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No ano passado, o Procurador-Geral da Repú blica ajuizou duas Açõ es Diretas de

Inconstitucionalidade (ADI 4.976/DF e ADI nº 5.030/DF, respectivamente) em


face de dispositivos da Lei Geral da Copa - Lei nº 12.633/12 e da Lei nº
12.350/10.

Referidos dispositivos concedem diversos benefícios fiscais à s entidades


promotoras da Copa.

No entanto, antes de adentrar analisar tais, destaque-se que, conforme Balanço


Patrimonial divulgado no início 2014, o faturamento da Féderation
Internationale de Football Association (FIFA) no ano de 2013 foi de U$ 1,386
bilhã o, o que representa um crescimento de 7,4% em relaçã o ao recorde
anterior, estabelecido quando da Copa da Á frica do Sul.

Deste, extrai-se lucro de U$ 72 milhõ es, valor 23% menor que o do período
anterior - U$ 89 milhõ es.

Ainda, conforme estudo da autoria BDO, a previsã o é de que a Copa 2014 gere
cerca de U$ 5 bilhõ es aos cofres da Associaçã o, valor 26% maior que da Copa da
Á frica de 2010 e 110% da Copa da Alemanha de 2006.

Pois bem, é evidente que está -se diante de uma das mais poderosas organizaçõ es
internacionais do mundo contemporâ neo, seja por seus fundamentos
econô micos, seja por sua credibilidade e renome.

E vultuoso poder tem, conforme Estatuto Social, como missõ es: o


desenvolvimento do esporte, a sensibilizaçã o do mundo e a construçã o de um
futuro melhor, tudo sob égide da promoçã o de um futebol autêntico, unitá rio,
prezando pela mais altíssimo desempenho e integridade da instituiçã o e do
esporte.

Neste sentido, é evidente que estamos diante de uma organizaçã o que, em que
pese nã o (deveria) visar o lucro, o faz com maestria.

É que, quando da seleçã o dos países candidatos à sediar o evento internacional, o


entã o Ministro de Estado da Fazenda, Aldo Rebelo, ofereceu condiçõ es (quase
que impostas pela FIFA) para atrair o evento ao país, dentre as quais a Garantia
Governamental nº 4, que trata da "Isençã o Geral de Impostos".

Ocorre que alguns destes benefícios entram em pleno confronto com a


Constituiçã o da Repú blica Federativa do Brasil, razã o do ajuizamento das
referidas Açõ es Diretas de Inconstitucionalidade.

A começar, a Uniã o se comprometeu a assumir a responsabilidade civil da FIFA:


tal nã o mais representa que adoçã o da Teoria do Risco Integral, corrente
radicalmente publicista e que, segundo Hely Lopes Meirelles "é a modalidade
extremada da doutrina do risco administrativo, abandonada na prá tica, por
conduzir ao abuso e à iniquidade social. Para essa fó rmula radical, a
Administraçã o ficaria obrigada a indenizar todo e qualquer dano suportado por
terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima" (1999, p. 586).

Ou seja, a Administraçã o Pú blica se responsabiliza por danos provocados por


terceiros, indo além do que a Carta Magna prevê: responsabilidade objetiva do
Estado, que consiste na responsabilizaçã o quando da existência de nexo causal
entre o dano e o prejuízo, independentemente de culpa. Note que, nesta hipó tese,
ainda resguarda-se vínculo direto entre o causador do dano e o prejudicado, o
que nã o se revela no caso em comento.

Foram concedidos prêmios em dinheiro e auxílio especial aos ex-jogadores das


Copas de 1958, 1962 e 1970, em clara afronta ao princípio da isonomia.

É que a isonomia abrange o tratamento desigual tã o somente quando os


elementos eleitos para discriminaçã o constituam "peculiaridade distintiva" ou ao
menos sejam "compatíveis com os interesses acolhidos no sistema
constitucional"1

Evidente que no caso, pelo maior esforço que se faça, nã o se faz possível extrair
qualquer benefício ao bem/interesse pú blico, sendo tais vantagens de índole
estritamente privada.

Nã o bastante, foi concedida isençã o à FIFA ao adiantamento e/ou pagamento de


custas, emolumentos, cauçã o, honorá rios periciais e quaisquer despesas
decorrentes de demandas judiciais perante as jurisdiçõ es administradas pela
Uniã o, o que tã o nã o resguarda correlaçã o ló gica eis que a ú nica possibilidade de
se vislumbrar tal benefício (em consonâ ncia com o ordenamento jurídico pá trio)
seria evitar mora na organizaçã o do evento.

Ocorre que a previsã o legal prevê a isençã o perante qualquer juízo, a qualquer
tempo e para qualquer matéria, donde resta evidente claro desvio de finalidade
da norma.

Por fim, e de forma sucinta, também concedeu-se isençõ es a título de inú meros
tributos à FIFA, suas subsidiá rias no Brasil, seus prestadores de serviço e sobre o
pagamento de remessa de valores por este ó rgã o.

Há desvirtuamento do texto constitucional, que, desta vez visando o interesse


pú blico, abarca algumas espécies de benefícios em prol do desenvolvimento e
promoçã o do esporte.

É que as atividades desenvolvidas pelos beneficiá rios acima elencados por vezes
(diga-se de passagem, muitas vezes) nã o sã o ligadas diretamente à finalidade
constitucional, mas à promoçã o das pró prias entidades através de seminá rios,
coletivas de imprensa, banquetes, cerimô nias de abertura dos eventos, dentre
outras.

1
MELLO, Celso Antô nio Bandeira d. O conteú do jurídico do princípio da
igualdade. 3ª Ed. Sã o Paulo: Malheiros, 2010, p. 42.
http://pt.fifa.com/aboutfifa/organisation/mission.html
http://www1.folha.uol.com.br/esporte/folhanacopa/2014/03/1428845-copa-
faz-fifa-quebrar-recorde-de-faturamento-em-2013.shtml

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