Você é divertida,
Gaby.”

Minhas orelhas ficam vermelhas. Muito preocupada em dizer


algo estúpido, estendo as mãos ao meu lado em um gesto do tipo
“o que posso dizer”.

Sacha sorri e abre a boca antes do som do sinal sonoro alto


vindo do bolso tirar sua atenção para longe da mesa. Puxando o
telefone, ele me pede para esperar antes de atender a chamada.
“Ei... Acabei uma corrida... sim... estou prestes a comer.” Ele me
lança um sorriso quando olha para cima. “Eu vejo você em breve...
Sinto sua falta também... ok... tchau.”

As chances de que a pessoa que ele estava falando do outro


lado sejam um membro da família poderiam ser bastante elevadas,
mas minha intuição diz o contrário. Alguém com uma aparência
tão boa tem que ter outro alguém significativo.

MARIANA ZAPATA
“Namorada?” Minha boca vomita sem pensar duas vezes.

Ele simplesmente balança a cabeça, e eu perco a maneira


como uma de suas pálpebras abaixa em negação. “Velha amiga.”

Amiga?

Certo. Eu quase rio. Eu cresci com três meninos, dois deles se


tornaram “pegadores” bem diante dos meus olhos. Eu entendo
como eles redigem suas sentenças. Uma “velha amiga” que você
diz que “sente falta” era mais provável ser uma ex-namorada ou
uma amiga que você usou para fazer as coisas e com quem você
provavelmente quer fazer mais coisas no futuro. Sacha não parece
ser como meu irmão ou Mase, mas ainda assim. Uma “velha
amiga” é uma “velha amiga”.

Não é da minha conta, no entanto, assim eu empurro a amiga


de Sacha e a conversa para fora da minha cabeça e sorrio para ele,
de boca fechada.

Ele apenas sorri de volta para mim. O silêncio se estabelece


em torno de nossos ombros em um ataque estranho.

“Você está pronto para ir?” Pergunto-lhe.

Sacha concorda e nos levantamos, caminhando para fora.


Nenhum de nós fala enquanto caminhamos de volta para o nosso
destino. Eu não sei o que dizer, e acho que ele também não.
Sorrimos um para o outro um par de vezes quando paramos em
um canto e esperamos para atravessar a rua.

Eu ouço os caras antes de vê-los. Estamos contornando o


edifício mais próximo do local do evento quando ouvimos uma
risada estrondosa de Eli misturada com duas outras ruidosas.
Imediatamente, sinto uma grande bola de temor se formar no meu
estômago, meus ombros ficam tensos.

Eu conheço Eli por dentro e por fora. Posso reconhecer sua


risada quando pensa que há algo meio engraçado, muito
engraçado, nada engraçado, mas ele está tentando ser agradável,

MARIANA ZAPATA
e estou muito consciente da textura de sua risada quando bebe
demais ou fuma maconha. E embora ele seja um homem adulto e
eu não tenho o direito de lhe dizer o que fazer, há uma razão pela
qual uma das condições que apresentei antes de vir em turnê com
ele fosse a dele não beber, e consequentemente, mantivesse as
festas no mínimo. Especialmente quando eu ia ter que aturar sua
porcaria depois.

Eli ri novamente, e eu respiro fundo, já apalpando no meu


peito o crachá que tenho em um cordão para que possa entrar no
edifício pela frente em vez da porta de trás.

A mão de Sacha cutuca meu braço. “Você está bem?” Ele


pergunta quando olho para ele.

“Sim, estou bem.” Forço um sorriso no meu rosto quando a


voz de Mason atravessa o ar.

Ele franze a testa. “Você não parece bem.”

Nós estamos chegando mais perto e mais perto do canto do


bloco aonde decidiremos entrar pela frente ou caminhar mais
alguns passos e caminhar para a parte de trás onde o ônibus e o
reboque estão. “Eu só...” Solto um suspiro que não percebi que
estava segurando e balanço a cabeça como se quisesse me livrar
de toda essa situação com os idiotas. “Eu não gosto de estar perto
de Eli quando ele está alterado com alguma coisa.” Tenho um
flashback repentino da noite que, finalmente, foi meu ponto de
ruptura, quando decidi que não queria continuar viajando com a
GO. Eu fiquei tão chateada que não falei com qualquer um deles
por meses depois que a turnê terminou.

“Ele fica tão mal assim?” Pergunta Sacha.

Levanto um ombro, lutando contra a ansiedade tentando


fazer uma casa em meu peito. “Não é mal, ele simplesmente... diz
coisas realmente estúpidas. Todos eles.” Coisas ofensivas e
pessoais que nenhum deles tem que se meter.

MARIANA ZAPATA
Ele balança a cabeça como se entendesse, e talvez ele
entenda. A maioria das pessoas tem um amigo que se transforma
em uma bola de demolição, uma vez que bebe demais ou faz outra
coisa que muda suas personalidades ou processo de pensamento.

Quando chegamos ao canto em frente do local, toco seu lado.


“Vou entrar pela frente.”

Sacha inclina a cabeça para baixo. “Eu deveria começar a me


vestir para que possa começar a aquecer.” Ele me mostra aquele
sorriso brilhante mais uma vez. “Se você quiser ir correr de novo,
me avise. Você é uma parceira melhor do que Julian.”

Eu não posso deixar de sorrir e acenar.

As barras escuras de suas sobrancelhas se erguem. “Eu vou


até mesmo pegar mais leve com você: apenas sete quilômetros na
próxima vez, se quiser.”

Eu luto contra o desejo de afastá-lo como teria feito, se ele


fosse um dos meus demônios e bufo antes de recuar. “Vá colocar
a sua maquiagem e se aquecer, Celine Dion.”

Eu ainda posso ouvir meu irmão rindo quando entro no local


menos de um minuto mais tarde.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 6

Eu sei que algo está acontecendo quando encontro meu irmão


gêmeo e Gordo sorrindo docemente para mim no estacionamento.
O fato de que todos os membros do TCC e sua tripulação os cerca
não ajuda em nada. Eu normalmente não tenho problemas para
dormir, mas um nariz entupido me manteve acordada. Pego um
copo plástico do armário sobre o micro-ondas e um dos galões de
água que estão guardados nos armários da cozinha, enquanto
observo o grupo de perto e tento ouvir o que diabos eles estão
falando.

O cheiro de besteira é forte no ônibus.

“Eu estou dentro”, Julian diz primeiro, olhando para Freddy.


“Você?”

“Eu estou dentro”, o gerente da turnê do TCC concorda.

Do que exatamente eles estão dentro?

Lenta, mas seguramente, o resto dos membros sentados nos


sofás concorda verbalmente com o que quer que estejam falando.
Eu lentamente deslizo para o único lugar disponível em frente a
Carter, que é em uma das duas cadeiras pertencentes à pequena
mesa na cozinha.

“Carter, e você?” Eli pergunta ao homem com quem passo


muito tempo.

Ainda de pijama e parecendo apenas um pouco mais acordado


do que eu, ele encolhe os ombros. Ele tem o cabelo solto e separado
no meio, as pontas roçando os ombros magros. “Vou jogar.”

Eu vou jogar?

MARIANA ZAPATA
Oh, não.

“Quantas pessoas estão nessa, então?” Gordo pergunta. Não


perco o olhar arrogante que ele joga na minha direção depois de
perguntar.

“Onze”, responde um dos caras do TCC.

Gordo deixa escapar o suspiro mais exagerado que já ouvi em


minha vida, chegando a ficar com olhos arregalados. “On-ze? É um
número ímpar. Não podemos ter uma quantidade ímpar de
jogadores. “

Este filho da puta.

Meu irmão vira para olhar para mim e encolhe os ombros.


“Flabs, eu acho que isso significa que você tem que jogar.”

“O inferno que significa que tenho que jogar. Não vou jogar”,
digo em uma voz cuidadosa e controlada antes de tomar um gole
muito casual de água, certificando-me de manter contato visual
com ele.

“Você precisa”, repete Eli.

“Números ímpares”, Gordo reitera como um merda.

Balanço a cabeça, certificando-me de manter as feições leves.


Se for cuidadosa e realmente indiferente a isso, minhas chances
de sair livre são maiores. Eli sabe facilmente como puxar minhas
cordas na hora certa, e eu com certeza não vou lá. “Isso não vai
acontecer.”

Carter me lança um olhar curioso. “Você não gosta de jogar?”

Olho para os dois idiotas quando respondo. “Eu não gosto de


jogar com eles.”

O riso de escárnio de Eli e Gordo é impossível de deixar


passar.

MARIANA ZAPATA
“Vamos lá. Não seja uma desmancha prazeres”, meu gêmeo
murmura.

“Não estou sendo uma. Simplesmente não sinto vontade de


ser espancada”, explico para eles. Olho de volta para Carter e
suspiro. “Toda vez que jogamos no passado, acabei me
machucando. Meu lábio ficou preso na última vez, e tenho certeza
que meu cóccix foi fraturado. Também tive esse machucado maior
do que a cabeça de Eli ...”

“Precisamos de você na equipe”, insiste Gordo.

Eu apenas balanço minha cabeça.

“Pare de ser um bebê e jogue. Gordo promete não te dar uma


joelhada de novo, não é mesmo, Gordo?” Eli pergunta.

O homem de pele escura ao lado dele assente quase com


entusiasmo.

Eles estão tão cheios de merda.

“Prometo não te dar uma joelhada também”, Eli emenda em


seguida. “Podemos ficar no mesmo time, se isso te faz feliz.”

Bem, isso foi parte do problema quando jogamos no passado


também. Não costumo ser uma pessoa competitiva — um jogo é
apenas um jogo e se for o dia de alguém vencer, que seja — mas
quando se trata de fazer coisas contra Eli, é uma história
totalmente diferente. Competimos por atenção, amor, comida e
quase tudo desde o momento em que nascemos. Argumentar e
brigar por coisas é uma segunda natureza para nós.

Mesmo assim. A lembrança do meu lábio machucado ainda


está fresca em minha mente dois anos depois. Antes disso, houve
uma visita ao dentista para um novo preenchimento, um nariz
sangrando, uma torção nas costas, um tornozelo que deixou difícil
andar por duas semanas... a lista é interminável.

MARIANA ZAPATA
Também existem as porcarias que o time perdedor tem que
fazer. É todo o propósito por trás do jogo: envergonhar o perdedor.

“Vou dizer a Mason para não te enganar de propósito de


novo”, Eli finalmente acrescenta com um olhar de expectativa no
rosto. “Combinado?”

Eu hesito. Junto com o lábio sangrento no passado, havia


também um olho roxo, um cotovelo no centro do meu peito...

“Vai ser divertido”, Bryce, o cara da iluminação do TCC


sugere.

Vai ser divertido, eles disseram.

Apenas um jogo amigável, disseram.

Bem, eles são mentirosos. Todos eles.

Duas horas depois de finalmente me sentir culpada e


concordar em jogar, o ônibus sai do estacionamento onde
passamos a noite e nos deixa em um parque. A viagem irá durar
apenas quatro horas e, no meio da noite, chegaremos a Houston,
no Texas. Infelizmente, há mais do que tempo suficiente para
matar antes que precisemos chegar ao local, então não posso usar
isso como desculpa para não jogar. Todos nós saímos, vestidos
com shorts, camisetas e tênis.

Alguns de nós, inclusive eu, estamos ocupados colocando


protetor solar quando Gordo passa, cortando papel de um caderno
e dobrando em pedaços pequenos. Tem dois pedaços com estrelas
para quem ganhar a tarefa de capitão da equipe e nove pedaços
com os números “1” ou “2”, decidindo em qual equipe cada pessoa
acabará. Combinamos no ônibus que Eli e eu estaremos no mesmo
time, então escolho um papel para nós dois.

Essa parte corre bem. Não há problema.

MARIANA ZAPATA
Julian acaba como capitão da equipe “1” e Freddy, o gerente
de turnê/cara do som pega o outro pedaço de papel para comandar
a equipe “2”.

Julian, Mason, Sacha, Bryce, Isaiah e Mateo estão no


primeiro time.

Freddy, Carter, Gordo, Miles, Eli e eu estamos na equipe dois.

Ainda assim, não há problema.

Então eles decidem conversar sobre as ideias de tarefas que o


time perdedor fará como punição. Isso também não é incomum;
toda vez que joguei aquele estúpido Jogo de Futebol da Morte no
passado, houve alguma aposta acontecendo. Sempre foi algo
humilhante, então meus padrões não eram altos demais. Eu estou
praticamente pronta para algo envolvendo bundas nuas ou ser
escravo de alguém por um dia.

E então o idiota e burro Mason deixa escapar: “A equipe


perdedora tem que raspar a cabeça.”

Uhh...

“SIM!” Não tenho certeza de quem grita primeiro seu acordo,


mas gostaria de saber, para saber em quem dar um soco.

“Não!” Jogo meus braços no ar e olho ao redor para o grupo


de idiotas que não estão gritando o quão idiota é sua ideia. “Vocês
estão me sacaneando?”

Eles não estão.

Por que quase todos acham que isso é uma excelente punição
para o time perdedor está além da minha compreensão.

“A maioria vence”, eles dizem. Carter e eu parecemos ser as


únicas pessoas contra isso, e isso provavelmente é porque temos
o maior número de fios de cabelo entre as pessoas em turnê. Todo
mundo está tão confiante que seu time ganhará que não se
importa em correr riscos.

MARIANA ZAPATA
Todos os garotos estão com muito medo de quebrar
acidentalmente um dedo e decidem que não haverá goleiros em
nenhum time. Tudo bem.

Nós nos separamos em lados opostos, o time 1 decidindo jogar


sem camisa para que todos saibam quem está em cada time. Eu
posso ter olhado para os caras que estão em ótima forma — Mason,
Julian e Sacha — um pouco mais do que o necessário, mas não
me arrependo. Começamos a jogar.

Os primeiros quinze minutos são bons. Todos estão sendo


respeitosos um com o outro, felizes chutando a bola para frente e
para trás enquanto correm pelo campo. Troco sorrisos com alguns
dos caras do outro time enquanto tento me defender, e caso a bola
chegue na direção deles.

Bom. Bem. Está indo bem.

Em seguida, Mason, que jogou futebol no colégio, marca um


gol para sua equipe e é como se um pequeno animal tivesse sido
abatido na costa da África do Sul. Os tubarões saem para brincar
e a agressividade no campo se multiplica.

Minha resolução para vencer não surge do nada. De nenhuma


maneira vou raspar meu cabelo, e farei o que for preciso para isso
não acontecer. Além da corrida, joguei dois anos de futebol no
colégio, e convivi com esses caras a maior parte da minha vida.

Nos quinze minutos após aquele começo amigável inicial,


cada jogador começa a empurrar para frente e para trás na grama.
Quando Sacha segura a bola e parece que todos os outros
membros da minha equipe estão com os dedos na bunda em vez
de tentar acompanhar, vou atrás dele para roubá-la. Suas pernas
são mais longas que as minhas, mas aparentemente ninguém da
minha equipe sabe o que é exercício físico, então tenho que fazer o
trabalho. Sacha começa a colocar a mão na minha cara quando
chego perto demais, e tenho que tirá-la toda vez que ele faz isso.

MARIANA ZAPATA
“Pare de monopolizar a bola!” Grito com ele, tentando
inutilmente roubá-la.

“Se te incomoda tanto, tire-a de mim, então”, ele brinca antes


de passar para Mateo.

Entre os trinta e quarenta e cinco minutos, cada jogador


começa a correr o mais rápido que pode. Ninguém quer estar no
time perdedor. A bola viaja de jogador para jogador mais rápido do
que normalmente. Eu estou ficando desesperada. Suada como o
inferno, graças à umidade e ao sol que não parecem se importar
se passei protetor solar há muito tempo, começo a empurrar meu
ombro no tronco de Sacha para desequilibrá-lo toda vez que a bola
chega perto demais. A ideia de perder meu cabelo — porque eu
com certeza não tenho a estrutura óssea para viver com a cabeça
raspada — solta a fera de dentro de mim.

A bola vem direto para nós e disparo na direção dela. Então


avanço de novo e de novo.

E de novo.

Enquanto corro com a bola na ponta do pé esquerdo, ouço


Sacha ao fundo gritando: “Que diabos? Isso merece um cartão
amarelo!”

“Engula essa, Sassy!” Grito de volta para ele.

E então, realmente tudo sai do controle.

Mesmo que estejamos rindo, começo a cutucá-lo — um tanto


gentilmente — nas costelas, e o chuto na coxa outra vez. Não tão
inocente, Sacha puxa a ponta do meu rabo de cavalo e usa o ombro
para me afastar.

A última vez que corro passando por ele, ele agarra a parte de
trás da minha camisa para me puxar para baixo. Infelizmente, seu
peso me fez cair primeiro sobre o quadril, batendo a merda do meu
lado quando caio ao lado dele, ainda rindo. Sacha é esperto o
suficiente para pular, levantar e sair correndo para pegar a bola.

MARIANA ZAPATA
Minha camisa está encharcada de suor, meus braços e
pescoço doem com a exposição ao sol e tenho sujeira em cima de
mim. Então, não deveria ter sido uma grande coisa quando Sacha
surge em meu caminho, enquanto estamos correndo lentamente e
me empurra com tanta força que perco o equilíbrio e caio no chão
mais uma vez.

No último minuto, antes do cronômetro de uma hora tocar no


telefone de Gordo, Carter marca um gol que não entendo
completamente.

O que entendo é o que acontece em seguida. Cansados e com


todos à beira da morte, porque apenas três de nós correm
regularmente, ninguém quer jogar uma prorrogação. Então o jogo
vai para os pênaltis.

Pênaltis.

É Eli quem diz: “Um de vocês, perdedores do stand de vendas,


e Bryce devem ser goleiros. Eu voto em você, Flabs. “

Estou sentada na grama quando inclino a cabeça para trás e


faço uma careta para ele. “Como é?”

“Vocês três são as únicas pessoas que podem arriscar se


machucar”, ele diz como se fizesse total sentido.

Acho que meio que faz. Mas eu realmente quero deixar o


destino do meu couro cabeludo nas habilidades de goleiro de
Carter? Na verdade, não.

“Pode ser?” Julian pergunta.

Concordo, pensando no meu cabelo comprido. “Tudo bem.”


Olho para Carter e pisco. “Vou fazer isso.”

“Posso ir primeiro? Podemos nos alternar”, Bryce, o cara de


iluminação do TCC, pergunta sem nem mesmo brigar.

Esfrego as mãos no meu pescoço queimado de sol e assinto.


“Vá em frente.”

MARIANA ZAPATA
Eli é o primeiro e erra. Um pavor frio desce pela minha
espinha, e tenho que enterrar a cabeça entre as mãos quando
percebo o quanto estamos ferrados.

Levanto e faço uma prece baixinha enquanto marcho na


direção do gol desequilibrado.

“Não me decepcione, Flabby!” Eli grita.

Olho para ele enquanto ando de costas, balbuciando e


apontando “Isto é culpa sua.” Vou acabar careca. Sei disso.

A primeira pessoa a se levantar para chutar o pênalti é Mason.


Ele pisca para mim quando fica em posição. “Eu te amo, Flabbers,
mas esta bola vai entrar.”

“Cale a boca e chute.” Aceno, pronta para acabar com isso.

“Seu desejo é minha ordem, minha noiva.” Ele então me


manda um beijo.

Mal consigo desviar a bola alguns poucos centímetros com as


pontas dos dedos quando ele acerta. Sua equipe está gritando do
lado de fora, enquanto Eli e Gordo gritam comigo por na pegar.
Filhos da mãe.

Freddy em nossa equipe é o próximo e consegue marcar.


Nervosismo agita meu estômago, mas o empurro para o lado e foco
no que preciso fazer quando volto para o gol.

O próximo na equipe adversária é Julian, que não fala nada e


simplesmente chuta. A bola sobe e sou muito baixinha para
alcançá-la.

“Droga! Por que você não é mais alta?” O berro de Eli sai ao
mesmo tempo em que grito frustrada comigo mesma.

Miles, do meu time, é o último e marca.

Carter vem atrás de mim e aperta meu ombro. “Gaby, não


ficarei brabo com você se perdermos.”

MARIANA ZAPATA
Dou um tapinha na mão dele e sorrio tristemente. “Obrigada,
lembre-se disso mais tarde, ok?”

O último jogador a chutar é…

Sacha

Ele sorri para mim quando dá uma dúzia de passos para longe
da bola e fica em posição. “Você está pronta para perder?”

Aperto os olhos e grito. “Manda ver, Sassy Pants1.”

Ele levanta uma sobrancelha e dá um enorme sorriso. “Você


pediu isso”, responde, ficando em posição.

Objetivo de Sacha: colocar a bola no gol.

Objetivo da bola: quebrar meu maldito rosto.

Não é realmente culpa de Sacha que a bola faz uma curva no


último minuto e minhas mãos estão no ar quando a bola fica
íntima do meu queixo.

Nunca entrei em uma luta antes, e de repente percebo o


porquê. Ser atingida no rosto não é legal. Nunca. Eu sei que de
fato grito, agarro meu queixo com ambas as mãos e possivelmente
falo: “Por que você fez isso comigo?” Antes de cair de joelhos no
chão.

Sacha — como aprendi rapidamente — é um idiota. Consigo


ouvi-lo rindo enquanto corre até mim e fica de joelhos em algum
lugar perto. As risadas histéricas vindas do meu irmão e de seus
amigos são um ruído de fundo que não posso ignorar.

“Gaby, oh meu Deus, eu sinto muito!” A voz inconfundível de


Sacha está no meu ouvido, horrorizada e divertida ao mesmo
tempo de alguma forma. “Você está bem?” Uma mão pousa em
cima da minha e outra aperta a parte de trás da minha cabeça.

1 Sassy Pants = apelido para alguém atrevido, petulante, audacioso

MARIANA ZAPATA
“Não!” É a verdade.

Meu rosto.

Meu rosto está quebrado.

Ele tem a coragem de rir mais, aproximando-se mais para que


seus joelhos nus e sujos pressionem contra meus próprios joelhos.
“Sinto muito.”

Ele praticamente gargalha não me permitindo acreditar em


suas desculpas.

Não tenho certeza de quanto tempo fico lá sentada, apertando


meus olhos fechados com o queixo entre as mãos, Sacha segura
minhas mãos em uma das suas e a parte de trás da minha cabeça
com a outra. Leva tudo em mim para não chorar, porque sério,
meu queixo lateja tanto que meu cérebro doí. Até meus dentes
parecem moles. Quando o desejo de chorar finalmente passa, pisco
para ver aqueles olhos translúcidos olhando para mim com
preocupação. Isaiah, Carter e Gordo estão atrás do homem que
acaba de chutar uma bola no meu rosto, visivelmente
preocupados.

“Me deixa dar uma olhada”, Sacha diz gentilmente, tirando


minhas mãos, uma de cada vez. Uma vez que ele cutuca com os
dedos e me faz estremecer, deixa as mãos cair em seu colo.

“Você está bem?” Carter pergunta, palmas cobrindo os


joelhos, o rosto rosado e angustiado.

Concordo, ainda segurando meu rosto e dizendo a mim


mesma que mulheres adultas não choram de humilhação.

“Você tem certeza?”

Concordo novamente.

Ele não parece convencido. “Eu vou pegar um pouco de gelo,


ok?”

MARIANA ZAPATA
Sim, não consigo segurar minha fungada. “Obrigado, Carter.”

Sacha dá um tapinha nas minhas costas. “Vamos nos sentar


ali, princesa.” Ele levanta primeiro, estendendo a mão para eu
segurar. Depois de me puxar para cima, me acompanha até um
dos bancos próximos. “Sinto muito”, ele continua repetindo,
sorrindo mais do que deveria, mas posso dizer que sente remorso
pelo menos. Se fosse algum dos meus irmãos que tivesse feito isso,
eles teriam morrido de rir no chão.

Com a visão periférica, posso ver Eli discutindo com Mason e


Julian. Quando chegamos ao banco, meu irmão gesticula
descontroladamente e aponta na minha direção.

“Você tem certeza de que está bem?” O homem sentado ao


meu lado pergunta, seu corpo todo inclinado em direção ao meu.

Volto a segurar meu rosto. “Sim. Estou bem.”

“Positivo?”

Concordo.

“Não estou brincando. Você tem certeza?”

Dou a mesma resposta. Estou bem. Mais ou menos.

Os cantos de sua boca puxam para baixo apenas um pouco,


seus olhos vagando pelas minhas bochechas e mandíbula. Depois
de um minuto de silêncio, ele sorri gentilmente para mim, suas
sobrancelhas escuras subindo levemente. “Isso foi muito divertido,
não foi?”

“Sim”, fungo novamente, “até que você tentou quebrar meu


queixo.”

“Foi um acidente!” Ele franze a testa, estendendo a mão para


colocá-la no topo da minha cabeça suavemente. “Estou tão
arrependido, não posso te dizer como sinto muito. Você quer me
bater?”

MARIANA ZAPATA
Concordo com a cabeça.

Os cantos de sua boca contraem novamente. Ele ainda está


lutando para não rir, não importa que se sinta mal. “Eu realmente
me sinto horrível. Não posso acreditar que isso aconteceu. “

Me certifico que ele esteja observando enquanto reviro os


olhos, mas sorrio depois. “Está tudo bem. Não é a primeira vez que
tenho uma bola chutada no meu rosto.”

Sacha tem essa expressão que é uma mistura perfeita de uma


carranca e um sorriso. “Se isso faz você se sentir melhor, você
chutou minha bunda algumas vezes no campo.” Olho para ele.
Manchas marrons e verdes cobrem sua camiseta e shorts, e juro
que há alguma lama enredada nos pelos da perna. Se ele não fosse
tão bonito, pareceria um sem-teto. “Você joga sujo.”

Eu apenas encolho os ombros para ele. Qual é o ponto em


negar?

“Você vai me perdoar?”

“Não.” Faço uma careta e pisco para ele. “Sim.”

Carter vem correndo até nós um momento depois com uma


sacola plástica cheia de gelo. “Aqui está”, diz ele, entregando-a.

Agradeço e pego a bolsa de gelo; minha mão mal deixa meu


queixo quando os dois homens assobiam. Congelo no lugar. “Está
muito ruim?”

Carter diz “não” ao mesmo tempo em que Sacha faz uma


careta e inclina o queixo para baixo apenas o suficiente para ser
entendido como um aceno de cabeça.

Ele nem tenta me enganar. O “sim” que sai de sua boca é alto
e claro.

Ah inferno.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 7

Vejo o rolinho de canela primeiro — é claro — antes de ver o


longo dedo masculino empurrando o pequeno prato de plástico em
minha direção. Não preciso olhar para cima para saber a quem
pertence. Fecho o livro devagar —essa semana estou lendo a
História de Edgar Sawtelle — e o deposito na mesa do stand de
vendas.

Sacha está parado ali, ainda em suas roupas normais,


embora as portas estejam prestes a serem abertas a qualquer
momento. Seu rosto está arrependido e esperançoso e muito doce
para eu continuar chateada. “Eli disse que são seus favoritos”, ele
oferece.

Rolinhos de canela não são meus favoritos; são os de Eli. Sou


mais do tipo donut com cobertura. Mas não digo isso a ele, e
também não faço uma careta, principalmente porque dói muito. A
verdade é que tudo dói, mas é meu rosto que mais incomoda. Certa
vez trabalhei com uma mulher que nunca sorria porque dizia que
não queria desperdiçar o colágeno em seu rosto. Naquela época
não entendi como diabos isso era uma ideia sensata, mas do jeito
que meu rosto está doendo... sim, estou evitando expressões
faciais.

“Obrigada”, agradeço a ele como uma mulher madura que


não está focada no hematoma enorme em sua mandíbula porque
realmente não estou. Foi um acidente. Além disso, não é como se
nunca aconteceu algo pior comigo.

Meu novo corte de cabelo, por outro lado, é uma história


diferente.

MARIANA ZAPATA
Subconscientemente, meus dedos tocam a parte da minha
cabeça diretamente acima da orelha direita, até que meu cérebro
lembra que não há mais cabelo lá. Há uma penugem. Há penugem
onde meu cabelo costumava estar. Vinte e quatro horas atrás, meu
amigo de vendas passou uma máquina de cortar na minha cabeça.

Carter se tornou o escolhido porque confiei que ele não teria


um “acidente” raspando também minhas sobrancelhas. Além
disso, obviamente, ele tem experiência raspando a parte de trás da
sua cabeça como um profissional toda semana. Desde o corte de
cabelo, racionalizei que existem coisas piores no mundo do que um
terço de sua cabeça raspada. Coisas como tratamento de canal.
Câncer. Cãibras no meio da noite.

E nem sofri muito.

As palavras que saíram da boca de Julian quando voltamos


para o ônibus da turnê depois da minha quase reconstrução facial
foram “Decidimos que você não tem que raspar toda a sua cabeça
já que... você sabe”, ele apontou na minha direção, traçando a
forma de um círculo com o dedo indicador.

Ele disse isso como se eu devesse ficar de joelhos e beijar seus


pés por conseguir tal arranjo.

Então ele acrescentou: “Tem certeza de que não precisa ir ao


hospital?”

Realisticamente, não fiquei surpresa. Apenas fiquei surpresa


deles não quererem se vingar em meu couro cabeludo. Felizmente,
Eli não estava no time adversário, caso contrário, tenho certeza
que pediria para rasparem minhas sobrancelhas também... talvez
até falar algo sobre raspar meu lábio superior, sendo um
espertinho. Quando cortaram os cabelos longos e pretos de Carter,
sem que ele piscasse, tentei me acalmar. Eli resmungou durante
seu corte, mas conseguiu. Em seguida, o resto dos caras passou
pelo mesmo com pequenas queixas.

MARIANA ZAPATA
Seria eu a única a ter vantagem quando todo mundo passou
por isso? Não.

Tudo o que ouvi quando sentei na cadeira que eles colocam


do lado de fora do local do show foram os cortadores conectados a
um cabo de extensão, e Mason perguntando a Carter: “Você pode
fazer isso?”

Carter respondeu: “Sim.” Então ele fez uma pausa antes de


perguntar: “Gaby, você quer um espelho para ver o que estou
fazendo?”

“Não.” Absolutamente não. “Apenas lembre o quanto gosto de


você, ok? Não esqueça.”

E foi assim que acabei com o que eles, brincando, chamam de


corte de cabelo da “Garota Viking. “ Um terço do meu cabelo foi
raspado acima de uma orelha, da testa até a parte de trás do
pescoço. Poderia ter sido pior, mas mesmo assim. Não sou tão
vaidosa, mas o cabelo de uma garota — seja ele curto ou comprido
— é o cabelo dela. Não sofri a toa com aqueles laços de cabelo
dolorosos com bolas nas extremidades quando criança. Além
disso, não é como se eu tivesse maçãs do rosto finas e um rosto
comprido. Em um bom dia, alguém pode dizer ele tem forma de
coração.

“Eu realmente ...” Sacha começa de novo, me tirando das


memórias do dia anterior.

“Está tudo bem”, asseguro a ele, observando seu rosto


enquanto os olhos percorrem o grande ponto vermelho que cobre
do meu queixo até a metade do caminho para o meu ouvido.

Ele franze a testa, mas joga a bunda no canto da mesa branca,


suas mãos no colo. “Eu me sinto um merda.” Aqueles olhos
cinzentos caem para o meu queixo, o estremecimento em seu rosto
é mais do que perceptível.

MARIANA ZAPATA
“Prometo que está tudo bem. Sei que foi um acidente.” Sorrio
para ele, um sorriso enorme, ignorando a pontada de dor vinda do
meu queixo. “Você não está na minha lista de assassinatos.”

Sacha pisca muito seriamente. “Quem está nela?”

Enxugando as mãos no short, arranco um pedaço do rolinho


de canela. “Mason ...”

Ele assente, entendendo por que coloquei Mase na lista. Ele


estava muito ansioso para garantir que minha cabeça fosse
raspada.

“Ainda estou em cima do muro com Freddy por errar seu


chute...”

Nesse momento Sacha dá de ombros.

“E meu irmão.” Definitivamente meu irmão.

Ele morde o interior de sua bochecha. “Pensei que ele tentaria


brigar comigo depois que chutei a bola em você.”

Sim, isso me fez rir. “Fico surpresa por ele não comemorar ou
tentar lhe dar um abraço.”

Ele faz uma pausa.

E a pausa diz tudo.

Abro minha boca. “Ele fez isso, não é?”

Quieto, ele assente com uma expressão envergonhada no


rosto. “Ele me deu um abraço e disse que me devia uma bebida.”

Chamaria meu irmão de traidor e idiota se não conhecesse Eli


melhor. Mas conheço, e se ele tentasse me proteger, estaria me
perguntando se ele está morrendo ou algo assim.

Por outro lado, Sacha não sabe como ele é implacável. “Eu
devo sufocá-lo com um travesseiro quando tiver a chance, juro.”

MARIANA ZAPATA
Sacha dá um grande sorriso enquanto arranco outro pedaço
do pãozinho e como. “Você disse que ele é apenas um pouco mais
velho que você?” Concordo com a cabeça. “Você é mais nova?”
Concordo novamente. “Sou o mais novo de cinco irmãos. Me
tratam como bebê. Eles ainda me chamam de Sasquatch – o Pé
Grande, por causa da sonoridade do nome.”

Minha boca fica boquiaberta por um segundo antes de


lembrar que há pão dentro dela. “Sasquatch?”

“Sasquatch”, ele confirma. “Eles me chamaram de Sacha


talvez duas vezes em toda a minha vida. O resto do tempo é “aquele
maldito Sasquatch” ou apenas “Sasquatch”.”

“Meninas ou meninos?”

“Quatro irmãs.” Ele balança a cabeça como se tivesse um


flashback de algo traumatizante com elas. “Elas são comigo como
Eli é com você.”

“Elas costumavam pegar chatos e propositalmente não lavar


o vaso sanitário?” Pergunto com um bufo.

Sacha sorri, passando a mão pelos cabelos mais longos no


topo da cabeça. Suas tatuagens aparecem contra a pele pálida,
largas faixas de tinta que cobrem o comprimento de seu braço.
“Pior, elas deixavam seus absorventes por todo o lugar. Quando eu
era jovem — minha irmã mais velha é quase 14 anos mais velha
que eu — colocavam vestidos em mim e diziam que nossos pais me
deram o nome de Sacha porque eu era realmente uma garota.”

De alguma forma consigo segurar a risada subindo pelo meu


nariz e mantenho minhas feições ainda mais sérias quando
pergunto: “O que você está tentando me dizer é que não é uma
garota?”

Ele olha para mim. “Lembra quando disse que você era
engraçada? Mudei de ideia. Você não é.”

MARIANA ZAPATA
Tudo que posso fazer é sorrir apesar da dor que atinge a
metade inferior do meu rosto.

O esforço que ele está fazendo para não rir é completamente


óbvio, especialmente quando levanta as sobrancelhas escuras.
“Não pense que não ouvi você me chamar de Sassy antes de me
empurrar no chão.”

O que posso fazer? Negar? “Pergunte-me se estou


arrependida?” Não espero que ele responda. Faço um círculo com
o polegar e o indicador e levanto para ele ver. Sassy Sacha.

Antes que ele possa responder, uma voz que reconheço


preenche o espaço vazio de Dallas. “GABRIELA!”

“É minha mãe, corra”, sussurro quando me inclino para


espionar a mulher que nunca me deixa esquecer como foi difícil
carregar gêmeos por quase nove meses. Ao lado dela estão meu
pai, Rafe e duas sobrinhas. Do outro lado da minha mãe está Eli
com o braço ao redor dela, nosso irmão mais velho Gil e minha
outra sobrinha.

Levanto a mão e aceno, mentalmente me preparando para a


tempestade de merda que normalmente anda de mãos dadas
quando toda a família Barreto está junta. Insultos, maldades e
gritos são partes essenciais de uma família que é metade brasileira
e metade italiana.

“Você não lembra que tem uma mãe?” Minha mãe grita
enquanto toda a família continua andando pelo local em minha
direção.

“Como posso esquecer!” Grito de volta para ela com um


sorriso fraco.

Ela visivelmente balança a cabeça ao mesmo tempo em que


meu pai dá um sorriso e um aceno silencioso. Enquanto meus pais
são ótimos e você pode dizer que se amam, muitas vezes me
pergunto como fazem as coisas funcionar nos últimos trinta e oito

MARIANA ZAPATA
anos. Mamãe e papai são opostos que frequentemente discordam
de tudo, desde o carro que devem usar para ir a igreja, até se o
gramado pode ser cortado na próxima semana ou não.

As duas filhas de Rafe gritam: “Tia Gaby!” Um segundo antes


de sair correndo. Certifico-me que Eli veja meu sorriso pelas
reações de nossas sobrinhas, já que sempre discutimos quem elas
amam mais.

Izabella e Heidi, de quatro e seis anos, gritam até estarem a


um metro e meio de distância quando de repente param... e ficam
boquiabertas.

Nenhuma delas reage verbalmente à minha transformação.

Gil faz isso. “O que...”, ele olha para sua filha, “você sabe o
que aconteceu com você, Demi2?”

Meus irmãos, Gordo e Mason realmente trazem o pior de mim.


Mostro minha língua para ele. “A questão importante aqui é: como
você sabe usar essa referência?”

Ele inclina a cabeça para a criança de nove anos ao seu lado.


“Disney Channel o dia inteiro, todos os dias.”

É o forte estalo de uma palma encontrando a carne que me


faz olhar para Eli, que segura a cabeça com as duas mãos,
franzindo a testa para Rafaela. “Que diabos é isso?”

A segunda filha mais velha dos Barreto, quando na realidade


ela sempre pareceu ser a mais madura, franze o cenho para meu
irmão mais novo. “Por que você fez isso com ela?”

“Eu não fiz!” Eli franze a testa, aproximando-se da nossa mãe


muito zangada com Rafe por machucar seu bebê.

“Você perdeu de novo?” Nosso pai pergunta.

Referência à época que Demi Moore raspou o cabelo em 1997 para fazer o filme Até o Limite da
2

Honra.

MARIANA ZAPATA
“De novo?” Sacha sussurra em voz baixa, e não posso deixar
de cutucá-lo no lado.

O que realmente me atinge sobre a pergunta é que eles ou


esperavam que Eli fosse o culpado ou eu fosse culpada por ser
desastrada.

“Nós jogamos o Jogo de Futebol da Morte ontem”, explico,


andando ao redor da mesa para que possa abraçar o clã inteiro,
estremecendo toda vez que um deles toca o lado do meu corpo que
absorveu o impacto quando Sacha me atacou durante o jogo.

O “ahhh” que sai deles ecoa pelo local. Todos já ouviram falar
do jogo, até as meninas, que abraço primeiro.

Izabella, a mais nova de Rafe, afasta-se de mim depois que me


ajoelho para abraçá-la. Seus pequenos olhos, o mesmo tom de
verde dos meus e do meu pai, se concentram no hematoma do meu
rosto. Ela ergue a pequena mão como se quisesse tocar, mas
estivesse com muito medo. “Dói?” Iza sussurra, seus dedos se
curvam no ar hesitantes.

“Sim.” Por que fingir que não? Dói e seria uma mentirosa ao
negar. De qualquer maneira, tenho a sensação de que Iza me
conhece muito bem. Ela descobriria minha mentira e não seria a
primeira vez.

Ela então olha nos meus olhos. “Você chorou?” Testando. Ela
está me testando e estou ciente disso.

Ouço Sacha fazer um barulho atrás de mim, mas mantenho


o foco na minha sobrinha. “Um pouco.”

Então ela faz isso. A menininha com quem passo incontáveis


horas, minha pequena parceira no crime, me joga para os leões.
“Como quando seu namorado terminou com você? Ou nem perto
disso?”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 8

No momento em que o ônibus para, dou uma cotovelada em


Gordo com um “Mova-se, otário”, com a única intenção de ser a
primeira a sair dali. Laila mandou uma mensagem avisando que
já está esperando no local em San Antônio, e com certeza a vejo
atravessando o estacionamento.

Depois de Houston, do nosso jogo de futebol e minha cabeça


raspada, Dallas com minha família e outra parada em Austin —
estou pronta para me afastar dos caras que me deixam louca e ver
minha melhor amiga.

Com um metro e meio e um sorriso que cobre todo o rosto,


Laila parece uma lufada de ar fresco depois de estar cercada por
tanta testosterona. No segundo em que estamos perto o suficiente,
ela coloca os braços em volta do meu tronco e a abraço acima dos
ombros, onde ela pode se encaixa perfeitamente sob o meu queixo.
Os pedais em sua cadeira de rodas cravam em minhas canelas,
mas não me importo.

Há algo nos abraços e no calor de Laila que sempre irradiam


compreensão e conforto. Há também o fato de que ela não me julga
quando rio de coisas que não devo. Mesmo nunca tendo desejado
outro irmão para substituir os três que já tenho, amo Laila
ferozmente.

Sobrevivemos ao ensino médio juntas. Ficamos amigas


mesmo depois que ela e sua mãe mudaram para San Antonio para
ela ir à escola, e saí em turnê com a Ghost Orchid. Então ela me
deixou viver com elas quando tive que sair da casa do meu ex.

Ela ainda está me abraçando forte quando finalmente fala.


“Estou tão feliz em ver você!”

MARIANA ZAPATA
“Estou tão feliz em vê-la também, sua preguiçosa.” Faço um
gesto para a cadeira de rodas antes de lhe dar outro abraço
esmagador.

“Não senti vontade de lidar com meus aparelhos o dia todo”,


explica.

Faço uma careta para ela só para incomodar, mas realmente,


sei o quão difícil seria para ela ficar de pé por um período tão longo.
Alguém só precisa criticá-la para que ela continue andando o
máximo que puder. Afastando-me, dou um passo para trás e olho.
Magra, cabelos escuros e uma cor caramelo clara que é excepcional
em sua pele, herdada de sua mãe cubana e do pai caimão, sempre
acho que ela tem o rosto e a personalidade de uma princesa de
desenho animado.

Demora um segundo para perceber que o cabelo dela está


cortado na altura dos ombros. “Quando você cortou o cabelo?”

Laila pisca para mim. “Quando você cortou o cabelo?”

“Essa é a surpresa que falei”, explico, tocando com os dedos


a parte raspada suavemente. O resto do meu cabelo está em um
rabo de cavalo baixo, mas ainda não consigo esconder o óbvio
corte. “Surpresa!” Murmuro, mexendo os dedos da maneira mais
desanimada possível.

Ela apenas olha para mim antes de perguntar lentamente:


“Mas que merda, Gabba. Essa é a punição do perdedor do Jogo de
Futebol da Morte?”

Balanço a cabeça. Já contei a ela sobre a bola que me acertou


no queixo. Pessoalmente, o enorme hematoma confirma a história.

Ela inclina a cabeça para olhar para mim e finalmente


assente, quase sagazmente. “Você teve sorte que eles não
rasparam toda sua cabeça, pelo menos. Você parece fofa assim,
mas se fosse tudo...” Ela solta um pequeno assobio e alarga suas

MARIANA ZAPATA
narinas. Claro, ela é doce, mas a honestidade que sai de sua boca
às vezes, é brutalidade recoberta de doces no seu melhor.

Laila abre a boca por uma fração de segundo antes de fechá-


la ao mesmo tempo em que arregala os olhos. Viro a cabeça um
pouco para ver quem ela está vendo. Sacha, Freddy e Julian saem
do ônibus e estão olhando na nossa direção atentamente de seus
lugares a seis metros de distância.

“Esses caras estão na turnê?” Ela sussurra.

“Sim e pare de babar, sua vadia cheia de tesão.”

“Não estou babando.” Laila se mexe na cadeira de rodas, as


mãos pequenas segurando o braço. “Mudei de ideia, preciso ligar
para minha mãe e dizer a ela para trazer minhas muletas.”

Bufo e puxo a alça de seu sutiã por baixo da blusa.

Ela nem sequer faz uma careta quando o material estala


contra sua pele; porque está tão focada nos três homens ali perto.
Seus olhos castanhos sobem para os meus. “Qual deles é o cara,
Sacha, que você me contou?”

“Como você sabe que é um deles?”

“Porque, se bem me lembro, sua mensagem disse: ‘Acabei de


chutar na bunda o cara mais gostoso que eu provavelmente já vi’.
E perguntei a você como ele era e você me mandou uma mensagem
de volta, ‘Como um cheeseburger duplo com bacon que eu daria
uma mordida’.”

Aparentemente, ela engoliu a informação como uma


prostituta faria com um pênis. Porque tudo bem, parece certo. Dou
a ela uma olhada. “Ele é o do meio com a tatuagem da manga”,
murmuro.

Laila solta outro pequeno assobio baixo. “É o mesmo cara que


chutou a bola na sua cara?”

“Sim.”

MARIANA ZAPATA
“Apresente-nos”, ela exige com um sorriso, olhando para
mim.

Que putinha.

“Sim senhora.” Curvo-me para ela, ganhando um beliscão na


parte de trás do meu joelho. “Siga-me, Wheels (rodas).” Ela me
belisca ainda mais forte.

Em circunstâncias normais, eu me ofereceria para empurrar


sua cadeira de rodas, mas somos amigas há mais de dez anos, e a
conheço como a palma da minha mão. Poderia citar todas as suas
comidas favoritas, as coisas que a irritam, o tamanho e estilo de
suas roupas e até mesmo que tipo de absorventes ela prefere.

E sei que ela não quer que eu empurre sua cadeira de rodas
quando vamos conhecer novas pessoas que acha atraentes. Ela
vem lutando por sua independência toda a sua vida, e estive com
ela em cada passo do caminho. Por causa de sua espinha bífida, a
maioria das pessoas tenta andar na ponta dos pés ao redor dela.
Eu não posso dizer que não tentei sufocá-la nos primeiros anos em
que nos tornamos amigas, mas agora conseguimos encontrar um
jeito. Ela gosta quando não lhe dou tratamento especial e sempre
brinco já que a maior parte das pessoas não faz.

No momento em que estamos perto o suficiente, sorrio para


os membros do TCC.

É Sacha quem fala primeiro. “Oi.”

“Oi. Esta é minha amiga Laila.” Acho que faço essa coisa
estranha com a mão, desenhando uma linha entre os dois, mas
não tenho certeza, pois não presto atenção quando Sacha estende
a mão e aperta a mão da minha melhor amiga.

“Prazer em conhecê-la”, ele diz depois de se apresentar.

Freddy e Julian fazem o mesmo.

MARIANA ZAPATA
Honestamente, fico aliviada por eles não começarem a agir de
maneira estranha ou falar alto. As pessoas fizeram isso com ela
antes por algum motivo que não entendo direito. Eles acham que
ela tem problemas de audição porque está em uma cadeira de
rodas? Não tenho certeza, e isso me irrita muito mais do que a
incomoda.

São as pequenas coisas que as pessoas fazem umas às outras,


que mais importam para mim. Aprecio o quão normal eles estão
sendo.

“O que você vai fazer hoje?” Sacha pergunta.

“Ficar por aqui”, respondo. “Preciso descarregar o trailer e


depois vamos comer algo.”

O homem que acredito ter inspirado os criadores do jogo


Hungry, Hungry Hippos— Hipopótamos Famintos — anima-se com
a menção de sua palavra favorita, comer.

Nem preciso perguntar a Laila se há problema em convidá-lo


— todos eles — porque sei a resposta. Além disso, é meio rude da
minha parte não convidar o homem que vai comer comigo toda vez
que peço. “Nós vamos comer pho no restaurante vietnamita.”

“Eu amo pho”, ele responde.

Claro que ama.

“Ele é muito fofo, Gaby”, afirma Laila enquanto me ajuda a


dobrar as camisas atrás da mesa de vendas poucas horas depois.

“Quem? Você flertou com todos eles, exceto Gordo”, eu rio


dela. Eli, Mase e Gordo também foram comer na nossa lanchonete
favorita.

“É inútil flertar com Gordo”, ela diz, como se eu já não


soubesse. “E você sabe de quem estou falando.”

MARIANA ZAPATA
Claro que sim. Ela me beliscou debaixo da mesa toda vez que
ele falou. As contusões vão aparecer mais tarde.

“Ele tem namorada?” Ela pergunta quando tudo que faço é


gemer em resposta.

Eu me inclino para pegar outra pilha de camisas que baguncei


durante um pico de clientes na noite anterior. “Não sei; acho que
não.”

“Você já o ouviu falar com alguém por longos períodos de


tempo?” A investigadora Laila pergunta.

“Não.” Olho para ela pelo canto do meu olho. “Não é como se
eu passasse o dia todo com ele ou qualquer coisa, Lai. Estou no
stand a maior parte do tempo; não sei o que acontece quando estou
aqui e todo mundo está lá fora.”

“Eu sei, mas acho que você sabe.” Ela faz uma pausa,
entregando-me as duas camisas que terminou de redobrar. “Só
digo que ele é muito fofo e parece o seu tipo.”

Isso me faz virar todo o corpo para olhá-la.

“Está bem, está bem. Ele é quase o tipo de todo mundo, mas
vocês dois estão flertando.”

Eu engasgo. “Não estamos flertando, apenas brincando.”


Muito.

“Isso é flertar, sua maldita mentirosa.”

“Talvez um pouco...”

“Ele jogou um guardanapo enrolado em você e te chamou de


princesa duas vezes”, Laila afirma.

Tusso. “Estamos sempre brincando uns com os outros”, tento


explicar antes de perceber que estou cavando um buraco mais
profundo. Ela simplesmente não entende.

MARIANA ZAPATA
Ela suspira e toca meu joelho. “Isso não ajuda a ganhar seu
caso. Eu te amo e quero que você seja feliz, Gab. Isso é tudo.”

“Eu sou feliz.”

“Você sabe o que quero dizer.”

Balanço a cabeça para ela e cutuco a mão dela com a minha.


“Eu sei, eu sei, e juro que estou muito melhor agora do que antes
de sair.”

Laila levanta uma sobrancelha, que rapidamente cobre


sacudindo uma camisa na frente do rosto. “Você não quer mais
matar Brandon, então?”

“Iria me conformar se ele tivesse um caso muito grave de


hemorroidas.”

Laila joga a cabeça para trás e ri. “Hemorroidas inflamadas e


sangrando.”

Há uma razão pela qual nossa amizade sobrevive por tantos


anos. Nós apoiamos uma à outra.

Quando me afasto, tenho um grande sorriso no rosto. “Se eu


nunca mais o ver, ficarei perfeitamente feliz.”

Horas depois, sei que algo está acontecendo quando Eli


manda uma mensagem.

Você quer tirar a noite de folga?

Mason, Gordo e ele amam seus fãs, mas vender mercadorias


é algo que nenhum deles gosta. Eles não conseguem fazer nada
porque as pessoas querem conversar com eles mais do que
comprar qualquer coisa.

Quando mando mensagens para Mason e Gordo e não recebo


resposta, meu sentimento se confirma. Esses dois seguram seus
telefones, como se o fim do mundo fosse começar se perderem uma

MARIANA ZAPATA
ligação ou mensagem de texto. Laila está sentada atrás da mesa
de vendas comigo e se oferece para ficar de olho nela depois que
mostro a mensagem. Tento meu melhor para atravessar a multidão
o mais rápido possível, sem ter que acotovelar muitas pessoas. Mal
chego ao corredor atrás do palco quando vejo Gordo andando do
lado de fora da sala verde.

Seus olhos escuros, quase negros, se arregalam quando ele


me vê chegando. “Você está saindo?” Ele pergunta, coçando a
sobrancelha com um único dedo indicador.

Balanço a cabeça em resposta. “Não. O que está


acontecendo?”

“Nada”, o filho da puta responde rápido demais. Ele é pior em


mentir do que eu.

Estreito os olhos para ele. “Gordis.”

Ele estremece e imediatamente suspira em derrota. O homem


é a pessoa mais fácil para quebrar do universo. Eu nunca confiei
nele com um segredo porque ele quebra em segundos. “Brandon
está aqui.”

Acho que se eu ouvisse essas palavras há dois meses, mais


do que provavelmente quebraria coisas enquanto sairia em direção
a ele para destruir seu rosto — onde quer que fosse.

