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GVEXECUTIVA

PUBLICAÇÃO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

VOLUME 22 • NÚMER0 1 • JANEIRO/MARÇO 2023 • CONEXÃO COM A PRÁTICA

Mulheres
na liderança

EXECUTIVO 1
EXECUTIVO 2
Sim, elas podem

Editorial

Sim, elas podem

Pela primeira vez em 20 anos alteramos o nome da revista. Em vez


de GV-executivo, esta edição chama-se GV-executiva, como forma de
marcar o caderno especial sobre mulheres na liderança. Assim como
na língua portuguesa, o olhar masculino ocupou historicamente os
espaços organizacionais e impõe-se sem que muitas vezes tomemos
consciência disso, como dizem Maria José Tonelli e Adriana Carvalho
no artigo de abertura do especial dedicado à gestão feminina.
O abrangente artigo de Maria José Tonelli e Adriana Carvalho apre-
senta dilemas e avanços para a igualdade de oportunidades entre ho-
mens e mulheres na gestão e é complementado com o depoimento
de Maria Fernanda Teixeira, conselheira de diversas organizações. O
caderno especial traz ainda quatro diferentes recortes sobre a temá-
tica. Cristina Kerr destrincha os vieses inconscientes de gênero que
fazem com que as mulheres enfrentem dificuldades na carreira, es-
pecialmente no primeiro passo para o nível gerencial; Ana Fontes e
Débora Monteiro mostram como empreendimentos femininos podem
trazer transformações sistêmicas para a construção de uma sociedade
mais equilibrada e menos desigual; Dilma Campos discute desafios e
avanços para as mulheres negras rumo à liderança; e Deborah Patri-
cia Wright aponta caminhos para aumentar a participação de mulhe-
res nos conselhos de administração. O caderno especial foi realizado
com apoio da editora convidada Maria José Tonelli, coordenadora do
NEOP – Núcleo de Estudos de Organizações e Pessoas, da FGV EAESP,
a quem agradecemos a valiosa colaboração.
Ademais, a GV-executiva traz dois artigos fora do núcleo especial
que reforçam a necessidade de continuamente refletir sobre as formas
de pensar e agir nas organizações. No primeiro, Iedo Matuella Filho,
Claudio de Souza Miranda e Jonny Mateus Rodrigues chamam aten-
ção para o possível aumento de vulnerabilidades para fraudes corpo-
rativas durante a pandemia da Covid-19 e fazem recomendações com
base em ações que foram tomadas para mitigar o crescimento de ris-
cos. No segundo, Sandro Magalhães Manteiga defende a importância
de fazer bom uso de ferramentas em reuniões estratégicas em vez de
adotar automaticamente slides de PowerPoint.
Diante de tantos desafios que enfrentamos atualmente, cabe às ges-
toras e aos gestores questionar padrões longamente estabelecidos e
com frequência difíceis de serem percebidos.

Boa leitura!
Adriana Wilner
Coeditora-chefe.

EXECUTIVO 3
EXECUTIVO
Volume 22 • Número 1 • JANEIRO/MARÇO 2023

Sumário
03 EDITORIAL
CADERNO ESPECIAL - Mulheres na liderança

05 DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO


As organizações foram construídas como espaços em que o imaginário
masculino da gestão é tomado como natural e, portanto, reproduzido e
reforçado. Como mudar esse cenário?
Maria José Tonelli , Adriana Carvalho

11 O IMPACTO DOS ESTEREÓTIPOS NA CARREIRA DAS MULHERES


Eles são considerados racionais, assertivos e competentes; elas, emotivas,
obedientes e colaborativas. Vieses inconscientes fazem com que mulheres
tenham maiores dificuldades que homens nas contratações e promoções,
especialmente no primeiro passo para o nível gerencial.
Cristina Kerr

17 MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA


Pesquisa com executivas negras mostra que há ainda muitos obstáculos
para aumentar sua participação nas posições de topo das organizações e
aponta recomendações para que a inclusão seja consistente.
Dilma Campos

23 EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE


Empreendimentos femininos têm o potencial de melhorar indicadores
econômicos e sociais no Brasil e fortalecem-se com iniciativas que vão do
estímulo à digitalização às compras afirmativas.
Ana Fontes, Débora Monteiro

29 A PRESENÇA FEMININA NOS CONSELHOS


Mulheres nos mais altos órgãos de controle das empresas podem trazer
benefícios em aspectos como ética, diversidade, recursos humanos,
sustentabilidade, inovação, estratégia e relacionamento com o consumidor
e nos resultados financeiros, mas é preciso aumentar sua participação.
Deborah Patricia Wright

ARTIGOS

34 COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?


Profissionais de governança, risco e compliance perceberam crescimento
de vulnerabilidades com a pandemia, mas também foram adotadas ações
para mitigá-las que podem ser usadas para enfrentar crises futuras.
Iedo Matuella Filho, Claudio de Souza Miranda, Jonny Mateus Rodrigues

41 COMO FAZER REUNIÕES ESTRATÉGICAS MAIS EFETIVAS


Usar PowerPoint ou documentos em formato de texto? Ambas as
ferramentas podem ser úteis, o importante é compreender suas
potencialidades para aumentar a capacidade de formular, comunicar,
memorizar e executar a estratégia corporativa.
Sandro Magalhães Manteiga

EXECUTIVO 4
DILEMAS E AVANÇOS Resumo
DAS MULHERES Objetivo: apontar dilemas e avanços contemporâneos
para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

NA GESTÃO
5.5: garantir a participação plena e efetiva das mulheres
e a igualdade de oportunidades para a liderança em
todos os níveis de tomada de decisão na vida política,
econômica e pública.
As organizações foram construídas Estado da arte: estudos mostram que, apesar de
como espaços em que o imaginário iniciativas e ações para aumentar a participação feminina

masculino da gestão é tomado


no mercado de trabalho e em posições de liderança, o
progresso ainda é lento.

como natural e, portanto, Originalidade: o artigo promove o debate sobre a


reproduzido e reforçado. Como inserção das mulheres em posições de liderança e suas
relações com as mudanças sociais.
mudar esse cenário? Impactos: o artigo chama a atenção de governo,
organizações, empresas e cidadãos para os aspectos
críticos para incluir mulheres no mercado de trabalho e
Maria José Tonelli – Professora titular na FGV EAESP, delegada em posições de liderança.
brasileira no W20, Doutora em Psicologia Social, psicóloga.
E-mail: maria.jose.tonelli@fgv.br Palavras-chave: ODS 5, mulheres, liderança, mulheres no
Adriana Carvalho – CEO da Generation Brasil, delegada brasileira no
W20, conselheira no Movimento Elas Lideram do Pacto Global da ONU.
mercado de trabalho.
Mestre em Administração pelo Insper e economista.
E-mail: adriana.carvalho@generation.org

EXECUTIVO 5
DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO

A
o nos aproximarmos do aniversário dos 50 anos da promulgação do Ano Internacional da
Mulher pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1975, a questão da inclusão da mu-
lher no mercado de trabalho continua em debate.
Nessas décadas, houve profunda transformação nos modelos econômicos e na organiza
ção das cidades, do trabalho e das famílias. Ocorreram mudanças nas mentalidades e nos
modos de conduta. Muitos aspectos da vida melhoraram, mas, por outro lado, os movimentos foram insufi-
cientes para eliminar todas as camadas das desigualdades1.
Sociedades com maior igualdade entre homens e mulheres são mais prósperas, contribuem para a demo-
cracia, ampliam o que cada um pode ser e promovem ambientes empresariais mais criativos e produtivos2.
Apesar dos estudos e das pesquisas que mostram benefícios para a sociedade como um todo, a inserção da
mulher no mercado de trabalho ainda envolve polêmicas, o que nos faz refletir que a solução da questão
passa por aspectos psicológicos e socioemocionais.
Gênero é um elemento constitutivo das relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre sexos3.
Foram atribuídas aos homens as relações de poder e a atuação pública, e às mulheres, o cuidado e o am-
biente privado. Essas projeções ainda influenciam o que é esperado da conduta de homens e mulheres e
permeiam grande parte das narrativas amplamente difundidas.
O debate sobre diversidade, equidade e inclusão perpassa todas as instâncias sociais, mas o progresso é
lento. Cabe indagar as razões que impedem que esse seja um assunto resolvido, ainda que esteja presente
nas organizações, nas mídias sociais e em políticas públicas.
Para traçar algumas dimensões que cercam esse fenômeno, este artigo teve como objetivo apontar di-
lemas e avanços contemporâneos para alcançar o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5, com
a apresentação de pesquisas, bem como de políticas e práticas empresariais, que promovem a inclusão de
mulheres no mercado de trabalho e apontam caminhos para a maior igualdade.

ESTUDOS SOBRE MULHERES


Alguns dados históricos são úteis para compreender o presente. Considera-se que o debate sobre a igual-
dade entre homens e mulheres começou com a Declaração dos Direitos das Mulheres e Cidadãs4. Escrito
por Olympe de Gouges em 1791, o documento foi uma resposta à Declaração Universal dos Direitos dos Ho-
mens e Cidadãos, proclamada na Revolução Francesa, de 1789, que deixava as mulheres de fora dos ideais
de liberdade, igualdade e fraternidade. Por suas críticas, de Gouges foi executada na guilhotina dois anos
depois. Em 1793, a educadora e ativista inglesa Mary Wollstonecraft publicou Reivindicação dos direitos das
mulheres5, livro que também virou um marco no movimento feminista.
Levou um século para o início da primeira onda feminista, que ocorreu do fim do século XIX até os anos
1950, com duas vertentes: a primeira, o movimento sufragista, classificado como liberal; e a segunda, o femi-
nismo socialista, que questionava instituições de poder. No Brasil, o direito ao voto da mulher foi conquis-
tado em 1932. Destaca-se, nesse período, a presença de Bertha Lutz, também ativista dos direitos humanos.
A segunda onda, dos anos 1950 a 1980, traz o livro de Simone de Beauvoir O segundo sexo6 como fundador
dos debates contemporâneos sobre a questão da mulher, em conjunto com o conceito de gênero, criado pelo
médico norte-americano Robert Stoller7. No Brasil, houve um componente adicional: as mulheres organiza-
ram-se em busca do estado democrático e do direito à cidadania nos anos 19708.
Professora de filosofia e política na New School for Social Research, Nancy Fraser9 salienta três momentos
na segunda onda. O primeiro questionou a visão do homem como chefe de família e o trabalho doméstico,
reprodutivo e de cuidado como sem importância. Era um debate circunscrito à classe média branca. Afinal,
as mulheres na pobreza sempre trabalharam; durante o regime feudal na Europa, labutavam tanto quanto os
homens na zona rural10 e, com a industrialização, fizeram parte da mão de obra fabril. No Brasil, as mulheres
de estratos sociais mais vulneráveis, de maneira especial as negras, também sempre trabalharam11.
No segundo momento, nos anos 1960/1970, os movimentos emancipatórios buscaram identificar as in-
justiças nas famílias, na vida cotidiana e na sociedade civil e questionaram também o sexismo existente nos
movimentos da esquerda. No terceiro momento, as mulheres entraram em massa no mercado de trabalho,
e o modelo familiar passou a ser baseado em dois salários. Nas organizações familiares, houve aumento do
número de mulheres como chefes de família. Na perspectiva de Fraser, ocorreu então o reconhecimento das
demandas feministas, mas não se deu propriamente uma reorganização social que favorecesse a igualdade.
Na terceira onda, o movimento feminista contemporâneo foi plural e incluiu diversas perspectivas e
abordagens, que se juntaram em objetivos comuns: independência econômica, social e política12. O debate
sobre a inserção das mulheres no mercado de trabalho se interseccionou com os conceitos de classe, raça,
etnia, idade e cultura13. Havia múltiplos questionamentos, como em relação à reprodução, pelas mulheres,
dos modelos masculinos nas organizações e ao foco das teorias feministas nas mulheres brancas.

EXECUTIVO 6
DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO

O conceito de interseccionalidade, que ficou conhecido pelo trabalho de Kimberlé Crenshaw, feminista
negra norte-americana, em 198914, evidencia como a dificuldade de ser mulher e negra é potencializada.
Vale ressaltar que o conceito já havia sido trabalhado em 1980 pela feminista brasileira Lélia Gonzalez15.
As teorias feministas pressupõem uma identidade que conjuga os interesses femininos, mas a filósofa
Judith Butler16 questiona o conceito de que as mulheres sejam homogêneas e tenham uma identidade co-
mum. Segundo a autora, a identidade de gênero é performática, ou seja, depende de possibilidades históri-
cas, sociais e culturais. É comum a suposição de que todas as mulheres sejam doces, mas nem por isso sua
entrada no mercado de trabalho dulcificou as relações organizacionais17.
É nesse contexto que os estudos sobre a inserção das mulheres no mercado de trabalho se intensificam
e apontam estereótipos e preconceitos, muitas vezes sutis, que permeiam os avanços e os dilemas das mu-
lheres na gestão. O momento atual é efervescente, com o debate ampliado para ambientes não tradicionais,
mas às vezes com distorções na agenda e também movimentos contrários aos avanços já conquistados.

MULHERES NA LIDERANÇA
Estudos mostram que as mulheres ainda são minoria na gestão das organizações em todo o mundo18.
Elas ocupam mundialmente menos de 5% das posições de liderança das grandes empresas19.
O conceito do double-bind dilemma20 é relevante para entender o contexto da inserção da mulher em po-
sições de liderança: de um lado, espera-se que as mulheres se comportem como femininas, de acordo com
o estereótipo de que são emocionais, dóceis, conciliadoras e amáveis; de outro, espera-se que ocupantes
de cargos de liderança apresentem características pretensamente masculinas, como assertividade e racio-
nalidade21. Assim, as mulheres vivem situações paradoxais: se usam estilos mais assertivos e diretivos de
liderança, são vistas negativamente, pois se espera que sejam mais suaves; e, se agem com docilidade, não
se encaixam na expectativa de posições de comando.
As organizações foram construídas como espaços para homens, e o imaginário masculino da gestão é to-
mado como natural, portanto, reproduzido e reforçado. As desigualdades revelam-se em salários menores
para as mesmas funções, posições de menor status e no desequilíbrio da demografia organizacional. Como
as estruturas organizacionais acabam por manter os homens em postos de maior visibilidade, reforçam a
possibilidade de crescimento dos homens nas estruturas hierárquicas das empresas. Em consequência, a me-
ritocracia, um conceito sempre questionado, não pode ser exercida da mesma forma para homens e mulheres.

POLÍTICAS E PRÁTICAS EMPRESARIAIS


Desde os anos 1960, uma série de iniciativas surgiram em busca de equidade de gênero nas organizações,
no mundo e no Brasil. A Tabela 1 apresenta algumas dessas iniciativas em sua diversidade de origens e
finalidades. Essa listagem não é exaustiva, e desculpamo-nos antecipadamente por não citarmos todos os
movimentos em prol da mulher.
A maior parte das iniciativas surgiu neste milênio. Nessa jornada de quase 20 anos, muitos esforços fo-
ram feitos para o avanço das mulheres no mundo do trabalho e nas posições de liderança. Podemos obser-
var, de maneira especial, maiores resultados quando o governo e empresas assumem compromissos e ações
em prol desses objetivos em iniciativas próprias ou conjugadas.
Por exemplo, acompanhando a premiação brasileira da iniciativa Women’s Empowerment Principles
(WEPs), observaram-se avanços importantes: das empresas de grande porte, 60% das finalistas atingiram
100% da pontuação no princípio de desenvolvimento profissional. Entre as grandes empresas, um dos pon-
tos frágeis continua sendo o trabalho com a cadeia de valores22.
No entanto, como todo problema complexo, ainda há grandes desafios para alcançar esforços coordena-
dos e constantes. Enfrentamos resistências e problemas não resolvidos, como a violência doméstica e a falta
de rede de apoio aos cuidados. Esses problemas são exponenciados em crises como a pandemia da Covid-19.
O Fórum Econômico Mundial divulga anualmente um relatório mostrando os avanços e retrocessos para
fecharmos as lacunas de gênero. O último, publicado em 202223, captou estagnação do progresso, em grande
medida por causa da pandemia, prevendo 133 anos para eliminar as inequidades de gênero. O maior desafio
é a participação das mulheres na política, que se situa em uma média de 22% nos países pesquisados, seguido
pela participação econômica (60%). Em educação e saúde, a participação das mulheres supera 90%.
Na parte econômica a boa notícia é que a proporção das mulheres na liderança ao longo dos 16 anos da
pesquisa subiu de 33,3 para 36,9%, porém a participação das mulheres no mercado de trabalho como um
todo tem diminuído desde a crise de 2009. A pandemia agravou a situação. Entre os principais fatores para
o declínio, cabe citar a questão da sobrecarga do trabalho do cuidado para as mulheres e a falta de políticas
públicas como creches e apoio para trabalhadoras.
De acordo com a pesquisa do Fórum Econômico Mundial, as dez maiores economias estão com percen-

EXECUTIVO 7
DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO

tuais acima de 80% em direção ao fechamento das lacunas. Enquanto a Islândia segue sendo o país mais
avançado, o Brasil, infelizmente, encontra-se bem aquém (69,6%), na 94ª posição de um total de 146 países.
As pesquisas acadêmicas e as práticas empresariais mostram que a inserção das mulheres no mercado
de trabalho traz benefícios múltiplos: para as famílias, para as comunidades locais, para as empresas e para
Tabela 1.

Algumas iniciativas para aumentar a participação das mulheres nas organizações


Iniciativa Ano País O que faz
de fundação de origem
Catalyst 1962 Estados Unidos Foi pioneira no apoio à participação e ao desenvolvimento da carreira das mulheres no mercado de
da América trabalho e apresenta estudos, ferramentas, orientações e campanhas (por exemplo, sobre vieses).
Geledés 1988 Brasil Desenvolve projetos próprios e em parceria em questões raciais e de gênero.
Women Corporate 2001 Estados Unidos Por meio de eventos, networking e ferramentas de educação e disseminação das melhores práticas
Directors (WCD) da América de governança corporativa, prepara e fortalece mulheres nos conselhos de administração.
Women’s Forum 2005 França É uma plataforma internacional que promove eventos com mulheres líderes e abrange
for the Economy & Society iniciativas como um barômetro que permite ver o avanço das mulheres em diferentes áreas.
Programa Pró-equidade 2005 Brasil Lançado pelo governo federal para impulsionar a evolução dos temas de gênero e raça nas
de Gênero e Raça empresas, teve inicialmente impacto nas estatais e depois ganhou adesão de empresas privadas.

Plataforma dos Princípios 2010 Global Mais conhecida por Women’s Empowerment Principles (WEPs), a plataforma foi lançada pela
de Empoderamento ONU Mulheres e Pacto Global para fazer parcerias com empresas (atualmente são sete mil no
das Mulheres mundo todo) com base em princípios orientadores.

Rede Mulher 2010 Brasil A organização fomenta o empreendedorismo feminino via eventos, programas de aceleração,
Empreendedora cursos, marketplace, entre outras ações.

Fórum Mulheres 2010 Brasil Organizado pela CKZ Diversidade, é um encontro de líderes pela causa da equidade de gênero
em Destaque e conta com a cooperação da ONU Mulheres e do ElesPorElas
30% Club 2010 Reino Unido Busca engajar empresas para que pelo menos 30% dos assentos em conselho e posições de
alta liderança sejam ocupados por mulheres.
Movimento Mulher 360 2011 Brasil A plataforma de atuação é estruturada em três dimensões, fomento, sistematização e
disseminação de conhecimentos e práticas, com o objetivo de acelerar o avanço da equidade
de gênero nas empresas e nas suas cadeias de valor.

Lean In 2013 Estados Unidos Apoia mulheres em círculos de confiança, troca de experiências e aprendizagem.
da América
Grupo Mulheres do Brasil 2013 Brasil Tem projetos para fomentar a adoção de políticas afirmativas e eliminar as desigualdades de
gênero, raça e condição social.
ElesPorElas (HeforShe) 2014 Global Foi criada pela ONU para engajar homens na discussão sobre equidade de gênero.
Women in Leadership 2014 Brasil Os objetivos são desenvolver a carreira das mulheres na América Latina e estimular empresas
in Latin America da região a implementarem programas para isso.

W20 2015 Global É um grupo de trabalho criado pelo G20 para levar questões de gênero para o próprio grupo
de chefes de Estado e ministros da Economia das maiores economias do mundo.

Aliança sem Estereótipo 2017 Global É uma plataforma criada pela ONU Mulheres em conjunto com empresas de bens de consumo
(como Unilever e Boticário) e grupos de mídia/publicidade (como WPP) para erradicar
estereótipos prejudiciais às mulheres.

Women on Board 2019 Brasil Tem como objetivos reconhecer, valorizar e promover ambientes em que há mulheres no
conselho de administração ou em conselhos consultivos, certificando-se de que empresas
tenham pelo menos duas mulheres efetivas no conselho.

Conselheira 101 2020 Brasil Busca incentivar e formar líderes negras para aumentar sua participação nos conselhos de
administração.

Elas Lideram 2021 Global O movimento faz parte da Ambição 2030 do Pacto Global para acelerar a implementação dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

FONTE: ONU - Organização das Nações Unidas.

EXECUTIVO 8
DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO

os países. Nesse sentido, alcançar o ODS 5 da ONU é

CHEGOU A NOSSA HORA


essencial para um planeta mais justo e sustentável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Maria Fernanda Teixeira – Conselheira de empresas no Brasil e nos Estados
Unidos. E-mail: ferena.fernanda@gmail.com Os movimentos feministas atuais, reforçados

D
pelo #metoo, trazem uma diversidade de perspecti-
esde minha tenra idade, entre os 7 e 9 anos de idade, vas para a questão de gênero. O acesso das mulheres
já observava, transitando pelas imponentes ruas pau- no espaço organizacional provoca novas identida-
listanas, homens bem trajados tecendo diálogos inte- des e concepções de feminilidades e questiona mo-
ligentes e entusiasmantes. Eram executivos tradicionais, com delos dominantes de conduta, mas cabe chamar a
padrões de vida bem estabelecidos, denotando uma aura de atenção para a superficialidade que por vezes cerca
sucesso incontestável. esses movimentos, com frases feitas, clichês e mo-
Contemplava esses executivos na mercearia que meus pais dismos que permeiam o mundo corporativo.
possuíam, adquirida com a ajuda inestimável de amigos. Havia Apesar dos avanços, inúmeras questões perma-
uma discrepância enorme entre esses indivíduos e os “homens necem em aberto, tanto nas pesquisas como nas prá-
comuns”, responsáveis por exercer funções operacionais – a de- ticas organizacionais. Como exemplo, cabe citar as
sigualdade de poder aquisitivo era fácil de se notar. A clientela diferenças salariais que ainda persistem, o labirinto
feminina basicamente consistia em nichos como os das donas de barreiras invisíveis que impedem que mulheres
de casa e mães residentes nas vizinhanças. ascendam24, a dupla jornada de trabalho e os confli-
Tais observações proporcionavam-me a formulação de tos entre família/vida pessoal e trabalho, a proble-
perguntas às quais não detinha as respostas à época. Paulatina- mática da violência doméstica e o envelhecimento
mente, comecei a tecer questionamentos sobre a diversidade de das mulheres executivas. Além disso, especialmente
gênero e acerca das diferenças entre os cargos e papéis de- pelas características demográficas do Brasil, a inser-
sempenhados nas instituições. Enfim, ainda criança, prometi ção das mulheres negras em posições de liderança
que seria uma importante executiva, do mais alto escalão.  é uma problemática de extrema relevância. Mais re-
Tratei de delinear um plano de como alcançar os meus so- centemente, com os impactos da pandemia, a ques-
nhos e objetivos, amparada por extrema paixão pela vida, cora- tão do burnout passou a ser mais debatida.
gem de lutar por posições relevantes e disposição para me de- Merece atenção ainda a discussão sobre como
dicar com afinco aos estudos, investindo na constante aquisição se manifestam as múltiplas masculinidades. Com
de conhecimentos. E sem jamais esquecer de inspirar, por meio mudanças na organização do trabalho e avanço das
de minhas realizações, outras mulheres a almejarem o poder, novas tecnologias, os homens também estão vul-
lutando pelas devidas conquistas. neráveis, ameaçados pela perda do emprego e pela
Contudo, lamentavelmente, a presente realidade decepcio- desvalorização do trabalho. Não se trata de oposição
na ao se analisar friamente os dados averiguados pela bolsa de entre homens e mulheres, mas sim de união para
valores em 20221, pois os resultados validam a neutra ou fraca que as sociedades sejam plurais e mais justas.
evolução na inserção das mulheres nas empresas listadas. A pandemia em 2020 parece ter encerrado o lon-
O discurso no mundo corporativo, de abarcar maior empe- go século XX. Resta saber como vamos construir o
nho em termos de diversidade, gera frustração, haja vista as século XXI. O desafio é buscar caminhos éticos para
próprias estatísticas, que atestam a incoerência entre o que se o desenvolvimento das empresas e soluções para os
fala e o que se faz. Em 2022, 61% das companhias com ações problemas apontados pelos ODS da ONU.
negociadas em bolsa de valores no Brasil não possuíam sequer
uma mulher presente na diretoria estatutária, repetindo o re- NOTAS
sultado do ano anterior. Já nos conselhos de administração, 1. Giddens, A. (2002). Modernidade e Identidade. Zahar.
houve ligeiro progresso. Em 2021, 45% das empresas listadas 2. McKinsey & Company (2013). Women Matter 2013. McKinsey
não contavam com mulheres nos conselhos. No ano seguinte, & Company. Recuperado de https://www.mckinsey.com/~/media/
mckinsey/business%20functions/people%20and%20organiza-
o percentual encolheu para 37%. Mais dramático ainda é o le- tional%20performance/our%20insights/gender%20diversity%20
vantamento do Estadão que revelou que menos de 4% das ins- in%20top%20management/gender%20diversity%20in%20
tituições do Ibovespa (principal índice da bolsa brasileira) têm top%20management.pdf; International Labour Organization
mulheres nas posições de chief executive officer (CEO) ou como (2015). Women in Business and Management: Gaining Momen-
tum. International Labour Organization, Bureau for Employers’
presidentes de conselhos2. Activities. Recuperado de https://www.ilo.org/global/publications/
Ressalto como é imprescindível acelerarmos o processo de ilo-bookstore/order-online/books/WCMS_316450/lang--en/
equidade. Enfim, solicito aos leitores para interpretarem este index.htm; Piccone, T. (2017). Democracy, gender equality, and
artigo sob o viés de quanto prezo e luto para haver igualdade gender security. Policy Briefs. Recuperado de https://www.brook-
ings.edu/wp-content/uploads/2017/08/fp_20170905_democra-
também em relação às  outras minorias, englobando diferentes cy_gender_security.pdf
raças, orientação sexual ou classe social. É humanamente in- 3. Scott, J. (2019). Gênero: uma categoria útil para análises históri-
cas. In H. Buarque de Holanda (ed.). Pensamento feminista: con-
ceitos fundamentais (pp. 49-82). Bazar do Tempo.

EXECUTIVO 9
DILEMAS E AVANÇOS DAS MULHERES NA GESTÃO

4. De Gouges, O. (1791). Declaration of the Rights of Woman and


the Female Citizen. In L. Hunt (ed.). The French Revolution and Hu-
man Rights: A Brief Documentary History (pp. 124-129).
justo, em pleno século XXI, vivenciarmos tamanha defasagem
5. Wollstonecraft, M. (2017). Reivindicação dos direitos da mulher.
no que concerne ao tema da inclusão. Boitempo.
Outros pontos pertinentes compreendem tópicos como ace- 6. De Beauvoir, S. (2014). O segundo sexo. Nova Fronteira.
lerar o crescimento do produto interno bruto do Brasil, melho- 7. Green, R. (2010) Robert Stoller’s sex and gender: 40 years
rar a qualidade de vida das famílias em todas as camadas so- on. Archives of Sexual Behavior, 39, 1457-1465. https://doi.
ciais e propiciar maior independência financeira de mulheres e org/10.1007/s10508-010-9665-5
afrodescendentes. Saliento ainda a necessidade de experimen- 8. Pinto, C. R. J. (2003). Uma história do feminismo no Brasil.
tar relacionamentos afetivos saudáveis, em detrimento de inte- Fundação Perseu Abramo.
rações tóxicas, tão comuns em um país ainda bastante sexista. 9. Fraser, N. (2019). Feminismo, capitalismo e a astúcia da história.
In H. Buarque de Holanda. Pensamento feminista: conceitos funda-
É essencial frisar como ser a única executiva em uma empre- mentais (pp. 25-48). Bazar do Tempo.
sa acarreta um ambiente de pouca criatividade e inovação e em 10. Poster, M. (1979). Teoria crítica da família. Zahar.
que a mulher não é devidamente ouvida. Tais fatores impedem o 11. Del Priore, Mary (ed.) (2004). História das mulheres no Brasil.
crescimento da companhia e geram baixos índices de lucrativida- Contexto.
de e vendas. Analiso como um enorme paradoxo, afinal mulhe- 12. Holanda, H. B. (ed.) (2019). Pensamento feminista: conceitos
res são responsáveis em média por 89% das decisões das des- fundamentais. Bazar do Tempo.
pesas das casas3. Então, como pode ser tolerável não existir um 13. Carneiro, S. (2019). Mulheres em movimento. In H. Buarque de
contingente razoável de mulheres nas deliberações? Holanda. Pensamento feminista brasileiro: conceitos fundamentais
(pp. 313-322). Bazar do Tempo.
Deixo uma indagação, nos moldes de provocação, para to-
14. Crenshaw, K. (1989). Demarginalizing the intersection of race
das as mulheres: o ciclo de vitimização deve ser encerrado. En- and sex: a black feminist critique of antidiscrimination doctrine,
quanto permanecermos resignadas, não progrediremos, esta- feminist theory and antiracist politics. University of Chicago Legal
cionando em zonas de conforto insolúveis. Confio solidamente Forum, (1).
que chegou o nosso momento, a nossa hora. 15. Gonzalez, L. (2019). Racismo e sexismo na cultura brasileira. In
As repetidas histórias de pessoas explanando sobre as difi- H. Buarque de Holanda. Pensamento feminista brasileiro: conceitos
fundamentais (pp. 341-356). Bazar do Tempo.
culdades e sacrifícios na edificação de suas carreiras virou algo
16. Butler, J. (2019). Atos performáticos e a formação dos gêneros:
negativo; são narrativas desprovidas de energia positiva, sem um ensaio sobre fenomenologia e teoria feminista. In H. Buarque
guarnecer incentivo. Necessitamos inspirar, demonstrando os de Holanda. Pensamento feminista brasileiro: conceitos fundamen-
caminhos apropriados, de mãos dadas e, sobretudo, sendo tais (pp. 213-234). Bazar do Tempo.
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são os grandes comandantes dessa transformação. Muitos dos ity: for a better future of work for all. International Labour Organi-
atuais líderes, que ainda não haviam colocado essas metas em zation Recuperado de https://www.ilo.org/global/publications/
suas agendas, atualmente veem parte de seus bônus atrelada books/WCMS_674831/lang—en/index.htm
a esses objetivos. Ou seja, precisam catalisar essas propostas 19. Goryunova, E., Scribner, R. T., & Madsen, S. R. (2017). The
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ership. Harvard Business Review.

EXECUTIVO 10
O IMPACTO DOS Resumo
ESTEREÓTIPOS NA Objetivo: discutir os vieses inconscientes que
prejudicam a carreira das mulheres.

CARREIRA DAS MULHERES Estado da arte: estudos mostram que, para mudar


pensamentos e atitudes, as pessoas devem tomar
consciência do impacto negativo de vieses de gênero.
Eles são considerados racionais, assertivos Originalidade: o artigo traz diferentes vieses
e competentes; elas, emotivas, obedientes de gênero (de maternidade, de afinidade, de
comportamento, de desempenho e de percepção) e
e colaborativas. Vieses inconscientes apresenta caminhos para enfrentá-los.  

fazem com que mulheres tenham maiores Impactos: espera-se que o artigo contribua

dificuldades que homens nas contratações para conscientizar lideranças, gestores(as) e


colaboradores(as) primeiramente sobre seus
e promoções, especialmente no primeiro próprios vieses inconsistentes de gênero e, em
seguida, sobre aqueles que impactam nos processos
passo para o nível gerencial. da organização.  

Palavras-chave: vieses inconscientes, estereótipos


de gênero, desigualdade de gênero, carreira das
Cristina Kerr – CEO da consultoria CKZ Diversidade, mestra em Sustentabilidade
pela Fundação Getulio Vargas (FGV), professora da Fundação Dom Cabral, colunista
mulheres.
da revista Você S.A. e autora do livro Viés Inconsciente.
E-mail: criskerr@ckzdiversidade.com.br

EXECUTIVO 11
O IMPACTO DOS ESTEREÓTIPOS NA CARREIRA DAS MULHERES

E
m 1989, a Orquestra Sinfônica de Chicago, uma das mais renomadas dos Estados Unidos da
América, resolveu fazer um processo de recrutamento às cegas para novos músicos. Todos os
candidatos, homens ou mulheres, fariam suas apresentações atrás de uma cortina escura, para
que as pessoas julgadoras não fossem influenciadas por outras características além da quali-
dade técnica. Nos primeiros testes, nenhuma mulher passou no processo seletivo. Intrigadas,
as pessoas responsáveis pela seleção verificaram que as cortinas não impediam as pessoas avaliadoras de
ouvirem o barulho dos saltos dos sapatos que as candidatas usavam. Então, as pessoas selecionadoras adi-
cionaram um detalhe, pedindo para todos os músicos entrarem descalços. Após essa mudança, o número
de mulheres na orquestra aumentou de 5 para 25% – e atualmente ultrapassa 50%1.
Essa história serve para ilustrar o conceito do viés inconsciente. Ao contrário do viés explícito, que reflete
uma crença consciente sobre determinado grupo de pessoas – nesse caso, as mulheres –, o viés inconsciente
ocorre de maneira não intencional, como influência de estereótipos profundamente arraigados fruto de
normas culturais, religiosas e sociais. As pessoas avaliadoras da orquestra pretendiam, ao fazer o recruta-
mento às cegas, isolar influências preconceituosas, mas o som do salto foi suficiente para ativar, incons-
cientemente, a crença propagada ao longo da história de que o desempenho das mulheres musicistas seria
inferior ao dos homens.
Os vieses inconscientes criam distorções que são responsáveis por influenciar negativamente a tomada
de decisão, o comportamento e o julgamento em relação às mulheres, levando à discriminação e reduzindo
as chances da equidade de gênero2. Os estereótipos que levam a esses vieses aumentam em mercados que
são tradicionalmente masculinos, o que gera um grande desafio para as corporações na retenção de mulhe-
res talentosas. Era o caso das orquestras algumas décadas atrás e é, ainda hoje, o caso da liderança das orga-
nizações, fortemente marcada pela convicção de que cargos mais altos devem ser ocupados pelos homens,
enquanto cargos inferiores, pelas mulheres3.
Pesquisa da McKinsey4 revela que há desafios para as mulheres em contratações e promoções em todos
os níveis hierárquicos, mas o maior impacto negativo está no primeiro passo para o nível gerencial. Mu-
lheres têm menor probabilidade de serem contratadas para cargos gerenciais, e, no caso das promoções,
para cada 100 homens promovidos a gerentes, apenas 72 mulheres são escolhidas. Eis o retrato final desse
processo: dos cargos de gerente, 62% são ocupados por homens, e 38%, por mulheres.
Os números apontados são
reflexo das associações estereoti-
Figura 1.
padas aos homens e às mulheres.
Principais barreiras para as mulheres chegarem Os homens são vistos como com-
petentes, ambiciosos, assertivos,
a cargos de liderança focados em tarefas, dominantes,
independentes, autoconfiantes, to-
1 Responsabilidades domésticas maiores para mulheres do que para homens;
madores de decisão e racionais. Já
2 Funções diferentes atribuídas pela sociedade para homens e mulheres; das mulheres, espera-se que sejam
3 Cultura corporativa masculina; gentis, atenciosas, amigáveis, co-
laborativas, obedientes, discretas,
4 Mulheres com experiência insuficiente em cargos de gestão e liderança;
intuitivas e compreensivas5. Estu-
5 Poucos role models femininos na liderança; do da Organização Internacional
Homens não incentivados a terem responsabilidades em casa (com afazeres do Trabalho (OIT)6 evidencia as 15
6
domésticos e cuidado com os filhos); principais barreiras, formadas por
crenças e padrões históricos, para
7 Falta de políticas e programas para promover a igualdade de gênero;
que as mulheres consigam chegar
8 Estereótipos contra as mulheres; a cargos de liderança nas empre-
9 Falta de treinamento de liderança para mulheres; sas (Figura 1).
A conclusão que podemos ti-
10 Falta de soluções para trabalhos flexíveis;
rar de todas as estatísticas e es-
11 Ausência de estratégia para retenção de mulheres qualificadas; tudos é que vieses inconscientes
12 Viés de gênero nos processos de recrutamento e promoção; se baseiam na bagagem adquiri-
da ao longo da vida, ficam grava-
13 Cargos de liderança e tomada de decisões considerados apenas para os homens;
dos no sistema inconsciente da
14 Políticas de igualdade de gênero não implementadas; nossa mente, moldam expectati-
15 Leis inadequadas sobre trabalho e não discriminação. vas e preferências e resultam em
comportamentos que dificultam
Fonte: Organização Internacional do Trabalho7
atingir a equidade de gênero, par-

EXECUTIVO 12
O IMPACTO DOS ESTEREÓTIPOS NA CARREIRA DAS MULHERES

ticularmente onde esta é mais necessária. Tendemos a acreditar que decisões injustas têm como base o
lado racional do cérebro, contudo atualmente os vieses são, na maioria dos casos, inconscientes e acabam
influenciando atitudes, julgamentos e ações. Sem que a pessoa perceba, ela acaba dando vantagens para
determinado grupo da sociedade8.

PRINCIPAIS VIESES
Os vieses inconscientes acabam formando uma barreira invisível e poderosa que dificulta o avanço das
mulheres nas corporações e, por outro lado, favorece os homens. Estudos mostram que a tomada de cons-
ciência sobre o impacto negativo dos vieses inconscientes pode ajudar as pessoas a terem uma nova forma
de olhar e pensar sobre a importância de uma cultura inclusiva e do aumento dos talentos femininos9. Para
isso, primeiramente é preciso identificar os principais vieses, dos quais destacamos cinco neste artigo: viés
de maternidade, viés de afinidade, viés de comportamento, viés de desempenho e viés de percepção. Cada
um deles é apresentado na Figura 2, mas faz-se importante levar em conta que todos estão interconectados.

Quadro 1.

Cinco vieses inconcientes que impactam a carreira das mulheres


Tipos de viés Descrição do viés com foco em gênero
Viés de maternidade Caracterização de mulheres que são mães como menos competentes ou menos
comprometidas com o trabalho.

Viés de afinidade Escolha de pessoas com quem temos maior afinidade ou que se parecem conosco.

Viés de comportamento Comportamento de uma pessoa foge do padrão esperado.

Viés de desempenho Valorização do trabalho dos homens, contrastando com a subestimação do trabalho das mulheres.

Viés de percepção Reforço a estereótipos ou suposições sobre determinado membro ou grupo de pessoas, sem bases
concretas para esse fato. Por exemplo: homens são mais aptos para áreas de ciências, tecnologia,
engenharia e matemática.

Viés de maternidade
O fato biológico de apenas as mulheres poderem, por nove meses, gestar filhos já ativa um estereótipo de
gênero que as coloca em desvantagem no mercado de trabalho. Depois de darem à luz, surgem novas barrei-
ras. Pesquisa realizada no Brasil pelos pesquisadores Cecilia Machado e V. Pinho Neto, da Escola Brasileira
de Economia e Finanças da Fundação Getulio Vargas, mostra que 48% das mulheres que saem de licença-
maternidade perdem o emprego um ano após o início do benefício10.
Uma mulher sem filhos tem maiores chances de ser contratada do que uma com prole. Mulheres que são
mães são caracterizadas como menos competentes e menos comprometidas com o trabalho do que aquelas
que não têm filhos11. Segundo a OIT, isso influencia negativamente sua carreira, ocasionando até mesmo
uma penalidade salarial que pode permanecer por toda a vida profissional12. Em comparação, homens pais
são qualificados como mais comprometidos e ganham salário superior ao daqueles que não têm filhos13.
Em artigo da American Economic Review14, Claudia Goldin indica que a diferença salarial entre homens
e mulheres não está relacionada à formação acadêmica, pois as mulheres estão estudando e formando-
se mais que os homens. Ela evidencia que as empresas valorizam e recompensam colaboradores que têm
longas jornadas de trabalho e estão disponíveis em tempo integral, fator que dificulta a participação das
mulheres com filhos. Por fim, ela indica que é necessário e urgente que as empresas reestruturem a forma
como incentivam colaboradores, criando trabalhos mais flexíveis.