Mas a parte surpreendente é que me encontro sem o menor


desejo de fazer exatamente isso. Quer dizer, que tipo de coragem
ele tem de vir em um show que sabe que meu irmão está tocando?
Nunca pensei que Brandon fosse idiota, mas acho que o julguei
mal. Eu não quero ver o rosto dele, e definitivamente não entendo
de onde ele tirou tanta coragem.

Essa turnê é minha casa. Minha família. Meu lugar.

E eu com certeza não deixarei que ele me faça fugir na


esperança de não vê-lo. Dei a ele muito poder sobre a minha vida

MARIANA ZAPATA
no mês depois que terminamos, e nunca darei isso a ele ou
qualquer um novamente. Eu espero.

Foda-se. Isso.

Balanço a cabeça para Gordo e até sorrio quando seu rosto


assume uma expressão de “oh merda”. “Ok.”

Estou bem, e aquele filho da puta irá aprender o quão bem


estou. Talvez eu tenha sido pega completamente de surpresa
quando ele terminou tudo, mas aposto que ele ficará muito mais
surpreso antes que a noite acabe. Vou direto para a sala verde da
The Cloud Collision, sabendo que eles são a razão pela qual
Brandon está no show.

Ele odeia shows. Disse isso para mim pelo menos uma
centena de vezes nos dois anos em que estivemos juntos.

Quando chego ao quarto dos fundos, encontro Sacha e Isaiah


se preparando para o show. Sacha está em pé no canto da sala
tirando coisas de uma pequena bolsa de náilon que o vi pegar antes
do show. Dentro dela há algum tipo de massageador, chá e um
óleo que ele aplica em sua garganta antes de iniciar seu
aquecimento vocal. Ele já está meio vestido para a noite em suas
calças e camiseta. Isaiah, por outro lado, tem seu violão no colo,
conectado a um pequeno amplificador de ensaio. Quando Isaiah
nota que estou ali, faz sinal para eu entrar.

“Está tudo bem?” Ele pergunta.

Limpo a garganta e concordo. “Sim, está tudo bem. Só me


perguntei se você viu Brandon?”

Sacha se vira. A expressão em seu rosto é de pura


curiosidade.

“O guitarrista do Screaming Ivy?” Isaiah pergunta.

Tenho um comentário imediato para acabar com a menção


daquela banda terrível, mas seguro de volta. O que diabos estava

MARIANA ZAPATA
pensando ao namorar alguém que toca em uma banda com um
nome tão estúpido? “Sim.”

“Acho que ele está no ônibus com Julian e Miles”, responde


Isaiah. Miles é o nome do baixista do TCC.

Os lábios de Sacha se contorcem enquanto caminha até onde


Isaiah está sentado e senta sua bunda no braço da cadeira. “Você
o conhece?”

Eu juro que não posso deixar de rir enquanto endureço minha


espinha e me preparo para rasgar meu ex idiota. “Sim. Conheço.”
Esfrego as mãos sobre minhas coxas e lhes dou um sorriso que é
provavelmente mais cruel do que precisa ser. “Obrigada por me
dizer. Tenham um bom show hoje à noite, ok?”

Mal dou três passos para fora da sala quando sinto uma mão
no meu cotovelo. Sem olhar sei que é Sacha que está me puxando
de volta para ele. Seus olhos estão cautelosos. “Por que sinto que
você está prestes a fazer algo ruim?”

“Porque estou”, rio, dando um passo à frente, um passo para


mais perto da minha missão. “Estou brincando. Juro que não vou
fazer nada de mal. Eu só preciso ir falar com ele por um minuto.”

Aqueles olhos cinzentos varrem meu rosto. “Vocês são


amigos?”

Limpo a garganta e luto contra o desejo de coçar a orelha.


“Nós namoramos.”

“Esse cara é seu ex?” Ele pergunta depois de uma breve


pausa.

Ele ouviu mais do que o suficiente sobre o meu infame ex da


minha família na noite anterior. Especialmente da Iza, traidora.
Droga.

Balanço a cabeça completamente sem entusiasmo. “Sim.”

Ele levanta uma sobrancelha. “Mas vocês não são amigos?”

MARIANA ZAPATA
Balanço a cabeça. Eu deveria ter me concentrado no fato de
que ele é tão insistente em perguntar se meu ex e eu somos amigos
ou não, mas não percebo. “Não. Eu chutaria minha bunda se
fôssemos amigos.”

Sacha sorri para mim, aquele grande sorriso que poderia


iluminar a Main Street na Disneylândia. “Eu te ajudo se você
quiser.”

“Você já ajudou.” Sorrio para o seu bumbum sedutor.


“Prometo que não vou fazer nada de errado, você pode voltar e se
aquecer.”

“E perder o que você vai fazer? Não.”

O segurança nos fundos pisca para mim enquanto saímos


pela porta dos fundos em direção ao ônibus. Sacha agarra meu
antebraço nesse momento, facilmente segurando meu passo,
tornando-o normal.

“O que exatamente você está planejando fazer?”

“Perguntar a ele o que diabos está fazendo aqui.” Eu acho.

Sua mão grande e quente aperta ainda mais. “Vocês ficaram


juntos por muito tempo?”

“Cerca de dois anos”, murmuro, segurando a maçaneta da


porta do ônibus antes de abrir. Não acho que já corri esses dois
passos mais rápido do que fiz nesse momento. Ouço as vozes no
ônibus antes mesmo de meu pé tocar o primeiro degrau.

“... dê o fora daqui.” Reconheço a voz de Eli imediatamente.

“Não é grande coisa”, a voz que não ouvi em meses me


cumprimenta quando chego ao topo da escada. A cortina está
fechada, então não consigo ver ninguém a princípio.

“O que diabos faria você pensar que aparecer aqui não é um


grande negócio, seu idiota? Gaby está aqui, seu covarde!” Meu
gêmeo grita.

MARIANA ZAPATA
Acho que nunca amei Eli mais do que nesse momento em pé
no topo da escada, com o corpo quente de Sacha diretamente atrás
de mim. Ele está falando tão alto que pode ser considerado grito,
mas sei que Eli só grita mesmo quando está animado com alguma
coisa, e ele definitivamente não está animado em ver Brandon.

“Eu o convidei”, a voz que reconheço como a voz profunda de


Julian fala.

“Isso não tem nada a ver com você, cara. Esse idiota sabe que
não devia ter vindo para cá, mas veio mesmo assim”, Eli explica
antes de parar.

Meu ex solta um suspiro que ouvi muitas vezes ao longo dos


anos. “Olha...”

“Cale a boca e vá embora. Eu não quero ver você, e Gaby não


quer ver você também.” Eu juro por Deus que meu irmão
resmunga. “Vá se esconder ou morrer, eu não dou a mínima para
o que escolher. Caso contrário, arregaçarei seu rosto logo depois
que te derrubar por terminar com a porra da minha irmã pelo
telefone, seu frouxo.”

Sacha me cutuca nas costas naquele momento, rindo


baixinho, e não posso deixar de rir um pouco também. Só Eli para
chamar alguém de frouxo.

“Gaby já é uma garota crescida, Eliza”, pensei ter ouvido meu


ex dizer.

Mas ele não pode ser tão estúpido, pode?

“Do que diabos você acaba de me chamar?” Eli estala e tenho


minha resposta.

Esse babaca acaba de chamar meu gêmeo pelo apelido que só


eu posso usar. Se não for assassiná-lo por simplesmente aparecer
no show, farei isso porque ele mexeu com Eli. Ninguém mexe com
meu irmão.

MARIANA ZAPATA
Puxando a cortina para o lado tão forte que talvez a tenha
rasgado, vejo meu ex sentado em um dos sofás longos com o braço
em volta de uma linda morena. O que me impressiona primeiro
que o desgraçado está usando uma camiseta que lhe dei de
presente no Dia dos Namorados um ano atrás. Sério?

“Gaby”, Brandon murmura com grandes olhos azuis.

Sinto meus ouvidos começarem a esquentar mostrando que


minha raiva aumenta a cada segundo que passa. “Brandon.”

É só quando sinto as pontas dos dedos de Sacha mergulhando


na minha calça jeans, roçando na parte baixa das minhas costas
que me acalmo o suficiente para pensar racionalmente.

Nos meses passados, pensei em uma centena de coisas que


adoraria que acontecessem com Brandon. Tudo, desde ficar com
um travesti, até perder seu pau com algum tipo estranho de
bactéria devoradora de homens, travou sua guerra através da
minha imaginação. Eu não o odeio realmente, mas ele sempre terá
um lugar na minha Lista Negra. Mas quando sinto meu novo amigo
puxar a parte de trás do meu jeans, percebo que não sou a mesma
pessoa que era há alguns meses atrás. Até um mês atrás.

Embora a carne e os flocos que compõem a casca da pele


sejam os mesmos, sinto-me mais forte do que antes. Não preciso
de Brandon, e realmente estou melhor sem ele. Tivemos um bom
relacionamento, mas em retrospectiva, ele não é o tipo de homem
com quem quero ficar para sempre. Nossos interesses são muito
diferentes e.… acho que falta alguma coisa. Nós não temos essa
amizade fácil que vem tão naturalmente com meus demônios e eu.
Inferno, até mesmo entre Sacha e eu que instantaneamente nos
divertimos juntos. Ele me amou, eu acho, mas não é o suficiente
para apagar o fato de que sempre fui a segunda — às vezes terceira
ou quarta — em sua vida depois de sua banda de merda. Só que
nosso rompimento aconteceu do nada. Eu me perguntei mil vezes
se os sinais estavam lá, se as coisas estavam caindo aos pedaços,
mas não importa o quanto analisei, realmente não houve um sinal.

MARIANA ZAPATA
Realmente, está tudo bem. Quaisquer que tenham sido suas
razões, eu não me importo mais. Chorei, sofri e como todo Barreto
antes de mim, mas continuei tocando minha vida. Estou feliz,
independentemente de saber o que quero fazer da minha vida ou
não.

Mas mais do que nunca, quero que o traseiro de Brandon seja


rasgado por uma dúzia de atores pornô bem-dotados.

“Vamos lá fora”, digo ao meu ex em uma voz tão calma que


quase não reconheço como minha.

Suas sobrancelhas franzem e seu rosto fica um pouco rosa.


“O que?”

“Venha até lá fora comigo, Bran”, eu digo, indicando com a


cabeça em direção à saída. “Nós precisamos conversar.”

Aqueles olhos que eu uma vez me importei estreitam na


minha direção. Ele me conhece; sabe que mesmo que eu esteja
calma, ele cruzou a porra da linha chamando Eli pelo meu apelido.
Algumas coisas são imperdoáveis. Sua namorada morena puxa
sua mão enquanto balança a cabeça.

Eu jogo um sorriso ao meu irmão; ele está parado ali com o


rosto vermelho e a mandíbula rígida. Todos os sinais do diabo
dentro dele são visíveis, esperando para explodir e destruir.
“Vamos lá, Brandon. Vamos lá. Só vai demorar um minuto.”

“Baby”, a garota choraminga baixinho.

Não fui grudenta com ele e talvez esse foi meu erro, mas não
consigo achar em mim a preocupação em saber se esse foi um fator
em nossa separação. Se Brandon queria conversar com alguém,
com um de seus fãs, eu nunca me importei. Imaginava que se ele
quisesse me trair, faria em qualquer momento e não havia nada
que eu pudesse fazer sobre isso. Mas essa cadela vai aprender que
eu definitivamente não quero sua bunda cheia de espinhas. “Não
quero o pau dele.” Olho para Eli quando digo isso. “Só quero falar

MARIANA ZAPATA
com ele por um minuto, e não quero envergonhá-lo na frente de
todos.”

Sacha puxa a parte de trás da minha calça novamente, seus


dedos mergulham mais profundamente na área entre o jeans e
minha calcinha. “Gaby”, ele avisa.

“Eu não sabia que você estava aqui”, Brandon interrompe


Sacha. “Pensei que poderia evitar...”

Não posso deixar de revirar os olhos. Ele pensou que poderia


evitar Eli? Oh, por favor. “Não me importo”, digo com uma voz
cantada. “Saia do ônibus e converse comigo. Você me deve isso.”
Quero adicionar um “filho da puta” no final, mas guardo para mim
mesma.

Ele sabe que me deve. Não me incomodo em esperar para vê-


lo sair do sofá; olho para Eli mais uma vez antes de me virar. Ele
está cerrando os punhos e olhando para Brandon como se fosse
matá-lo apenas por olhar. Passo por Sacha na saída, circulando
seu pulso rapidamente com o polegar e o dedo indicador, fazendo
o melhor que posso. Não encontro seus olhos, mas não por estar
envergonhada por ele saber que fui dispensada, muito menos por
ter sido pelo telefone. Acontece com todas as garotas. Eu acho.
Talvez sem a parte do telefone. Tocar Sacha é mais para apenas
dizer a ele que estou bem. Que não farei nada que irei me
arrepender.

Em pouco tempo, Brandon está saindo do ônibus atrás de


mim e fecha a porta atrás dele. Passaram quatro meses desde a
última vez que o vi e, claro, ele parece exatamente o mesmo: seu
cabelo escuro está perfeitamente penteado, seus pelos faciais estão
compridos o suficiente para serem chamados de barba, e seu corpo
ainda está musculoso o suficiente para ser considerado em forma.
Ele é bonito? Sim, mas quem se importa? Eu posso pesquisar
online e encontrar milhares de caras que são igualmente, se não
mais, atraentes quanto ele.

Eu posso olhar para os caras em turnê comigo.

MARIANA ZAPATA
Brandon para e cruza os braços sobre o peito, seus olhos
perfurando os meus. “Gaby, eu estou...”

“Cale-se.”

Os olhos de Brandon se arregalam com meu tom áspero, e


não perco o jeito que os ombros sobem em surpresa. “Por que você
está sendo assim?”

Por que estou sendo assim? Sério? “Você está brincando? Ou


está realmente me perguntando por que estou chateada que você
está aqui?”

“Isso não é uma piada”, ele responde.

“Claro que não é uma piada de merda. Você está aqui onde
não deveria estar. O que é difícil de entender sobre isso?” Pergunto.

“Baby, você sempre foi tão doce...”

Minha visão fica vermelha. Ele foi lá e falou a palavra com ‘b’.
Foda-se.

“Você não costuma agir assim”, ele continua, alheio ao fato


de que está muito perto de ser agredido.

Honestamente, se não há vapor saindo dos meus ouvidos,


ficaria surpresa.

Você não costumava agir assim.

Baby, você sempre foi tão doce.

Gaby, o que você está fazendo da sua vida?

Eu não posso mais fazer isso...

Todo mundo tem seu ponto de ruptura, e eu cheguei ao meu.

“Você terminou comigo! Por telefone! Do nada! Tudo o que


disse é que não queria mais fazer isso e alguma merda sobre eu
não saber o que quero fazer com a minha vida e como isso afetou
sua vibração artística, seu babaca! Passei dois anos com você —

MARIANA ZAPATA
dois anos! E em cinco minutos você me chutou para fora da casa
que você me convidou para dividir seis meses antes. Eu lhe disse
que não queria viver com você e você disse o quanto seria divertido,
o quanto me amava, como era inevitável. Seis meses, Bran! Que
porra é essa?”

Em circunstâncias normais, eu não falaria isso assim, nem


faria esse discurso. Bem, a menos que eu estivesse em torno dos
meus familiares ou Laila. Mas as palavras estavam guardadas no
meu peito por meses agora. Todas as perguntas e a frustração
sobre o que aconteceu com o meu relacionamento explodem em
mim nesta exigência odiosa e gritante.

Para dar-lhe crédito, Brandon coloca as mãos na testa e


suspira, seu olhar vai para o chão. “Eu amei você. Eu
provavelmente sempre amarei você, de certa forma. Você é
ótima...”

Faço um sinal com a mão para impedi-lo de continuar com a


lista de traços que ele admira porque, francamente, não dou a
mínima para o que ele gostava de mim. “Nós quase nunca
brigamos, e conversamos ao telefone na noite anterior como se
tudo estivesse normal. Você me cortou perfeitamente de sua vida
depois de tanto tempo, e nunca mais ouvi falar de você. Então,
uma semana ou duas depois, descubro que você já tem outra
namorada? Apenas me pegou do nada, você entende por que isso
me irrita?”

“Sinto muito. Eu realmente sinto, querida.” Ele desliza as


mãos pelo rosto com uma exalação trêmula. “Eu não quis que as
coisas acontecessem do jeito que aconteceram. Juro que não fiz
sexo com ela enquanto ainda estávamos...”

Tenho que rebobinar as palavras que saem de sua boca e


ouvi-las novamente.

Quando faço, meus ouvidos ficam quentes e meu cérebro dá


um curto-circuito por uma fração de segundo. Nem uma vez
sequer pensei em traição. Eu realmente não pensei. Brandon se

MARIANA ZAPATA
considerava um pegador, mas nem uma vez agiu como o cara que
manda mensagens para outras oito garotas enquanto tem uma
namorada. Isso não é como ele é. Fomos a um encontro no dia
depois que nos conhecemos. Acho que acabei de pensar que ele fez
a mesma coisa novamente.

Mas isso…

“Você não fez sexo com ela enquanto estávamos juntos…?


Mas começou a conversar com ela enquanto estávamos...?”

Ansiedade cruza seu rosto tão rapidamente que mal percebo.


Ele pode até ter parado de respirar antes de começar a gaguejar.
“Bem…”

Eu não estou nem brava, por si só. Eu não estou. O que está
feito, está feito e tudo o mais. Limpo a garganta e tiro o nó dela.
“Não importa.” As palavras saem da minha boca um pouco
ásperas, um pouco estranhas. Ele começou a conversar com outras
pessoas antes de nos separarmos.

Mas meu orgulho, meu orgulho não aguenta.

Eu pego as peças imaginárias e as junto.

“Isso realmente não importa mais, mas vou cortar suas bolas
com meus aparadores de sobrancelha se você falar com Eli assim
novamente. Saia da minha vida e não me importo se verei você de
novo. Meu irmão não te quer por perto, e é melhor você acreditar
que a única razão pela qual seu rosto ainda está intacto é porque
saiu comigo.”

“Sinto muito, baby”, ele diz baixinho, usando o mesmo


maldito apelido que está empurrando um espeto na parte de trás
do meu pescoço. “Eu não quis te machucar assim.”

Dou de ombros pois de que outra forma posso responder que


não seja socando-o nos olhos por ser uma merda? “Não me importo
mais, Brandon. Mas quero que você e sua namorada saiam da

MARIANA ZAPATA
porra do ônibus. Vá assistir ao show de onde quiser, mas fique
longe de mim.”

Ele abre a boca para dizer algo mais, mas deve ter entendido
o quão séria estou porque ele a fecha. Assentindo, Brandon olha
para longe. Levo um segundo só para olhar para o cara com quem
estive por dois anos.

Brandon era bonito, alto e magro, mas agora, não olho para
ele da mesma maneira que costumava. Nenhuma das coisas físicas
realmente importa em longo prazo. Uma parte de mim quer se
concentrar em tudo que ele não é, mas não há motivo para fazer
isso.

Ele me fez parecer uma idiota. Mais do que qualquer outra


coisa, isso é algo que não posso ignorar.

Respiro fundo e sorrio em sua direção, deixando a raiva


borbulhar dentro de mim. É nesse momento que me pergunto o
que mais me arrependerei mais tarde, sentada no meu beliche: ser
adulta ou me sentir melhor.

E eu sei. Sei no fundo do meu coração o que exatamente me


causaria mais arrependimento. Um sorriso facilmente se arrasta
pelo meu rosto quando digo: “Obrigada por ver as coisas do meu
jeito.”

Ele me olha desconfiado por um segundo antes de concordar,


seu pequeno sorriso puxando os cantos de sua boca. “Eu sinto
muito por tudo.”

Balanço a cabeça.

Então dou dois passos para frente, segurando meus braços


ao lado do corpo como se fosse lhe dar um abraço... e quando ele
começa a se inclinar, fico na ponta dos pés e bato nele o mais forte
que posso, bem na garganta.

Ele faz um barulho de engasgo quando se inclina para frente,


mas não estou mais olhando para ele.

MARIANA ZAPATA
Quando me viro para voltar ao local com a vingança em
minhas veias, por acaso olho para as janelas do ônibus para ver
meu irmão e Sacha com os rostos pressionados contra o vidro e
olhares de espanto em seus rostos. Dou-lhes um aceno.

Pronto! Agora posso dormir esta noite. Caso contrário, teria


deitado em meu beliche com a mão em punho e me chamaria de
covarde por não ir em frente.

O resto da noite passa sem problemas. Laila aparentemente


fez amizade com Carter, pelo jeito que o encontrei atrás da mesa
de vendas da Ghost Orchid, sentado ao lado dela. Durante um
intervalo entre as músicas, ela pergunta alto o suficiente para
Carter ouvir: “O que aconteceu?” Tudo o que digo em resposta é:
“Eu dei um soco na garganta dele”, o que a faz explodir em
gargalhadas e leva Carter a perguntar se foi em Mason que dei um
soco.

Ela se controla bem a tempo do Ghost Orchid entrar no palco,


e continua batendo no meu ombro quando fica animada. É uma
noite mais lenta que o normal, então tenho muito tempo para
assistir ao set deles e ao The Cloud Collision's. Sacha atravessa o
palco tão facilmente e com tanta energia que é elétrico. Mesmo que
ele não tenha um dos rostos mais marcantes que já vi, é impossível
manter meus olhos longe dele. Ele é um artista completo.

Mais importante ainda, ele é meu amigo. Quando Gordo ficou


lá dentro depois que descobri que Brandon estava por perto, Sacha
foi o único a ir encontrá-lo comigo porque estava preocupado que
eu faria algo ruim. Se isso não é amizade, não sei o que é.

Em algum momento no meio do set, ele costuma conversar


com o público, contando uma pequena história sobre a estrada ou
sua vida, percebo que, se qualquer coisa — Sassy, em sua calça
preta, camisa de botão azul-claro, e gravata skinny marinho — é
um bastardo leal.

“Você sabe o que eu odeio?” Ele pergunta ao público que ruge


na sua frente. Eles gritam todos os tipos de coisas em resposta.

MARIANA ZAPATA
“Bucetas!”

Sacha balança a cabeça e aponta na direção de onde a pessoa


gritou. “Não. Eu gosto disso.”

“Caras de jeans skinny!”

Ele dá de ombros dramaticamente. “Tanto faz, cara.”

Algumas pessoas gritam outras coisas aleatórias até que ele


as dispensa, pressionando o microfone bem perto do rosto como
se fosse contar às mais de mil pessoas na plateia um segredo. Ele
ergue um dedo, que aponta para a frente quase como se estivesse
apontando para minhas costas.

“Paus”, ele grita e, em seguida, estende o dedo do meio, ainda


apontando para a frente. “Paus e idiotas!”

Imediatamente, o barulho alto do bumbo pega, sinalizando o


início de outra música.

Eu quase mijo nas minhas calças de tanto rir.

Estou apaixonada pelo mundo e pelos homens da minha vida


pelo resto da noite.

Por que ninguém disse que ser amada e cuidada — embora


de uma maneira estranha — poderia ser tão incrível? Sinto como
se alguém apontasse uma varinha para mim e conjurasse um
feitiço que transforma tudo em arco-íris e unicórnio. Meu irmão
chama Brandon de bucetildo e Sacha o acompanha chamando-o
de pau na frente de mil pessoas. O que mais posso pedir?

Assim que Carter e eu terminamos de carregar o carrinho com


as caixas e guardamos tudo, saímos do local. Laila foi embora
minutos atrás, explicando que tem que acordar cedo para uma
aula que está dando e sua mãe não quer buscá-la tarde demais.
Com uma enxurrada de abraços e promessas de mandar uma

MARIANA ZAPATA
mensagem no dia seguinte, digo adeus à minha melhor amiga
pelos próximos dois meses.

Vejo Eli primeiro, de costas para mim depois de carregar suas


caixas de bateria no enorme trailer. Com três longos passos, lanço-
me em cima de suas costas, envolvendo meus braços em seu
pescoço e beijo sua bochecha. “Eu te amo”, digo a ele, beliscando
sua bochecha.

“Porra, eu te amaria se você perdesse cinco quilos antes de


pular nas minhas costas de novo”, ele bufa, me erguendo em suas
costas com uma mão.

“Tanto faz”, murmuro, apertando sua bochecha novamente.


“Obrigada por me defender, Eliza.”

“Alguém precisa fazer isso, Flabby. Se eu soubesse que você


iria socá-lo na garganta, teria sido mais tranquilo com ele, sua
maldita psicopata.” Ele ri. “Juro por Deus, ver você fazendo aquilo
quase me fez chorar.”

Eu rio, a curiosidade me matando. “O que aconteceu depois


que fui embora?”

“Ele com certeza não falou nada quando voltou ao ônibus.


Acenou para a garota e saiu dali, mas não rápido o suficiente,
porque fiz questão de rir na sua cara. Sacha teve que deitar no
beliche de tanto que estava rindo.” Ele fala. “Mason está chateado
porque perdeu.”

Acontece que não vi Mason a noite toda. Ele não estava no


caminho e ignorou minhas mensagens de texto, mas também não
estava no ônibus quando o incidente com o ‘Pau Idiota’ aconteceu.
Eu conheço aquele filho da puta. Ele não senta sem fazer nada.
“Espere. Onde ele está?”

Posso sentir as risadas do meu irmão debaixo de mim. “Acho


que é melhor você não saber apenas no caso de os policiais
perguntarem.”

MARIANA ZAPATA
“E!”

Uma mão bate na minha bunda muito forte e eu grito. Não


surpreendentemente, Mason para bem ao nosso lado, sorrindo.
“Esse é o meu pagamento por hoje à noite, minha querida”, ele diz
com um falso olhar malicioso.

“O que você fez?” Pergunto, mas na verdade estou


obscenamente interessada no que ele fez. Aceito de bom grado uma
contusão na bunda para descobrir.

Ele encolhe os ombros. “Vamos apenas dizer que Brandon vai


precisar de três pneus novos e uma lavagem de carros, Flabs. Ele
deve estar esperando por isso.”

Meu pequeno coração incha nesse momento.

Eli nos vira para que minha bunda esteja na frente de Mason
mais uma vez antes que o idiota bata ainda mais forte do que na
primeira vez. Eu pulo dele, esfregando minha pobre bunda na
esperança de que a dor diminua, e então chamo os dois de paus
que eu amo. Agarrando roupas limpas do compartimento debaixo
do ônibus, ouço um grito vindo de dentro. Como não sei
exatamente quem está envolvido, e eu definitivamente não quero
ser a estranha que entra no meio de uma discussão, espero até
que as vozes baixem.

Uma vez lá dentro, vejo Julian e Miles sentados na sala de


estar parecendo chateados, as carrancas que fazem para mim são
tudo menos amigáveis. Ainda não sei que merda está acontecendo.

Na área dos fundos, encontro Sacha e Isaiah no espaço dos


beliches, mexendo em suas mochilas silenciosamente. Não é
preciso ser um gênio para descobrir que Sacha e os dois na sala
de estar estavam brigando apenas um minuto antes. É minha
culpa, bem, de Brandon por ser um idiota, que isso aconteceu.

“Sinto muito por tudo isso”, digo a ele da porta.

MARIANA ZAPATA
Os olhos cinzentos de Sacha se aproximam de mim quando
joga sua mochila em cima da cama. Sua expressão suaviza e ele
balança a cabeça. “Não se preocupe com isso.” Suas bochechas
puxam para cima naquele sorriso torto que faz meu interior se
transformar em gosma e a sensação me fez sentir estranha. O que
diabos está acontecendo? “Valeu a pena”, ele continua.

Eu empurro o sentimento pegajoso de lado e me concentro


nele e no que ele falou. “Foi muito legal”, eu rio. “Obrigada.”

Ele levanta um ombro, mas mantém aqueles olhos hipnóticos


em mim. “Sempre que precisar, Streetfighter (lutadora de rua).”

Eu dou risada antes de fechar a distância entre nós e jogar


meus braços ao redor do seu peito, abraçando-o. Leva dois
segundos para ele perceber o que estou fazendo antes de envolver
os braços em meus ombros, apertando-me a ele com força. Eu não
me importo que ele esteja suado, que sua camiseta esteja
encharcada e agarrada como uma segunda pele molhada, e
obviamente ele não se importa que com certeza meu cabelo cheira
como se precisasse de uma lavagem, porque ele me abraça por um
minuto que parece se estender por eras. Este é meu amigo, meu
amigo que entra em uma discussão com pessoas com quem tem
um relacionamento mais importante do que o que temos, e ele não
se importa.

Eu o abraço ainda mais apertado.

É nesse momento, quando o abraço como se minha vida


dependesse disso, que reconheço a estranha e pegajosa emoção
que está flutuando em minha barriga na última parte da noite.

Eu gosto de Sacha.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 9

“Vamos jogar Twister.”

“Não.”

“Qual é, Gaby.”

“Não.”

“Por favor?”

“Não.”

“Por favor?”

Suspiro. “Tudo bem.”

“Nus?”

Eu coloco meu livro do momento no colo e aceno para Mase


com uma cara séria. “OK. Eu sempre quis ver como é o corpo de
um hermafrodita.”

Gordo ri de onde está sentado observando seu colega de


banda e eu. Temos um dia de folga pela primeira vez em quase três
semanas, graças a uma viagem de vinte horas entre cidades. Por
volta da décima oitava hora, o ânimo na cabine e o tédio estão
começando a atingir proporções épicas. Nem mesmo Mario Kart
pode aliviar a histeria que borbulha através de todos nós — ou pelo
menos daqueles que estão acordados.

“Você sabe que eu sou um homem”, Mason fala, puxando o


lóbulo da minha orelha em retaliação.

Sorrio na direção dele, olhando o cabelo preto que precisa de


uma boa lavagem. “Se parece uma mulher e grita como uma

MARIANA ZAPATA
mulher — provavelmente é uma mulher.” Toco a ponta do seu
nariz enquanto ele faz uma careta, eu sorrio maliciosamente. “Você
com certeza soou como uma dama quando gritou ‘assassino
sangrento’ para o rato que passou em cima do seu pé ontem.”
Belisco a ponta do nariz dele.

Com toda a honestidade, eu também gritei, e o rato não


chegou nem a dez metros de mim. O ponto é que Mason parecia
uma atriz de filmes de terror e gritou como se estivesse fazendo um
teste para o papel da garota sexy, que toma péssimas decisões,
seminua em um filme de terror ruim. Só ele, Gordo, Carter e eu
estávamos lá quando aconteceu. Se Eli estivesse lá, todas as
pessoas da página do Facebook da Ghost Orchid saberiam o que
aconteceu. Eli tem um talento especial para filmar coisas que não
dão certo. Como na formatura da faculdade de Rafe, quando uma
garota caiu do palco. Claro que ela poderia ter se machucado, mas
não aconteceu, então não há problema em rir do vídeo uma dúzia
— ou cinco dúzias de vezes.

Pelo menos foi o que falei a mim mesma.

Aqueles olhos azuis que amo de um modo fraternal me


encaram. “Aquele ser mutante era do tamanho de um gambá.”

“Tenho certeza que era apenas um rato”, eu o corrijo.

“Tudo a mesma coisa, cale a boca, Flabby”, ele bufa. “Você


faria o mesmo.”

Gordo se inclina para frente no sofá, apoiando os cotovelos


nos joelhos. “Cara, estou surpreso que você não começou a
chorar.”

Mason franze a testa antes de comentar sobre o quanto Gordo


é uma garota porque ficou com os olhos marejados quando assistiu
Um Sonho Possível alguns dias atrás.

Sento lá ouvindo-os até que Sacha sai da área de beliche


alguns minutos depois. O homem dorme tanto quanto se estivesse

MARIANA ZAPATA
em coma. Seu rosto está suave, um pouco inchado e enrugado
enquanto caminha pela cozinha, batendo as mãos com Mason e
Gordo antes de sentar no meu lado. “Bom dia, Jean-Claude”, ele
boceja, curvando-se quando suas pernas abrem. Um joelho peludo
relaxa contra o meu. O short com que ele dormiu está amontoado
em suas coxas.

Eu tento não pensar sobre o que descobri na noite anterior —


coisa estúpida — mas é muito mais difícil do que espero. A única
coisa racional que posso encontrar é: Quem não gosta de Sacha?
Ele é bonito, engraçado, gentil e incrivelmente talentoso. Haveria
algo de errado comigo se não gostasse dele?

Posso lidar com uma pequena paixão. Nada demais. Não


posso navegar na Internet sem encontrar uma foto de um cara
atraente que nunca vou encontrar.

E essa é a história que vou contar.

Quer dizer, posso admirá-lo de longe sem significar nada,


certo?

“Bom dia.” Sorrio para ele tão platonicamente quanto


possível. Mesmo com um pouco de baba seca no canto dos lábios
e parte do seu cabelo esmagada contra o couro cabeludo, ele é um
espetáculo depois de acordar.

Então há pessoas como eu de manhã. Uma vez na minha


adolescência, acordei e encontrei os três filhos de Satã na sala de
estar de manhã jogando vídeo games. Meu irmão tirou um dos
maiores crucifixos de nossa mãe da parede e segurou no ar para
mim enquanto sussurrou: “Você está banida!”

“Bom dia” Sacha responde com um bocejo. Ele pisca aqueles


olhos cinzentos e cristalinos e seus longos cílios negros. “Você vai
ao cinema com a gente?” Ele pergunta.

“Bom dia, Mariah.” De que cinema ele está falando? Eu


balanço a cabeça. “Não sei de cinema nenhum.” Estranho.

MARIANA ZAPATA
Ele levanta um ombro enquanto esfrega um olho com o punho
fechado. “Acabo de te dizer. Venha conosco. Depois que tomarmos
um banho, Matt” — é o nome do nosso motorista do ônibus —
“disse que estacionaria em um shopping com uma sala de cinema.”
Quando não respondo imediatamente, ele solta um longo suspiro
de ar diretamente no meu rosto, fazendo-me estremecer. “Até vou
deixar você compartilhar comigo o que comprar.”

“Tenho a sensação de que, mesmo que eu não concorde em


compartilhar minhas coisas com você, você vai pegar mesmo
assim.” Inclino-me para trás e pergunto na minha melhor voz:
“Quando você escovou os dentes pela última vez?”

Sacha coloca a mão sobre a boca, fazendo parecer que está


soprando na palma da mão e respira estremecendo. “Seu palpite
parece certo, e os escovei na noite passada.”

Não posso deixar de revirar os olhos brincando. “É hora de


escovar os dentes novamente, e você tem sorte de eu não ter
problemas em compartilhar, desde que lave as mãos primeiro.”

“Acho que é hora de você escovar os dentes novamente...”

Também sopro na minha mão. “Eu não estou com bafo”,


argumento.

“E estou muito feliz em saber que você está disposta a


compartilhar.” Eu sorrio para ele, ganhando um sorriso de volta.
“Só porque falou, vou escovar os dentes agora. Feliz?”

Balanço a cabeça. “Muito.” Quero acrescentar que um cara


quente com mau hálito matinal é uma tragédia, mas não digo
nada. Admitir em voz alta que o acho atraente seria terrível,
embaraçoso e patético, sem nenhuma ordem específica. Mesmo
que sinta que Sacha não é uma daquelas pessoas que tornaria
uma amizade estranha depois de uma declaração dessa proporção,
não confio nisto. Além disso, com a minha sorte e a sua natureza
boba, ele provavelmente vai zombar de mim por isso. Suspiro na

MARIANA ZAPATA
minha cabeça e lanço um olhar para ele. “Que filme vamos
assistir? “

Horas mais tarde, depois de sair do ônibus para tomar banho


em outra parada de viagem, convenço Eli, por mensagem de texto,
a trançar meu cabelo. Não me sinto uma garota de verdade pelo
que parece uma eternidade. Estar perto desses caras que
testemunharam minha passagem pela puberdade, aparelhos, os
efeitos imediatos de ter meus dentes do siso removidos, todo corte
de cabelo ruim que já fiz e me visitaram no pós-operatório quando
estava chapada, faz eu não me importar com a minha aparência.

A última vez que usei maquiagem diferente de batom e


delineador foi no primeiro dia de turnê. Nem me incomodo em
colocar corretivo sobre minhas espinhas. A última vez que usei
algo além de shorts e moletom foi no mesmo dia; vestir camisetas
sem manchas é a extensão da minha vaidade no momento. Odor
corporal também é uma preocupação regular. Estou mais focada
em estar confortável do que tentar parecer fofa, apesar da
constante provocação do meu irmão sobre como pareço abatida.
As pessoas que vem no stand de vendas parecem estar bem comigo
vestindo uma regata, com um hálito agradável e um sorriso pronto,
então, qual o ponto de tentar com mais afinco? Eu tenho feito mais
esforço nos últimos dias do que antes, e tenho a sensação de que
é apenas pelos roxos na parte inferior do meu rosto.

Mas a cada noite, enfrento garotas que gastam tempo com sua
aparência, e isso me faz sentir um pouco mais triste dia após dia,
embora eu saiba que não há sentido em tentar quando há um
show. Vou parecer um palhaço afogado quando voltar para o
ônibus, independentemente de quanto ou quão pouca maquiagem
eu aplique.

Laila sempre me diz que se sente melhor quando sabe que


está bonita. No meu caso, eu me sinto como uma garota normal e

MARIANA ZAPATA
limpa em um piscar de olhos. Um banho, o vestido que peguei da
minha mala e uma boa trança pode ser o pontapé inicial.

Eli entra sorrateiramente no quarto dos fundos do ônibus


comigo depois de concordar em tomar banho rapidamente para
podermos trancar a porta e começar os negócios.

“Você tem um monte de pontas duplas”, Eli afirma um


minuto depois que me sento no chão na frente dele de pernas
cruzadas. Seus dedos separam meu cabelo sem cuidado ou
gentileza, mas sei que não devo reclamar sobre o quão áspero ele
está sendo. É o habitual.

“Tenho certeza que pedi para você trançar meu cabelo, não
sua opinião sobre se preciso de um corte de cabelo ou não, Vidal
Sassoon”, rio, empurrando meu cotovelo na parte grossa de sua
coxa.

O bastardo puxa meu cabelo com força enquanto bufa.


“Espero que você fique careca.” Suas grandes mãos roçam meu
cabelo mais uma vez antes de separá-lo do jeito que ele quer, não
que tenha tanto cabelo em um dos lados da minha cabeça, de
qualquer maneira.

Não vou reclamar que a parte raspada faz minha estrutura


óssea parecer mais redonda. Não.

Eli aprendeu a trançar meu cabelo quando tínhamos nove


anos porque mamãe quebrou a mão e não podia fazer isso por
mim. O que começou como uma simples trança na parte de trás
da minha cabeça se transformou no interesse que o levou a fazer
coisas incríveis com meu cabelo. Ele até fez uma estilo escama de
peixe em algum momento; quando ou como ele fez isso, não tenho
certeza, e tive a certeza de não perguntar também.

De fato, ele é melhor do que nossa mãe jamais foi. Seu talento
também é uma daquelas coisas que mantemos entre nós dois e
nossos pais. Gil e Rafe nunca falaram nada sobre isso, então não
tenho certeza que saibam. Eu nunca falei a Eli nada sobre tranças;

MARIANA ZAPATA
é algo que ele aprendeu a fazer porque me amava e eu pedi. Não
quero fazer piadas e estragar uma coisa boa.

“Ainda não posso acreditar que você socou Brandon na


garganta”, ele fala enquanto alguns dos seus dedos passam sobre
a parte raspada acima da minha orelha.

Eu realmente estou muito orgulhosa de mim mesma, e tenho


certeza que me sinto bem com o elogio de Eli. Então me lembro do
que Brandon disse e meu bom humor despenca. Aquele idiota do
caralho. “Você ouviu o que ele disse?”

“Não tudo. Ouvi pedaços quando você estava gritando com ele,
mas então esse olhar louco tomou conta do seu rosto e pensei
‘porque diabos ela está sorrindo assim’.” Ele nem finge não ser
intrometido. “O que ele falou?”

Suspiro e me inclino mais no assento, os lados das coxas


gigantescas do meu gêmeo pressionam contra meus ombros. “Ele
praticamente admitiu que começou a conversar com aquela garota
que está namorando antes de nos separarmos, que foi uma decisão
difícil e ele não queria ferir meus sentimentos...”

“Ele te traiu?” Meu irmão pergunta devagar, e não posso


deixar de sorrir pela indignação em seu tom.

“Ele disse que não enquanto estávamos juntos, isso é


importante. Você acredita? É por isso que lhe dei um soco na
garganta. Nunca pensei que ele estava falando com outra pessoa
antes de nos separarmos, E. Me senti tão estúpida...”

Sua coxa cutuca meu ombro. “Você é muito estúpida, mas ele
é um idiota, Flabby. Você não pode ficar tão surpresa com isso.
Você quer ficar com um cara pelo resto da vida que atravessa o
palco usando calças mais apertadas do que você? Não, você não
quer.”

Eu começo a rir. “Sim, eu sei. Cale-se.”

MARIANA ZAPATA
“Eu sei que é difícil tentar encontrar alguém que possa se
igualar a mim...” Ele começa a dizer.

“Sua mãe”, eu bufo.

Eli engasga atrás de mim. Ele mexe no meu cabelo por alguns
minutos antes de finalmente falar de novo, sua voz mais baixa do
que o normal. “Olha, meu aluguel em Nova York vai acabar em três
meses. Estou cansado de morar lá e estou pensando em voltar
para Dallas por um tempo depois que a turnê terminar.
Poderíamos conseguir um apartamento de dois quartos, uma casa
ou algo assim, se você quiser. Até te deixo dividir o aluguel comigo.”
Ele me cutuca novamente. “Pense nisso.”

Com a quantidade de porcaria que jogamos um no outro, é


fácil subestimar nosso vínculo. Nós somos uma equipe. Sempre
cobrimos as costas do outro, e aposto a minha vida que com
setenta anos ainda vamos cuidar um do outro. Assim que abro a
boca para dizer a ele que definitivamente vou pensar sobre sua
oferta, alguém bate na porta.

“Ei! Posso entrar?” A voz de Mason grita do outro lado.

“Não!” Nós dois gritamos ao mesmo tempo.

Ele não responde imediatamente, como se não pudesse


entender por que não pode. “Por quê?” Ele finalmente pergunta,
parecendo confuso e perturbado.

“Eli está me mostrando como usa o absorvente”, dou risada


e ganho outro puxão no meu cabelo.

Há silêncio do outro lado da porta por um minuto, permitindo


que Eli termine minha trança. Sempre parece um milagre o quão
gentis aquelas patas grandes podem ser quando querem. Tenho o
visto baterem em pratos e rostos. Horas depois, aquelas mãos
podem fazer os desenhos mais intrincados no meu cabelo na altura
dos ombros. Ninguém pode dizer que Eli não é um filho da puta
com muitas qualidades.

MARIANA ZAPATA
“Eu não entendo... por que não posso entrar?” A voz de Mason
finalmente resmunga pela porta novamente.

Eu pulo e jogo os braços ao redor do meu irmão, dando-lhe


um beijo rápido na bochecha enquanto ele freneticamente tenta se
afastar em desgosto. “Obrigada, perdedor. Você vai ser uma mãe
maravilhosa para minha futura sobrinha um dia”, eu digo logo
antes dele lamber a ponta do dedo e mergulhar no meu ouvido.
Faço uma careta e afasto sua mão, depois me levanto para
destrancar a porta.

Mason entra, barbeado e molhado. Seus olhos azuis alertas


passam pelo pequeno quarto curiosamente. Sento-me ao lado de
Eliza, tocando delicadamente os fios de cabelo arrumados na
minha cabeça.

Quando os olhos de Mason pousam em mim, ele franze a testa


e passa a mão pelo cabelo, afastando os fios úmidos da testa. “Você
parece uma menina.”

“Eu sou uma menina.”

Aqueles mesmos olhos azuis-cobalto se estreitam e depois se


estreitam mais um pouco enquanto ele olha para o comprimento
da minha roupa antes de olhar para Eli. “Você vai deixar ela sair
assim?”

“Desde quando ela me escuta?” Ele zomba, jogando um braço


sobre meus ombros. “Não há nada de errado com minha Flabby se
você não olhar seu rosto muito de perto.”

Eu rio. Claro que sua frase não está exatamente dizendo que
estou bonita, mas para os padrões dele, isso é o melhor que vou
conseguir.

“Por que você nunca se veste assim para mim?” Mason


pergunta, sentando-se à nossa frente.

“Não há sentido; nós dois sabemos que você gosta de suas


mulheres com mais pelos faciais do que eu”, rio.

MARIANA ZAPATA
O diabinho dá de ombros e pisca para sua autoproclamada
alma gêmea, o homem sentado ao meu lado. “Verdade.”

O movimento suave do ônibus diminui até parar e nos faz


balançar levemente. Há uma conversa alta na frente antes que
sons familiares da porta abrindo e os rapazes se juntam, me
avisando que chegamos ao shopping. Bato na coxa do meu irmão
gêmeo e digo a ele que nos vemos mais tarde, antes de sair. Os
idiotas e alguns caras da TCC estão planejando ir a um bar que
tem trezentos tipos diferentes de cerveja, e não estou com vontade
de passar por essa experiência. Sair com Sacha parece um bônus.
Um bônus muito agradável. Um bônus muito agradável e
platônico, como passar um tempo com Carter.

Certo.

Mal pulo dos degraus do ônibus, deslizando a alça da bolsa


pelo meu ombro, quando vejo Sacha e Isaiah do lado de fora
esperando.

“Somos só nós?” Pergunto, caminhando até eles.

Os olhos de Sacha se voltam em minha direção, sua boca se


abre de uma maneira que me avisa que um comentário inteligente
sairia em um momento, mas nada realmente sai. Ele olha para
mim — meu rosto, a pele nua do meu peito acima do algodão roxo
do vestido de verão, e depois para baixo, pelo comprimento do meu
corpo lentamente. Isso me deixa encabulada e me remexo. É
instintivo querer puxar a frente do vestido, mas não é como se
tivesse comprimento para isso.

“Somos apenas nós”, responde o pequeno sotaque de Isaiah.


Ele olha para mim uniformemente. “Eu gosto do seu cabelo.”

Infelizmente, sou uma daquelas pessoas que nunca sabe lidar


com um elogio de pessoas que não sou próxima, ou mesmo sei o
que dizer depois. Meu rosto fica um pouco quente e sorrio para ele.
“Obrigada.”

MARIANA ZAPATA
Sorrio mais uma vez antes de olhar para Sacha, que está
ocupado inspecionando meu rosto novamente. Ele sorri, mas é um
olhar distraído e distante. Toda caminhada do estacionamento ao
centro comercial é surpreendentemente quieta. Isaiah não falou
mais que duas palavras para mim nas quase três semanas em que
estivemos em turnê, e Sacha está estranhamente silencioso.
Depois de comprar nossos ingressos de cinema, cutuco meu amigo
de olhos cinzentos quando Isaiah diz que está indo ao banheiro.
Entramos na fila para comprar comida.

“Ele costuma ser quieto com todo mundo?” Pergunto,


gesticulando com a cabeça na direção que Isaiah saiu.

“Isaiah?”

Concordo. “Sim.”

Sacha acena, mantendo os olhos fixos no menu do teto. “Sim.


Ele não fala muito.”

Eu não falo muito a não ser que me sinta confortável em torno


de alguém, e acontece que estou cercada por três das pessoas que
conhecem as melhores e as piores partes de mim. Se não posso ser
eu mesma em torno deles, com quem posso ser? Por alguma razão,
algo sobre Sacha me deixa à vontade e ele é uma exceção.

Ele não diz mais nada quando a fila à nossa frente encurta, e
estou realmente começando a me preocupar. Por que ele está tão
quieto? Não é como se eu precisasse conversar o tempo todo, mas
ainda assim. Tudo estava bem antes do banho, então a mudança
em sua atitude é bastante confusa.

“Você está bem?” Eu finalmente bato em minhas bolas


imaginárias para perguntar, virando um pouco para olhar para ele.

Ele franze a testa, ainda mantendo o olhar no cardápio. “Sim,


por quê?”

“Você está muito quieto”, digo.

MARIANA ZAPATA
Sacha finalmente olha para mim. Ele não colocou nenhum
produto e seu cabelo está solto e brilhante, a parte mais longa
caindo para o lado mais curto do couro cabeludo. “Minha mente
está em outro lugar”, diz ele se desculpando. Seus olhos claros
olham para o decote do meu vestido tão brevemente que quase
perco.

O que eu não perco são seus dedos subindo para tocar a


trança pendurada no meu ombro.

“Você ficou muito bem”, ele comenta.

Eu preferia ser chamada de “bonita”, mas os mendigos não


podem escolher. ‘Bem’ é educado e nada assustador ou agressivo.
Sorrio para o meu amigo, um dos amigos mais bonitos que já tive
na vida. “Obrigada.”

Ele pisca para mim, mostrando aquele distante sorriso mais


uma vez, me fazendo pensar em onde exatamente está sua mente.
“Quer compartilhar uma pipoca?”

“Você está perguntando se eu vou comprar uma para que você


possa comer?” Olho para ele com desconfiança.

Ele dá de ombros da mesma maneira que sempre faz. “Sim,


praticamente.”

Bem, gosto de pessoas honestas.

“Compro uma bebida se você pegar a pipoca”, ele oferece.

Dou outro olhar para ele. Ele usa a mesma roupa que
costuma vestir quando não está no palco: bermuda, camiseta e seu
par bom de tênis verde e preto. “Feito.”

Ele enrola os lábios atrás dos dentes e me dá um olhar


esperançoso. “Manteiga?”

“Manteiga.”

MARIANA ZAPATA
Poucos minutos depois, nos acomodamos em nossos assentos
no cinema com nossas comidas. Ele aponta para a garrafa de água
extragrande que comprou. “Quer um pouco?”

“Claro”, digo, já tirando do porta-copos. Torço a tampa,


seguro a alguns centímetros acima da minha boca e estou prestes
a derramar quando ele geme.

“Beba da garrafa. Eu não tenho germes. “

“Nunca se sabe”, murmuro, colocando o gargalo na minha


boca. Ele arranca o saco de pipoca de tamanho médio do meu colo
enquanto tomo um gole.

Sacha bonito e perfeito, com uma voz que me dá arrepios toda


noite, pega um punhado de pipocas e empurra metade diretamente
em sua boca. “Tão bom”, ele geme através de um bocado
transbordante.

Isaiah não reapareceu desde que saiu para ir ao banheiro.


Sacha enviou uma mensagem dizendo que vamos esperar dentro
do cinema. Quase ao mesmo tempo, levantamos nossas pernas
para descansar os pés na parte de trás dos assentos na nossa
frente.

Meu novo amigo pega mais pipoca e enfia na boca.

Eu como uma pequena quantidade de cada vez, muito


ocupada observando-o comer punhado após punhado. É
fantástico. É realmente incrível vê-lo comer tanto rapidamente.
“Você está pensando em comer tudo, gordo?”

Ele engasga no meio do caminho para pegar mais. “Você acha


que sou gordo?”

“Sim”, eu minto, olhando para seu abdômen plano como se


não o tivesse visto sem camisa quase todas as noites. Se for
honesta comigo mesma, admitiria que posso lembrar do seu
tanquinho vividamente. “Você só corre?” Eu não me lembro de tê-
lo visto se exercitar. Por outro lado, ele sempre está comendo.

MARIANA ZAPATA
Ele murmura algo com a boca cheia de pipoca que soa como
“eu levanto pesos também.”

“Quando?”

“Normalmente, durante o show de abertura”, ele explica. “Nós


temos halteres e um banco na parte de trás do trailer.” O timing
faz todo o sentido. Eu raramente vejo qualquer um dos caras
depois que as portas se abrem.

“E você?”

“Apenas exercícios aeróbicos.” Levanto o braço e bato na parte


inferior dele. “Vê? Nenhum músculo.”

Ele lambe seus lábios salgados, olhando para mim


intensamente. “Onde você mora?” Ele pergunta do nada.

“Em Dallas. Você?”

“São Francisco.”

“Isso é legal”, penso por um segundo. “Não vamos parar lá na


próxima semana?”

O rápido e entusiasmado aceno de cabeça que ele me dá em


resposta me faz sorrir. Excitação irradia através de seus poros.
“Sim. Você pode conhecer meus amigos.”

“Ok.” Sorrio e concordo, lembrando de uma conversa anterior.