Viés de afinidade
O viés de afinidade é a forte tendência que temos de escolher as pessoas com quem sentimos alguma
afinidade ou que se parecem conosco. Nas entrevistas de emprego, pessoas selecionadoras buscam racio-
nalmente pessoas com alta competência, mas, inconscientemente, há influência de similaridades culturais
nas experiências de vida e estilo comportamental15. Esse viés inconsciente continua depois que a pessoa é
contratada, pois a probabilidade de que ela receba avaliações melhores, promoções e maiores orçamentos
para seus projetos é alta16.
De acordo com a organização Lean In17, reconhecida por abordar temas como vieses inconscientes e
apoiar o empoderamento feminino, o viés de afinidade pode ser ativado por características físicas ou até

EXECUTIVO 13
O IMPACTO DOS ESTEREÓTIPOS NA CARREIRA DAS MULHERES

mesmo pelo nome da pessoa. Matéria publicada no jornal norte-americano The New York Times18 aponta
que há mais homens com o nome John como presidentes de empresas nos Estados Unidos da América do
que toda a quantidade de mulheres nas mesmas posições.
O viés de afinidade é particularmente prejudicial para mulheres e pessoas negras, pois são geralmente
deixadas de lado nos processos de recrutamento e entrevistas, já que pouco ou nada têm em comum com as
lideranças que as entrevistarão, que em sua maioria é formada por homens brancos.

Viés de comportamento
O viés de comportamento ocorre quando a expectativa de determinado comportamento é frustrada. Es-
pera-se que homens sejam líderes e assertivos e mulheres gentis e comunais. Quando estas demonstram
as características que são consideradas padrão para os homens, acabam sendo julgadas e, muitas vezes,
penalizadas por feedbacks negativos de lideranças e demais colaboradores. Mulheres líderes são mais pro-
pensas a serem descritas como mandonas e agressivas, embora essas palavras quase nunca sejam usadas
para descrever os homens19.
Não é esperado que as mulheres sejam competentes nem que sobressaiam em suas carreiras. As mulhe-
res deveriam, quando líderes, agir orientadas para o cuidado, e não para a obtenção de resultados20. Caso
demonstrem e superestimem seu papel de liderança, recebem classificações de desempenho mais baixas,
o que não ocorre com homens de mesmo comportamento21. A autopromoção no trabalho, fator positivo e
de alavancagem na carreira dos homens, é um problema para as mulheres, pois se espera que elas sejam
submissas e humildes e não demonstrem ser excessivamente confiantes22.

Viés de desempenho
O viés de desempenho tem suas raízes nas pressuposições de que homens têm melhores habilidades pro-
fissionais dos que mulheres. O resultado disso é um enorme desgaste emocional para elas, que enfrentam
mais microagressões, são mais interrompidas, têm suas ideias mais questionadas e precisam obter mais
resultados do que os homens para provarem que são competentes em seu trabalho. Não à toa, relatório mais
recente do Women in the Workplace23, da McKinsey em parceria com o Lean In, identificou que mulheres
que conseguem chegar aos cargos de liderança estão mais propensas a desistir.
Já no processo seletivo, o que é levado em conta como diferencial para as mulheres são suas conquistas
anteriores, enquanto os homens são contratados com base no seu potencial para o futuro, pois já é assumi-
do, inconscientemente, que eles possuem as habilidades necessárias para o cargo24. Estudo mostra que so-
mente alterar o nome feminino por um masculino no currículo aumenta a chance de contratação em 60%25.
O viés de desempenho gera oportunidades perdidas para as mulheres e piores avaliações de desempe-
nho. Elas são mais criticadas por seus erros e menos parabenizadas por seus acertos do que os homens, o
que acaba minando sua confiança e causa grande impacto negativo em suas carreiras26.

Viés de percepção
O viés de percepção é a tendência de acreditarmos em e reforçamos estereótipos ou suposições sobre
determinado membro ou grupo de pessoas sem bases concretas. Estereótipos de gênero acabam impedindo
o progresso das mulheres em áreas predominantemente masculinas, como as de ciências, tecnologia, enge-
nharia e matemática (STEM). Consequentemente, as mulheres têm menor motivação e identificação para
seguirem nesses campos profissionais.
As barreiras para as mulheres nas áreas de STEM começam na infância, marcadas pela crença de que me-
ninos são melhores do que meninas em matemática. As atitudes de pais e colegas são predominantemente
guiadas por esse estereótipo, o que faz com que aos poucos meninos sejam mais estimulados para essas
áreas do que meninas27. Apesar do interesse por matemática e ciências ser o mesmo, independentemente do
gênero, em crianças pequenas a divisão vai ficando nítida conforme crescem. As meninas são socialmente
levadas a acreditar que não podem obter sucesso em áreas de STEM, e já no ensino médio os meninos co-
meçam a superá-las em matemática28.
As barreiras seguem aumentando na idade adulta, pois existe uma representatividade muito maior de
homens nessas áreas. Faltam modelos femininos nas áreas de STEM, o que faz com que muitas vezes mu-
lheres se sintam isoladas. Além disso, desde o recrutamento até a avaliação de trabalhos científicos ou de
desempenho corporativo, as mulheres enfrentam maiores dificuldades29.

Interseccionalidades
Cabe ainda inserir o conceito de interseccionalidades30 aos vieses inconscientes. Quando consideramos,
além de gênero, a intersecção com outros estereótipos, como raça e etnia, identidade de gênero, orientação

EXECUTIVO 14
O IMPACTO DOS ESTEREÓTIPOS NA CARREIRA DAS MULHERES

sexual, deficiência e classe social, os vieses intensificam-se e as mulheres tendem a sofrer ainda mais em
suas carreiras profissionais. Estudo atesta que pessoas com três ou mais identidades estereotipadas não se
sentem pertencentes a lugar nenhum nem a nenhum grupo31.
Mulheres negras, quando comparadas às brancas, recebem menos suporte de seus gerentes, são promo-
vidas mais lentamente e têm menor acesso aos cargos de liderança sênior e, portanto, acabam sub-repre-
sentadas em cargos gerenciais, de acordo com levantamento da McKinsey32.

CONCLUSÃO
Os vieses de gênero não são intencionais, mas formam uma barreira invisível e poderosa que dificulta o
avanço das mulheres nas corporações, reduzem a chance da equidade de gênero e favorecem os homens.
A tomada de consciência sobre o impacto negativo dos vieses de gênero é o passo inicial para eliminá-los.
Aprender a lidar com os vieses inconscientes no trabalho é, em primeiro lugar, reconhecer que todas
as pessoas têm vieses33. Uma forma de trazer para a consciência tais vieses é pela realização do teste de
associação implícita de Harvard, que está disponível em português no link https://implicit.harvard.edu/im-
plicit/brazil. O teste tem como objetivo medir o nível do viés inconsciente e as associações estereotipadas.
O próximo passo para a redução do preconceito é o contato com mais mulheres. Faz-se preciso um nú-
mero maior de mulheres e toda a sua interseccionalidade em cargos de gestão e liderança. A representati-
vidade é fundamental para criar associações mentais para o cérebro, além de essencial para que as próprias
mulheres se vejam representadas e acreditem que também podem chegar lá. Vale ainda participar dos gru-
pos de afinidades de gênero na empresa.
O processo de conscientização e mudança inclui realizar revisões periódicas de processos importantes
como avaliação de desempenho, calibração e promoção. Antes de reuniões a respeito desses processos, é
recomendável preparar material para relembrar as pessoas os principais vieses inconscientes e seus impac-
tos. Esse momento é indispensável, uma vez que o processo inconsciente é tão profundo que leva a pessoa
a acreditar que está sendo justa. Assim, ela terá a oportunidade de perceber se sua escolha está enviesada.
A conscientização por meio de treinamentos e workshops continuados também é imprescindível para
que as pessoas entendam como as crenças, os preconceitos e os estereótipos influenciam negativamente as
suas tomadas de decisão, que acabam por comprometer de forma inconsciente a chegada das mulheres aos
cargos de gestão e liderança34.
Portanto, para construir uma organização mais diversa e sustentável, é fundamental criar um ambiente
de confiança e empatia para tratar do tema viés inconsciente, começando pela conscientização da lideran-
ça, de gestores(as) e colaboradores(as) sobre seus próprios vieses inconsistentes e abrindo caminho para
tratar dos temas diversidade e equidade de gênero.

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EXECUTIVO 15
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EXECUTIVO 16
MULHERES NEGRAS Resumo
RUMO À LIDERANÇA Objetivo: apresentar o histórico de mulheres negras na
gestão de empresas no país, as principais dificuldades que
enfrentaram para assumir posições de liderança, os desafios
que ainda precisam ser vencidos e as recomendações para
Pesquisa com executivas negras ampliar a participação de lideranças negras nas organizações.

mostra que há ainda muitos Estado da arte: apesar do avanço nos temas diversidade e
inclusão no mercado corporativo nos últimos anos, o número
obstáculos para aumentar sua de executivas negras, de maneira especial em posições

participação nas posições de


C-Level, ainda está muito distante da representatividade desse
grupo na totalidade da população brasileira.

topo das organizações e aponta Originalidade: para dar voz à realidade das empresárias
recomendações para que a inclusão negras, foi realizada uma pesquisa online com um grupo de
60 executivas que participaram de um programa de formação
seja consistente. de lideranças para atuação em conselhos de administração em
empresas.

Impactos: o artigo oferece caminhos para que as empresas


intensifiquem suas ações de inclusão de mulheres negras,
particularmente em cargos de liderança, e oferece insights
que podem inspirar políticas públicas e a conscientização da
sociedade.

Dilma Campos – Chief executive officer (CEO), sócia fundadora da Outra Palavras-chave: diversidade, inclusão, governança
Praia, head de governança ambiental, social e corporativa da B&Partners.
ambiental, social e corporativa, conselhos de administração,
co, conselheira da AMPRO, da São Paulo Companhia de Danças e da
Solum Capital, Winning Women 2016 da EY, TEDx Speaker, coautora do sustentabilidade, gestão.
livro Publicidade antirracista e finalista do Prêmio Jabuti de Literatura.
E-mail: dilma@outrapraia.com.br

EXECUTIVO 17
MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA

O
s negros representam 56,1% da população brasileira, segundo o Instituto Brasileiro de Geo-
grafia e Estatística (IBGE), mas ocupam apenas 4,7% dos cargos de liderança nas 500 maiores
empresas do país1. No caso das mulheres negras, o quadro revela-se ainda mais crítico: elas
preenchem apenas 0,4% dessas posições. Quando olhamos para o cargo de chief executive of-
ficer (CEO) das 423 empresas listadas na B3, nenhum profissional negro, homem ou mulher,
ocupa hoje essa cadeira2. Mesmo no recorte das 73 empresas que participaram do processo seletivo do Índi-
ce de Sustentabilidade Ambiental da B3 em 2021, ambientes em que o tema diversidade deveria estar mais
adiantado, a maioria das empresas (78%) afirmou ter apenas de 0 a 11% de negros em cargos C-Level.
As estatísticas comprovam uma realidade que se vê na maioria dos ambientes corporativos: a inclusão
racial está longe de refletir a heterogeneidade da população brasileira. Apesar dos avanços da pauta gover-
nança ambiental, social e corporativa (ESG) nas organizações e do surgimento de órgãos e entidades que
fomentam a inclusão da mulher preta na gestão, ainda são inúmeros os desafios que elas enfrentam para
galgar posições nas corporações.
Neste artigo, apresento o cenário histórico de homens e mulheres negros em cargos executivos nas em-
presas, que culmina com o quadro atual de esforços apoiados por diversos coletivos, entre eles o Conse-
lheira 1013, ou C101, programa de incentivo à presença de mulheres negras em conselhos de administração
do qual fiz parte. Mostro então resultados de uma pesquisa que fiz com minhas colegas do programa, reve-
lando dificuldades, avanços, desafios e, por fim, recomendações para fortalecer e aumentar a presença de
mulheres negras na liderança das empresas.

HISTÓRICO DE EXECUTIVOS E EXECUTIVAS NEGROS


O livro Executivos negros: racismo e diversidade no mundo empresarial, escrito por Pedro Jaime de Co-
elho Junior com base em sua tese de doutorado defendida na Universidade de São Paulo (USP)4, ajuda a
trazer luz para os fatos que impulsionaram a entrada de pessoas negras no mundo corporativo. No livro,
ganhador do terceiro lugar do Prêmio Jabuti de Economia em 2017, o autor classifica dois momentos cla-
ros desse movimento.
O primeiro deles inicia-se nos anos 1970, com os executivos da primeira geração. Os pioneiros enfrenta-
ram uma dura realidade nas organizações e construíram trajetórias profissionais isoladas, passando muitas
vezes por situações abertas de racismo. A incapacidade das áreas de recursos humanos de lidar com o tema
e a incipiência da legislação vigente – é importante destacar que até 1989 o racismo não era considerado cri-
me, apenas contravenção, sob pena de multa – fizeram com que esses executivos desenvolvessem mecanis-
mos para se blindarem do racismo. Esses mecanismos envolviam relevar situações de discriminação racial
no trabalho, evitar o enfrentamento quando o racismo se mostrava evidente e dedicar-se intensamente às
atividades profissionais para enfrentar o preconceito.
Os executivos da primeira geração foram desbravadores, ao galgar novas posições na hierarquia sem o
suporte de grupos ou movimentos estruturados. Nos anos 1970, época da ditadura militar, havia intensa
repressão aos movimentos sociais e raciais. É importante ressaltar que, nessa primeira geração, apenas ho-
mens galgaram posições.
As primeiras executivas negras chegaram ao poder apenas no fim do século, muitas delas seguindo o
mesmo impulso solitário nas corporações. Além de situações de preconceito e discriminação racial, elas
vivenciaram situações de assédio moral e/ou sexual, além de outras formas simbólicas de violência5. Muitas
enfrentaram ainda obstáculos em suas vidas privadas e tiveram dificuldade em conquistar um casamento
estável ou uma vida familiar organizada, situação causada em parte pelo sexismo e pelo racismo.
Já os executivos da segunda geração, que alçaram posições no mercado a partir do início do século, fo-
ram impulsionados por um movimento sustentado por coletivos negros. Estes passaram a reivindicar uma
série de políticas afirmativas a partir de 1985, na volta à democracia, com o fim da ditadura militar no país.
Em 2003, organizações não governamentais (ONGs) provenientes do movimento negro fizeram uma repre-
sentação no Ministério Público do Trabalho (MPT) cobrando que este cumprisse sua função institucional
de dar atendimento às questões de interesse público, utilizando instrumentos legais como o inquérito civil
público e a ação civil pública em prol da entrada de negros no mercado de trabalho. Em 2005, foi lançado
pelo MPT o Programa de Promoção da Igualdade de Oportunidades para Todos, com o objetivo de fazer com
que empresas adotassem ações afirmativas para o enfrentamento das desigualdades de gênero e raça nas
relações de trabalho.
No mesmo ano, foram instaurados inquéritos civis públicos contra os cinco maiores bancos do Brasil, que
dispunham de pouquíssimas pessoas negras em seu quadro de colaboradores. Como resposta, a Federação
Brasileira de Bancos (Febraban) iniciou negociações com representantes de entidades sindicais e ONGs e,
em 2006, começaram a surgir os primeiros programas de trainee voltados a jovens afrodescendentes. Esses

EXECUTIVO 18
MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA

programas são particularmente relevantes, pois é por meio deles que são formados os futuros líderes das
empresas. Roberta Anchieta, atualmente diretora de Administração Fiduciária do Itaú Unibanco, entrou no
banco por meio de um programa de trainee ainda no ano 2000, antes dos programas voltados para negros.
No entanto, apesar de chegarem ao mercado corporativo em um contexto social mais favorável, as
jovens que entraram em programas de trainee voltados à população negra continuaram enfrentando
situações de discriminação, como as reações e o estranhamento dos colegas ao fato de elas irem traba-
lhar, por exemplo, com tranças no cabelo. A intersecção entre raça e classe mostra-se evidente quando
elas passaram a vivenciar situações com trainees e estagiários que estudaram em escolas particulares,
por não terem as mesmas experiências culturais para acessar posições de prestígio, como por exemplo
vivências internacionais6.
Com todas as dificuldades, a segunda geração de executivos negros teve (relativa) maior facilidade de
acesso às empresas em relação à primeira geração, por causa do avanço da agenda positiva de diversida-
de e de inclusão e da ampliação da discussão sobre a redução das desigualdades raciais, tanto na esfera
política como nas iniciativas pública e privada. Uma das ações na agenda foi a Lei de Cotas, de 20127, que
reservou 50% das vagas em universidades e institutos federais a pessoas que estudaram em escolas pú-
blicas, ampliando o acesso da população preta, majoritária nas classes econômicas menos favorecidas, ao
ensino superior.
Outro reforço na agenda positiva veio com o surgimento da sigla ESG, em 2004, em publicação do Banco
Mundial, em parceria com o Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU)8. Chamada Who Cares
Wins (Ganha Quem se Importa)9, a publicação foi resultado de uma provocação do então secretário-geral da
ONU, Kofi Annan, a 50 CEOs de grandes instituições financeiras do mundo e instigou o mercado de capitais
a integrar fatores ESG como critério de investimento nos negócios. O pilar social (o S da sigla ESG) fortaleceu
discussões sobre práticas de diversidade, inclusão, equidade de gênero e racial, ajudando a impulsionar po-
líticas e metas para reduzir a desigualdade nas organizações.
Aos poucos, mais executivas negras começaram a galgar posições C-Level nas empresas. Entre as pionei-
ras, está Rachel Maia, que assumiu o cargo de chief financial officer (CFO) da Tiffany & Co. em 2001, a posição
de CEO da Pandora em 2010 e hoje é conselheira administrativa da Vale, Banco do Brasil e CVC. Outro exem-
plo é Jandaraci Araújo, que foi diretora-executiva do Banco do Povo em 2019 e atualmente é CFO da 99Jobs.

PRETAS NO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO


Em 2019, apenas 13% dos cargos de CEO eram ocupados por mulheres. Desse total, a representativida-
de de mulheres negras era de apenas 1%10. Uma das formas de ampliar a participação em cargos de lide-
rança é por meio da participação de representantes desse grupo em conselhos de administração. Mem-
bros de um conselho administrativo têm a responsabilidade de gerar transparência e credibilidade para
as empresas e são o elo entre os interesses dos acionistas e as atribuições da alta gestão executiva.
Uma líder preta como conselheira é garantia de um olhar de diversidade para a organização, com po-
tencial de aumentar o retorno sobre o investimento. Pesquisa da consultoria McKinsey11 com 700 empre-
sas na América Latina revelou que as organizações com diversidade possuem probabilidade 93% maior
de superarem a performance financeira de seus pares na indústria do que aquelas sem esse perfil. Essa
pesquisa também correlacionou a diversidade a maiores índices de felicidade dos colaboradores, à reten-
ção de talentos e ao maior nível de inovação e colaboração, o que em última instância aumenta a probabi-
lidade de obter resultados financeiros superiores.
Se o número de executivas negras em cargos C-Level ainda é baixo, a representatividade em conselhos
é quase inexistente. Esse foi um dos motivos pelos quais, em agosto de 2020, em plena pandemia de Co-
vid-19, surgiu um programa de incentivo à presença de mulheres negras em conselhos de administração.
O C101 foi criado por um coletivo de mulheres e teve o apoio da consultoria KPMG e da Women Corporate
Directors (WCD). A iniciativa partiu da advogada Lisiane Lemos, que se conectou a representantes da
WCD no Brasil, particularmente à também advogada Marienne Coutinho, sócia-líder da KPMG. Outras
sete executivas fazem parte do grupo fundador.
A primeira turma capacitou 20 executivas negras para os desafios da jornada de uma conselheira de
administração. As selecionadas para o programa aprendem desde temas básicos, como introdução à go-
vernança e formação de conselhos e comitês, até temas mais avançados e práticos, como simulações de
reuniões realizadas por conselhos. Ao todo, 60 mulheres já foram formadas pelo programa. Além dos
hard e soft skills, o programa amplia a perspectiva de participação das mulheres negras como conselhei-
ras, um papel que a maioria delas não vislumbrava anteriormente como uma possibilidade de carreira. Os
resultados até o momento são animadores: 47% das participantes ingressaram em conselhos consultivos,
eméritos, fiscais/auditoria e/ou administrativos, alcançando 50% de movimentações executivas.