“E sua família? Eles não moram lá?”

“Não mais. Minha mãe mora na Austrália agora; meu pai


voltou para Rússia...”

“Você é russo?” Finalmente pergunto. Quero dizer, estive me


perguntando de onde saiu seu nome e estou surpresa por não
perguntar em tanto tempo.

Sacha assente. “Meus pais são. Minhas duas irmãs mais


velhas nasceram lá, mas o resto de nós nasceu aqui.”

MARIANA ZAPATA
Coloco o cotovelo no braço da poltrona e olho para o rosto
dele. “Hã. Isso é realmente legal. Qual é o seu sobrenome?”

“Malykhin.”

“Soletre.”

Ele soletra.

“E suas irmãs?” Pergunto.

“Elas estão em todo lugar. Uma na África, uma no Reino


Unido, uma no Alasca e outra em Hong Kong.” Ele ergue as
sobrancelhas. “Não consigo mais vê-las a menos que vá visitar ou
nos encontremos em algum lugar para passar férias.”

“Você sente falta deles?” Estou bem ciente do fato de que não
tenho o direito de perguntar, mas faço de qualquer maneira.

Surpreendentemente, ele responde sem sequer pensar nisso.


Um único ombro sobe uma fração, encolhendo-os. “Muito, mas vou
ver minha mãe em breve.”

“Isso é bom.” Cutuco seu cotovelo com o meu. “Se você quiser
um irmão, não hesite em pedir Eli emprestado. Você pode ficar
com ele. “

Seus lábios tremem um pouco antes de rir. “Isso é muito


generoso da sua parte.”

“Apenas dizendo. Se você deseja ser aterrorizado,


ridicularizado e peidado, ele é seu. “

Sacha me dá uma olhada pelo canto do olho. “Eu já recebi


dois desses três.”

Sério? Tento pensar nas vezes que ele está com os caras do
TCC, mas todos parecem se dar muito bem, embora um pouco
distantes, e eles são mais maduros do que os idiotas do GO. “De
quem?”

MARIANA ZAPATA
Ele me cutuca novamente. “Você tira sarro de mim
diariamente… temo pela minha segurança quando estou perto de
você…”

“Oh, cale a sua boca!” Começo a rir.

“Tudo que falta é você começar a peidar em mim.”

“Eu nunca faria isso!”

Ele faz uma careta que me faz rir mais.

“Nunca faria isso de propósito, pelo menos! “

Sacha me dá um sorriso enorme, seus dentes brancos e retos


em exibição. “Isso soa mais como você.”

Oh Deus. Eu não devo achar engraçado que ele pense que eu


poderia peidar nele — porque não faria — mas faria. Especialmente
quando ele começa a me cutucar com o cotovelo. Eu apenas o
cutuco de volta.

A próxima coisa que sei é que nós dois estamos acotovelando


o outro, cada um tentando apontar para a coxa da outra pessoa
até que ele acerte seu alvo e eu grito feito um porco, fazendo ele rir
tão alto que as pessoas nas fileiras na nossa frente viram para ver
o que está acontecendo.

Bato em seu ombro com a palma da mão aberta. “Seu


bundão.”

Com outro grande sorriso, ele pega minha mão entre as suas.
Seus dedos estão frios. “Você acha que sou malvado com você?”

“Sim”, eu digo, mas realmente tenho minha atenção focada


no fato de que ele está segurando minha mão entre as dele. Tento
me afastar? Não, tão estúpido quanto isso é.

“Não estou brincando. Você acha que eu sou?” Ele pergunta,


sua voz rouca abaixando no que posso assumir que é uma
tentativa de ser sério.

MARIANA ZAPATA
Sorrio para ele. “Não. Porque você pensaria isso? Gosto do
jeito que brincamos”, eu digo a ele a verdade. Claro, brinco com
Eli e Mason, mas isso é diferente. Mesmo meu ex não gostava de
brincar comigo um quarto do que Sacha faz.

“Você tem certeza? Carter ainda está com raiva de mim pelo
incidente do pênalti.” Seu polegar roça as juntas da minha mão
suavemente uma vez, apenas uma vez. Seu olhar desvia para a
minha mandíbula ainda machucada.

“Sim. Quero dizer, você é um idiota por chutar a bola na


minha cara, mas está tudo bem”, digo a ele, observando seus olhos
pálidos irem em direção ao meu peito rapidamente. “Mas se
machucar minha fonte de renda novamente, e vou chutar suas
bolas.”

Nós dois rimos ao mesmo tempo em que as luzes do cinema


começam a escurecer. Isaiah aparece no pé da escada, com as
mãos cheias de doces. Eu puxo minha mão para fora do aperto de
Sacha para pegar um pouco de pipoca do pacote que em algum
momento acabou no seu colo.

Ele levanta uma sobrancelha para mim quando enfio na


minha boca como ele fez, mas antes que ele possa falar, eu digo:
“Se você me chamar de gorda, vou me certificar de que Eli peide
em você.” As palavras saem da minha boca antes que eu possa
detê-las.

Sacha dá de ombros antes de se inclinar para mim. “Se for da


sua bunda, eu não direi nada.”

Eu não posso…

Eu fico…

Satisfeita. Um pouco feliz demais.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 10

Antigamente, eu não tinha nada contra São Francisco.

Estive lá várias vezes com a Ghost Orchid, e gostei tanto


quanto qualquer um poderia gostar de uma cidade que está
visitando. Depois do dia que tive, exatamente seis shows após
socar meu ex na garganta, a cidade seria para sempre manchada
pela memória de as coisas ruins que aconteceram. Não vou dizer
que esse é o pior dia da minha vida, mas com certeza não é o
melhor.

Quando acordo com cólicas que parecem a dor durante o


parto — pelo menos imagino que seja assim — saio da cama o mais
rápido que posso.

Só não rápido o suficiente.

Meu irmão, entre todas as pessoas sai da cama ao mesmo


tempo e percebe a enorme mancha vermelha que tento esconder.

“Puta merda! Flabby! Que porra é essa?!” Ele grita, apontando


e rindo. Literalmente, apontando e rindo.

Tiro ele do caminho e pego minha bolsa do chão, onde


costumamos deixar nossas coisas, e corro para dentro do pequeno
banheiro para resolver o problema.

Desnecessário dizer que ele conta para os dois colegas de


banda. Já é ruim o suficiente lidar com as cólicas e dores nas
costas, mas tudo isso enquanto tiram sarro de você? É como ter
doze anos durante a primeira menstruação novamente.

MARIANA ZAPATA
Quando as piadas continuam sendo feitas pelo meu irmão,
Mason e aquele imbecil do Gordo, estou tão perto de perder minha
paciência que finalmente me escondo no beliche.

Horas depois, quando desço o último degrau para sair do


ônibus, machuco a pele que cobre meu tendão de Aquiles, jogo
uma pedra em Eliza que ri. Apenas Isaiah e Carter perguntam se
estou bem porque são seres humanos decentes. Meu irmão e meus
amigos são malditos idiotas.

Para completar, meu celular cai do bolso e o canto da tela


quebra. Eu literalmente levanto as mãos para o céu como se
estivesse em algum tipo de sacrifício para um deus do sol e grito
como uma psicopata.

Vou direto arrumar a mesa de trabalho depois de descarregar


as mercadorias, grata por Carter ser um cara bom que não gosta
de me aterrorizar.

Em um breve momento de culpa, Eli manda uma mensagem


e pergunta se quero comer algo, já que não há nada no local. Para
ser honesta, a única razão pela qual concordo é porque o gerente
da turnê do The Cloud Collision lhe deu meu dinheiro. Caso
contrário, eu diria para ele chupar suas bolas e me deixar em paz.
Mas quando saio para encontrá-lo, imediatamente passo pelo meu
irmão gêmeo.

Eu o encaro.

Então encaro um pouco mais antes de murmurar: “Não posso


lidar com você hoje.”

Ele me dá esse olhar idiota que implora por um tapa. “O que


foi?”

Devo deixar claro que anos atrás, Mase e eu jogamos fora


vinte camisas polo estúpidas e feias de Eli, que eram pequenas
demais para ele, e faziam com que parecesse um idiota gigante.
Aparentemente, ele não sabia que vestir não apenas uma, mas

MARIANA ZAPATA
duas camisas com as golas rasgadas ao mesmo tempo era...
apenas... não. Não. Eu quase estremeço com essa lembrança.

Ele se queixou do que havíamos feito? Não. Ele reclamou.


Reclamou muito. Mas Eli era fácil e felizmente, nunca mais voltou
a comprar polos.

Até agora, aparentemente.

Todo o dinheiro dos Barreto estava lá orgulhosamente em


uma polo verde-esmeralda limpa, o que teria sido bom... se não
estivesse com a gola levantada. Ugh “Você gostou?” Ele pergunta
com tanto entusiasmo que não consigo encontrar em mim uma
reclamação.

Olho para Mason, que está de pé atrás dele, olhando


diretamente para o pescoço de seu amigo com uma expressão
engraçada no rosto. Eu acho que seu olho pode estar contraindo.

“Legal, hein?” Eli pergunta novamente buscando a


confirmação que apenas alguém usando um boné de caminhoneiro
poderia dar.

Tirando relutantemente a careta do meu rosto, concordo.


“Claro, E. Se ainda estivéssemos em 2002 e você estivesse no time
de lacrosse.”

“Tesouras, precisamos de tesouras, Flabs”, Mase murmura


alto o suficiente para meu irmão ouvir.

Eli franze a testa e manda a gente se foder antes de começar


a dar a volta no ônibus em direção a uma lanchonete que eles
ouviram que é boa. Nós mal chegamos perto do prédio quando toco
no bolso de trás e percebo que esqueci meu telefone.

“Droga, esqueci meu telefone no ônibus. Vou pegá-lo


rapidamente.” Nem sequer espero que eles concordem que ficarão
me esperando antes de correr de volta para o ônibus. Conhecendo-
os, eles irão esperar talvez cinco minutos. Se eu não voltar nesse
tempo, me deixarão para trás. O fato é que eu não confio em deixar

MARIANA ZAPATA
meu telefone perto desses caras. Nem mesmo os caras do TCC.
Embora eu não tenha falado com Miles ou Julian desde o incidente
com Brandon, ainda me dou bem com o resto do grupo do TCC e
não confio que eles não vão postar fotos de pau nas minhas
páginas de mídia social ou qualquer outra coisa que minha mãe
possa ver.

Entro no ônibus e encontro Gordo em seu computador em um


dos sofás. “O que houve?” Ele pergunta.

“Nada. Esqueci meu telefone e estamos indo comer. Você quer


que eu traga algo?” Pergunto, caminhando pelo ônibus em direção
a metade.

Ele balança a cabeça. “Vou pegar algo depois.” Inclina o


queixo e vira a cabeça para o lado, na direção dos beliches atrás.
“Espere Flabs. Sacha está lá atrás com uma garota...”

Há uma garota lá atrás com Sacha?

O que?

Há uma garota lá atrás com Sacha?

Eu…

Eu sinto... sinto meu estômago despencar, então continua em


direção a primeira camada da crosta terrestre e desce direto para
o seu núcleo.

Ele está lá com uma garota.

Meu coração dispara, sufoca e morre um pouco naquela


fração de segundo.

Mas de alguma forma me encontro acenando, ainda olhando


para o rosto de Gordo.

Menina. Lá atrás. Sacha

Sacha, Sacha, Sacha que acabou de ir ao cinema comigo e


disse algo sobre minha bunda.

MARIANA ZAPATA
Lá atrás com uma garota.

Porcaria. Por que meu peito dói? É assim que dói um ataque
cardíaco?

Antes que possa pensar muito sobre isso, tomo a decisão


precipitada de ainda ir para a área dos beliches, porque se não
fizer isso, Gordo saberá que algo está errado. A tensão palpita entre
minhas sobrancelhas diante do mistério por trás do que eu possa
ver.… ou ouvir...

Porra!

Eu balanço a cabeça para o meu velho amigo, mas consigo


segurar o sorriso fraco. “Obrigada pelo aviso.”

Prendo a respiração quando entro na área de beliche. Meu


coração dispara e um nó se forma na minha garganta...

Seu beliche fica acima do meu. Seu beliche fica acima do meu.

Mas ele não está lá.

Eu ouço as vozes antes de perceber que a porta que dá para


a sala dos fundos está aberta, e vejo. Os vejo.

Sacha está sentado no banco em frente à porta com o braço


por cima dos ombros de uma menina. Suas testas estão se
tocando. E eles estão sussurrando um para o outro.

Em um piscar de olhos, meu peito começa a doer novamente,


e mesmo que eu não queira culpar a intimidade do momento que
estou vendo, sei que é por isso. Não há como começar a descrever
o sentimento que inunda meu peito antes de subir pela minha
coluna, ombros e finalmente meu crânio. É como se eu quisesse
vomitar ao mesmo tempo em que uma enxaqueca se instala no
meu cérebro.

Dou um passo para frente mais perto do meu beliche, lutando


contra a náusea no meu interior.

MARIANA ZAPATA
“Não podemos fazer isso aqui...” ele diz apenas alto o
suficiente para eu ouvir.

Oh inferno.

Minha cabeça lateja. Meu estômago está em um nó. Lágrimas


inundam meus olhos por uma fração de segundo antes que eu
deslize meu tronco para o meu beliche, pegando o telefone no canto
que sempre deixo, esmagando meu cotovelo na madeira que
conecta todas as camas. Dói como o inferno? Sim, mas eu nem
sequer xingo porque faria muito barulho, e preciso sair do ônibus
o mais rápido possível. Dois minutos atrás, de preferência.

O que diabos há de errado comigo?

Meu coração bate de forma irregular quando passo por Gordo


na saída; minhas mãos começam a tremer. Eu reconheço o
sentimento passando através do meu corpo muito bem.

Estou com ciúmes. Horrivelmente, estupidamente,


pateticamente enciumada.

Enciumada com a ruiva que está sentada ao lado de Sacha.


Com seu braço em volta dela. Tocando seu rosto com o dele.

Quero dizer, eles podem ser amigos, mas também não quero
ser ingênua. Mason e eu somos mais próximos que melhores
amigos, e não temos limites físicos um com o outro, mas nunca
nos sentamos juntos, sussurrando. Geralmente estamos
brincando, não nos abraçando e babando. Há intimidade quando
as pessoas sussurram.

Isso me faz querer chorar.

Mas não choro.

Sacha é meu amigo. Eu não devo ter nenhum sentimento por


ele, muito menos sentimentos possessivos, mas tenho. Eles estão
enterrados no fundo da minha cabeça, obviamente, porque estou
nadando no Rio Nilo.

MARIANA ZAPATA
Gosto dele. Gosto muito dele aparentemente, se as terríveis
emoções de merda que estão correndo pelo meu sistema nervoso
estão corretas. Burra, burra, burra.

Eu quase esqueci que Eli e Mason podem estar esperando por


mim quando chego ao lado do prédio, mas eles estão lá, parados
olhando para seus telefones. Antes que possam me ver, limpo os
olhos com as costas da mão para me certificar de que meu corpo
não está sendo um maldito traidor e tento controlar meu rosto.

Este não é o momento para ficar chateada. Inferno, nunca


será hora de ficar chateada se Sacha passando tempo com uma
garota. No ônibus. Com o braço em volta dela.

Não vou ficar chateada. Não vou ficar chateada, droga.

Ao longo dos anos ouvi todos os tipos de histórias de membros


da banda transando com seus fãs. Inferno, Mason contou ter feito
sexo com uma garota atrás do ônibus em Las Vegas há alguns
dias. Toda vez que saio em turnê com o Ghost Orchid, todos os
monstros têm algum tipo de “interação” com seus fãs, até mesmo
Gordo. Isso é o que caras solteiros fazem. E outros não tão solteiros
que são pedaços de merda.

É uma história antiga. Mesmo o membro da banda menos


atraente é atingido por uma fã ou alguém da plateia pelo menos
uma vez; se eles fazem algo sobre isso, é uma coisa diferente. Há
algo sobre músicos, até mesmo os pouco populares, que os tornam
mais atraentes para as mulheres. Entendo isso.

Só que desta vez, parece um golpe no rim ver um homem que


não estou namorando, que não é nada mais do que um amigo, com
alguém no ônibus.

Eu sinto...

“O que no inferno está errado com você?” Meu gêmeo


pergunta enrugando o nariz enquanto caminho até eles.

“Minha perna dói onde raspei”, minto rapidamente.

MARIANA ZAPATA
Eli pisca. “Idiota.”

E ele deixa para lá por um tempo.

Enquanto comemos, ele fica olhando para mim, perguntando


se estou bem — ou em suas palavras exatas, “o que está enfiado
na sua bunda?” Eu digo a ele que meu tornozelo está doendo, que
estou com cólicas e não estou me sentindo bem. Mason franze a
testa a refeição toda.

Não posso deixar de notar que Eli vem me ver durante o show
naquela noite, o que significa que ele realmente vem ao stand em
vez de ficar nos bastidores ou no ônibus o tempo todo. Ele não
pergunta mais o que está errado, mas sei que pode dizer que algo
está me incomodando. Toda a coisa com Sacha no ônibus deixou
um buraco no meu peito. Estou triste. Triste. É lamentável.

Não consigo nem aproveitar o show. Enfio meus tampões de


ouvido e sento com os braços cruzados todos os momentos que
posso. É claro que esta é a noite em que o público está super
tagarela e as pessoas mencionam o nome de Sacha a cada cinco
segundos porque é sua cidade natal.

Em algum momento, um fã tenta sair com dois CDs que estão


em exibição na mesa, o que se transforma em um desastre comigo
confrontando-o, e os guardas tendo que se envolverem quando
Carter os chama. O cara me chama de puta antes de ser expulso
do show. Então, no geral, as coisas poderiam estar melhores.
Muito melhores.

Eu nem sequer faço uma pausa naquela noite, exceto para


fazer xixi e trocar meus fones porque não quero lidar com ninguém.

Pensei que minha noite acabaria quando eu terminasse de


arrumar as malas e ajudasse Carter a carregar o carrinho.

Mas o destino tem outros planos e quer virar essa adaga de


prata no meu intestino uma última vez.

MARIANA ZAPATA
“Nós vamos comer, Flabs”, Eliza diz assim que entro no
ônibus.

Faço uma careta porque sinto que ele está mal-intencionado.


“Não estou com fome.”

O olhar que ele lança para mim poderia ter derretido cera.
“Você não está com fome? Agora sei que algo está errado. Você
sempre está com fome.”

Vejo que Eli realmente presta atenção de vez em quando. Eu


não lhe dei crédito suficiente. Meu gêmeo me conhece. Ele é muito
mais esperto e mais gentil do que seu coração enferrujado lhe
permite. Se há alguém para quem Eli mudaria o Kilimanjaro, essa
sou eu.

Talvez. Se eu perguntar a ele no dia certo no momento certo


com uma lua azul no fundo.

Se eu mentir para ele falando que nada está errado, ele vai
saber. Ele sempre sabe e por isso não para de perguntar. Então
faço a próxima melhor coisa: uma mentira parcial. “Me sinto
doente. Só isso.”

“Hmm.” Ele estreita os olhos. “Que pena, mas vai comer. Caso
contrário, vou ficar preso ouvindo você reclamar em algumas horas
sobre como está morrendo de fome e essa merda é irritante.” Ele
olha para mim por outro segundo antes de me puxar para o
assento ao seu lado, jogando o braço sobre os meus ombros.

Eu nem me importo que ele está suado, então coloco a cabeça


em seu ombro e fecho meus olhos. Afastando tudo que está
acontecendo no ônibus que está começando a mexer, fico no
mesmo lugar, apreciando o raro momento em que meu irmão é ao
mesmo tempo tranquilo e reconfortante. A próxima coisa que
percebo é que o ônibus está parando de novo em frente a algum
restaurante. Saio com o resto do Ghost Orchid, os membros do
TCC seguindo atrás, embora eu não esteja exatamente olhando.

MARIANA ZAPATA
Uma mão quente agarra meu ombro quando entramos. É
Mason, olhando para mim com olhos preocupados. “Você está
bem?”

“Na verdade, não.” Dou a ele um sorriso indiferente.

Não quero olhar para trás, mas porque sou uma idiota, eu
faço. Vejo Sacha no estacionamento com dois caras, outra garota
e a ruiva de antes, antes de entrarem. Meu estômago cai de novo,
e me viro para esperar que a garçonete junte três grandes mesas
para todos nós nos sentarmos.

“Você viu E saindo do palco?” Mason pergunta, sentado em


seu lugar ao meu lado.

Em circunstâncias normais, eu teria pedido detalhes


específicos e ficaria desapontada por perder meu gêmeo passando
vergonha, mas ter testemunhado a cadela de olhos verdes faz eu
mal conseguir sorrir. “Não.”

Ele franze a testa e puxa a ponta do meu rabo de cavalo suado


o suficiente para me fazer gritar. “Eu não gosto de ver você assim.
Pare com isso.”

“Seu idiota”, eu gemo, esfregando o local onde meu cabelo


está amarrado. “Espero que sua navalha arranque alguns pelos na
próxima vez que você se barbear lá”, murmuro.

Mason ri. “Ai está minha noiva.” Ele me dá uma cotovelada


com uma piscadela. “E eu não me depilo.”

Oh meu Deus.

Nesse momento, digo a mim mesma para ignorar o sentimento


no estômago e consigo, mais ou menos. Bufando, penso em
abraçá-lo por um segundo até que me lembro que ele não toma
banho há alguns dias, e ao invés disso cutuco o local debaixo de
suas costelas, onde sei que sente cócegas. Quando as mesas estão
prontas, sento entre ele e Eli, com Carter, Gordo e Freddy em frente
a nós.

MARIANA ZAPATA
Avisto Sacha três assentos do lado em que estou. Posso ou
não ter notado que ele puxa a cadeira ao lado dele para a ruiva
antes de sentar. Peço minha comida e tento me concentrar na
conversa ao meu redor — uma é sobre o cereal Fruity Pebbles
contra o Frosted Flakes, e a outra discute madeiras usadas em
guitarras. Em um ponto, noto Sacha inclinando-se sobre a mesa
olhando para mim, mas felizmente Eliza se move uma fração de
segundo depois, bloqueando sua visão.

Quando me levanto para usar o banheiro depois de terminar


minha refeição, puxo meu telefone do bolso e começo a cutucar a
tela como se estivesse ocupada enviando uma mensagem
importante para que eu possa me concentrar nisso e não nas
pessoas que estou passando. Uma vez no banheiro, uso o mais
devagar possível, disposta a sentir aquela sensação desagradável
e inquietante que incomoda meus nervos.

Ele tem uma namorada ou uma garota que está interessado.


Isso é realmente tão surpreendente? Não deveria ser.

Eu não estou particularmente deslumbrante; raramente


coloco um monte de esforço em minha aparência, e
constantemente nos provocamos e conversamos sobre funções
corporais. Isso não exatamente grita romance.

Bem. Tudo bem. Está tudo bem; pelo menos ficará.

Saio do banheiro, voltando para a mesa com uma dor de


cabeça. Ao contrário de antes, fixo meus olhos na parede à minha
frente para não olhar quando passo pelo assento de Sacha. Estou
sendo imatura? Talvez um pouco, mas não me importo. Meu
coração está batendo, minha cabeça lateja e me sinto uma idiota.

A mão quente e firme que pousa no meu antebraço me detém


quando vejo o cabelo raspado na lateral da cabeça de Sacha na
minha visão periférica.

“Fight Club”, sua voz murmura, aumentando o aperto em


meu braço.

MARIANA ZAPATA
Leva tudo em mim para engolir a bílis que misteriosamente
aparece em meu estômago antes de olhar para ele, tão inexpressiva
e indiferente quanto possível. Amigos. Nós somos amigos, eu me
lembro. “Ei.”

Aqueles olhos cinzentos passam pelo meu rosto, que sei que
está manchado de delineador e levemente oleoso do tanto que suei
durante o dia. Meu cabelo é uma bagunça com o rabo de cavalo
lateral e também há manchas de ketchup na minha camisa. Então,
basicamente, pareço tão atraente quanto possível...

Para um cego.

“Gaby, quero que você conheça meus amigos.” Sacha diz, me


observando engolir em seco. Ele começa a apontar para as quatro
pessoas que o cercam. “Esses são Matt, Seb, Bianca e Liz.”

Liz. A ruiva.

Buscando profundamente dentro de mim minha adulta


interior, puxo o braço do aperto de Sacha para olhar para seus
“amigos” e aceno. “Oi”, eu os cumprimento, percebendo o quão
falsa é a cor vermelha no cabelo da sua “amiga.” Quem ela acha
que é? A pequena sereia?

Todos me cumprimentam, mas é a última pessoa que faz


minha cabeça doer mais.

“Olá”, responde a filha ilegítima de Ronald McDonald,


piscando os grandes olhos castanhos em minha direção. Ela tem
esse tipo de beleza clássica que dá tesão em um fotógrafo. E pele
perfeita, clara e pálida.

Que puta.

“Seu cabelo é tão fofo”, ela acrescenta.

Uma grande parte de mim quer dizer algo realmente foda


como “até parece que me importo” ou “vá se foder.” Não faço isso.
Mas realmente quero.

MARIANA ZAPATA
É minha menstruação falando. Certo.

Eu apenas sorrio rigidamente. “Obrigada.”

“Queria que você os conhecesse mais cedo, mas você


desapareceu”, explica Sacha com um sorriso no rosto que faz meu
estômago querer se revoltar.

Aceno para ele, mas é tão forçado que tenho certeza que meu
nível extremo de desconforto tem que ser aparente.

Estranho.

Tusso e aponto para a mesa. “Vou terminar de comer. É...”


quase engasgo com as minhas palavras porque sou uma péssima
mentirosa, “...prazer em conhecer todos vocês.”

Eu nem sequer me incomodo em esperar que alguém diga


alguma coisa antes de volta ao meu lugar, me sentindo uma idiota
completa. Eu sei o quão fora da realidade tem sido para mim dizer
que nunca terei sentimentos por outro homem porque não quero
o drama associado a um rompimento nunca mais, mas isso é
ridículo. Eu me sinto traída e não tem razão para isso. Eu sou
apenas a garota que Sacha conhece e se dá bem porque estamos
presos em um ônibus em uma viagem juntos. Isso é tudo. Meu
maldito coração estúpido aperta no peito enquanto sento lá
miseravelmente.

Eu não falo com Sacha por uma semana.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 11

“O que você está fazendo, garotinha?” Uma voz sussurra ao


mesmo tempo em que uma mão segura meu braço.

Em vez de gritar, como a maioria das pessoas sensatas, que


estão sentadas no escuro vendo Sabrina com uma garrafa de vinho
na mão, eu acabo me urinando um pouco. Juro por Deus. Eu me
mijo. Não muito, mas o bastante.

Gostaria de justificar o que aconteceu admitindo que meu


subconsciente deveria sempre reconhecer o idiota que
aparentemente se arrastou pelo chão para me assustar.

“Droga, Mase”, grito enquanto puxo as pernas contra o peito,


sentando ereta.

Certamente, ele está deitado no chão com um grande sorriso


no rosto. “Assustei você?” Ele pergunta enquanto arrasta as calças
de pijama e fica em pé.

“Sim. Preciso trocar minha calcinha agora, obrigada.”


Felizmente, eu trouxe minha mochila da área do beliche quando
levantei.

Ignoro sua risada quando vou ao banheiro e tiro minha roupa


íntima super sexy, colocando-a em uma das sacolas plásticas que
ficam escondidas embaixo da pia para caso de emergência. Noto
que minha menstruação finalmente acabou. Não tenho certeza se
meus hormônios ainda estão fora de sintonia devido a isso, ou se
estou apenas sendo mal-humorada porque tenho uma desculpa.

Eu ainda estou me sentindo muito mal durante toda tarde e


à noite — ok, durante toda a semana — mas ficou pior depois que
corri para o trailer no meio do show de abertura e vi Sacha, Julian

MARIANA ZAPATA
e Miles cercados por cinco meninas vestindo shorts que mais
pareciam roupas íntimas e tops curtos. Prostitutas.

Para ser justa, tento ficar longe de quase todos, exceto Carter,
que é a única influência calmante na turnê, nos últimos sete dias.
Faço isso principalmente porque sei que estou sendo melancólica
e mal-humorada. Há também o fato de que os três patetas me
conhecem muito bem, e se eles se importarem realmente, podem
descobrir que há mais na minha atitude do que simplesmente a
menstruação.

Então digo a todos que estou doente.

É por isso que estou escondida no meu beliche durante a


maior parte da semana.

Exceto esta noite, não consigo dormir. É a primeira noite de


uma viagem de dois dias de Winnipeg a Toronto, e dormi a maior
parte do dia. Deitei na cama lendo até meus olhos doerem, e no
momento que o ônibus ficou em silêncio, acreditei que todos
estavam dormindo. Quieta como um ninja, levantei e saí da área
dos beliches com a mochila, peguei a garrafa de vinho comprada
naquela tarde na geladeira e zapeei pelos canais de televisão.

Nem meia hora depois que o velho filme clássico começou,


Mase levantou.

Odiando a ideia de voltar para a cama, vou para a sala de


estar e encontro-o sentado no sofá oposto ao meu, bebendo vinho
diretamente da garrafa enquanto assiste o filme no mesmo volume
superbaixo que eu deixei. Quando ele me ouve fechar a porta do
banheiro, olha e sorri.

“Tem algumas calcinhas novas?”

“Ha ha”, murmuro.

Mase simplesmente sorri quando toma outro gole. Seus olhos


desviam para a tela. Sento no mesmo local em que estive e volto a
assistir ao filme. Alguns minutos se passam antes que eu sinta o

MARIANA ZAPATA
movimento da garrafa contra a minha mão. Ele está passando para
mim, então pego.

Eu mal tomo um gole quando ele pergunta: “Você finalmente


está melhor?”

“Estou me sentindo um pouco melhor”, respondo, olhando


para ele, tentando ser legal e indiferente.

Ele me dá um olhar que imediatamente me faz sentar. “Eu


tenho ESTÚPIDO escrito na minha testa?”

Eu pisco. “Isso é uma pergunta capciosa ou...?”

O idiota nem hesita na fração de segundo que leva para


atravessar o espaço entre nós e beliscar minha bochecha. Eu grito
e tento me afastar, mas isso só faz a dor piorar.

“Você terminou sua merda com Sacha?” Ele finalmente é


direto e pergunta depois de largar meu rosto.

Hum.

O que posso fazer? Apenas olho para ele. Se não admitir ou


negar qualquer coisa...

“Papai Mason sabe de tudo.” Ele ergue as sobrancelhas


enquanto se recosta no sofá novamente. “Tudo”, ele avisa.

Oh inferno. “O que...”

Mason me encara com aqueles intensos olhos azuis e paro de


falar. Nós dois sabemos que é inútil. Eu aqui pensando que estava
me esquivando, escondendo e fingindo que estava doente, e ele
sabia a verdade. O que só significa que os outros dois idiotas
devem saber também.

Isso definitivamente vale o suspiro que sai de mim quando


dou de ombros, resignada. Franzo o nariz, envolvendo os braços
em meus joelhos dobrados novamente. “É tão óbvio?”

MARIANA ZAPATA
Ele dá de ombros. “Descobrimos isso no dia seguinte a São
Francisco.”

Estremeço.

“Você não pode esconder nada de nós”, ele diz, confirmando


o que eu já deveria saber.

Suspiro novamente. “Isso é o que eu estava com medo,


caramba.” Pensando nisso por um segundo, penso em algo. “Por
que Eli não disse nada?” Nós dois sabemos que ele não sabe como
ou quando calar a boca. Inferno, todo mundo sabe disso.

“Ele não quer te irritar.”

Sim, isso me faz rir. “Desde quando?” Ele geralmente faz de


tudo para me irritar.

Isso faz Mase sorrir. “Desde que você foi embora da última
vez, Flabs. Merda, eu não quero te chatear também. Tudo isso é
uma droga.” Ele faz uma pausa e me dá o que pode ser considerado
um olhar tímido se durasse mais que um segundo. “Quantos
meses passaram antes de você começar a falar conosco
novamente?”

“Alguns”, respondo quase culpada. Mas, de novo, porque


estou me sentindo culpada? Eles abriram suas bocas grandes e
disseram algo que não era da conta deles. “Senti falta de vocês
também, mas...”

“Eu sei que fodemos tudo.”

Nós nos olhamos em silêncio. Realmente não há muito a dizer


depois disso. É a primeira vez que qualquer um deles reconhece
completamente que fizeram algo para ferir meus sentimentos. Eu
praticamente acordei um dia e decidi perdoá-los por serem idiotas.
Estava cansada de ficar com raiva e, sinceramente, realmente senti
falta deles.

MARIANA ZAPATA
A próxima vez que os vi na casa de meus pais durante o Dia
de Ação de Graças, ninguém mencionou o que aconteceu e
continuamos como se aquela noite nunca tivesse acontecido. Na
realidade, eles disseram aos membros das outras duas bandas que
estavam na turnê que eu iria colocar silicone porque tinha “um
pequeno e um grande”, como me lembro muito claramente. Eles
riram depois, bêbados e chapados, sem saber que eu estava
escutando.

Não foi eles dizendo às pessoas que eu iria fazer uma cirurgia
e colocar silicone que me incomodou. Quem se importa se eles
soubessem? Eu não estava envergonhada; estava em êxtase por
finalmente poder dar este próximo passo. O que tocou
profundamente dentro da minha alma e me fez chorar no banheiro
por dez minutos, foi a risada. Eles riram de algo que me incomodou
por tanto tempo. Eu não conhecia mais ninguém que tinha sido
chamada de “deformada” aos treze anos no acampamento e depois
riu. Ninguém entendia como era nunca poder usar tops a menos
que o decote fosse alto, ou tentar encontrar sutiãs ou biquínis que
pudessem ser facilmente preenchidos com enchimentos para que
a diferença não fosse tão perceptível. Eu nunca deixei ninguém
além do meu médico ver meu peito, nunca. Nem mesmo com sutiã.
Eu nem deixava minha mãe ou Rafe me verem de sutiã. Brandon
foi a primeira pessoa desde o meu cirurgião plástico e meu
ginecologista que viu meus seios desde que começamos a namorar
logo depois da cirurgia.

E esses três caras que eu amava, me conheciam e também me


amavam, riram às minhas custas na frente de outras pessoas.

Então, sim, eu não pediria desculpas por não falar com eles
por alguns meses. Eles mereceram. Desde então, anos se
passaram, e não vou falar sobre isso mais do que o necessário.

Mase sorri, como se soubesse exatamente o que estou


pensando, e dá um tapinha no assento ao lado dele. “Venha aqui.
Venha sentar ao lado de alguém que ama sua bunda bêbada.”

MARIANA ZAPATA
“Não estou bêbada.”

Ele me lança um olhar. “Você está bebendo direto da garrafa,


sentada no escuro assistindo a um dos seus filmes favoritos. Você
realmente vai me dizer que não está?”

O fato dele saber que Sabrina é um dos meus filmes favoritos


não é perdido. Então pisco. “Não me julgue.”

“Tarde demais.”

Isso me faz rir. Antes que possa pensar duas vezes, levanto e
sento ao lado dele, me apoiando em seu ombro com um suspiro.
“Eu sou tão estúpida.”

Ele me garante que não sou burra? Claro que não. “Não diga,
Sherlock.” Ele dá um tapinha no meu joelho. “Se isso faz você se
sentir melhor, não fiquei surpreso. Depois de mim, ele é o cara
mais bonito da turnê”, sua bunda modesta explica. “O cara é um
imbecil, Flab. Você sabe que garotas amam cantores. Gordo
escolhe as garotas que fica e nem gosta delas. E ele é um filho da
puta feio. Entende?”

Ugh.

Claro que já sei de tudo isso, mas ainda assim... Ele não
precisa falar assim. Há uma hierarquia de atração nas bandas,
independentemente de como os membros realmente parecem: todo
mundo gosta do cantor mesmo que pareça que ele usa heroína; em
seguida estão os guitarristas, os bateristas, os baixistas e
finalmente os tecladistas. São com atores que não são bonitos, mas
as mulheres gostam deles de qualquer maneira porque são
famosos.

“Eu não o vi com ninguém, se isso faz você se sentir melhor”,


ele acrescenta. “Mas…”

“Sim. Sim. Eu sei.” Mas ele ainda estava com aquela garota.
Um fato que venho tentando aceitar por uma semana.

MARIANA ZAPATA
Digo a mim mesma o que venho dizendo desde então: ele não
é meu namorado, ele é meu amigo, e preciso superar esse
sentimento possessivo e ciumento. Vou superar. Espero que sim.

Com outro suspiro, olho para Mason, que ainda me deixa


inclinar sobre ele e sorrio com relutância. “Você realmente sabia
que eu estava cheia de merda desde o começo?”

“Você é minha melhor amiga pela minha vida inteira. É claro


que sei quando algo está te incomodando”, ele afirma.

Isso me faz sorrir de verdade. Nós somos melhores amigos


durante toda a nossa vida; esse menino-homem lindo e idiota que
uma vez teve um espaço entre os dentes e não cresceu até quase
dezesseis anos. Quantas coisas fizemos um pelo outro? Mais do
que eu poderia contar e só isso faz meu coração inchar de carinho.
A maioria das pessoas não tem um único melhor amigo, e eu não
tenho apenas vários — mas alguns que até cometeriam crimes por
mim. Esse cara é um deles. Ele é perfeito? Absolutamente não.
Nem eu.

Mas quem precisa de perfeição quando tem alguém leal,


engraçado, com leves problemas mentais que conhece você por
dentro e por fora? Eu não preciso. “Você sabe que eu te amo,
certo?”

Ele coloca a mão na minha cabeça e bagunça meu cabelo já


bagunçado. “Sim, eu sei, Flabby.”

Sorrio para ele e ele sorri de volta.

Então ele mexe no meu cabelo um pouco mais. “Se isso faz
você se sentir melhor, seus peitos são melhores do que os daquela
garota.”

É rude? Claro que sim, mas sorrio de qualquer maneira, e eu


rir faz Mase rir também.

“O que eu faria sem você?”

MARIANA ZAPATA
“Ficaria entediada até a morte”, ele responde, puxando meu
cabelo.

Fecho os olhos.

“Não gosto de ver você chateada, então pare com isso. Uma
semana é tempo suficiente.”

Se ele tivesse me visto logo depois do meu rompimento. Além


disso, ele já fez sabe-se lá o que no carro de Brandon em retaliação.
“Vê? E Mandy costumava dizer que você não se importava com
nada.”

Ele franze a testa. “Eu esqueci dela.”

“Eu só lembro dela me dizendo que iria chutar a minha bunda


se eu não parasse de enviar mensagens para você.” Então eu disse
a ela que estava na vida de Mason antes dela e continuaria depois,
só para ser uma vadia.

Ele ri. “Ela odiava sua coragem! Não lembrava disso!” Ele solta
um suspiro. “A maioria das minhas namoradas...” para constar,
ele não teve uma namorada oficial em pelo menos cinco anos,
“...não gostava de você, agora que penso sobre isso.”

Claro que não. A maioria delas sempre achou que havia mais
na nossa amizade do que realmente existia. Não que eu pudesse
culpá-las, mas sempre tentei ser mais respeitosa e não apertar
suas bochechas quando ele estava namorando alguém.

“Lembra de Teresa Martinez no primeiro ano? Terminei com


ela porque disse que você era irritante.”

Pisco, sabendo exatamente a quem ele está se referindo. Ela


foi uma das namoradas dele que me irritavam. Aquela cadela falsa.
Enquanto percebo que é idiota ficar ofendida com um comentário
que alguém fez há dez anos, não posso deixar de ficar um pouco.
“Ela disse isso para você?”

MARIANA ZAPATA
“Sim. Eu não pude acreditar. Você é uma dor na bunda, não
é chata.”

Bufo. “Bem, ela era uma puta, eu lembro disso.”

Ele me dá uma cotovelada com uma risadinha. “Eu sei. É por


isso que saí com ela.”

Oh Deus.

Então ele continua, como se eu quisesse ouvir todas as coisas


ruins que suas namoradas disseram sobre mim. Não quero. “Você
se lembra de Crystal Hernandez? Último ano? Ela te chamou de
puta. Deixei que ela me desse um boquete e nunca mais liguei.”

Minhas mãos passam pelo meu rosto enquanto reprimo a


vontade de rir. Quando finalmente me controlo, seguro as
bochechas e balanço a cabeça. “Que gesto nobre. Sério. Obrigada.”

Mason sorri. “Certo?”

Soltando minhas mãos, concordo com ele. Há lágrimas nos


meus olhos e nem me incomodo em piscar. “Eu não trocaria você
por um milhão de dólares, Mase.”

Sua resposta me atinge.

“Mas por dez milhões, eu pensaria em algum tipo de horário


de visitas.”

É a dor no pescoço que me acorda.

Há também o fato de que uma das minhas pernas está quente,


meu braço está dormente e estou com dor de cabeça.

Eu mal abro os olhos para descobrir o que diabos está


acontecendo quando percebo que não estou no meu beliche. A
almofada embaixo de mim é mais dura do que deveria e há muita
luz. Que diabos?

MARIANA ZAPATA
Tento clarear minha última memória, que é de Mase e eu no
sofá assistindo comerciais e discutindo se a cola que eles estão
apresentando realmente funcionaria ou não. Depois disso, não
consigo lembrar de nada. A única resposta que encontro é que não
preciso ser um gênio para descobrir que minha cabeça dói da
garrafa que terminamos juntos.

Quando consigo abrir outra pálpebra, confirma-se que ainda


estou no sofá. Minha cabeça está apoiada no meu bíceps como
travesseiro e, felizmente, estou de costas para a sala, assim
ninguém pode ver meu rosto enquanto durmo. Não é até quando
tento me ajoelhar que percebo porque minha perna está tão
quente. Mase está desmaiado, com metade do seu corpo em cima
de mim. Ele está usando minhas costas como travesseiro, e acho
que pode estar com o rosto na minha bunda.

Gemo quando começo a balançar um dos ombros de Mason


cegamente, tentando não sentir o gosto estranho na minha boca.
“Eu preciso levantar”, sussurro, empurrando-o até que ele
resmunga e se contorça ao redor. Assim que ele se mexe, rolo para
fora do sofá e apenas caio sobre minhas mãos e joelhos antes de
bater minha bunda. Gemo, jurando nunca mais beber tanto vinho.
Isso é quando olho para cima.

Sentado no sofá oposto, olhando diretamente para mim com


uma tigela contra o peito, está Sacha.

Claro que sim.

Sorrio fracamente e fico em pé sussurrando. “Bom dia.”

Desvio o olhar antes que Sacha responda “Dia, Gaby”,


enquanto me inclino e aperto o ombro de Mason um pouco mais.

“Volte para o seu beliche, cabeça de crack”, digo ao meu


amigo.

MARIANA ZAPATA
Mase geme e rola de costas, abrindo um olho sonolento. Ele
me dispensa e acho que fiz o meu melhor. Se ficar com o rosto
marcado com a estampa do sofá, a culpa é dele.

Cambaleio para a cama, puxo a cortina e volto a dormir.

“Gaby? Você está acordada?”

Sim, estou acordada. Não, eu ainda não quero falar com ele.

Estou deitada no meu beliche durante a última hora, com a


cabeça doendo, a cortina bloqueando tudo e todos enquanto revezo
entre pensar e ler. Penso na minha família que vi a pouco e como
eles me amam, sobre Eli que é meu parceiro no crime pela vida,
Laila, Mason e Gordo. Eu até penso brevemente em Brandon.
Principalmente, penso sobre Sacha, como me sinto sobre ele e
como preciso superar isso. Ou pelo menos lidar com essa paixão
de forma mais eficaz.

Já superei um grande rompimento e isso não é nem um


rompimento, mas até certo ponto, parece pior. Talvez porque não
há uma única chance de algo acontecer. Ou talvez apenas sou
louca. Mais do que provavelmente sou apenas louca e burra, e uma
má perdedora.

Independentemente disso, preciso superar isso.

“Gaby?” A voz sussurra novamente.

Olho para cima como se pudesse ver através dos materiais


que separam a cama de Sacha da minha e sinto meus lábios se
juntarem por um segundo. Naquele mesmo momento, me pergunto
sobre o que ele gostaria de falar. Preciso de mais alguns minutos
para realmente acalmar minha mente, então fico quieta.

Eu os ouvi conversando sobre uma próxima parada em breve


para tomar banho, e não estou realmente com vontade de falar
com alguém por enquanto.

MARIANA ZAPATA
Supere isso, Gaby. Lide com isso. Pare de ser uma putinha.

“Best of the Best?” Sacha sussurra mais uma vez.

Eu não respondo, mas me sinto um pouco mal.

Estou sendo uma idiota? Tive amigos homens no passado que


gostavam de mim e eu não gostava por uma razão ou outra. Mas
fui estranha e rude com eles? Claro que não. Eles ficaram
chateados por eu não querer sair com eles?

Não. Eles não ficaram.

Em retrospecto, percebo que estou mais chata do que é


preciso. Me afastei para evitar Sacha. Quando ele fez qualquer tipo
de indicação que queria falar comigo, fiz algo para evitar. Sei que
fui imatura, mas estive tão desapontada comigo mesma que não
consegui falar com ele.

Isso não é culpa dele.

De repente, a cortina do meu beliche se abre e a próxima coisa


que sei, é que um corpo gigantesco causa um eclipse antes de rolar
na minha cama, fechando o material aveludado atrás.

E sei quem é “ele” mesmo antes dos meus olhos perceberem.


Posso reconhecer o cheiro de Eli em um aterro sanitário.

“O que você está fazendo?” Sussurro para ele, sua cabeça


exatamente a cinco centímetros da minha. Seu corpo aperta o meu
contra a parede, então fico de lado, encostada na parede.

“Você está acordada?” Ele pergunta em uma voz normal.


Ainda não consigo ver seu rosto claramente.

“Agora estou.” Sussurro de volta, consciente de que um certo


cantor ainda pode estar em seu beliche, ouvindo.

Ele me cutuca na testa com o dedo indicador. “Sua


menstruação ainda não acabou?”

MARIANA ZAPATA
Só ele poderia me perguntar isso. Juro que Eli é o homem
mais insensível do planeta. Houve momentos em que eu era mais
jovem e acho que ele realmente acreditava que éramos a mesma
pessoa em dois corpos diferentes. “Sim. Por quê?”

“Eu quero saber se você parou de ter esse humor de merda.”

À menção do meu humor de merda, tenho uma lembrança da


cena em que entrei no ônibus e meu estômago se revolta. Não
tenho o direito de ficar tão enciumada, mas meu cérebro e meu
corpo não enxergam esse ponto, aparentemente. Não vou dizer a
ele que Mase disse que ele sabe exatamente o que está
acontecendo. Se Eli não mencionar isso, eu também não irei.

“Acho que sim”, respondo honestamente, cutucando-o na


testa como ele fez anteriormente. “Acredito que sim.”

Ele faz um som baixo na garganta. Nenhum de nós diz nada


durante um longo minuto enquanto nos encaramos no meu
beliche, apertados. Apenas nos olhamos até que ele quebra o
silêncio em voz baixa. “Você não está planejando ir para casa,
certo?”

“Não.” Franzo o nariz apesar do fato de que ele provavelmente


não pode me ver fazendo isso. “Porque você pensaria isso?”

“Porque você não está feliz.”

E há mais um ponto para eu me sentir uma babaca extrema.


Toco seu nariz com a ponta do meu dedo. “Eu estou bem, E. Juro.
Não vou a lugar nenhum.”

Posso ver sua silhueta descansando a cabeça em sua mão.


“Não contei nada a ninguém sobre seus peitos, você sabe.”

Não pensei nenhuma vez que ele faria. Essa foi minha
segunda condição quando entrei na turnê, especialmente depois
que ele abriu a boca da última vez que estive com a Ghost Orchid.
“Não diga coisas assim em voz alta. Tenho certeza que metade

MARIANA ZAPATA
desses caras pensam que estamos tendo algum tipo de incesto;
não piore as coisas.”

Ele solta uma grande gargalhada que acordaria qualquer um


que ainda estivesse dormindo. “Foda-se, eles pensam, não é?
Mateo me perguntou há alguns dias se somos realmente parentes
ou isso é apenas uma mentira confusa que contamos para todos.”

“Como se eu aguentaria sua merda se você não fosse meu


irmão”, eu rio. “Feio.”

“Cadela, você foi abençoada por nascer ao meu lado.”

Isso me faz gemer alto. “Oh Deus. Cale-se.”

Eli apenas ri aquela risada que é minha favorita desde que


fomos crianças. Não é desagradável ou malvada, apenas... é.
“Estamos prestes a parar. Quer que eu trance o seu cabelo
depois?”

Como se eu fosse dizer não a ele.

Então isso me atinge. Quão ruim eu fui para ele realmente


estar se oferecendo para fazer isso? Mais um ponto contra mim.

“Obrigada, perdedor.”

Logo antes de sair da cama com uma última cutucada na


minha testa, ele diz: “Sua mãe é uma perdedora.”

Algumas coisas nunca envelhecem: como a provocação do


meu irmão, e o fato de que o sol nasceria e brilharia,
independentemente do que estava acontecendo na minha vida. Ou
não, neste caso.

Parei de ser uma vadia safada. Mentalmente lavo as minhas


mãos e paro com essa cena de quem teve seus sentimentos feridos
porque algum cara gostoso tem uma espécie de namorada. Eu não
tenho chance. Nunca pensei que tivesse uma. Estava apenas
sendo uma perdedora possessiva.

MARIANA ZAPATA
Não importa. Vou superar isso, como fiz com tudo mais no
passado.

Eu juro que é como se um peso tivesse sido tirado dos meus


ombros quando meu serial killer interno sai de férias pelas
próximas três semanas. Espero até ouvir todos saírem do ônibus
para descer do meu beliche, pegar roupas e ir em direção aos
banheiros. Me sinto rejuvenescida e mais parecida comigo do que
senti em muito tempo. Até minha cabeça para de doer, pela maior
parte do tempo.

Deve ser bem aparente que voltei ao normal porque Gordo me


dá um tapinha nas costas quando subo no ônibus depois do
banho. “Você parece estar se sentindo melhor.”

“Estou.” Eu o belisco no estômago como prova antes de


continuar.

Vou para a área dos beliches para deixar minha mochila no


chão. No caminho, alguém cutuca a parte baixa das minhas
costas. Com um olhar por cima do meu ombro, noto primeiro os
olhos cinza-claros.

“Oi”, diz Sacha, deixando cair a mão para o lado.

“Hey”, respondo, me endireitando e fechando a cortina no


meu beliche. Não sei o que dizer ou até mesmo como agir agora
que cheguei a um acordo com o fato de que não estou apenas
atraída por ele fisicamente, que ele não sente o mesmo em relação
a mim e que finalmente não vou deixar minhas piores emoções
comandarem minhas ações.

Sim. Posso lidar com isso. Uma lésbica poderia se apaixonar


por Sacha. Não há nada de errado em ficar atraída por ele. Além
disso, não é como se eu estivesse procurando por um namorado
também.

MARIANA ZAPATA
Sorrio para ele, apertado, tão apertado que fico tensa
enquanto tento aliviar a tensão dos meus ombros e os músculos
nervosos no meu abdômen.

Seu cabelo está molhado e suas bochechas ficam rosadas


enquanto me olha. Uma mochila pende de uma das suas mãos.
“Você está com raiva de mim?” Ele pergunta em voz baixa do nada.

Sinto uma pontada de culpa por tê-lo evitado


descaradamente, porque é exatamente o que eu fiz. Então penso
sobre ele e a ruiva no sofá e aquela sensação pesada no meu
estômago inunda minhas entranhas mais uma vez. Sim, a culpa
não dura tanto quanto deveria, mas preciso ser uma adulta e lidar
com isso. Não é culpa dele eu estar atraída, ele nunca foi nada
além de gentil comigo. De certo modo, estava irritada por ele
simplesmente ser uma ótima pessoa. Ele não pode deixar de ser
simpático, mesmo que eu não saiba lidar com isso.

Limpando a garganta, balanço a cabeça e mantenho meu foco


em seus olhos, minhas feições neutras. “Não. Porque estaria?” Isso
soa tão convincente quanto espero?

“Você não falou mais comigo. Toda vez que olho para você,
você desvia o olhar”, ele afirma com tanta naturalidade que quase
caio.

E me sinto culpada de novo.

Procuro as habilidades mentirosas que tanto usei quando


criança para salvar a bunda de Eli e dou a Sacha o mais honesto
sorriso de remorso possível. “Eu sinto muito. Está tudo bem. Não
estou brava com você.”

O que é verdade, tecnicamente. Não estou brava com ele.


Estou com raiva de mim mesma.

“Você tem certeza? Porque você não fica brava facilmente, e


se eu... “

Ali está, ele culpa a si mesmo. Bom Deus.

MARIANA ZAPATA
Eu nunca tive uma chance, não é?

Como eu não poderia gostar de Sacha? Eu não sou cega nem


surda. Ele é incrivelmente atraente, doce e simplesmente pateta.
Lembrar-me por que gosto dele não ajuda a situação.

Antes que ele possa roubar um pedaço maior de atração da


minha alma, balanço a cabeça negando. “Você não fez. Estamos
bem. Eu só não estava me sentindo bem, e estava...” Hesito por
uma fração de segundo antes de pensar que vou ‘estragar tudo’.
Sacha disse que tem irmãs mais velhas; não é como se ele não sabe
que as mulheres menstruam. “Estava menstruada.”

O fato dele nem sequer piscar com a palavra é


impressionante. Tudo o que ele faz é acenar com a cabeça antes
de um sorriso pequeno e inseguro cruzar seu rosto. “Mesmo?”

Concordo.

Sua expressão fica apenas ligeiramente cautelosa. “Estou feliz


que estamos bem, então.”

Este sapo estúpido rasteja na minha garganta e tudo que


consigo fazer é acenar.

Então ele estende a mão e bate no meu cotovelo com a mão


livre, os cantos de sua boca se alargando. “Senti falta de conversar
com você.”

Bom. Concordo e com uma voz um pouco estranha, digo:


“Também senti falta de falar com você.”

“Tem sido muito chato sem você”, Sacha acrescenta, o


sentimento óbvio pelos vincos nos cantos dos olhos.

Um pequeno sorriso cruza meu rosto, e dou de ombros mesmo


quando minhas entranhas ficam torcidas. Não sei porque me sinto
tão... desesperançosa, mas sinto. Quero absorver suas palavras e
guardá-las no coração, mas uma parte maior de mim não quer

MARIANA ZAPATA
isso. Qual é o ponto? Preenchi um vazio como sua amiga. Palavra-
chave: amiga.

Por mais que eu queira ser sensata sobre isso e pegar o que
posso conseguir, não é fácil para mim. Minha mãe sempre diz que
guardo as coisas no coração, que sinto muito. Quando começo a
pensar em algo, se não posso tê-lo, então não quero mais nada
para tentar substituí-lo.

Eli começa a gritar meu nome na área de estar, então sorrio


para Sacha antes de caminhar em direção ao meu irmão gêmeo.
Quando vou passar por ele, ele agarra meu antebraço para
impedir.

“Eu realmente senti falta de conversar com você.”

Balanço a cabeça para ele, não confiando nas palavras


enferrujadas e inseguras na ponta da minha língua. Preciso mudar
o assunto agora. Preciso tentar ser uma amiga melhor. “Avise-me
a próxima vez que você quiser correr, ok?”

“Pode deixar.”

Bem, se há uma coisa que eu sei, é ser amiga de alguém. Eu


posso fazer isto.

Eu posso.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 12

Carter e eu nos despedimos ao terminar de colocar as caixas


no carrinho. Esta noite é o último show da turnê norte-americana
na Filadélfia, e estamos todos com ótimo humor. A Ghost Orchid
vendeu quase cinco mil em produtos promocionais, o que significa
que ganhei quinhentos dólares. Não posso acreditar.

Outra coisa que não posso acreditar é quanto dinheiro Carter


deve ter faturado, considerando que sua venda é geralmente duas
vezes maior que a minha. Deve ser o suficiente porque meu amigo
quieto e pensativo está sorrindo de orelha a orelha, e me dá três
abraços enquanto desmontamos todo o esquema.

A primeira parte da turnê Rhythm & Chord acabou.

Não importa que estou cansada e inquieta ultimamente, e nos


últimos dias mais excitada do que uma virgem lendo contos
eróticos já que não tenho nenhuma privacidade; fico aliviada e
animada que esta parte da turnê acabou. E tenho dinheiro. Vivi
com tão pouco nas últimas seis semanas porque realmente nunca
ganhamos muito. Se o lugar não tem estrutura, o dinheiro que
ganho é apenas suficiente para comprar o almoço, café da manhã
e jantar.

Teremos três dias de folga entre hoje à noite e a partida para


a Austrália.

Austrália. Finalmente vou conhecer o país, e estou animada.

“Você quer tomar banho enquanto termino?” Carter pergunta


quando caminhamos pela área dos fundos onde ficam os
camarins.

MARIANA ZAPATA
O local é um dos poucos que tem chuveiros, e todos
concordamos em tomar banho antes de voltar para o ônibus. A
gravadora do Cloud Collision fica na Filadélfia e eles vão fazer uma
festa de final de turnê/lançamento atrasado do CD em um clube.
Eu não sou muito festeira, mas todo mundo vai.

“Certo. Depressa e vou garantir que você seja o próximo no


chuveiro”, falo para ele, que concorda.

Pego minha mochila e corro para os dois banheiros separados


que tem um chuveiro separado em cada. Apenas uma das duas
portas está fechada, então entro na aberta e tiro a roupa, tomando
banho e me depilando o mais rápido possível. Coloco o vestido roxo
escuro que comprei naquela tarde, depois de Eli dizer de forma tão
eloquente que não posso sair vestida como uma vagabunda.
Coloco um pouco de maquiagem, torço meu cabelo molhado sobre
o ombro, coloco todas as coisas de volta na bolsa, e espio para fora
do banheiro descobrindo que Carter está sentado no chão do lado
de fora, com Julian e Isaiah em pé a cerca de cinco metros de
distância conversando.

“Sua vez, amigo”, digo ao meu amigo recém-careca.

Ele sorri, o piercing no lábio inferior brilha quando salta —


furtivo como um gato — e desliza para o banheiro ao mesmo tempo
em que saio. Julian aparentemente ainda não me perdoou pela
cena com Brandon, então não fico surpresa quando ele olha para
mim com zero de emoção. Isaiah, por outro lado... puxo o vestido
para baixo, enquanto sorrio para ele. O material está subindo tanto
nas minhas pernas quando ando, que me pergunto o quão
pequenas são minhas chances de não mostrar a calcinha verde em
algum momento. O problema é que só tive vinte minutos para fazer
compras antes de voltar ao local do show, e minhas opções não
eram tão boas assim: muito decote ou mostrar a calcinha. A única
opção é parecer uma prostituta.

MARIANA ZAPATA
A quarta pessoa que vejo ao sair é meu irmão, que já está
vestido e digitando em seu telefone. Ele passa o olhar pelo meu
corpo de cima abaixo por um segundo e olha de novo.

“Que porra é essa, Flabby? Você vai trabalhar na esquina hoje


à noite, ou o que?” Ele grita, apontando para o meu vestido.

“Cale a boca”, gemo. Ele faz isso toda vez que uso algo que
está a mais de cinco centímetros acima do meu joelho.

Eli olha para mim um segundo mais antes de revirar os olhos


e voltar a brincar com o celular. Assim que começo a me afastar,
ele grita. “Se você ganhar algum dinheiro esta noite, quero a minha
parte!”

O afasto e entro no ônibus praticamente vazio. O cara do som


do TCC está lá dentro e Miles também. As coisas ainda estão um
pouco estranhas entre nós desde o incidente com o Pau Idiota.
Apesar de termos falado algumas palavras desde que a turnê
começou, ele ainda está fazendo caras engraçadas enquanto
mantém o silêncio. Entendo que ele é amigo de Brandon, mas o
idiota achar quer era boa ideia ir a um show onde o irmão psicótico
de sua ex-namorada está tocando. Realmente, ele mereceu.

Querendo evitar olhares estranhos, caminho até o quarto dos


fundos e sento no longo sofá com um livro que escondi em um dos
armários.

Carter aparece alguns minutos depois vestindo jeans skinny


cinza e uma camisa branca de botões que comprou naquela tarde
também. Ele sorri para mim e senta no banco à direita.

“Você está bem”, comento, e suas bochechas coram.

Mason chega em seguida. Olhando para baixo, sua calça e


camisa pretas estão completamente desabotoadas a ponto de eu
não conseguir entender como as roupas ainda estão no seu corpo.
“Ei cara, posso pegar emprestado...” Meu amigo de longa data olha

MARIANA ZAPATA
para cima e para de falar. Ele pisca aqueles grandes olhos azuis
para mim.

Meu rosto fica vermelho quando ele não diz nada por muito
tempo. “O que é?”

Mason se vira e olha para Carter. “Saia e tranque a porta.”

Não posso deixar de rir, chutando sua perna. “Pare com isso.”

“Sério. Flabby”, ele diz, olhando para minhas pernas,


“quando vamos nos casar?”

Meu rosto se aquece novamente, mas tudo que faço é gemer


em resposta.

Ele olha para mim por mais um minuto antes de balançar a


cabeça e perguntar a Carter se tem um cinto extra. Fico com Carter
nos fundos enquanto o ônibus vai até o clube. Em pouco tempo,
ele para e posso ouvir todos na frente descendo. Deslizo nos saltos
pretos que comprei aquela tarde também, sigo meu amigo para ver
que estamos parados na saída de incêndio em algum lugar
chamado The Magic Carpet. Há uma fila de pessoas do lado de
fora; avisto Eli e Gordo contornando a fila e entrando no clube.
Seguimos e o segurança apenas acena para Carter e eu entrarmos
sem verificar nossos documentos.

O clube não é nada do que eu esperava. Primeiro, porque está


tocando música dos anos oitenta. Em vez de um lugar escuro e
sujo que definitivamente teria esperma seco contaminando em
cada canto e recanto, as paredes são de um vermelho escuro com
mobília contemporânea preta e cinza espalhada pelas bordas do
espaço. O bar tem banquetas, balcão e prateleiras — onde as
garrafas estão colocadas — com luz néon. Então há a pista de
dança, que é a pista mais legal que já vi na minha vida. A atmosfera
é divertida e limpa.

Carter me dá uma cotovelada quando “Eye of the Tiger”


começa a tocar nos alto-falantes. Ele faz uma careta e gesticula em

MARIANA ZAPATA
direção ao bar com a cabeça. Concordo e sigo atrás dele. “O que
você quer beber?” Ele meio gesticula, meio grita. Faz apenas quatro
dias desde que Mase e eu bebemos a garrafa de vinho, e
aparentemente esqueci da promessa de nunca mais beber.

“Long Island Iced Tea”, sussurro de volta.

Ele assente antes de desaparecer no meio do bar.

Fico lá, batendo o pé e cantarolando junto com a música alta


tocando pelos alto-falantes. Em um canto, alguns caras do The
Cloud Collision já estão conversando com um grupo de garotas
sentadas em uma mesa. Mas Sacha não. Não que eu esteja
procurando. Todo esse jogo de ser legal e superar a paixão está
indo bem. Se eu apenas engolir, sorrir e lembrar que existem
muitos outros homens no mundo para me apaixonar, é fácil. Sacha
e eu corremos em Toronto com um silencioso e emburrado Julian
e almoçamos no dia anterior em Nova Jersey. É uma desculpa dizer
que estou orgulhosa de mim mesma por tentar ser uma boa amiga.

Continuo olhando em volta, tentando tirar o russo da minha


cabeça. As duas almas gêmeas, Eli e Mase, não estão em lugar
algum. Carter volta antes que eu perceba, com um pequeno copo
transparente em uma mão e um maior na outra, segurando-o em
minha direção.

“Obrigada”, digo para ele.

Ficamos ali por alguns minutos, e ele caminha comigo até


encontrarmos uma mesa pequena e vazia perto dos banheiros.
Sentamos lá, tomando nossas bebidas durante algumas músicas
antes de eu perceber Eli cortando a massa de corpos na pista de
dança LED caminhando em nossa direção.

Ele está segurando as mãos na frente do corpo, praticamente


balançando a língua fora da boca, mostrando o rosto mais idiota
que já vi — o seu. Para completar, está balançando os ombros.

MARIANA ZAPATA
Já estou rindo quando ele chega à mesa, e deslizo para fora
do assento, sabendo que é inútil lutar com ele. Virando para
Carter, mantenho a mão em sua direção. “Vamos!” Grito com um
grande sorriso.

Ele balança a cabeça.

“Tem certeza?” Pergunto praticamente gritando.

Ele me dá um sinal de positivo com um sorriso.

Carter já mencionou que tem alergia a dançar, então não vou


forçá-lo a fazer algo que ele não queira. Odeio quando as pessoas
fazem isso comigo. Encolho os ombros como quem diz ‘se você quer
assim’ e sigo a grande bunda de Eli até a pista.

Eliza começa a fazer movimentos de dança egípcia quando


paramos no meio da pista enquanto “Walk Like an Egyptian” toca
nos alto-falantes. Espelho seus movimentos, rindo o tempo todo.
Uma música se transforma em quatro enquanto dançamos na
frente um do outro, nossos movimentos ficam cada vez mais
escandalosos enquanto as músicas dos anos 80 continuam
tocando. A metade da bebida que tomei provavelmente está
ajudando.

Não posso deixar de me perguntar por que diabos a gravadora


do TCC os trouxe para um clube dos anos oitenta, mas não me
importo. Adoro dançar, mas só quando posso agir como uma idiota
desinibida sem me preocupar se todos vão me julgar. A próxima
coisa que percebo, é Mason chegando por trás e batendo a lateral
do corpo no meu por algumas músicas.

Empurro Mason quando ele começa a tentar se espremer


entre eu e alguma morena aleatória na pista de dança. Uma mão
roça minha bunda enquanto passo pelo meio da multidão, e eu a
empurro no segundo em que toca em mim. Mal saio da pista
quando vejo Sacha em... oh Deus misericordioso. De todas as
coisas do mundo que ele poderia usar... ele usa suspensórios —
suspensórios! — por cima da camisa de uma cor entre rosa e roxo,

MARIANA ZAPATA
e jeans pretos apertados. Ele está a poucos metros de distância,
de frente para a pista de dança, conversando com um homem mais
baixo de óculos.

O cantor do TCC sorri no segundo que percebe que o vi e


acena. O pensamento de fingir que não o vi passa pela minha
cabeça. Somos amigos e amigos não se ignoram, digo a mim
mesma quando seus olhos me varrem enquanto caminho em sua
direção. Sim, puxo meu vestido para baixo.

“Gaby”, ele diz no meu ouvido quando paro ao lado dele. Sua
mão estende para pousar nas minhas costas, e tenho que lutar
contra o desejo de reagir.

Bom Deus, estou tão faminta por atenção que estou ficando
excitada com uma mão nas minhas costas?

Sim. Sim, estou.

“Oi”, o homem menor cospe em um grito.

Aceno para o estranho e estendo minha mão para ele. “Oi, eu


sou Gaby.”

“Dennis, linda!” Ele aperta minha mão por um segundo a mais


e sorri, com todos os pequenos dentes brancos para me
cumprimentar.

Passei meses sem um único elogio, mas agora que me vesti


como uma prostituta de repente todos estão me elogiando. Oh,
foda-se. Pegarei o que posso conseguir. “Prazer em conhecê-lo!”
Grito com um grande sorriso.

“É sua namorada, Malykhin?” Dennis pergunta. Pelo menos é


o que acho que ele pergunta, mas tudo que posso fazer é me
perguntar se o ouvi corretamente ou se estou imaginando.

Antes que possa processar a pergunta que sai da boca do


homem, os dedos de Sacha se curvam no meu quadril. “Ainda não!

MARIANA ZAPATA
Vou levá-la para dançar. Te vejo mais tarde, ok?” Sacha grita para
ele, inclinando-se.

Eu posso ter me assustado. Posso. Mas não me assusto.


Principalmente porque fiz essa cena uma centena de outras vezes
com Mason e Gordo. Fosse para tirá-los de das garras de alguma
garota — ou no caso de Gordo, um cara — ou para afastá-los de
alguém com quem não querem conversar, sou um apoio, um bode
expiatório ou uma namorada sem pestanejar. Então sim. Sei meu
papel naquele momento. Estou ajudando Sacha a escapar e digo a
mim mesma que não é grande coisa.

Amigos. Amigos. Certo. Continuo falando mentalmente.

O homem assente antes de piscar para mim.

A mão do meu amigo pressiona nas minhas costas, levando-


me para a pista de dança. Assim que estamos a cerca de três
metros de distância, ele baixa a boca ao lado da minha orelha. “Eu
não sei dançar.” Sua respiração quente contra minha pele. “Esse
é o dono da nossa gravadora. Ele estava falando durante a última
hora e eu não aguentava mais.”

“Eu me sinto usada, Sassy”, o provoco, lutando contra a


decepção que agita meu intestino. Bode expiatório dessa vez. Tudo
certo.

Sacha balança a cabeça, as luzes estroboscópicas


multicoloridas iluminam as laterais do seu cabelo curto. “Nunca.
Se eu te empurrar para ele, então será uma história diferente.” Ele
inclina o queixo para baixo com um sorriso doce que atinge
diretamente os meus joelhos, confirmando o fato de que sou uma
pessoa fraca e patética sem espinha dorsal quando vejo este
cantor. “Mas eu não faria isso.”

“Espero!” Agarro seu pulso, puxando-o para o meio da


multidão, onde podemos estar longe de qualquer um do nosso
grande grupo. “Você realmente não sabe dançar?” Tenho que ficar

MARIANA ZAPATA
na ponta dos pés e ele tem que se inclinar para que eu possa falar
em seu ouvido.

Ele confirma. “Não!”

Encolho os ombros para ele. “Quem se importa! Eu não sou


tão boa assim. Apenas se divirta.”

Ele sorri quando a música muda de repente para “Thriller”.

Faço uma careta para ele antes de começar meus movimentos


de dança bem praticados. Minha mãe é uma grande fã e quando
éramos pequenos, ela tocava esse disco cem vezes, ensinando a Eli
e eu os movimentos. Tenho certeza que poderíamos dançar a
música inteira se quiséssemos, e não ficaria surpresa se ele
estivesse em algum canto aleatório da pista dançando sozinho.
Sacha coloca a língua no canto da boca e imita meus movimentos
perfeitamente. Eu não posso dizer que ele não sabe dançar, mas
também ajuda que ambos estamos rindo incontrolavelmente
durante toda a música, e depois continua com “I'm So Excited” que
vem a seguir.

Claro que pareço uma tola, mas não me importo. Não sou a
melhor dançarina do mundo, e provavelmente não gostaria que
alguém como Julian me observasse, mas eu estava com Sacha.
Meu amigo, que por acaso, é quase perfeito em seu próprio jeito
desleixado, que admitiu ter evacuado em um saco de lixo no
passado.

Quando começamos a dançar muito rápido, ele se inclina


para frente, pressionando a testa suada contra a minha. Tento
afastar a sensação engraçada e quente do meu estômago pelo
contato, eu juro, mas é incrivelmente difícil. Ele é tão fofo e feliz
que me domina. Seus olhos encontraram os meus, arregalados
como se ele tivesse descoberto uma nova constelação. “Não me
lembro da última vez que me diverti tanto!”

Realmente não há sentido em sequer lutar contra meus


sentimentos por esse cara, não é?

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 13

No primeiro dia entre as turnês, todos, exceto Sacha, estão


ocupados com algum grau de ressaca. Ele alega só ter bebido água
a noite toda. Exibido. Eu bebi dois Long Island Iced Tea e um
uísque, mas é o suficiente para me sentir terrível na manhã
seguinte. Porém eu provavelmente sou a pessoa que está melhor.
Gordo está caído sobre um dos meus ombros e, do outro lado,
Carter tem uma toalha molhada no rosto. Os outros caras parecem
uma merda total quando não estão ocupados vomitando fora do
ônibus, de um lado para o outro, a noite toda e de manhã cedo.
Me sinto muito mal pela pessoa que está recolhendo os carrinhos
no estacionamento do supermercado que ficamos estacionados
essa noite.

Uma vez que o vômito e as reconstituições de O Exorcista


estão sob controle, o ônibus finalmente sai do estacionamento
destruído. É um passeio tranquilo para o hotel que vamos ficar
hospedados perto do aeroporto. Quando chegamos ao Wyndham,
todos pulam e se dirigem para seus respectivos quartos para
continuar com o sofrimento em particular.

Meu quarto fica ao lado do de Eli e em frente ao de Gordo.


Passo o resto do dia descansando em cima das cobertas com o ar-
condicionado explodindo, vestida apenas com minha calcinha e
comendo lanches da máquina de venda automática, mantendo-me
alimentada até que o restaurante abra para o jantar. Tomo dois
banhos quentes e longos sem meus malditos chinelos pela
primeira vez no que parece uma vida inteira. Minhas coxas estão
doloridas de toda a dança ridícula da noite anterior. Mais da
metade foi com Sacha, que riu e sorriu sem jeito comigo.

MARIANA ZAPATA
Na verdade, aprendi em primeira mão que ele é muito pior na
dança do que eu. Mas ele é tão bobo e entusiasmado que mais do
que compensa seus pés grandes e desajeitados e quadris duros.

A outra metade da noite passei dançando com meu irmão,


lendo mensagens de texto malucas que a namorada irritada de
Carter estava enviando para ele porque não podia acreditar que ele
tinha ido a uma festa sem ela, e assistindo Gordo detonar todos os
caras no bar.

Perto do meio-dia da manhã seguinte, o telefone ao lado da


minha cama toca.

“Umm... alô?”

“Gaby?” A voz de Sacha passa pelo receptor.

“Oh, oi.” Me perguntei quem diabos estava ligando para o meu


quarto ao invés do meu celular.

Ele solta um longo suspiro de alívio. “Obrigado, porra. Acho


que liguei para todo mundo menos você.”

Eu rio porque sei que ele não tem meu número de celular. Do
lado deles, só Carter tem. Trocamos mensagens durante a noite,
se for impossível falar em voz alta.

“O que você está fazendo?” Ele pergunta.

Chuto as cobertas das minhas pernas e gemo. “Sendo uma


preguiçosa. O que você está fazendo?”

“Eu só peguei uma porcaria para comer, e agora estou


entediado. Quer jogar futebol?” Ele diz tudo de uma vez, como se
isso fosse o mesmo que assistir TV ou algo assim. Quando não
respondo, Sacha imediatamente fala: “Nenhuma porcaria de morte
novamente, apenas um jogo normal.”

“Eu vou, se você prometer não machucar meu rosto... espere.


Como iremos até lá?”

MARIANA ZAPATA
Sacha emite um ruído suave e ofegante. “Aluguei um carro. A
menos que você queira andar, vou te seguir de carro...” Ele ri.

O que diabos devo fazer? Assistir mais televisão? “Claro.”

“Encontre-me no saguão em quinze minutos”, ele ordena.

Desligo e me visto pela primeira vez em vinte e quatro horas.


Envio a Eli uma mensagem para que ele saiba que estou saindo e
caminho até o saguão para me encontrar com Sassy. Ele está
esperando lá, de short preto e camiseta branca com Mateo e Isaiah
ao lado dele.

“Bom dia”, ele diz antes de Mateo repetir a saudação.

“Oi, pessoal”, digo, parando na frente deles.

Sacha me lança um sorriso. “Pronta para ir?”

Concordo e vamos para o estacionamento. Há um pequeno


Kia vermelho estacionado. Mateo pula no banco da frente
enquanto Isaiah e eu vamos atrás.

“Você está pronta para a Austrália?” Isaiah pergunta em voz


baixa logo depois de colocar o cinto.

“Espero que sim, estou muito animada. Continuo vendo se


meu passaporte não saiu da minha bolsa sozinho. “

Ele me dá uma sugestão de sorriso. “É o meu lugar favorito


da turnê, você vai ver.”

“Eu gosto da Austrália”, Sacha diz do banco do motorista.

“Eu gosto da Europa”, acrescenta Mateo.

Sacha faz um barulho de peido com a boca, sua atenção


concentrada na estrada. “Todo mundo sabe que você gosta de ir ao
Red Light District.”

“O Red, Red Light District?” Eu lentamente pergunto como se


houvesse outro no mundo.

MARIANA ZAPATA
Mateo tem a decência de me dar um sorriso tímido por cima
do ombro. “Sim.”

“Interessante”, digo, enquanto tento imaginar Mateo subindo


e descendo a rua, pegando prostitutas. Ele tem estatura e
constituição mediana, cabelos escuros e olhos escuros. Julian
definitivamente parece mais o tipo de pegar uma prostituta, mas
quem sou eu para saber?

Mateo começa a balbuciar sobre como há mais do que apenas


prostitutas em Amsterdã, mas eu meio que me desconcentro. Nós
estacionamos ao lado de um parque logo depois e saímos do carro.
Pego o protetor solar de Sacha quando ele termina e espalho mais
do que provavelmente preciso. Nos separamos em duas equipes.
Mateo dá um tapa no ombro de Sacha, como sua maneira de
reivindicá-lo, e deixa Isaiah e eu juntos.

Corremos e corremos.

Subindo e descendo o campo uma e outra vez, perseguindo


um ao outro. Assim como na primeira vez que jogamos, o jogo
começa bem limpo. Mantemos uma distância respeitável e focamos
apenas em nossos pés tentando roubar a bola. Mas depois de
alguns gols, o quadril de Sacha choca com o meu e a porra do jogo
começa.

“Sua pequena trapaceira”, ele ri quando o cutuco nas costelas


para distraí-lo.

Nos tocamos de vez em quando por quase duas horas até que
tenho que deitar na grama de tão ofegante que estou. Sacha
estende a mão para eu pegar e me levanta. Voltamos para o carro,
depois de decidir parar para comer no caminho. Assim que nos
sentamos, ele me passa o iPhone entre os assentos.

“Coloque aí o seu número”, ele exige.

Vamos deixar o país em dois dias, e não vejo o ponto em dar


a ele meu número quando ele não vai poder usar, mas mantenho

MARIANA ZAPATA
minha boca fechada. Termino de digitar meu nome e número
quando o telefone começa a tocar. “Liz” aparece na tela, fazendo
meu estômago revirar com a memória dela e Sacha sentados no
sofá.

Ugh.

“Sua amiga está ligando”, murmuro, entregando o telefone


enquanto tento não fazer uma careta. Ou pelo menos um rosto que
Isaiah possa ver do seu lugar ao meu lado.

Sacha olha para a tela quando pega o telefone da minha mão,


para por um momento e finalmente coloca no seu rosto para
atender.

“Oi... Acabei de terminar um jogo de futebol... Com Mat,


Isaiah e Gaby... Sim, ela joga... Não, eu acho que ela não se
preocupa com as marcas de roupa... Ficar marcada do sol não é o
fim do mundo, Jesus… Não… Não… Partimos daqui a dois dias…
não mudei de ideia… Liz… Liz… Já falamos sobre isso… Olha,
vamos comer agora. Eu te ligo quando voltar... porque sim!”

Sim, estou totalmente observando o rosto dele no espelho.


Não tenho vergonha. Claro que estou tentando manter isso
imperceptível, mas meu ouvido está posicionado e ouve cada
palavra.

Mais tarde, poderei lembrar por que meu estômago dói e


lidarei com o mau humor, mas naquele instante estou ouvindo.

Sacha solta um suspiro alto, seus olhos correndo para o teto


por uma fração de segundo antes de continuar sua ligação. “Você
precisa pensar sobre o que eu te disse. Eu não vou mudar de
ideia... agora não é hora de falar sobre isso... eu disse no ônibus
— nós já falamos sobre isso. OK... eu sei… Ok… tchau.”

Bem, então. Isso é estranho.

Isaiah me dá uma longa olhada antes de limpar a garganta.


“Ela ainda está te incomodando?”

MARIANA ZAPATA
Sacha assente rigidamente. Posso ver suas mãos flexionando.
“Ela apenas...” Ele grunhe no final, eu só posso supor ser
frustração.

É errado que fico ali rindo internamente? Nah. Bem, talvez


um pouco. Devo ficar triste porque meu melhor amigo está
chateado, mas não estou.

“Mulheres”, Sacha bufa, virando-se rapidamente para me


olhar com um sorriso travesso.

Eu me inclino para frente e dou uma batidinha na sua


bochecha em resposta.

“Quais são as minhas chances de morrer de insolação?”

“Você tem uma chance melhor de morrer se eu te derrubar no


caminho.”

Lanço a Sacha um olhar bravo enquanto descemos as escadas


dos nossos beliches. É o segundo dia do nosso mini intervalo entre
as turnês, e o sortudo conseguiu ingressos grátis para um jogo do
Philadelphia Alliance. Eles são um time da Liga Americana de
Futebol Masculino. Um dos fãs do TCC mandou uma mensagem
para ele e ofereceu ingressos depois de um post que ele fez na conta
do Twitter da banda sobre o nosso jogo de futebol no dia anterior.
Os quatro ingressos que ele ganhou foram distribuídos entre nós,
Julian e Mateo. Isaiah tem outros planos. O grande choque do dia
foi Julian, que finalmente não está agindo como se eu tivesse
herpes. Ele realmente sorriu para mim quando os encontrei no
saguão.

“Isso é incrível”, digo quando encontramos a fileira onde


nossos assentos estão localizados.

Julian senta primeiro; sigo atrás com Sacha e finalmente


Mateo. O jogo está marcado para começar em cinco minutos, e
realmente preciso de um pouco de água. O sol brilhante é quase

MARIANA ZAPATA
doloroso. Coloquei protetor solar no dia anterior, mas não
reapliquei e fiquei levemente queimada. Meu único alívio é que o
sol vai se pôr em cerca de uma hora. Quando um vendedor começa
a subir e descer o corredor imediatamente depois de sentarmos,
levanto e tento chamar sua atenção.

“Vocês querem?” Pergunto a eles.

Sacha e Julian assentem, e eu passo para ficar na frente de


Sacha pegando as três garrafas e pagando por elas. Paro na frente
dele de propósito? Não.

Sou uma maldita mentirosa. Tenho certeza que sim. Estou


usando o meu melhor par de shorts cáqui e, embora não tenha
nascido com ótimos seios, tenho uma bunda decente, então me
processe. Volto para o meu lugar, pego Sassy se mexendo em seu
assento enquanto busca a carteira no bolso de trás.

Faço uma careta, batendo no braço dele. “Não se preocupe


com isso.”

Ele franze a testa um pouco antes de concordar. “Obrigado.”

Julian, que não fala comigo há semanas, se inclina sobre o


meu lugar. “Obrigado, Gaby.”

Balanço a cabeça para ele e me acomodo, engolindo metade


da minha garrafa em um gole. “Vocês vão a jogos quando estão em
casa?” Pergunto.

“Não, San Jose é a cidade mais próxima com um time, e


geralmente estamos fora durante todo verão de qualquer maneira.
Você?”

“Também. Houston fica a algumas horas de distância. Fui


com minha melhor amiga algumas vezes; a prima dela, na verdade,
joga no time feminino lá e às vezes dá ingressos...” Explico. “Nós
pagamos para ver o time masculino algumas vezes. Laila gosta de
checar os caras.”

MARIANA ZAPATA
Sacha levanta uma sobrancelha, embora sua atenção esteja
voltada para o campo. “E você não?”

“Bem, eu não deixo exatamente meu binóculo em casa.”

Ele ri e vira para mim. Eu luto para não fazer uma cara
estúpida pela sua proximidade. Ele cheira como homem limpo e
doce. “Você é uma coisa, sabe disso?”

Tento entender as palavras dele como ele realmente as quis


dizer e consigo sorrir um pouco.

Ele sorri e se inclina para trás, mas seus olhos ficam


diferentes quando faz isso. Aquelas íris cinza pálidas estão
brilhantes, alertas e um pouco cautelosas. Isso é estranho.

O jogo começa imediatamente depois disso, e os gritos nas


arquibancadas seguem. A primeira metade é insana; há alguns
gols muito próximos e todos ficam loucos quando o time adversário
se aproxima demais do gol da Alliance. Quando faltam dois
minutos para o primeiro tempo acabar, um atacante do
Philadelphia marca um gol e as arquibancadas enlouquecem. Não
sou uma fã, mas pulo com os outros e abraço todos que estão por
perto. Quando viro para Sacha, ele bate as duas mãos contra as
minhas antes de me puxar para um abraço quente e apertado que
dura exatamente três segundos impressionantes e amigáveis.

Durante o intervalo, Sacha e Miles levantam para comprar


comida, deixando Julian e eu.

“Desculpe pela coisa com Brandon...” O homem ao meu lado


diz inesperadamente, mudando de posição para olhar para mim.

Tirando meus olhos dos dançarinos desfilando em todo o


campo no final da sua dança de intervalo, dou um sorriso
hesitante e encolho os ombros. “Está tudo bem. Sinto muito, Eli e
eu perdemos a cabeça.”

“Nós somos amigos há muito tempo, sabe. Tocamos juntos


alguns anos atrás, quando cobri seu guitarrista.” Ele franze os

MARIANA ZAPATA
lábios. “Eu deveria saber que você era a sua Gaby, mas não
pensei...”

Lembrei de Brandon contando quando começamos a namorar


que ele trocou os membros de sua banda antes de eu aparecer,
então a explicação de Julian faz todo o sentido.

“Tudo bem. Considere-se com sorte por ter sido apenas


temporário.”

Sua risada é tão alta que me pega desprevenida. “Oh foda-se,


eles são ruins, certo?”

Balanço a cabeça como se tivesse ganhado um prêmio por


contar a verdade sobre a banda da hemorroida humana.

“Não consigo dizer a ele como sua música é ruim”, Julian diz
com outra risada.

Isso me faz jogar a cabeça para trás e rir. “Eu também nunca
disse. Ele pensa que eu usava tampões porque não queria
danificar meus ouvidos.”

Julian se junta a mim, rindo. “Você é uma garota legal, Gaby.


Sinto muito por ser um idiota.”

Eu fui uma idiota com seu colega de banda, então não posso
ser realmente hipócrita e não aceitar seu pedido de desculpas.
“Não se preocupe com isso.”

Ele estende a mão e não posso deixar de sorrir enquanto


aperto. “Você realmente lhe deu um soco na garganta?” Ele
pergunta com diversão escrita em todo o seu tom.

Meu rosto fica um pouco vermelho. “Sim.”

Algo frio pressiona contra a parte de trás do meu pescoço e


grito. Sacha segura uma garrafa, um sulco em suas sobrancelhas
enquanto olha para mim. “Eu trouxe um pouco de água.”

MARIANA ZAPATA
“Obrigada, Sassy”, digo a ele, pegando a garrafa. Ele tem
outra na mão e uma pequena pipoca debaixo do braço.

Julian solta minha mão antes de falar. “Você não me trouxe


uma?”

Sacha bufa enquanto senta. “Não, porra.”

Meu amigo de olhos cinzentos coloca o recipiente de pipoca


bem no meio do seu colo. Eu nem sequer penso duas vezes antes
de mergulhar minha mão no balde e pegar o máximo que posso.
Sacha sorri para mim antes de pegar seu próprio punhado e enfiar
tudo na boca.

“Você está se divertindo?” Ele pergunta.

Concordo. “Com certeza estou. E você?”

“Sim.” Ele sorri. “Estou.”

O jogo começa de novo e as coisas ficam intensas. É uma


tentativa de gol após a outra, corrida e uma bagunça insana de
gritos. Durante uma pausa no jogo, as duas telas enormes em
lados opostos do estádio se iluminam com filmagens no campo
antes da câmera se mover e a câmera do beijo aparecer em enormes
letras cor-de-rosa brilhantes na tela. Sorrio para mim mesma
quando vejo, porque sempre gostei da câmera do beijo em qualquer
evento esportivo que fui. Os casais mais velhos são meus favoritos.

Mas quando a tela amplia e foca duas pessoas na plateia, não


é um casal mais velho.

É Julian e eu.

Meu rosto fica em chamas como o cara do Quarteto Fantástico.


Olho na direção em que percebo que a câmera está e começo a rir,
balançando as mãos e a cabeça em negação. A câmera sobe e desce
recusando meus gestos.

Sim, meu rosto fica ainda mais vermelho.

MARIANA ZAPATA
“Ah merda”, Julian ri ao meu lado.

Eu me viro para olhá-lo com o canto do olho e gemo quando


o ângulo na tela sobe e desce novamente enquanto as pessoas na
multidão aplaudem. Olhamos um para o outro com expressões
idiotas em nossos rostos, e deixo a queimadura de vergonha descer
para o meu peito.

“Gaby”, ouço Sacha atrás de mim, mas não consigo me virar.


A câmera ainda está em mim. Em Julian e eu congelados no lugar.

A multidão ruge quando a câmera se aproxima novamente,


um coração rosa circula nossos rostos.

O guitarrista ao meu lado encolhe os ombros grandes com um


largo sorriso descuidado no rosto. “Foda-se isso?”

“Gaby”, Sacha repete meu nome, mas continuo lutando


contra o desejo de me virar, realmente estou. A última coisa que
preciso é virar na direção dele e fazer a câmera focar para nos
beijarmos. Esse tipo de humilhação não é algo que quero.

“Foda-se”, digo a Julian com uma risada áspera e


envergonhada quando meu rosto fica inacreditavelmente quente.

Ele sorri e eu sorrio de volta nervosa. Julian me agarra pelas


duas orelhas, puxa meu rosto para mais perto dele e beija minhas
duas bochechas duas vezes enquanto eu explodo no que só pode
ser descrito como risos. O riso nas arquibancadas é inegável.

Engasgo um pouco e forço um sorriso grande no meu rosto


enquanto meu coração acelera com a inesperada e indesejada
atenção. Poderia ter sido muito pior, certo? Eles poderiam ter
focado no objeto da minha atração não correspondida à esquerda.
Eu ainda estou sorrindo enquanto acaricio o ombro de Julian por
ser um bom jogador, mas não sorrio por muito mais tempo.

Quando me viro para encarar Sacha imediatamente depois...

Ele não está sorrindo. Ele não está sorrindo de jeito nenhum.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 14

“Sente ao meu lado no avião.”

Estou tirando meus sapatos para colocar nas bandejas de


plástico no posto de segurança quando Sacha me cutuca com o
cotovelo. Todo restante do meu material já está na longa mesa de
metal indo para o raio-x. Alguns metros à frente, Gordo está sendo
examinado. Um lado da minha bochecha sobe quando vejo os
olhos cinzentos de Sassy. Ele está agindo tão estranho desde o dia
anterior no jogo de futebol, não tenho certeza do que está
acontecendo.

Mas, vou aceitá-lo do jeito que ele é, normal e brincalhão.

“Você tem certeza?” Pergunto apenas para me certificar.

Ele balança a cabeça, sorrindo aquele enorme sorriso que


toma conta do seu rosto enquanto simultaneamente me faz pensar
em unicórnios, antes de olhar para baixo e desfazer seu cinto. Juro
que tento não olhar na direção de sua virilha, mas falho.
Miseravelmente. Talvez eu deva olhar para a virilha de outra
pessoa? Você sabe, para parecer que não estou olhando apenas a
dele.

“Tenho filmes no meu laptop”, ele tenta me subornar, como


se isso fosse necessário.

Eu olho para a fila e vejo que Gordo está longe o suficiente


para que não possa nos ouvir. Olhando de relance para o espécime
perfeito de homem, faço uma careta. “Que filmes?” Como se isso
realmente importasse. Eu provavelmente assistiria Barney, se ele
quisesse.

“Você não tem fé no meu gosto?” Ele zomba.

MARIANA ZAPATA
“Eh.”

“Próximo!” O funcionário da TSA chama.

Gemo e passo pela máquina de raio-X. Alguns segundos


depois, a mulher acena. Sacha é o próximo. Espero para pegar
minhas coisas e fico de olho nele enquanto está do outro lado do
detector de metal, conversando com o empregado antes de ser
direcionado para alguém mais à frente na fila.

Sacha tira duas pequenas bolsas pretas da mochila para


mostrar ao trabalhador da TSA. Ele mostra ao homem algumas
pequenas caixas com cartas coloridas e então mostra um pedaço
de papel. Estou colocando meus sapatos enquanto Sacha
concorda com qualquer coisa que o cara esteja dizendo a ele, e
coloca suas coisas de volta na mochila.

“Senhora, você pode se mover?” Um dos funcionários do


aeroporto pergunta assim que pego todas as minhas coisas.

Saio do caminho e vou para o lado. Sacha se aproxima de mim


apenas um ou dois minutos depois, ainda colocando as coisas em
sua bolsa enquanto para.

“Eles encontraram seu estoque de vibradores?” Eu rio.

“Não, apenas minhas bolas tailandesas”, ele ri, puxando uma


caixa que diz alguma coisa sobre lancetas. Quando franzo as
sobrancelhas em confusão, ele enfia a caixa na bolsa novamente.
“Eles gostam de verificar tudo às vezes”, ele explica, mas ainda
estou confusa.

“Lancetas?” Pergunto a ele, pensando no que podem ser, e


então isso me atinge. Lembro que minha tia Dora costumava
carregar caixas de lancetas em seu carro caso alguma emergência
esquisita acontecesse. “Você é diabético?” O jeito que pergunto faz
parecer que é um segredo profundo e escuro que ele está contando.
Mas, de novo acho que me sinto uma idiota. Nós compartilhamos

MARIANA ZAPATA
um ônibus toda primeira parte de uma turnê. Como não sei que
ele tem diabetes?

“Sim.” Ele termina de fechar a bolsa antes de olhar para cima.


“Eu nunca te disse?”

Sacha não me disse muitas coisas porque parecemos apenas


brincar na maioria das vezes. Nós conversamos sobre algumas
coisas como nossas famílias, o que gostamos e não gostamos, mas
ele ainda é um estranho para mim de certa maneira. Isso parece
muito claro agora.

“Não.” Tento pensar se ele fez algo para me mostrar, mas não
consigo. Ele é esquisito sobre o que come a maior parte do tempo
e não bebe, mas isso não é algo inédito ou estranho.

Ele toca meu braço guiando na direção do nosso portão.


“Sempre me testo no quarto dos fundos; provavelmente por isso
que você não me viu checando a glicose.”

Isso não é surpreendente. Ele acorda depois que eu e vai para


a cama depois de mim. “Você tem que tomar insulina?” Pergunto
por que se ele toma, serei a pior amiga do mundo. Como diabos
não percebi essas coisas? Nós passamos um mês juntos, sem
contar a semana em que fui uma cadela e o ignorei.

Ele nega com a cabeça. “Não, eu tenho o tipo 2. Tenho desde


criança, então aprendi a controlá-la sem remédio.”

Lembro de como minha tia ficava doente muitas vezes. Tinha


dias em que ela se sentia terrível, mas eu sabia que ela tinha que
tomar insulina. “Então... eu não vou ter que te furar com uma
agulha?”

Sacha bate seu ombro no meu enquanto continuamos em


direção ao nosso portão. “Não. Desculpe, princesa. “

“Droga”, suspiro de decepção, ganhando uma risada em


resposta. “Mas você trouxe o suficiente de tudo?”

MARIANA ZAPATA
Ele me bate de novo. “Sim, não se preocupe.”

“Tem outras pessoas diabéticas em sua família?”

“Sim. Minha avó, mãe, irmã mais velha e eu somos


diabéticos.” Ele bate na minha mão com as costas da dele. “Vou
usar o banheiro; te encontro no portão?”

“Certo.” Ele me dá um pequeno sorriso antes de se virar em


direção ao banheiro. Fico lá e observo sua bunda por
possivelmente dez segundos. Ele está usando calças de moletom
— como a maioria de nós, que está preparado para nossa viagem
de dois dias — e isso simplesmente aumentou sua bunda perfeita.
Aleluia.

Pare. Pare com isso, Gaby.

Uma garganta sendo limpa me faz virar em outra direção. Meu


irmão e Mason estão andando em minha direção, ambos sorrindo
como se soubessem de algo que não sei. Droga.

“O que?” Pergunto depois de me juntar aos dois.

“Eu vi você.” Eli balança as sobrancelhas.

Tento controlar meu rosto para não me entregar


completamente, mas, de novo, esse é meu irmão. Não apenas meu
irmão, meu gêmeo maldito. Nós praticamente temos percepção
extra-sensorial. Mas... “Não sei do que você está falando.”

“Ah não? Você não estava parada ali olhando a bunda dele?”

Eu pisco e zombo, mas não consigo esconder o sorriso


estúpido no meu rosto. Pega. “Não. Só pensei que ele tinha uma
mancha nas calças.”

Até mesmo Mason ri quando Eli empurra meu ombro. “O que?


Beijar Julian não foi suficiente?”

MARIANA ZAPATA
“O que?” Grito, sabendo que não contei sobre o que aconteceu
porque não falei com ele desde antes do jogo. Assim que voltamos
para o hotel, fui direto para o meu quarto.

“Sim, você está em toda a fan page do TCC. Alguém postou


uma foto de vocês no telão do jogo de ontem.” Ele dá uma grande
gargalhada.

O sangue some do meu rosto. Se estar no telão não é ruim o


suficiente, estar na página do The Cloud Collision é muito pior.
Eles não são exatamente uma banda nova. “Sério?” Engasgo.

Olhos verdes familiares brilham para mim em diversão. “Oh


sim. Um fã deles postou essa merda para seus quatrocentos mil
seguidores verem.”

A ideia de tantas pessoas me vendo e julgando... não,


obrigada. No passado, há alguns anos, Eli postou uma foto nossa
em sua página da Ghost Orchid. Desnecessário dizer que os
comentários me elogiaram e insultaram ao mesmo tempo. Desde
então, tento manter meu rosto longe de páginas da internet para
todo mundo ver. Algumas pessoas são destruídas pela crítica de
estranhos. Eu não. “Ele apenas beijou minha bochecha, Jesus
Cristo. Não colocou a língua na minha garganta...” Argumento.

Eli faz som de beijos barulhentos enquanto franze os lábios


como o babuíno que ele é. “Flabbys e Julian, sentados em uma
árvore...”

“Cale a boca”, gemo, sabendo que ele está apenas tentando


ser uma dor na minha bunda. Por mais que Julian seja atraente,
não sinto nada em relação a ele, exceto amizade ou algo próximo
a isso.

É Mason quem joga um braço por cima do meu ombro,


inclinando-se quase com todo peso em mim, considerando que ele
é quase trinta centímetros mais alto. “Você deve olhar as fotos.”

Estreito meus olhos para ele. “Por quê?”

MARIANA ZAPATA
Ele aperta meu ombro. “Apenas olhe.”

“Mas por quê?” Pergunto de novo, sabendo que ele não


consegue ser enigmático por mais de um segundo.

A respiração que ele sopra me diz que estou certa. “Alguém


não parecia exatamente feliz.”

Minhas sobrancelhas sobem sozinhas, lembrando do exato


rosto que ele está se referindo. Sacha pareceu perturbado, talvez
até com raiva, o que foi uma surpresa. Em um mês e meio, não o
vi mais do que levemente frustrado. Ele é incrivelmente controlado
e quase sempre tem um sorriso no rosto. A noite passada foi a
exceção.

Mas Mase está certo.

Quando me virei depois da câmera do beijo e vi a expressão


no rosto de Sacha, congelei e demorei um segundo para absorvê-
la. Em um piscar de olhos, ele apertou os olhos e sorriu com força.
Ele continuou sorrindo firmemente o resto do jogo. Daquele
momento, até entrar na fila atrás de mim para passar pela
segurança minutos antes, ele estava agindo de um jeito meio
estranho.

Eu não me permito pensar nisso. Qual o ponto? Talvez ele


ache que sou imbecil por deixar seu amigo beijar minhas
bochechas. Assim que o pensamento entra em meu cérebro,
afasto-o. Ele não é assim. Isso É idiota.

“Quem sabe o que ele estava pensando? Isso realmente não


importa...” Digo a ele com um encolher de ombros.

Meu amigo aperta meu ombro em resposta quando chegamos


ao portão e vamos para uma fila de lugares vazios onde nos
sentamos.

Olho para o meu bilhete antes de colocá-lo no zíper da minha


mochila. “Um de vocês vai sentar ao meu lado no voo?”

MARIANA ZAPATA
“Por quê?” Eli pergunta.

“Por que…”

Ele se inclina para trás e me olha. “Deixe-me adivinhar, você


vai se sentar em outro lugar?”

Quando assinto, Eliza começa a rir e estica a mão na direção


de Mason. “Você me deve vinte, cadela.”

“Droga, Gaby”, Mase grunhe, já colocando a mão no bolso


para pegar sua carteira.

“Vocês apostaram, idiotas?”

Ambos concordam, trocando dinheiro. “Duh”

“Você falhou comigo, Flabs. Vamos lá. Pensei que você usaria
essas bolas de gude e não nos largaria, porra...” Mase bufa.

Por um segundo me sinto um pouco culpada por querer


sentar com Sacha, apesar de quão imprudente para o meu coração
é, mas depois me lembro. “Oh, certo. Como aquela vez que vocês
me deixaram em uma festa para ficar com essas garotas, e tive que
ir para casa com Gordo no meio da noite? “

Sim, isso os faz calar a boca.

“Espero que vocês dois peguem Ebola”, acrescento com uma


risada. Realmente não é tão surpreendente que eles tenham feito
apostas ou que um deles esteja chateado por ter perdido. Eu
costumava fazer apostas com Eli sobre coisas mais aleatórias.
Como nossa mãe reagiria a certas coisas. Com ela, há certos níveis
de raiva: ela esfrega a testa se estivesse apenas um pouco louca,
depois começa a bater as gavetas, depois grita nossos nomes
completos, ou, finalmente, se está realmente louca — e isso é
apenas com Eli — ela começa a chorar, perguntando a Deus em
voz alta o que fez para merecer ser tratada ‘assim’.

Sacha aparece um segundo depois, sentando no assento vazio


ao lado do meu e começa a conversar com meu irmão sobre uma

MARIANA ZAPATA
banda que eles realmente gostam e acabou de lançar um álbum.
Uma hora passa rapidamente. A próxima coisa que sei é que
estamos esperando na fila para embarcar, e Sassy está
perguntando a Miles se ele se importa de sentar com Eli e Gordo
no avião para que eu possa trocar. Miles é extremamente tranquilo
e não parece se importar com a mudança nos arranjos de assentos.

Uma vez a bordo, o avião é o maior que já vi. Há três fileiras


com quatro assentos no meio e três do outro lado. Eu apenas sigo
Sacha quando ele senta em uma janela no meio da aeronave e eu
no assento do meio. Carter acena antes de sentar com Mateo e
Julian no lado oposto do avião. Vejo todos se espalharem em
fileiras diferentes.

Uma senhora vem e senta-se no assento ao lado do meu,


dizendo oi para nós.

Coloco as mãos no colo, viro a cabeça para olhar para o meu


amigo, que tem sua atenção focada em mim. “Há mais alguma
coisa que eu deva saber antes do avião decolar?”

Um olho cinzento fica um pouco apertado. “Como o quê?”

“Oh, eu não sei. Você fica enjoado em voos? O bebezinho


Sassy está com medo de voar e preciso segurar sua mão ou algo
assim?” Pergunto.

Aquela linda boca com um gordo lábio inferior, franze. Ele


pisca. “Você diminui a masculinidade de todos os homens em sua
vida?”

“Apenas dos que gosto.”

Ele abre um sorriso antes de se aproximar puxando o cinto


de segurança em minhas coxas. “Tudo bem, então.”

Abro a boca para dizer algo, mas antes que possa, uma
gravação com a voz da aeromoça começa nos alto-falantes com
informações de emergência. Ela continua falando.

MARIANA ZAPATA
“Provavelmente vou desmaiar em breve”, ele avisa quando o
discurso acaba. Ele já está colocando o pequeno travesseiro no
espaço entre a cabeça e as janelas.

Balanço a cabeça em concordância. Levantei cedo para


comprar coisas de última hora com Carter naquela manhã e
andamos muito. Um cochilo é necessário. “Se eu roncar, me
acorde, ok?”

“Sem promessas.” Ele sorri.