EXECUTIVO 19
MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA

DIFICULDADES, AVANÇOS, DESAFIOS E CAMINHOS


Tendo participado da primeira turma do programa, decidi investigar, por meio de uma pesquisa online
aberta para as 60 participantes, quais foram as principais dificuldades e os desafios para o futuro na visão
dessas executivas. Trago as respostas em primeira mão neste artigo.
Feita em dezembro de 2022, a pesquisa obteve 31 respostas (52% do total). Em relação aos cargos que
ocupam atualmente, 13 são executivas C-Level em empresas ou CEOs de seu próprio negócio; oito ocupam
o cargo de diretoras; 10, a função de head; e oito atuam também como conselheiras. As respostas revelam
assim que 25% já estão em posições em conselhos.
Com relação ao tempo em que estão em seus cargos, considerando C-Level, diretora ou head, sete ocu-
pam a posição há menos de um ano; 12, entre um e três anos; cinco, entre três e cinco anos; e sete, há mais de
cinco anos. Os dados mostram que 61% das respondentes estão há menos de três anos em cargos executivos,
ou seja, assumiram essa posição de 2019 em diante, o que corrobora com o fato de que a ascensão de execu-
tivas negras se acentuou nos últimos anos. No que tange ao tempo em que atuam como conselheiras, cinco
das oito participantes que também atuam no conselho passaram a acumular essa função há menos de um
ano; e as outras três, entre um e três anos, o que denota o caráter formador do programa C101.
Ao serem questionadas sobre as principais dificuldades para assumir cargos executivos, o racismo estru-
tural despontou como principal motivo, seguido da ausência de política efetiva de diversidade na organiza-
ção (Figura 1). Cada participante poderia selecionar uma ou mais respostas que se aplicassem ao seu caso.
As participantes também puderam citar dificuldades adicionais que precisam ser superadas para que
outras mulheres negras possam assumir cargos de alta gestão. Elas mencionaram a falta de networking, a
ausência de estrutura institucional e de apoio técnico, o viés inconsciente que gera preconceito por parte
dos gestores, além de questões relacionadas à autoestima e autoconfiança (“não acreditar que [o cargo] era
meu”; “falta de autoconfiança”;
“dificuldade de confiar que daria
Figura1.
certo”; “sentimento de síndrome
As principais dificuldades para assumir o cargo de liderança de impostora”). Apenas uma das
respondentes declarou não ter
tido nenhuma dificuldade para as-
Racismo estrutural
sumir o cargo atual.
Em relação aos principais avan-
Ausência de uma política efetiva
de diversidade na organização ços nos últimos anos, a maioria
das respondentes considerou im-
Falta de preparo para assumir o cargo portante a criação de órgãos para
fomentar a inclusão da mulher
Outros preta na gestão, as políticas de
inclusão e diversidade nas orga-
0 % 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% nizações e o aumento da adoção

Dificuldades de práticas ESG, além de terem


surgido exemplos de outras lide-
ranças negras (Figura 2). Apenas
Figura2. uma das executivas consultada
citou outro avanço, destacando
Os principais avanços na inclusão da mulher preta nos últimos anos demandas regulatórias e ações
afirmativas como regras de diver-
Criação de orgãos ou entidades que fomentam sidade em conselhos para empre-
a inclusão da mulher preta na gestão sas participantes do mercado de
Política de inclusão e diversidade ações Nasdaq.
nas organizações As executivas também foram
Aumento de adoção de práticas ESG questionadas sobre os principais
nas organizações desafios para o futuro. Suas res-
postas revelam diversos insights a
Exemplo de outras lideranças pretas
respeito do que ainda precisa ser
desenvolvido para ampliar a di-
Outros
versidade e a equidade racial e de
0% 20% 40% 60% 80% gênero nas organizações (Figura
ESG: Governança ambiental, social e corporativa Avanços 3). De forma geral, os desafios es-
tão relacionados a: ampliação de

EXECUTIVO 20
MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA

Figura 3.
posições estratégicas e de lideran-
Os principais desafios para o futuro ça para mulheres negras nas em-
presas; capacitação, formação e
Garantir a permanência das mulheres negras que já ocupam posições nas empresas; desenvolvimento de mulheres ne-
Ampliar os espaços para a inclusão de outras mulheres negras entre executivas e conselheiras, gras para essas posições; expan-
garantindo que saiam da base e que apoiem as que já ocupam tais posições; são de programas (como o C-101)
Preparar jovens negras para posições de liderança; que fomentam a participação de
mulheres negras nos conselhos
Dar visibilidade às mulheres negras sêniores e carreirá-las;
de administração; manutenção
Consolidar e expandir iniciativas que já existem nas organizações; e sustentabilidade de metas e
Expandir e escalar programas como aqueles que fomentam a mulher negra nos conselhos (da políticas já iniciadas e intensifi-
formação à entrada efetiva); cação da agenda de diversidade
racial nas empresas; preparo das
Intensificar a agenda de diversidade racial, com a criação e ampliação de políticas privadas e públicas que
organizações para receber lide-
efetivamente funcionem para inclusão de mulheres pretas nas empresas e em posições de liderança;
ranças negras; quebra de vieses
Garantir equidade na remuneração para mulheres e negras em relação a homens e brancos; estruturais e criação de políticas
Considerar nas políticas metas que consideram a transversalidade de problemáticas relacionadas à públicas e privadas; apresentação
questão de raça e gênero; de resultados por parte de conse-
lheiras negras, o que vai garantir
Ter sustentabilidade em ações afirmativas até que cheguemos à igualdade racial nos espaços de poder;
a expansão de sua atuação nos
Permanecer relevante em posições de liderança diante de ambientes complexos, competitivos, conselhos.
inovadores e majoritariamente ocupados por pessoas brancas;
As respostas sinalizam que as
Ter letramento racial mais abrangente e efetivo nos lugares que não entendem a necessidade de uma empresas ainda precisam traba-
mudança de postura e posicionamento; lhar uma série de vieses incons-
Quebrar vieses estruturais; cientes e a própria cultura orga-
nizacional para verdadeiramente
Preparar as organizações para serem lideradas por pessoas negras;
acolher e dar espaço para repre-
Sensibilizar empresas do quanto a diversidade é saudável e traz benefícios para o negócio; sentantes deste e de outros grupos
Garantir que o pertencimento seja de fato genuíno nos ambientes organizacionais. diversos. As executivas consul-
tadas mostraram a necessidade
de resistir para permanecer nos
cargos, de superar ambientes refratários a mudanças e de fazer com que as políticas sejam eficazes e que o
pertencimento seja genuíno, para citar alguns aspectos levantados.
Ao final da pesquisa, foi deixado um campo aberto para observações adicionais ou complementos às
respostas anteriores. As respostas originaram recomendações para ampliar a participação de mulheres ne-
gras na gestão (Figura 4). Entre os
Figura 4. destaques, cabem citar o suporte
e envolvimento das empresas no
Recomendações para ampliar a participação impulsionamento da carreira de
de mulheres negras na gestão mulheres negras, a importância
de grupos de apoio como o C-101,
Não basta visibilidade, é necessário suporte técnico na gestão para que as mulheres negras se o engajamento de pessoas não ne-
sustentem nas posições conquistadas; gras para apoiar e abrir espaços
É preciso ampliar a inclusão de mulheres negras em careiras tradicionais de C-Level, pois as empresas nas instituições e a criação de in-
tendem a circunscrevê-las a carreiras de diversidade e sustentabilidade; dicadores claros de promoção para
pessoas negras. Essas recomenda-
Engajar as pessoas não negras é fundamental para apoiar as iniciativas existentes e abrir espaços
ções podem ser importantes dire-
efetivos nas empresas e instituições;
cionadores para as organizações
Eventos pontuais em períodos de comemoração são efetivos, mas acabam perdendo-se nos demais que desejam ampliar sua agenda
meses. Dessa forma, é importante ter eventos regulares para combater vieses e fortalecer a cultura da
de inclusão.
diversidade;

Construir parâmetros de práticas exemplares setoriais pode ajudar a impulsionar políticas e ações CONSIDERAÇÕES FINAIS
empresariais ou de regulação; Embora o avanço dos temas di-
Programas como C101 são essenciais para dar visibilidade e aumentar as oportunidades; versidade e inclusão seja inegável
nas organizações, trata-se de um
A criação de indicadores claros para carreiras de mulheres negras nas organizações ajuda a consolidar
processo de longo prazo que está
políticas e oferece transparência ao processo de inclusão
apenas começando. As estatísti-

EXECUTIVO 21
MULHERES NEGRAS RUMO À LIDERANÇA

cas apresentadas no início deste artigo mostram que a representatividade de executivas negras ainda é
baixa. As pioneiras, que desbravaram seu caminho de forma individual e de certa maneira heroica, são hoje
inspiração para as novas gerações. A maioria das executivas que já atingiu posições C-Level investe tempo
e esforços em mentorias e participa ativamente de grupos de apoio a mulheres negras. Elas sabem o quão
importante é inspirar outras mulheres com sua trajetória e estão prontas para dar o suporte a questões prá-
ticas que enfrentam no dia a dia e no processo de ascensão profissional.
Do ponto de vista das organizações, o tema diversidade é ainda um potencial a ser explorado. O Brasil é
o país com a segunda maior população negra do mundo (atrás apenas da Nigéria)12, e as mulheres negras
representam 27,8% da população, segundo o IBGE. Ter representantes desse grupo na liderança ou em con-
selhos de administração amplia a visão de mercado das marcas, dá visibilidade a um potencial público-alvo
ainda não atendido e pode revelar talentos que hoje não são considerados na maioria das empresas.
As organizações que querem investir nesse público podem agir de diversas formas: aumentar a partici-
pação de mulheres negras nos conselhos de administração; desenvolver programas de trainee para profis-
sionais negras, permitindo a capacitação dos jovens talentos; investir em programas de desenvolvimento
de lideranças negras; promover o letramento racial em toda a liderança não negra. Mudar pensamentos e
padrões enraizados na sociedade brasileira é essencial para avançar na temática racial e combater os vieses
inconscientes que hoje são predominantes nas culturas organizacionais

NOTAS
1. Instituto Ethos (2016). Perfil social, racial e de gênero das 500 maiores empresas do Brasil e suas ações afirmativas. Instituto Ethos.
Recuperado de https://www.ethos.org.br/wp-content/uploads/2016/05/Perfil_Social_Tacial_Genero_500empresas.pdf
2. Klingspiegel, B. (2022). CEOs negros trabalham o dobro para chegarem à liderança, diz pesquisa. Estadão. Recuperado de https://www.
estadao.com.br/economia/sua-carreira/ceo-negros-trabalham-o-dobro-que-brancos-diversidade-pesquisa/
3. Recuperado de https://www.linkedin.com/company/conselheira101/posts/?feedView=all
4. Coelho Junior, P. J. D. (2011). Executivos negros: racismo e diversidade no mundo empresarial. Uma abordagem socio-antropológica
(Tese de doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo).
5. Coelho Junior, P. J. D., & Hein, A. S. (2021). Gênero, raça e diversidade: trajetórias profissionais de executivas negras. Organizações e
Sociedade, 28(97), 252-281. https://doi.org/10.1590/1984-92302021v28n9702PT
6. Coelho Junior & Hein (2021).
7. Brasil (2012). Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Diário
Oficial da União. Recuperado de http://portal.mec.gov.br/cotas/docs/lei_12711_29_08_2012.pdf
8. Pacto Global Rede Brasil. ESG. Recuperado de https://www.pactoglobal.org.br/pg/esg
9. The Global Compact. (2004). Who Cares Win. The Global Compact. Recuperado de https://documents1.worldbank.org/curated/
en/280911488968799581/pdf/113237-WP-WhoCaresWins-2004.pdf
10. Inper e Talenses (2019). 3ª Pesquisa Panorama Mulher. Recuperado de http://online.fliphtml5.com/gbcem/bczq
11. McKinsey (2020). Diversity Matters: America Latina. Recuperado de https://www.mckinsey.com/br/our-insights/diversity-mat-
ters-america-latina
12. Pereira, D. M. (2022). A face negra do Brasil multicultural. Fundação Cultural.

EXECUTIVO 22
EMPREENDEDORAS Resumo
TRANSFORMAM A Objetivo: apresentar caminhos para fortalecer o
empreendedorismo feminino.

SOCIEDADE Estado da arte: o empreendedorismo feminino


passou a ganhar espaço como uma solução social
no contexto de desigualdade econômica entre
Empreendimentos femininos têm o homens e mulheres, além de apresentar-se com
grande potencial econômico.
potencial de melhorar indicadores Originalidade: o artigo faz a conexão entre
econômicos e sociais no Brasil e os desafios da desigualdade de gênero e o
empreendedorismo feminino no Brasil e apresenta
fortalecem-se com iniciativas que oportunidades de inclusão mais justa das

vão do estímulo à digitalização às


mulheres.

compras afirmativas. Impactos: o artigo contribui para inspirar


mulheres e iniciativas que visam a transformações
mais profundas e sistêmicas, para que tenhamos
uma sociedade mais equilibrada e menos
desigual.
Ana Fontes – Empreendedora, pesquisadora de gênero, especialista
em empreendedorismo feminino e fundadora da Rede Mulher Palavras-chave: mulheres empreendedoras,
Empreendedora (RME) e do Instituto RME. impacto social, empreendedorismo social,
E-mail: ana.fontes@rme.net.br
Débora Monteiro – Gerente executiva no Instituto RME, mestra em
desigualdade de gênero.
Relações Internacionais (USC) e gestora de Políticas Públicas (USP).
E-mail: debora.monteiro@rme.net.br

EXECUTIVO 23
EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE

H
istoricamente, as mulheres não têm tido as mesmas condições nem oportunidades que os
homens nos espaços de poder e dos negócios. Quando fizeram o movimento de sair de suas
casas para trabalhar, elas enfrentaram uma série de dificuldades. Vagas de emprego eram
predominantemente operacionais, em cargos como os de secretárias, atendentes e recep-
cionistas, e faziam exigências preconceituosas que ainda hoje perduram, como a da “boa
aparência”. Lélia Gonzalez1, nos anos 1980, já chamava a atenção para o racismo que atravessa também a
questão de gênero: a tal da boa aparência sempre foi uma moça de cor branca e cabelos lisos.
O cenário vem mudando em ritmo lento. A presença feminina ainda é proporcionalmente mais forte
nos cargos de base do que naqueles de liderança. Para continuar no emprego ou crescer profissionalmente,
assédios devem ser suportados. Se a mulher possui filhos, a vaga não serve para ela; se tem determinada
idade, está velha demais. Não é raro encontrar relatos de mulheres que acabaram de voltar da licença-ma-
ternidade e são demitidas sem grandes explicações. As mulheres, afinal, são as grandes responsáveis pela
economia do cuidado2. De acordo com relatório da Organização Internacional do Trabalho3, elas se dedicam
3,2 vezes mais do que os homens nos trabalhos não remunerados de cuidado.
É difícil conciliar as demandas domésticas com um emprego celetista, ainda mais se a mulher morar lon-
ge do seu local de trabalho. O empreendedorismo surge como uma via para flexibilizar a rotina de trabalho
sem deixar de conseguir renda e independência financeira. Apesar de a expressão ser atualmente roman-
tizada, ser a sua própria chefe é um caminho que a mulher procura para se livrar de situações de assédio e
abusos a que possivelmente estaria submetida em um ambiente empresarial.

O RETRATO DAS MULHERES EMPREENDEDORAS


Pesquisa do Instituto Rede Mulher Empreendedora (RME) de 20224 ouviu 3.386 mulheres de cinco regi-
ões do país para entender o perfil atual das mulheres que resolvem trabalhar por conta própria ou abrem
um negócio. Desponta em primeiro lugar, entre as razões para empreender, a vontade de ter independência
financeira (Figura 1). Se observarmos o conjunto de motivos mais frequentes, constatamos uma mistura
entre a ambição de encontrar oportunidades melhores e a necessidade de ter renda e conseguir conciliar a
carga de atividades diárias.
Mas quem é a mulher brasileira que empreende no dia a dia? Ela é, em geral, mãe, casada e negra e não
cursou o ensino superior. Metade pertence à classe C de nossa sociedade, e 34%, às classes A e B. Metade
trabalha na informalidade, já que a maioria não tem recursos para custear impostos e outras obrigações. O
percentual de empreendedoras informais é bem superior no norte e nordeste (75 e 64%, respectivamente),
do que no centro-oeste, sul e sudeste (49, 43 e 41%, respectivamente).
O Brasil conta com mais de 52 milhões de empreendedores, dos quais 30 milhões são mulheres, tornando
nosso país o sétimo com mais empreendedores do sexo feminino no mundo5. Mediante a falta de um merca-
do para mulheres profissionais, ou de um que esteja disposto a contratá-las, iniciativas de empreendedoris-
mo absorvem a população feminina desempregada. No Brasil, 47% do empreendedorismo feminino é mo-
tivado por necessidade – para os homens, esse índice é de 34%6. Para efeitos de comparação, em países da
América do Norte, a taxa média de empreendedorismo feminino por necessidade é de apenas 13% e, mesmo
na América Latina e no Caribe, é de 30%, colocando as brasileiras em clara desvantagem7. Ou seja, no Brasil,
o empreendedorismo feminino acaba sendo uma solução para levar comida à mesa de milhões de famílias.
Considerando que o percentual de mulheres que empreendem por necessidade é maior do que o de ho-
mens, é de se esperar que a predominância de porte empresarial também difira. De fato, enquanto 80% das
empreendedoras obtêm faturamento mensal de até 5 mil reais, 69% dos empreendedores homens situam-se
nesse patamar de renda8. Com a pandemia, a fragilidade dos empreendimentos conduzidos por mulheres
pode ter crescido comparativamente à daqueles liderados por homens. De acordo com o estudo9 realizado
pela Nubank em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e o Banco
Interamericano de Desenvolvimento, enquanto os microempreendedores individuais (MEIs) masculinos
tiveram receita média 10,8% superior à feminina em 2020, essa diferença cresceu para 33% em 2021.

POR QUE ESTIMULAR O EMPREENDEDORISMO FEMININO


Mudar o panorama do empreendedorismo feminino é importante por diversas razões. Estudos10
mostram que mulheres alocam a maior parte de sua renda na educação dos filhos, no bem-estar da
família e no auxílio à comunidade onde vivem, ao passo que os homens tendem a priorizar bens con-
sumíveis11. Além disso, é importante ressaltar que 45% dos negócios gerenciados por mulheres acabam
empregando majoritariamente outras mulheres – no caso dos negócios liderados por homens, esse
percentual é de apenas 21%12. Isso cria, automaticamente, um ciclo positivo de acolhimento e prospe-
ridade local.

EXECUTIVO 24
EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE

Figura1.

Razões para ter o próprio negócio/trabalhar por conta própria (%)


TOTAL DE MENÇÕES PRINCIPAL MOTIVO

Para ter mais independência, ser meu (minha)


38 13
próprio(a) chefe

Para crescer na vida e ter mais oportunidades 34 10

Para fazer minha própria rotina e ter mais


31 8
tempo para fazer outras atividades

Empreender sempre foi um sonho meu 35 17

Por falta de trabalho/desemprego 24 13 24% Classe DE


17% Ensino
fundamental
Para ganhar mais 18 5

Para buscar novos desafios 23 5

Para equilibrar melhor trabalho e família 25 8

Para juntar dinheiro para realizações materiais


20 5
(casa própria, carro próprio etc.)

Não tinha outra opção 13 5

Surgiu uma boa oportunidade 15 4

Queria mudar de carreira 9 3

Para juntar dinheiro para estudar (fazer


4 0
faculdade, curso etc.)

Para manter um negócio da família 4 2

Para ter mais tempo para estudar 2 1

Outro 4 1

FONTE: INSTITUTO REDE MULHER EMPREENDEDORA

O fortalecimento do empreendedorismo feminino contribui para a diminuição da violência doméstica.