Sacha começa a me contar sobre o quão alto Julian pode


roncar, e então digo a ele sobre como meu pai costuma nos manter
acordados a noite toda porque soa como uma moto suja. O avião
decola em algum momento e, com certeza, minhas pálpebras
começam a cair em pouco tempo. O pequeno travesseiro que a
companhia fornece está esmagado atrás da minha cabeça, e
lembro de dar a Sacha um sorriso sonolento.

Desmaio.

Quem sabe quanto tempo depois, minhas pernas começam a


ficar um pouco estranhas e desconfortáveis, então abro os olhos e
descubro que não estou sentada. Meu tronco está sobre o colo de
Sacha; a única coisa que me impede de ficar com a boca em sua
salsicha humana é o travesseiro. Meus dedos estão presos
embaixo de uma de suas coxas e algo quente está descansando no
meu pescoço. Mexo uma mão para sentir que seus dedos estão
cobrindo minha garganta. Ele não está se movendo, o que significa
que provavelmente está dormindo também.

Não vou pensar demais. Eu faria o mesmo com meus


babuínos. Fecho os olhos e volto a dormir.

“Você gostaria de mais alguma coisa, senhor?”

Tenho que colocar a mão na minha boca para não rir. A


comissária de bordo está curvada na cintura e se debruça sobre a

MARIANA ZAPATA
senhora no banco ao lado do meu. Inferno, eu posso cutucar sua
testa se quiser. Mas ela não se importa conosco; eu nem acho que
ela realmente vê a outra passageira ou eu sentadas lá.

Seu foco: Sacha.

Sacha, que acabou de acordar há três minutos e tem um


pouco de baba nos cantos da boca, enquanto uma bochecha está
rosada e marcada pela posição em que ele estava. Seus olhos ainda
estão pesados de sono. Depois de um cochilo de quatro horas,
acordei com as costas, pescoço e quadris rígidos, e então apertei
seu braço para acordá-lo quando vi a aeromoça vindo pelo corredor
com um carrinho.

“Não, obrigado”, ele responde com um sorriso levemente


desajeitado no rosto.

A mulher, mais do que provavelmente em seus trinta anos,


permanece nessa posição um segundo a mais do que o necessário
antes de abaixar a voz para soar... sensual. Sim, ela
definitivamente soa sensual. Eu nem acho que é possível soar tão
sexy. “Você tem certeza? Mais alguma coisa?”

Eu grito logo antes de Sacha beliscar minha perna. “Não,


obrigada.”

“Tudo bem”, ela responde antes de sair para a próxima fila


com seu carrinho.

“Puta merda!” Tento abafar minha risada, sussurrando


porque sei que ela está bem atrás de nós.

Sacha me lança um olhar com o canto do olho antes de pegar


seu copo de água para beber. “Não diga nada”, ele geme.

“Sassy, essa senhora quer, sem dúvida nenhuma, mexer seus


ovos.”

Eu o ouço engasgar e tossir antes de apertar o nariz com um


suspiro. “Jesus Cristo, Gaby”, ele sussurra enquanto tenta se

MARIANA ZAPATA
controlar. Eu imito quebrar ovos no ar e, em seguida, mexo-os. Ele
estende a mão para empurrar as minhas para baixo com um
gemido.

“Você acha que estou brincando, mas vou trocar seus serviços
por alguns lanches mais tarde, quando ficar com fome. Ainda
temos duas horas restantes neste voo.” Vamos parar em São
Francisco para conexão com nosso segundo voo para Sydney e
depois mais um para Perth. Felizmente, a primeira parada é de
apenas uma hora.

Os ombros de Sacha começam a tremer quando ele ri, a mão


fazendo um Band-Aid imaginário sobre a boca. “Vou compartilhar
meus lanches com você. Apenas não troque minha virtude por
comida.”

Isso me faz jogar minha cabeça para trás. “Sua virtude? Ha!”

“Gaby Barreto, você está tentando dizer que acha que maculei
minha reputação?” Ele está tentando tanto não sorrir, mas esse
cara provavelmente sorri enquanto dorme — é algo impossível.

Coloco a mão em cima do pulso dele, e faço uma cara


incrédula. “Você se lembra do incidente Pau Idiota com Brandon?
Tenho certeza que você...” Me inclino para mais perto dele porque
a senhora do meu outro lado está acordada, “...disse que gostava
de b-u-c-e-t-a. Tenho certeza que sua virgindade foi perdida há
muito tempo, garoto.”

Seu rosto fica rosa quando ele ri. “Sim, eu disse isso”, ele ri.
“E não sou virgem há algum tempo, mas tenho quatro irmãs e
muitos fãs que gostam de mim, mas não me conhecem. Você
provavelmente não acreditaria com quantas pessoas já fiquei.”

Eu realmente não quero perguntar quando exatamente ele


perdeu a virgindade ou com quantas pessoas já ficou porque me
faz sentir incrivelmente estranha no fundo do peito. Ciúmes sobre-
humano explode dentro dos meus órgãos, o que é estúpido. “Isso
é bom”, digo a ele porque é. A maioria dos homens hoje dorme

MARIANA ZAPATA
com mulheres cujos nomes não conseguem lembrar no dia
seguinte. Meus amigos e parentes incluídos.

“E você, princesa?” Ele pergunta com uma sobrancelha


levantada, algo cintila em seus olhos claros.

Estreito os meus em troca. “Eu o quê?”

“Sua virtude está intacta?”

Eu rio. Juro, não é como se eu queira rir dessa pergunta


específica porque sei que isso me faz parecer uma prostituta total
— o que não sou, para constar, —mas ainda assim. Ele ri também,
antes que eu me force a manter minha expressão neutra ficando a
mais séria possível. “Sim.”

Seus olhos se arregalam e parece que sua mandíbula vai cair.


“Não brinca.”

“Não, idiota.” Me inclino para empurrar o cotovelo em sua


coxa musculosa. Sacha é magro, mas bastante definido. “Não ando
por aí. Só tive um namorado sério...” Não há sentido em mencionar
o nome de Brandon e especialmente não precisa do nome do meu
namorado no colégio, “... e se você não pode sentir, então não
aconteceu certo?”

Sacha abre um sorriso; enorme, brilhante, tão magnífico que


me faz pensar na lua. “Isso mesmo, mas não sei com que tipo de
caras você está saindo se não consegue sentir...”

Franzo o nariz, levantando um ombro.

Aquele sorriso magnético se transforma em algo perverso


antes de inclinar em minha direção. “Você deve definitivamente
sentir alguma coisa.”

Engulo.

Uma onda de arrepio sobe pela minha espinha e luto contra


a sensação pegajosa na minha garganta. “Sim, provavelmente”,
praticamente ofego.

MARIANA ZAPATA
Ele sorri para mim e sorrio de volta, todos os meus órgãos fora
de sintonia.

Sacha estende a mão, lambe o polegar e depois limpa o canto


da minha boca. “Pronto. Você tinha um pouco de saliva seca ali.”

Sim, sento lá parada como um manequim. Minha boca


provavelmente está escancarada. Se alguém mais fizesse isso
comigo, eu empurraria a mão. Esse é um fato que não perco. Nem
o fato de eu considerar o que ele fez, doce. Muito doce.

Mas uma coisa é certa quando começo a pensar que limpar


minha baba é íntimo...

Preciso de um vibrador. Agora.

“Nenhum de vocês pensou em me dizer que é inverno aqui,


porra?” Falo para os três monstros que estão lá confortáveis com
seus capuzes.

Eles me encaram com olhos arregalados enquanto passeio


pela calçada com meus braços cruzados sobre o peito. Está dez
graus em Perth e eu esperava que estivesse, sei lá, talvez trinta
graus. Em vez disso, estamos presos do lado de fora da área de
retirada de bagagens esperando o promotor da turnê australiana
nos buscar, e estou congelando minhas bolas imaginárias. Sou do
Texas. Temos duas estações: cinquenta semanas de verão e duas
semanas de algo entre um inverno semi-brutal e uma primavera
ruim. Se estiver menos que vinte graus, você nunca vai me ver sem
uma jaqueta.

Minha lombar está me incomodando depois do último voo


ridiculamente longo, e nunca mais quero sentar. Bem, pelo menos
por algumas horas. Com apenas minha calça de moletom e uma
camiseta velha da Ghost Orchid, não estou preparada para o
vento. Aparentemente, todo mundo sabia sobre a temperatura.
Eles estavam todos em jaquetas e blusas de lã, exceto eu.

MARIANA ZAPATA
“Venha aqui, eu vou mantê-la aquecida”, Mason fala do seu
lugar a poucos metros de distância.

Eu reviro os olhos e rio. Os membros do The Cloud Collision


estão lentamente saindo da alfândega e da área de bagagens,
depois de irem para a fila mostrar seus vistos de trabalho. Eu estou
viajando como turista em férias.

“Tenho certeza de que um de nós tem um casaco extra que


você pode pegar emprestado”, Gordo diz.

Mas não se oferece para emprestar o dele.

Franzo a testa, ando por trás do meu irmão e me pressiono


contra seu corpo, braços ainda cruzados, tentando bloquear um
pouco do vento. “Então qual o plano?”

“Que plano?” Eliza pergunta.

“Vamos pegar outro ônibus ou o quê?” Grito quando uma


rajada de vento muito fria nos atinge por trás.

Eliza ri. “É por isso que gosto de você, Flabs. Você está sempre
pronta para tudo, sem se preocupar com os detalhes.”

“E é provavelmente por isso que sempre tenho problemas com


você”, eu rio contra seu ombro. É verdade. Ao crescer, Eli dizia
“vamos” e eu ia sem questionar onde. Minha confiança nele sempre
foi astronômica. Claro que teríamos problemas por ficar fora de
casa por muito tempo ou fazer coisas que não deveríamos fazer —
isso sempre acontecia com ele —mas geralmente valia a pena.

Ele olha para mim por cima do ombro. “Vamos ficar em hotéis
e o promotor vai nos levar.”

Balanço a cabeça contra ele. Não é como se eu realmente me


importe se vamos estar em um ônibus ou não, mas a ideia de
dormir em uma cama de verdade todas as noites realmente soa
incrível. “Terei meu próprio quarto?”

“Você vai dividir comigo”, afirma Mason.

MARIANA ZAPATA
“Nesse caso, vou dormir no corredor.”

Eli ri. “Cara, eu não divido um quarto com você depois


daquela merda que fez...”

“Eu estava dormindo”, Mase geme.

Meu irmão nem espera que eu pergunte o que Mason fez antes
de começar a falar. “Acordei uma noite quando estávamos
compartilhando um quarto há um ano atrás, e esse filho da puta
estava se masturbando a um metro e meio de distância. Eu gritei,
mas ele não acordou até que joguei uma agenda de telefones nele.
Essa é a razão para não dividimos mais quartos. Pago do meu
próprio bolso, então não preciso ver essa merda nojenta nunca
mais.”

“Eu estava dormindo”, Mason repete.

Eli faz um som de nojo. “Continue repetindo isso, cara. Todo


mundo está em quartos individuais de qualquer maneira. Espero
conseguir alguma buceta australiana.”

“Por favor, pare de falar, eu não quero saber”, choramingo,


pressionando minha testa entre o braço e as costelas.

“O que você não quer saber?” A voz de Sacha pergunta atrás


de mim.

Viro a cabeça para olhar para ele, vejo que já está usando uma
jaqueta vermelho brilhante. Faço uma careta na direção dele. “Eli
quer transar e não quero saber disso.”

Ele sorri. Miles e Carter estão atrás dele, puxando as próprias


malas. “Eu não te culpo.” Seus olhos varrem meu corpo
aconchegado ao meu irmão. Uma carranca aparece em sua boca.
“Onde está sua jaqueta?”

“Eu não trouxe uma”, digo, fazendo uma careta. “Ninguém


me disse que estaria frio aqui.”

MARIANA ZAPATA
Sacha nem sequer hesita, abre a jaqueta, larga a mochila no
chão e tira as mangas. “Aqui”, ele diz, segurando em minha
direção. “Não quero que você fique doente.” O lado direito de sua
boca se levanta em um pequeno sorriso.

Deus abençoe este homem maravilhoso, doce e atencioso.

“Obrigada!” Coloco o casaco mais rápido do que coloco meu


sutiã depois de um banho em uma sala fria. O interior já está
quente do calor do seu corpo e tem aquele cheiro limpo e distinto
que associo a ele. É dois tamanhos maior, mas não me importo.

Ele acena para mim, cruzando os braços sobre o peito. As


marcas escuras e grossas tatuadas em seu braço aparecem no
material simples de sua camisa e suas calças de moletom cinza.
Ele é muito bonito para o seu próprio bem, e acho que o fato dele
ser tão casual sobre isso, tão indiferente à sua beleza é
surpreendentemente chocante, e aumenta seu apelo.

“Você não está com frio?” Pergunto, sendo uma pervertida e


olhando se seus mamilos se animaram.

“Nah. Não está tão frio.”

“Desculpe.” Brinco com ele, revirando os olhos. “Mas sério,


obrigada. Você é um verdadeiro cavalheiro. “

Ele apenas fica lá, sem me avisar do braço duro que envolve
meu pescoço um segundo depois, apertando minha traqueia. “Vá
dormir, Gaby”, a voz de Eli ri no meu ouvido, lembrando-me de
quando éramos mais jovens e ele praticava seus movimentos de
luta livre. Ele costumava praticar o “dorminhoco” comigo o tempo
todo na esperança de que pudesse me fazer desmaiar. Tento
inclinar a boca para morder seu braço antes que ele se afaste,
dando ao meu lóbulo da orelha um puxão no processo.

A buzina de um carro nos faz virar. Uma grande van branca


para ao lado do meio-fio com um reboque engatado; um jovem
pula, indo imediatamente até Sacha. Ele se apresenta como Vince,

MARIANA ZAPATA
o promotor da turnê australiana, e nos coloca na van com toda a
nossa porcaria. Acabo sentando entre Carter e Gordo no passeio
até nosso hotel.

A Austrália me lembra do que a maioria dos americanos


imagina que o Texas é. O Texas não é gado e vaqueiros, como
Perth, na Austrália, não é só cangurus e coalas em cada esquina.

Vince diz a todos nós onde podemos comer nas proximidades,


que lugares nos manter afastados, e outras coisas que estou
distraída demais para ouvir. Entramos em um hotel de aparência
decente, e Julian pega minha mala do reboque. O promotor nos
entrega todas as chaves dos quartos, e percebo que nossos quartos
estão em andares diferentes. Metade do grupo está no primeiro
andar, enquanto a outra metade está no segundo andar.

No caminho para deixar a bagagem, percebo que estou no


mesmo andar que Mason, Gordo, Julian e Carter.

“Tem certeza de que não quer dividir um quarto?” Mason


pergunta enquanto ambos estamos parados em nossas portas,
passando os cartões-chave.

Abro a porta com o pé, e assinto. “Positivo.” Idiota.

“Se você mudar de ideia…”

“Dormirei com Gordo.”

Sua boca se aperta e ele pisca aqueles lindos olhos azuis para
mim. “Eu posso esperar até a nossa noite de núpcias, se você
quiser.”

Eu puxo minha mala para dentro do quarto e lhe mando um


beijo quando apenas minha cabeça está pendurada na porta.
“Você é tão atencioso. Obrigada pela compreensão. “

Eu deixo a porta pesada bater atrás de mim. O quarto do hotel


é limpo e pequeno, e com certeza não vou reclamar. Abro minha
mala, tiro as roupas e tomo um bom e longo banho para lavar os

MARIANA ZAPATA
milhões de germes que peguei nos três voos para Perth. Mal coloco
minhas leggings favoritas com estampa de abóbora quando alguém
começa a bater na porta.

“Quem é?” Grito, puxando uma blusa preta.

“Sacha, Bloodsport.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 15

Sacha?

Olho-me no espelho e encolho os ombros. “Estou indo!” Grito,


correndo em direção à porta enquanto enrolo uma toalha em volta
do cabelo molhado.

A fechadura mal é virada quando Sacha pergunta do outro


lado: “Você está com fome?”

Abro a porta, sorrio para o homem com rosto e cabelos


molhados encostado na porta com as mãos nos bolsos. “Estou
sempre com fome.”

As palavras mal saem da minha boca quando Carter e Julian


passam. “Venha comer com a gente, Gaby.” Meu colega de vendas
convida.

Eu quase pergunto onde eles estão planejando ir, mas


realmente? Não é como se isso importe. “Vocês vão agora?”

Sacha assente, mas sua atenção está voltada para baixo. Nas
minhas calças. E ele está sorrindo.

“Ok, me dê dois minutos para trocar de roupa”, digo já dando


um passo para trás e puxando a toalha da minha cabeça.

Ele ergue o olhar, os cantos dos olhos enrugados em diversão.


“Por quê? Você está adorável.”

Minhas bochechas ficam quentes, mas ignoro, tiro o elogio da


minha cabeça e dou outro passo para o meu quarto, segurando a
porta com a mão. “Sim, sim. Essas calças não são quentes de
qualquer maneira. Tudo que preciso é de um minuto, prometo.
Corro para dentro, tiro minhas leggings, jogo a toalha sobre uma

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cadeira e coloco um jeans limpo. Coloco a jaqueta de Sacha e meus
sapatos, pego a bolsa e chave do quarto. Abro a porta e encontro
meu amigo onde o deixei. No final do corredor, nos elevadores,
alguns dos outros caras estão esperando por perto.

“Pronta?” Sacha pergunta, puxando o capuz de sua jaqueta


sobre o meu cabelo muito úmido.

“Pronta.” Então percebo que ele só está usando uma camisa


de mangas compridas já que eu estou com a jaqueta. Culpa
queima em minhas veias. E se ele ficar doente? Ele é o melhor
cantor que já conheci; ele está sempre tentando cuidar de si
mesmo e de sua voz. Inferno, sua rotina de aquecimento antes de
cada show leva uma hora. “Você quer sua jaqueta? Não me importo
de ficar, especialmente se alguém trouxer comida para mim.”

Ele pega meu cotovelo, seus dedos compridos envolvem todo


o comprimento. “Fique com essa até conseguir uma. Você não
precisa ficar doente, princesa. “

“Você tem certeza?” Pergunto, olhando para ele e olhando seu


cabelo molhado. “Ninguém se importa se eu perder minha voz, mas
posso ser esfaqueada se você perder a sua.”

Sacha olha para mim e meio que franze a testa. “Estou bem.
Vou ficar bem.” Ele pisca. “Você sempre foi assim tão pequena?”

Isso me faz gemer. “Sim, capitão óbvio.”

“Você tem certeza?” Ele estende a mão e dá um tapinha no


topo da minha cabeça com seu capuz. “Você é tão fofa. Eu posso
te carregar...”

Bato no braço dele enquanto tento esconder minha risada.


“Pare. Deus, pare com isso. “

Sacha ri, aperta o cotovelo que ainda segura. “Estou


brincando.” Ele se esquiva do meu próximo soco. “Mas realmente,
quanto você mede? Um metro e meio?”

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Empurro a cabeça para trás e olho para ele. “Eu deveria ter te
dado à comissária de bordo quando tive a chance…”

“Flabs, deixe-me dar uma mordida”, diz Mason, a mão já


estendida sobre a mesa enquanto balança os dedos.

Eu nem sequer me incomodo em responder antes de passar


meu hambúrguer meio mastigado. O promotor australiano
apontou um restaurante que era possível ir caminhando em nosso
caminho para o hotel. Nos encontramos no saguão e caminhamos
três quarteirões como se estivéssemos treinando para uma
maratona. Não é preciso dizer que a última vez que comemos foi
no voo há horas e todo mundo está morrendo de fome.

Sem se preocupar em pedir permissão, Eli aproveita a


oportunidade para pegar meu copo e tomar um grande gole de
água, assim como Gordo, que está sentado do outro lado, pega
algumas batatas fritas do meu prato. No assento em frente ao meu
irmão e ao lado de Mase, Sacha ergue as sobrancelhas enquanto
observa Mason devolver minha comida.

Eu sorrio, dando outra mordida. “Posso oferecer a você um


pouco...”

Ele ri. “Sim, obrigado. Parece que todo mundo come metade
da sua comida de qualquer maneira.”

Dou de ombros, colocando uma batata frita na minha boca.


“É por isso que dizem para você não alimentar animais de rua...”

Meu irmão belisca a parte de trás do meu braço com força.

“Oww, E, seu idiota”, choro, esfregando o local onde ele


apertou.

Do outro lado, Gordo aperta meu outro braço.

“Droga, Gordo”, gemo.

MARIANA ZAPATA
No final da longa mesa, alguns dos caras estão virando em
seus lugares para olhar para algo, mas estou muito ocupada
tentando beliscar Gordo em vingança para perceber o que é.

Acabo de fazer quando ouço um deles dizer: “Olhe para esses


monstros.”

Reconheço a voz de Miles. “Quão grande você acha que essas


coisas são?”

Ouço murmúrios em resposta que não consigo ouvir


claramente, mas não sou idiota. Sei exatamente do que eles estão
falando. É por isso que minha espinha fica um pouco rígida, sem
aviso consciente. Eu tento não ouvir.

Então eles começam a rir, e juro que é como reviver aquele


momento, dois anos atrás, quando ouvi meus amigos queridos
conversando com nossos companheiros de turnê sobre peitos — os
meus, especificamente.

“Eu vou empurrar minha cara entre eles.”

“Empurrar a cara neles? Eu adoraria...”

Levanto uma sobrancelha e solto um suspiro, dizendo a mim


mesma para ignorar a conversa. Eles não estão fazendo isso ao
meu redor, tecnicamente. Eles não estão falando comigo. Também
não é como se caras não falassem sobre mulheres assim o tempo
todo, porque eles falam. Para não ser hipócrita, posso admitir de
bom grado que de vez em quando olho para caras seminus e
gostosos.

“Eles parecem falsos. Não parecem falsos?” Alguém cuja voz


não posso identificar pergunta, e isso me deixa realmente tensa.

Eli cutuca minha mão com a dele, encontrando meus olhos.


Ele tem essa pequena inclinação estranha em seus lábios e sei que
está bem ciente do que está me incomodando. Ele me cutuca
novamente.

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“Toda garota que eu conheci com peitos falsos...”

Começo a sacudir a perna por baixo da mesa, dizendo a mim


mesma para manter a boca fechada. Não é da sua conta, Gaby.

“...puta...”

Eu deixo meu garfo cair na mesa, ao mesmo tempo meu rosto


fica quente. Realmente muito quente. Até minhas orelhas
esquentam o suficiente para começam a doer um pouco.

Quando eu era criança, cresci assistindo uma atriz na


televisão com seios enormes e cabelo loiro igualmente magnífico,
tornar-se um ícone sexual. Enquanto, por outro lado, revistas
retratavam mulheres com peitos pequenos, corpos finos e quadris
estreitos como um padrão de beleza. Mas eu sou baixinha, tenho
cabelos escuros ondulados, um pouco gordinha e meus pobres
peitos são irregulares. Não caio perto de nenhum desses
estereótipos.

Eu tive um tamanho P outro G por quase dez anos, desde o


final do meu surto de crescimento aos quatorze anos até a cirurgia
aos vinte e três anos. Ninguém jamais poderia entender como foi
para mim lidar com isso ou como foi escondê-los. Eu só usei
camisetas feitas de certos materiais. Nunca nada, nem mesmo
remotamente decotado, mesmo que desejasse, porque sabia que
não podia. Nenhum dos meus tops era apertado.

Eu vestia camisetas por cima dos meus tops porque havia um


enchimento especial e impermeável no meu “lado pequeno. “
Escolher o vestido de formatura foi um pesadelo. Comprar sutiã
me causava ansiedade severa. Querer brincar com meu namorado
no banco de trás de seu carro no colégio foi uma experiência
estranha ao dizer a ele para não tocar meus peitos quando ele
obviamente queria, e eu realmente queria também.

Houve tantas vezes que chorei por detestar meu corpo.

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Não é como se eu não tentasse. Tudo que eu queria era ser
normal. Eu odiava como tinha nascido assim e me perguntava por
que eu. Por que tive que crescer dessa forma? Eu fodidamente
odiava isso com cada fibra do meu ser.

Então o que deveria fazer? Viver assim o resto da minha vida?


Claro, eu poderia, mas sentia um medo tão debilitante que alguém
notasse a imperfeição que nunca estaria confortável em minha
pele. Por mais que eu não quisesse que isso me incomodasse,
aconteceu.

Eu não queria caras olhando para os meus seios. Eu não


queria fazer pornô ou ganhar dinheiro com o meu corpo. Tudo que
eu queria era me sentir melhor comigo mesma. Para obter um
bronzeado uniforme. Usar um biquíni pela primeira vez na minha
vida, porque não precisaria me preocupar com o preenchimento de
um lado. Eu queria estar com um cara e não me preocupar com o
que ele iria pensar, ou para quem eles diria se descobrissem que
um dos meus seios era muito maior que o outro. Eu queria ficar
confiante comigo mesma.

Então fiz isso acontecer.

Ninguém tentou me convencer do contrário. Ninguém me fez


sentir envergonhada como se próteses fizessem de mim uma
pessoa ruim ou uma viciada. Meus parentes estavam me apoiando
na decisão desde o começo.

Economizei o máximo de dinheiro que pude enquanto estava


em turnê com a Ghost Orchid para pagar o melhor cirurgião do
Texas, e valeu cada centavo. Eu passaria por toda dor e medo de
novo. O primeiro biquíni que comprei quatro meses depois
provavelmente era o mais conservador do planeta, mas chorei
mesmo assim quando o coloquei pela primeira vez.

Quem tinha o direito de me fazer sentir mal pelo que fiz? E


enquanto todas as mulheres têm suas próprias razões para fazer
o que querem com seu corpo, eu acredito firmemente que as
pessoas precisam cuidar de seus próprios problemas. Se você não

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está machucando ninguém e não está pedindo conselhos, ninguém
tem o direito de abrir a maldita boca.

Assim que abro a boca para dizer aos caras do TCC que tenho
próteses e eles devem se calar, duas pessoas falam antes. Duas
pessoas totalmente inesperadas.

Meu irmão.

E Sacha.

Eles falam ao mesmo tempo, fazendo com que seja difícil


descobrir o que exatamente é dito, mas soa como uma mistura de
“Vocês querem calar a boca?”

Eu pisco. Então pisco de novo, totalmente pega de surpresa


pelo tom feio e inflexível em ambas as vozes. Um nó se forma em
minha garganta, e juro, por um longo minuto, apenas sento lá
absorvendo o fato de eles terem dito alguma coisa. Finalmente,
rapidamente, o momento clica e lembro o que está acontecendo.

“Por quê?” Pode ter sido Mateo perguntando.

É Sacha que se inclina sobre a mesa para encarar seu colega


de banda, uma expressão sem sentido no rosto que faz os cantos
de sua boca apertarem. “Porque vocês parecem ignorantes. Minha
mãe fez essa cirurgia. Você está chamando-a de vagabunda? “

O silêncio que cai sobre a mesa é ensurdecedor.

E também, tão, tão fodidamente estranho. Puta merda.

Mas é a raiva e lealdade irradiando do cantor do TCC e como


isso me faz sentir que mais me choca. Ele sabe que também está
me defendendo? Claro que não, mas aproveito a vitória de qualquer
jeito, como se fosse minha também.

Eu inclino a cabeça para olhar na direção de Eli apenas para


encontrá-lo já olhando para mim. Ele me dá um olhar de olhos
arregalados e mais do que ligeiramente impressionado que diz “o
que foi isso?”

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Respondo a ele com os olhos “não faço ideia.”

Seu olhar diz “isso foi brutal.”

O meu responde “eu sei.”

Ninguém fala muito pelo resto do jantar. Se é porque estamos


todos cansados, muito ocupados comendo ou se alguém está se
sentindo mal-humorado por como Sacha reagiu, não faço ideia.
Escolho as duas primeiras categorias; eu também estou ocupada
pensando sobre o que ele disse sobre sua mãe. A curiosidade está
me matando, mesmo sabendo muito bem que não é da minha
conta se é verdade ou não. Todos terminam de comer e fazemos
fila para pagar nossas refeições individualmente, pago por Eli
quando ele desaparece. Espero nas portas por Sacha.

Uma das últimas pessoas a pagar, ele está ocupado colocando


moeda australiana em sua carteira quando eu digo “Boo”.

Ele sorri fracamente quando enfia a carteira no bolso da calça


jeans.

“O que há de errado?” Pergunto.

Sacha revira os olhos e levanta um ombro. “Nada que


importe.” Ele estende a mão para puxar o capuz sobre a minha
cabeça novamente. “Estou feliz que você esteja pelo menos falando
comigo.”

Sorrio para ele, esperando que o prazer e o orgulho que estou


sentindo pelo que ele fez irradiem no meu rosto. “Eu acho que você
é muito maravilhoso agora.”

Ele tem uma expressão engraçada no rosto. “Mesmo?”

“Sim.” Bato meu ombro com o dele. “Foi muito legal da sua
parte, sabe. Dizer algo a eles”, explico apenas no caso de ele não
saber a que estou me referindo.

Sacha olha para mim com o canto do olho, chegando à porta


primeiro para segurá-la antes de acenar para que eu passe.

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“Vamos antes que todo mundo termine de pagar. Não quero lidar
com eles agora.”

Assinto, indo para a noite fria com ele seguindo atrás.

Nós andamos em silêncio um pouco antes dele de repente


dizer: “Eles são idiotas de verdade às vezes.”

Encolho os ombros para não dizer ‘sim, eles são’. “Bem, você
os conhece há muito tempo e estão juntos constantemente.
Acontece.”

Ele concorda, sua atenção na calçada enquanto seguimos em


direção ao hotel alguns quarteirões abaixo. “Você sabe por
experiência?”

Outro flashback do incidente tantos anos atrás passa pela


minha cabeça, e tenho que lutar contra o desejo de fungar. “Você
não tem ideia do quão louca esses três me deixam. Posso sentir
uma dor de cabeça chegando só de pensar nisso.”

Sacha solta um risinho.

Sentindo que ele ainda está frustrado, continuo. “Uma vez,


fiquei cinco meses sem falar com eles. Antes disso, nunca passei
mais de uma semana sem vê-los desde o jardim de infância.”

“O que aconteceu?” Ele pergunta, e por que não? Se ele


mencionasse a mesma coisa para mim, eu teria perguntado
também porque sou intrometida.

“Bem...” Droga, o que diabos eu posso dizer? Eu não estou


exatamente pronta agora — provavelmente nunca estarei — para
contar a ele sobre meus seios. Contei a Brandon sobre minha
cirurgia na noite em que decidi que estava pronta para dormir com
ele pela primeira vez. Os três idiotas sabem por que somos amigos
desde sempre. Não há segredos entre nós. Falei sobre fazer a
cirurgia por anos, mas eles sabem principalmente porque são eles:
meu irmão gêmeo e os dois caras que são praticamente cicatrizes
na minha pele que não consigo me livrar.

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Mas Sacha não é um amigo antigo, e nós não estamos prestes
a tirar a roupa ou fazer dele meu terceiro namorado, então ele só
vai conseguir uma pequena parte da história.

“Todos ficaram bêbados uma noite, alguns anos atrás, e


contaram algumas coisas realmente ruins sobre mim pelas minhas
costas para os outros caras da turnê.” Solto um suspiro e mordo o
interior da minha bochecha. “Eu não aceitei muito bem.”

Ele visivelmente estremece. “É por isso que você parou de sair


em turnê com eles?” Ele pergunta, obviamente se lembrando da
nossa conversa de um mês atrás.

Concordo. “Eles realmente feriram meus sentimentos.”

“E é por isso que você não gosta de estar perto do seu irmão
quando ele está bebendo?”

Porra, ele é perceptivo. “Bingo.”

“Mas você os perdoou.”

“Claro. Além da minha amiga Laila que você conheceu, eles


são meus melhores amigos. Eli é meu irmão gêmeo. Sou obrigada
a perdoá-lo por toda a merda estúpida que já fez, mas eu disse a
ele antes de vir nesta turnê que não faria isso a menos que
prometesse não beber perto de mim novamente. Está tudo bem
agora. Eles sempre me irritam e me deixam um pouco maluca. É
normal. Tenho certeza que você sabe disso.”

Sacha faz um pequeno barulho no fundo da sua garganta. “Eu


fico meses sem vê-los quando não estamos em turnê. Mat e Isaiah
são companheiros de quarto. Julian mora a alguns quarteirões de
distância deles, então eles se veem com frequência. Eu começo a
sentir falta deles às vezes depois de um tempo, mas depois de
algumas semanas em turnê, lembro porque não saio com eles
quando estamos em casa.”

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Ele balança a cabeça com um suspiro exasperado. “Há apenas
um limite do que você pode aguentar, estando perto das mesmas
pessoas o tempo todo.”

Bem. Ok. Isso dói um pouco.

Balanço a cabeça, baixando o meu olhar para o chão. “Sim,


eu entendo”, respondo quando a queimadura do que ele disse
atinge minha pele. Quer dizer, ele pediu para eu sentar com ele no
voo para a Austrália, não é? E me convidou para o jogo de futebol,
certo? Não é como se eu estivesse perseguindo Sacha por aí.
Ninguém jamais me acusou de ser pegajosa ou carente antes.

Mas ainda assim. Suas palavras ardem. Muito.

“Ah merda.” Ele suspira. “Gaby.”

“Hã?” Eu me agacho para mexer com o meu cadarço, tentando


afastar a rejeição que me atinge. Realmente, não estou tentando
ser sanguessuga.

“Ei.” Sua voz é suave.

“Hmm?” Desamarro meu cadarço e amarro de novo, alheia ao


fato de que ele está se abaixando na minha frente até os joelhos
baterem nos meus. Eu posso sentir o cheiro picante e limpo de seu
xampu e sabonete líquido. Por que faço isso comigo? Por que não
posso me sentir atraída por alguém que me vê como mais que uma
amiga?

Mais do que tudo, o que quero naquele instante é não me


importar que ele acabou de dizer que está cansado de estar perto
das mesmas pessoas o tempo todo.

Pessoas como eu.

Gostaria de poder ir embora, dar a o espaço que ele quer e


não machucar meus sentimentos. Porque se fosse Mason dizendo
que está cansado de me ter por perto, eu diria a ele para comer

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merda. Então, uma hora depois, ele provavelmente me daria um
abraço e me perguntaria quando teremos filhos juntos.

Mas é diferente com Sacha. Claro que é diferente com ele, e


isso é uma droga.

“Ei.”

Seus joelhos tocam os meus e digo a mim mesma para deixar


isso de lado. Para não deixar isso me incomodar. Eu não devo
deixar suas palavras importarem.

“Gaby, baby”, ele diz com a mesma voz suave que é tão
diferente da que ele usa no palco todas as noites para cantar para
seus fãs. Aquelas grandes mãos se curvam sobre meus ombros
inesperadamente, e me certifico de manter o queixo para baixo.
“Eu não estava falando de você.”

Lutando contra o desejo de limpar a garganta, balanço a


cabeça e me forço a olhar para cima, um sorriso apertado em
minha boca. “Eu sei”, digo, mas as palavras soam tão forçadas
quanto parecem.

O sorriso que toma conta do seu rosto diz que ele sabe
exatamente quão cheia de merda eu estou. Aquelas feições duras
que deixam seu rosto tão atraente, suavizam instantaneamente.
“Ei, estou falando sério. Me expressei errado. Eu não quis dizer
você.”

“Eu sei.” Meu peito... meu peito parece estranho. “Você viu
Eli?” Pergunto, ansiosa para fugir.

“Fight Club...” ele suspira. “Não me olhe assim e invente


alguma coisa sobre o seu irmão. Ele saiu quando todos entraram
na fila para pagar de qualquer maneira.”

“Eu estou bem”, insisto. “Sei o que você quis dizer, Sacha.”

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“Sacha?” Seus polegares tamborilam sobre minha clavícula
quando ele inclina a cabeça para baixo. “Agora eu sei que estou
realmente fodido.”

“Estou bem. Mesmo.” Ele balança a cabeça, sua expressão


agitada, e forço um sorriso no rosto. “Vamos. Certifique-se de que
ninguém me sequestre no caminho de volta”, digo.

“Parece que acabei de chutar você em suas bolas imaginárias,


me sinto um merda por dizer algo tão estúpido.” Ele desliza as
mãos pelos meus ombros até meus braços e finalmente agarra
minhas mãos, que estão em meus joelhos. Ele as envolve nas suas
antes de se levantar, me colocando em pé. Solta seu aperto até ter
os dedos em volta dos meus punhos e aperta levemente. “Sinto
muito. Eu não quis dizer você. Juro de dedinho.” Ele aperta
novamente. Seu tom é gentil e baixo. “Eu nunca me referiria a você,
querida.”

Eu não digo nada, acenando com a cabeça e ele suspira


novamente. Seu polegar acaricia a pele sensível no interior do meu
pulso, em uma longa veia que se estica por todo braço. Então ele
me solta. “Vamos lá.”

Mantendo meus olhos no cimento diretamente à frente dos


meus pés, me chamo de idiota por deixar suas palavras me
incomodarem e também por deixá-lo saber que elas me
incomodam. Estúpida. Estúpida, estúpida, estúpida. Por que estou
sendo tão chata com isso? Com ele?

Nós andamos apenas alguns metros em silêncio antes que ele


pare de repente. “Como você pode pensar que eu ficaria cansado
de você? Eu sou o único que anda seguindo você por aí. E você é
tão fofa, que não aguento metade do tempo.”

Sim, estou tão distraída que não vejo o meio-fio.

Arrebento minha bunda e quase como concreto.

MARIANA ZAPATA
Meus joelhos acham que estão competindo no campeonato
nacional de patinação artística pelo primeiro lugar, e minhas mãos
tentam ganhar o segundo lugar.

Sacha grita alguma coisa, mas estou tão ocupada rindo do


que aconteceu — e dizendo a mim mesma para ignorar o fato dele
ter me chamado de fofa — que não ouço o que sai da sua boca. Há
lágrimas nos meus olhos enquanto as mãos dele vão para os
braços para me ajudar. Rolo na minha bunda e, em seguida,
coloco-a no meio-fio para não ser atropelada por um carro —
porque é só o que falta — meu peito treme.

“Você está bem?” Ele pergunta, enquanto senta ao meu lado


e sacode minhas palmas para dar uma olhada nelas. “Oh,
princesa”, Sacha sibila quando o lado de sua coxa pressiona
contra a minha. Os arranhões vermelhos, com o menor indício de
sangue acumulado, marcam as partes carnudas das minhas
mãos.

“Eu estou bem”, digo em uma risada enquanto espio as mãos


que ele ainda segura. São meus joelhos que realmente doem. Puxo
minha perna contra o peito, aperto os olhos e vejo os rasgos no
jeans entre minhas canelas e joelhos.

Honestamente, eu poderia ter chorado só pelos buracos,


droga.

“Oh meu Deus, era minha calça favorita”, eu gemo.

“O que aconteceu?”

“Meus jeans estão rasgados.”

Ainda segurando minhas mãos, seus olhos encontram os


meus. Sua boca se contrai. “Você acabou de cair na sua cara...”

“Não foi de cara... “

“...eu pensei que você tinha quebrado um pulso, e está


preocupada com o seu jeans?”

MARIANA ZAPATA
Bem, quando ele diz assim, me faz soar como um idiota.
Pigarreio. “Sim, mas não estou ferida e esta era minha favorita”,
explico.

Sacha solta um suspiro quando fecha os olhos e balança a


cabeça.

Aperto meus dedos contra os dele e bufo, absorvendo suas


feições, já que ele parece estar rezando por paciência ou algo
próximo a isso. Acho que ele não está mentindo sobre estar
preocupado. Eu o cutuco, ignorando a dor que vem dos meus
joelhos e mãos. “Foi muito engraçado, não foi?” Uso as mesmas
palavras que ele escolheu quando chutou a bola no meu rosto.

Ele não responde por tanto tempo que penso que realmente
ficou muito preocupado e não pensou em como eu não ver o meio-
fio e cair de quatro é hilário.

Então ele finalmente olha para cima e todo o lado de sua boca
está apertado na expressão mais fofa que eu já vi, e ele encolhe um
ombro musculoso. Há também uma chance de seus olhos estarem
brilhando. “Foi muito engraçado.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 16

“Pare com isso!” Julian grita, batendo as costas na frente de


Sacha.

Sacha está ocupado demais ficando dobrado, rindo, para dar


a mínima para o fato de que seu amigo foi acertado pelo cocô de
um pássaro.

Pela segunda vez em menos de uma hora.

Estamos no King's Park, em Perth, o maior parque urbano do


mundo, um dia depois de termos chegado ao Land Down Under.
Sacha, Julian, meu irmão, Isaiah e eu pegamos uma carona para
o belo local no final da manhã. O que começou comigo batendo na
porta do meu irmão pedindo a ele para me acompanhar para
algum lugar, se tornou um convite estendido para os outros caras
durante o café da manhã.

“Parem de rir e me ajudem a limpar!” Julian está praticamente


gritando quando para na minha frente, esperando que eu seja sua
salvadora.

Eu quero ajudar Julian com o problema dele. Mesmo. Eu


quero. O problema é que não consigo parar de rir também.

“Gaby! Por favor! Tire isso!”

Sério, preciso me esforçar muito para parar de rir. Finalmente


limpo o lugar pegajoso com o último guardanapo que coloquei no
meu bolso mais cedo, mas demora mais do que normalmente
aconteceria. Um segundo depois, outro pássaro invade o céu e o
faz começar a xingar em aborrecimento e provavelmente com
medo. Já é ruim o suficiente ser premiado uma vez, mas duas

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vezes? E na frente de Eli e Sacha? Não há como Julian viver com
isso.

“Eu sinto como se devesse fazer cocô em você também agora.


O que exatamente estou esperando, sabe?” Eli gargalha, batendo
no pobre cara nas costas antes de imediatamente retirar sua mão
e verificá-la com uma careta.

O mesmo pássaro voa perigosamente sobre nossas cabeças, e


começo a gargalhar, vendo o olhar de puro horror no rosto de
Julian mais uma vez.

“É melhor correr antes que eles venham atrás de você


novamente”, Sacha brinca com ele quando consegue respirar
novamente. Ele dá uma olhada na minha direção e depois se perde
de novo; solta uma gargalhada alta e dolorosa que faz eu rir
também.

Não tenho certeza de como isso acontece, mas Sacha e eu de


repente estamos encostados um no outro, da testa até o ombro,
apesar da diferença de altura. A respiração quente no pescoço
enquanto rachamos de rir às custas de Julian. Tenho certeza que
ele nos mostra o dedo antes de ir em direção à saída que está do
outro lado do parque.

Eli e Isaiah seguem atrás dele, insultando-o com ameaças


sobre um pássaro indo em sua direção.

Quando meu peito finalmente começa a desejar uma lufada


de ar, me afasto e sento no banco mais próximo para limpar
minhas lágrimas e me recompor. “Você riria de mim assim se eu
tivesse sido a vítima?” Pergunto a ele.

Ele olha para mim de cara séria, mas não está nada sério,
posso dizer pela diversão em seus olhos. “O que você acha?”
Quando sorrio, ele pisca e ri. “Eu provavelmente riria mais,
princesa, e tiraria uma foto para guardar para sempre.”

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É um pouco patético o quanto gosto da sua provocação. Por
outro lado, se os papéis fossem invertidos e fosse ele recebendo
uma entrega especial? Não há dúvida em minha mente que
fotografaria isso. “Touché. Se fosse você, colocaria em uma
moldura e penduraria na frente do meu banheiro, então toda vez
que estivesse lá, poderia aproveitar.”

“Eu não sei como me sinto sobre você olhando para mim
enquanto está...” Ele faz uma careta, “...usando o banheiro.”

Encolho os ombros, o que só o faz menear a cabeça e estender


a mão em minha direção.

“Vamos encontrá-los”, diz Sacha, balançando os dedos longos


e finos na minha frente.

“Tudo bem”, eu apenas lamento. Antes de todo o incidente do


pássaro, todos concordamos em fazer uma pausa e comer alguma
coisa no café, mas pelo que parece, esse não é o plano.

Nós estamos andando por horas, e vim com os sapatos


errados. Além disso, meu joelho ainda está me matando por causa
do tombo na noite anterior, quando Sacha disse... bem, o que ele
disse. Eu não estava me permitindo pensar muito sobre isso. Mase
sempre diz coisas que realmente não significam algo, então os
comentários de Sacha não precisam ser diferentes.

Ele levanta uma sobrancelha e move seus dedos mais rápido.


“Vamos. Vou te dar uma carona na volta, sua aleijada”, ele oferece.

Cavalinho? Sim. Cavalinho nas costas de Sacha? Duplo,


triplo, infinito sim. Bato os dedos e pego sua mão sem pensar duas
vezes, deixando-o me puxar para cima.

“Vamos antes que eu deixe você para os pássaros”, ele


ameaça.

“Sim, senhor”, digo a ele enquanto salto o mais alto possível.


Ele agarra a parte de trás das minhas coxas e me levanta um pouco

MARIANA ZAPATA
mais enquanto envolvo os braços em seu pescoço. “Vamos, minha
carruagem. Já limpei merda suficiente hoje.”

Ele ri e me dá um tapa na coxa antes de começar nossa


caminhada. Ficamos quietos por um minuto ou dois antes de
Sacha virar a cabeça um pouco para que sua bochecha fique bem
ao lado da minha. “Eu gosto do jeito que você cheira. O que é isso,
laranjas?”

“Sim. Tomei banho esta manhã”, eu o lembro enquanto tento


não ser sem vergonha e aproximar meu rosto do dele.

“Hoje foi seu dia de banho na semana?” Ele brinca.

Suspiro. “Duas vezes esta semana, Sassy. Considere-se com


sorte. “

Sacha para de andar. “Devo chamar o Guinness? Dizer-lhes


sobre o seu novo recorde?”

Eu solto uma das minhas mãos e aperto seu nariz. “Babaca.”

“Ele não sabe”, digo a ele.

Sacha faz uma careta. “Ele sabe.”

Eu não posso deixar de bufar quando olhamos para o meu


irmão caído no chão como um garotinho que comeu muito doce,
conversando com Gordo sobre sabe-se lá o quê. Estamos sentados
atrás da minha mesa de vendas por cerca de meia hora contando
camisetas e falando sobre os piores ferimentos que já tivemos
depois que mostrei a enorme contusão abaixo do meu joelho da
noite anterior. O fato de Carter estar sentado atrás da mesa do
TCC, fazendo a mesma coisa sozinho, não é ignorado por mim, mas
prometo a mim mesma que o ajudarei mais tarde, assim que meu
assistente for embora.

“Ele sabe que tem sangue, mas não o tipo”, esclareço. “Se ele
acabar precisando de uma transfusão de sangue e não puder ligar

MARIANA ZAPATA
para minha mãe, minha irmã ou para mim, ele vai acabar
morrendo quando lhe derem um tipo diferente.”

“Não, ele sabe. Ele tem que saber.”

Eli joga uma baqueta no ar e, em seguida, tenta pegá-la


puxando o cós da calça para que caia nesse espaço... com sua
bunda apertada. “De jeito nenhum.”

Sacha e eu nos viramos olhando um para o outro e cada um


de nós faz uma cara estranha.

“Eu aposto vinte dólares com você que ele não pode sequer
nomear os diferentes tipos”, digo a ele com um suspiro enquanto
vejo meu irmão tentar seu truque novamente.

Ele dá um tapa suave nas minhas costas assente.


“Combinado.” Sacha limpa suas calças, pisca para mim e grita,
“Eli!”

Eliza se vira para olhá-lo antes de estender os braços para os


lados. “O que é?”

“Ajude-me a ganhar vinte dólares.”

Bato no braço dele. “Você é um trapaceiro.” É claro que Eli


faria algum esforço para tentar se lembrar se achasse que eu
perderia dinheiro.

“Não consigo lembrar que tipos sanguíneos existem. Você


sabe?”

Meu irmão franze a testa. “Tipos sanguíneos?”

Eu rio e bato Sacha no lado com as costas da minha mão.

“Sim. Tem o OB, certo? Qual mais?”

OB? Que diabos? Por outro lado, uma sugestão errada é justa
o suficiente, não é exatamente uma trapaça.

Eli tosse. “Uh, A? Positivo? B uhumum…”

MARIANA ZAPATA
“O que é isso?” Pergunto a ele, tentando o meu melhor para
segurar uma risada.

“A negativo, aaaahhummmhhhmmhmm”, ele balbucia de


novo, dizendo algo realmente alto e depois diminuindo de volume
enquanto continua fazendo barulhos. Eu não posso deixar de rir,
o que só faz Eli apertar os lábios novamente antes de me mostrar
o dedo. “Eu não sei! O que eu pareço? Algum tipo de profissional
de sangue?”

Profissional de sangue? Bato a mão na minha boca e abaixo


para ele não me ver rindo de sua estupidez.

“O que eu disse? Ele é tão inteligente quando quer, mas


quando não quer...” Eu digo ao meu amigo de olhos cinza através
da minha risada. “Se você perguntar a ele que dia é o aniversário
da nossa mãe, ele lhe dirá trinta e um de abril.”

Sacha sorri. “Mas há apenas trinta dias em abril.”

Balanço minhas sobrancelhas. “Exatamente. Tenho que


enviar uma mensagem para lembrá-lo de todos os aniversários da
nossa família.” Penso nisso por um segundo. “Se não tivéssemos
nascido no mesmo dia, ele não saberia em que dia é meu
aniversário. Com certeza.”

“Que dia é seu aniversário?” Ele pergunta.

“Dois de dezembro. O seu?”

“Treze de agosto.”

“Vou ter que me lembrar e enviar um cartão de aniversário do


One Direction ou algo assim.” Sorrio para ele.

Ele pisca. “Você é muito generosa.”

Dou de ombros, ainda sorrindo. “E você? Você sabe os


aniversários de sua família?”

MARIANA ZAPATA
“Sei de todo mundo. Se eu esquecesse, minhas irmãs
provavelmente esfolariam minhas bolas.” Ele faz uma pausa e
pensa sobre isso.” Bem, Dena, minha mais velha, faria. O resto
colocaria um anúncio no Craigslist para uma noite, apenas para
homens, e colocaria meu número como contato”, ele ri.

“Essa é boa.” Eu também rio. “Vou lembrar disso caso você


me irrite.”

Ele zomba com um suspiro. “Eu? Te irritar? O que você quer


dizer?”

“Cale a boca.” Dou-lhe uma cotovelada na costela. “Está


fadado a acontecer um dia. Você vai me ver menstruada
novamente ou algo assim.”

Sacha mostra a língua no canto da boca. “Sobrevivi dezoito


anos com minhas irmãs, e você é muito mais tranquila e linda que
elas. Nós ficaremos bem.”

Minhas bochechas ficam quentes, e mais uma vez, digo a mim


mesma para não levar a sério o que ele está dizendo. Ele á legal.
Inacreditavelmente legal. Pessoas legais dizem coisas doces para
os outros porque isso é algo deles. Eu não vou ser idiota e
interpretar isso errado. “Sim, claro, Sassy.” Pisco para ele,
tentando não deixar minhas bochechas me traírem. “Vou deixar
você me pagar meus vinte dólares depois, você não tem que falar
doce.”

Mais tarde naquela noite, enquanto o TCC está se


apresentando, Eli segue para a área de vendas para assinar alguns
autógrafos.

“Flabs?” Ele grita no meu ouvido enquanto estou ajudando


um fã, com um olho em Sacha em sua roupa formal e adequada
enquanto ele se move pelo palco.

“O que você quer?”

MARIANA ZAPATA
Um dedo passa pelo meu lábio inferior. “Você precisa de um
babador”, Eliza ri.

Eu rio, dando-lhe um olhar exasperado. “Me deixe em paz.


Você não me vê te irritando quando está flertando com garotas.”

Ele começa a dizer algo mais, mas Sacha começa a falar ao


microfone sobre um cara na plateia usando um chapéu de Natal e
como o Natal é seu feriado favorito. “Mas não é o meu dia favorito
no ano”, ele diz com um sorriso para a multidão.

Eli se inclina para mim. “É o dia do bife e boquete — dia 14 de


março, feriado criado para os homens em resposta ao dia dos
namorados.”

Eu me inclino para longe dele, sorrindo. “Esse é o seu feriado


favorito”, digo a ele, ganhando um aceno animado em resposta.

A abertura de uma de suas músicas atinge o local enquanto


Sacha está em um dos alto-falantes do chão e pressiona o
microfone contra seus lábios. “É dois de dezembro!” Ele grita antes
que a batida forte dos tambores sinalizasse o resto da música.

O que diabos está acontecendo?

“Meu aniversário? Ele é gay?” Eli me pergunta com um olhar


confuso no rosto.

Dou um soco no estômago dele só por ser um idiota.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 17

É o estrondoso bang, bang na porta que me assusta pra


caramba.

O fato de que são duas horas da manhã só aumenta o pânico


‘o está acontecendo’ que queima meus pensamentos.

Voltamos para o hotel há uma hora. Tempo suficiente para eu


tomar banho e começar a relaxar do show agitado e lotado em
Perth. O fato de metade das datas na Austrália estão esgotadas é
excitante e assustador.

Principalmente excitante. Os australianos têm os sotaques


mais sexy que já ouvi. Whoo.

“Quem é?” Pergunto um pouco hesitante, desejando ter uma


faca, um taco ou pelo menos uma pedra que possa lançar na
pessoa que está batendo. Mas, lembro que todos os quartos ao
redor têm um dos caras da turnê. Se eu gritar alto o suficiente
alguém viria, certo?

Eh. Eu posso usar um abajur se precisar agir.

Alguém — ou algo? — arranha a porta levemente.

Jesus Cristo. “Sério, quem é? “

Há mais arranhões.

Droga! “Eli, eu juro por Deus...”

Uma risada alta atravessa a porta. “Sou eu.”

Eu.

Sassy.

MARIANA ZAPATA
Gemo e resmungo saindo da cama. “Droga, Sacha. Você está
tentando me causar um ataque cardíaco?”

“Sim.”

Sim, reviro os olhos, mas estarei mentindo se disser que não


estou aproveitando a atenção, especialmente depois do que ele
disse durante o set do The Cloud Collision. Seu dia favorito é meu
aniversário? Isso não foi ele me chamando de fofa ou dizendo algo
mais nesse sentido. Então o que diabos isso significa? O que diabos
isso significa, droga?

Não posso falar com qualquer um dos bobões, ou até mesmo


Carter, sobre isso. Também não posso entrar no Skype e conseguir
informações de Laila por causa da diferença de fuso horário. Esta
não é uma conversa digna de e-mail; exige uma conversa cara a
cara.

Eu não tenho ninguém.

Então…

Não vou mencionar isso e possivelmente tornar a nossa


amizade estranha até que possa descobrir como devo lidar com o
que ele disse e o que pode significar.

“Um segundo, Sassy Pants”, digo enquanto viro a fechadura.


Eu mal abro a porta quando seu rosto sorridente me cumprimenta.
“Oi.”

“Princesa”, ele diz com um longo piscar de olhos quando


empurra a porta e desliza para dentro.

Ele tira os sapatos no instante em que chuta a porta. Antes


mesmo de trancá-la, ele está subindo na minha cama e se
apoiando contra a cabeceira. Minha mente diz: “Perigo!” Mas meus
ovários gritam: “Nua! Agora!”

Em vez disso, faço o que qualquer amigo teria feito: pulo na


cama como se ele aparecer no meu quarto no meio da noite não

MARIANA ZAPATA
fosse grande coisa, e sento de pernas cruzadas ao lado de onde ele
sentou.

Com o rosto limpo, ele empurra as mechas negras para trás


antes de esfregar um dos lados da cabeça raspada. “Pensei que
você estaria dormindo essa hora.”

“Ainda estou tentando relaxar.” Além disso, ele bateu na porta


tão alto que teria me acordado mesmo se eu tivesse desmaiada,
mas guardo isso para mim mesma. “O que você está fazendo
acordado?”

“Não consegui dormir, e não estou com vontade de escrever


nada esta noite.”

Levanto as sobrancelhas. “Escrevendo seu próximo álbum?”

Ele assente. “Essa turnê é do último álbum que temos com


nossa gravadora e nosso contrato acaba em exatamente um ano;
queremos lançar outro álbum no dia seguinte ao fim. Quero
começar as músicas agora.”

“Vocês vão gravar de forma independente?”

“Sim. Tenho certeza de que depois teremos que processar


nossa gravadora pelos royalties atrasados que nos devem.” Ele
estremece.

Faço uma careta que espelha a sua.

“Vai ficar tudo bem”, ele me assegura.

“Tenho certeza que vai.”

Ele balança a cabeça, esfregando a lateral novamente


enquanto seus olhos se desviam para o pedaço da minha cabeça
que encontrou a máquina de aparar de Carter semanas atrás.
Sacha levanta o queixo. “Você está planejando raspar de novo?”

“Não. Tenho sorte se conseguir dois cortes de cabelo em um


ano; manter isso é demais. Vou parecer ridícula até que volte a

MARIANA ZAPATA
crescer. E é provavelmente um corte de cabelo muito moderno para
mim de qualquer maneira. “

“Você é estilosa.” Ele sorri. “A maior parte do tempo.”

Eu meio que engasgo, mas ainda rio. “Oh, obrigada por um


elogio tão incrível.”

“É para isso que estou aqui.”

Reviro os olhos de brincadeira, colocando as costas contra a


cabeceira da cama. “Às vezes sinto que te conheço por toda a
minha vida, e outras vezes, me pergunto o que diabos estou
pensando tentando ser sua amiga.”

O sorriso que toma conta de sua boca me surpreende. “Penso


o mesmo sobre você. Como seria minha vida? Se você não tivesse
me chutado na bunda?”

Aperto os olhos e gemo, ganhando uma gargalhada em


resposta do cara ao meu lado.

“Nunca conheci alguém com quem me senti tão confortável


tão rápido”, ele diz como se não significasse nada.

Por que ele tem que ser tão doce? Empurro essa pergunta
para a parte de trás do meu cérebro e sorrio para ele, apreciando
suas palavras. “Sou exigente com meus amigos, sabe.”

“Então devo me sentir honrado por ser seu melhor amigo?”


Ele pergunta, levantando uma sobrancelha escura enquanto um
sorriso bobo e torto cobre seus lábios.

Não posso deixar de bufar. “Somos melhores amigos?”

Ele senta um pouco mais ereto, assentindo com o mesmo


sorriso ridículo em seu rosto. “Para dizer o mínimo.”

Quero me concentrar em suas palavras, mas estou com muito


medo, e balanço as sobrancelhas para ele. “Quantos anos eu
tenho?” Pergunto, sabendo que ele não tem ideia.

MARIANA ZAPATA
“Vinte e três?” Ele pergunta, contraindo um olho.

“Você está demitido. Tenho vinte e seis.” Zombo, apertando


sua coxa em resposta. “Qual é a minha cor favorita?”

Ele faz outra careta. “Azul?”

“Como você sabia?”

“Você está sempre vestindo azul”, ele se gaba com uma


piscadela. “Qual você acha que é minha cor favorita?”

Eu olho bem no fundo dos olhos dele. “Rosa, duh.”

Ele pisca os longos e negros cílios, uma e outra vez. “Você tem
alguma ideia de como é fácil amar você?”

Não há como responder a isso. Além disso, ele está brincando.


Quero dizer, ele está brincando, certo? Em vez de correr o risco de
dizer algo do qual me arrependa mais tarde, estendo a mão e tento
acertá-lo na testa, mas ele segura minha mão. Tento puxar de
volta, mas quase me dou um soco no rosto. Eu faço uma careta.

“O que você mais gosta de ouvir?” Pergunto, imaginando que,


como estamos nos conhecendo um pouco mais, eu posso
aproveitar.

“Você sabe, eu não tenho nada específico”, ele responde,


franzindo os lábios. Típico para um músico responder. “Eu gosto e
odeio tudo. Eu posso ouvir qualquer coisa desde que seja boa. E
você? Kidz Bop?”

Jogo minha cabeça para trás e rio. “Oh sim, estou tão feliz
que você me contou como era cativante.”

Sacha sorri e faz um ruído divertido e gentil em sua garganta


que soa fracamente como um bufo enquanto agita os cílios grossos
e longos em minha direção. “Vou te mandar o resto da minha
coleção quando chegar em casa”, ele me provoca. Quando sorrio
para ele, sua expressão suaviza e seus olhos piscam para as

MARIANA ZAPATA
minhas mãos. “Você não esteve com mais ninguém desde que você
e Brandon se separaram?” Ele pergunta abruptamente.

A questão meio que me joga em um loop já que não estou


esperando nada disso. Mas aquele vazio que sentia pelo meu ex
está entorpecido e tão insignificante que não consigo me
incomodar de lembrar de algo sobre ele que costumava significar
algo para mim. “Não”, respondo a ele simplesmente. “Por u tempo,
achei que meu coração estava partido. Depois fiquei muito
chateada e deprimida com a vida para me preocupar com qualquer
coisa além da faculdade por um tempo. Agora, estou apenas
cuidando do meu próprio negócio, aproveitando a turnê,
aproveitando para ser a capitã do meu destino por um tempo. “

E tendo uma paixão enorme por você que desafia todo o


sentido, penso.

Ele assente pensativamente. “Sem arrependimentos, então?”

“Nenhum.” Essa é a verdade. “Tudo acontece por um motivo,


e sei que as coisas não teriam funcionado entre nós a longo prazo,
você entende o que quero dizer?”

“Sim”, ele responde com uma voz suave. “Minha última


namorada, Liz — você a conheceu em São Francisco, lembra?”
Como posso esquecer? Concordo e sinto uma ânsia subir e consigo
controlar, mas felizmente sua atenção está em suas mãos, em vez
das caretas que estou fazendo. “Ela terminou comigo porque
odiava que eu viajasse o tempo todo. Ela queria que eu a
escolhesse sobre minha música, mas...” Aqueles olhos cinza
encaram os meus, “...não sei. Não parecia a coisa certa a fazer. Eu
não quero fazer isso. Ela sabia antes de começarmos a namorar o
que eu fazia para viver; não foi uma surpresa. Eu não quis
namorar ninguém desde Liz, porque não quero ficar preso nesse
tipo de relacionamento novamente, eu acho.”

A ideia de que alguém, especificamente Ronalda, pediu a


Sacha para desistir de seu sonho e seu incrível talento para ficar
menos sozinha, faz meu coração se agitar. Seu dom não merece

MARIANA ZAPATA
desaparecer, e essas razões egoístas me irritam. “Acho que alguém
que realmente te ama não pediria para desistir do que você ama,
que é o que você está destinado a fazer.” Digo a ele com uma voz
tão irritada que me choca.

Ele sorri para mim e assente. “Eu concordo, Princesa.”

“Eu te encontro em vinte minutos”, Sacha sussurra em meu


ouvido quando estamos saindo da van depois de um jantar tardio
em Geelong.

É uma decisão mútua tomarmos banho antes dele vir para o


meu quarto todas as noites, embora eu adoraria se ele tomasse
banho no meu quarto. Comigo.

Não que eu faria a oferta em voz alta, mas não há nada de


errado em simplesmente pensar sobre isso. Naquela noite em
Perth, que ele ficou até as cinco da manhã, foi o começo. Depois
foram cinco noites consecutivas sentada no meu quarto com um
homem bonito, recém banhado, delicioso e cheiroso.

Infelizmente e sem surpresa, tudo é sempre muito inocente.


Nós sentamos na cama, conversamos muito, assistimos televisão
e irritamos um ao outro contando o que gostamos e não gostamos.
Quando digo a ele que vi My Girl cerca de um milhão de vezes, ele
revira tanto os olhos que fico com medo que aquelas lindas íris
fiquem lá. Quando ele me diz que viu todos os filmes Transformers
no cinema pelo menos seis vezes, e até sentou na fila por vinte e
quatro horas para assistir a première de um deles, olho para ele
sem expressão.

A coisa que mais me mata na nossa amizade é que quanto


mais aprendo sobre Sacha, mais gosto dele. Gosto de saber que ele
é voluntário em um abrigo para animais de estimação, que sabe
como tocar quatro instrumentos diferentes, e que tem uma
tartaruga de estimação chamada Mercury que o irmão de Julian
toma conta quando estão em turnê. Acho incrível que trabalhe em

MARIANA ZAPATA
um estúdio como pianista e backing vocal quando está em casa. O
bastardo é doce e atencioso, e ri das minhas piadas e minhas
histórias embaraçosas.

Este enorme e cegante incêndio florestal de felicidade enche


meu peito quando estou perto dele. Enquanto deveria ser lindo que
gosto tanto dele, não é. Não tenho ideia de como as coisas estão
entre nós. Nós definitivamente somos amigos; isso é óbvio. Eu
adoro passar tempo com ele porque tem esse jeito que sempre me
deixa de bom humor, mas…

Não tenho certeza se há algo mais. Nossa brincadeira pode ser


considerada flertar. Ele passa mais tempo comigo do que com
qualquer outra pessoa. Quando estamos nos shows e ele não está
ocupado, vem visitar o stand de vendas, mesmo que tenha que
usar um moletom com capuz para evitar o assedio dos fãs.

Isso, nós, é tão complicado.

Eu não quero assumir nada, então não faço. Afinal, ele


mencionou Ronalda como sua ex, mas não posso deixar de lembrar
daquela conversa que ouvi. Então houve o comentário dele quando
estávamos no carro na Filadélfia sobre como havia dito a ela algo
sobre não ser o momento certo para falar sobre o que quer que
fosse. Há algo mais que pode estar acontecendo? Eu não tenho a
menor ideia, e com certeza não vou perguntar.

Empurro esses pensamentos para fora da minha cabeça, vou


para o meu quarto e tomo banho o mais rápido possível para poder
estar pronta para o meu visitante noturno. É um pouco
desesperado? Talvez. Mas não me importo. Não é como se alguém
estivesse me vendo.

A batida na minha porta vem apenas alguns minutos depois


que termino de passar creme em toda a minha pele. “Qual é a
senha?” Pergunto andando em direção à porta.

“Gaby é a princesa do universo.”

MARIANA ZAPATA
Dou risada. Minhas mãos param na fechadura enquanto
sorrio para mim mesma. “Eeeeeee...?” Pergunto só para ser
irritante. Como se o que ele disse não fosse suficiente.

Há uma pausa. “Eu tenho biscoitos.”

“Bingo!” Destranco a fechadura e nem sequer me incomodo


em cumprimentar Sacha. Ele faz sua rotina habitual, tirando os
sapatos, o moletom e caindo no seu lado da cama.

Ele joga um pacote de biscoitos que provavelmente comprou


na máquina de venda automática. “Guarde metade para mim”, ele
pede docemente, balançando a bunda no colchão para tentar ficar
confortável.

Concordo, já rasgando o pacote antes de pular do outro lado


da cama. Tenho que rastejar com os biscoitos na minha boca até
um ponto bem no meio da cama, onde cruzo as pernas. Ele olha e
gesticula para um ponto ligeiramente mais perto dele. “Venha me
manter aquecido.”

Ele poderia colocar uma jaqueta, mas não vou lembrá-lo


disso.

A pequena parte do meu cérebro que ainda não reconheceu


que ele é meu amigo e só meu amigo, quer dizer-lhe que se ele
quiser, posso rastejar sob os lençóis, mas só alguém com um QI
de 20 diria isso a ele.

Eu também poderia mexer no termostato do quarto, mas...


não.

Pensando agora, o que eu deveria ter feito era abaixar a


temperatura ainda mais para poder lhe dar uma razão para
abraçar. Não fiz isso também.

O que eu faço é me aproximar. Tão perto que ele coloca a mão


no meu joelho. Olho para sua mão e mantenho a boca fechada,
apesar de saber quão estúpido é.

MARIANA ZAPATA
Sacha troca os canais com uma mão ao mesmo tempo em que
a outra acaricia meu joelho enquanto como os biscoitos de
baunilha que ele trouxe. Estou mais focada em seus longos dedos
esfregando minhas pernas cobertas do que no filme que ele
colocou.

“Você tem algum protetor labial?” Ele pergunta um segundo


depois.

Aponto minha cabeça em direção a mochila, que está no chão


ao lado dele. “Bolso superior”, respondo da maneira mais gentil
que posso, sem cuspir migalhas por todo o lugar.

Ele balança a cabeça, alcançando a beira da cama para pegar


minha mochila e a coloca no colo para procurar. O bolso superior
é aberto e ele para, olha para o que quer que esteja segurando e
faz uma careta. “O que é isso?” Ele pergunta, segurando alguma
coisa.

Engasgo em cima dele. Literalmente. Migalhas ficam em toda


a sua camiseta e calças, mas não consigo encontrar em mim uma
merda de desculpa quando reconheço o que ele segura.

Meu pequeno vibrador, que parece com um batom feito de


metal, está na palma da mão dele. Comprei enquanto ainda
estávamos em Darwin no dia seguinte a partida de Perth, em um
passeio com Carter, quando não tínhamos nada para fazer no local
do show por horas. Eu o abandonei na loja de música enquanto
corri para a loja ao lado e comprava meu novo amigo.

“Desculpe!” Engulo em seco, tentando limpar seu peito. Há


pequenos pedaços de biscoito por toda a sua camisa cinza. Pego o
pequeno vibrador da mão dele, enfio sob a coxa e começo a tirar
os farelos de sua roupa.

Ele ri e encolhe os ombros, tirando pedaços também,


colocando os maiores em sua boca. “É o que eu acho que é?” Ele
pergunta em voz baixa e divertida.

MARIANA ZAPATA
“Batom? Sim”, minto, mantendo os olhos em sua camiseta
enquanto acabo de tirar as migalhas restantes.

Sacha cutuca meu joelho. “Mentirosa.”

“Você é um mentiroso”, murmuro.

“Sou?” Ele pergunta na mesma voz que usou com sua última
pergunta.

Eu lentamente arrasto meus olhos para suas íris cinzentas.

“Sim.” Minha pele coça de repente. “Seu passaporte diz que


você é um homem, mas você é uma mulher na verdade.”

“Gaby”, ele geme, tentando disfarçar sua risada. “Você está


causando um complexo em minha masculinidade.”

Agradeço ao senhor que não tenho mais biscoitos na boca


quando ele usa a palavra masculinidade.

Olhando para ele, vejo que seus olhos estão apontados para a
perna em que escondi o vibrador. Então ele olha para mim e juro
que suas pálpebras parecem pesadas.

Três horas depois, quando começo a balançar com o sono, ele


puxa os lençóis da minha cama. “Vou embora. Tranque a porta
quando eu sair, antes de adormecer”, ele sussurra, e então me
beija na ponta do nariz.

Sim, de repente eu não estou mais tão sonolenta.

“Qual é a senha?”

“O aniversário de Gaby deveria ser um feriado nacional.”

Sorrio como uma idiota, e felizmente, estou no meu quarto


sozinha para que ele não possa ver meu rosto. Tem que haver um
limite para o tanto que minhas bochechas esticam em tão pouco
tempo. “Eeeee?” Pergunto, no que se tornou o nosso jogo.

MARIANA ZAPATA
Ele ri do outro lado da porta. “Comprei um livro para você.”

Meu sorriso aumenta exponencialmente enquanto abro a


porta para deixá-lo entrar. Ele mal consegue entrar antes de
chutar a porta e colocar uma mão em cada uma das minhas
bochechas. Eu não o vi o dia todo.

Quando Eliza me acordou naquela manhã para tomar café,


batendo os punhos na porta na batida de uma música da Ghost
Orchid, meu primeiro pensamento foi: eu me sinto uma merda.
Meu corpo doía, eu estava com uma febre furiosa e me sentia como
uma porcaria. Eli levou-me ao médico, onde me disseram que
havia um vírus por aí e que eu poderia ter pegado de alguém.
Acabei ficando no meu quarto com meu irmão durante a maior
parte do dia até que ele foi de táxi para o show dessa noite.

“Eu não acho que você deveria estar aqui. Não quero te deixar
doente”, aviso.

Ele revira os olhos, sem tirar as palmas das mãos do meu


rosto. “Eu não fico doente. Vou ficar bem. Você ainda está se
sentindo uma merda?” Ele me pergunta baixinho.

Balanço a cabeça, olhando diretamente em seus olhos


brilhantes. “Sim.”

Ele se inclina para frente e examina meu rosto. “Estive


preocupado com você o dia todo. Mason não nos disse que você
estava doente até que estávamos no meio do caminho para o show.
Só pensei que você e Eli tinham ido fazer algo juntos.”

“Você perdeu a visita ao médico e a sopa mais saborosa que


já comi”, sorrio para ele.

Sacha me dá aquele sorriso torto que eu gosto. “Uma festa


animal.” Suas mãos roçam meu pescoço e descansam em meus
ombros. “Quer que eu vá buscar algo para você?”

MARIANA ZAPATA
Nego e gesticulo em direção aos sacos na mesa de cabeceira.
“O bebê de Rosemary me trouxe um sanduíche e suco quando
vocês chegaram, mas obrigada.”

Não sei porque toda vez que eu agradeço ele sorri. Sempre.
Ele coloca a mão atrás do seu corpo por um segundo, seu cotovelo
balança no ar, antes de me entregar um livro. “A moça da livraria
disse que, como você é uma nerd da história, provavelmente vai
gostar”, ele diz, colocando o livro na minha mão estendida.

Memórias de uma gueixa é o título.

Jogo meus braços ao seu redor e lhe dou o abraço mais fraco
que eu normalmente daria, ligeiramente sorrindo para ele me
chamando de nerd da história. Gosto de ficção histórica,
especialmente porque não tive muito tempo de ler enquanto estava
na faculdade. “Obrigada.”

Sacha passa os braços pelo meu corpo e me aperta com força


suficiente para compensar a minha fraqueza. “De nada.”

“Você é o homem mais legal que já conheci. Não me importo


com o que alguém diz sobre você. “

Ele ri levemente, esfregando minhas costas. Nos separamos


depois de um minuto, e então ele tira os sapatos e deita no lado da
cama que não contaminei ainda. “Então você pegou um vírus,
hein?” Ele pergunta, abaixando seus longos braços abertos sobre
o colchão.

“Um grande e fedorento vírus”, digo a ele, mostrando minha


língua. “Devo estar melhor depois de amanhã, provavelmente.”

Ele faz uma careta enquanto coloco meu presente em cima da


mochila. “Isso é uma droga”, ele responde, me observando. Um
lento sorriso aparece em suas bochechas. “Pobre bebê doente.”

Bufando pateticamente, tomo um gole da garrafa de água que


tenho na mesa de cabeceira antes de me jogar na cama ao lado
dele. Eu me esparramo no colchão queen-size, o que não diz muito

MARIANA ZAPATA
já que não tenho exatamente a altura de uma supermodelo. “Tome
isso.”

“Tome o que?” Ele ri.

“Minhas bolas invisíveis”, eu rio, virando a cabeça um pouco


para encará-lo.

Ele está sentado na cama enquanto estou deitada. “Eu me


esqueço dessas coisas.” A mão mais próxima a mim estende para
agarrar meu antebraço. “Eu vejo essa garota que geralmente é
linda para caralho e a última coisa que espero é que ela tenha um
par de bolas sob suas roupas”, ele ri.

Eu absorvo seu elogio por uma fração de segundo. “Espere


um segundo. O que você quer dizer com “geralmente”?”

“Você está doente”, ele explica, com voz divertida, ignorando


a minha pergunta sobre o apelido.

“Então você está me dizendo que pareço uma merda?” Eu


finalmente rio, apesar da dor aguda na garganta, nem um pouco
insultada pelo que ele está sugerindo. Não há como eu não parecer
do jeito que me sinto, uma pilha grande e velha de cocô.

Sua palma acaricia meu braço. “Você não está exatamente no


seu melhor, Princesa, mas você ainda é bonita”, ele oferece.

Bato em sua mão e rio, tentando me afastar dele.

Sacha ri mais alto, deslizando um braço sob o meu corpo e


me puxando. Metade do caminho até ele. “Pare de pescar elogios.
Você ainda é bonita.” Ele me esmaga em seu peito saltitante e
entretido. Seu outro braço termina o círculo ao meu redor, meus
seios pressionados contra suas costelas, o lado da minha cabeça
encontrando seu peito.

“Tudo o que eu ouço é blah, blah, blah”, dou risada contra o


material macio de seu moletom com capuz vermelho, ignorando as
sirenes que saem da minha cabeça e o jeito que meu coração bate

MARIANA ZAPATA
de repente com a proximidade dele. Não é isso que amigos fazem.
Isso não é absolutamente o que amigos fazem. Mas eu com certeza
não estou me movendo ou dizendo algo para arruinar o momento.

Ele me aperta mais forte. “Você é uma dor na bunda.”

“Olha quem está falando.”

“Você não deveria estar dormindo ou algo assim? Não é isso


que as pessoas fazem quando estão doentes?”

Balanço a cabeça contra ele. “Sim, mas tem esse cara chato
que gosta de vir no meu quarto e me manter acordada todas as
noites.”

“Que idiota”, ele zomba, balançando a cabeça quando diz


isso.

“Eu sei, certo?” Rio.

Sacha inclina a cabeça para baixo, de modo que seus lábios


estão tão perto da minha testa que posso sentir seu calor. “Quer
que eu vá embora?”

Como se houvesse outra resposta possível. “Não.”

Ele não diz nada, mas sinto que começa a se mexer na cama.
“Vou esperar até você começar a adormecer, então.”

“Ok.”

Ficamos sentados em silêncio, com a televisão tão baixa que


soa como um sussurro no fundo, até que, “Silêncio, bebezinho, não
diga uma palavra...”

“O que você está fazendo?” Começo a rir com voz rouca.

“Estou cantando uma canção de ninar para você dormir”, ele


diz.

MARIANA ZAPATA
Eu me mexo um pouco em seus braços, me aconchegando em
seu calor e ignorando a voz em minha mente que diz que amigos
realmente não fazem esse tipo de coisa. “Ok, continue.”

Seu peito se move com uma risada silenciosa. “Sacha vai te


comprar um passarinho...” Bufo, tentando segurar uma risada.
Seu peito treme mais, mas não perde o ritmo da música. Se
acontece alguma coisa é que sua voz doce e bonita fica um pouco
mais alta. “E se aquele passarinho não cantar, Sacha vai te
comprar um anel de diamante.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 18

“Flabbs, por que você não se veste assim?” Mason pergunta.

Estamos sentados em um bar de karaokê por quinze minutos.


Metade dos caras na mesa está olhando para as mesmas duas
garotas por quatorze dos quinze daqueles minutos. A outra metade
está ocupada bebendo o máximo de cerveja que podem o mais
rápido possível. Hoje é o aniversário de Julian, e o cara
aparentemente tem uma relação amorosa e saudável com o
karaokê. Vai saber.

Eu nem sequer me preocupo em olhar na direção das duas


mulheres, porque já as chequei dez minutos atrás. Em saias que
mostram mais bunda do que as minhas roupas íntimas, e blusas
com decotes tão profundos que fico surpresa pelos mamilos não
estarem à mostra, estou completamente desinteressada. Se eu
quiser olhar para peitos, olho para Lucy e Ethel no espelho.

“Como uma prostituta?” Pergunto a ele, tomando um gole de


água.

Mason se inclina para mim do seu lugar à minha direita e


assente. “S-i-m”, ele praticamente sussurra com muito
entusiasmo.

Sacha, que está a dois lugares, ao lado de Carter, que está à


minha esquerda, olha para mim com um sorriso no rosto. O fato
dele ser um dos poucos que não checa as duas garotas seminuas
não me escapa. É o seu sorriso que alimenta meu fogo ridículo.
“Você sabe que saí dessa vida há muito tempo.”

Os caras mais próximos a nós começam a rir, e Mason puxa


a ponta do meu rabo de cavalo antes de pegar onde estava a faixa

MARIANA ZAPATA
de cabelo e usar meu cabelo solto como um chicote. “Estou feliz
que você não se tornou uma puta”, ele diz com toda a seriedade
característica de Mason Meyers.

Inclinando a cabeça para olhar para meu velho amigo, bato


suavemente na sua garganta, fazendo-o engasgar. “Eu não pude.
Você roubou meu lugar.”

“Babaca”, ele ri, puxando meu cabelo mais uma vez.

Eli volta para a mesa naquele instante, carregando uma


grande tigela de vidro entre as mãos. Quando estávamos
debatendo o que fazer para celebrar o aniversário de Julian e o
karaokê era a única coisa que o rapaz de vinte e oito anos queria,
concordamos que cada pessoa escrevesse uma música que
queríamos ver apresentada. Tinha que ser uma música entre as
quarenta mais tocadas em algum momento da história recente. O
problema é que havia alguns de nós — inclusive eu — que não
sabiam cantar, então o consenso é que poderíamos formar duplas,
se quiséssemos. Qualquer um poderia ir várias vezes.

“Escolha seu destino, cadelas”, Eli grita, colocando a tigela


no meio das duas mesas que juntamos.

Em pouco tempo, enchemos a tigela com pedaços de papel


com títulos de músicas. Carter, meu parceiro desde o momento em
que os duetos se tornaram uma possibilidade, gesticula com a
cabeça para eu escolher nossa música. Nós concordamos em
acabar com isso primeiro. Cada pessoa ou equipe — há apenas
outra dupla formada por dois funcionários do TCC — escolherá um
papel quando a música acabar, para manter as escolhas uma
surpresa.

“Vamos ver o que vamos cantar”, começo a dizer a Carter


quando abro o bilhete para ver “Baby” de Justin Bieber escrito lá.
“Droga, Eli!”

Meu gêmeo sorri. “Como você sabe que fui eu que escolhi essa
música?”

MARIANA ZAPATA
“Mamãe”, gemo. É a música que ele salvou como seu toque
pessoal no telefone da nossa mãe quando ele liga para ela. Idiota.
Algo sobre ele ser seu bebê. Como se eu não fosse tecnicamente o
bebê da família. Se isso não bastasse, posso reconhecer sua
caligrafia horrível a quilômetros de distância.

Ele joga a cabeça para trás e ri. “Oh sim.”

Carter faz uma careta e suspira. “Eu acho que poderia ser
pior.”

Eu não posso nem discordar dele. Poderia. Ele levanta para


se juntar a mim com os ombros caídos, e Julian levanta a mão
para nos cumprimentar à caminho do palco. O palco do karaokê é
um dos maiores que já vi, mas não deixo que isso me intimide. O
cara que trabalha ao lado do palco nos pergunta qual música
queremos cantar e quando contamos, ele sorri, mas concorda,
entrega dois microfones e acena. Meu irmão já falou com ele sobre
nosso grande grupo, e concordamos em revezar com as outras
pessoas no bar.

“FLABBY!” Meu irmão berra da mesa.

Eu posso ver todos rindo quando a música começa e as letras


aparecem na tela atrás de nós. Olho para Carter e dou um tapinha
nas costas dele. “Lembre-me de nunca mais fazer isso a menos que
tenha bebido”, digo a ele, afastando o microfone do meu rosto.

Ele sorri e acena com a cabeça. “Lembre-me de nunca mais


fazer isso, ponto final.”

Essa é uma ideia ainda melhor. Engolindo em seco, aponto


para o aniversariante na plateia e digo: “Feliz aniversário, Julian!”

Então nós começamos.

Eu começo a cantar e Carter segue no refrão. Nós terminamos


apenas um quarto da música até eu começar a rir tanto que não
consigo cantar junto. O resto do nosso desempenho é apenas uma

MARIANA ZAPATA
bagunça desajeitada de nós resmungando, e os caras nos
importunando.

“Eu quero ser seu bebê, Carter querido!” Esse é Eliza.

“Seja minha, Gaby!” Mason gargalha.

Quando finalmente terminamos, agradecemos e saímos do


palco. Algumas pessoas que eu não conheço jogam suas mãos para
nos cumprimentar enquanto caminhamos de volta para a mesa.
Os caras começam a assobiar quando nos aproximamos, e sento
na antiga cadeira de Carter para estar ao lado de Sacha.

“Quão ruim foi?” Pergunto a ele. Meu rosto está tão quente
que tenho certeza que estou corando.

Ele está sorrindo de orelha a orelha. “Você não é ruim, mas


eu não planejaria lançar um álbum solo tão cedo”, ele ri. “Ou
nunca.”

“Idiota.” O cutuco no lado e sorrio. O mesmo pensamento que


estou lutando nos últimos dias passa pela minha cabeça. Sacha
realmente gosta de mim? Meu raciocínio dedutivo diz que as
chances são altas, mas ainda estou com muito medo de ser a
primeira a dizer alguma coisa. Dizer qualquer coisa.

Mason sobe alguns minutos depois quando ninguém mais se


aproxima do palco e canta junto com “I Kissed A Girl”, é horrível,
mas engraçado o suficiente para me fazer chorar. Mas é quando
meu irmão sobe para cantar “My Heart Will Go On” e, em vez disso,
decide começar a despir-se no meio do caminho que fica ridículo.

“Tira!” Julian grita.

Eli começa a tirar sua camisa, o que me faz gritar: “Coloque


de volta! Vista novamente!”

Eu não acho que é intencional por conta da música, mas sinto


que Sacha coloca o braço em volta da parte de trás da minha
cadeira. Eu me viro para olhar para ele por cima do meu ombro e

MARIANA ZAPATA
lhe dou um pequeno sorriso tímido. Ficamos assim durante as
performances de Julian e depois de Miles, até que Sassy decide
que é a vez dele.

Algo quente pressiona contra o meu ombro nu quando ele


puxa a cabeça para trás, e eu sei, eu sei que ele me beijou lá. Puta
merda. Um momento depois, ele puxa um pedaço de papel da tigela
e sobe ao palco, balançando a cabeça o tempo todo. É quando a
abertura de “Since U Been Gone” começa que quase me mijo. É a
música que eu escolhi.

Para surpresa de ninguém, e felizmente para nossos ouvidos,


Sacha atinge as notas altas sem nenhum problema. Ele faz uma
reverência para a plateia de pessoas que estão ocupadas batendo
palmas e gritando em reconhecimento ao fato dele não ser
desafinado. Quando ele volta para a mesa, retoma sua posição no
banco com o braço ao redor das costas da minha cadeira, mas
mais perto do que antes. Ele se inclina para frente espelhando
minha postura. Eu não me atrevo a me mexer. Está escuro o
suficiente para que ninguém possa vê-lo pressionar seus lábios
contra o mesmo lugar que já havia beijado antes.

Eu estremeço e não digo uma palavra. Mas me aproximo dele.

Ficamos assim em silêncio até que chega sua vez de ir


novamente após a versão de Gordo de uma música do Red Hot
Chili Peppers. A escolha de “Tubthumping” por Julian faz com que
Sacha e meu irmão subam ao palco e se juntem a ele por um
minuto.

Ainda há mais alguns papéis na tigela quando ele termina.

“Eu acho que você deveria começar uma banda de tributo ao


Chumbawamba”, digo quando ele senta ao meu lado.

Ele desliza o braço sobre as costas da minha cadeira mais


uma vez, liso como seda. “Eu vou fazer isso depois de terminar
meus shows de Vanilla Ice.”

MARIANA ZAPATA
“Oooh, isso teria sido bom para colocar na tigela. Eu gostaria
de ver sua pequena bunda lá em cima tentando cantar Ice, Ice,
Baby”, eu rio.

Seus olhos se estreitam. “Você acha que tenho uma bunda


pequena?”

Estou em terreno perigoso e sei disso. Mas foda-se. Eu nunca


vou saber a menos que tente, certo? O que tenho a perder além da
minha dignidade? “Não. Eu acho que você tem uma bunda ótima.”

Aqueles olhos pálidos ficam ligeiramente abertos, mas ele não


diz nada. Simplesmente olha para mim. E então ele se inclina para
frente e pressiona seus lábios quentes e cheios contra aquele ponto
no meu queixo que termina no meu ouvido. Sua boca permanece
ali, os lábios na pele, quente no liso.

Seu telefone acende. Ele está colocado em cima da mesa o


tempo todo, e olho para baixo em um torpor do beijo mais íntimo
que já ganhei. O que me distrai não é que ele tenha recebido uma
mensagem de texto de sua mãe, mas o fato de que o fundo de tela
é uma foto minha que ele tirou no café da manhã alguns dias atrás,
quando empurrei dois pedaços de guardanapo em meu nariz
porque estava escorrendo.

Não há nenhum traço de constrangimento ou medo em seus


olhos quando nossos olhos se encontram.

“Então o que está acontecendo com você e seu namorado?”


Eli me pergunta logo antes de enfiar uma garfada de ovos na boca
durante o café da manhã na manhã seguinte.

Eu faço uma careta na direção do meu prato antes de lançar


um olhar para cima encontrando os olhos de Gordo em mim, um
sorriso no rosto.

“Mason?” Pergunto, voltando para a minha comida.

MARIANA ZAPATA
Eli fez um ruído de engasgar, me acertando com força nas
costelas. “Eu não vou entrar em detalhes sobre o quão perturbador
é eu dizer ‘seu namorado’ e você automaticamente pensar em foder
Mase.”

“Ele está sempre me chamando de noiva, ou dizendo às


pessoas que eu não sei quando vamos nos casar”, respondo,
acotovelando-o de volta tão forte quanto ele me acertou. É
parcialmente verdade... mas principalmente, não quero falar sobre
o homem que beijou meu ombro horas atrás.

“Eu amo Mase, mas o inferno vai congelar antes de vocês


ficarem juntos”, ele murmura.

Eu bufo, mordendo meu biscoito. “De quem diabos mais você


estaria falando?” Eu pergunto, mas já sei. Oh, sei muito bem que
ele está se referindo a Sacha.

Gordo ri do outro lado da mesa antes de colocar as mãos em


sinal de rendição quando olho para ele. “Eu não disse nada.”

“Sacha, Flabby. Sacha. Seu namorado. Seu cobertor de


orelha.” Eliza finalmente responde.

De repente, o biscoito meio comido no meu prato precisa ser


comido imediatamente. Enfio o pedaço inteiro na minha boca para
evitar a conversa que meu irmão está tentando começar. Tive
conversas sobre garotos com Eli no passado, e elas nunca
terminaram — ou começaram — bem. “Não há nada acontecendo
entre nós. Nós somos apenas amigos.”

Porque nós somos.

Eli faz um barulho que soa como “hummph” no fundo de sua


garganta. É incrédulo e desacreditado. Então ele faz uma pergunta
para provar, voltando sua atenção para seu companheiro de
banda. “Gordo, você acha que sou cego?”

Gordo sacode a cabeça.

MARIANA ZAPATA
“Gaby, você acha que sou cego?” Ele pergunta.

“Não cego, apenas burro.” Sorrio.

Ele me lança uma carranca. Um momento depois, ele joga o


braço sobre meus ombros e começa a empurrar seu prato para
longe com a mão livre. “Flabby Gaby, esse garoto está apaixonado
por você.”

Apaixonado.

Por mim?

Eu me inclino para frente e tento cheirar sua respiração.


“Você ainda está bêbado?”

Mas meu irmão continua falando antes que eu possa


continuar. “Qualquer um com olhos e ouvidos sabe que aquele
cara pensa que você faz cocô de cereais Lucky Charms.”

Gordo e eu desatamos a rir.

“Isso é uma coisa boa?” Pergunto a ele.

Eliza empurra meu rosto para longe com a palma da mão,


ignorando meu comentário novamente. “E eu acho que você o ama
também.”

O barulho que sai da minha boca soa como um híbrido “moo”


e grito ao mesmo tempo. “Eu”, fecho a boca antes de abri-la
novamente com um ruído. “O que? Nós nem sequer, nós nem
sequer...”

Isso não ajuda a situação porque Eli joga a cabeça para trás
e ri no fundo da sua garganta. Aquela gargalhada enorme que pode
causar um terremoto. “Gaby, lembra quando jurou que estava
apaixonada por Reiner Kulti? Mas você nunca o conheceu? Se ele
tivesse aparecido na nossa porta, você teria vendido sua alma ao
diabo para estar com ele.”

MARIANA ZAPATA
Concordo porque é a porra da verdade. Se isso acontecesse
agora, eu chutaria o ícone do futebol aposentado para o meio-fio,
mas há dez anos? Eu teria sido totalmente uma mãe adolescente.

“Você lembra do dia em que estava doente?” Gordo me


pergunta com sua voz calma do outro lado da mesa. Quando
concordo, ele continua: “Ele pareceu infeliz o dia inteiro. Ele ficava
perguntando a cada hora se verificamos você. Se alguém tinha
certeza que você tinha algo para comer. Blá,blá,blá.”

As palavras se fixam na minha pele, meus poros os


absorvendo lentamente.

“E ele está sempre falando de você. ‘Gaby disse isso, Gaby


disse aquilo’.”

Eli balança a cabeça em desgosto. “O que me matou foi que


alguns dias atrás, a garota...”

“Aquela garota!” Gordo exclama, sabendo exatamente de que


garota meu irmão está se referindo.

“Aquela garota...” Eli coloca as mãos na frente do peito,


deixando espaço suficiente para que dois melões pudessem se
encaixar. “Aquela garota que parecia uma supermodelo da
Victoria's Secret veio até ele, e ela estava praticamente estuprando-
o com os olhos desde o começo. Ela disse a ele em que hotel estava,
qual número de quarto, e ele estava apenas em seu próprio mundo.
Em seu próprio maldito mundo. Como se não estivesse prestando
atenção. Quando ela saiu, todos os caras do TCC estavam tipo
‘Cara, faça isso!’ E o que ele fez? Ele encolheu os ombros.” Meu
irmão balança a cabeça como se não pudesse acreditar nas
palavras que saem de sua própria boca. “Você não ignora quando
alguém se joga em cima de você.”

Gordo assente em compreensão.

Mas meu irmão não terminou ainda. “Então Julian diz a ele:
‘Sacha, ela é tão gostosa. Vá.’ E esse cara”, ele ri, balançando a

MARIANA ZAPATA
cabeça. Eu não sei dizer se é decepcionado ou divertido. “Ele diz a
Julian: ‘Ela é gostosa, mas não faz meu tipo’.”

“Aquela garota é o tipo de todo mundo”, acrescenta Gordo.


“Até eu teria pensado em ir ao quarto de hotel dela. Você teria
ficado com ela, Flabby.”

Abro a boca para fazer um comentário sobre Gordo ficar


atraído por uma mulher pela primeira vez em sua vida, mas Eli
aparentemente precisa continuar. “E eu entendi! Entendi na hora,
e todo mundo percebeu naquele momento. O filho da puta está
apaixonado, mas depois ele confirmou quando disse: “Eu não
estou interessado”.”

Gordo parece estar na igreja quando joga as mãos no ar. “Todo


ser humano teria se interessado.”

“Então, meu ponto é, Flabby. Esse cara mais do que gosta de


você”, ele finalmente termina. “Pare de ser burra, preocupada,
todo tímida e essa merda, porque todos nós sabemos que você
realmente não é, e siga em frente.”

Eu estou vacilando. Meu coração parece que pode bater até


virar manteiga amolecida. Lembro, lembro muito bem de sua boca
no meu ombro. No meu queixo. Oh Deus.

“Eu acho que isso significa que tenho que começar a


economizar, hein?” Eliza me pergunta com um aperto no ombro.

“Para o quê?” Resmungo, ainda pensando mais sobre o que


ele disse.

“Seu casamento, estúpida. Eu pagarei pela merda do seu


casamento se você se casar com Sacha um dia.” Ele levanta o copo
de suco de laranja na direção de Gordo para um brinde. “Eu gosto
do cara.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 19

Quase esqueço que a mãe de Sacha deve vir visitar seu bebê.

Dois dias antes do final da turnê australiana, sou pega de


surpresa pela estonteante e intensa mulher que entra no local do
show enquanto ajudo Julian a montar sua bateria.

Sra. Malykhin — se o sobrenome ainda for assim, já ela e o


pai de Sacha se divorciaram, pelo que descobri — é uma mulher
fina e delicada com o cabelo igual do seu filho. Alta e magra, sua
postura é ereta. Sério, se há alguém que se parece com uma rainha
verdadeira, é ela.

Ela também fala como imagino que a realeza faz. Posso ouvi-
la do outro lado do espaço enquanto eles vêm em nossa direção.

“...teve a audácia de dizer que minhas primeiras frases são


insuficientes. Insuficientes. Eu. Você acredita na audácia?...”

Sacha responde com algo que não consigo ouvir claramente,


mas estende a mão e coloca em seu ombro enquanto o início de
um sorriso aparece em sua boca.

O “ugh” que vem do meu lado me faz virar a cabeça e olhar


para Julian, que está ocupado montando seu bumbo enquanto
toco os címbalos pela primeira vez. Como um presente de
aniversário tardio, me ofereci para ajudá-lo a se preparar de vez
em quando. Sua atenção está nas mesmas pessoas, exceto que seu
nariz está enrugado. Quando ele percebe que estou vendo sua
expressão, ele cutuca o interior da bochecha com a língua, seu
rosto sem demonstrar remorso. “A mãe dele é.…” ele para com um
sussurro, “...uma esnobe.”

“Mesmo?” Sussurro de volta.

MARIANA ZAPATA
“Sim.” Ele olha novamente para a dupla que se aproxima.
“Você verá.”

“Você está me assustando.”

“Ela é uma famosa cantora de ópera”, ele explica


rapidamente. “Em sua mente, Sach está jogando fora um talento
incrível que herdou dela e é tudo culpa nossa, ela nos deixa saber
disso cada vez que aparece.”

Faço uma careta e Julian assente.

Ele faz uma pausa antes de acrescentar rapidamente: “Não a


chame de Sra. Malykhin.”

Antes que eu possa agradecer pelo aviso, a voz feminina rouca


chama. “Olá, Julian.”

O membro do TCC estampa um sorriso no rosto enquanto


caminha para longe da bateria que está montando. “Olá, senhorita
Viktoriya.” Ele me dá um olhar de lado significativo que aceito
como um sinal. “Faz muito tempo.”

Olhando mais de perto, ela é mais alta do que aparentava ser


do outro lado do palco, deve ter quase um metro e oitenta e
definitivamente não parece ter idade suficiente para que seu filho
mais novo tenha quase trinta anos, e muito menos que tem cinco
filhos. A elegante mulher estende a mão magra na direção de
Julian. Ele pega e beija.

Literalmente. Ele beija a mão dela. Eu nunca vi visto isso


acontecer pessoalmente, e de repente me pergunto por quê.

Meus olhos disparam para Sacha, que está de pé poucos


metros atrás de sua mãe. Ele sorri para mim, abrindo a boca ao
mesmo tempo. “Mãe, quero que você conheça alguém”, ele diz
enquanto fecha a distância entre nós.

A senhorita Viktoriya vira seu corpo inteiro para me encarar.


As semelhanças entre mãe e filho são marcantes. Eles têm as

MARIANA ZAPATA
mesmas maçãs do rosto, o mesmo cinza em suas íris e o mesmo
tipo de beleza extraordinária. Toda aquela atenção e confiança
estão agora em mim, e não consigo deixar de me incomodar.

Mas Sacha, maravilhoso, deve ter percebido minha ansiedade


porque nos apresenta. “Mãe, esta é Gaby. Gaby, esta é minha
mãe.”

Droga. Ele a chamou da forma que é confortável, mas isso não


me dá uma dica se devo chamá-la de Viktoriya também ou não.

Sorrio com firmeza para a mulher e estendo minha mão em


sua direção, deixando claro — pelo menos assim espero — que não
beijarei sua mão como Julian fez, não importa quão famosa ela
seja. “Oi, é bom conhecê-la.”

Mesmo quando ela pega minha mão em um aperto que não é


hesitante de forma alguma, ela me olha de cima a baixo
discretamente. “É um prazer conhecê-la também. Ouvi muito
sobre você.”

Muito sobre mim? O que diabos está acontecendo aqui?

Sei que não estou exatamente no meu melhor, mas optei por
usar jeans em vez de moletom, e uma blusa da sessão infantil que
eu escolhi em Brisbane que tem um coala com Austrália escrito em
letras nas cores do arco-íris. Eli foi legal o suficiente para trançar
meu cabelo depois que prometi dar-lhe Tylenol para sua dor de
cabeça, como se não fosse dar a ele de qualquer jeito.

Olho ansiosamente para Sacha, que está apenas a dois


passos de distância, com uma expressão de satisfação no rosto,
sorrindo de forma radiante fazendo todo meu peito brilhar por
dentro. Não tivemos chance de conversar desde a coisa toda do
beijo no pescoço na noite anterior. Adormeci na carona para casa
e mal consegui chegar ao meu quarto intacta.

“Vamos comer. Você quer vir conosco?” Ele pergunta.

MARIANA ZAPATA
“Não posso, prometi a Carter que o ajudaria a contar as
mercadorias.”

Ele assente, mas é sua mãe que fala. “Que pena. Talvez da
próxima vez”, ela fala, mas não posso dizer se está sendo
sarcástica ou se realmente quer dizer isso.

“Sach!” Miles começa a gritar com ele da porta dos fundos.

Ele franze a testa e diz algo sobre estar de volta enquanto sua
mãe fica onde está, sua atenção em mim. No segundo que Sacha
está longe o suficiente, ela dá um passo à frente. Seu
comportamento inteiro fica sério e tenso.

“Isso é tudo o que você faz?” Ela pergunta friamente.

“Você quer dizer, vender artigos promocionais?” Faço questão


de dizer as palavras para poder entender claramente o que ela quer
dizer. Aparentemente, Sacha disse a ela o suficiente sobre mim
para que saiba que vendo as mercadorias da banda. Olho para
Julian, mas ele está ocupado fingindo mexer em seu equipamento.
Covarde.

“Sim.”

“Nesse momento, sim. Acabei de me formar. Não tenho certeza


do que vou fazer a seguir.”

Senhorita Viktoriya cantarola, me dando outra inspeção


completa. “No ensino médio?”

“Na faculdade.”

Seus cílios ridiculamente longos baixam apenas uma fração.


“No que você se formou?”

Sim, não me importo com o tom dela, e sinto meus próprios


olhos se estreitando em sua direção. “História.”

A ponta do nariz sobe cinco milímetros. “O que planeja fazer


com isso?”

MARIANA ZAPATA
Por que sinto que estou fazendo a entrevista de emprego mais
estranha e mais crítica do mundo? Bem, se ela pensa que vou me
esconder, ela vai precisar se esforçar mais. “Eu não faço ideia.”

“Entendo”, ela diz, mas não é exatamente em um tom ‘acho


que você é uma idiota’, está mais para... curiosa. Realmente
interessada. Por outro lado, talvez eu esteja imaginando tudo isso.

Olhando rapidamente para o lado, vejo Sacha voltando para


onde estamos. Aparentemente, ela também, porque a próxima
coisa que sei, é que a Srta. Viktoriya, rainha das performances de
ópera, dá um passo à frente e sussurra: “Meu menino sempre sabe
o que quer, e ele mergulha nas coisas primeiro, sem pensar.
Quebre o coração dele e vou arruinar sua vida.”

Ela se afasta com essas palavras.

“O que ela disse para você?” Julian finalmente fala quando a


cantora de ópera se vai.

Eu pisco, ainda pensando no que diabos ela quis dizer. “Eu


acho que ela apenas me ameaçou.”

Ele não parece remotamente surpreso; simplesmente inclina


o queixo para baixo. “Faz sentido.”

Naquela noite, quando ele bate na minha porta e peço a


senha, ele diz: “Gaby deveria ganhar uma medalha de ouro por
estar viva.”

Dou risada porque não tenho certeza se isso é bom ou não,


como a maioria das coisas que saem da sua boca. “Eeeee?”

“Eu tenho um presente para você”, ele diz depois de uma


risada.

“Sério, Sassy, você não precisa sempre trazer algo”, digo a


ele, abrindo a porta com um sorriso no rosto.

MARIANA ZAPATA
Ele sorri quando entra, chutando seus sapatos enquanto
empurra uma sacola amarela na minha direção. “Eu vi quando fui
jantar com minha mãe”, ele explica antes que eu abra a sacola.

“Você está me mimando”, olho para ele brevemente antes de


tirar uma pequena camiseta branca com um canguru bebê, as
palavras Call Me Joey escritas em letras verde-limão. Dou risada e
jogo meus braços em torno de Sacha uma fração de segundo
depois, apertando sua cintura. “Obrigada, Sassy.”

Sacha me aperta de volta, envolvendo os braços sobre o topo


dos meus ombros. “De nada.”