No Brasil, 34% das empreendedoras já sofreram algum tipo de agressão em relações conjugais. Ao empreen-
der, 48% delas conseguiram independência financeira para sair desses relacionamentos abusivos e violen-
tos13. Na pesquisa do Instituto RME, 81% das mulheres consultadas concordaram que ter o próprio dinheiro
traz maior autonomia à vida e independência nas relações14.
As empreendedoras que fizeram parte do levantamento do Instituto RME foram também questionadas
sobre as políticas públicas que mais atraem seus votos. Em primeiro lugar, elas valorizam projetos voltados
à educação, desde creches até universidades. Quando uma mulher avança, ela investe mais na educação dos
filhos e na sua própria educação, demonstrando que é por meio do ensino que pode conquistar mais espaços.
Em negócios de mulheres que tiveram mais oportunidades, há também evidências de que elas conse-
guem desempenho superior. Na First Round, empresa de capital de risco dos Estados Unidos especializada
em fornecer financiamento inicial para startups de tecnologia, as empresas fundadas por mulheres repre-
sentam uma porcentagem maior de seus investimentos do que a média nacional de investimentos de ven-
ture capital. Em suas análises15, as empresas com uma fundadora mulher tiveram desempenho 63% melhor
nos investimentos do que com equipes de fundadores exclusivamente homens.

EXECUTIVO 25
EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE

CAMINHOS PARA FORTALECER EMPREENDIMENTOS DE MULHERES


Listamos a seguir as principais recomendações que, acreditamos, serem essenciais para reforçar o em-
preendedorismo feminino no Brasil.

Facilitar acesso a diferentes tipos de capital


Estudos mostram que investidores preferem negócios atraentes e passíveis de lucro que sejam liderados
por homens16. Em pesquisa do Instituto RME, 42% das empreendedoras que disseram já ter solicitado cré-
dito em algum momento da vida tiveram seus pedidos negados17. Entre os fatores que explicam a diferença,
estão os culturais18. Quando olham para negócios liderados por homens, investidores procuram entender
o potencial de ganho e lucratividade, enquanto no caso dos negócios das mulheres a dúvida é como vão
prevenir possíveis perdas19.
De modo geral, essa preocupação não tem fundamento. Relatório da Fundação Marion Ewing Kauffman
comparou o retorno sobre o investimento de equipes lideradas por mulheres e homens e verificou retorno
positivo 35% maior do que as empresas com apenas lideranças masculinas20. Há também o levantamento já
citado da First Round com sua carteira de investimentos em startups, que fornece evidências de desempe-
nho superior entre empreendimentos criados por mulheres.
Além de mudar vieses entre os atores de crédito convencional e fundos de venture capital, que em sua
grande maioria investem em empresas mais maduras que desejam expandir suas operações, há que se es-
timular os investidores anjos21, que contribuem com iniciativas inovadoras que estão saindo do papel e
precisam de recursos financeiros iniciais para entrar no mercado. Também é fundamental fortalecer e mul-
tiplicar opções de microcrédito e cooperativas locais de moeda solidária, como o Banco Social do Vergel22,
que possui um olhar mais atento para empreendedoras de periferia, dando oportunidades moldadas de
acordo com o seu contexto local.

Oferecer mais oportunidades de acesso à inovação


Existem indícios de que as mulheres empreendedoras obtêm menor acesso a programas de inovação do
que os homens. De acordo com levantamento da plataforma Pipe.Social23 sobre características de 1.272 ne-
gócios de impacto, esses empreendimentos que buscam, além do lucro, mudanças ambientais e sociais têm
equilíbrio entre times femininos e masculinos. Por outro lado, aqueles administrados por mulheres captam
proporcionalmente menos recursos, são menos acelerados e, por conseguinte, estão menos presentes na
fase já de consolidação de escalar o negócio24. A maior discrepância, de acordo com a pesquisa, ocorre no
acesso à aceleração.
As mulheres são minoria em programas de aceleração no ecossistema empreendedor. Dessa forma, elas
acabam tendo menor acesso a oportunidades essenciais. Uma das saídas é voltarmos nossa atenção para o
maior incentivo de representatividade nessas iniciativas. Existem programas de aceleração exclusivos para
mulheres, como é o caso do RME Acelera25, que desde 2018 tem como objetivo potencializar negócios e star-
tups fundados por mulheres, facilitando a conexão com possíveis investidores.

Incentivar a digitalização dos negócios


A pandemia escancarou a necessidade da digitalização dos negócios. Em pesquisa realizada pelo Insti-
tuto RME, mulheres colocam esse ponto como necessidade fundamental para a sobrevivência dos próprios
negócios. Com a pandemia, esse foi um aspecto crítico. Para 62% das consultadas pelo Instituto RME, o
impacto da digitalização foi positivo para o negócio. Muitas empreendedoras adotaram então ferramentas
para os seus empreendimentos, como sites e blogues próprios, plataformas de e-commerce, redes sociais e
aplicativos de mensagens para gestão, divulgação e como ferramenta de vendas26.
Como os recursos digitais são essenciais às empreendedoras, acreditamos importante a multiplicação
de projetos de capacitação voltados exclusivamente para o letramento digital, que envolvam não somente
a capacidade de compreender as situações de leitura e escrita que acontecem no contexto tecnológico, mas
também a utilização de recursos e ferramentas que auxiliem na gestão do negócio. Como exemplo de pro-
jeto nessa linha, o Instituto RME com a Visa Foundation criou em 2021 o Projeto Elas Digitalizam27, a fim de
capacitar as mulheres no meio digital. O projeto foi voltado para problemas específicos, como dificuldades
no entendimento sobre transformação digital, estratégia digital para negócios e melhores modelos digitais
para empreendimentos, além de gerenciamento do tempo, considerando a gama de canais disponíveis.
Outro fator importante a destacar é a desigualdade no acesso à internet. Em escala global, há 259 milhões
de homens a mais do que mulheres usando a internet. Embora as mulheres representem cerca de metade da
população, elas ainda são uma parcela desproporcional – e crescente – da população off-line global28. É im-

EXECUTIVO 26
EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE

portantíssimo que o governo crie programas de rede de internet para todas as regiões do país para melhorar
a conectividade de todas as pessoas, principalmente das mulheres. O acesso à internet vem atrelado a polí-
ticas de incentivo à geração de emprego e renda, uma vez que o recurso ainda não é gratuito, e os aparelhos
de conexão não são tão acessíveis. Programas globais de hubs de internet de comunidades carentes29 podem
servir de exemplo de modelos de conectividade que dão certo.

Possibilitar maior acesso a mercados


Quando o mercado está equilibrado, os empreendimentos de mulheres podem competir com sucesso
com as empresas lideradas por homens. Uma das formas de garantir melhores condições para as empre-
endedoras superarem as barreiras superiores que enfrentam é incentivar políticas de compras afirmativas.
Normalmente, essas políticas estimulam grandes empresas a adquirirem produtos e serviços de pequenos
negócios liderados por mulheres, assim como programas que facilitam essa conexão.
Entre as políticas, a ONU Mulheres30 publicou um guia corporativo de compras sensíveis a gênero, com
recomendações para empresas criarem seus planos, além de ferramentas e técnicas para os colocarem em
prática. Entre os programas, destacamos o RME Conecta31, desenvolvido pela RME com especialistas na
área de vendas e que, desde 2019, conecta negócios de mulheres com grandes empresas para negociação e
fornecimento business-to-business (B2B).
Políticas e programas de compras afirmativas têm dado bons resultados. Estudo recente de McKinsey32
chegou à conclusão de que empresas que compram de mulheres e de grupos minoritários nas cadeias de
suprimento têm impacto positivo em termos de inovação, resiliência e competitividade. O guia de compras
afirmativas da ONU Mulheres cita o exemplo da AT&T, gigante das telecomunicações que, em 2014, atribuiu
US$ 4 bilhões da receita aumentada ao engajamento de fornecedoras mulheres.
Outro caminho para possibilitar maior acesso aos mercados é fortalecer redes de negócio entre mulhe-
res. Redes ou grupos servem tanto para apoio em momentos de necessidade como para networking, troca
de experiências e aprendizados. Faz-se preciso sempre lembrarmos que o empoderamento feminino não
ocorre no individual, mas sim no coletivo33.
É válido pontuar que o Estado também precisa ser envolvido em alguns eixos-chave para que a mudança
cultural tenha um peso maior sobre determinados setores que não se movem somente com a pressão da
sociedade civil. Além disso, é fundamental o fomento de políticas públicas de compras afirmativas para
empresas do setor público, a fim de que cada vez mais mulheres possam adentrar nas diferentes portas de
entrada do mercado econômico.

Promover educação e capacitação


Há tendência global de aumento da escolaridade das mulheres em relação aos homens. No Brasil, entre os
homens com 25 anos ou mais de idade, 15,1% têm ensino superior completo, enquanto entre as mulheres na
mesma faixa etária 19,4% completaram o ensino superior34. Na amostra da pesquisa do Instituto RME, 45%
das mulheres já realizaram algum curso ou formação para empreendedores e 67% planejam ainda realizá-lo.
Esses pilares são fundamentais para a inclusão das mulheres no mundo empreendedor e em uma so-
ciedade justa: aprender, capacitar-se, preparar-se para os negócios e, consequentemente, gerar renda
para si. Os dados deixam claro que vontade existe, falta talvez que o caminho seja de alguma forma faci-
litado para essa mulher.

Garantir que os direitos das mulheres sejam assegurados


Para que uma mulher possa empreender e ter sua dignidade humana respeitada, é preciso que o Estado
democrático de direito crie políticas e mecanismos capazes de respaldar juridicamente direitos garantidos

..
de maneira constitucional. Entre eles, reforçamos:
Enfrentamento a toda e qualquer forma de discriminação contra a mulher;

..Enfrentamento a toda e qualquer forma de violência contra a mulher;


Enfrentamento a toda e qualquer forma de racismo;

.Mitigação da insegurança alimentar gerada pela alta taxa de inflação da cesta de alimentos básicos;
Garantia do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
Por fim, esperamos que haja políticas públicas capazes de fortalecer programas de empreendedorismo
feminino já existentes, assim como uma esfera pública que aceite, e não rejeite, a mulher como formula-
dora dessas políticas. Além disso, é muito importante que mulheres ocupem diferentes espaços de poder,
sejam eles governamentais, sejam empresariais, sejam midiáticos, sejam organizacionais. Somente com
mais mulheres pensando por elas mesmas vamos avançar nas pautas que tanto queremos. Ocupar lugares
estratégicos é fundamental para virar o jogo da desigualdade de gênero.

EXECUTIVO 27
EMPREENDEDORAS TRANSFORMAM A SOCIEDADE

NOTAS
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%C3%A0%20educa%C3%A7%C3%A3o%2C%20mostra%2Dse,1%25%20t%C3%AAm%20ensino%20superior%20completo

EXECUTIVO 28
A PRESENÇA FEMININA Resumo
NOS CONSELHOS Objetivo: mostrar a importância de aumentar
a participação de mulheres nos conselhos de
administração das empresas do Brasil.

Mulheres nos mais altos órgãos de Estado da arte: a presença de mulheres nos
controle das empresas podem trazer conselhos traz benefícios para as organizações
em múltiplas dimensões, mas o impacto
benefícios em aspectos como ética, positivo depende de um contexto de equidade
e transparência, e elas ainda estão sub-
diversidade, recursos humanos, representadas, particularmente no Brasil.

sustentabilidade, inovação, estratégia e Originalidade: o artigo apresenta uma análise

relacionamento com o consumidor e nos


atual do cenário, com os benefícios de um
conselho diverso em gênero e caminhos para

resultados financeiros, mas é preciso aumentar a participação das mulheres.

aumentar sua participação. Impactos: o artigo contribui para inspirar o


aumento da participação de mulheres nos
conselhos de administração, com potencial
efeito cascata dentro das organizações.

Palavras-chave: conselheiras, mulheres no


conselho de administração, desigualdade
Deborah Patricia Wright – Conselheira do Banco Santander e do
de gênero.
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.
E-mail: dw@deborahwright.com.br

EXECUTIVO 29
A PRESENÇA FEMININA NOS CONSELHOS

“Não consigo avaliar se mulheres são melhores do que os homens,


mas com certeza posso afirmar que não são piores”
(Golda Meir, primeira-ministra de Israel).

A
diversidade ganhou protagonismo nos principais fóruns de debate globais. Grande parte das
empresas e dos investidores, em maior ou menor grau, já se convenceu da relevância do tema
e o incluiu em suas diretrizes estratégicas. Permanece ainda o desafio de fazê-lo acontecer
nos diversos ecossistemas organizacionais e, de maneira especial, nas lideranças.
A transformação não acontecerá sem mudança sistêmica e disposição para questionar ins-
trumentos tradicionais utilizados pelas áreas de recursos humanos em seleção e recrutamento, avaliação de
desempenho e critérios de escolha dos melhores candidatos para promoção. Há ainda muito por fazer para
assegurar a representatividade da diversidade, alinhando metas com a estratégia do negócio e promovendo
as mulheres a posições de linha, técnicas, executivas e conselheiras.
Este artigo ressalta a importância de aumentar a representatividade das mulheres em conselhos de ad-
ministração. O conselho, em última análise, é o guardião da cultura organizacional e, para além do exemplo,
direciona a organização para alcançar os níveis aceitáveis de diversidade, assegurando igualdade e justiça
na gestão de oportunidades na empresa.

BENEFÍCIOS DA DIVERSIDADE
Comprovadamente, a diversidade tem impacto tangível sobre a produtividade no trabalho e sobre o valor
organizacional. Estudos da McKinsey conduzidos durante um período de cinco anos demonstram correla-
ção positiva, estatisticamente significativa, entre a diversidade, tanto de gênero quanto de etnicidade, e o
desempenho financeiro de uma organização.
Esses estudos foram conduzidos em três momentos, gerando os relatórios Diversity Matters1, de 2015;
Delivering Through Diversity2, de 2018; e Diversity Wins3, de 2000. Os resultados sustentam o argumento
em favor da diversidade, definida como maior proporção de mulheres e indivíduos étnico e culturalmente
diversos em posições de liderança. Estabelece-se clara conexão entre a diversidade e melhores resultados
financeiros. O último levantamento, conduzido em 15 países de cinco continentes, com um universo de
mais de mil empresas de grande porte, mostrou rentabilidade 25% superior entre as empresas do quartil
com maior diversidade de gênero nos times executivos com relação àquelas do quartil com menor diversi-
dade. Em termos de etnicidade, a diferença foi de 36%.
Mergulhando na questão de gênero, a presença de mais mulheres nas organizações promove maior con-
fiança e diálogo aberto, construindo uma cultura orientada à colaboração, o que impacta em uma agenda
de inovação mais robusta. O aumento da participação feminina também sustenta práticas empresariais e
comportamentos de liderança eficazes, levando a equipes mais motivadas e melhor saúde organizacional,
definida como a capacidade de entregar resultados superiores no longo prazo4.
Em levantamento com empresas europeias realizado em 20205, a agência de classificação de risco Moo-
dy’s concluiu que, entre as que apresentaram melhores notas de crédito, havia um fator em comum: maior
representatividade de mulheres em conselho e nas diretorias executivas. Quando uma empresa obtém bom
rating, tem acesso a crédito mais barato e de melhor qualidade. Esse resultado confirma o que havia sido
encontrado também entre empresas americanas, em 2019: as que tinham mulheres em cargos de liderança
apresentavam maior abertura para mudanças e menor propensão a risco6. Podemos assim afirmar, sem
medo de errar, que a diversidade faz sentido e é bom para os negócios.

BENEFÍCIOS DE TER MULHERES NO CONSELHO


Ao colocarmos uma lupa sobre as mulheres em conselhos no Brasil, pesquisas mostram ganhos impor-
tantes. Estudo da KPMG que analisou 293 empresas de capital aberto7 detectou que o percentual de mulhe-
res nas posições de conselhos no país dobrou, de 8% em 2018 para 16% em 2021. O board index da Spencer
Stuart8, com amostra de 211 empresas listadas nos segmentos diferenciados de governança corporativa da
bolsa de valores, também mostra crescimento, de 7,2% em 2015 para 14,3% em 2021 (Tabela 1).
Embora acredite na importância de celebrarmos as vitórias, precisamos reconhecer que as mulheres ain-
da estão sub-representadas nos conselhos das empresas brasileiras. O mesmo estudo da Spencer Stuart
mostra percentual médio internacional de presença das mulheres em conselhos de 27,1%. Além disso, alerta
para queda no número percentual de mulheres atuando como presidentes de conselhos no Brasil, de 7,3%
em 2019 para 4,5% em 2021, além de apontar a baixa proporção de empresas com três ou mais mulheres nos

EXECUTIVO 30
A PRESENÇA FEMININA NOS CONSELHOS

Figura 1.
conselhos (Figura 1). Outro levantamento, da Deloit-
Número de membros mulheres nos conselhos de te9, coloca o Brasil em 39º lugar entre 51 países em

empresas listadas no mercado de ações do Brasil*.


percentual de cadeiras em conselhos ocupadas por
mulheres nas empresas.
Estudos vêm analisando o efeito das mulheres
Cinco ou mais Quatro
em conselhos no desempenho das empresas. A ONU
2% 2%
Mulheres sintetiza resultados de diversos levanta-
Três
mentos que sinalizam resultados financeiros supe-
9% riores em empresas com participação maior de mu-
lheres no conselho10.
Na academia, cabe destacar ampla revisão da
literatura realizada por Anja Kirsch no periódico
Nenhuma Duas The Leadership Quaterly11. Essa revisão aponta para
35% 17% evidências positivas da presença feminina em con-
selhos considerando aspectos éticos como menor
índice de fraudes corporativas, menor evasão fiscal,
menos erros contábeis, melhor qualidade de resul-
Uma
tados financeiros, melhor disclosure das atividades,
35%
maior transparência e códigos de ética mais abran-
gentes. Além disso, mostra também efeitos favorá-
veis em indicadores de responsabilidade social cor-
porativa.
*NOVO MERCADO, NÍVEL 1 E NÍVEL 2 DA B3. FONTE: SPENCER STUART
Em relação aos indicadores financeiros, a revisão
publicada na The Leadership Quaterly ressalta que,
apesar de haver estudos que mostram ligação entre mulheres nos conselhos e diferentes medidas contábeis
e de mercado de ações, os resultados dependem do contexto. Em países mais equalitários em termos de
gênero, a presença de mulheres em conselhos confere legitimidade e sinalização favorável ao mercado de
capitais. No caso dos indicadores contábeis, as pesquisas mostram que, quando os países têm regulamen-
tações maduras de proteção aos acionistas, há incentivos para os conselhos de fato atuarem devidamente
e utilizarem os valores e os conhecimentos das mulheres membros para a tomada de melhores decisões.
As mulheres têm potencial para contribuir positivamente para as organizações por diferentes razões.
Estudos mostram que elas são mais comprometidas com suas tarefas nos conselhos: são mais assíduas, pre-
param-se mais para as reuniões, tomam mais notas e acompanham com maior afinco os desdobramentos
nas ações da liderança executiva das empresas12. As pesquisas também evidenciam que as mulheres trazem
diferentes experiências e habilidades, apresentam múltiplos pontos de vista para as discussões, questio-
nam e aprofundam mais os temas, além de conseguirem trabalhar para um ambiente menos conflituoso
e mais colaborativo13. Também há contribuição das mulheres nos conselhos para a retenção de talentos14,
inovação15 e compreensão dos consumidores16.
Há ainda evidências de que as mulheres conseguem colaborar nos conselhos quando elas encontram um
ambiente mais equitativo e aberto para suas ideias e conseguem fazer articulações de poder dentro e fora
das organizações17. Ter mais que uma mulher em um conselho propicia um ambiente favorável para que elas
possam exercer plenamente suas atividades, assim como mulheres nos conselhos fortalecem a equidade de
gênero em toda a organização. O estudo de Anja Kirsch18 mostra que há associação entre mais mulheres no
conselho e diversidade de gênero em diferentes níveis organizacionais, sucesso de chief executive officers
(CEOs) mulheres e redução de gap salarial por gênero.
No caso brasileiro, os estudos mostram resultados inconclusivos sobre a ligação entre a presença femini-
na nos conselhos e os resultados das empresas. Ao fazerem um estudo que apresenta leve relação favorável
e apontarem pesquisas anteriores com resultados divergentes, Claudio Pilar da Silva Júnior e Orleans Sil-
va Martins19 frisam que os efeitos da participação feminina sobre o desempenho financeiro poderiam ser
maiores se houvesse uma mudança mais profunda em vez do tokenismo, ou seja, inserção de uma ou outra
mulher apenas para dar aparência de diversidade, em vez de aumentar de fato a representatividade femini-
na e ter políticas para dar voz a elas.