Ficamos assim por um momento, depois dois, cinco, oito


minutos. Um de seus braços se solta antes de senti-lo alisar a mão
pelo meu cabelo molhado. “Você sabe que não precisa me comprar
nada”, digo. “Eu deixaria você entrar mesmo que trouxesse apenas
mau hálito.”

Ele ri enquanto esfrega a mão livre suavemente sobre as


minhas costas. “Eu sei.”

“Ok.”

Sua mão escorrega uma polegada na parte de trás da minha


camisa, as pontas dos dedos roçando minha pele nua ao mesmo
tempo em que sua boca mergulha na minha testa. “Gosto que você
não espera que eu compre coisas, é por isso que compro.”

Algo pisca em meu cérebro, fazendo-me pensar em Ronalda e


em como Sacha puxava a cadeira para ela, e como ela ainda queria
que ele sacrificasse tudo por ela. Talvez ele tenha feito coisas assim
porque ela exigia? Empurro o pensamento para longe, não
querendo pensar nela quando estou vivendo um momento com
este homem bonito.

“Obrigada mesmo assim.” Digo a ele em voz baixa, sem fôlego.

Sacha se afasta apenas uma polegada antes de inclinar minha


cabeça para trás. Ele me dá um sorriso malicioso e sedutor. “Você

MARIANA ZAPATA
é a pessoa mais fácil do mundo para agradar”, ele respira,
beijando minha bochecha suavemente.

O fato de ele estar beijando minha bochecha e eu lidar com


isso como se não fosse um grande problema é algo que vou pensar
mais tarde, quando o momento acabar e eu não estiver mais
vivendo-o.

“Isso é uma coisa boa?”

Seu sorriso se abre novamente, em um que me faz pensar em


um segredo. “É uma ótima coisa.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 20

Sacha me cutuca na lateral. “Fique acordada.”

Eu nem sequer me incomodo em cobrir meu bocejo enquanto


o observo sonolento, a televisão um zumbido constante no fundo.
A última vez que olhei para o relógio, passava das três da manhã.
Eli me acordou cedo para explicar que nossos voos foram
cancelados e sairemos na tarde seguinte.

Não tenho certeza porque ele não disse isso em qualquer


momento, em vez de ao raiar do dia, mas, novamente, não sei por
que meu irmão faz metade das coisas que faz.

Meu melhor amigo autoproclamado de olhos cinzentos está


deitado na minha cama, os ombros pressionados contra a
cabeceira enquanto me sento de pernas cruzadas ao lado dele,
cochilando. “Estou com sono, mas você pode ficar”, digo a ele com
um bocejo novamente.

“Venha aqui”, ele murmura, acariciando o espaço vazio entre


nossos corpos.

O que você faz quando um homem como Sacha Malykhin quer


que você se deite ao lado dele? Você obedece. De preferência nua,
mas estou cansada demais para sequer pensar em algo mais
sugestivo do que isso. Então dou um sorriso cansado e descruzo
as pernas para ir até o lugar solicitado. Me estico ao lado dele
enquanto ele se move para ficar deitado contra a cama, estendendo
o braço direito para que eu deite em cima. Ele enrola o braço assim
que me acomodo, me puxando até que eu esteja com a cabeça no
peito dele.

MARIANA ZAPATA
Posso ter colocado meu braço sobre seu estômago da forma
mais indiferente possível.

“Você está quente”, sussurro contra sua camiseta preta.


Bocejo de novo e pisco, tentando o meu melhor para ficar acordada
e aproveitar nossa proximidade. “Eu nunca te disse”, bocejo. “Você
se parece com sua mãe.”

“Você acha?”

Concordo. Não contei a ele o que sua mãe disse. Não fazia
sentido. Há também o fato de que não tenho certeza do que diabos
ela quis dizer com ‘arruinar minha vida’, então... deixo passar e a
culpo por ser uma diva. “Características femininas e tudo mais.”

Seu peito retumba sob a minha cabeça. “Você sempre sabe o


que dizer para que eu me sinta especial.”

“Você pode me agradecer pela amizade depois.”

Ele ri novamente. “Vou me lembrar de fazer isso.” É a vez dele


bocejar. “Senta comigo amanhã?”

“Contanto que você...” solto outro longo bocejo, “... me deixe


dormir em suas pernas, deixarei você dormir nas minhas.”

“Combinado.”

Pressiono minha testa mais perto de sua mandíbula.

Sacha me aperta com um suspiro. “Vá dormir, Princesa”, ele


diz em sua voz calma.

“Ok”, sussurro.

Sacha acaricia meu braço com os dedos uma vez, duas, três
vezes. “Frère Jacques, frère Jacques, dormez-vous?Dormez-vous?
Sonnez les matines, sonnez les matines, ding dong, ding dong”, ele
canta baixinho.

Sorrio contra ele, inclinando a cabeça para cima. “Boa noite,


Sassy.”

MARIANA ZAPATA
Ele acaricia meu braço mais uma vez antes de senti-lo mexer
embaixo de mim, minha cabeça se aprofunda em seu peito. O
momento é sonolento, quente, doce e perfeito. Ele pressiona seus
lábios contra os meus gentilmente por um momento, e então beija
meu nariz.

Ele me beijou.

Mesmo em meu estado quase delirante, reconheço e sinto


profundamente no meu peito. Nenhum eclipse poderia ofuscar o
fato de que estou absolutamente apaixonada por esse cara, e é a
coisa mais fácil e simples do mundo.

“Você parece confortável”, Sacha diz com um sorriso. Ele está


sentado no banco em frente ao meu, com as mangas do casaco
vermelho brilhante empurradas até os cotovelos. Deus, ele é tão
fofo.

Olho para os dois homens dormindo em cima de mim. Meu


irmão está com a cabeça no meu colo, babando, enquanto Mason
apoia a cabeça no meu ombro, também babando. Apesar do fato
de serem duas da tarde, os dois estão aparentemente exaustos de
qualquer loucura que experimentaram na noite anterior. Tudo o
que entendi de suas tagarelices foi algo sobre um clube de strip-
tease, garotas da Nova Zelândia e uma banana.

Não quero saber mais nada. Posso carregar cicatrizes disso


pelo resto da vida.

Então agora eles estão desmaiados em cima de mim,


ensopando meu moletom e calça jeans com sua saliva, mas não
tenho coragem de empurrá-los. O caminho para o aeroporto dura
pouco menos de uma hora, e eles estão ocupados aproveitando ao
máximo.

“Já estive mais confortável”, sorrio para ele, pensando em


como acordei naquela manhã.

MARIANA ZAPATA
Sacha estava se mexendo embaixo de mim, tentando sair da
cama o mais gentilmente possível. Ele pressionou um beijo na
minha bochecha, me disse que tinha uma entrevista e que me veria
mais tarde, então soltou sua respiração matinal no meu rosto e
saiu. Só eu acharia isso encantador.

Seu telefone começa a tocar pela quarta vez desde que


entramos na van, e ele suspira. Novamente. Não é da minha conta
perguntar quem está evitando, mas... a curiosidade está me
matando. Isaiah, que está sentado ao lado dele, grunhe em
frustração.

“Atenda o telefone, cara. Estou cansado de ouvi-lo tocar”, ele


reclama baixinho.

Posso ver Sacha revirando os olhos antes de puxar o celular e


mudar sua posição olhando para frente. Eu imediatamente fico um
pouco desconfiada de sua ação. Várias vezes seus pais ou irmãs
ligaram enquanto estávamos juntos, e ele atendeu suas ligações
sem pensar duas vezes. Ele não se importa que eu ouça o que é
dito, mas sua hesitação em responder àquela chamada, naquele
momento, me diz que há algo que ele está tentando evitar.

Confio nele. Muito. Ele não me dá razão para duvidar que se


importa comigo ou que é honesto. Por outro lado, nos conhecemos
há pouco mais de dois meses. Levou três anos para Brandon foder
tudo.

“Flabbs”, Eliza geme quando sua mão começa a acariciar meu


joelho antes de pousar em seu rosto. Ele limpa os lábios e, em
seguida, toca o ponto de baba que deixou na minha calça. “Ahh
foda-se.”

Por mais que eu queira escutar a conversa que Sassy está


tendo na minha frente, meu irmão decide começar a latir naquele
momento. Idiota inútil.

“Isso é baba?” Ele murmura.

MARIANA ZAPATA
“Não, é suco Kool-Aid, idiota”, dou risada, passando a mão
sobre as pontas curtas de seu cabelo que estão começando a
enrolar depois de mais de um mês.

Eli sorri contra a minha perna, fazendo um barulho que soa


como uma risada baixa e sonolenta. “Beba depois, então.” Ele
pisca duas vezes antes de fechar os olhos e voltar a dormir.

Bruto.

A conversa baixa no assento à nossa frente me faz parar de


respirar para que possa ouvir melhor. O que é engraçado é que
todos os outros que estão acordados na van baixam suas vozes
quando Sacha começa a falar. Levou apenas algumas semanas
para aprender que esses caras são mais fofoqueiros do que garotas
adolescentes. Mesmo que tentem demonstrar desinteresse,
devoram qualquer coisa que chame sua atenção.

Como quando Isaiah foi apresentado a uma fã, que lhe


ofereceu quinhentos dólares para transar com ele.

Ou quando uma fã perguntou ao meu irmão, Gordo e Miles,


se poderia lamber seus sapatos.

Ou então quando Mason...

Muitas coisas aconteceram e os caras estão animados demais


para falar.

Obviamente, há algo nessa conversa que chama a atenção.

“Eu já disse a você… Lizzy, não vou mudar de ideia...” Sacha


fala no telefone. Lizzy? Porra? Antes que eu possa refletir um pouco
mais, ele continua. “Não, não há mais ninguém. Não quero voltar
porque a escolha é minha. Assim como você decidiu que não queria
ficar junto, não quero continuar de onde paramos...” Sinto como
se estivesse sendo esfaqueada enquanto ele fala. “Eu me preocupo
com você. Você sabe disso. Você significa muito para mim, mas
isso não significa que quero continuar com você. Estou cansado
de explicar isso toda vez.”

MARIANA ZAPATA
Posso ver seu reflexo no vidro. Seus olhos estão fechados e a
testa está pressionada contra a janela fria. Meu coração bate
freneticamente, embora eu saiba que não deveria. Nada do que
Sacha está dizendo é tecnicamente mentira. Tecnicamente é sua
escolha não querer voltar com sua ex. Ele se importa com ela. Quer
dizer, eles ficaram juntos por um tempo.

Mas...

Mas...

Mas...

Eu me sinto enjoada. Sacha também se importa comigo. Sei


que sim. Cada veia em meu corpo sabe disso. Mas talvez seja por
isso que ele não faz um movimento comigo? Porque ele não quer
ficar amarrado em alguém? Um simples beijo não é um anel de
compromisso, ou algo assim. Não tem que significar nada
romântico. E.… há uma diferença entre amar alguém e estar
apaixonado. Eu sei disso.

Minha compreensão e aceitação da noite anterior são


enterradas. Estou apaixonada por um homem que talvez me ame
de acordo com os outros, mas talvez não me ame como eu quero.
Talvez ele não queira um relacionamento. Tem vários homens em
minha vida que me amam de uma forma platônica. Qual o
problema com mais um? E por que me sinto traída por ele ainda
se importar com a dublê de Ariel? Sacha é um cara legal. Inferno,
ele é o cara mais legal que já conheci. Provavelmente essa é apenas
sua forma de cuidar das pessoas, mas...

Estendo a mão sobre o grande corpo de Eli para pegar a


mochila que está no seu colo, e pego seus caros fones de ouvido do
estúdio, conectando-os em meu telefone o mais rápido que posso
enquanto olho para o homem que está ao telefone. Passando as
músicas que tenho na minha biblioteca, escolho a que está no topo
da lista e subo o volume o mais alto possível.

MARIANA ZAPATA
Fechando os olhos, deixo minha cabeça cair de volta no
assento e coloco uma mão em cada um dos caras ao meu lado.

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 21

Durmo durante nossa passagem por Dubai e, de alguma


forma, consigo chegar a Londres sem falar mais de vinte palavras
com Sacha. Mais importante, não durmo em suas pernas e ele não
cochila nas minhas. Quando pegamos nosso voo de conexão,
descobrimos que ele ia dividir o assento com um estranho, então
sentei com meu irmão e Gordo. Gordo — que ouviu a mesma
conversa que eu — não diz uma palavra. É o doce Starburst
vermelho que ele me dá mais tarde que realmente demonstra sua
simpatia.

Quando finalmente pousamos em Londres, o promotor da


turnê nos leva em uma van Sprinter para um hotel onde
passaremos a noite. Um novo ônibus de turismo vai nos pegar no
dia seguinte.

Faço um esforço para me segurar e sentar longe do meu amigo


de olhos cinzentos. Meu humor está muito ruim e me sinto muito
grogue com o jetlag. Por mais empolgada que esteja em estar na
Europa, não estou com vontade de fazer loucuras em nosso
primeiro dia de folga. Todo mundo está tão aliviado por estar em
terra novamente, que definitivamente não serei a desmancha
prazeres do grupo, acabando com o humor dos outros.

Se meu bom humor fosse uma jangada chamada Gaby,


estaria prestes a afundar.

Eli se despede quando me acomodo em meu quarto e diz que


volta mais tarde, independentemente de eu querer ir a algum lugar
ou não. Ele sabe que algo está me incomodando, mas é esperto o
suficiente para não perguntar sobre isso até mais tarde. Mesmo
que não tenha herdado o temperamento da nossa mãe, partes dele

MARIANA ZAPATA
ainda estão gravados em meus cromossomos. Ele está bem ciente
do que esperar quando estou de mau humor.

O que não levo em consideração é que Sacha também me


conhece.

Quando uma batida soa na minha porta algumas horas


depois de termos sido deixados, não me incomodo em perguntar
quem está lá porque acho que é Eliza. Mas não é.

“Você não pediu a senha”, Sacha diz franzindo a testa quando


a porta se abre.

Dou de ombros e abro mais para ele entrar. “Pensei que fosse
Eli”, respondo simplesmente.

“Oh” Sacha me dá um olhar duro quando entra no quarto


minúsculo. Ele tomou banho desde a última vez que nos vimos,
está vestido de jeans e uma camiseta branca com decote em V.
Joga seu longo corpo na minha cama, apoiando-se nos cotovelos.
“O que vamos fazer hoje?”

Fecho a porta, e me viro para encará-lo enquanto tento aliviar


o trovão que atinge meu coração. “Estou planejando ficar por
aqui.”

“Pensei que você quisesse caminhar por aí?” Ele levanta uma
sobrancelha escura.

Outro encolher de ombros. “Talvez amanhã, estou cansada.


Tenho certeza de que alguém pode ir com você.”

Sacha apenas pisca para mim. “Eu quero ir com você.”

Não, não, não, não, não. Sorrio para ele. “Tenho certeza que
você vai se divertir mais com outra pessoa.”

Ele olha para mim por tanto tempo em silêncio que não tenho
certeza se vai responder até que finalmente faz. Sua pergunta é
calma e controlada. “O que há de errado?”

MARIANA ZAPATA
“Nada.”

“Gaby.”

Dou a ele o sorriso mais fraco do universo. “Estou apenas


tonta e grogue, e minha cabeça está doendo.”

Ele pisca novamente. “Quando começou a doer?”

Meus ombros sobem. “Mais cedo, antes do primeiro voo.” Logo


depois que ouvi você contar para outra mulher que se importa com
ela.

Ele resmunga e rola para ficar sentado. Esfrega as mãos para


cima e para baixo nas pernas da calça. O olhar em seu rosto é um
aviso. “Me diga o que está errado. Você está estranha.”

“Estou bem”, insisto. “Só quero ficar sozinha agora.”

Aqueles olhos pálidos se contraem em descrença e


possivelmente machucados. “Não faça isso comigo de novo.”

“O que?” Pergunto a ele, embora saiba o que ele está tentando


sugerir.

“Você está me afastando. Eu não gosto disso.”

“Sacha, eu não estou...” Droga.

Ele faz uma careta. “Viu, você nunca me chama de Sacha.”


Ele empurra a beira da cama para ficar em pé. “Me diga o que está
errado.”

Eu balanço a cabeça e desvio os olhos para o teto. Claro que


olho para cima uma fração de segundo, mas ele percebe e é isso.
“Não é nada”, murmuro.

“Você está mentindo”, ele responde.

Estou e odeio isso. Eu não sou uma mentirosa. Algumas vezes


omito coisas, mas não gosto de fazer isso. Sou terrível nisso. Mas
o que vou dizer a ele? A verdade? Ei, Sassy, percebi que estou

MARIANA ZAPATA
apaixonada por você na noite passada, e então você diz a sua ex
que se importa com ela, e que não há mais ninguém na sua vida.
Certo. Isso soa como a pior ideia da vida.

Quando ele segura meu pulso com seus dedos quentes,


respiro fundo. “Gaby, baby”

Eli me disse uma vez, há muito tempo, que você não está
vivendo sem não estiver correndo riscos. A coisa que ele nunca
mencionou é que os riscos são assustadores. Eu não lido bem com
rejeição. Mas o que são mais quatro semanas? Será mais fácil
ignorá-lo por esse período de tempo ou mentir e fingir que estou
bem quando não estou.

“Diga-me, Princesa”, ele fala com um aperto no meu pulso.

Eu nunca me considerei corajosa antes. Geralmente encontro


minha força no meu irmão, que não se importa o suficiente com o
que as pessoas pensam sobre as consequências, ou Laila, que não
se intimida com a maioria das coisas. Minha confiança nos outros
geralmente é a garantia que preciso para fazer coisas que me
deixam nervosa. Eu sei que eles nunca fariam coisas que poderiam
me matar.

Tudo o que tenho são mais quatro semanas.

Suspiro e olho em todos os lugares, exceto para ele. “Eu foquei


em algo mais do que deveria e agora me sinto idiota. Isso é tudo.”

“Em que você focou?” Ele pergunta em uma voz levemente


acima de um sussurro.

Bolas. Eu tenho bolas invisíveis e posso fazer isso. “Pensei que


alguém gostasse de mim, mas percebi que talvez não seja o mesmo
tipo de atração que estou esperando”, digo a ele lentamente,
encontrando seus olhos no maior ato de bravura que já realizei
sozinha.

Seu lindo rosto se transforma em uma expressão sombria.


“Quem?” Sua pergunta é feita lentamente.

MARIANA ZAPATA
Jesus fodido Cristo, engulo em seco. “Quem o quê?”

“Quem não gosta de você?”

Oh, irmão. “Você é um cara legal, Sassy. Eu sei disso. Todo


mundo sabe disso. Inferno, acho que até Eli tem uma queda por
você.” Sorrio para ele, apenas um pouco, lembrando que não é sua
culpa ser tão simpático. “Não é da sua natureza ser um completo
idiota, e tudo bem. Entendo. Eu gosto muito de você, mas você não
precisa fingir. Pelo menos não finja comigo.”

As sobrancelhas de Sacha franzem antes que ele faça uma


careta para mim, confusão estragando suas feições. “Do que você
está falando?”

“Oh meu Deus”, lamento e dou um passo para trás, mas ele
segura meu pulso apertado.

Homens. Idiota. Homens idiotas.

Eu devo ter olhado para ele por tempo suficiente para


finalmente atingi-lo. Sua mão sobe para a parte favorita da sua
cabeça, onde ele está sempre esfregando, e ri ao mesmo tempo,
incrédulo. “Você acha que não gosto de você?”

E eu quero morrer. “Eu acho que você gosta de mim de um


jeito diferente de como gosto de você, se insiste em saber.” Me
mate. Me mate agora.

“O que?” Ele sussurra, dando um passo à frente. “Por que


você acha isso?”

Meus olhos vão para o teto novamente. Eu não quero ter essa
conversa. Cada fibra do meu ser está se revoltando contra mim.
“Todos na van ouviram sua conversa telefônica, Sassy. Não há
ninguém especial. Você se preocupa com sua ex-namorada, mas não
quer voltar com ela.” Puxo meu braço de volta inutilmente. “Eu
entendo. Está tudo bem.”

Mas não está.

MARIANA ZAPATA
Sacha solta um longo suspiro. “Você ouviu o que falei para
Liz, e acha que o que eu disse muda alguma coisa?” Ele dá outro
passo em minha direção. “Você realmente acha que não gosto de
você?”

Quando não digo nada em resposta, ele bate no canto da boca


com a ponta da língua. “Gaby, eu posso te dizer que te odeio. Posso
te dizer que acho você a pior pessoa que já conheci. A garota mais
feia do planeta. Posso dizer a todos na plateia que sou gay, mas
você acha que isso muda alguma coisa?”

“Você me faz mais feliz do que qualquer outra pessoa já fez, e


se soubesse quantas pessoas já conheci, entenderia o que isso
significa. Eu sei que você não conhece Liz, mas essa é a única
maneira que sei que vai atingi-la. Se eu falasse a ela que acho você
a melhor coisa do planeta, isso a tornaria implacável. Ela não sabe
o que ‘não’ significa. E não é da conta de ninguém, a não ser sua,
o que sinto por você”, ele diz, rapidamente.

Por mais que suas palavras me aqueçam, não são as que eu


quero. Elas não são uma confirmação. São apenas uma explicação
que faz todo sentido para mim, mas não alivia minha preocupação
o suficiente. “Entendo. Acho que você é ótimo também”, digo a ele
com um suspiro. “Mas isso não é...”

“O sol é o maior objeto no espaço?” Ele pergunta com uma voz


firme e decidida.

Tenho que pensar sobre isso por um segundo antes de


concordar, confusa com o que ele está perguntando. “Não.”

“Como você explica ao sol que existem estrelas distantes que


o tornam pequeno?” Ele baixa o rosto em direção ao meu. “Gostei
de você desde o momento em que te conheci.” Ele pisca, as
sobrancelhas se unindo em surpresa. “Droga, Gaby. Eu sou louco
por você.”

Ele disse o quê?

MARIANA ZAPATA
Seus olhos perfuram os meus, bebendo na confusão que
tenho certeza que é evidente neles. “Não me olhe assim.”

“Você é... você...” Eu... o que...

Seus dedos apertam meus lóbulos das orelhas. “Você não está
solteira há muito tempo. Eu não quero te apressar em nada, e não
vou deixar você sair da minha vida mesmo quando a turnê acabar”,
ele explica em voz baixa e uniforme. Sua voz é hipnótica e estou
viciada. Um pequeno sorriso frustrado cobre sua boca. “Você é
uma idiota se pensa que não é especial para mim. Você é a mais
especial.” Seus lábios pairam sobre os meus. “A mais.”

Morta. Eu estava morta e esta é a vida após a morte.

Ele lentamente me puxa para frente. Sua mão segura meu


rosto; seus lábios macios estão sorrindo de propósito quando
cobrem os meus tão ternamente que não consigo pensar em
respirar. A boca de Sacha se abre lentamente, persuadindo a
minha a fazer o mesmo. E gradualmente ele inclina os lábios para
me beijar o mais profundamente possível. Ele tem gosto fraco de
hortelã.

Duas mãos seguram meu rosto de repente quando ele nos


segura forte, como se estivesse preocupado que vou tentar me
afastar. Ele geme profundamente em sua garganta quando o beijo
de volta com a mesma intensidade que ele me beija. Uma de suas
mãos passa pela parte de trás do meu pescoço, segurando com
força enquanto seu outro braço envolve minha cintura e traz meu
corpo para mais perto. Cada músculo magro de seu tronco
pressiona contra o meu, contraindo e flexionando com a força de
suas ações.

Então ele se afasta um centímetro para dar um beijo molhado


e de boca aberta no meu rosto. “Você precisa que eu soletre?”

Eu tremo e concordo, inclinando mais a cabeça em direção a


ele. “Acho que sim.”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 22

“Você feriu meus sentimentos”, digo a Sacha em voz baixa


depois daqueles espetacularmente maravilhosos primeiros beijos.

Eu brevemente penso em não contar a ele o quanto suas


palavras me incomodaram, mas decido o contrário. Já pulei com
os dois pés ao admitir que gosto dele e que ele me faz sentir
estúpida. Neste ponto, minha dignidade está perdida e não vai
voltar tão cedo.

“Gaby”, ele suspira, estendendo a mão para envolver seus


longos dedos em meu pulso. Puxando-me para perto, dá um
tapinha no espaço aberto entre suas pernas estendidas. Não é
preciso ser um gênio para entender que ele quer que eu sente entre
elas, mas não consigo. Pelo menos ainda não. Em vez disso, sento
a alguns centímetros da coxa mais próxima. “Essa é a última coisa
que eu gostaria de ter feito.”

Balanço a cabeça. Algo profundo no meu instinto me diz que


ele está falando a verdade. “Tudo bem.”

Virando o corpo inteiro para mim, um pé no chão, a outra


perna dobrada e descansando no colchão, suas mãos pousam nos
meus ombros e lentamente avançam pelos meus braços. Suas
mãos se curvam sobre meus bíceps e cotovelos. “Não está tudo
bem. Eu deveria ter resolvido as coisas quando estive com ela”,
Sacha responde. Ele se inclina, envolvendo seus braços em meu
corpo em um abraço solto e reconfortante quando um de seus
joelhos pressiona contra os meus. “Eu sempre fui louco por você.
Acho que apenas presumi que você sabia.”

“Oh!” Eu saber? Como? Ok, talvez os sinais estivessem lá, mas


não me permiti percebê-los.

MARIANA ZAPATA
“Gaby”, ele sussurra, cobrindo meu rabo de cavalo em cima
do ombro com uma mão. “Não sei o que estou fazendo com você
na metade do tempo.” Sacha ri quase preguiçosamente. “Eu gosto
tanto de você que me deixa idiota.”

Eu não posso deixar de rir, enquanto me afasto e olho para


ele. “Acho que esse barco já partiu muito antes de eu aparecer,
Sassy.”

Ele ri baixinho, inclinando-se para frente um momento depois


para beijar minha bochecha. Isso pode ter me causado surpresa.
“Vê? Não gostar de você é como lutar contra a gravidade.”

Esse cara será a minha morte.

“Muitas pessoas não gostam de mim, como Miles”, zombo.


“Todo mundo só me atura por causa de Eli, provavelmente.”

Lábios beijam meu rosto duas vezes, e cada vez tenho que
lutar contra o desejo de rastejar em seu colo e pedir mais. “Você
não vê as coisas claramente.” Seu nariz se aninha em minha
garganta. “Você é especial para muitas pessoas, mas
especialmente para mim.”

Olho para ele, vendo aqueles olhos cinzentos muito mais


próximos do que estou acostumada. Eu não estou buscando
elogios ou confiança no amor que pessoas como meu irmão e
Mason tem por mim. Sei que eles se importam. Seu amor é fácil e
incondicional.

Se essa coisa entre nós é apenas curtição ou amor — não


tenho certeza. Cresci compartilhando coisas durante toda a minha
vida. Nunca houve a opção “meu” com meus irmãos, tudo
pertencia a todos, mas com Sacha... não há essa opção. Nunca
poderá haver essa opção.

“Acabou, no entanto?” Pergunto a ele, olhando para a cama.


“Entre você e Ron... quero dizer, Liz?”

MARIANA ZAPATA
Outro beijo lento pousa na minha garganta enquanto ele
mantém contato visual comigo através de seus cílios, aumentando
o calor que sinto. “Eu prometo que sim.”

“Posso sentir seu cheiro de merda a um quilômetro de


distância”, aviso, tentando o meu melhor para me concentrar no
que estou dizendo e não em como ele está me fazendo sentir com
todos aqueles beijos.

Sacha ri baixo. “Oh, eu sei Princesa. Eu não espero menos,


mas prometo. Não há nada com ela há muito tempo. Mesmo
quando havia, não era nada perto disso.” Ele toca minha orelha.
“Você sabe que pode confiar em mim.”

Oh inferno sim, isso eu sei.

“Estamos bem então?” Ele pergunta com hesitação


estampada seu tom. “Melhor do que antes?”

Concordo e pisco para ele, precisando e querendo ter certeza


de que estamos na mesma página. “Só para ter certeza... você gosta
de mim também, certo?”

Aqueles olhos rolam antes dele pressionar a testa contra a


minha, o nariz tocando o meu. Posso sentir sua respiração na
minha boca quando sussurra: “Tantos sentimentos que você não
tem ideia.”

Bem, merda. O que sai da minha boca é provavelmente a


resposta mais idiota e discreta que posso dar, “Ok.”

“Ok?” Ele pergunta. Posso sentir seu sorriso, embora não


possa ver de tão próximos que estamos.

“Sim. Ok.” Sinto que posso respirar pela primeira vez em


horas ou mais. Isso significa que sei o que está acontecendo? Não.
Acho que perdi as regras de quando as pessoas estão oficialmente
namorando e quando não estão desde que minhas experiências
passadas não são muito para comparar. Brandon simplesmente
me chamou de namorada um dia quando me apresentava às

MARIANA ZAPATA
pessoas e foi isso. Meu namorado na escola me pediu em namoro.
Como diabos você deveria saber o que está acontecendo?

Uma batida forte na minha porta nos tira da nossa bolha.


Lamento e pulo para verificar o olho mágico. Meu irmão está em
pé do outro lado com os braços cruzados sobre o peito antes de eu
deixá-lo entrar.

“Vamos em um desses passeios em ônibus de dois andares.


Coloque sapatos”, ele diz rapidamente, antes de estreitar os olhos.
“E alguma maquiagem. Com certeza, coloque um pouco de
maquiagem.”

Idiota.

Fico ali com a boca aberta por um segundo, o que o faz franzir
a testa e depois espiar por cima do meu ombro vendo Sacha
sentado na minha cama. Uma careta lenta cobre o rosto de Eliza
antes que ele estremeça.

“Oh foda-se, eu vou ficar enjoado”, ele geme antes de fazer


som de ânsia.

Rio e dou um soco em seu estômago. “Cale-se. Estamos


totalmente vestidos, seu idiota.”

Eli sorri rapidamente e pisca para Sacha, apenas confirmando


o homem que sei que mora dentro dele. “Vamos lá, Sach. Você pode
traduzir o que os guias estão dizendo.”

“Eles falam inglês”, digo ao meu irmão, sentindo um dos


meus olhos começar a rolar.

“Mas eles têm sotaque, Flabby, olá.”

Olho por cima do meu ombro e encontro Sacha balançando a


cabeça, então dou risada. “Felizmente para você, E, Sacha fala
‘estupidez’, então ele pode traduzir.”

MARIANA ZAPATA
“E você se pergunta por que não tem nenhum amigo.”

Sacha me lança um olhar enquanto passa as mãos pelo


cabelo. Ele terminou de me dizer que estou louca por querer entrar
no brinquedo. Aqueles olhos pálidos espiam novamente,
observando a coisa tipo roda-gigante que atualmente o está
assustando muito. Ele pisca e engole em seco. “Eu não posso fazer
isso”, afirma.

“Você está mesmo com tanto medo?” Pergunto, cruzando os


braços sobre o peito.

Eli e Gordo estão parados perto, meu irmão ocupado


gesticulando e olhando para um grupo de mulheres à nossa
direita. Conhecendo-o, está planejando qual garota vai pegar
primeiro. Pobre alma. Felizmente, ninguém está testemunhando o
surto que penso que Sacha está prestes a ter. Ele olha para mim
novamente antes de olhar para a London Eye cautelosamente.

“Você tem medo de altura?”

Sacha engole em seco. “Eu posso lidar com alturas normais,


subir em uma escada ou em um balcão, mas isso é muito alto.
Muito alto”, ele solta a respiração, observando a enorme
engenhoca.

Me viro para olhar a atração iminente. É muito alta. Mesmo


que eu não tenha medo de altura, é intimidante. Eliza foi quem
sugeriu que continuássemos o passeio depois do ônibus de dois
andares. Estou mais do que feliz que sobrevivemos sem que meu
irmão insultasse alguém com a merda que sai de sua boca. Gordo
foi o único que ficou preso ao lado dele, enquanto Sacha e eu
sentamos em outro assento. Agora que penso sobre isso, fui eu que
me pendurei na borda do ônibus, observando a vista enquanto ele
se endireitou e absorveu tudo que sei que já havia visto antes.

Não é a primeira vez que ele visita Londres, e também não é a


primeira vez do meu irmão, mas gosto que os dois se preocupem
em encontrar maneiras de fazer coisas que sabem que não fiz.

MARIANA ZAPATA
Coisas que não teriam feito se eu não estivesse por perto. Eu não
posso imaginar Eli ou Gordo andando em um ônibus turístico
como diversão. Inferno, fico surpresa que Eliza não está em um
bar, mas não serei eu a falar sobre isso.

“Se você realmente não quer subir, nós não precisamos”, digo
a ele, sorrindo um pouco do seu medo.

Ele geme e olha para a engenhoca atrás de mim novamente,


rangendo os dentes. “Mas você já comprou nossos ingressos...”

“Oh senhor, Sassy, prefiro ficar aqui do que você pulando lá


de cima”, cutuco em seu estômago, gostando de como tudo parece
normal depois da conversa que tivemos no meu quarto de hotel.
“Está bem. Não se preocupe com isso. Tenho medo do escuro,
então não me julgue.”

Ele levanta uma sobrancelha, dando-me o menor indício de


um sorriso. “Do escuro?”

“Sim”, digo a ele. “Eu tenho uma luz noturna no meu quarto.”

Ele ri, dando um passo à frente. “Por alguma razão, não estou
surpreso.” Suas mãos se estendem para pousar em meus ombros,
apertando-os levemente e eu deixo as borboletas voarem no meu
estômago. “Você sabe que não há nada para temer, certo?”

Dou de ombros e olho para trás de mim. “Você já viu filmes


de terror? Há muitas coisas para se ter medo. Freddy Krueger,
Michael Myers, Chuck. Eu não quis tomar banho sozinha por cerca
de um mês depois que eu assisti um desses filmes. Não, obrigada.”

Sacha sorri aquele grande sorriso que faz meu peito vibrar.
Isso tudo é novo e repentino, mas ao mesmo tempo, não é. Isso ia
acontecer, certo? Até Eli não está me provocando ou fazendo
caretas. Isso tem que ser um sinal. Isso — ele — é fácil. Sem
esforço. Apenas parece certo.

Provavelmente deveria ser estranho que menos de algumas


horas atrás, eu não queria nem falar com ele, mas não é. Ele gosta

MARIANA ZAPATA
de mim. Eu gosto dele. E Ronalda está fora do meu Mac Lanche
Feliz.

O que mais posso querer, além de Sacha nu?

“Se eles vierem atrás de você, estou aqui”, ele ri.

Dou risada, pensando em como meus babuínos me deixariam


morrer se isso acontecesse. “A menos que tenhamos que subir a
lateral de um prédio.”

“Nesse caso, foi bom conhecê-la”, ele ri.

Oh meu Deus. Eu amo isso. Realmente amo.

“Nojento e Imundo, prontos para ir?” Eli pergunta.

Dando um passo para trás, viro a cabeça para ver meu irmão
e Gordo em pé ali, sorrindo. Reviro os olhos. “Eu não acho que
vamos subir.”

Ele me dá um olhar incrédulo. Nós estamos andando em


montanhas-russas juntos antes mesmo de eu ser alta o suficiente
para andar, então ele sabe que há uma razão para eu não subir.
“Por que diabos não?”

Sacha faz um barulho na garganta e sei que ele está se


preparando para dizer alguma coisa. Mas não quero fazer isso com
ele. Dizer a Eli Barreto que você tem uma fraqueza é o equivalente
a sangrar perto de um tubarão.

“Eu preciso fazer o número dois”, solto, antes mesmo de


pensar e imediatamente me encolho. De todas as coisas que
poderia ter dito...

Sacha bufa.

Meu gêmeo assente sem pestanejar. “Claro.” Claro que ele diz
isso. Se há alguma coisa no mundo que ele leva a sério, é a
necessidade de se ir ao banheiro.

MARIANA ZAPATA
Alguns minutos depois, ele e Gordo correm para a entrada da
London Eye. Sacha geme por um minuto antes de me guiar atrás
deles. “Vamos. Se eu desmaiar, pelo menos me segure.”

Meu peito aperta novamente pelo seu pequeno ato de bravura.


Por mim. Porque sabe que quero ir. “Juro que não vou contar a
ninguém se você desmaiar.”

“Você é muito gentil”, ele sorri com olhos arregalados,


olhando para a atração novamente.

Assim que Eli nos vê na fila, ele joga os braços para os lados
e pergunta gritando: “Pensei que você precisava ir ao banheiro!”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 23

“Flabby, eu adoraria uma massagem”, sugere Mason


descaradamente, batendo o ombro contra o meu.

Bato nas costas dele. Nós estamos sentados em nosso ônibus


novo: um monstro de dois andares que faz nosso ônibus americano
parecer minúsculo. O primeiro andar tem cozinha e área de estar,
enquanto o andar de cima tem a área de beliches. Naquele
momento, Mase e eu estamos sentados em um dos sofás comendo
peixe e batatas fritas que meu irmão arranjou em algum lugar
antes do show terminar.

Foi um ótimo primeiro dia. As duas primeiras etapas da turnê


Rhythm & Chord foram incríveis, nos levando por todo o EUA e
Austrália, mas Londres é além da perfeição. A multidão é diferente.
A energia é diferente. E estou curtindo muito os fãs com seus
sotaques.

“Mason”, mordo uma batata frita. “Eu adoraria não estar


menstruada, mas nem sempre conseguimos o que queremos.”

Ele solta uma gargalhada, mergulhando o peixe no meu


vinagre. “Bem, eu adoraria que você não estivesse menstruada
também, sua maldita psicopata.” Mason pisca para mim antes de
puxar a ponta do meu rabo de cavalo.

Eu bufo. “Eu adoraria se você tomasse um banho.”

“Eu tomei!” Ele engasga, sabendo que está mentindo.

“Ontem”, eu rio.

Mase apenas sorri de lado, provocando um sorriso meu


enquanto termina sua comida. Ele rouba um pequeno pedaço de

MARIANA ZAPATA
peixe do meu prato, e depois tenta me distrair de seus roubos,
jogando um braço por cima do meu ombro e inclinando-se para o
meu lado. “Então, Flabby, você e aquele garoto finalmente estão
juntos?”

“Que garoto?” Pergunto a ele em voz baixa e secreta.

“Sacha”, ele sussurra de volta.

Estamos praticamente sozinhos no primeiro andar, com


exceção de Miles e Julian, que estão do outro lado do ônibus. Todo
mundo está no segundo andar fazendo Deus sabe o que. Não há
realmente um ponto nele sussurrando, mas acho divertido de
qualquer forma. O bastardo tenta ficar quieto nos momentos
errados.

“Ele é mais velho do que você”, digo antes de acrescentar, “e


não sei, por quê?”

Seus olhos azuis escuros se estreitam. “Porque preciso saber


se devo falar com ele sobre o que vai acontecer se fizer algo
estúpido”, ele diz com naturalidade.

Tenho que apertar meus lábios para não sorrir de sua forma
de ameaça. “Mesmo?”

Mason assente, apertando sua mão ao meu redor. “Flabby,


você sabe que eu não tenho nenhuma irmã...”

“Graças a Deus”, solto uma pequena risada, imaginando uma


mulher igual a Mason.

Ele funga. “Mas se não vamos nos casar...”

Eu bufo.

“Então preciso ter certeza de que nenhum idiota vai partir seu
coração”, ele diz antes de estremecer. “Novamente.”

Eu não posso deixar de rolar meus olhos para o que ele


acrescenta. “Obrigada pelo lembrete, jumento.”

MARIANA ZAPATA
Mason simplesmente sorri e encolhe os ombros. “Eu me
vinguei por você não se preocupe com isso.” A lembrança do que
aconteceu em San Antonio me faz sorrir. Eles ficaram tão calados
sobre o que exatamente aconteceu fazendo com que Brandon
precisasse de três pneus novos, que ainda não tenho ideia da
verdade. Por que não danificaram todos os quatro pneus está além
de minha compreensão, mas conhecendo Mason, há uma razão.

Isso não significa que é necessariamente uma boa razão, mas


que seja.

“Você contou a ele sobre Laverne e Shirley?”

Sim, tenho que apertar meu nariz depois dessa pergunta.


“Você quer dizer Lucy e Ethel”, esclareço. “Não, não contei a ele.
Não sei como.”

“Não me pergunte, Flabs. Só te digo que surpreenda a merda


fora dele. “ Ele faz sua melhor imitação de Strip-tease, fingindo
rasgar a camiseta. “O que ele vai fazer? Engasgar? Dizer ‘oh não’?
Pssh De jeito nenhum.”

“Oh, Mase”, sorrio para ele, “o que eu faria sem você?”

Ele dá de ombros, todo músculos e sorriso lânguido.


“Sonharia comigo.”

“Ha!” Me inclino em direção a ele e dou um beijo em sua


bochecha. “Teria pesadelos.”

Mason ri e me aperta mais uma vez antes de soltar meu braço


com um suspiro. “Falando em pesadelos, seu irmão e seu pão de
mel estão chegando; acho que o deixamos com ciúmes.”

Reviro os olhos e me levanto para jogar fora os dois pratos.


Com certeza, Eliza e Sacha estão bem atrás de mim em pouco
tempo. Mas meu amigo de olhos cinzentos, que disse à multidão
que lotou o show hoje à noite o quanto gosta de morenas, não
parece com ciúmes. A última coisa com a qual quero lidar é alguém

MARIANA ZAPATA
com ciúmes de Mason. Meu Mason, que é como um irmão adotivo
que escapou de um manicômio.

Quando eles se juntam a nós, ficamos por algumas horas


jogando baralho enquanto eles me contam sobre lugares onde
devemos tentar ir enquanto a turnê está na Inglaterra. Não estou
realmente cansada, mas vou para cama ao mesmo tempo que
Eliza, deixando Mason e Sacha na sala de estar assistindo
televisão.

Em algum momento, enquanto cochilo, acordo sentindo uma


pressão na minha mão antes de ver a luz passando por uma fresta
nas minhas cortinas. Aperto os olhos, me adaptando a escuridão
e posso ver que é Sacha me tocando. Seu beliche está localizado
diretamente acima do meu mais uma vez.

“Você está bem?” Sussurro.

Aqueles dedos longos que admiro regularmente acariciam


meu queixo. “Sim. Não queria te acordar. Volte a dormir.” Ele não
me dá chance de perguntar qual é sua intenção. Ele abaixa a
cabeça no meu beliche, beija minha bochecha, aperta meu ombro
e fecha a cortina.

Sim, não consigo voltar a dormir depois disso. Passados


menos de dez minutos começo a me perguntar por que não o
convidei para deitar comigo.

Na noite seguinte, depois de um show incrível em Glasgow, já


estou na cama quando a cortina é puxada novamente. Sei quem é
o intruso antes dos meus olhos terminarem de se ajustar.

“Eu não consigo dormir”, sussurra Sassy Pants.

Bocejo, penso por um segundo sobre como posso responder,


e então aceno para ele entrar. Ele pensa nisso durante o mesmo
tempo que eu: um único segundo. Não há muito espaço em
minha minúscula cama, mas não me importo, e aparentemente,

MARIANA ZAPATA
quando entra imediatamente depois, ele também não se importa.
Não é a primeira vez que ele dorme ao meu lado, então tanto faz.
A ideia de que isso está indo rápido demais, quando no passado
esperei mais de quatro meses antes de compartilhar uma cama
com o meu ex, não passa pela minha cabeça. Esse é Sacha. Meu
amigo e mais, e nada — nós —nunca foi assim.

Tenho que me arrastar até que minhas costas estejam contra


a parede atrás de mim enquanto ele se mexe, fechando a cortina.

“Cante-me uma canção de ninar.” Ele desliza o braço em volta


do meu corpo sem esforço e me puxa, alinhando nossos corpos
para ficar cara a cara.

Minha risada é fraca e sonolenta quando beijo sua bochecha


com cheiro de sabão. “Rock bye, baby”, eu começo. “Ok, boa
noite.”

Sacha ri baixinho em minha pele, sua mão acariciando


minhas costas enquanto pressiona seu peito no meu. Posso senti-
lo inclinando a cabeça para beijar o canto da minha boca. “Boa
noite”, ele diz, pressionando os lábios quentes nos meus
sonolentos.

Como ele espera que eu não retribua quando aquela boca


fantástica e cheia toca a minha?

Boca fechada, beijos sem pressa um em cima do outro.


Segundos se transformam em minutos e beijos suaves se
transformam em beijos de boca aberta que fazem meu coração
disparar. Sacha se afasta para soltar um pequeno suspiro,
puxando-me ainda mais contra ele. Seu corpo está quente e firme;
demoro trinta segundos para adormecer depois que ele me beija
pela última vez.

A pergunta de Mason me assombra por dias.

Sacha e eu estamos namorando?

MARIANA ZAPATA
Passamos a maior parte do tempo juntos. Ok, isso é uma
mentira gorda e fedorenta. Passamos todo o nosso tempo juntos
quando é possível. Entre entrevistas, passagens de som, e meu
irmão me levando aos lugares, não conseguimos passar o dia todo
juntos, mas tudo bem. Quando é possível, acontece.

Durante os shows, ele se esgueira para a área de vendas com


seu capuz disfarçando-o para falar comigo. Faço minha folga
estrategicamente antes do show para desejar-lhe boa sorte.
Durante os shows, ele costuma dizer algo direcionado a mim, como
mencionar sua atração por morenas. Então, a cada noite, ele sobe
no meu beliche e passa a noite ali, enquanto abafamos nossas
risadas sobre o que achamos engraçado.

É uma coisa deslumbrante, essa amizade inacreditável — esse


amor — que tenho com ele e por ele. É meu, me faz feliz, e me
delicio com isso.

Mas tanto quanto suas palavras e seus beijos me envolvem,


ainda tenho dúvidas. Chamar-nos de amigos com benefícios é tão
ruim, tão sem importância. Sei que ele se importa mais comigo do
que apenas como uma amiga. Eu posso sentir isso nos meus
ossos.

Um pouco mais de uma semana depois do início do tour pela


Europa, parece que alguém no céu com harpa e asas decide que
quer me ajudar com esse estado de confusão que tomou conta do
meu ser.

Um amigo de Julian — porque sempre são os amigos de


Julian que mexem comigo está além de meu entendimento—
decide que gosta de carne americana.

Essa carne americana sou eu.

A noite toda, o cara está flertando comigo. Aquele sotaque


inglês sussurra para mim o quão fofa ele acha que eu sou quando

MARIANA ZAPATA
termina o show do Ghost Orchid. Não estou tentando ganhar seus
elogios ou prestar atenção ao cara, porque não quero. Quando ele
começa, eu digo: “Estou namorando alguém.” Direto o bastante,
certo? Isso não o impede, no entanto.

Ele apenas continua voltando, e me vejo indo na direção de


Carter e Gordo toda vez que ele aparece.

É depois do show, quando estamos do lado de fora esperando


terminar de carregar as coisas, que ando até um grupo de pé em
um círculo. Sacha está de pé com Julian e o pequeno flerte de
antes. Assim que me sento a uma distância confortável ao lado de
Sacha, ele me lança um largo sorriso e dá dois passos, jogando o
braço sobre meu ombro. Seu queixo inclina para baixo quando ele
diz: “Oi, Princesa.”

Deslizo meu braço ao redor de sua cintura e sorrio. Não


estamos tentando esconder o afeto entre nós; ele está livre
distribuindo seus abraços e atenção e eu também. Mas não sou o
tipo de garota que constantemente precisa de alguém segurando
minha mão para me sentir especial. Então, novamente, isso não
diz muito porque ele poderia ter colocado um dedo no meu ouvido
e eu pensaria que é fofo. “Oi.”

Um dos outros amigos de Julian que está visitando também,


pigarreia, fazendo com que Sacha nos vire de volta na direção do
resto do grupo. Ele me puxa para mais perto e gesticula na minha
direção com a cabeça. “Gente, essa é minha Gaby. Princesa, esses
são...”

O tempo para.

Não consigo lembrar de nada depois que ele diz meu nome.

Minha Gaby.

Minha Gaby.

Não sou a Gaby de todos. Nem a Flabby. Nem a irmã de Eli.


Nem apenas a velha Gaby.

MARIANA ZAPATA
A Gaby do Sacha.

A única coisa que consigo captar é que o flerte levanta uma


sobrancelha porque estou no meu maldito mundo dos sonhos.

Quando Sacha entra no meu beliche mais tarde, no que se


torna nossa rotina, levanto uma sobrancelha. “Eu sou sua Gaby?”
Pergunto em um sussurro assim que nos instalamos sob meus
lençóis.

Meu amigo sorri aquele sorriso devastador que faz meus


ovários gritarem. “Sim.”

“Huh”, bufo.

Sacha mergulha a boca na minha, envolvendo um braço no


meu corpo e me puxa contra seu peito. “Você não sabe que é a
minha garota?” Ele pressiona um beijo longo e demorado nos meus
lábios.

Eu o beijo de volta, tentando deixar uma impressão


semelhante nele. “Não recebi o memorando.”

“Você não recebeu?” Ele pergunta com uma voz provocante.


Quando balanço minha cabeça, ele pressiona seus lábios no canto
da minha boca. “Você é.”

“Sou?”

Ele assente. “Sim.”

“Então você é meu Sassy?” Pergunto contra o seu pescoço,


passando a boca sobre a pele lisa ao lado do seu ombro.

Sacha geme quando o beijo lá. “Todo seu”, ele esclarece com
voz rouca.

“Bom.”

“Acho que sim.”

Nós sorrimos um para o outro.

MARIANA ZAPATA
Seu dedo indicador sobe para fazer o contorno da minha
orelha. “Ouvi que Sam estava flertando com você a noite toda.”

Meus olhos estão ocupados demais sendo fechados em


resposta ao seu toque, para visivelmente captar qualquer
expressão que esteja em seu rosto. “Esse é o amigo de Julian?”
Pergunto em voz baixa, quase sonhadora enquanto ele dá um beijo
ao lado do meu cabelo.

“Mhmm”, ele responde, colocando os lábios no mesmo lugar


novamente.

“Então sim, ele estava.” Leva mais autocontrole do que deveria


ter que abrir uma pálpebra e espiar.

Sua resposta é um resmungo que atinge todo o caminho até


os dedos dos pés. “Que pena para ele.”

Então acontece apenas uma sequência de lábios e mais


lábios, mãos nas costelas e sob as camisetas. Ele inclina a boca
sobre a minha, e escova minha língua, repetidamente. A mão que
tenho em seu quadril, começa a passar para baixo de sua
camiseta, alisando a pele quente e músculos magros.

A mão de Sacha aperta meu quadril antes de subir pela minha


camisa, as pontas dos dedos roçando a pele do meu estômago. É
um gesto tão inocente, mas me faz congelar. Isso me lembra do
que eu estou adiando dizer a ele.

Sacha, sendo maravilhoso, deve ter sentido a mudança na


tensão correndo por mim, porque para e se afasta um pouco.
“Muito?”

Deus o abençoe. Me inclino o suficiente para poder beijar sua


clavícula, meu coração acelerado por causa de nossos beijos, mas
principalmente porque estou preocupada em contar a verdade.
Realisticamente, sei que as chances são que ele não recue em
desgosto, grite ou qualquer coisa ruim assim, mas... a ideia de

MARIANA ZAPATA
compartilhar este pequeno segredo ainda é intimidante e um
pouco assustadora. E se ele achar estranho? Eu sou esquisita.

“Tem algo que preciso te dizer”, falo antes que possa mudar
de ideia.

Ele sorri gentilmente. “Ok.”

Ok? Bem, tudo bem. As pontas de seus dedos roçam o mesmo


ponto no meu estômago em que estavam quando surtei. “Eu tenho
silicone.” Pronto. Direto, sem introdução, droga.

Nenhuma única palavra ou som sai dele por possivelmente


cinco segundos. Então, de repente, ele cantarola e me beija. “Ok.”

Ok? É só isso? “Eles eram assimétricos. Eu fiz uma cirurgia”,


explico, embora ele não tenha perguntado, mas quero que saiba,
entenda. Não que isso importe, mas...

Isso faz com que ele recue alguns centímetros para me olhar
diretamente nos olhos. “Isso é uma merda, Princesa.”

Uhh... estou me sentindo decepcionada que ele não está


reagindo de forma diferente? “Isso é tudo que você tem a dizer?”
Pergunto.