CAMINHOS
O novo capitalismo de stakeholders, com maior foco em ambiental, social e governança (ASG) e em di-
versidade, inclusão e equidade (DIE), exige uma nova postura dos conselhos de administração e dos con-
selheiros. O valor de um colegiado diverso que apresente em sua composição competências profissionais

EXECUTIVO 31
A PRESENÇA FEMININA NOS CONSELHOS

diferentes e complementares vai definindo um novo perfil para os conselhos de alta performance.
Embora o momento possa até se traduzir em maiores oportunidades para mulheres, o fato é que não há
um único caminho para o aumento de sua participação nos conselhos. O crescimento do número de conse-
lheiras segue lento, mesmo com discussões mais frequentes de que a diversidade é relevante.
Sabemos que todos nós temos vieses, inconscientes ou não, e por mais neutro e bem-feito que seja o pro-
cesso de seleção de candidatos a conselho, a decisão final será tomada por um ser humano ou um comitê de
nomeações. Cerca de 90% dos membros de conselho são indicados por sua rede de relacionamentos20, e no
Brasil essas redes são predominantemente masculinas.
Nos últimos anos, vêm surgindo no país iniciativas para fortalecer redes femininas, preparar mulheres
para assumir posições de conselho e fazer advocacy em relação ao tema. Exemplo é a Women Corporate
Directors (WCD), com uma base de 350 associadas. A WCD, juntamente com a Bolsa de Valores do Brasil
(B3), o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e a International Finance Corporation (IFC),
promove o Programa Diversidade em Conselho, com mentoria, cursos e eventos. Outro exemplo é o 30%
Club Brazil, capítulo brasileiro de um movimento global que busca atingir 30% de mulheres nos conselhos.
Cabe destacar ainda o Conselheira101 (C101), programa para aumentar a presença de mulheres negras em
conselhos de administração.
Além das redes, muitos países têm imposto cotas para mulheres nos conselhos. A Noruega foi pioneira
ao fazê-lo em 2005 e hoje é a vice-líder em proporção de assentos em conselhos ocupados por mulheres
(42,4%), atrás apenas da França (43,2%), que também tem legislação a respeito21. É crescente o número de
países que vêm inserindo cotas, e a União Europeia está adotando leis a respeito. Há ainda países que esta-
belecem cotas somente para as empresas estatais ou que determinam a obrigatoriedade de divulgação do
percentual de mulheres em conselhos para as empresas de capital aberto. Outros países vêm preferindo o
caminho da autorregulação, estimulando a adoção de metas estabelecidas pela própria empresa e a divul-
gação da evolução.
A questão de cotas é assunto controverso. A experiência mostra que os resultados dependem do contexto
cultural de cada país. Pode-se observar que os países que adotaram alguma forma de ação afirmativa estão
mais adiantados em seus índices quando comparados aos que ainda não o fizeram. O caso europeu mostra
que, sem nenhum estímulo, as mulheres dificilmente saem do lugar. Países da Europa sem nenhum tipo de
estímulo têm um percentual de 18% de mulheres nos conselhos, em média. Já nos que têm cotas chamadas
soft, no formato de metas a empresas, esse percentual sobe para 30,7%; e naqueles com cotas obrigatórias
por lei, aumenta para 38,8%22.
No Brasil, a B3 sugere a adoção do modelo “pratique ou explique” para a questão da diversidade. Até
2026, companhias em todos os níveis de listagem da bolsa devem ter ao menos uma mulher e um integrante
de comunidade minorizada no conselho ou na diretoria estatutária.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Resumindo, por que é importante falarmos de diversidade de gênero em conselhos? Inicialmente, por-
que amplia a base disponível de talentos, aumenta o engajamento entre colaboradores, melhora a qualida-
de das lideranças, conecta melhor a marca com seus clientes e consumidores e dá acesso a uma gama mais
variada de competências e conhecimentos.
Há efeito positivo claro em aspectos sociais e éticos do comportamento do conselho, criando melhor
dinâmica de grupo e influenciando também o aumento da diversidade nos demais níveis da organização.
O fortalecimento de mulheres nos conselhos contribui ainda para o conhecimento e a geração de valor,
pois, na base de todo o processo de inovação de sucesso está a diversidade cognitiva ou a pluralidade de
experiências e visões.
Diversidade é um assunto de governança e gestão. Para ser bem-sucedida, deve contar com o envolvi-
mento de todos os níveis das organizações.
É sobre decisões e escolhas. Que saibamos fazer as corretas!

NOTAS
1. Hunt, V., Layton, D., & Prince, S. (2015). Diversity Matters. McKinsey. https://www.mckinsey.com/~/media/mckinsey/business%20
functions/people%20and%20organizational%20performance/our%20insights/why%20diversity%20matters/diversity%20matters.pdf
2. Hunt, D. V., Yee, L., Prince, P., & Dixon-Fyle, S. (2018) Delivering through diversity. McKinsey. https://www.mckinsey.com/capabilities/
people-and-organizational-performance/our-insights/delivering-through-diversity
3. McKinsey (2020). Diversity Wins. McKinsey. https://www.mckinsey.com/~/media/mckinsey/featured%20insights/diversity%20
and%20inclusion/diversity%20wins%20how%20inclusion%20matters/diversity-wins-how-inclusion-matters-vf.pdf
4. Tonelli, M. J. (2022). Uma questão de gênero. GV-Executivo, 21(3). https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/gvexecutivo/article/
view/88036

EXECUTIVO 32
A PRESENÇA FEMININA NOS CONSELHOS

5. Moody’s (2020). Higher ratings related to higher diversity at European corporate boards. Moody’s. https://www.moodys.com/research/
Moodys-Higher-ratings-related-to-higher-diversity-at-European-corporate--PBC_1215330
6. Moody’s (2019). Gender diversity is correlated with higher ratings, but mandates pose short-term risk. Moody-s. https://www.moodys.
com/researchdocumentcontentpage.aspx?docid=PBC_1184245
7. KPMG (2022). A governança corporativa e o mercado de capitais. KPMG https://assets.kpmg/content/dam/kpmg/br/pdf/2022/12/
governanca-corporativa-mercado-capitais-17-edicao.pdf
8. Carneiro, F., Carvalho, H., & Aguiar, O. (2022). Brasil Board Index 2021. Spencer Stuart https://www.institutobkk.org.br/wp-content/
uploads/2021/10/Board-Index-Brazil-2021-Spencer-Stuart.pdf
9. Deloitte Global Boardroom Program (2022). Progress at a snail’s space: women in the boardroom: a global perspective. Deloitte e The
30% Club. https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/global/Documents/gx-women-in-the-boardroom-seventh-edition.pdf
10. ONU Mulheres (2021). Business Case – Perspectivas de gênero e inclusão nas empresas: Impactos financeiros e não financeiros. ONU
Mulheres. http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2021/09/Business-Case_Report-1-Portuguese.pdf
11. Kirsch, A. (2018). The gender composition of corporate boards: A review and research agenda. The Leadership Quarterly, 29(2), 346-
364. https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2017.06.001
12. Adams, R. B., & Ferreira, D. (2009). Women in the boardroom and their impact on governance and performance. Journal of Financial
Economics, 94(2), 291-309. https://doi.org/10.1016/j.jfineco.2008.10.007; Khemakhem, H., Maalej, M., & Fontaine, R. (2022). Inside
the black box: How can gender diversity make a difference in the boardroom? Equality, Diversity and Inclusion, (no prelo); Huse, M., &
Solberg, A. G. (2006). Gender-related boardroom dynamics: How Scandinavian women make and can make contributions on corporate
boards. Women in Management Review.
13. Kim, D., & Starks, L. T. (2016). Gender diversity on corporate boards: Do women contribute unique skills? American Economic Review,
106(5), 267-271; Khemakhem et al. (2022); Kirsch (2018).
14. Terjesen, S., Sealy, R., & Singh, V. (2009). Women directors on corporate boards: A review and research agenda. Corporate Governance,
17(3), 320-337. https://doi.org/10.1111/j.1467-8683.2009.00742.x
15. Torchia, M., Calabrò, A., & Huse, M. (2011). Women directors on corporate boards: From tokenism to critical mass. Journal of Business
Ethics, 102(2), 299-317.
16. Korenkiewicz, D., & Maennig, W. (2022). Women on a corporate board of directors and consumer satisfaction. Journal of the Knowl-
edge Economy, 1-25.
17. Westphal, J. D., & Milton, L. P. (2000). How experience and network ties affect the influence of demographic minorities on corporate
boards. Administrative Science Quarterly, 45, 366-398; Huse & Soberg (2006); Konrad, A. M., Kramer, V., & Erkut, S. (2008). The impact
of three or more women on corporate boards. Organizational Dynamics, 37(2), 145-164.
18. Kirsch (2018).
19. Silva Júnior, C. P. D., & Martins, O. S. (2017). Mulheres no conselho afetam o desempenho financeiro? Uma análise da representação
feminina nas empresas listadas na BM&FBOVESPA. Sociedade, Contabilidade e Gestão, 12(1).
20. Yang, B. (2020). Women On boards: how to close the gap. Forbes. https://www.forbes.com/sites/bedyyang/2020/03/31/women-on-
boards-how-to-close-the-gap/?sh=29e728313a38
21. Deloitte Global Boardroom Program (2022).
22. Gaudiano, P. (2022) EU law set to increase gender diversity on company boards. Forbes. https://www.forbes.com/sites/paologaudia-
no/2022/11/30/eu-law-set-to-increase-gender-diversity-on-company-boards/?sh=5f8c34e833ea

EXECUTIVO 33
COVID-19: UMA JANELA Resumo
PARA FRAUDES Objetivo: entender a percepção dos participantes do
mercado de governança, riscos e compliance (GRC) sobre
ocorrência de fraudes corporativas no período crítico da

CORPORATIVAS? Covid-19.

Estado da arte: estudos mostram que momentos de


crise favorecem fraudes. Conforme a ótica do triângulo
Profissionais de governança, risco e de fraudes, a maior suscetibilidade vem do crescimento

compliance perceberam crescimento


de pressões, das oportunidades para fraudar e da
racionalização para justificar os atos fraudulentos.

de vulnerabilidades com a pandemia, Escopo: o estudo foi realizado com base em questionário de
mas também foram adotadas ações survey respondido por 120 profissionais de GRC, testes de
hipótese e análises descritivas.
para mitigá-las que podem ser usadas Originalidade: o artigo traz a percepção dos participantes
para enfrentar crises futuras. do mercado de GRC no Brasil sobre o aumento de fraudes
durante a Covid-19, mostra quais ações foram tomadas
para mitigar os problemas e as perspectivas para o futuro.
Iedo Matuella Filho – Mestre pela Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEA-RP/USP). Impactos: a pesquisa pode auxiliar profissionais com
E-mail: iedofilho@alumni.usp.br benchmark de alterações do GRC em momentos de tomada
Claudio de Souza Miranda – Professor da Faculdade de Economia, de decisão acelerada e com pouca informação.
Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo (FEA-RP/USP).
Palavras-chave: governança, riscos e compliance;
E-mail: csmiranda@usp.br
Jonny Mateus Rodrigues – Professor da Escola de Administração de pandemia, fraudes, gestão de crise, tomada de decisão.
Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP).
E-mail: jonny.rodrigues@fgv.br

EXECUTIVO 34
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

N
o início da Covid-19, surgiram preocupações de como as modificações organizacionais provocadas pela
pandemia afetariam os riscos de fraudes corporativas1. Sem garantias de que estariam tomando as melho-
res decisões, as organizações substituíram operações presenciais por remotas e adaptaram seus sistemas
para que isso ocorresse da melhor forma possível. Tais mudanças poderiam trazer vulnerabilidades, com
fragilização dos ambientes de controle internos, riscos de segurança cibernética e problemas reputacio-
nais, entre outras questões. Além disso, as áreas de governança, riscos e compliance (GRC) poderiam sofrer desinvestimen-
tos com a possível realocação de recursos para reorganizar outras áreas das empresas.
O cenário era ideal para uma avaliação dos impactos de grandes períodos de incerteza nas práticas de GRC. Pesquisas
anteriores relacionaram a importância dessas atividades para redução de casos de corrupção e fraudes no Brasil2. Este
estudo então buscou entender como os profissionais de GRC perceberam os riscos de fraudes corporativas com a eclosão
da Covid-19 e quais ações foram tomadas para mitigá-los. Foi elaborado um questionário, com a ajuda de 12 entrevistados,
que foi respondido por 120 profissionais contatados pela rede social Linkedin.
Os possíveis aumentos de riscos foram avaliados pela ótica da teoria do triângulo de fraudes3, que considera três as-
pectos para explicar a suscetibilidade de funcionários para violar leis, regulamentos, políticas, procedimentos e controles
internos organizacionais. São eles o aumento de pressão, por, por exemplo, problemas pessoais ou empresariais diante
de uma crise como a da Covid-19; as brechas que aumentam a oportunidade de fraudar, por exemplo, quando faltam in-
vestimentos em controles; e, por último, a racionalização, quando o funcionário procura justificar atos fraudulentos, por
exemplo, para salvar sua família ou a empresa.
Os resultados da pesquisa revelaram riscos aumentados em todos esses três aspectos durante a pandemia. Ao contrá-
rio do que muitos esperavam, as empresas investiram em controles internos no período para lidar com o aumento dos ris-
cos. A contribuição do estudo com essa descoberta é mostrar não só a dinâmica de mudanças em governança, compliance
e controle de riscos em períodos críticos, como apontar caminhos para o futuro.
O artigo apresenta primeiramente a literatura sobre a teoria do triângulo de fraudes, fazendo também distinções entre
as várias atividades de GRC. Em seguida, mostra a metodologia utilizada pela pesquisa. Depois, detalha os resultados en-
contrados e faz a discussão dos achados, contrastando-os com o que já se sabe a respeito. Por fim, sugere recomendações
para as empresas lidarem melhor com futuras crises.

ESTADO DA ARTE
Diversas pesquisas mostram como períodos de crise favorecem fraudes. Por exemplo, em consulta aos associados so-
bre o impacto da recessão de 2008 nas empresas dos Estados Unidos da América, a Association of Certified Fraud Exami-
ners (ACFE) descobriu que a maioria deles conviveu com aumento no número de fraudes, e 80% afirmaram que as fraudes
aumentam em períodos de dificuldades econômicas4.
O crescimento da propensão a fraudes em períodos de crise pode ser explicado pela ótica da teoria do triângulo de
fraudes, criada há meio século por Donald R. Cressey5. Essa teoria parte do pressuposto de que pessoas com cargos ou
posições de confiança podem romper essa fidúcia para resolver, via desvios ou adulterações nos processos empresariais,
determinada situação pessoal ou organizacional que não gostariam de expor aos colegas.
O primeiro ponto do triângulo de fraudes consiste na pressão, relacionada ao motivo para a fraude. Relatório da EY6 lis-
ta como pressões no tocante à crise da Covid-19 as necessidades de: manter estilo de vida, situação financeira e emprego;
cumprir metas difíceis para o contexto; e salvar empresas das dificuldades – além de condições mais estressantes do home
office e da própria pressão pela sobrevivência física ante uma pandemia.
O segundo ponto é a oportunidade, ligada à possibilidade de fraudar, seja pelo conhecimento, seja pelo cargo ocupado,
seja pelo contexto. Quando ocorrem crises, as empresas tendem a cortar custos em áreas que não geram receitas, como as
que lidam com GRC, o que acaba criando oportunidades para os fraudadores7. No caso da Covid-19, além desse fator, hou-
ve uma série de flexibilizações, estímulos, subsídios e doações, nas esferas pública e privada, que geraram oportunidades
de corrupção e fraude, como mostra o relatório da EY. É importante citar também a transição para o trabalho remoto em
um espaço de tempo insuficiente para assegurar monitoramento e supervisão adequados.
O terceiro e último ponto está na racionalização, na justificativa para a fraude. É quando o fraudador aceita, mental-
mente, que vai efetuar o ato e encontra razões para se convencer de que deve fazê-lo. No contexto da pandemia, há relação
desse ponto com a necessidade de sustento da família, da sobrevivência empresarial ou mesmo do risco sanitário.
As atividades de GRC são consideradas essenciais para lidar com esses três pontos do triângulo de fraudes8. A necessi-
dade de uma gestão organizada das áreas de governança corporativa, riscos e controle internos, que ficou conhecida como
modelo GRC9, veio com a Lei Sarbanes-Oxley, sancionada em 2002 pelo Congresso dos Estados Unidos para proteger
investidores e demais stakeholders de fraudes, após o famoso escândalo da Enron.
O modelo GRC é composto de três itens, com as seguintes atividades: a governança envolve análises de políticas e pla-
nos de conselho e as estruturas de controle; a análise de riscos tem como princípio ser preventiva, observando os efeitos
de atividades e mudanças nas empresas; e o compliance auxilia no cumprimento da meta pela integridade e transparência
e está bastante associado à área de controles internos10.

EXECUTIVO 35
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

METODOLOGIA
A pesquisa procurou relacionar os pontos do triângulo de fraudes de Cressey com a percepção dos participantes do
mercado de GRC das empresas brasileiras. Para tal, foram feitas, em uma primeira etapa, 12 entrevistas com especialistas
para apoio na estruturação de questionário. Na segunda etapa, o questionário foi enviado para uma base de 971 e-mails,
levantados por meio da rede social LinkedIn, mediante buscas no site pelas palavras-chave “riscos”, “governança corpora-
tiva”, “controles internos” e “compliance”. Foram efetuadas quatro ondas de disparo, sendo três via e-mail e a última pelo
mensageiro instantâneo da rede LinkedIn, entre dezembro de 2021 e janeiro de 2022. Houve 120 respostas válidas.
As questões referentes ao triângulo de fraudes foram construídas utilizando-se a escala de Likert de 7 pontos, indo
do cenário de queda intensiva (ponto 1) até o de aumento intensivo (ponto 7). O questionário também continha questões
sobre mudanças nas áreas de GRC/compliance com a pandemia (como medidas de distanciamento social, adaptações
gerenciais para home office e mudanças em doações no período).
Foi realizada análise descritiva, assim como testes de normalidade e testes não paramétricos, conforme a necessidade
dos resultados11. Para tal propósito, foram utilizados os softwares SPSS e Microsoft Excel e também variáveis de controle,
para verificar possíveis diferenças de percepções entre grupos de respondentes, divididos pelo tamanho da empresa em
que trabalham, nível hierárquico, nacionalidade da empresa, tipo de vínculo com a empresa (interno ou externo/consul-
tor), atuação em áreas de governança corporativa, riscos, controles internos e compliance. Os respondentes eram de 13
estados brasileiros, com concentração no sudeste, faixa etária predominante 31 a 50 anos, gênero dividido entre homens
e mulheres. A maior parte dos respondentes atuava em mais de uma área de GRC, com liderança para a de compliance,
seguida de riscos, governança corporativa e controles internos.

RESULTADOS
Os resultados são apresentados em três partes: movimento efetuado pelas organizações durante o período crítico da
Covid-19 no Brasil, percepções dos consultados sobre os efeitos da pandemia nos pontos do triângulo de fraudes e perspec-
tivas para o futuro.

Movimento durante a Covid-19


Primeiramente, é importante mostrar as adaptações por que passaram as empresas dos respondentes com a pandemia.
Em apenas 1,7% dos casos, não houve mudanças na forma de trabalhar após a eclosão da Covid-19. Em 75% dos casos, a
empresa adotou o home office; em 1,7%, reduziu a carga horária; e em 21,7%, implantou ambas as medidas, ou seja, home
office e redução de carga horária. A adoção do home office trouxe consequências. Para 62,5% dos atuantes externos às orga-
nizações, como consultores, houve perda ou ruídos de comunicação com o trabalho remoto. Por sua vez, esse percentual
foi bem menor, de 32,9%, entre os funcionários internos.
Outra mudança ocorrida na pandemia foi o aumento das doações. A maioria dos respondentes citou que, com isso, hou-
ve reforço em políticas e ferramentas para assegurar transparência e controles ao processo. Essa mudança foi mais intensa
em empresas maiores, com mais de 5.000 funcionários, mais ativas em fazer doações: 57,1% dos respondentes que traba-
lham nesse porte de empresa afirmaram que houve reforço de controles com doações, enquanto 17,1% disseram que não foi
preciso haver controle adicional, mes-
Figura1. mo com aumento de doações – outros

Riscos que surgiram ou aumentaram com a pandemia (%) 25,7% relataram que os empregadores
não participaram de doações.
90 As mudanças provocadas pela pan-
80
demia propiciariam o surgimento ou
o aumento de algumas categorias de
70 riscos. A que mais se destacou, ligada
60 diretamente ao home office, foi a de ris-
co cibernético, apontada por 77,5% dos
50
respondentes. Em seguida, aparece-
40 ram os riscos operacional, sanitário, fi-
30 nanceiro e de conformidade (Figura 1).
20 Não ocorreram diferenças estatís-
ticas significativas entre os grupos no
10
que concerne ao risco cibernético. Em
0 relação aos outros riscos, apareceram
diferenças, e destacamos as mais im-
co

ro

de

cal
na

ári

gic
cei
éti

da

Fis
cio

portantes. Aqueles que atuam em go-


nit

é
ern

an

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era

Sa

Fin

for

vernança corporativa tiveram maior


Est
Cib

Op

n
Co

percepção de presença e aumento de

EXECUTIVO 36
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

risco operacional (65,4% contra 50% dos que não trabalham com governança corporativa) e sanitário (67,3% contra 38,2%
dos que não trabalham com governança corporativa). No tocante ao risco sanitário, a percepção também foi mais intensa
entre os profissionais de empresas nacionais e as de menor porte (com até 100 funcionários). Aqueles que atuam em con-
troles internos tiveram uma percepção bem superior sobre risco financeiro do que os que não têm essa função (63% contra
37,8%). No que se refere ao risco de conformidade, houve diferença grande entre consultores e funcionários internos: 68,8%
dos primeiros apontaram esse risco, contra 38,6% dos últimos.
Não houve, durante o período pandêmico, fortes desinvestimentos. Pelo contrário, a maioria dos respondentes (56,7%)
sinalizou que os investimentos em GRC cresceram. Viu-se o fortalecimento dessas atividades, com 52,5% dos profissionais
consultados afirmando que aumentou a rigidez dos controles, de forma a evitar desvios de conduta durante o período mais
crítico da pandemia.
A maioria dos profissionais consultados relatou que foi necessário reforçar investimentos em tecnologia, pois em 40%
dos casos as empresas não tinham estrutura para home office. Além dos investimentos em equipamentos, estruturas de
virtual private network (VPN) e treinamentos, cabe destacar os investimentos mais alinhados com GRC: 62,4% dos respon-
dentes afirmaram que houve investimentos em segurança cibernética e 47% que houve estruturas de reforços de controles.
Em termos de mudanças nas operações antifraudes, o que mais houve foram adaptações (59,2%). Apenas 30% dos res-
pondentes afirmaram que foram implantadas novas metodologias. Em relação ao uso do canal de denúncias, na maioria dos
casos (60,8%), ficou estável. A maioria dos consultados pela pesquisa (74,2%) afirmou que foi criado comitê de crise para o
período na empresa, com alta assertividade.
Para os atuantes em compliance, houve esforços para melhorar mecanismos de conformidade por causa do home office.
Entre eles, destaca-se o aumento de comunicação e treinamentos (para 59,2% dos respondentes), seguido de melhorias
de due diligence (38,2%). Entre os atuantes em governança corporativa, ocorreram mudanças no formato de reuniões de
assembleia, que passaram para o online e foi considerado ainda melhor que o presencial por 56,1% dos respondentes.

Figura2. Efeitos da pandemia nos pontos do


triângulo de fraudes
Percepção de mudança em aspectos que predispõem a fraudes (%) Quando perguntados sobre os três
pontos do triângulo de fraudes du-
rante o período pandêmico, os res-
Pressão
pondentes assinalaram com maior
frequência na escala Likert a opção
Oportunidade
intermediária, que representa a au-
sência de mudanças com a pande-
Racionalização
mia. No entanto, quando somados os
0 20 40 60 80 100 graus 5, 6 e 7 da escala Likert, que re-
Queda intensiva Queda moderada Queda suave Sem mudanças presentam diferentes níveis de cres-
cimento de riscos (suave, moderado e
Aumento suave Aumento moderado Aumento intensivo
intensivo), verificaram-se os percen-
tuais mais significativos: 55,1% para
aumento de pressão; 59,1% aumento de oportunidade; e 48,4% aumento de racionalização (Figura 2).
Vale destacar algumas diferenças entre os grupos analisados. Em relação à pressão, os entrevistados que atuam
em empresas menores demonstraram maior tendência a acreditar que esse fator predispôs a fraudes. Além dessa
diferença por grupos, os participantes de empresas nacionais também apresentaram maior percepção de pressão do
que aqueles de multinacionais. Sobre o possível aumento da oportunidade em realizar fraudes, houve diferenças es-
tatísticas na divisão dos profissionais por hierarquia. Participantes em cargos superiores na hierarquia da empresa
relataram maior percepção de oportunidades de fraude do que aqueles em cargos inferiores.
Duas questões adicionais relacionavam-se ao triângulo de fraudes. A primeira questionava os profissionais sobre
o aumento de risco de fraudes em razão de possíveis flexibilizações de controles durante a pandemia. Novamente, a
gradação da escala que recebeu maior número de respostas foi a intermediária, que aponta para ausência de efeitos,
com 46,7% das respostas; mas, somadas as respostas que acusaram aumento de suave a intensivo de risco, o percen-
tual chegou a 48,3%. Os profissionais de governança corporativa perceberam vulnerabilidade menor do que a média,
enquanto aqueles que atuam em risco notaram vulnerabilidade maior do que a média. Também foi verificada dife-
rença entre os atuantes internos e externos à organização: os últimos relataram riscos bem maiores, especialmente
no nível intensivo.
A segunda questão adicional foi sobre se o trabalho remoto trouxe ambiente muito estressante ou sensação de
falta de supervisão. Para 57,5% dos consultados, isso ocorreu, enquanto 28,3% não sentiram nenhuma mudança,
e 14,2% disseram que, ao contrário, o trabalho remoto proporcionou ambiente menos estressante e aumento de
supervisão.

EXECUTIVO 37
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

Perspectivas futuras
Questionados sobre como aprendizados e acontecimentos da pandemia podem ser direcionadores do futuro, os respon-
dentes sinalizaram que os aspectos predominantes a perdurarem são a adoção de trabalho remoto por áreas que antes não
utilizavam essa modalidade, a automatização de fluxos de processos e controles gerenciais, o aumento de uso de tecnologia
em análises e indicadores e as reuniões de assembleias e conselhos de forma remota (Tabela 1). Entre as alternativas apre-
sentadas, a manutenção de um comitê para gerenciar crises foi a menos escolhida.

Tabela 1.

Percepção de perspectivas de futuro para a área de governança, riscos e compliance


% dos respondentes
Perspectiva de futuro que concordaram
com a perspectiva

Adoção do trabalho remoto para áreas da empresa que antes não utilizavam essa modalidade 65,8

Automatização dos fluxos de processos e controles gerenciais 63,3

Aumento da tecnologia nas análises e indicadores 58,3

Reuniões de assembleias e conselhos de forma remota 58,3

Maior visão nas empresas da importância de GRC 53,3

Aumento dos investimentos na área de GRC 39,2

Manutenção do comitê de gerência de crises 31,7

Ausência de mudanças para o futuro da área de GRC 8,3

GRC: governança, riscos e compliance

DISCUSSÃO
A discussão é apresentada nos mesmos três blocos dos resultados: o movimento realizado durante a pandemia, o triân-
gulo de fraudes e as percepções sobre o futuro.

O movimento efetuado pelas organizações durante a pandemia


A pesquisa mostra que grande parte das empresas fez modificações por causa da pandemia, passando a adotar trabalho
remoto. Apesar dos benefícios do trabalho virtual, a migração rápida trouxe a sensação de que a comunicação interna so-
freu prejuízos. Isso levou à percepção de aumento de riscos, principalmente o cibernético. Diversos autores vêm apontan-
do os riscos nessa área com a migração dos funcionários para o trabalho remoto12, até mesmo relacionados a dificuldades
na compra e instalação de equipamentos com as ferramentas necessárias para as atividades serem exercidas a contento,
sem aumentar o risco de vazamento de dados e de fraudes13.
Para enfrentar os riscos, as empresas fizeram investimentos em tecnologia, computadores, ferramentas, rede VPN e se-
gurança cibernética, em consonância com o preconizado por estudos a respeito14. Além disso, aumentaram os investimen-
tos em GRC, contrariando as expectativas do início da pandemia, de que poderia haver realocação de recursos para áreas
mais diretamente ligadas à geração de receitas15. As melhorias em GRC foram diversas, com criação de comitês de crises,
aumento de comunicação e treinamento, reforços de integridade, aperfeiçoamentos em due diligence, maior efetividade
em reuniões de assembleias e conselhos, entre outros aspectos.
Houve maior rigidez nos procedimentos e controles para evitar problemas com possíveis brechas de desvios de conduta
no auge do período pandêmico. Diante dos curtos prazos para implantar mudanças, ocorreram mais adaptações de meto-
dologias antifraudes do que criação de sistemáticas.
Sobre as diferenças entre grupos, de forma geral, nota-se que empresas maiores e multinacionais parecem mais prepa-
radas para lidar com situações como a pandemia do que as menores e nacionais, que muitas vezes enfrentam mais riscos
e precisam fazer maiores investimentos repentinos. Além disso, os profissionais externos demonstram percepção de risco
mais aguçada do que os internos, pois conseguem olhar os problemas com maior distanciamento e visão crítica.

EXECUTIVO 38
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

Percepções sobre os pontos do triângulo de fraudes


Uma grande proporção dos profissionais de GRC que participaram da pesquisa notou alta nos riscos de fraudes no
tocante aos três pontos do triângulo de fraudes: pressão, oportunidade e racionalização. Tal resultado é condizente com
pesquisas que mostram essa maior predisposição a fraudes em períodos de crise16.
O ambiente empresarial foi identificado pelos participantes como mais estressante e menos supervisionado, o que é
diretamente relacionado com os pontos pressão e oportunidade do triângulo. Os possíveis enfraquecimentos dos contro-
les internos, além da sensação de falta de monitoramento, podem implicar a tomada de decisão do possível fraudador,
que já se encontra pressionado, de acordo com a ACFE17.
No que se refere a diferenças de grupos, vale notar que, novamente, os profissionais de empresas menores e nacio-
nais sobressaíram entre os que perceberam maiores suscetibilidades no triângulo de fraudes, assim como os atuantes
externos. Também é importante ressaltar que profissionais com cargos mais altos perceberam com maior intensidade
o aumento de oportunidade para fraudes. Como explica Cressey18, a oportunidade faz-se mais presente entre aqueles
com informações e habilidades técnicas para efetuar fraudes. Além disso, o relatório da EY19 destaca que esse ponto do
triângulo de fraudes está relacionado a ações que estão sob a alçada de cargos mais altos, como flexibilizações de regula-
mentos, aumentos das doações no período pandêmico e decisões sobre alocação de recursos diante da crise.

Perspectivas futuras
Em relação às perspectivas para o futuro, percebe-se que algumas mudanças vieram para ficar, como a
adoção do home office e aperfeiçoamentos tais quais a automatização de controles e maior uso de tecno-
logia em GRC. Por outro lado, outras iniciativas, como o comitê de crise, são temporárias. Comitês de crise
podem ser dissolvidos após o período mais crítico e retomados caso sejam necessários no futuro.
Os resultados estão em linha com as recomendações de fortalecimento de ações de governança, controle
de riscos e compliance20. Para enfrentar turbulências de curto, médio e longo prazos, as empresas devem
usar estratégias e ações bem-sucedidas que foram iniciadas para lidar com a Covid-19 e assim fortalecer
suas agendas de integridade, ética e conformidade.

RECOMENDAÇÕES
A pesquisa mostrou maior preocupação e aumento da pressão, oportunidades e racionalização de frau-
des durante o período de isolamento entre os profissionais de GRC. Além disso, houve a percepção de um
ambiente menos supervisionado, mais estressante e com maior risco iminente de fraude.
Houve investimentos para lidar com o aumento de riscos, com estratégias e ações que em grande parte
devem perdurar. Não se sabe se tais esforços foram suficientes para fazer frente às novas possibilidades
para a ocorrência de fraudes. Dessa forma, passado o período mais crítico da pandemia, recomenda-se que
as empresas mantenham seu nível de segurança ao acesso remoto, com investimentos em acessos via VPN,
privacidade dos dados, equipamentos configurados e ambiente remoto seguro. Sugere-se, ainda, a imple-
mentação de controles apropriados à realidade remota para as empresas que migraram e pretendem conti-
nuar migrando para o home office. Há um grande desafio à frente para reverter a sensação de baixa supervisão
do ambiente virtual.
Também é importante ter planos contingenciais de emergência, aos quais as empresas podem recorrer
em caso de necessidade. Gestores das áreas de GRC devem ter visão estratégica de suas funções, traçando
planejamentos voltados para a continuidade de suas operações e eficácia empresarial. Recomenda-se ainda
a utilização de relatórios e métricas automatizadas para o controle gerencial e mitigação de riscos.
De nada adianta ter bons controles se incentivos e questões culturais não estiverem bem equacionados.
As metas estabelecidas aos funcionários devem estar alinhadas com as condições possíveis do mercado,
para que não se estabeleçam níveis elevados de pressão que predisponham a fraudes. Treinamentos pe-
riódicos sobre conduta ética empresarial, utilização correta dos sistemas e segurança dos dados ajudam a
formar uma cultura de integridade.
Essa mudança de cultura deve ter como fio condutor o exemplo dos líderes. A alta gerência deve apoiar
a implementação e o seguimento da agenda de conduta ética e de compliance. Os órgãos de governança tam-
bém devem equilibrar suas preocupações entre resultados operacionais e financeiros e aqueles relaciona-
dos a ética e compliance, nem sempre ligados a resultados de curto prazo.

NOTAS
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EXECUTIVO 39
COVID-19: UMA JANELA PARA FRAUDES CORPORATIVAS?

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17. ACFE (2020).
18. Cressey (1973).
19. EY (2020).
20. EY (2020).

EXECUTIVO 40
COMO FAZER Resumo
REUNIÕES ESTRATÉGICAS Objetivo: apresentar pontos frágeis e boas práticas no
uso de linguagens baseadas em imagens e texto para

MAIS EFETIVAS
reuniões sobre estratégia corporativa.

Estado da arte: estudos recentes indicam que o


Usar PowerPoint ou documentos formato e a linguagem utilizados para a produção de
narrativas, seja com base em imagens, seja em texto,
em formato de texto? Ambas as influenciam a efetividade das estratégias.

ferramentas podem ser úteis, o Originalidade: com base em achados de pesquisas


e casos recentes, o artigo propõe boas práticas para
importante é compreender suas utilizar as linguagens visual e textual para melhorar a

potencialidades para aumentar a


efetividade da estratégia.

capacidade de formular, comunicar, Impactos: executivos e consultores de estratégia


podem inspirar-se no artigo para produzir narrativas
memorizar e executar a estratégia estratégicas mais eficazes ao compreenderem
melhor as vantagens e as desvantagens de cada
corporativa. ferramenta.

Sandro Magalhães Manteiga – Vice-Presidente de Operações do Nubank, Palavras-chave: estratégia, narrativas, linguagem,
doutor em Administração de Empresas pela FGV EAESP e pesquisador de
desenvolvimento de competências organizacionais em empresas de alto
six-pager, PowerPoint.
crescimento.
E-mail: smanteiga@gmail.com

EXECUTIVO 41
COMO FAZER REUNIÕES ESTRATÉGICAS MAIS EFETIVAS

E
m novembro de 2021, faltavam poucas semanas para a abertura de capital (IPO) do Nubank. Mesmo sendo
um executivo recém-contratado, eu tinha uma grande expectativa com relação ao evento. À medida que mi-
nhas atividades de integração avançavam, mesmo que de forma 100% remota, em função da pandemia de
Covid-19, participei de uma reunião bastante diferente da usual.
Enquanto ainda aconteciam as saudações por voz e pelo chat da ferramenta de teleconferência, um dos
participantes compartilhou o link de um artigo na nuvem para ser lido em 15 minutos. Durante esse período, todos ficaram
absolutamente compenetrados na leitura. Então, um colega quebrou o silêncio e confirmou se os participantes estavam
prontos para iniciar a discussão sobre o conteúdo do documento de texto. Assim, a reunião prosseguiu com a discussão.
Naquele mesmo dia, descobri que essa prática era utilizada pela Amazon, de onde veio a inspiração para o Nubank
adotá-la. Na Amazon, em 2004, os principais líderes da empresa receberam um e-mail breve de Jeff Bezos, então chief exe-
cutive officer (CEO), que dizia: “O PowerPoint não será mais usado em reuniões executivas”1. Os gestores ficaram confusos,
pois apresentações em PowerPoint sempre tinham sido a base para discutirem estratégia. Ao questionarem o que seria
esperado a partir de então nessas reuniões, receberam como resposta: “Narrativas escritas na forma de texto, e não mais
em imagens”2.
A maioria das empresas utiliza softwares de apresentação como o PowerPoint para efetuar discussões complexas e estra-
tégicas, contudo algumas empresas, principalmente da área de tecnologia e com centralidade no cliente, inspiradas pelo
sucesso da Amazon, começaram a utilizar narrativas para basear suas reuniões estratégicas. Mas, afinal de contas, o que os
estudos mostram sobre o uso de uma ou outra ferramenta?
O objetivo deste artigo é discutir o uso de ferramentas mais visuais, como o PowerPoint, ou textuais, como as narrativas
adotadas pela Amazon e pelo Nubank, apontando os aspectos frágeis e as formas mais efetivas destacados na literatura
para adotar imagem e/ou texto para melhorar a elaboração, comunicação, memorização e alinhamento para a execução
da estratégia. O artigo apresenta primeiramente a polêmica em torno do PowerPoint para então mostrar caminhos para
instrumentos de comunicação em reuniões estratégicas.