Eu posso vê-lo piscar na escuridão do beliche. “Sim. Eu não


me importo se você tem silicone ou não. Sinto muito que tenha
passado por isso. Tenho certeza que foi difícil...” Ele acrescenta,
apertando meu quadril.

E é isso. Naquele momento, sinto que estou entregando o


resto da minha vida para esse homem. Com prazer. De boa
vontade. Sem esforço.

Nenhum de nós diz nada depois disso por um longo tempo.

Em um momento, enquanto estamos nos beijando, sua mão


segura meu peito sobre a camiseta e seu polegar roça meu mamilo.

MARIANA ZAPATA
Ele me rola de costas, se acomodando entre minhas pernas
como se vivesse lá há anos. Nós mantemos isso fácil e doce nas
noites anteriores. Ele continua me beijando, mas é quando o sinto
soltar seu peso para que nossos quadris pressionem juntos, que
quase choro lágrimas de alegria.

Sacha está quente e duro contra mim. Quando ele começa a


rolar seus quadris, pressionando o que parece ser um bom e longo
pau contra mim, não choramingo alto só porque sua boca está
colada a minha.

“Jesus, Gaby”, ele sussurra, revirando a pelve para que a


cabeça enrugada entre as pernas dele esfregue o ápice das minhas
através das nossas roupas finas.

Eu sei que precisamos ficar quietos, mas quando a língua dele


lambe meu pescoço antes dele começar a chupar suavemente,
tenho que morder meu lábio para não gemer como uma estrela
pornô total. Isso não me impede de envolver minhas pernas em
sua cintura e arquear contra ele. Minhas mãos vagam para cima e
para baixo em sua coluna, alisando os músculos tensos que estão
flexionando com seus quadris.

Seu polegar continua roçando meu mamilo, círculos lentos e


firmes que complementam o impulso constante de seus quadris e
pênis. A boca de Sacha está tão quente e sua língua tão sensual
que não consigo pensar. Aquela cabeça dura continua esfregando-
se contra mim tão deliciosamente que desejo mais do que qualquer
coisa que não estivéssemos no meu minúsculo beliche, cercado
por outras quinze pessoas, completamente vestidas.

Quando sinto o começo do orgasmo através da base do meu


estômago, pressiono a testa em seu ombro enquanto ele continua
empurrando seus quadris contra meu centro quente. Não há uma
dúvida em minha mente de que estou tão excitada que
provavelmente encharcarei minha calcinha e blusa. Mas quando
gozo, com manchas brancas pontilhando minha visão e um grito

MARIANA ZAPATA
abafado em seu pescoço, não me importo com onde estamos,
mesmo se estivéssemos no meio da rua.

Com mais alguns atritos contra mim, sinto seu corpo inteiro
apertar sob minhas mãos. Ele estremece, amaldiçoando tão baixo
que soa como um resmungo. Meus braços parecem soltos e muito
felizes quando os olhos de Sacha se encontram com os meus e
ganho um sorriso malicioso enquanto sou beijada mais uma vez.

“Você está me matando”, dou um gemido antes de ele sair de


cima de mim. Um sorriso enorme toma conta do meu rosto. Coloco
a cabeça na palma da minha mão, e simplesmente saboreio a visão
que é esse homem lindo.

Sacha pisca antes de rolar para o lado, acariciando as pontas


dos dedos no meu rosto com um sorriso. Ele suspira antes de se
inclinar e chupar meu lábio inferior por um momento. “Isso é
melhor do que...” Ele olha em meus olhos e faz uma pausa,
provavelmente pensando melhor em tudo que pode sair da sua
boca. “Tudo.” Sacha me dá um sorriso bobo antes de sair do meu
beliche para trocar de roupa.

Enquanto estou deitada lá, sorrio totalmente satisfeita. Essas


próximas três semanas serão incríveis. Apenas sei disso.

“Você já recebeu um pouco daquela abobrinha rosa?”

Começo a rir da pergunta de Laila. Peguei emprestado o


laptop de Gordo para usar o Skype com minha melhor amiga de
todo o planeta, sem contar os discípulos de Satanás e Sacha. Já
faz mais de um mês desde a última vez que conversamos, e tenho
muito a dizer a ela “pessoalmente” que não quero escrever em um
e-mail. Nós já falamos sobre tudo, exceto as coisas boas.

Especificamente, minhas sessões noturnas.

Só de pensar nelas me deixa toda quente e ansiosa.

MARIANA ZAPATA
“Ainda não”, resmungo, sorrindo. “É difícil o bastante quando
há outras quinze pessoas a poucos metros de distância.”

Laila sacode a cabeça enquanto sorri. “Você é uma vadia.”

“Eu nunca disse que não era”, dou risada.

“Mas vocês vão finalmente ficar em um albergue?”

Vamos viajar em uma van agora que estamos na França e


ficaremos em albergues e hotéis baratos. Estou animada para
dormir em uma cama de verdade. Certo. ‘Uma cama de verdade’.
Vamos pensar assim. “Sim, vamos.”

“Boa sorte com esse vegetal!” Ela pisca.

Bufo e dou a ela um sinal de positivo. “Vou virar vegetariana,


espere e verá.”

Sua cabeça abaixa para fora da tela, mas sua risada alta e
forte é claramente captada pelo microfone. Sua frase “há algo
seriamente errado com você” me faz rir.

“Estou te ensinando meus truques, garota. Tome notas.”

Isso a faz rir ainda mais, o topo de sua cabeça espreitando na


parte inferior da tela. Lentamente, ela se senta, sua pele escura
está ruborizada enquanto enxuga os olhos. “Eu tenho meus
próprios truques. A donzela em perigo funciona sempre. “

Sempre penso que a autoconfiança de Laila é uma das


melhores coisas sobre ela. Aquela garota sabe que é especial.

“Você contou a ele sobre Lucy e Ethel?” Ela pergunta.

A lembrança daquela conversa ainda está fresca. “Oh sim. Ele


nem sequer piscou. Depois, disse que achava que eu estava sendo
tímida...”

Isso a faz gritar. “Tímida? Você?”

MARIANA ZAPATA
“Cale a boca”, falo com uma risadinha divertida. “E daí se
gosto de usar shorts, me deixe em paz.” Meu irmão começa a gritar
meu nome do corredor, então suspiro. “Eu preciso ir. Eli está
gritando ‘Doutora Flabby’, e parece estar morrendo. Vou te mandar
um e-mail em breve, ok?”

Ela assente e me manda um beijo que retribuo antes de cada


uma desligar o Skype. Estou colocando o computador para
hibernar quando duas mãos grandes se curvam sobre meus
ombros.

“Divertiu-se conversando com Laila?” A voz de Sacha está


baixa enquanto ele fala.

Olho para ele, sorrindo. “Sempre. Eu sinto falta dela.”

Ele sorri de volta antes de se inclinar para plantar um beijo


de cabeça para baixo nos meus lábios. “Seu irmão está procurando
por você. Ele está com uma farpa que não consegue alcançar e se
recusa a deixar que alguém tente tirá-la.”

Claro. “Doutora Flabby está a caminho.”

Ele ri. “Se você fosse uma médica e sua foto estivesse online,
eu provavelmente me tornaria hipocondríaco”, ele ri, dando um
passo para trás.

Saio da cadeira e deslizo o laptop debaixo do braço, sorrindo


para o cara na minha frente que é muito bom para seu próprio
bem. “Obrigada?” Eu pisco. “Eu acho.”

Ele passa um braço por cima do meu ombro e me puxa para


ele rudemente. “Eu até deixaria você fazer um exame retal.”

Nós dois rimos tão alto que ecoa pelo corredor. Honestamente,
estou surpresa por não ter caído no chão, mas provavelmente é
porque estamos abraçados.

“Deixe-me ir para a faculdade de medicina agora”, digo a ele,


batendo em seu estômago com as costas da mão.

MARIANA ZAPATA
“Estou pronto para me abrir quando você estiver.”

Oh meu Deus. Começo a rir de novo, batendo a mão no meu


rosto. “Deixe-me investir em uma boa lanterna então.”

Ele deixa cair o braço e beija minha bochecha de forma


desleixada, molhada e perfeita enquanto ri. “Onde você esteve
durante toda a minha vida, hein?”

“No Texas?” Ofereço com uma cara estúpida.

Sacha apenas balança a cabeça, sorrindo, antes de apertar


meu pulso e unir nossos dedos. “Nesse caso, estou feliz que tenha
saído de lá.”

Apenas ao chegarmos a Zurique podemos ficar em um hotel.


As pousadas em que ficamos enquanto as bandas tocavam em
Frankfurt e Stuttgart eram boas, exceto que fiquei presa dividindo
um quarto com meu irmão, Mason e Gordo nas duas noites. No
primeiro dia quando acordei, eles desenharam bigodes no meu
rosto com um marcador. Na segunda noite, certifiquei-me de
dormir de bruços com um lençol sobre a cabeça. Idiotas.

“Eu tenho meu próprio quarto”, Sacha informa quando


estamos na van em direção ao hotel.

Levanto a sobrancelha para ele, sorrindo. “Sério?”

Ele assente, estreitando aqueles olhos cinzentos na minha


direção. “Fique comigo. Sinto falta da sua bunda grande contra
mim.”

“Claro que você sente.” Eu me inclino para ele. “Vou pedir a


Carter que divida um quarto comigo para não ter que ouvir Eli
cantando sobre ‘você e eu sentados em uma árvore’ amanhã de
manhã.”

MARIANA ZAPATA
Sacha sacode a cabeça, com um sorriso enorme. “Ele me disse
mais cedo que se eu transar com você durante a turnê, teremos
que nos casar e dar o nome dele ao bebê.”

Jogo a minha cabeça para trás e dou risada. “Oh Deus.”

Ele encolhe os ombros. “Estou de acordo com os termos.”


Sacha beija minha bochecha antes de abaixar a voz. “Vamos
começar hoje à noite”, ele brinca. Pelo menos eu acho que é uma
provocação.

“O que?” Grito porque a coisa toda de bebê meio que me


apavora. Amo crianças, só não tenho certeza se quero tê-las em
breve. Ou algum dia.

“Estou brincando”, ele sorri gentilmente, estendendo a mão


para segurar a minha e apertar. “Pelo menos sobre as crianças.
Nós temos que descobrir como ficarão as coisas quando eu viajar
novamente.”

O lembrete de que isso entre nós é tão novo, que ele vive em
um estado e eu moro em outro, fixa um lugar no meu peito. Estou
tão acostumada a vê-lo quase o dia todo, todos os dias que não
tenho certeza do que vamos fazer quando a turnê terminar em
algumas semanas. Eu não quero falar sobre isso. Sacha dizer que
teremos que descobrir isso me dá uma espécie de garantia de que
ele está disposto a ter algo para trabalhar uma vez que a vida volte
ao normal.

Quando chegamos ao hotel, sigo Sacha para o seu quarto,


afastando meu irmão quando ele começa a gemer no corredor, “Eu
vou passar mal.”

Eu não me acostumo como tudo parece menor na Europa. Os


quartos são mais compactos, e até mesmo o chuveiro é mais
estreito do que estou acostumada. Mas não reclamo quando deixo
minha mochila no chão ao lado da cama de casal.

“Você quer tomar banho primeiro?” Sacha pergunta.

MARIANA ZAPATA
“Você pode ir primeiro. Você é mais rápido”, digo a ele.

Ele assente, vasculhando sua mochila em busca de roupas e


artigos de higiene antes de entrar no minúsculo banheiro. Em
menos de dez minutos, ele termina e penso que morri e fui para o
céu. Vestindo apenas seu amado short preto de basquete, é um
milagre que eu não esteja de pé, porque teria caído. Sacha tem
músculos seriamente definidos no seu tronco, ele é todo plano e
músculos definidos, me deixando babando em aprovação.

E o bastardo sabe disso porque apenas sorri na minha


direção.

“Cale a boca”, sussurro quando passo por ele apenas para


me voltar e apertar sua bunda antes de fechar a porta. Eu posso
ouvi-lo rindo do outro lado enquanto tomo banho rapidamente.

Assim que termino de me vestir, abro a porta para encontrá-


lo esparramado em cima da cama, ainda sem camisa, trocando os
canais da televisão pequena. Sorrio antes de me sentar ao lado
dele. Ele olha para mim antes de estender a mão na minha coxa,
esfregando todo o comprimento.

Aproveito o tempo para contar as sólidas faixas de tinta que


rasgam seu braço. Há treze delas no total, começando em seu
pulso e subindo até o ombro em espaços perfeitamente uniformes.
“Há algum motivo para isso?” Pergunto, sabendo que seu olhar
ainda está em mim.

Sacha pega minha mão com a dele e a coloca em seu


antebraço. “Cada faixa é um lembrete do número de gravadoras
que nos rejeitaram antes de recebermos um sim”, ele responde.
“Eu gosto de lembrar que não importa o quão bem-sucedido eu
possa ser agora ou no futuro, a jornada não foi fácil.” Ele para por
um momento. “Isso é brega?”

“Não”, respondo, porque não é. Este é o meu cara muito


humilde que não age ou parece da maneira que eu esperava no

MARIANA ZAPATA
começo. “Eu acho que é legal.” Deslizo a ponta do meu dedo ao
redor da faixa que cobre seu cotovelo. “E aquela no seu peito?”

Ele olha para o espesso redemoinho preto em seu peitoral.


“Eu só achei que parecia legal”, ele ri.

Eu balanço a cabeça, rindo. “Você é um idiota.” Cutuco seu


estômago esticado. “A do pescoço?” Passo as teclas do piano com
os dedos e vejo quando ele inclina a cabeça para o lado para senti-
los na sua pele.

“É o meu instrumento favorito. Você sabia que comecei a tocar


quando tinha três anos?” Nego com a cabeça. “Sim. Fiz aulas de
música clássica. Lembro-me da minha mãe sentada atrás de mim
no banco antes que eu tivesse idade suficiente para alcançar os
pedais, tentando me ensinar.”

Quão fofo é isso? Um garotinho de pele clara com cabelos


negros e enormes olhos cinzentos? Bah. Mantenho isso para mim
e pergunto: “Você tem mais tatuagens?”

“Uma”, ele diz de forma tranquila.

“Onde?” Pergunto com desconfiança.

Seus olhos piscam. “Na minha bunda.”

“De jeito nenhum!”

“Desse jeito.”

Um segundo depois, estou tentando rolá-lo para olhar sua


bunda, mas ele agarra meus pulsos para me impedir de fazê-lo.
“Deixe-me ver”, imploro.

“Não.”

“Vamos lá.”

Ele balança a cabeça severamente.

“Por que não?”

MARIANA ZAPATA
“Foi a primeira tatuagem que fiz”, ele admite.

Sorrio, me divertindo com o fato de que ele ainda está


segurando meus pulsos. “Não pode ser tão ruim assim.” Quando
ele não diz nada em resposta, fico com um pouco de medo. “Sério.
O que é? Contanto que não seja uma tatuagem tribal, não pode ser
tão horrível.”

Sacha olha para mim pelo que parece um longo tempo. “É do


meu cachorro.”

Pisco para ele. “Cale-se.”

“É”, ele bufa a resposta, sorrindo tanto que não consigo levá-
lo a sério.

Tento puxar minhas mãos fora do seu aperto, mas não


consigo. “Você é um maldito mentiroso.”

Ele me puxa contra seu corpo, beijando minha garganta


suavemente. “Ok, acho que você pode ver”, ele murmura contra
mim. Um momento depois, está virando de joelhos e estou
puxando o short e a cueca boxer para um lado.

Não há nada lá.

Eu puxo para baixo o outro lado, e não há nada lá também.

“Mentiroso!” Dou risada ao mesmo tempo em que bato na


metade inferior da sua bunda o mais forte que consigo.

Com um grito, Sacha se vira, envolvendo um braço em minha


cintura para me puxar para baixo dele. Seu longo corpo estica
sobre o meu até que estamos quadril com quadril. Ele balança a
cabeça. “Oh Gaby, Gaby. Você quer brincar assim?”

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 24

Sacha recebe um único bom tapa.

Eu não sei o que estava pensando quando bati nele. Esse é


Sacha. Eu deveria saber que ele revidaria de alguma forma. E ele
faz. Em um piscar de olhos, me vira de bruços e bate na minha
bunda com tanta força que haverá, com certeza, um hematoma lá
amanhã.

A coisa especial sobre o meu relacionamento com esse cara,


a coisa que nos faz diferentes, é que nós rimos o tempo todo.

Nem em um milhão de anos eu poderia imaginar que ser


espancada por outra pessoa poderia ser engraçado e também
muito sexy. Eu posso culpar o último pelo fato de ter visto sua
bunda musculosa e fofa segundos atrás. Meu Sassy é algo
especial. Se há uma fração de dúvida em meu cérebro de que sou
louca por esse cara, que sinto uma conexão com ele que supera
qualquer outro relacionamento que tive no passado por léguas
marítimas, isso é esquecido.

“Seu puto!” Grito contra a colcha da cama, afastando meus


quadris para longe.

Seu peso cai sobre mim, seu peito pressiona contra minhas
costas, e posso sentir seus lábios no meu pescoço. “Princesa”, ele
diz com um bufo.

“Isso dói!”

Ele bate mais forte, me beijando uma e outra vez. “Gaby”, ele
murmura. “Eu diria que sinto muito, mas não sinto.”

MARIANA ZAPATA
Eu uivo de dor até que a palma da mão dele alisa da lateral
até a parte inferior das minhas costas e lentamente avança para
minha bunda ainda doendo; chupo uma respiração raivosa.
Aquela palma grande acaricia, esfrega e amassa a carne
suavemente. O que faço? Arqueio minhas malditas costas.

Sua mão livre empurra a parte de trás da minha camisa para


cima, até que todo o material se acumula sobre meus seios e no
meio das minhas costas. “Você é tão suave”, ele diz com uma voz
rouca bem antes de lábios quentes e molhados se arrastarem pela
minha espinha. “Deus, Gaby”, ele geme quando me enrolo nele
ainda mais.

“Hmm?” Murmuro incoerentemente, saboreando a sensação


de sua boca e pele quente na minha.

Sinto algo infinitamente mais quente que seus lábios e muito


mais molhado nas minhas costas. Ele me lambe. Oh, meu senhor,
Sacha — o homem mais lindo de todos os universos — está me
lambendo. Ambas as mãos deslizam ao redor da minha cintura.
Seus dedos cutucam o elástico da minha calça de pijama, antes de
puxá-la para baixo devagar e eroticamente.

Não é até sentir sua boca no meu ombro e seus dedos


mergulhando na frente da minha calcinha que penso que a terra
se partiu em um milhão de fragmentos. “Sacha”, seu nome sai dos
meus lábios.

Ele geme meu nome em resposta, as longas pontas dos dedos


levemente calejadas roçando a parte inferior do meu corpo, sem
parar até que ele acaricia a fenda lá várias vezes. “Merda”, ele
sussurra no meu ouvido. Um único dedo mergulha em mim ao
mesmo tempo em que ele usa a outra mão para puxar minhas
costas contra seu peito. A posição lhe dá acesso ao meu pescoço,
onde começa a chupar levemente.

Grito quando ele desliza outro dedo em mim, me tocando tão


lentamente que não consigo respirar pela doce antecipação. Que
diabos minhas mãos estão fazendo, eu realmente não tenho ideia.

MARIANA ZAPATA
Acho que estão nas suas coxas, apertando com força. “Isto é tão
bom.”

Ele cantarola, beliscando levemente entre meu pescoço e


ombro. “Eu quero você tão fodidamente que dói.”

O balanço dos meus quadris contra seus dedos deve ser


resposta suficiente para o seu pedido, mas viro minha boca para
beijá-lo, longa, profunda e lentamente. É só quando me afasto de
seus lábios que peço. “Por favor.”

Sacha puxa minha calça e calcinha pelas pernas um segundo


depois, dando-me um tapa leve onde a mão dele esteve por último.
Lábios úmidos beijam uma nádega e depois a outra antes de me
rolar para a posição sentada. Sua boca cobre a minha novamente,
beijando-me lentamente, sugando um lábio e depois o outro em
sua boca enquanto suas mãos brincam com o tecido da minha
camisa, puxando-a para cima e sobre a minha cabeça.

Seus olhos varrem meu corpo, um grande sopro de ar


enchendo seus pulmões quando ele faz isso. Mesmo não tendo
optado pelos maiores peitos do universo, gosto de Lucy e Ethel o
bastante. Eles agora são tamanho G com pequenas linhas
cicatriciais embaixo de cada um. Parecem tão naturais quanto
possível. Sacha me empurra de costas gentilmente, arrastando a
boca aberta e os lábios pelo meu queixo, por cima do meu maxilar,
pescoço, clavícula, antes de se instalar no mamilo direito. Não é
minha imaginação quando o sinto estremecer em cima de mim.

Estou puxando seus shorts e cuecas para baixo de seus


quadris com as mãos e, em seguida, com meus pés quando não
consigo mais alcançar. Meus dedos percorrem o caminho para
cima e para baixo de suas costas, dos ombros a bunda. Minhas
pernas se abrem mais ao redor de seus quadris nus. Quanto mais
pele vejo — toda essa pele lisa e levemente bronzeada, quanto a
pele pintada com traços negros de tinta — mais tento acreditar em
quão sortuda sou.

MARIANA ZAPATA
“Você está me deixando louco”, ele geme, lambendo meu
mamilo. “Preciso de você agora mesmo.” Seu pau pesado e quente
roça a parte interna da minha coxa enquanto ele remexe os
quadris. “Eu posso?”

O “sim” explode na minha língua com a pressa.

Sacha se afasta. Seus lindos olhos verdes estão pesados e


cobertos de luxúria e algo mais que não consigo decifrar. Ele
inclina a boca contra a minha antes de se afastar e pressionar
nossas testas juntas. Um dedo roça meu seio enquanto outro
acaricia minha mandíbula.

Fecho os olhos porque tudo parece demais. A sensação dele


em cima de mim, como seus olhos me fazem sentir que não
pertenço mais a mim mesma. Mas me sinto como uma covarde
fazendo isso, então abro-os novamente.

Ele sorri para mim gentilmente antes de se esticar sobre meu


corpo, cavando em sua mochila por um segundo, pegando uma
pequena caixa lá dentro. “Você é um sonho se tornado realidade”,
ele diz suavemente, quando volta ao lugar, beijando sobre o meu
coração.

Ao ver o pacote preto e dourado em sua mão, olho para seu


rosto. “Você é perfeito”, digo a ele.

Sacha me beija, afastando-se para olhar para baixo. Posso ver


suas mãos tremendo quando abre o preservativo e senta em seus
calcanhares. Não sei como não falo algo como “puta merda” ou “oh
meu Deus”. Enquanto ficamos no meu beliche, tudo que fizemos
foi com roupas. Eu nunca coloquei minhas mãos em sua carne.
Então, quando olho para baixo, do seu peito nu e duro, os
músculos simétricos em seu abdômen até chegar no seu pau
espesso, comprido, duro e orgulhoso no ar, respiro fundo.

Ele rola o preservativo sobre a cabeça larga e empurra entre


suas coxas e sobre o eixo que se alarga na base. Sacha envolve
suas mãos em meus quadris puxando em direção a ele assim que

MARIANA ZAPATA
está totalmente protegido. A ponta desliza para cima e para baixo
na minha vagina, a ponta esfregando de um jeito gostoso, que
choramingo.

Mais um beijo e ele está se apoiando nos cotovelos,


prendendo-me entre seus bíceps. Outro beijo suave e gentil e ele
está se ajustando para pressionar a ponta suavemente.
Lentamente, ele empurra. Eu me abro mais e estico em torno dele,
centímetro por centímetro até que está enterrado ao máximo. Os
pelos curtos da sua pelve estão pressionados contra meus lábios
macios.

Sacha solta um ruído que soa estrangulado, mas pressiono a


testa contra seu ombro, tentando passar todo sentimento a ele.

Depois de um minuto ou cinco, ele sai de mim lentamente


antes de deslizar de volta no mesmo ritmo lento. Então faz
novamente. E mais uma vez. Cada vez mais lento, ele empurra
seus quadris profundamente em mim. “Eu não vou durar tanto
tempo”, ele sussurra, beijando o canto da minha boca.

“Tudo bem.” Está mais do que bem. Melhor do que bem.

“Você é gostosa demais. Sinto muito”, ele ofega, e empurra


forte.

Eu grito.

“Todo dia. Eu quero você todos os dias”, ele geme. “Você é a


melhor coisa do mundo.” Ele nos vira depois disso, nunca saindo
de mim ou soltando o contato de nossas bocas quando rolamos.
“Monte em mim”, ele implora. “Eu quero que você goze.”

Sorrio para ele, me sentindo mais incrível do que qualquer ser


humano deveria ser capaz. Deslizo para cima e para baixo do seu
pau longo lentamente. Menos de um minuto depois, estou suando
e empurrando mais rápido. “Oh meu Deus.”

Seus quadris empurram, fora de ritmo ou sincronia, e gozo


forte, meus músculos abdominais contraídos. Mal termino meu

MARIANA ZAPATA
orgasmo, ainda com a visão embaçada, quando ele investe para
dentro de mim ainda mais rápido, ofegante em meu pescoço.
Sacha fica tenso, pressionando os lábios contra o meu peito com
um abafado “Porra!” Ele goza, esvaziando-se dentro de mim.

Nos próximos minutos, enquanto se acalma, ele joga fora o


preservativo e volta para a cama, e sinto como se estivesse vivendo
um sonho. Sacha está se enrolando em meu corpo, empurrando o
cabelo fora do meu rosto e sorrindo de orelha a orelha — um
sorriso que deixa todos os outros humilhados.

“O que significa esse olhar?” Pergunto a ele, passando a mão


pelo braço tatuado.

Seu sorriso se torna bobo e doce. “Você me deixa tão feliz,


Princesa. Você não tem ideia.”

“Você é idiota.”

Sacha brinca, passando as mãos pelos meus pés para colocá-


los em seu colo. Nós estamos em Berlim, sentados em sua cama
jogando Uno. Mais cedo caminhamos com Julian e Freddy e depois
seguimos para o local do show. Agora que tudo acabou, podemos
finalmente permitir que a exaustão nos atinja com força total.
Quase três meses de turnê sem fim estão finalmente cobrando seu
preço.

Eli e Gordo ficaram doentes na semana passada. Mason


parece ter perdido uma briga com um chupacabra. O pobre Carter
parece mais magro e pálido do que o normal. Os outros caras do
TCC não estão se saindo muito melhor. Nossos corpos não foram
feitos para estar em movimento por tanto tempo, dormindo pouco
e se alimentando tão mal, mas nossos corações estão tentando
acompanhar.

Acho que a única coisa que me mantém em movimento é


Sassy.

MARIANA ZAPATA
E o pedaço de Malykhin entre suas coxas.

Desde aquela noite em Zurique, nos transformamos em


adolescentes excitados. Nenhum banheiro ou quarto de hotel foi
poupado. É fodidamente fantástico. Mágico. Um sonho molhado se
tornando realidade.

Meu coração e corpo não são páreo para este homem.

“Não é minha culpa que eu saiba jogar”, rio.

Ele me dá um tapinha na testa. “Não há estratégia para isso,


você só está com sorte.”

Pego uma carta do baralho e jogo na cara dele. “Existe uma


estratégia. Você não pode continuar colocando todos os seus +4 e
+2 quando os pega, duh. Você precisa esperar até que tenha
poucas cartas e então me fazer comer merda.”

“Isso não faz qualquer sentido”, ele franze a testa, me


cutucando na lateral antes de colocar um quatro azul.

Dou risada e coloco um símbolo azul. “Diz o homem que não


ganhou de mim uma vez.”

Sacha ri. “Eu posso ganhar de você em muitas outras coisas.”

É a verdade, mas dou de ombros, sorrindo. “Talvez, mas não


nisso, otário.”

Quatro rodadas depois, ganho novamente. Ele pega a pilha de


cartas e joga no ar com um bufo. “Isso é o que penso sobre você
ganhar.”

“Você é um merda.”

Ele cai de volta na cama, me puxando para baixo ao lado dele.


“Você é muito melhor do que eu”, murmura, beijando meu
pescoço.

Tremo, inclinando a cabeça para que ele possa ter acesso a


mais do meu pescoço. “Verdade.”

MARIANA ZAPATA
Sacha arrasta a língua quente pela minha orelha. “Gaby?”

“Sim?”

Sua mão lentamente acaricia meu braço. “Temos apenas uma


semana”, ele diz em uma voz suave, lembrando que nosso tempo
juntos está chegando ao fim.

Movo a cabeça para beijar sua mandíbula, ignorando a


ansiedade que atinge meu estômago. “Eu sei.”

“O que nós vamos fazer?”

Olhos cinzentos encontram os meus, algo como preocupação


ou tristeza preenche até a borda dos seus cílios. Estive querendo
perguntar isso a ele, mas sou uma covarde. Nesse momento,
lamento não ter mencionado antes.

“Fazer dar certo?” Ofereço a ele.

Ele joga a cabeça para trás e ri. “Não brinca.” Dedos enrolam
no meu pulso, puxando minha mão em seu peito. “Isso tem que
funcionar.”

“Oh sim?”

Sacha assente, ainda sorrindo. “Sim, Princesa. Sim.”

Beijo sua bochecha, deslizando uma perna entre as suas. “Eu


sei.” Beijo sua bochecha novamente. “Quem mais vai manter você
entretido se eu não estiver junto?”

Depois de uma breve pausa sem resposta, nos entreolhamos


e rimos.

“Julian?”

Ele beija meu nariz enquanto seu peito vibra com uma risada
áspera. “Eu te amo.”

A admissão esmaga meu coração, apertando e me arruinando


pelo resto da minha existência. “Eu sei.”

MARIANA ZAPATA
“Você sabe?” Ele me pergunta baixinho.

“Sim.” Me afasto para ver melhor a pele suave do seu rosto,


seu cílios longos e escuros que emolduram seus olhos coloridos.
Não é necessário pensar em todas as coisas que ele fez e faz para
que eu saiba que ele se importa comigo, principalmente porque,
pela primeira vez na vida, sinto sua afeição. Sua atenção. Sinto
Sacha de uma maneira que não tem explicação ou razão. Conheço
o amor em suas muitas formas. Sei como amo Eli de uma forma
que faz todo o sentido porque ficamos presos por tanto tempo
juntos. Sei que amo os outros dois babuínos, mas isso... não é
nada parecido. É inegável, brilhante e maciço.

É um arco-íris, um unicórnio, um bilhete de loteria de um


milhão de dólares e felicidade encarnada, tudo em uma só coisa.

“Eu te amo. Muito.”

Seu sorriso é do tamanho de Júpiter e mais brilhante que o


sol. “Eu...” Ele gagueja, corando. “Eu...”

“Você pode colocar para fora”, provoco-o.

Sacha sorri. “Quanto?”

“Quanto o quê?”

Reviro meus olhos. “Eu acabei de dizer ‘muito’. Muito.


Demais.” Murmuro em sua garganta. “Por quê?”

“Porque se você não me ama muito mesmo, terei muito mais


trabalho a fazer até que se sinta assim”, ele afirma.

Isso é suspeito. “Por que?”

“Porque não acho que vou gostar de estar longe de você


quando a turnê acabar.” Ele puxa meu lóbulo da orelha,
envolvendo o braço em minha cintura para me colocar em cima
dele. Ele já está duro, pressionando contra o tecido fino de sua
cueca boxer.

MARIANA ZAPATA
“Acho que também não vou gostar”, admito, tentando não
balançar sobre sua ereção grossa, mas falhando miseravelmente.
“Você não tem que fazer uma turnê novamente por pelo menos
alguns meses depois disso, certo?”

Ele acena em resposta. Seus dedos deslizam por baixo da


bainha da minha camiseta. “Não. Vamos apenas ficar escrevendo
até estarmos prontos para o próximo álbum. Esta é a última turnê
do ciclo.”

“Nós vamos descobrir o que fazer”, prometo, deixando-o tirar


minha camiseta. Seus polegares roçam meus mamilos lentamente.
Desviando o olhar do movimento de seus dedos, sorrio, absorvendo
seu rosto bonito. “Nós temos que descobrir.”

“Doze homens?” O motorista da van, que também é nosso


tradutor, confirma com Julian quantas pessoas estão no nosso
grupo antes de passar a informação para a recepcionista que
trabalha no hotel em Muenster.

Dou uma olhada de lado para o meu irmão, que está de pé


comigo. “Tenho certeza que não sou um homem”, sussurro.

Eli ri, empurrando o cotovelo para acertar minha costela mais


baixa. “Veja que ninguém se incomoda em corrigir o fato?”

“Idiota.”

“Apenas falando a verdade, Flabby. Você é praticamente um


de nós.” Ele ri. “Só Sacha acha que você é bonita, e eu acho que
você tem um cabelo bom.”

“Eu acho que seu cabelo é melhor, seu babaca.” Acerto ele de
volta. “Mas obrigada por dizer que gosta do meu cabelo.”

Eliza revira os olhos, cutucando-me na testa antes de seguir


Christof, nosso tradutor extraordinário, pelo corredor que leva aos

MARIANA ZAPATA
nossos quartos de hotel. “Quer comer naquele pequeno
restaurante que passamos no caminho até aqui?”

Concordo, parando na porta que Christof explica ser meu


quarto. Meu irmão segue atrás dele. Eu mal abro a porta quando
uma presença surge atrás de mim. “Princesa”, Sacha diz quando
se aproxima de mim e abre mais a porta.

“Sas”, sorrio para ele, entrando.

Ele segue atrás de mim, largando a bolsa na porta. “Senti sua


falta hoje.”

“Eu também”, digo, largando minha bolsa ao lado da dele e


passando meus braços ao redor de sua cintura.

Ele esteve ocupado o dia todo. Houve duas entrevistas com


revistas alemãs, uma entrevista na televisão e, em seguida, uma
passagem de som com equipamento ruim que levou o dobro do
tempo que deveria. Só nos vimos quando acordamos e tomamos
café da manhã, e depois de passagem durante o dia. Passei a tarde
no Prinzipalmarkt e no museu Pablo Picasso com Carter antes de
voltarmos para montar o stand de vendas.

Como diabos devo lidar com não estar perto dele em poucos
dias? Em vez de estarmos separados por portas e ventiladores,
serão milhares de quilômetros e cordilheiras que irão nos separar.
Isso faz meu coração doer ao pensar.

“Estou muito cansado”, ele murmura, beijando meu nariz.


“Minha garganta está começando a doer também.”

Estremeço. “Eli disse algo sobre sair para comer, quer que eu
traga alguma coisa para que você possa ficar aqui e descansar?”

Sacha assente, suspirando. “Por favor. Apenas comida. Vou


fazer um chá, tomar banho e me deitar...”

“Nu?” Pergunto a ele, levantando as sobrancelhas para tirar


sua mente das dores.

MARIANA ZAPATA
Ele ri. “Para você, qualquer coisa.”

Dou um beijo em seus lábios que dura décadas, outro em sua


garganta e começo a recuar em direção à porta antes de parar. O
que diabos estou fazendo saindo? “Você quer que eu fique?”

“Eu vou ficar bem. Prefiro ficar aqui e você me traz alguma
coisa para comer.”

Olho para ele mais um segundo antes de concordar. “Ligue


para Eli se precisar de mim, ok?”

“Eu vou”, ele tosse fracamente. “Pão dura.”

Ele sabe que ainda estou me recusando a ligar meu celular


para evitar as cobranças de roaming, pisco e saio do quarto. Eli
está no corredor com as mãos enterradas nos bolsos do short. Ele
acena antes de sairmos do hotel em direção a um restaurante
aberto.

“Você está bem?” Pergunto.

Ele balança a cabeça lentamente, os cachos em sua cabeça


chamando minha atenção. “Ainda me sinto um merda e estou
pronto para ir para casa.”

“Eu sei disso.” Realmente sei. Estou cansada de hotéis, pouca


ou nenhuma privacidade, e sempre estar em movimento, mas a
ideia de não ver as pessoas de quem me tornei tão próxima nos
últimos três meses regularmente, me chateia ainda mais.

Abrindo a porta na minha frente, ele estreita os olhos. “Você


já descobriu o que irá fazer quando voltamos?”

Lamento. “Não.”

“Nenhuma ideia?” Ele não acredita em mim. Eu geralmente


tenho um plano para tudo.

Nesse caso, só planejei os próximos quatro dias. Depois


disso…

MARIANA ZAPATA
“Nem uma única”, suspiro.

“E quanto ao seu amor?” Sua pergunta é baixa e cautelosa.

Eliza e eu realmente não conversamos muito sobre a situação


com Sacha. É estranho, pelo menos com meu irmão. Ele sabe como
me sinto, usando aquele sexto sentido especial, e foi o primeiro a
me dizer que Sacha sentia o mesmo, mas ainda assim. Eu sei que
as intenções de Sacha são puras e honestas. Isso não significa que
o futuro não seja assustador e cheio de variáveis mesmo assim.

“Ele está planejando me visitar uma semana depois que


chegarmos em casa.”

Eliza levanta uma sobrancelha. “Huh.”

“O que?”

Ele dá de ombros devagar demais. “Isso é.… rápido.”

“E?”

“É bom”, ele explica. “Isso me faz feliz, Flabby. Aquele cara


acha que você é a melhor coisa do planeta, e estou feliz que pense
assim. Você merece alguém assim.” Quando meus olhos começam
a ficar molhados com seu comentário, ele puxa a ponta do meu
rabo de cavalo com muita força. “Nenhum choro é permitido. Pare
com isso. “

“Você me ama.”

Ele geme e desvia o olhar. “Sim, eu amo, sua estúpida. Essa


é a minha boa ação do ano.”

Dou risada antes de envolver meus braços em seu bíceps


gigante. “Obrigada, E. Estou feliz que me convidou para vir nessa
turnê.”

Eli me lança um olhar enojado antes de abrir a boca, enfiando


o dedo na metade da boca como se fosse engasgar. “Confie em

MARIANA ZAPATA
mim. Nós todos sabemos como você é grata por estar na turnê, sua
prostituta safada.”

Ele não se surpreende quando lhe dou um soco no estômago.

“Vocês dois pombinhos vão resolver tudo. Eu não estarei em


turnê por um tempo, mas você é mais do que bem-vinda para sair
conosco novamente quando a próxima for confirmada”, ele diz.
“Ainda podemos morar juntos.” Abro a boca para dizer que
devemos fazer isso, mas ele me para. “Pense nisso. Dê algumas
semanas para ver o que acontece, Flabs. Tudo bem?”

Concordo com ele, grata por sua oferta, mas não tenho certeza
se gostaria de sair em turnê novamente depois de tudo isso,
mesmo que sejam meses ou anos a frente. Além disso, se Sacha
viajar e eu também, nunca conseguiremos nos ver. Algo profundo
na boca do meu estômago me diz que essa porcaria de longa
distância vai ser difícil.

Mas todas as melhores coisas da vida também são difíceis,


certo?

MARIANA ZAPATA
CAPÍTULO 25

“Por que você parece ter acabado de descobrir que Kulti casou
de novo?” Mason me pergunta em um sussurro alto. Nós estamos
na Antuérpia no último dia da turnê. A Cloud Collision está prestes
a voltar ao palco para seu bis e, enquanto Eli e Gordo conversam
com os fãs na plateia, esse babuíno me faz companhia.

Lembro que, na verdade, ele estava por perto quando descobri


minha paixão mais antiga: Reiner Kulti, o ícone do futebol alemão
que eu adorava, e um dia, há quinze anos atrás, teve a coragem de
se casar com uma atriz. Ugh. Foi um dia ruim, para dizer o
mínimo. “Estou triste que a turnê acabou.”

Ele encolhe os ombros. “Foi muito divertido, não foi?”

Balanço a cabeça, concordando.

Mason me dá um olhar bobo. “Você teve que fazer uma turnê


com os homens mais atraentes no Pla...”

“Acho que você está exagerando.”

Ele franze a testa, mas continua. “Teve que ver o mundo. Viu
um canguru pessoalmente...”

“Vi você quase ser socado pelo mesmo canguru...”

“Assistiu seu irmão ser atacado por aquele cara transexual...”

Faço uma careta para ele, lembrando do incidente. “Tenho


certeza que foi você.”

Mason nem se incomoda em confirmar ou negar minha


declaração. “Foi a um monte de museus chatos...”

MARIANA ZAPATA
Gemo. Mase e eu temos ideias muito diferentes para o que é
divertido.

“Teve que passar muito tempo com seus melhores amigos...”

Ele me ganha nessa.

“E conheceu seu pequeno bicho preguiça”, ele sussurra


batendo os cílios como um idiota.

Relaxo meu rosto para olhar para ele entediada. “Você


esqueceu uma coisa.”

“Carter rasgando as calças quando estávamos em


Estocolmo?”

“Não.”

“Julian e Eli fazendo sexo oral na mesma garota com uma


hora de intervalo?”

Engasgo com a lembrança dessa história. Os dois ficaram


insatisfeitos, mais Julian do que Eli porque ele foi o segundo a
brincar com a garota. Repugnante. “Não.”

Mason estreita os olhos. “O que então?”

“Eu te dando um soco no saco pela primeira vez”, digo a ele


enquanto balanço meu punho na direção de suas bolas.

Ele pula para trás com uma risada. “Jesus! Estou feliz por ter
cancelado o casamento, sua louca.” Ele grita, mas não posso ouvi-
lo porque a música recomeça tão alto que torna impossível.

Existem apenas algumas músicas no seu repertório de bis.


Depois de três meses em turnê, ouvindo as bandas noite após
noite, provavelmente posso cantar todas as suas músicas e tocar
todos os instrumentos de memória. E eu nem sei tocar qualquer
instrumento. Qualquer que seja.

Meu coração dói um pouco sabendo que esta é a última vez


que verei as bandas tocarem por sabe quanto tempo. Parece

MARIANA ZAPATA
agridoce que eu tenha concordado com relutância no início, só
querendo fugir da porcaria de voltar para casa. Agora estou triste
porque a experiência está chegando ao fim. Quem entende?

“Nós só temos algumas músicas, Antuérpia! Antes que fique


rápido e pesado, gostaríamos de agradecer a todos vocês por terem
participado da nossa turnê! Foram três meses insanos com nossos
amigos da Ghost Orchid, que estiveram com a gente. Obrigado à
nossa equipe e, especialmente”, Sacha coloca a mão sobre seu
coração, sorrindo um pequeno sorriso brincalhão, “a minha linda
garota, a melhor coisa desde a invenção do ar-condicionado,
minha Gaby, por fazer dessa a melhor turnê do caralho.” As
pessoas na plateia começam a assobiar e gritar coisas que não
entendo. “Vocês estão prontos pra caralho?”

“SIM!” A plateia grita em resposta.

Sacha aponta para a plateia antes de pular em cima de um


alto-falante, ao mesmo tempo em que os pratos da bateria
quebram no segundo que a última música começa.

Eu.

Eu.

Eu sou a melhor coisa desde o ar condicionado, e quem não


ama ar condicionado?

Quando olho para Mason com o que tenho certeza que é o


sorriso mais idiota que existe, ele faz uma careta e empurra minha
cabeça, o que só me faz sorrir mais.

Naquele momento, tomo a decisão de que não há nada, e


quero dizer, nada, que possa ficar entre Sassy e eu. Sempre será
ele. Ele é o fim do meu começo.

Uma hora depois, quando estamos parados do lado de fora


enquanto os caras terminam de dar autógrafos e posam para fotos
encharcados de suor e cheirando a meias sujas, me permito
absorver tudo. Sacha se aproxima depois de terminar uma

MARIANA ZAPATA
conversa com alguns fãs e sorri abertamente. O bastardo sabe que
desmaiei por ele e suas palavras. Além disso, ele ainda está usando
suas roupas de palco, especificamente os suspensórios que
acrescentou ao seu guarda-roupa de shows.

“Eu amo ar condicionado”, digo a ele, enfiando os dedos nos


seus quando ele para na minha frente.

Ele balança a cabeça, sorrindo o mesmo sorriso que tenho


certeza que estava no meu rosto enquanto ele falava com a plateia
mais cedo. “Eu também, Rocky. Eu também.”

Em vinte e quatro horas, estaremos separados por milhares


de quilômetros. Mas a distância é insignificante quando você ama
alguém do jeito que amo Sacha. Ar condicionado. E risadas.

MARIANA ZAPATA
EPÍLOGO

“Oiiii”, murmuro para a câmera no meu laptop.

“Olá, Princesa.” A tela na minha frente fica borrada enquanto


percebo que Sacha se move em torno do quarto de hotel. Um
segundo depois, a imagem foca no homem normalmente bonito.
Ele parece terrível. Seus olhos cinzentos estão sem brilho,
destacados por bolsas escuras embaixo delas.

“Você parece uma merda”, digo, observando a cor doente e


pálida de sua pele. É um sinal revelador da gripe que ele contraiu
dois dias atrás e ainda está chutando sua bunda.

Sacha sorri fracamente, rindo. “Feliz aniversário de


casamento para você, meu amor.”

Eu grito, temporariamente esquecendo que ele está doente.


“Feliz aniversário de casamento!”

“Sinto muito por não poder estar aí”, ele lamenta, passando
a mão pelo cabelo mais comprido. A última vez que eu o vi — quase
quatro semanas atrás — estava mais curto dos lados.
Recentemente, ele está ficando muito mais preguiçoso em cortar
meticulosamente, e eu gosto. Mas, de novo, eu provavelmente
ainda pensaria que ele é bonito mesmo se tivesse um mullet — o
verdadeiro sinal de um espécime perfeito.

Dou de ombros, sorrindo para ele através da câmera. “Está


tudo bem. Meu presente chegou pelo correio ontem, mas esperei
até hoje para abri-lo como a caixa dizia”, falo a ele em voz cantada,
com um balanço de sobrancelhas, segurando a pulseira legal que
ele me mandou da Indonésia. “Eu amei.”

MARIANA ZAPATA
Sacha inclina-se para a frente apoiando o queixo na mão,
ainda parecendo fora de si, mas feliz. A faixa lisa de ouro branco
em seu dedo anelar pisca para mim, lembrando-me que
exatamente um ano atrás, nós decidimos nos casar no último
minuto. Nem sequer tínhamos alianças no dia. Éramos apenas
duas pessoas aleatórias no tribunal que serviram como
testemunhas e nós. Semanas depois, finalmente compramos
alianças simples e não poderíamos ter ficado mais felizes.

Ficamos exatamente dois meses vivendo em estados


diferentes antes dele afirmar que a distância o estava matando.
Em sessenta dias, ele me visitou três vezes, e fui vê-lo duas vezes
em San Francisco antes de aceitar que não queríamos ficar tão
longe um do outro. Correção: não poderíamos estar tão longe um
do outro.

Um jogo de papel-pedra-tesoura via Skype decidiu quem iria


se mudar.

E eu mudei.

“Pensei em você quando vi.” Ele de alguma forma consegue


piscar para mim, apesar do fato de saber que ele se sente horrível.
“Eu tenho outro.”

“Outro presente?”

Ele assente.

Eu faço um barulho “ooh”. “Mostre.”

Seu rosto cansado se suaviza quando ele sorri


maliciosamente. Um momento depois, ele puxa a camisa sobre a
cabeça me dando uma visão perfeita do seu peito tatuado...

“Você tatuou meu nome!” Grito, me inclinando na cadeira


para dar uma olhada melhor nas lindas e loucas letras na minha
tela, porque isso definitivamente funciona.

MARIANA ZAPATA
“Não, eu fiz o nome do outro amor da minha vida.” Ele ri com
voz rouca.

“Sassy”, suspiro. O transe em que estou é tão poderoso que


não consigo pensar em uma réplica para sua resposta estúpida.
Meus olhos estão colados ao fato de que meu nome está
permanentemente tatuado em sua pele, espelhando diretamente o
redemoinho negro em seu outro peitoral. Há uma pequena
tartaruga no final do 'y' e de repente sinto o desejo de chorar. “Eu
sinto sua falta.” A declaração sai como um triste gemido. “Eu tenho
o seu presente aqui, pronto e esperando.”

O sorriso de Sacha não é perdido. “Você não tem ideia do


quanto sinto sua falta também, mas estarei em casa em três dias.”
Ele suspira.

“Nu?”

Ele ri. “Definitivamente...”

“Sachita!” A voz profunda e explosiva de Eli chama por cima


do meu ombro.

Reviro os olhos para o meu irmão. Ele me visitou pelas


últimas duas semanas, mas passa mais tempo com nossa vizinha
solteira de 20 anos do que com sua “irmã favorita”. Logo depois
que chegamos em casa da turnê The Rhythm & Chord, ele se
comprometeu a não ficar tanto tempo sem me ver. Fiel à sua
palavra, Eli altera seus planos para visitar, mesmo depois que
mudei para o outro lado do país. Inferno, Mase e Gordo vem junto
na metade das vezes. Nenhuma distância é suficiente para acabar
com essas amizades.

“Ei, E”, Sacha grita com um aceno.

“Eu e Gaby fomos ver o novo filme dos Transformers”, meu


irmão lhe oferece a informação, apesar de termos combinado não
dizer a Sacha que fomos, somente se ele perguntasse. Bastardo.
São os filmes favoritos de Sacha.

MARIANA ZAPATA
Ele ofega. “Você foi sem mim?”

Balanço a cabeça para ele devagar, séria. “Eu sinto muito. Nós
estávamos realmente entediados, e prometo ir assistir com você de
novo quando chegar em casa.”

“Você tem sorte de eu te amar”, ele sorri. Ele ama seus filmes,
mas me ama mais.

“Eu sei, Sassy.” Sorrio de volta para ele, esquecendo


completamente que Eli está de pé atrás de mim.

“Eu vou vomitar agora. Se cuida, cara. Vou cuidar da sua


velha bruxa até você chegar em casa!” Eli grita antes de bater na
parte de trás da minha cabeça e sair da sala.

Reviro os olhos enquanto dou risada. “Lembre-me porque faço


negócios com ele.”

“Porque você o ama?” Sacha pergunta com uma sobrancelha


levantada, como se fosse difícil para ele lembrar por que fiz isso
também.

Alguns meses depois de nos mudarmos, eu ainda não tinha


conseguido encontrar um emprego que amasse. Sacha se ofereceu
para me levar em turnê com ele como sua garota do stand de
vendas, mas eu amava Carter. Ele se tornou um dos meus amigos
mais próximos — e únicos — depois da minha mudança, e eu sabia
muito bem que ele adorava sair em turnê com o TCC, apesar do
pouco que o ajudavam. Não havia como eu estragar as coisas para
ele. Depois de mencionar isso a Eliza uma noite pelo telefone, ele
me perguntou por que eu não vendia artigos promocionais online.
A Ghost Orchid pagava para que uma grande empresa vendesse
suas coisas para eles, aparentemente.

Uma ideia e um pequeno empréstimo do meu irmão, porque


me recusei a aceitar dinheiro de Sacha, deram início à The Promos
Girl. É um site online onde vendo coisas do TCC, Ghost Orchid e,
eventualmente, quinze outras bandas, graças aos contatos dos

MARIANA ZAPATA
meus dois homens favoritos. Cobro menos do que a maioria das
outras grandes empresas e faço questão de cuidar de tudo. O
bônus final é ser minha própria chefe, então posso visitar Sacha
em turnê sempre que quero, contanto que consiga alguém para
assumir o negócio por quanto tempo for necessário.

Nós concordamos quando ele saiu pela primeira vez após a


minha mudança, que não iríamos ficar mais de um mês sem nos
vermos. É tempo suficiente para que nossos encontros sejam a
coisa mais quente do universo, e não é tanto tempo para que
ambos nos transformemos naqueles idiotas apaixonados que nos
fazem revirar os olhos.

Amor, pelo menos nossa versão de amor, são pequenas


coisas. Coisas intangíveis. Risadas e nossas três tartarugas
chamaram Mercury, Frank e Bumblebee. Jogar futebol no parque
perto do nosso apartamento, correr e tentar empurrar um ao outro
durante o percurso, nossas conversas por vídeo quando estamos
em continentes diferentes. É compromisso e afastamento um do
outro e, no meu caso, da minha família, dos babuínos e Laila.

Mas eu o amo e para estarmos juntos, isso não é nada.

MARIANA ZAPATA

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