A DEMONIZAÇÃO DO POWERPOINT
Estima-se que 500 milhões de pessoas usem o PowerPoint em todo o mundo e que, a cada dia, sejam criadas 30 milhões
de apresentações3. A popular ferramenta, no entanto, vem atraindo críticas crescentes há duas décadas. Em 2003, a ca-
tástrofe com o ônibus espacial Columbia, que resultou na morte de sete astronautas, foi o gatilho para a demonização do
PowerPoint como ferramenta de tomada de decisão estratégica4.
O desastre foi causado por uma falha na integridade do revestimento de proteção térmica nas asas da nave, ocasionada
pelo choque com um pedaço de espuma isolante que se desprendeu do Columbia já na decolagem. Ficou obscuro então o
que levou à tomada de decisão de fazer o ônibus espacial reentrar na atmosfera com componentes danificados.
O cientista de informação Edward Tufte decidiu conduzir uma análise das comunicações que fundamentaram a deci-
são equivocada da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa)5. Ele descobriu que, em vez de textos técnicos
sobre os problemas enfrentados pelo Columbia, a base para a discussão foram 28 slides parcamente organizados e escritos
em linguagem confusa e imprecisa.
O mais fundamental deles passava no título a ideia de resistência dos materiais da nave, para só ao final, com menor
destaque, alertar que as condições reais de impacto eram muito mais críticas do que as testadas em laboratório. A conclu-
são de Tufte foi que, embora a lógica para uma melhor tomada de decisão estivesse implícita nos dados das apresentações,
a má qualidade, as escolhas de sequência e a linguagem vaga ofuscaram a clareza quanto à decisão correta a ser tomada.
Diversos pesquisadores vêm estudando o uso do PowerPoint6 para tomadas de decisão estratégicas. Eles apresentam os

.
seguintes pontos frágeis da ferramenta:
Conflito de canal e sobrecarga cognitiva: os participantes de apresentações em PowerPoint utilizam audição e visão
para compreender o que está sendo apresentado, contudo cientistas cognitivos comprovam que é impossível retermos
toda a informação enquanto visualizamos imagens e texto em uma tela e ouvimos um apresentador ao mesmo tempo.
Em outras palavras, o uso simultâneo de canais distintos de comunicação cria conflito ou sobrecarga cognitiva em

.
nosso cérebro, que é incapaz de realizar essa multitarefa, o que resulta em perda de informação7;
Linearização de narrativas complexas: por design, o PowerPoint induz à linearização de narrativas. Um slide sucede-se
ao outro de forma mecânica, dificultando ao apresentador construir uma narrativa rica e complexa em nuanças e in-
ventividade. Essa estrutura tende a dificultar a compreensão de contexto e a avaliação de relacionamentos complexos,

.
que caracterizam discussões estratégicas8;
Ordenação incompleta e incoerente: em geral, quando uma narrativa complexa é condensada em PowerPoint, é o con-
teúdo que acaba comprimido e de certa forma fatiado para adequar-se ao formato da ferramenta de apresentação9.
Isso resulta em uma falsa sensação de ordem na informação, que em geral está incompleta e às vezes incoerente.
Ficam lacunas de informação entre os slides e entre os bullet points, e é o apresentador quem tem de completar esses

.
vácuos em sua fala10;
Introdução de vieses inconscientes: o PowerPoint é um instrumento incompleto que depende da variabilidade das

EXECUTIVO 42
COMO FAZER REUNIÕES ESTRATÉGICAS MAIS EFETIVAS

habilidades de apresentação e do carisma dos apresentadores11. Ao mesmo tempo que essa característica pode ajudar
um bom apresentador, acaba contribuindo para decisões equivocadas nos exemplos contrários, como no caso da ca-

. tástrofe do ônibus espacial Columbia12;


Dinâmica confusa da apresentação: costuma ser recorrente a realização de perguntas que acabam por interromper o
fluxo planejado para a apresentação e que também podem conduzir a discussão por um caminho que se afasta dos
temas relevantes13.

CAMINHOS
Estudos mostram que a linguagem, seja baseada em imagens, seja em textos, afeta a efetividade da estratégia, desde
sua formulação até sua execução14. A questão central é como construir uma narrativa eficaz e escolher o formato mais
adequado para a finalidade da reunião. No caso dos estrategistas, o desafio é montar narrativas que comuniquem mensa-
gens convincentes e estimulantes de fácil memorização que influenciem, engajem e alinhem compreensões sobre linhas
estratégicas de ação15.
O PowerPoint pode ser uma alternativa eficaz em determinados contextos, se bem utilizado16. O CEO do Google Sundar
Pichai faz uso de slides para apresentar estratégias da empresa, contudo ele procura evitar os problemas citados neste
artigo elaborando apresentações ricas em imagens e animações e minimalistas em palavras ou números17. Quando o texto
aparece, é curto e tem a função de descrever uma imagem, ou seja, reforça a informação visual. Apresentações que adotam
esses mesmos princípios são as TED Talks18, uma das razões por que é relativamente fácil lembrar-se do seu conteúdo mes-
mo após muito tempo após esses eventos.
Consultores de estratégia altamente especializados também costumam fazer bom uso do PowerPoint19, ao criarem slides
com infográficos. Exemplos são flywheels, círculos que permitem representar visualmente relações complexas e mostrar
retroalimentações que fomentam o crescimento da empresa; e gráficos que justapõem informações em eixos horizontais e
verticais, facilitando comparações e permitindo a visualização de intersecções de aspectos da estratégia nos eixos. Os slides
também destacam elementos visuais para enfatizar determinadas informações, com o uso de cor, forma, tamanho, con-
traste e localização dos elementos no slide. Os diferentes mecanismos permitem reconhecer e reinterpretar conjuntamente
os aspectos mais importantes da estratégia.
As narrativas estratégicas textuais empregam uma lógica diferente, mas podem ter entre seus apêndices elementos
visuais como flywheels, frequentemente usados na Amazon e no Nubank. A Amazon sugere um texto curto como base de
suas reuniões, com um limite de seis páginas, o formato 6-pager20, que também é observado pelo Nubank. O texto é escrito
de forma colaborativa, em geral assíncrona, antes da realização da reunião. Assim, quando esta se inicia, os participantes
leem o texto do início ao fim, para se informar sobre os aspectos essenciais do que será discutido. Tão logo a leitura é fina-
lizada por todos, a discussão em si se inicia.
Executivos da Amazon verificaram que uma narrativa estratégica baseada em texto tem entre sete e nove vezes mais
densidade de informação do que uma apresentação em PowerPoint. Além disso, as pessoas leem três vezes mais rápido
do que um apresentador é capaz de falar. Assim, as narrativas baseadas em texto permitem absorver mais informação
do que a alternativa baseada em PowerPoint em determinado período de tempo. Além disso, narrativas estratégicas ba-
seadas em texto resultam em um documento completo, autocontido, que passa a fazer parte da gestão de conhecimento
da organização – embora apresentações em PowerPoint também possam ser gravadas em vídeo para serem reproduzidas
posteriormente.
Narrativas em formato de texto ainda ajudam a promover inclusão. A interação inicial entre a audiência e o apresenta-
dor é silenciosa, por meio da leitura de um documento. Portanto, ideias e raciocínio tomam o lugar de habilidades como
apresentação, fluência em outro idioma e criação de impacto visual. O Nubank, por exemplo, costuma promover reuniões
em inglês por ter profissionais de mais de 45 nacionalidades distintas. Em geral, os profissionais têm maior facilidade com
leitura e escrita em idioma não nativo do que com a fala. Assim, todo o processo de construção de narrativas tende a con-
tribuir para fortalecer a inclusão da diversidade na organização.
O processo de produção de um 6-pager, entretanto, demanda maior rigor e mais tempo de preparação do que outros
formatos discursivos. Como a maioria dos profissionais têm mais experiência e prática na produção de apresentações em
PowerPoint, tende a simplesmente transpor o conteúdo de slides para documentos em formato de texto. Quando realizou a
mudança de PowerPoint para textos, a Amazon percebeu que seus funcionários usavam os mesmos bullet points dos slides,
apenas reduzindo o tamanho da letra para comprimir conteúdos longos.
A Amazon levou tempo para aprimorar conteúdo, componentes e formato das narrativas em linguagem de texto, para
torná-las efetivas nas reuniões executivas. O Nubank valeu-se da experiência de executivos experientes, contratados da
Amazon, para acelerar o desenvolvimento dessa competência. Os exemplos mostram que a adoção de texto para a constru-
ção de narrativas estratégicas tem uma significativa curva de aprendizado que precisa ser considerada.
O modelo aprimorado da Amazon estrutura o texto em formato de uma história, por meio de uma lógica bem argu-
mentada, com raciocínio claro e sintético. Gráficos e tabelas podem ser incluídos nos 6-pagers, porém posicionados em
apêndices, de tal modo que sua leitura seja opcional, e não obrigatória. Um apêndice particularmente importante consiste

EXECUTIVO 43
COMO FAZER REUNIÕES ESTRATÉGICAS MAIS EFETIVAS

nas frequently asked questions (FAQ), desenvolvidas de forma colaborativa.


Da perspectiva de conteúdo, as narrativas destacam as principais conclusões logo no início do documento, para facilitar

..
a avaliação do raciocínio e da argumentação que vêm a seguir, em três aspectos da estratégia21:
a formulação do desafio, ou seja, qual problema precisa ser resolvido;

. a abordagem, método ou política para a resolução desse problema;


a escolha de um conjunto coerente de ações que alavanquem a efetividade dos recursos disponíveis.

..
Outra possibilidade é o conteúdo dos 6-pagers apresentar:
o problema;

.as abordagens diferentes que já foram cogitadas no passado;


como as soluções propostas beneficiam os clientes.
O processo de participação dos profissionais no desenvolvimento das narrativas pode ser mais orgânico ou mais estru-
turado. O(s) autor(es) pode(m) atribuir papéis distintos para determinados participantes desse processo, como contribui-
dores e revisores, por exemplo. Ao documento, podem ser atribuídos diferentes estados ao longo do tempo, como: aberto a
comentários, sob revisão, finalizado ou descontinuado.
Tais recomendações ajudam na escrita de uma narrativa textual focada e eficaz, mas seu uso ainda assim deve ser
seletivo e direcionado a escolhas estratégicas com consequências de fato relevantes22. Em outras palavras, por causa dos
esforços necessários para a elaboração de narrativas em forma de texto, não se recomenda a sua criação para toda e qual-
quer tomada de decisão23.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As pesquisas e os casos práticos sugerem que o uso combinado de imagem e texto para a produção da estratégia tende
a ser mais efetivo, juntamente com uma maior recorrência de rituais de reforço da estratégia, com a ajuda coordenada
de uma área de comunicação interna24. Os rituais de comunicação devem ser tanto top-down (a liderança comunicando)
quanto bottom-up (profissionais da linha de frente contando histórias selecionadas, que reforçam a estratégia corporativa).
O Nubank, por exemplo, tem eventos quinzenais nesse sentido.
Finalmente, por conta das mudanças introduzidas no trabalho em razão da pandemia de Covid-19, ainda é preciso com-
preender melhor a influência do trabalho remoto e do presencial para o desenvolvimento das atividades no ambiente
híbrido25. O grau de familiaridade dos profissionais com ferramentas digitais de colaboração influencia a comunicação, o
compartilhamento de informações e os questionamentos. Assim como o uso das linguagens, discutido neste artigo, uma
melhor compreensão sobre a interação em reuniões presenciais e virtuais pode contribuir para a maior efetividade da
estratégia nas empresas.

NOTAS
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EXECUTIVO 44
COMO FAZER REUNIÕES ESTRATÉGICAS MAIS EFETIVAS

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EXECUTIVO 45
Volume 22 • Número 1 • JANEIRO/MARÇO 2023
Ficha técnica

FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO


Entidade de caráter técnico-científico e filantrópico, instituída em 20 de dezembro de DIRETORIA
1944 como pessoa jurídica de direito privado, visando ao estudo dos problemas da Diretor: Luiz Artur Ledur Brito

organização racional do trabalho, especialmente nos seus aspectos administrativos e Vice-Diretor: Tales Andreassi
social, e à conformidade de seus métodos às condições do meio brasileiro. CONGREGAÇÃO
PRIMEIRO PRESIDENTE E FUNDADOR Presidente: Luiz Artur Ledur Brito
Luiz Simões Lopes CONSELHO DE GESTÃO ACADÊMICA
PRESIDENTE Presidente: Luiz Artur Ledur Brito
Carlos Ivan Simonsen Leal
VICE-PRESIDENTES
 DEPARTAMENTOS DE ENSINO E PESQUISA

Francisco Oswaldo Neves Dornelles (Licenciado)  Administração da Produção e de Operações: Ely Laureano Paiva
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque Administração Geral e Recursos Humanos: Maria José Tonelli
CONSELHO DIRETOR Contabilidade, Finanças e Controle: Paulo Renato Soares Terra
Presidente Fundamentos Sociais e Jurídicos da Administração: Eugênio Augusto Franco Montoro
Carlos Ivan Simonsen Leal Informática e Métodos Quantitativos Aplicados à Administração: Eduardo Henrique Diniz
Vice-presidentes Marketing: Felipe Zambaldi
Francisco Oswaldo Neves Dornelles (Licenciado) Planejamento e Análise Econômica Aplicados à Administração: Antonio Carlos Manfredini da Cunha Oliveira
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque Gestão Pública: Clovis Bueno de Azevedo
Vogais
Carlos Alberto Pires de Carvalho e Albuquerque, Cristiano Buarque Franco Neto, Ernane CURSOS, PROGRAMAS E SERVIÇOS
Galvêas, José Luiz Miranda, Lindolpho de Carvalho Dias, Marcílio Marques Moreira, Curso de Graduação em Administração: Renato Guimarães Ferreira
Roberto Paulo Cezar de Andrade. Curso de Graduação em Administração Pública: Marco Antonio Carvalho Teixeira
Suplentes Curso de Especialização em Administração para Graduados (CEAG): Simone Guimarães Cornelsen
Aldo Floris, Alexandre Koch Torres de Assis, Antonio Monteiro de Castro Filho, Ary Curso de Especialização em Administração Hospitalar e de Sistemas de Saúde (CEAHS): Laura Maria Cesar Schiesari
Oswaldo Mattos Filho, Eduardo Baptista Vianna, Gilberto Duarte Prado, José Ermírio de Master in Business and Management (MBM): Simone Guimarães Cornelsen
Moraes Neto, Marcelo José Basílio de Souza Marinho, Willy Otto Jordan Neto. Mestrado e Doutorado em Administração de Empresas: Isleide Arruda Fontenelle
Mestrado e Doutorado em Administração Pública e Governo: Mario Aquino Alves
CONSELHO CURADOR Mestrado Profissional em Administração de Empresas (MPA): Marcelo Oliveira Coutinho de Lima
Presidente Doutorado Profissional em Administração (DPA): Thomaz Wood Júnior
João Alfredo Dias Lins Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas: Claudio Gonçalves Couto
Vice-presidente Mestrado Profissional em Gestão Internacional: Luis Henrique Pereira
João Alfredo Dias Lins (Klabin Irmãos & Cia.) Mestrado Profissional em Gestão para a Competitividade: Gilberto Sarfati
Vogais OneMBA: Jorge Manoel Teixeira Carneiro
Antonio Alberto Gouvea Vieira, Carlos Alberto Lenz Cesar Protásio, Carlos Eduardo Programa Global MBA, parceria da Alliance Manchester Business School (AMBS) com a FGV: Susana Carla Farias
de Freitas, Cid Heraclito de Queiroz , Clovis José Daudt Darrigue de Faro, Eduardo Pereira
Coordenação Acadêmica para Educação Executiva da EAESP com o IDE: João Carlos Douat
M. Krieger, Estado da Bahia,  Estado do Rio Grande do Sul, Federação Brasileira FGV EAESP Pesquisa e Publicações: Thomaz Wood Jr.

de Bancos (Isaac Sidney Menezes Ferreira), IRB – Brasil Resseguros S.A. (Antônio Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios: Edgard Elie Roger Barki
Cássio dos Santos), Luiz  Chor, Luiz Ildefonso Simões Lopes, Marcelo Serfaty, Marcio Centro de Estudos de Administração Pública e Governo:  Fernando Burgos Pimentel dos Santos
João de Andrade Fortes, Maria Tereza Leme Fleury, Miguel Pachá,  Pedro Henrique Centro de Estudos de Política e Economia do Setor Público: George Avelino Filho

Mariani Bittencourt, Sindicato das Empresas de Seguros Privados, de Resseguros e de Centro de Estudos em Planejamento e Gestão de Saúde: Ana Maria Malik
Capitalização nos Estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo (Ronaldo Mendonça Centro de Estudos em Sustentabilidade: Mário Prestes Monzoni Neto
Vilela), Souza Cruz S/A (Jorge Irribarra). Centro de Excelência em Logística e Supply Chain: Orlando Cattini Junior
Suplentes      Centro de Excelência em Varejo: Mauricio Gerbaudo Morgado
Almirante Luiz Guilherme Sá de Gusmão, Banco de Investimentos Crédit Suisse S.A. Centro de Tecnologia de Informação Aplicada: Alberto Luiz Albertin
(Solange Srour), Carlos Hamilton Vasconcelos Araújo, General Joaquim Maia Brandão Instituto de Finanças: Antonio Gledson de Carvalho
Júnior, José Carlos Schmidt Murta Ribeiro, Leila Maria Carrilo Cavalcante Ribeiro Centro de Estudos de Microfinanças e Inclusão Financeira: Lauro Emilio Gonzalez Farias
Mariano, Luiz Roberto Nascimento Silva, Manoel Fernando Thompson Motta Filho, Centro de Estudos em Finanças: William Eid Jr.
Monteiro Aranha Participações S.A. (Olavo Monteiro de Carvalho), Ricardo Gattass, Rui Centro de Estudos em Private Equity: Ricardo Ratner Rochman
Barreto, Sul América Companhia Nacional de Seguros (Patrick de Larragoiti Lucas). Centro de Estudos em Competitividade Internacional: Maria Tereza Leme Fleury
Centro de Inovação: Susana Carla Farias Pereira
UNIDADES DA FGV-SP Centro de Estudos em Ética, Transparência, Integridade e Compliance: Ligia Maura Costa
Escola de Administração de Empresas de São Paulo Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo: Nelson Marconi
Diretor: Luiz Artur Ledur Brito Núcleo de Comunicação, Marketing Digital: Eliane Pereira Zamith Brito
Escola de Economia de São Paulo Centro de Estudos de Infraestrutura e Soluções Ambientais: Gesner José de Oliveira Filho
Diretor: Yoshiaki Nakano Centro de Estudos em Analytics e Políticas de Segurança: João Luiz Becker
Escola de Direito de São Paulo Núcleo de Estudos em Organizações e Pessoas: Maria José Tonelli
Diretor: Oscar Vilhena Vieira
APOIO
FGV Projetos Centro de Desenvolvimento do Ensino e da Aprendizagem:  Delane Botelho
Diretor Executivo: Coordenadoria de Avaliação Institucional: Heloisa Mônaco dos Santos
Luiz Carlos Guimarães Duque Centro de Carreiras: Cecilia Maria Braga de Noronha Santos
Diretor Técnico: Ricardo Simonsen Coordenadoria de Diversidade: Márcio José de Macedo
Diretor Adjunto do Escritório de São Paulo: Irineu Frare Office for Global Affairs: Julia Alice Sophia von Maltzan Pacheco
Diretor: Irapoan Cavalcanti Serviço de Apoio e Atendimento Psicológico e Psiquiátrico – Pró-Saúde GV: Tiago Luis Corbisier Matheus
Diretor do Centro de Economia Mundial: Carlos Geraldo Langoni Alumni FGV: Francisco Ilson Saraiva Junior
Diretoria da FGV para assuntos da FGV-SP Admissions Office: Luciana Gaia
Diretor: Maria Tereza Leme Fleury ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DA FGV-SP
Diretoria de Operações da FGV-SP: Mario Rocha Souza Diretora Geral: Alexandre Godoi de Angelis
 DIRETÓRIO ACADÊMICO GETULIO VARGAS
Presidente: Gabriel Domingues

GVEXECUTIVO
fgv.br/gvexecutivo - v. 22, n. 1, 2023 REDAÇÃO
GV-executivo / Escola de Administração de Empresas de São
Paulo. – Vol. 3, n. 3 (ago./out. 2004) - . - São Paulo: FGV
EAESP, 2004 - v. ; il. ; 27,5 cm.
Editor Chefe: Thomaz Wood Jr. Jornalista e produtora editorial: Aline Lilian dos Santos
Editora Adjunta: Adriana Wilner ADMINISTRAÇÃO Trimestral até abril 2006. Bimestral a partir de maio 2006.
Conselho Editorial: André Luís de Castro Moura Duarte, Camila Responsável: Ilda Fontes Semestral a partir de agosto 2009. Bimestral a partir de
Cheibub Figueiredo, Claudia De Farias Santiago, Cristina Dai Prá Assistente administrativa: Eldi Soares janeiro 2017. Trimestral a partir de 2021.
Martens, Fernando Burgos Pimentel dos Santos, Gilberto Sarfati, Assistente de marketing: Andréa Cerqueira Souza Continuação de: RAE-executivo.
Ilan Avrichir, João Lins Pereira Filho, João Martins Tude, Jorge REVISÃO: Marília Garcia Boldorini
Renato de Souza Verschoore Filho, Ligia Maura Costa, Luiz Ernesto PROJETO GRÁFICO E ILUSTRAÇÕES: Beto Nejme ISSN 1806-8979
Migliora Neto, Marcelo Oliveira Coutinho de Lima, Marco Antonio PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO: Renato Brandão 1. Administração de empresas – Periódicos. I. Escola de
Carvalho Teixeira, Marcos Henrique Facó, Maria José Tonelli, Mario CENTRAL DE RELACIONAMENTO: gvexecutivo@fgv.br Administração de Empresas de São Paulo.
Monzoni, Moacir de Miranda Oliveira Junior, Rafael Dan Schur, DIRETÓRIO: 10th Edition of Cabell’s Directory of Publishing CDU 658
Priscila Laczynski de Souza Miguel. Opportunities in Management www.cabells.com

EXECUTIVO 46

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